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RESUMO DOS INFORMATIVOS - SITE DIZER O DIREITO

DIREITO PENAL

Atualizado em 01/03/2018: novos julgados + questões de concurso

Pontos atualizados: nº 02 (Info 913); nº 46 (Info 913); nº 31 (Info 915); nº 33 (Info


915); nº 36 (Info 915); nº 11 (Info 919); nº 48 (Info 920); nº 37 (Info 923)

1. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO
1.1. Um crime não pode ser absorvido por uma contravenção penal – (Info 743) –
IMPORTANTE!!!

O princípio da consunção é aplicável quando um delito de alcance menos


abrangente praticado pelo agente for meio necessário ou fase preparatória ou
executória para a prática de um delito de alcance mais abrangente.
Com base nesse conceito, em regra geral, a consunção acaba por determinar que a
conduta mais grave praticada pelo agente (crime-fim) absorve a conduta menos
grave (crime-meio).
O STF decidiu que o agente que faz uso de carteira falsa da OAB pratica o crime de
uso de documento falso, não se podendo admitir que esse crime seja absorvido
(princípio da consunção) pela contravenção penal de exercício ilegal da profissão
(art. 47 do DL nº 3.688/41).
Não é possível que um crime tipificado no Código Penal seja absorvido por uma
infração tipificada na Lei de Contravenções Penais.
STF. 1ª Turma. HC 121652/SC, rel. Min. Dias Toffoli, j. 22/4/2014 (Info 743).

2. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
2.1. STF reconheceu que o valor econômico do bem furtado era muito pequeno,
mas, como o réu era reincidente, em vez de absolvê-lo aplicando o princípio da
insignificância, o Tribunal utilizou esse reconhecimento para conceder a pena
restritiva de direitos – (Info 913) – IMPORTANTE!!!

Em regra, o reconhecimento do princípio da insignificância gera a absolvição do


réu pela atipicidade material. Em outras palavras, o agente não responde por nada.
Em um caso concreto, contudo, o STF reconheceu o princípio da insignificância,
mas, como o réu era reincidente em crime patrimonial, em vez de absolvê-lo, o
Tribunal utilizou esse reconhecimento para conceder a substituição da pena
privativa de liberdade por restritiva de direitos.
Em razão da reincidência, o STF entendeu que não era o caso de absolver o
condenado, mas, em compensação, determinou que a pena privativa de liberdade
fosse substituída por restritiva de direitos.
STF. 1ª Turma. HC 137217/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre
de Moraes, j. 28/8/18 (Info 913).
OBS:
É possível aplicar o princípio da insignificância em favor de um réu reincidente ou
que já responda a outros inquéritos ou ações penais? A aplicação do princípio da
insignificância envolve um juízo amplo (“conglobante”), que vai além da simples
aferição do resultado material da conduta, abrangendo também a reincidência ou
contumácia do agente, elementos que, embora não determinantes, devem ser
considerados. A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a
insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto. Na hipótese
de o juiz da causa considerar penal ou socialmente indesejável a aplicação do princípio
da insignificância por furto, em situações em que tal enquadramento seja cogitável,
eventual sanção privativa de liberdade deverá ser fixada, como regra geral, em regime
inicial aberto, paralisando-se a incidência do art. 33, § 2º, "c", do CP no caso concreto,
com base no princípio da proporcionalidade. STF. Plenário. HC 123108, Rel. Min.
Roberto Barroso, julgado em 03/08/2015 (Info 793).

Caso concreto julgado pelo STF: Antônio foi denunciado por tentar furtar quatro
frascos de xampu de um supermercado, bens avaliados em R$ 31,20. O réu foi
condenado pelo art. 155 c/c art. 14, II, do CP a uma pena de 8 meses de reclusão. Foi
aplicado o regime inicial semiaberto e negada a substituição por pena restritiva de
direitos. A defesa impetrou habeas corpus pedindo a absolvição do condenado com
base na aplicação do princípio da insignificância. O “problema” é que Antônio é
reincidente (já possuía uma condenação anterior por furto).

Primeira pergunta: por que o juiz negou a substituição da pena privativa de liberdade
por restritiva de direitos? Porque o réu era reincidente em crime doloso, nos termos
do art. 44, II, do CP:
Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e
substituem as privativas de liberdade, quando:
(...)
II – o réu não for reincidente em crime doloso;

Segunda pergunta: o STF concordou com o pedido da defesa e absolveu o réu com base
no princípio da insignificância? NÃO. A 1ª Turma do STF adotou uma posição
“intermediária”. Como o réu era reincidente em crimes patrimoniais, o STF decidiu
que não se poderia aplicar o princípio da insignificância para absolver o agente. No
entanto, apesar disso, o STF concedeu habeas corpus de ofício para que a pena
privativa de liberdade imposta ao condenado seja substituída por restritiva de
direitos, com base no art. 44, § 3º do CP:
§ 3º Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a
substituição, desde que, em face de condenação anterior, a
medida seja socialmente recomendável e a reincidência não
se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.

Desse modo, o princípio da insignificância pode ser utilizado em alguns casos para
não absolver o agente, mas conceder a ele benefício penal, como por exemplo, a
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, mesmo
havendo óbice legal. Situação parecida já havia sido reconhecida pelo STF no
julgamento do HC 123533. Veja:
(...) Por maioria, foram também acolhidas as seguintes teses:
(i) a reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa
reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos
elementos do caso concreto; e
(ii) na hipótese de o juiz da causa considerar penal ou
socialmente indesejável a aplicação do princípio da
insignificância por furto, em situações em que tal
enquadramento seja cogitável, eventual sanção privativa de
liberdade deverá ser fixada, como regra geral, em regime
inicial aberto, paralisando-se a incidência do art. 33, § 2º, c, do
CP no caso concreto, com base no princípio da
proporcionalidade. (...)
STF. Plenário. HC 123533, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado
em 03/08/2015.

O Min. Alexandre de Moraes afirmou que, em pequenas comunidades, a substituição


da pena privativa de liberdade por medida restritiva de direito, a permitir que as
pessoas vejam onde está sendo cumprida, tem valor simbólico e pedagógico maior
do que a fixação do regime semiaberto ou aberto. STF. 1ª Turma. HC 137217/MG,
Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em
28/8/2018(Info 913).

2.2. É possível a aplicação do princípio da insignificância para o furto de um galo,


quatro galinhas caipiras, uma galinha garnizé e três quilos de feijão – (Info 911)

Em regra, a habitualidade delitiva específica (ou seja, o fato de o réu já responder


a outra ação penal pelo mesmo delito) é um parâmetro (critério) que afasta o
princípio da insignificância mesmo em se tratando de bem de reduzido valor.
Excepcionalmente, no entanto, as peculiaridades do caso concreto podem justificar
o afastamento dessa regra e a aplicação do princípio, com base na ideia da
proporcionalidade.
É o caso, por exemplo, do furto de um galo, quatro galinhas caipiras, uma galinha
garnizé e três quilos de feijão, bens avaliados em pouco mais de cem reais. O valor
dos bens é inexpressivo e não houve emprego de violência. Enfim, é caso de
mínima ofensividade, ausência de periculosidade social, reduzido grau de
reprovabilidade e inexpressividade da lesão jurídica.
Mesmo que conste em desfavor do réu outra ação penal instaurada por igual
conduta, ainda em trâmite, a hipótese é de típico crime famélico.
A excepcionalidade também se justifica por se tratar de hipossuficiente. Não é
razoável que o Direito Penal e todo o aparelho do Estado-polícia e do Estado-juiz
movimente-se no sentido de atribuir relevância a estas situações.
STF. 2ª Turma. HC 141440 AgR/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 14/8/18 (Info 911).
OBS: Ressalte-se, mais uma vez, que não há uma regra geral e absoluta para a
aplicação do princípio da insignificância em favor de reincidentes ou réus que já
possuam outras ações penais. No Info 910, por exemplo, foi noticiado um julgado no
qual o STF negou a aplicação do referido princípio tendo como principal fundamento
a circunstância de o réu ser reincidente.

2.3. (In) aplicabilidade do princípio no caso do crime previsto no art. 34 da Lei


9.605/98 – (Info 901)
O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c
parágrafo único, II, da Lei 9.605/98:
Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados
por órgão competente:
Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas
cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:
II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de
aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;
Caso concreto: realização de pesca de 7kg de camarão em período de defeso com o
uso de método não permitido.
STF. 1ª Turma. HC 122560/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 8/5/18 (Info 901).

Obs: apesar de a redação utilizada no informativo original ter sido bem incisiva
(“O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c
parágrafo único, II, da Lei 9.605/98”), existem julgados tanto do STF como do STJ
aplicando, excepcionalmente, o princípio da insignificância para o delito de pesca
ilegal. Deve-se ficar atenta(o) para como isso será cobrado no enunciado da prova.
OBS:
Imagine a seguinte situação adaptada: João foi encontrado pescando camarões pelo
método de arrasto motorizado no período de defeso. Esse método não é permitido no
período de defeso. Em seu barco foram localizados 7kg de camarão-rosa. Diante desse
fato, João foi denunciado pela suposta prática do delito previsto no art. 34, caput e
parágrafo único, II, da Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais):
Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em
lugares interditados por órgão competente:
Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as
penas cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:
II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante
a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não
permitidos;

A defesa invocou a aplicação do princípio da insignificância e o caso chegou até o


STF. Indaga-se: o Supremo admitiu a incidência da insignificância neste caso
concreto? NÃO.

A jurisprudência aplica o princípio da insignificância para o crime de pesca ilegal?


Essa resposta envolve três afirmações:
1) A jurisprudência entende que, em tese, é possível aplicar o princípio da
insignificância para crimes ambientais.

2) Na prática, a esmagadora maioria dos julgados do STF e STJ nega a incidência do


princípio da insignificância para o delito do art. 34 da Lei nº 9.605/98:
(...) Esta Corte entende ser possível a aplicação do princípio da
insignificância aos delitos ambientais, quando demonstrada a
ínfima ofensividade ao bem ambiental tutelado (AgRg no
REsp 1558312/ES, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta
Turma, julgado em 02/02/2016).

Na espécie, contudo, é significativo o desvalor da conduta, a


impossibilitar o reconhecimento da atipicidade material da
ação ou a sua irrelevância penal, ante o fato de o recorrente
ter sido surpreendido com considerável quantidade de
pescado em período no qual, sabidamente, é proibida a
pesca, demonstrando a relevância do dano causado e o risco
criado à estabilidade do meio ambiente pela prática
notadamente ilícita. (...)
STJ. 5ª Turma. RHC 59.507/RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da
Fonseca, julgado em 04/05/2017.

(...) Não é insignificante a conduta de pescar em época


proibida, e com petrechos proibidos para pesca (tarrafa, além
de varas de pescar), ainda que pequena a quantidade de
peixes apreendidos. (...)
STJ. 6ª Turma. REsp 1685927/RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro,
julgado em 12/09/2017.
Caso concreto: não aplicado à atividade de pesca em período
de defeso, em que apreendidos 5 varas com molinete, 1 tarrafa
e 250g de peixe robalo.

3) Apesar de não ser comum, a jurisprudência já reconheceu a aplicação do princípio


da insignificância para o delito do art. 34. Veja:
Não se configura o crime previsto no art. 34 da Lei nº 9.605/98
na hipótese em há a devolução do único peixe – ainda vivo –
ao rio em que foi pescado.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.409.051-SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro,
julgado em 20/4/2017 (Info 602).

Se a pessoa é flagrada sem nenhum peixe, mas portando consigo equipamentos de


pesca, em um local onde esta atividade é proibida, ela poderá ser absolvida do delito
do art. 34 da Lei de Crimes com base no princípio da insignificância? A 2ª Turma do
STF possui decisões conflitantes sobre o tema:
 SIM. Inq 3788/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 1°/3/16 (Info 816).

 NÃO. RHC 125566/PR e HC 127926/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26/10/16


(Info 845).

2.4. Crimes tributários e o limite de 20 mil reais – (Infos 749 e 898)

Qual é o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários e


descaminho?
20 mil reais (tanto para o STF como para o STJ)
Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de
descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$
20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as
atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda.

STJ. 3ª Seção. REsp 1688878-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 28/2/18 (recurso
repetitivo).
STF. 1ª Turma. HC 137595 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 07/05/2018.
STF. 1ª Turma. HC 127173, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão: Min. Roberto
Barroso, j. 21/03/2017.
STF. 2ª Turma. HC 155347/PR, Rel. Min. Dias Tóffoli, j. 17/4/2018 (Info 898).
STF. 1ª Turma. HC 121717/PR, Rel. Min. Rosa Weber, j. 3/6/14 (Info 749).
OBS:
Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários
federais e de descaminho quando o débito tributário
verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil
reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com
as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas
do Ministério da Fazenda.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.709.029/MG, Rel. Min. Sebastião Reis
Júnior, julgado em 28/02/2018 (recurso repetitivo).

Em suma, qual é o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes


tributários e descaminho? Tanto para o STF como o STJ: 20 mil reais (conforme as
Portarias 75 e 132/2012 do MF).

2.5. É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de manter rádio


clandestina? – (Info 853)

É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de manter rádio


comunitária clandestina?
 STJ: NÃO. É inaplicável o princípio da insignificância ao delito previsto no
art. 183 da Lei nº 9.472/97, nas hipóteses de exploração irregular ou
clandestina de rádio comunitária, mesmo que ela seja de baixa potência,
uma vez que se trata de delito formal de perigo abstrato, que dispensa a
comprovação de qualquer dano (resultado) ou do perigo, presumindo-se
este absolutamente pela lei. Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp
740.434/BA, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 14/02/2017.
 STF: SIM, é possível, em situações excepcionais, o reconhecimento do
princípio da insignificância desde que a rádio clandestina opere em baixa
frequência, em localidades afastadas dos grandes centros e em situações nas
quais ficou demonstrada a inexistência de lesividade.
STF. 2ª Turma. HC 138134/BA, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 7/2/2017 (Info
853).

2.6. Provedor clandestino de internet sem fio – (Info 842)

O réu que disponibiliza provedor de internet sem fio pratica atividade clandestina
de telecomunicação (art. 183 da Lei 9.472/97), de modo que a tipicidade da conduta
está presente, devendo ser afastada a aplicação do princípio da insignificância
mesmo que, no caso concreto, a potência fosse inferior a 25 watts, o que é
considerado baixa potência, nos termos do art. 1º, § 1º, da Lei nº 9.612/98.
STF. 1ª Turma. HC 118400/RO, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 04/10/2016 (Info 842).
OBS:
A conduta de transmitir sinal de internet, via rádio, como se fosse um provedor de
internet, sem autorização da ANATEL, configura algum crime? SIM. A conduta de
transmitir sinal de internet, via rádio, de forma clandestina, caracteriza, em princípio,
o delito descrito no art. 183 da Lei 9.472/97 (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp
1483107/RN, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 01/12/2015).
Veja o que diz este dispositivo legal:
Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de
telecomunicação:
Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade
se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil
reais).

Mas o art. 183 fala em “atividades de telecomunicação”. O provedor de acesso à


internet desenvolve atividade de telecomunicação? O provedor de acesso à Internet
via radiofrequência (internet via rádio) desenvolve dois serviços:
 um serviço de telecomunicações (Serviço de Comunicação Multimídia); e
 um Serviço de Valor Adicionado (Serviço de Conexão à Internet).

Dessa forma, a chamada “internet via rádio” pode ser considerada também um serviço
de telecomunicação.

Os provedores de internet via rádio precisam de autorização da Anatel para


funcionar? Prevalece que sim. As atividades de telecomunicação precisam de
autorização prévia da ANATEL, salvo se forem praticadas dentro de uma mesma
edificação ou propriedade (art. 75 da Lei 9.472/97).

O acusado argumentou também que não deveria ser condenado, considerando que não
ficou provado que ele causou prejuízo, seja para os clientes, seja para os serviços de
telecomunicações. Essa alegação é acolhida pelos Tribunais? NÃO. O delito do art.
183 da Lei 9.427/97 é crime de perigo abstrato. Isso significa que, para a sua
consumação, basta que alguém desenvolva de forma clandestina as atividades de
telecomunicações, sem necessidade de demonstrar prejuízo concreto para o sistema
de telecomunicações (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1560335/MG, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, julgado em 21/06/2016).

2.7. Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em violência


doméstica – (Info 825) – IMPORTANTE!!!

Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de


violência doméstica.
Os delitos praticados com violência contra a mulher, devido à expressiva
ofensividade, periculosidade social, reprovabilidade do comportamento e lesão
jurídica causada, perdem a característica da bagatela e devem submeter-se ao
direito penal.
O STJ e o STF não admitem a aplicação dos princípios da insignificância e da
bagatela imprópria aos crimes e contravenções praticados com violência ou grave
ameaça contra a mulher, no âmbito das relações domésticas, dada a relevância penal
da conduta.
O fato de o casal ter se reconciliado não significa atipicidade material da conduta
ou desnecessidade de pena.
STJ. 5ª Turma. HC 333.195/MS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 12/4/16.
STJ. 6ª Turma. AgRg no HC 318.849/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 27/10/15.
STF. 2ª Turma. RHC 133043/MT, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 10/5/16 (Info 825).

2.8. Aplica-se o princípio da insignificância aos crimes ambientais – (Info 816)


É possível aplicar o princípio da insignificância para crimes ambientais.
Ex: pessoa encontrada em uma unidade de conservação onde a pesca é proibida,
com vara de pescar, linha e anzol, conduzindo uma pequena embarcação na qual
não havia peixes.
STF. 2ª Turma. Inq 3788/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 1°/3/2016 (Info 816).
STJ. 5° Turma. AgRg no AREsp 654.321/SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j.
9/6/15.
OBS:
A jurisprudência do STF é no sentido da aplicabilidade do princípio da insignificância
aos crimes ambientais, tanto com relação aos de perigo concreto — em que haveria
dano efetivo ao bem jurídico tutelado —, quanto aos de perigo abstrato, como no art.
34, caput, da Lei nº 9.605/98.
No processo em exame, não se produziu prova material de que tenha havido qualquer
dano efetivo ao meio ambiente. Ademais, mesmo diante de crime de perigo abstrato,
não é possível dispensar a verificação “in concreto” do perigo real ou mesmo
potencial da conduta praticada pelo acusado com relação ao bem jurídico tutelado.
Esse perigo real não se verificou no caso concreto.

2.9. Princípio da insignificância e outras ações penais – (Info 793)

É possível aplicar o princípio da insignificância em favor de um réu reincidente?


A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a
insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto.
Apesar disso, na prática, observa-se que, na maioria dos casos, o STF e o STJ negam
a aplicação do princípio da insignificância caso o réu seja reincidente ou já
responda a outros inquéritos ou ações penais. De igual modo, nega o benefício em
situações de furto qualificado.
STF. Plenário. HC 123108/MG, HC 123533/SP e HC 123734/MG, Rel. Min. Roberto
Barroso, j. 3/8/2015 (Info 793).
OBS:
Ex: o STF negou o princípio da insignificância para réu que praticou furto simples de
um chinelo avaliado em R$ 16. Embora o bem tenha sido restituído à vítima, a Corte
não aplicou o referido princípio em razão de ele ser reincidente específico,
costumeiro na prática de crimes contra o patrimônio. Segundo afirmou o Min. Teori
Zavascki, a reiteração criminosa do agente faz com que seja alta a carga de
reprovabilidade da conduta, servindo para impedir a concessão do benefício (HC
123.108/MG).

2.10. Contrabando – (Sem Info)

Não se aplica o princípio da insignificância no caso de contrabando, tendo em vista


o desvalor da conduta do agente.
STF, HC 110964, Relator Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, julgado em 07/02/2012.
STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1472745/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 1/9/15.

3. TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO


3.1. O superior hierárquico não pode ser punido com base na teoria do domínio do
fato se não tiver sido demonstrado o dolo – (Info 880)
A teoria do domínio do fato não permite que a mera posição de um agente na escala
hierárquica sirva para demonstrar ou reforçar o dolo da conduta.
Do mesmo modo, também não permite a condenação de um agente com base em
conjecturas. Assim, não é porque houve irregularidade em uma licitação estadual
que o Governador tenha que ser condenado criminalmente por isso.
STF. 2ª Turma. AP 975/AL, Rel. Min. Edson Fachin, j. 3/10/17 (Info 880).
OBS: Sobre o tema, confira outro precedente semelhante:
Não há óbice para que a denúncia invoque a teoria do domínio
do fato para dar suporte à imputação penal, sendo necessário,
contudo, que, além disso, ela aponte indícios convergentes no
sentido de que o Presidente da empresa não só teve
conhecimento do crime de evasão de divisas, como dirigiu
finalisticamente a atuação dos demais acusados.
Assim, não basta que o acusado se encontre em posição
hierarquicamente superior. Isso porque o próprio estatuto da
empresa prevê que haja divisão de responsabilidades e, em
grandes corporações, empresas ou bancos há controles e
auditorias exatamente porque nem mesmo os sócios têm como
saber tudo o que se passa.
STF. 2ª Turma. HC 127397/BA, Rel. Min. Dias Toffoli, j.
6/12/16 (Info 850).

4. DOSIMETRIA DA PENA
4.1. MULTA: MP é quem deve executar a pena de multa e, apenas se ficar inerte
por mais de 90 dias, essa legitimidade é transferida para a Fazenda Pública – (Info 927)
– IMPORTANTE!!! Mudança de Entendimento!!!

O Ministério Público possui legitimidade para propor a cobrança de multa


decorrente de sentença penal condenatória transitada em julgado, com a
possibilidade subsidiária de cobrança pela Fazenda Pública.

Quem executa a pena de multa?


• Prioritariamente: o Ministério Público, na vara de execução penal, aplicando-se a
LEP.
• Caso o MP se mantenha inerte por mais de 90 dias após ser devidamente
intimado: a Fazenda Pública irá executar, na vara de execuções fiscais, aplicando-
se a Lei nº 6.830/80.
STF. Plenário. ADI 3150/DF, Rel. para acórdão Min. Roberto Barroso, j. 12 e 13/12/18
(Info 927).
STF. Plenário. AP 470/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 12 e 13/12/18 (Info 927).

Obs: A Súmula 521-STJ fica superada e deverá ser cancelada. Súmula 521-STJ: A
legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em
sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública.
OBS:
Multa: é uma espécie de pena, por meio da qual o condenado fica obrigado a pagar
uma quantia em dinheiro que será revertida em favor do Fundo Penitenciário.

Pagamento da multa: A pena de multa é fixada na própria sentença condenatória.


Depois que a sentença transitar em julgado, o condenado terá um prazo máximo de
10 dias para pagar a multa imposta (art. 50 do CP). O Código prevê a possibilidade de
o condenado requerer o parcelamento da multa em prestações mensais, iguais e
sucessivas, podendo o juiz autorizar, desde que as circunstâncias justifiquem (ex.: réu
muito pobre, multa elevadíssima etc.). O parcelamento deverá ser feito antes de
esgotado o prazo de 10 dias. O Juiz, antes de decidir, poderá determinar diligências
para verificar a real situação econômica do condenado e, ouvido o MP, fixará o
número de prestações (art. 169, § 1º da LEP). Se o condenado for impontual ou se
melhorar de situação econômica, o Juiz, de ofício ou a requerimento do MP, poderá
revogar o benefício (art. 169, § 2º da LEP).

O que acontece caso o condenado não pague nem parcele a multa no prazo de 10 dias?
1) Antes da Lei 9.268/96: se o condenado, deliberadamente, deixasse de pagar a pena
de multa, ela deveria ser convertida em pena de detenção. Em outras palavras, a multa
era transformada em pena privativa de liberdade.
2) Atualmente: a Lei 9.268/96 alterou o art. 51 do CP e previu que, se a multa não for
paga, ela será considerada dívida de valor e deverá ser exigida por meio de execução
(não se permite mais a conversão da pena de multa em detenção).

Antes da Lei 9.268/96 Depois da Lei 9.268/96 (ATUALMENTE)


Art. 51. A multa converte-se em pena Art. 51. Transitada em julgado a sentença
de detenção, quando o condenado condenatória, a multa será considerada
solvente deixa de paga-lá ou frustra a dívida de valor, aplicando-se-lhes as
sua execução. normas da legislação relativa à dívida ativa
da Fazenda Pública, inclusive no que
concerne às causas interruptivas e
suspensivas da prescrição.

Multa permaneceu com caráter penal: Importante esclarecer que, mesmo com essa
mudança trazida pela Lei 9.268/96, a multa continua tendo caráter de sanção
criminal, ou seja, permanece sendo uma pena, por força do art. 5º, XLVI, “c”, da
CF/88:
Art. 5º (...)
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará,
entre outras, as seguintes:
c) multa;

Assim, a única coisa que a Lei 9.268/96 fez foi mudar a forma de cobrança da multa
não paga: antes, ela virava pena de detenção; agora, deve ser cobrada por meio de
execução.

Quem executa a pena de multa?


STF:
STJ: Fazenda Pública Prioritariamente: o Ministério Público.
Subsidiariamente: a Fazenda Pública
O STJ sempre sustentou que, como se A Lei nº 9.268/96, ao considerar a multa
trata de dívida de valor, a pena de penal como dívida de valor, não retirou dela
multa deveria ser executada pela o caráter de sanção criminal.
Fazenda Pública por meio de Diante de tal constatação, não há como
execução fiscal que tramita na vara de retirar do MP a competência para a
execuções fiscais. execução da multa penal, considerado o
teor do art. 129 da CF/88, segundo o qual é
O rito a ser aplicado seria o da Lei nº função institucional do MP promover
6.830/80. privativamente a ação penal pública, na
A execução da pena de multa forma da lei.
ocorreria como se estivesse sendo Promover a ação penal significa conduzi-la
cobrada uma multa tributária. ao longo do processo de conhecimento e de
Não se aplica a Lei nº 7.210/84 (LEP). execução, ou seja, buscar a condenação e,
uma vez obtida esta, executá-la. Caso
Esse era o entendimento pacífico do contrário, haveria uma interrupção na função
STJ, tanto que foi editada uma do titular da ação penal.
súmula nesse sentido. Ademais, o art. 164 da LEP é expresso ao
reconhecer essa competência do MP. Esse
Súmula 521-STJ: A legitimidade para dispositivo não foi revogado
a execução fiscal de multa pendente expressamente pela Lei nº 9.268/96.
de pagamento imposta em sentença Vale ressaltar, entretanto que, se o titular
condenatória é exclusiva da da ação penal, mesmo intimado, não
Procuradoria da Fazenda Pública. propuser a execução da multa no prazo de
90 dias, o juiz da execução criminal deverá
dar ciência do feito ao órgão competente da
Fazenda Pública (federal ou estadual,
conforme o caso) para a respectiva
cobrança na própria vara de execução
fiscal, com a observância do rito da Lei
6.830/80.
Quem executa: Fazenda Pública. Quem executa:
Juízo: vara de execuções fiscais. • Prioritariamente: o Ministério Público, na
Legislação: Lei nº 6.830/80. vara de execução penal, aplicando-se a
LEP.
• Caso o MP se mantenha inerte por mais
de 90 dias após ser devidamente intimada:
a Fazenda Pública irá executar, na vara de
execuções fiscais, aplicando-se a Lei nº
6.830/80.

Exemplo: João foi sentenciado por roubo e o juiz de direito (Justiça Estadual) o
condenou a 4 anos de reclusão e mais 10 dias-multa no valor de meio salário mínimo
cada. Depois do trânsito em julgado, o condenado foi intimado para pagar a pena de
multa no prazo de 10 dias, mas não o fez. Diante disso, o escrivão da vara irá fazer
uma certidão na qual constarão as informações sobre a condenação e o valor da multa.

• Para o STJ, o magistrado deveria remeter a certidão para Procuradoria Geral do


Estado e um dos Procuradores do Estado iria ajuizar, em nome do Estado, uma
execução fiscal que tramitaria na vara de execuções fiscais (não era na vara de
execuções penais).

• Agora, com a decisão do STF, o magistrado deverá intimar o Ministério Público e


o Parquet irá propor a execução da multa na vara de execução penal. Caso o MP,
devidamente intimado, não proponha a execução da multa no prazo de 90 dias, o juiz
da execução criminal deverá dar ciência do feito ao órgão competente da Fazenda
Pública (federal ou estadual, conforme o caso) para a respectiva cobrança na própria
vara de execução fiscal, com a observância do rito da Lei 6.830/80.
 Alerta: se João tivesse sido condenado pela Justiça Federal, quem iria ingressar
com a execução seria prioritariamente o MPF e, apenas subsidiariamente, a
União, por intermédio da Procuradoria da Fazenda Nacional (PFN).

O que acontece com o entendimento do STJ manifestado na Súmula 521? Fica


superado e a súmula será cancelada. Isso porque a decisão do STF foi proferida em
ação direta de inconstitucionalidade possuindo, portanto, eficácia erga omnes e
efeito vinculante (art. 102, § 2º, da CF/88).

4.2. Correto conceito de culpabilidade, princípio da não-culpabilidade e vedação


ao bis in idem – (Info 851)

Determinado réu foi condenado por furto qualificado por rompimento de


obstáculo (art. 155, § 4º, I, do CP).
O STF considerou incorreta a sentença do juiz que, na 1ª fase da dosimetria da
pena, aumentou a pena-base com fundamento em três argumentos:
a) Culpabilidade. O magistrado afirmou que era patente a culpabilidade do réu
considerando que ele tinha plena consciência da ilicitude de seu ato.
O juiz confundiu os conceitos. Para fins de dosimetria da pena, culpabilidade
consiste na reprovação social que o crime e o autor do fato merecem. Essa
culpabilidade de que trata o art. 59 do CP não tem nada a ver com a culpabilidade
como requisito do crime (imputabilidade, potencial consciência da ilicitude do fato
e inexigibilidade de conduta diversa).

b) Antecedentes. O juiz aumentou a pena pelo fato de o agente já responder a


quatro outros processos criminais.
A jurisprudência entende que, em face do princípio da presunção de não
culpabilidade, os inquéritos policiais e ações penais em curso não podem ser
considerados maus antecedentes (Súmula 444-STJ e STF RE 591054/SC).

c) Circunstâncias do crime. O julgador considerou que as circunstâncias do crime


eram negativas porque o crime foi praticado com rompimento de obstáculo à
subtração da coisa.
Aqui, o erro do magistrado foi utilizar como circunstância judicial (1ª fase da
dosimetria) um elemento que ele já considerou como qualificadora (inciso I do § 4º
do art. 155). Houve, portanto, bis in idem (dupla punição pelo mesmo fato).
STF. 2ª Turma. HC 122940/PI, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13/12/16 (Info 851).

4.3. Elevados custos da investigação e enriquecimento do réu não são argumentos


para aumentar a pena-base – (Info 845)

Os elevados custos da atuação estatal para apuração da conduta criminosa e o


enriquecimento ilícito obtido pelo agente não constituem motivação idônea para a
valoração negativa do vetor "consequências do crime" na 1ª fase da dosimetria da
pena.
Em outras palavras, o fato de o Estado ter gasto muitos recursos para investigar os
crimes (no caso, era uma grande operação policial) e de o réu ter obtido
enriquecimento ilícito com as práticas delituosas não servem como motivo para
aumentar a pena-base.
STF. 2ª Turma. HC 134193/GO, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26/10/16 (Info 845).
4.4. Aumento da pena-base pelo fato de a concussão ter sido praticada por policial
– (Info 835) – IMPORTANTE!!!

É legítima a utilização da condição pessoal de policial civil como circunstância


judicial desfavorável para fins de exasperação da pena-base aplicada a acusado
pela prática do crime de concussão.
Aquele que está investido de parcela de autoridade pública — como é o caso de um
juiz, um membro do Ministério Público ou uma autoridade policial — deve ser
avaliado, no desempenho da sua função, com maior rigor do que as demais pessoas
não ocupantes de tais cargos.
STF. 1ª Turma. HC 132990/PE, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Edson
Fachin, j. 16/8/16 (Info 835).
OBS:
Imagine a seguinte situação adaptada: João, policial civil, foi condenado pela prática
do crime de concussão (art. 316 do CP). No momento da dosimetria, na 1ª fase
(circunstâncias judiciais), o magistrado aumentou a pena-base sob o argumento de
que havia acentuada culpabilidade, já que o delito foi cometido por policial, pessoa
encarregada de garantir a segurança pública dos cidadãos. A defesa recorreu contra
este ponto alegando que a majoração da pena com base neste argumento configura bis
in idem. Isso porque a concussão é um crime que só pode ser praticado por funcionário
público. Logo, o fato de o agente ser policial teria sido utilizado duas vezes.

O argumento invocado pela defesa foi aceito pelo STF? Houve bis in idem neste caso?
A decisão do magistrado foi equivocada? NÃO.

O delito previsto no art. 316 do CP realmente só pode ser praticado por funcionário
público. No entanto, é possível que o magistrado, ao fazer a dosimetria da pena,
analisando as circunstâncias do art. 59 do CP, aumente a pena invocando a qualidade
específica ou a qualificação do funcionário público.

4.5. Condenações anteriores transitadas em julgado não podem ser utilizadas como
conduta social desfavorável – (Info 825)

A circunstância judicial "conduta social", prevista no art. 59 do CP, representa o


comportamento do agente no meio familiar, no ambiente de trabalho e no
relacionamento com outros indivíduos.
Os antecedentes sociais do réu não se confundem com os seus antecedentes
criminais. São circunstâncias distintas, com regramentos próprios. Não se mostra
correto o magistrado utilizar as condenações anteriores transitadas em julgado
como "conduta social desfavorável".
STF. 2ª Turma. RHC 130132, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 10/5/2016 (Info 825).
OBS:
Critério trifásico: A dosimetria da pena na sentença obedece a um critério trifásico:
1º passo: o juiz calcula a pena-base de acordo com as circunstâncias judiciais do art.
59, CP;
2º passo: o juiz aplica as agravantes e atenuantes;
3º passo: o juiz aplica as causas de aumento e de diminuição.
Este critério trifásico, elaborado por Nelson Hungria, foi adotado pelo Código Penal,
sendo consagrado pela jurisprudência pátria: STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp
1021796/RS, Rel. Min. Assusete Magalhães,julgado em 19/03/2013.

Primeira fase (circunstâncias judiciais): Na primeira fase, as chamadas circunstâncias


judiciais analisadas pelo juiz são as seguintes: a) culpabilidade, b) antecedentes, c)
conduta social, d) personalidade do agente, e) motivos do crime, f) circunstâncias do
crime, g) consequências do crime, h) comportamento da vítima.

Imagine agora a seguinte situação: João possui quatro condenações transitadas em


julgado. Ele está agora sendo julgado pela prática do crime 5. No momento da
dosimetria da pena, o juiz aumentou a pena-base com base em duas circunstâncias
judiciais:
 Utilizo a condenação do crime 1 como maus antecedentes;
 Os crimes 2 a 4 indicam que sua conduta social é péssima, pois já se viu
envolvido em vários outros episódios que não aqueles valorados no item
anterior e que demonstram que o réu não se adéqua às regras sociais.

A defesa impugnou a decisão afirmando que o magistrado valorou negativamente


circunstâncias judiciais diversas com fundamento na mesma base empírica (registros
criminais), conferindo-lhes conceitos jurídicos assemelhados.

A tese da defesa foi aceita pelo STF? Houve erro na dosimetria da pena? SIM. Teori
explicou que, antes da reforma da Parte Geral do CP (1984), a análise dos antecedentes
abrangia todo o passado do agente, incluindo, além dos registros criminais, o seu
comportamento na sociedade. Após a aprovação da Lei 7.209/84, a conduta social
passou a ter significado próprio. A conduta social passou a ser utilizada apenas para
avaliar o comportamento do condenado no meio familiar, no ambiente de trabalho
e no relacionamento com outros indivíduos. Ou seja, os antecedentes sociais do réu
não mais se confundem com os seus antecedentes criminais. Trata-se de
circunstâncias diversas. Assim, a análise da circunstância judicial da conduta social
não tem relação com a vida criminal do acusado. O histórico criminal já é utilizado
para aferir os antecedentes (primeira fase de aplicação da pena) ou a reincidência
(segunda fase de aplicação da pena). A conduta social está relacionada com aspectos
extrapenais.

5. MAUS ANTECEDENTES
5.1. Cinco anos após o cumprimento ou extinção da pena, a condenação pretérita
ainda poderá ser utilizada como maus antecedentes? – (Info 799) – IMPORTANTE!!!

A existência de condenação anterior, ocorrida em prazo superior a cinco anos,


contado da extinção da pena, poderá ser considerada como maus antecedentes?
Após o período depurador, ainda será possível considerar a condenação como maus
antecedentes?
1ª corrente: SIM. Posição do STJ.
2ª corrente: NÃO. Posição do STF.
STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 323.661/MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca,
julgado em 01/09/2015.
STF. 2ª Turma. HC 126315/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 15/9/2015 (Info
799).
5.2. Inquéritos policiais e ações penais sem trânsito em julgado – (Infos 791 e 772)
– IMPORTANTE!!!

A existência de inquéritos policiais ou de ações penais sem trânsito em julgado não


podem ser considerados como maus antecedentes para fins de dosimetria da pena.
STF. Plenário. HC 94620/MS e HC 94680/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski,
julgados em 24/6/2015 (Info 791).
STF. Plenário. RE 591054/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 17/12/2014
(repercussão geral) (Info 772).

6. AGRAVANTES
6.1. As agravantes (tirando a reincidência) não se aplicam aos crimes culposos –
(Info 735)

As circunstâncias agravantes genéricas não se aplicam aos crimes culposos, com


exceção da reincidência.
STF. 1ª Turma. HC 120165/RS, rel. Min. Dias Toffoli, j. 11/2/14 (Info 735).

7. PRESCRIÇÃO
7.1. Interpretação do art. 112 do CP – (Info 890) – IMPORTANTE!!! TEMA
POLÊMICO!

Se o Ministério Público não recorreu contra a sentença condenatória, tendo havido


apenas recurso da defesa, qual deverá ser o termo inicial da prescrição da pretensão
executiva? O início do prazo da prescrição executória deve ser o momento em que
ocorre o trânsito em julgado para o MP? Ou o início do prazo deverá ser o instante
em que se dá o trânsito em julgado para ambas as partes, ou seja, tanto para a
acusação como para a defesa?
 Posicionamento pacífico do STJ: o termo inicial da prescrição da pretensão
executória é a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a
acusação, ainda que a defesa tenha recorrido e que se esteja aguardando o
julgamento desse recurso. Aplica-se a interpretação literal do art. 112, I, do
CP, considerando que ela é mais benéfica ao condenado.

 Entendimento da 1ª Turma do STF: o início da contagem do prazo de


prescrição somente se dá quando a pretensão executória pode ser exercida.
Se o Estado não pode executar a pena, não se pode dizer que o prazo
prescricional já está correndo. Assim, mesmo que tenha havido trânsito em
julgado para a acusação, se o Estado ainda não pode executar a pena (ex: está
pendente uma apelação da defesa), não teve ainda início a contagem do
prazo para a prescrição executória. É preciso fazer uma interpretação
sistemática do art. 112, I, do CP. Vale ressaltar que, com o novo
entendimento do STF admitindo a execução provisória da pena, para essa
segunda corrente (Min. Roberto Barroso) o termo inicial da prescrição
executória será a data do julgamento do processo em 2ª instância. Isso
porque se estiver pendente apenas recurso especial ou extraordinário, será
possível a execução provisória da pena. Logo, já poderia ser iniciada a
contagem do prazo prescricional.
STF. 1ª Turma. RE 696533/SC, Rel. Min. Luiz Fux, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso,
j. 6/2/2018 (Info 890).
OBS:
Conceito de prescrição: É a perda do direito do Estado de punir (pretensão punitiva)
ou de executar uma punição já imposta (pretensão executória) em razão de não ter
agido (inércia) nos prazos previstos em lei.

Espécies: Existem duas espécies de prescrição:


I – Prescrição da pretensão punitiva, que pode ser:
I.a) prescrição da pretensão punitiva propriamente dita;
I.b) prescrição superveniente ou intercorrente;
I.c) prescrição retroativa;

II – Prescrição da pretensão executória.

Prescrição da pretensão executória (prescrição da condenação): Ocorre quando o


Estado perde o seu poder-dever de executar uma sanção penal já definitivamente
imposta pelo Poder Judiciário em razão de não ter agido nos prazos previstos em lei.

Cálculo da prescrição executória no caso de pena privativa de liberdade: A prescrição


da pretensão executória da pena privativa de liberdade é calculada com base na pena
concreta, fixada na sentença ou no acórdão que já transitou em julgado e, portanto,
não pode mais ser alterada.

Termo inicial: Como vimos, o Estado tem um prazo máximo para fazer com que o réu
condenado inicie o cumprimento da pena. Caso não o faça, ocorre a prescrição
executória.

A pergunta é: a partir de que dia começa a correr esse prazo que o Estado tem para
fazer com que o condenado inicie o cumprimento da pena? Dito de outra forma: qual
é o termo inicial do prazo da prescrição da pretensão executória? A resposta encontra-
se no art. 112, I do CP:
Termo inicial da prescrição após a sentença condenatória
irrecorrível
Art. 112. No caso do art. 110 deste Código [que trata da
prescrição executória], a prescrição começa a correr:
I - do dia em que transita em julgado a sentença
condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão
condicional da pena ou o livramento condicional;

Desse modo, segundo o art. 112, I do CP, o termo inicial da prescrição executória é a
data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação.

E se o MP não recorre, mas a defesa apresenta recurso? Nesse caso, a sentença


condenatória transitou em julgado para a acusação. Logo, segundo a redação do art.
112, I do CP, inicia-se a contagem do prazo de prescrição executória mesmo ainda
estando pendente a apreciação do recurso interposto pela defesa.

Veja o seguinte exemplo hipotético: João foi condenado a 4 anos de reclusão pelo
Tribunal de Justiça. O Ministério Público concorda com o acórdão e não recorre, razão
pela qual ocorre trânsito em julgado para a acusação no dia 18/02/2010. O advogado
do réu apresenta recurso extraordinário, de forma que, para a defesa, não houve
trânsito em julgado.

Qual é o prazo de prescrição executória quando o réu é condenado a 4 anos? A


prescrição ocorre em 8 anos (art. 109, IV, do CP). Em outras palavras, se o réu for
condenado a 4 anos, o Estado tem o poder-dever de fazer com que esse condenado
inicie o cumprimento da pena em até 8 anos. Se passar desse prazo, o Estado perde
o poder de executar a sanção e o condenado não mais terá que cumprir a pena imposta.

Em nosso exemplo, quando se iniciou a contagem do prazo de prescrição executória


(levando-se em consideração a regra do art. 112, I do CP)? No dia 18/02/2010, data em
que a sentença transitou em julgado para a acusação. Isso significa que o Estado tinha
um prazo de 8 anos para fazer com que o réu iniciasse o cumprimento da pena. Se o
réu não começou a cumprir a pena até 18/02/2018, aconteceu a prescrição. Essa é a
regra que está presente no art. 112, I do CP.

Crítica à regra do art. 112, I do CP: A CF/88 prevê que ninguém poderá ser
considerado culpado até que haja o trânsito em jugado da sentença penal condenatória
(art. 5º, LVII). Por força desse princípio, durante os anos de 2009 até 2016 prevaleceu
no STF o entendimento de que não existia no Brasil a execução provisória (antecipada)
da pena.

Assim, de 2009 até 2016 o STF entendia que, enquanto não tivesse havido trânsito em
julgado para a acusação e para a defesa, o réu não poderia ser obrigado a iniciar o
cumprimento da pena.

Se ainda estava pendente de julgamento qualquer recurso da defesa, o condenado não


podia iniciar o cumprimento da pena porque ainda era presumivelmente inocente.
Isso perdurou, como já dito, de 2009 (STF. Plenário. HC 84078, julgado em
05/02/2009) até 2016, quando o STF mudou sua jurisprudência no HC 126292/SP, Rel.
Min. Teori Zavascki, julgado em 17/2/2016.

Desse modo, perceba a seguinte situação estranha que o art. 112, I, ocasionava (entre
2009 a 2016):
 Se o réu fosse condenado, a defesa recorresse e o MP não, esse condenado não
podia iniciar o cumprimento da pena enquanto estivesse pendente o recurso;
 Apesar disso, pela redação literal do art. 112, I, do CP, já começava a correr o
prazo da prescrição executória.

Diante desse paradoxo que podia ser ocasionado pela regra do art. 112, I, do CP,
alguns doutrinadores e membros do Ministério Público idealizaram a seguinte tese:
O início do prazo da prescrição executória devia ser o momento em que ocorre o
trânsito em julgado para ambas as partes, ou seja, tanto para a acusação como para a
defesa. Não se pode dizer que o prazo prescricional começa com o trânsito em julgado
apenas para a acusação, uma vez que, se a defesa recorreu, o Estado não pode dar
início à execução da pena, já que ainda não haveria uma condenação definitiva. Se há
recurso da defesa, o Estado não inicia o cumprimento da pena não por desinteresse
dele, mas sim porque há uma vedação de ordem constitucional decorrente do
princípio da presunção de inocência. Ora, se não há desídia do Estado, não se pode
falar em prescrição. Desse modo, foi uma tese que surgiu para desconsiderar a
interpretação literal do art. 112, I, do CP.
Essa tese que desconsidera a regra do art. 112, I, do CP foi aceita pela jurisprudência?
 STJ: NÃO. Para o STJ, conforme determina o art. 112, I do CP, o termo inicial
da prescrição da pretensão executória é a data do trânsito em julgado da
sentença condenatória para a acusação, ainda que a defesa tenha recorrido e
que se esteja aguardando o julgamento desse recurso. Nesse sentido: STJ. 6ª
Turma. AgRg no RHC 74.996/PB, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em
12/09/2017.
O argumento de que se deveria aguardar o trânsito em julgado para ambas as
partes não tem previsão legal e contraria o texto do Código Penal.
Além disso, não se pode querer “corrigir” a redação do art. 112, I, do CP
invocando-se o art. 5º, LVII da CF/88, porque, nesse caso, se estaria utilizando
um dispositivo da Constituição Federal para respaldar uma “interpretação”
totalmente desfavorável ao réu e contra expressa disposição legal.
Exigir o trânsito em julgado para ambas as partes como termo inicial da
contagem do lapso da prescrição da pretensão executória, ao contrário do texto
expresso da lei, seria inaugurar novo marco interruptivo da prescrição não
previsto no rol taxativo do art. 117 do CP, situação que também afrontaria o
princípio da reserva legal.
Assim, somente com a devida alteração legislativa é que seria possível
modificar o termo inicial da prescrição da pretensão executória, e não por meio
de "adequação hermenêutica".

 Precedente da 1ª Turma do STF: SIM. A 1ª Turma do STF acolhe a tese acima


explicada e entende que o art. 112, I, do CP deve ser interpretado
sistematicamente à luz da jurisprudência que prevaleceu no STF de 2009 a
2016, segundo a qual só era possível a execução da decisão condenatória
depois do trânsito em julgado.
Assim, se não era possível a execução provisória da pena, não era razoável
considerar que o curso da prescrição da pretensão punitiva já começou a correr
pelo simples fato de a acusação não ter recorrido. Ora, não é possível
prescrever aquilo que não pode ser executado.

Veja ementa nesse sentido:


(...) 2. A partir do julgamento pelo Plenário desta Corte do HC
nº 84.078, deixou-se de se admitir a execução provisória da
pena, na pendência do RE.
3. O princípio da presunção de inocência ou da não-
culpabilidade, tal como interpretado pelo STF, deve repercutir
no marco inicial da contagem da prescrição da pretensão
executória, originariamente regulado pelo art. 112, I do
Código Penal.
4. Como consequência das premissas estabelecidas, o início da
contagem do prazo de prescrição somente se dá quando a
pretensão executória pode ser exercida. (...)
STF. 1ª Turma. HC 107710 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso,
julgado em 09/06/2015.

7.2. Inadmissibilidade da prescrição em perspectiva – (Info 831)


A prescrição em perspectiva (ou prescrição virtual) não é admitida nos crimes
militares, assim como ocorre também nos crimes comuns.
STF. 2ª Turma. HC 125777/CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 21/6/16 (Info 831).
OBS:
O que é a chamada prescrição virtual? Ocorre quando o juiz, verificando que já se
passaram muitos anos desde o dia em que o prazo prescricional começou ou voltou a
correr, entende que mesmo que o inquérito ou processo continue, ele não terá
utilidade porque muito provavelmente haverá a prescrição pela pena em concreto.
Para isso, o juiz analisa a possível pena que aplicaria para o réu se ele fosse condenado
e, a partir daí, examina se, entre os marcos interruptivos presentes no processo, já se
passaram mais anos do que o permitido pela lei.

Sinônimos: A prescrição virtual é também chamada de prescrição “em perspectiva”,


“por prognose”, “projetada” ou “antecipada”.

A prescrição virtual possui previsão na lei? NÃO. Apesar de ser comum na prática, a
prescrição virtual não tem previsão na lei, sendo considerada uma “criação” dos juízes
e Tribunais.

A prescrição virtual é admitida pelo STF e pelo STJ? NÃO. O STF e o STJ afirmam que
é inadmissível a prescrição virtual por dois motivos principais:
 em virtude da ausência de previsão legal;
 porque representaria uma afronta ao princípio da presunção de não-
culpabilidade.

7.3. Redução do prazo prescricional para condenados maiores de 70 anos e


momento de sua aferição – (Info 822) – IMPORTANTE! Cuidado com alguns livros!

Para que incida a redução do prazo prescricional prevista no art. 115 do CP, é
necessário que, no momento da sentença, o condenado possua mais de 70 anos. Se
ele só completou a idade após a sentença, não terá direito ao benefício, mesmo que
isso tenha ocorrido antes do julgamento de apelação interposta contra a sentença.
Existe, no entanto, uma situação em que o condenado será beneficiado pela redução
do art. 115 do CP mesmo tendo completado 70 anos após a sentença: isso ocorre
quando o condenado opõe embargos de declaração contra o acórdão condenatório
e esses embargos são conhecidos. Nesse caso, o prazo prescricional será reduzido
pela metade se o réu completar 70 anos até a data do julgamento dos embargos.
Nesse sentido: STF. Plenário. AP 516 ED/DF, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o
acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 5/12/2013 (Info 731).
STF. 2ª Turma. HC 129696/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/4/2016 (Info
822).
OBS:
Redução do prazo prescricional para condenados maiores de 70 anos: O art. 115 do
CP preconiza:

Art. 115. São reduzidos de metade os prazos de prescrição


quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21
(vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70
(setenta) anos.
Situação 1. Imagine o seguinte exemplo hipotético: João, com 69 anos, foi condenado,
em 1ª instância, no dia 02/02/2010. O condenado interpôs apelação. O TJ julgou a
apelação em 03/03/2014 e manteve, na íntegra, a sentença. Nesta data, ele já tinha 73
anos.

O réu terá direito ao art. 115 do CP? NÃO. Isso porque, na data da sentença, ele tinha
menos de 70 anos.

Este é também o entendimento do STJ:

(...) A Terceira Seção desta Corte, no julgamento dos


Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 749.912/PR,
pacificou o entendimento de que o benefício previsto no artigo
115 do Código Penal não se aplica ao réu que completou 70
anos de idade após a data da primeira decisão condenatória
(...)
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 332.735/RJ, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, julgado em 16/02/2016.

Situação 2. Imagine agora o exemplo um pouco diferente: João, com 69 anos, foi
condenado, em 1ª instância, no dia 02/02/2010. O condenado opôs embargos de
declaração. O juiz conheceu dos embargos, mas os julgou improvidos em 05/05/2010,
mantendo a sentença. Nesta data, o condenado já tinha mais de 70 anos.

O réu terá direito ao art. 115 do CP? SIM. O STF admite a redução do prazo
prescricional pela metade quando o réu completa 70 anos após a sentença
condenatória, mas antes de terem sido julgados os embargos de declaração opostos
contra a decisão (se conhecidos). Isso porque se entende que a decisão dos embargos
integra a sentença.

7.4. Não se admite a denominada prescrição em perspectiva – (Info 788)

A prescrição virtual ocorre quando o juiz, verificando que já se passaram muitos


anos desde o dia em que o prazo prescricional começou ou voltou a correr, entende
que mesmo que o inquérito ou processo continue, ele não terá utilidade porque
muito provavelmente haverá a prescrição pela pena em concreto.
Para isso, o juiz analisa a possível pena que aplicaria para o réu se ele fosse
condenado e, a partir daí, examina se, entre os marcos interruptivos presentes no
processo, já se passaram mais anos do que o permitido pela lei.
A prescrição virtual é também chamada de prescrição “em perspectiva”, “por
prognose”, “projetada” ou “antecipada”.
O STF e o STJ afirmam que é inadmissível a prescrição virtual por dois motivos
principais:
a) em virtude da ausência de previsão legal;
b) porque representaria uma afronta ao princípio da presunção de não-
culpabilidade.
O STJ tem, inclusive, um enunciado proibindo expressamente a prática (Súmula
438-STJ).
STF. 1ª Turma. Inq 3574 AgR/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 2/6/2015
(Info 788).
7.5. A publicação do acórdão condenatório para fins de prescrição ocorre no dia da
sessão de julgamento – (Info 776) – IMPORTANTE!!!

A prescrição da pretensão punitiva do Estado, em segundo grau de jurisdição, se


interrompe na data da sessão de julgamento do recurso e não na data da publicação
do acórdão.
Para efeito de configuração do marco interruptivo do prazo prescricional a que se
refere o art. 117, IV, do CP, considera-se como publicado o “acórdão condenatório
recorrível” na data da sessão pública de julgamento, e não na data de sua veiculação
no Diário da Justiça ou em meio de comunicação congênere.
A publicação do acórdão nos veículos de comunicação oficial deflagra o prazo
recursal, mas não influencia na contagem do prazo da prescrição.
STF. 1ª Turma. RHC 125078/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 3/3/2015 (Info
776).

7.6. O § 1º do art. 110 do CP, alterado pela Lei 12.234/2010, é constitucional – (Info
771) – IMPORTANTE!!!

A Lei 12.234/2010 alterou o § 1º do art. 110 do CP, acabando, parcialmente, com a


prescrição retroativa.
Atualmente, não mais existe prescrição retroativa com relação ao período
compreendido entre a data do fato e o recebimento da denúncia (ou queixa). No
entanto, ainda pode ocorrer a prescrição retroativa na fase processual, ou seja, após
o recebimento da denúncia ou queixa.
Surgiu uma tese sustentando que a alteração promovida pela Lei 12.234/2010 seria
inconstitucional em virtude de praticamente ter eliminado as possibilidades de se
reconhecer a prescrição retroativa, o que violaria diversos princípios
constitucionais.
O STF não concordou com a tese e decidiu que o § 1º do art. 110 do CP, com redação
dada pela Lei 12.234/2010, é CONSTITUCIONAL.
O sistema de justiça criminal no Brasil ainda é pouco eficiente e a taxa de
esclarecimento de crimes é baixa, não se conseguindo investigar, com eficiência,
todos os delitos praticados.
Diante disso, o legislador optou por não mais prestigiar um sistema de prescrição
da pretensão punitiva retroativa que culminava por esvaziar a efetividade da tutela
jurisdicional penal. Vale ressaltar que a chamada prescrição retroativa é uma
peculiaridade existente somente na lei brasileira, não havendo similar no direito
comparado. Isso demonstra que a definição sobre as espécies de prescrição é
questão de política criminal, ficando a cargo do legislador.
STF. Plenário. HC 122694/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 10/12/14 (Info 771).

7.7. Durante a suspensão condicional da pena não corre prazo o prescricional –


(Info 744)

Durante a suspensão condicional da pena (art. 77 do CP), não corre o prazo


prescricional.
STF. 2ª Turma. Ext 1254/Romênia, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 29/4/2014
(Info 744)
OBS: Ao analisar um pedido de extradição, o STF confirmou que a conclusão (pacífica)
de que durante a suspensão condicional da pena (art. 77 do CP), não corre prazo o
prescricional. Segundo o art. 112, I, do CP, a prescrição somente começa a correr do
dia em que for revogada a suspensão condicional da pena (sursis).

8. FIXAÇÃO DO REGIME PRISIONAL


8.1. Imposição do regime semiaberto para réu reincidente, condenado a 1 ano e 4
meses de reclusão pelo furto de uma garrafa de licor – (Info 910)

João, reincidente, foi condenado a uma pena de 1 ano e 4 meses de reclusão, em


regime inicial fechado, pela prática do crime de furto simples (art. 155, caput, do
CP).
A defesa postulou a aplicação do regime aberto com base no princípio da
insignificância, considerado o objeto furtado ter sido apenas uma garrafa de licor.
O STF decidiu impor o regime semiaberto.
Entendeu-se que, de um lado, o regime fechado deve ser afastado. Por outro, não se
pode conferir o regime aberto para um condenado reincidente, uma vez que isso
poderia se tornar um incentivo à criminalidade, ainda mais em cidades menores,
onde o furto é, via de regra, perpetrado no mesmo estabelecimento.
A reincidência delitiva do paciente, que praticou o quinto furto em pequeno
município, eleva a gravidade subjetiva de sua conduta.
STF. 1ª Turma. HC 136385/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre
de Moraes, j. 7/8/2018 (Info 910).

8.2. Fixada a pena-base no mínimo legal, não é possível a imposição de regime


inicial mais severo do que aquele abstratamente imposto – (Info 881)

Se todas as circunstâncias judiciais são favoráveis, de forma que a pena-base foi


fixada no mínimo legal, então, neste caso, não cabe a imposição de regime inicial
mais gravoso.
STF. 2ª Turma. RHC 131133/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 10/10/2017 (Info 844).
Obs: o STJ possui um enunciado nesse sentido:
Súmula 440-STJ: Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de
regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com
base apenas na gravidade abstrata do delito.

8.3. Fixada a pena-base no mínimo legal, não é possível a imposição de regime


inicial mais severo do que aquele abstratamente imposto – (Info 844)

Se a pena-base foi fixada no mínimo legal (circunstâncias judiciais favoráveis), o


juiz deverá estabelecer o regime inicial semiaberto para o condenado a pena
superior a 4 e que não exceda a 8 anos.
Aplica-se ao caso a Súmula 440 do STJ: Fixada a pena-base no mínimo legal, é
vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em
razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito.
STF. 2ª Turma. RHC 135298/SP, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac.
Min. Teori Zavascki, j. 18/10/16 (Info 844).
OBS:
Fixação do regime inicial: O juiz, ao prolatar a sentença condenatória, deverá fixar o
regime no qual o condenado iniciará o cumprimento da pena privativa de liberdade.
A isso se dá o nome de fixação do regime inicial. Os critérios para essa fixação estão
previstos no art. 33 do Código Penal.

O que o juiz deve observar na fixação do regime inicial? O juiz, quando vai fixar o
regime inicial do cumprimento da pena privativa de liberdade, deve observar quatro
fatores:
1) o tipo de pena aplicada: se reclusão ou detenção;
2) o quantum da pena definitiva;
3) se o condenado é reincidente ou não;
4) as circunstâncias judiciais (art. 59 do CP).

Imagine a seguinte situação hipotética: João foi condenado a 5 anos e 4 meses de


reclusão pela prática do crime previsto no art. 157, § 2º, I e II, do CP.

Na dosimetria, o juiz fixou a pena-base no mínimo legal. Apesar disso, estabeleceu o


regime inicial fechado. Agiu corretamente o magistrado? NÃO. Se o réu não
reincidente foi punido com pena de reclusão maior que 4 e menor que 8 anos, o CP
prevê que, em regra, deverá ser imposto a ele o regime inicial semiaberto. Confira:

Art. 33 (...) § 2º As penas privativas de liberdade deverão ser


executadas em forma progressiva, segundo o mérito do
condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as
hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:
a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar
a cumpri-la em regime fechado;
b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4
(quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o
princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;

É possível que seja imposto ao condenado primário um regime inicial mais rigoroso
do que o previsto para a quantidade de pena aplicada? Ex.: se uma pessoa pode ser
condenada a 6 anos de reclusão e o juiz fixar o regime inicial fechado? SIM, é possível,
desde que o juiz apresente motivação idônea na sentença.

Súmula 719-STF: A imposição do regime de cumprimento


mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação
idônea.

O juiz pode fundamentar a imposição do regime mais severo devido ao fato do crime
praticado ser, abstratamente, um delito grave? Ex.: o juiz afirma que, em sua opinião,
no caso de tráfico de drogas o regime deve ser o fechado em razão da gravidade desse
delito. NÃO. A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime NÃO
constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o
permitido segundo a pena aplicada (Súmula 718-STF).

O que é considerado, então, motivação idônea para impor ao condenado regime mais
gravoso? Exige-se que o juiz aponte circunstâncias que demonstrem que o fato
criminoso, concretamente, foi grave. Se as circunstâncias judiciais do art. 59 forem
desfavoráveis, é possível que o juiz se fundamente nesses dados para impor ao
condenado regime inicial mais gravoso que o previsto para a quantidade de pena
aplicada. Nesse sentido:

(...) Se as penas-base de ambos os crimes são fixadas acima do


mínimo legal em face da valoração negativa das
circunstâncias do art. 59 do Código Penal, não há ilegalidade
na imposição de regime inicial mais gravoso do que o
abstratamente previsto de acordo com a quantidade de pena
aplicada. (...)
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1471969/RN, Rel. Min. Jorge
Mussi, j. 20/11/14)

Se a pena privativa de liberdade foi fixada no mínimo legal, é possível a fixação de


regime inicial mais severo do que o previsto pela quantidade de pena? Ex.: Paulo, réu
primário, foi condenado a uma pena de seis anos de reclusão. As circunstâncias
judiciais foram favoráveis. Pode o juiz fixar o regime inicial fechado? NÃO. A
posição que prevalece no STJ é a de que, fixada a pena-base no mínimo legal e sendo
o acusado primário e sem antecedentes criminais não se justifica a fixação do regime
prisional mais gravoso. STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 303.275/SP, Rel. Min. Jorge Mussi,
j. 03/02/15.

O STJ possui um enunciado no mesmo sentido:


Súmula 440-STJ: Fixada a pena-base no mínimo legal, é
vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso
do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas
na gravidade abstrata do delito.

Esse é também o entendimento do STF:

Habeas corpus. Penal. Processual penal. Roubo. Artigo 33, §


2º, do CP. Imposição de regime inicial de cumprimento de pena
mais gravoso. Possibilidade, desde que seja a decisão devida
e concretamente fundamentada. Circunstâncias judiciais
reconhecidamente favoráveis. Pena-base fixada no mínimo
legal. Ausência de fundamentação apta ao agravamento do
regime prisional. Habeas corpus deferido.
(...)
3. A Corte tem entendido que a fixação de regime mais severo
do que aquele abstratamente imposto pelo art. 33, § 2º, do CP
não se admite senão em virtude de razões concretamente
demonstradas nos autos.
4. Ausência, no caso concreto, de fundamentação válida, nas
razões de convencimento, para a fixação do cumprimento da
pena em regime inicialmente fechado.
STF. 1ª Turma. HC 118.230, Rel. Min. Dias Toffoli, j.
08/10/2013.

8.4. Fixação de regime inicial de cumprimento de pena e circunstâncias judiciais –


(Info 775)
Se a pena-base é fixada acima do mínimo legal em virtude de as circunstâncias
judiciais do art. 59 do CP serem desfavoráveis, é possível que o juiz determine
regime inicial mais gravoso do que o abstratamente previsto de acordo com a
quantidade de pena aplicada.
Ex.: Paulo, réu primário, foi condenado a uma pena de 2 anos e 6 meses de detenção.
Em regra, o regime inicial seria o aberto (art. 33, § 2º, “c”, do CP). Ocorre que duas
circunstâncias judiciais foram desfavoráveis a ele, conforme fundamentação do
juiz (circunstâncias e consequências do crime). Nesse caso, o magistrado,
fundamentando sua decisão nesses dados, pode impor ao condenado o regime
inicial semiaberto.
STF. 2ª Turma. HC 124876/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 24/2/15 (Info 775).

8.5. Regime inicial de cumprimento de pena para o condenado por crime hediondo
ou equiparado

Qual é o regime inicial de cumprimento de pena do réu que for condenado por
crime hediondo ou equiparado?
O regime inicial nas condenações por crimes hediondos ou equiparados (como é o
caso do tráfico de drogas) não tem que ser obrigatoriamente o fechado, podendo
ser também o regime semiaberto ou aberto, desde que presentes os requisitos do
art. 33, § 2º, alíneas “b” e “c”, do Código Penal.
STF. Plenário. HC 111840/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 27/6/2012.
STJ. 3ª Seção. EREsp 1.285.631-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, j. 24/10/2012.

9. CRIME DE HOMICÍDIO
9.1. Dirigir alcoolizado na contramão: reconhecimento de dolo eventual – (Info 904)

Verifica-se a existência de dolo eventual no ato de dirigir veículo automotor sob a


influência de álcool, além de fazê-lo na contramão. Esse é, portanto, um caso
específico que evidencia a diferença entre a culpa consciente e o dolo eventual. O
condutor assumiu o risco ou, no mínimo, não se preocupou com o risco de,
eventualmente, causar lesões ou mesmo a morte de outrem.
STF. 1ª Turma. HC 124687/MS, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto
Barroso, j. 29/5/2018 (Info 904).
OBS:
A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: João, na direção de veículo
automotor, entrou na contramão e atingiu uma motocicleta, causando a morte do
condutor. Não foi feito teste de etilômetro (“bafômetro”) em João, mas as testemunhas
afirmaram que ele exalava hálito etílico e que estava cambaleante. João foi
pronunciado e condenado a 6 anos de reclusão em regime inicial semiaberto por
homicídio doloso simples (dolo eventual). O condenado impetrou sucessivos habeas
corpus até que a questão chegou ao STF. No writ, João pede a desclassificação do delito
para homicídio culposo na condução de veículo automotor, crime previsto no art. 302
do CTB.

O pedido foi acolhido pelo STF? NÃO. O STF entende que, em casos de homicídio
causado por motorista embriagado, se o Tribunal do Júri entender que houve dolo
eventual, não cabe ao Supremo alterar esta tipificação, sendo uma decisão legítima
do júri popular.
Vale ressaltar, no entanto, que o simples fato do condutor do veículo estar
embriagado não gera a presunção de que tenha havido dolo eventual:
A embriaguez do agente condutor do automóvel, por si só,
não pode servir de premissa bastante para a afirmação do dolo
eventual em acidente de trânsito com resultado morte.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.689.173-SC, Rel. Min. Rogério Schietti
Cruz, julgado em 21/11/2017 (Info 623).

Dessa forma, haverá assunção do risco – apta a caracterizar o dolo eventual –, "quando
o agente tenha tomado como séria a possibilidade de lesar ou colocar em perigo o bem
jurídico e não se importa com isso, demonstrando, pois, que o resultado lhe era
indiferente”( TAVARES, Juarez apud PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal
Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 332).

Assim, diante da existência de elementos concretos delineados no caso concreto –


embriaguez ao volante, excesso de velocidade (120 km/h) e direção perigosa
(ultrapassagens em movimentos de zigue-zague) –, entende-se haver o mínimo de
evidências acerca do possível dolo eventual do réu, isto porque, em tese, demonstrou
ao que tudo indica, sua indiferença com a vida e com a integridade física alheia.

Nesse sentido:
STJ. 6ª Turma. AgRg-AREsp 1.226.580-DF, Rel. Min. Rogério
Schietti Cruz, julgado em 05/06/2018.
STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 965.57-/RS, Rel. Ministro
Jorge Mussi, julgado em 19/5/2017.

9.2. Entrega de veículo automotor a pessoa embriagada e inexistência de homicídio


doloso – (Info 812)

Se houver incorreto enquadramento fático-jurídico na capitulação penal, que


repercuta na competência do órgão jurisdicional, admite-se, excepcionalmente, a
possibilidade de o magistrado, antes da pronúncia e submissão do réu ao júri
popular, efetuar a desclassificação para outro tipo penal e encaminhar o feito ao
órgão competente.
No caso, o STF considerou que não havia homicídio doloso na conduta de um
homem que entregou o seu carro a uma mulher embriagada para que esta dirigisse
o veículo, tendo havido acidente por conta do excesso de velocidade e da
embriaguez, resultando na morte da mulher (condutora).
STF. 2ª Turma. HC 113598/PE, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 15/12/2015 (Info 812).

9.3. Dolo eventual não é compatível com qualificadora de traição, emboscada,


dissimulação (art. 121, §2º, IV do CP) – (Info 677)

O dolo eventual não se compatibiliza com a qualificadora do art. 121, § 2º, IV


(traição, emboscada, dissimulação).
STF. 2ª Turma. HC 111.442/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 28/8/2012 (Info 677).
OBS:
No caso julgado pela 2ª Turma, o réu foi denunciado pela suposta prática do crime de
homicídio qualificado pela surpresa (art. 121, § 2º, IV, CP), e embriaguez ao volante
(art. 306 do Código de Trânsito) porque, ao conduzir veículo em alta velocidade e em
estado de embriaguez, ultrapassara sinal vermelho e colidira com outro carro, cujo
condutor viera a falecer.

A 2ª Turma considerou que, em se tratando de crime de trânsito, cujo elemento


subjetivo teria sido classificado como dolo eventual, não se poderia, ao menos na
hipótese sob análise, concluir que tivesse o paciente deliberadamente agido de
surpresa, de maneira a dificultar ou impossibilitar a defesa da vítima.

Assim, a 2ª Turma aplicou o entendimento prevalecente no sentido de que o dolo


eventual é incompatível com a qualificadora prevista no inciso IV do § 2º do art. 121
do CP (traição, emboscada, dissimulação).

Por que o dolo eventual é incompatível com a qualificadora da surpresa? Para que
incida a qualificadora da surpresa é indispensável que fique provado que o agente
teve a vontade de surpreender a vítima, impedindo ou dificultando que ela se
defendesse. Ora, no caso do dolo eventual, o agente não tem essa intenção,
considerando que não quer matar a vítima, mas apenas assume o risco de produzir
esse resultado. Como o agente não deseja a produção do resultado, ele não direcionou
sua vontade para causar surpresa à vítima. Logo, não pode responder por essa
circunstância (surpresa).

10. CRIME DE ABORTO


10.1. Interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação – (Info 849) –
IMPORTANTE!!! – (Advogado/BANPARÁ-2017) (Analista em Previdência/RO-2017)

A interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação provocada pela


própria gestante (art. 124) ou com o seu consentimento (art. 126) não é crime.
É preciso conferir interpretação conforme a Constituição aos arts. 124 a 126 do
Código Penal – que tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de
incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre.
A criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da mulher,
bem como o princípio da proporcionalidade.
STF. 1ª Turma. HC 124306/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min.
Roberto Barroso, j. 29/11/16 (Info 849).
(Advogado/BANPARÁ-2017): Acerca do aborto, o STF, em recente julgado de sua
1ª Turma, afirmou ser necessário conferir interpretação conforme a Constituição
aos arts. 124 a 126 do Código Penal (que tipificam o crime de aborto) para excluir
do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no
primeiro trimestre do período gestacional. BL: Info 849, STF.

(Analista em Previdência/RO-2017-IBADE): Acerca da decisão do STF sobre a


interrupção da gravidez de feto anencefálico, assinale a alternativa correta:
Tencionava-se fosse dada a dispositivos do Código Penal uma interpretação
conforme a Constituição e o instrumento escolhido para sua propositura foi a
arguição de descumprimento de preceito fundamental.

OBS: ADPF 54: A Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde do Brasil


ingressou com uma ação de arguição de descumprimento de preceito
fundamental no Supremo Tribunal Federal (ADPF n.º 54) pedindo que a Corte
Constitucional conferisse ao Código Penal uma interpretação conforme a
Constituição e declarasse que o aborto de fetos anencéfalos não é crime.
(...)
A cirurgia de retirada de um feto anencéfalo é considerada aborto? NÃO. Sete
Ministros que participaram do julgamento consideraram que não se trata de
aborto porque não há a possibilidade de vida do feto fora do útero. O Min. Gilmar
Mendes votou pela descriminalização da prática, mas considerou que tal prática
configura sim aborto. Segundo o Min. Mendes, o aborto de feto anencéfalo pode
ser enquadrado no inciso II do art. 128 do CP, que afirma que não se pune o aborto
praticado por médico se não há outro meio de salvar a vida da gestante.

OBS:
Exceções em que o aborto não é crime: O Código Penal, em seu art. 128, traz duas
hipóteses em que o aborto é permitido:
 1ª) se não há outro meio de salvar a vida da gestante. É o chamado aborto
“necessário” ou “terapêutico”, previsto no inciso I.
 2ª) no caso de gravidez resultante de estupro. Trata-se do aborto
“humanitário”, “sentimental”, “ético” ou “piedoso”, elencado no inciso II.
Segundo o texto expresso do CP, essas são as duas únicas hipóteses em que o
aborto é permitido no Brasil.
 3ª) Interrupção da gravidez de feto anencéfalo: O STF, no julgamento da ADPF
54/DF, criou uma nova exceção e decidiu que a interrupção da gravidez de
feto anencéfalo é conduta atípica (Plenário. ADPF 54/DF, rel. Min. Marco
Aurélio, 11 e 12/4/2012). Assim, por força de interpretação jurisprudencial,
realizar aborto de feto anencéfalo também não é crime.
 4ª) Interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação: A 1ª Turma do
STF, no julgamento do HC 124306, mencionou a possibilidade de se admitir
uma quarta exceção: a interrupção da gravidez no primeiro trimestre da
gestação provocado pela própria gestante (art. 124) ou com o seu
consentimento (art. 126) também não seria crime (HC 124306/RJ, rel. orig. Min.
Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 29/11/2016.
Info 849).

Vamos entender o julgado veiculado no Info 849.

INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ NO PRIMEIRO TRIMESTRE DA GESTAÇÃO


Requisitos para que a tipificação de uma conduta seja compatível com a
Constituição: Segundo o Min. Roberto Barroso, para ser compatível com a
Constituição, a criminalização de uma conduta exige o preenchimento de três
requisitos:
a) este tipo penal deverá proteger um bem jurídico relevante;
b) o comportamento incriminado não pode constituir exercício legítimo de um direito
fundamental; e
c) deverá haver proporcionalidade entre a ação praticada e a reação estatal.

Em outras palavras, se determinada conduta for prevista como crime, mas não atender
a algum desses três requisitos, este tipo penal deverá ser considerado inconstitucional.
Verifique abaixo os argumentos invocados pelo Min. Relator Roberto Barroso:

VIOLAÇÃO A DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS MULHERES


Violação à autonomia da mulher: A criminalização viola, em primeiro lugar, a
autonomia da mulher, que corresponde ao núcleo essencial da liberdade individual,
protegida pelo princípio da dignidade humana (art. 1º, III, da CF/88). Autonomia
significa a autodeterminação das pessoas (o direito de elas fazerem suas escolhas
existenciais básicas e de tomarem as próprias decisões morais sobre o rumo de sua
vida). Quando se trata de uma mulher, um aspecto central de sua autonomia é o poder
de controlar o próprio corpo e de tomar as decisões a ele relacionadas, inclusive a de
cessar ou não uma gravidez.

Violação do direito à integridade física e psíquica: Em segundo lugar, a


criminalização do aborto afeta a integridade física e psíquica da mulher. A integridade
física é abalada porque é o corpo da mulher que sofrerá as transformações, riscos e
consequências da gestação. Aquilo que pode ser uma bênção quando se cuide de uma
gravidez desejada, transmuda-se em tormento quando indesejada. A integridade
psíquica, por sua vez, é afetada pelo fato de ela estar sendo obrigada a assumir uma
obrigação para toda a vida, exigindo renúncia, dedicação e comprometimento
profundo com outro ser. Também aqui, o que seria uma bênção se decorresse de
vontade própria, pode se transformar em provação quando decorra de uma imposição
heterônoma. Ter um filho por determinação do direito penal constitui grave violação
à integridade física e psíquica da mulher.

Violação aos direitos sexuais e reprodutivos da mulher: A criminalização viola,


também, os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, que incluem o direito de toda
mulher de decidir sobre se e quando deseja ter filhos, sem discriminação, coerção e
violência, bem como de obter o maior grau possível de saúde sexual e reprodutiva. O
reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres como direitos
humanos percorreu uma longa trajetória, que teve como momentos decisivos a
Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (CIPD), realizada em
1994, conhecida como Conferência do Cairo, e a IV Conferência Mundial sobre a
Mulher, realizada em 1995, em Pequim. A partir desses marcos, vem se
desenvolvendo a ideia de liberdade sexual feminina em sentido positivo e
emancipatório. A criminalização do aborto afeta a capacidade de autodeterminação
reprodutiva da mulher, ao retirar dela a possibilidade de decidir, sem coerção, sobre
a maternidade, sendo obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada.

Violação à igualdade de gênero: A punição do aborto traduz-se, ainda, em quebra da


igualdade de gênero. Na medida em que é a mulher que suporta o ônus integral da
gravidez, e que o homem não engravida, somente haverá igualdade plena se a ela for
reconhecido o direito de decidir acerca da sua manutenção ou não. "Se os homens
engravidassem, não tenho dúvida em dizer que seguramente o aborto seria
descriminalizado de ponta a ponta" (Min. Ayres Britto, na ADPF 54-MC, j. 20.10.2004).

Discriminação social e impacto desproporcional sobre mulheres pobres: A tipificação


penal do aborto produz também discriminação social, já que prejudica, de forma
desproporcional, as mulheres pobres, que não têm acesso a médicos e clínicas
particulares, nem podem se valer do sistema público de saúde para realizar o
procedimento abortivo. Por meio da criminalização, o Estado retira da mulher a
possibilidade de submissão a um procedimento médico seguro. Não raro, mulheres
pobres precisam recorrer a clínicas clandestinas sem qualquer infraestrutura médica
ou a procedimentos precários e primitivos, que lhes oferecem elevados riscos de
lesões, mutilações e óbito.

Em suma: A criminalização da interrupção da gestação no primeiro trimestre vulnera


o núcleo essencial de um conjunto de direitos fundamentais da mulher. Trata-se,
portanto, de restrição que ultrapassa os limites constitucionalmente aceitáveis.

VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE


Funções do princípio da proporcionalidade nos crimes e penas: O legislador, ao definir
crimes e penas, deverá fazê-lo levando em consideração dois valores essenciais:
 o respeito aos direitos fundamentais dos acusados;
 a necessidade de garantir a proteção da sociedade, cabendo-lhe resguardar
valores, bens e direitos fundamentais dos indivíduos.
Assim, o princípio da razoabilidade-proporcionalidade funciona com uma dupla
dimensão, tendo por objetivo proibir os excessos e também a insuficiência.

Divisão do princípio da proporcionalidade: O princípio da proporcionalidade divide-


se em três subprincípios:
a) subprincípio da ADEQUAÇÃO: no qual deve ser analisado se a medida adotada é
idônea (capaz) para atingir o objetivo almejado;
b) subprincípio da NECESSIDADE: consiste na análise se a medida empregada é ou
não excessiva; e
c) subprincípio da PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO: representa a
análise do custo-benefício da providência pretendida, para se determinar se o que se
ganha é mais valioso do que aquilo que se perde.

Subprincípio da adequação: Aqui, deve-se analisar se os tipos penais previstos nos


arts. 124 e 126 do CP protegem realmente o feto. A medida adotada (punir o aborto
consensual) é idônea para proteger o feto? O STF entendeu que não. De acordo com
estudos da OMS a criminalização não produz impacto relevante sobre o número de
abortos. As taxas de aborto nos países onde esse procedimento é permitido são muito
semelhantes àquelas encontradas nos países em que ele é ilegal. Atualmente, existem
medicamentos que são facilmente encontrados e que a mulher, ao usá-los, consegue
interromper a gravidez sem que o Poder Público tenha meios para tomar
conhecimento e impedir a sua realização. Assim, a criminalização não gera uma
diminuição na quantidade de abortos. Eles continuam sendo realizados
constantemente, de forma clandestina e perigosa para a saúde da mulher. Por outro
lado, se não houvesse a punição haveria a possibilidade de estes procedimentos serem
realizados de forma segura e sem tantos riscos. Na prática, portanto, a criminalização
do aborto é ineficaz para proteger o direito à vida do feto. Do ponto de vista penal, ela
constitui apenas uma reprovação “simbólica” da conduta.

Subprincípio da necessidade: Aqui, a pergunta a ser analisada e respondida é a


seguinte: existe meio alternativo à criminalização que proteja igualmente o direito à
vida do nascituro, mas que produza menor restrição aos direitos das mulheres? O Min.
Barroso defendeu que sim. Há instrumentos que são eficazes à proteção dos direitos
do feto e, simultaneamente, menos lesivos aos direitos da mulher. Uma política
alternativa à criminalização implementada com sucesso em diversos países
desenvolvidos do mundo é a descriminalização do aborto em seu estágio inicial (em
regra, no primeiro trimestre), desde que se cumpram alguns requisitos
procedimentais que permitam que a gestante tome uma decisão refletida. É assim na
Alemanha, em que a grávida que pretenda abortar deve se submeter a uma consulta
de aconselhamento e a um período de reflexão prévia de três dias. Procedimentos
semelhantes também são previstos em Portugal, na França e na Bélgica. Além disso, o
Estado deve atuar sobre os fatores econômicos e sociais que dão causa à gravidez
indesejada ou que pressionam as mulheres a abortar. As duas razões mais comumente
invocadas para o aborto são a impossibilidade de custear a criação dos filhos e a
drástica mudança na vida da mãe (que a faria, p. ex., perder oportunidades de
carreira). Nessas situações, é importante a existência de uma rede de apoio à grávida
e à sua família, como o acesso à creche e o direito à assistência social. Além disso,
muitas gestações não programadas são causadas pela falta de informação e de acesso
a métodos contraceptivos. Isso pode ser revertido, por exemplo, com programas de
planejamento familiar, com a distribuição gratuita de anticoncepcionais e assistência
especializada à gestante e educação sexual. Logo, a criminalização do aborto também
não é aprovada no teste relacionado com o subprincípio da necessidade.

Subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito: As restrições aos direitos


fundamentais das mulheres decorrentes da criminalização são ou não compensadas
pela proteção à vida do feto? O fato de as mulheres serem privadas do direito de
abortar gera uma maior proteção ao feto? O STF entendeu que não. Conforme
demonstrado, a tipificação penal do aborto produz um grau elevado de restrição a
direitos fundamentais das mulheres. Por outro lado, a criminalização do aborto
promove um grau reduzido (se algum) de proteção dos direitos do feto, uma vez que
não tem sido capaz de reduzir o índice de abortos. Dessa forma, não há
proporcionalidade em sentido estrito em se manter a punição do aborto consentido
nos três primeiros meses da gravidez. Praticamente nenhum país democrático e
desenvolvido do mundo trata a interrupção da gestação durante a fase inicial da
gestação como crime, aí incluídos Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Canadá,
França, Itália, Espanha, Portugal, Holanda e Austrália.

Primeiro trimestre da gravidez: Ressalta-se que, pela decisão do STF, só não será
punido o aborto consentido (realizado pela mulher ou por terceiro com sua
concordância) e desde que feito nos três primeiros meses da gravidez. Se for realizado
após o primeiro trimestre, continua sendo crime.

Por que este critério de três meses? Existe uma intensa e polêmica discussão sobre
quando se inicia a vida e qual é o status jurídico do embrião durante a fase inicial da
gestação. Dentre outras, há duas posições principais e antagônicas em relação a isso:
1ª) de um lado, os que sustentam que existe vida desde a concepção, desde que o
espermatozoide fecundou o óvulo, dando origem à multiplicação das células.
2ª) de outro lado, estão os que sustentam que antes da formação do sistema nervoso
central e da presença de rudimentos de consciência (o que geralmente se dá após o
terceiro mês da gestação) não é possível ainda falar-se em vida em sentido pleno.

ESCLARECIMENTOS SOBRE OS EFEITOS DA DECISÃO COMENTADA: Tão logo


esta decisão foi proferida, surgiram várias notícias na imprensa no sentido de que o
STF teria descriminalizado o aborto realizado nos três primeiros meses de gravidez.
Esta afirmação não é tecnicamente correta. No caso concreto, o STF analisava um
habeas corpus impetrado por dois médicos que foram presos em flagrante no
momento em que supostamente estariam realizando um aborto com o consentimento
da gestante (art. 126 do CP). No HC impetrado, os pacientes buscavam a liberdade
provisória. O Min. Barroso, ao analisar o writ, entendeu que não estavam presentes os
pressupostos da prisão preventiva. Um desses pressupostos é a existência de crime, o
que é exigido na parte final do art. 312 do CPP:
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como
garantia da ordem pública, da ordem econômica, por
conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a
aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do
crime e indício suficiente de autoria.

Segundo o Ministro, não havia motivo para a prisão preventiva, considerando o fato
de que a gravidez da mulher estava ainda no primeiro trimestre, razão pela qual a
punição prevista nos arts. 124 e 126 do CP não seria compatível com a CF/88, ou seja,
não teria sido recepcionada pela atual Carta Magna. Por conta disso, o Ministro
concedeu a ordem de habeas corpus para afastar a prisão preventiva dos pacientes,
concedendo-lhes liberdade provisória.

É importante, no entanto, pontuar três observações:


1) Esta decisão foi tomada pela 1ª Turma do STF (não se sabe como o Plenário
decidiria);
2) A discussão sobre a criminalização ou não do aborto nos três primeiros meses da
gestação foi apenas para se analisar se seria cabível ou não a manutenção da prisão
preventiva;
3) O mérito da imputação feita contra os réus ainda não foi julgado e o STF não
determinou o "trancamento" da ação penal. O habeas corpus foi concedido apenas
para que fosse afastada a prisão preventiva dos acusados.

Atenção: Obviamente, esta decisão representa um indicativo muito claro do que o STF
poderá decidir caso seja provocado de forma específica sobre o tema, tendo o Min.
Roberto Barroso proferido um substancioso voto que foi acompanhado pelos
Ministros Edson Fachin e Rosa Weber. Os demais Ministros da 1ª Turma (Marco
Aurélio e Luiz Fux) não se comprometeram expressamente com a tese da
descriminalização e discutiram apenas a legalidade da prisão preventiva. Dessa
forma, existem três votos a favor da tese, não se podendo afirmar que o tema esteja
resolvido no STF. Ao contrário, ainda haverá muita discussão a respeito.

11. CRIMES CONTRA A HONRA


11.1. INJÚRIA: Esposa tem legitimidade para propor queixa-crime contra autor de
postagem que sugere relação extraconjugal do marido – (Info 919)

A esposa tem legitimidade para propor queixa-crime contra autor de mensagem


que insinua que o seu marido tem uma relação extraconjugal com outro homem.
Se alguém alega que um indivíduo casado mantém relação homossexual
extraconjugal com outro homem, a esposa deste indivíduo tem legitimidade para
ajuizar queixa-crime por injúria, alegando que também é ofendida.
Caso concreto: Roberto insinuou que Weverton teria um relacionamento
homossexual extraconjugal com outro homem. A mulher de Weverton tem
legitimidade para ajuizar queixa-crime contra Roberto pela prática do crime de
injúria.
STF. 1ª Turma. Pet 7417 AgR/DF, Rel. Min. Luiz Fux, red. p/ o ac. Min. Marco
Aurélio, j. 9/10/18 (Info 919).
11.2. DIFAMAÇÃO: Difamação pode ser praticada mediante a publicação de vídeo
no qual o discurso da vítima seja editado – (Info 876)

Configura, em tese, difamação a conduta do agente que publica vídeo de um


discurso no qual a frase completa do orador é editada, transmitindo a falsa ideia de
que ele estava falando mal de negros e pobres.
A edição de um vídeo ou áudio tem como objetivo guiar o espectador e, quando
feita com o objetivo de difamar a honra de uma pessoa, configura dolo da prática
criminosa.
Vale ressaltar que esta conduta do agente, ainda que praticada por Deputado
Federal, não estará protegida pela imunidade parlamentar.
STF. 1ª Turma. Pet 5705/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 5/9/2017 (Info 876).
OBS:
A situação concreta foi a seguinte: Durante a reunião de uma CPI instaurada para
apurar a violência contra jovens negros e pobres no Brasil, o Deputado Federal Jean
Wyllys (PSOL-RJ) proferiu a seguinte frase: “tem um imaginário impregnado,
sobretudo nos agentes das forças de segurança, de que uma pessoa negra e pobre é
potencialmente perigosa. É mais perigosa do que uma pessoa branca de classe média.
Esse é um imaginário que está impregnado na gente”. O Deputado Eder Mauro (PSD-
PA) publicou, em sua página no Facebook, um vídeo no qual o discurso do Deputado
Jean Wyllys é editado. No vídeo publicado, a parte inicial e final da frase são cortadas
e ouve-se apenas: “Uma pessoa negra e pobre é potencialmente perigosa. É mais
perigosa do que uma pessoa branca de classe média”. Assim, o vídeo editado dá a
entender, falsamente, que o Deputado estaria defendendo essa afirmação pejorativa
contra pessoas negras e pobres. Diante disso, o Deputado Federal Jean Wyllys
ingressou com queixa-crime contra o Deputado Eder Mauro afirmando que o
querelado praticou contra ele o crime de difamação (art. 139 do CP):

Art. 139. Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua


reputação:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

O STF analisou se deveria receber ou não a queixa-crime. O que decidiu o Supremo?


A 1ª Turma do STF recebeu a queixa-crime contra o Deputado Eder Mauro. O Min.
Luiz Fux afirmou que a edição do discurso de Wyllys foi feita com “a clara intenção
de difamar”. Ele observou que a edição de um vídeo ou áudio tem como objetivo guiar
o espectador e, quando feita com o objetivo de difamar a honra de uma pessoa,
configura dolo da prática criminosa. Segundo o Ministro, a edição buscou imputar ao
parlamentar do PSOL o crime de racismo, o que poderia dar motivação, inclusive, a
uma denúncia pelo crime de calúnia. No entendimento do relator, ficou constatada a
vontade de difamar (animus difamandi), o que leva, nesta fase, ao recebimento da
queixa. Os ministros entenderam, ainda, que a divulgação do vídeo editado não
estaria abrangido pela imunidade parlamentar.
STF. 1ª Turma. Pet 5705/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 5/9/2017 (Info 876).

11.3. INJÚRIA: Não deve ser punido Deputado Federal que profere palavras
injuriosas contra adversário político que também o ofendeu imediatamente antes –
(Info 838)
Determinado Governador afirmou, em rede social, que certo Deputado Federal
estava financiando, com a utilização de “dinheiro sujo”, a produção de injúrias
contra ele e que o parlamentar estava sendo processado pelos crimes de tortura,
corrupção e estupro.
No dia seguinte, o Deputado, em resposta, afirmou, também em uma rede social,
que o Governador era acusado de corrupção eleitoral, que tinha como costume fazer
acusações falsas para tentar incriminar seus desafetos políticos, que costumava
espancar seu pai e que era desequilibrado mental.
O STF entendeu que o Deputado Federal praticou fato típico, antijurídico e
culpável, mas que não deveria ser punido, com base no art. 140, § 1º, II, do CP.
O Deputado postou as mensagens ofensivas menos de 24 horas depois de o
Governador publicar a manifestação também injuriosa. Dessa forma, as mensagens
do parlamentar foram imediatamente posteriores às veiculadas pelo ofendido e
elaboradas em resposta a elas. Ao publicá-las, o acusado citou parte do conteúdo
da mensagem postada pelo ofendido, comprovando o nexo de pertinência entre as
condutas. Dessa maneira, o ofendido não só, de forma reprovável, provocou a
injúria, como também, em tese, praticou o mesmo delito, o que gerou a retorsão
imediata do acusado. Logo, o STF entendeu que não havia razão moral para o
Estado punir o Deputado.
STF. 1ª Turma. AP 926/AC, Rel. Min. Rosa Weber, j. 6/9/2016 (Info 838).
OBS:
O motivo para isso foi a imunidade parlamentar? Ao proferir estas palavras o
Deputado estava sob o abrigo da imunidade material? NÃO. O STF entendeu que não
deveria se falar em imunidade parlamentar no presente caso. Isso por conta de dois
motivos:
1) As declarações foram proferidas fora do recinto
parlamentar e em ambiente virtual.
2) Não havia relação entre as declarações e o exercício do
mandato. As postagens atacaram a dignidade e o decoro do
Governador, sem qualquer relação com o exercício do
mandato. Mesmo sendo adversários políticos, o que se contata
é que nas declarações proferidas pelo Deputado não há um
propósito de crítica ou de debate. O seu intuito é apenas o de
atribuir condutas negativas ao Governador.

Obs: se o STF tivesse reconhecido que o Deputado Federal


estava acobertado pela imunidade parlamentar, a conduta por
ele praticada seria considerada atípica (STF Inq 3677).

Qual foi o motivo, então, para o Deputado não ser condenado? Perdão judicial.

Perdão judicial na injúria: O perdão judicial é um instituto do direito penal, segundo


o qual mesmo constatando que o fato praticado é típico, antijurídico e culpável, o juiz,
com base em hipóteses previstas na lei, deixa de punir o agente por entender que,
naquele caso concreto, a punição seria desnecessária ou ilegítima. O perdão judicial
consiste em uma causa de extinção da punibilidade (art. 107, IX, do CP). A sentença
que concede o perdão judicial não é considerada condenatória nem absolutória, mas
sim declaratória da extinção da punibilidade. Nesse sentido:

Súmula 18-STJ: A sentença concessiva do perdão judicial é


declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo
qualquer efeito condenatório.
No § 1º do art. 140 são previstas duas hipóteses de perdão judicial para o crime de
injúria, ou seja, duas situações em que se reconhece que o agente praticou injúria, mas
mesmo assim ele não será punido. Veja:

Art. 140 (...)


§ 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou
diretamente a injúria;
II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.

Retorsão imediata (inciso II): O STF deixou de aplicar a pena ao Deputado com base
no inciso II do § 1º do art. 140 (retorsão imediata). Conforme explica Cleber Masson:
"A retorsão é a injúria proferida pelo ofendido contra quem
antes o injuriou. É o revide: tão logo ofendida, a vítima
também ataca a honra de seu agressor. Deve ser imediata, ou
seja, efetuada tão logo o injuriado tiver conhecimento da
ofensa. Assim, tratando-se de injúrias verbais, a retorsão deve
se verificar na mesma ocasião em que o ofendido suportar a
ofensa.
Admite-se também o perdão judicial no tocante a injúrias
escritas. Nessa hipótese, a relação de imediatidade impõe o
revide quando o injuriado conhecer a sua existência, pois
somente a partir de então surge a possibilidade de retorsão
imediata." (Direito Penal esquematizado. São Paulo: Método,
2014, p. 199).

11.4. Deputado que, em entrevista à imprensa, afirma que determinada Deputada


"não merece ser estuprada" pratica, em tese, injúria (art. 140 do CP) – (Info 831)

O Deputado Federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) afirmou que a também Deputada


Federal Maria do Rosário (PT-RS), “não merece ser estuprada por ser muito ruim,
muito feia, não faz meu gênero”. E acrescentou que, se fosse estuprador, "não iria
estuprá-la porque ela não merece".
O STF entendeu que a conduta do parlamentar configura, em tese, para fins de
recebimento de denúncia, o crime de injúria: "Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-
lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa."
As declarações do Deputado atingiram a honra subjetiva da Deputada porque
rebaixaram sua dignidade moral, expondo sua imagem à humilhação pública, além
de associar as características da mulher à possibilidade de ser vítima de estupro.
STF. 1ª Turma. Inq 3932/DF e Pet 5243/DF, Rel. Min. Luiz Fux, j. 21/6/16 (Info 831).

12. CRIME DE FURTO


12.1. Sistema de vigilância em estabelecimento comercial não constitui óbice para a
consumação do furto – (Info 897)

A existência de sistema de vigilância em estabelecimento comercial não constitui


óbice para a tipificação do crime de furto.
STF. 1ª Turma. HC 111278/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz
Roberto Barroso, j. 10/4/18 (Info 897).
Súmula 567-STJ: Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou
por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não
torna impossível a configuração do crime de furto.

12.2. Causa de aumento do § 1º pode ser aplicada tanto para furto simples como
qualificado – (Info 851) – IMPORTANTE!!!

É legítima a incidência da causa de aumento de pena por crime cometido durante o


repouso noturno (art. 155, § 1º) no caso de furto praticado na forma qualificada (art.
155, § 4º).
Não existe nenhuma incompatibilidade entre a majorante prevista no § 1º e as
qualificadoras do § 4º. São circunstâncias diversas, que incidem em momentos
diferentes da aplicação da pena.
Assim, é possível que o agente seja condenado por furto qualificado (§ 4º) e, na
terceira fase da dosimetria, o juiz aumente a pena em 1/3 se a subtração ocorreu
durante o repouso noturno.
A posição topográfica do § 1º (vem antes do § 4º) não é fator que impede a sua
aplicação para as situações de furto qualificado (§ 4º).
STF. 2ª Turma. HC 130952/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 13/12/16 (Info 851).
STJ. 6ª Turma. HC 306.450-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 4/12/14
(Info 554).
OBS:
Exemplo: Se João e Pedro, durante a madrugada, invadem a residência da vítima
enquanto esta dormia, e de lá subtraem a televisão, eles irão ter praticado furto
qualificado:
§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o
crime é cometido:
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.

Além disso, na 3ª fase da dosimetria da pena, ao analisar as causas de aumento, o juiz


irá aumentar a pena em 1/3 pelo fato de o crime ter sido cometido durante o repouso
noturno, conforme prevê o § 1º.

13. CRIME DE ROUBO


13.1. Inexistência de continuidade delitiva entre roubo e extorsão – (Info 899) –
IMPORTANTE!!! – (PCMT-2017)

Não há continuidade delitiva entre os crimes de roubo e extorsão, ainda que


praticados em conjunto. Isso porque, os referidos crimes, apesar de serem da
mesma natureza, são de espécies diversas.
STJ. 5ª Turma. HC 435.792/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 24/05/2018.
STF. 1ª Turma. HC 114667/SP, rel. org. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto
Barroso, j. 24/4/2018 (Info 899).

Não há como reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes de roubo e o de


latrocínio porquanto são delitos de espécies diversas, já que tutelam bens jurídicos
diferentes. (PROVA PCMT-2017)
STJ. 5ª Turma. AgInt no AREsp 908.786/PB, Rel. Min. Felix Fischer, j. 06/12/2016.
OBS:
CONCEITO DE CRIME CONTINUADO: Ocorre crime continuado quando o agente:
- por meio de duas ou mais condutas
- pratica dois ou mais crimes da mesma espécie
- e, analisando as condições de tempo, local, modo de execução e outras,
- pode-se constatar que os demais crimes devem ser entendidos como mera
continuação do primeiro.

O crime continuado é uma ficção jurídica, inspirada em motivos de política criminal,


idealizada com o objetivo de ajudar o réu. Ao invés de ele ser condenado pelos vários
crimes, receberá a pena de somente um deles, com a incidência de um aumento
previsto na lei.

EXEMPLO: Carlos era caixa de uma lanchonete e estava devendo R$ 500,00 a um


agiota. Ele decide, então, tirar o dinheiro do caixa para pagar sua dívida. Ocorre que,
se ele retirasse toda a quantia de uma só vez, o seu chefe iria perceber. Carlos resolve,
portanto, subtrair R$ 50,00 por dia. Assim, após dez dias ele consegue retirar os R$
500,00. Desse modo, Carlos, por meio de dez condutas, praticou dez furtos.
Analisando as condições de tempo, local, modo de execução, pode-se constatar que os
outros nove furtos devem ser entendidos como mera continuação do primeiro,
considerando que sua intenção era furtar o valor total de R$ 500,00. Ao invés de Carlos
ser condenado por dez furtos, receberá somente a pena de um furto, com a incidência
de um aumento de 1/6 a 2/3.

PREVISÃO LEGAL:
Art. 71. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou
omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e,
pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras
semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como
continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos
crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada,
em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

NATUREZA JURÍDICA: Existem três teorias que foram desenvolvidas para tentar
explicar a natureza jurídica da continuidade delitiva.
a) Teoria da unidade real: afirma que todas as condutas praticadas que, por si sós, já
se constituiriam em infrações penais, são um único crime. Segundo essa teoria,
para todos os efeitos, Carlos praticou apenas um único furto.
b) Teoria da ficção jurídica: sustenta que cada uma das condutas praticadas
constitui-se em uma infração penal diferente. No entanto, por ficção jurídica, esses
diversos crimes são considerados, pela lei, como crime único. Segundo essa
teoria, Carlos praticou dez furtos, entretanto, considera-se, ficticiamente, para fins
de pena, que ele cometeu apenas um.
c) Teoria mista: defende que, se houver crime continuado, surge um terceiro crime,
resultado do próprio concurso. Segundo essa teoria, Carlos praticou uma nova
categoria de crime, chamada de furto por continuidade delitiva.

O Brasil adotou a teoria da ficção jurídica.

REQUISITOS: Para o reconhecimento do crime continuado, são necessários quatro


requisitos:
1) Pluralidade de condutas (prática de duas ou mais condutas subsequentes e
autônomas);

2) Pluralidade de crimes da mesma espécie (prática de dois ou mais crimes iguais);

3) Condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução, entre outras;

4) Unidade de desígnio.

1) Pluralidade de condutas
O agente deve praticar duas ou mais condutas, ou seja, mais de uma ação ou omissão.

2) Pluralidade de crimes da mesma espécie


O agente deve praticar dois ou mais crimes da mesma espécie. Segundo o STJ e o
STF, quando o CP fala em crimes da mesma espécie, ele exige que sejam crimes
previstos no mesmo tipo penal, protegendo igual bem jurídico. Desse modo, para
que seja reconhecida a continuidade delitiva, é necessário que o agente pratique dois
ou mais crimes idênticos (ex.: quatro furtos simples consumados e um tentado). Se a
pessoa comete um furto e depois um roubo, não há continuidade delitiva. Se a pessoa
pratica um roubo simples e, em seguida, um latrocínio, igualmente, não haverá crime
continuado. Para que haja continuidade, repita-se, é indispensável que os crimes
sejam previstos no mesmo dispositivo legal e protejam o mesmo bem jurídico.
Nesse sentido:
Não há continuidade delitiva entre os crimes de roubo e
extorsão, ainda que praticados em conjunto. Isso porque, os
referidos crimes, apesar de serem da mesma natureza, são de
espécies diversas.
STJ. 5ª Turma. HC 435.792/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas,
julgado em 24/05/2018.
STF. 1ª Turma. HC 114667/SP, rel. org. Min. Marco Aurélio,
red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 24/4/2018
(Info 899).

Importante: Também não se reconhece continuidade delitiva entre roubo e


latrocínio:
Não há como reconhecer a continuidade delitiva entre os
crimes de roubo e o de latrocínio porquanto são delitos de
espécies diversas, já que tutelam bens jurídicos diferentes.
STJ. 5ª Turma. AgInt no AREsp 908.786/PB, Rel. Min. Felix
Fischer, julgado em 06/12/2016.

3) Condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução, entre outras


A doutrina afirma que deve haver uma conexão de tempo, de lugar e de execução
entre os crimes para que se caracterize o crime continuado.

3.1 Conexão de tempo (conexão temporal):


Significa dizer que, para que haja continuidade delitiva, não pode ter se passado um
longo período de tempo entre um crime e outro. Para os crimes patrimoniais, a
jurisprudência afirma que entre o primeiro e o último delito não pode ter se passado
mais que 30 dias. Se houve período superior a 30 dias, não se aplica mais o crime
continuado, havendo, neste caso, concurso material. Vale ressaltar que, em alguns
outros delitos, como nos crimes contra a ordem tributária, a jurisprudência admite que
esse prazo seja maior.

3.2 Conexão de lugar (conexão espacial):


Para que haja continuidade delitiva, os crimes devem ter sido praticados em semelhantes
condições de lugar. Segundo a jurisprudência, semelhantes condições de lugar
significa que os delitos devem ser praticados dentro da mesma cidade, ou, no
máximo, em cidades contíguas.

3.3 Conexão quanto à maneira de execução (conexão modal):


Para que haja continuidade delitiva, os crimes devem ter sido praticados com o
mesmo modus operandi, ou seja, com a mesma maneira de execução (mesmos
comparsas, mesmos instrumentos etc.).

4) Unidade de desígnio
Esse quarto requisito não está previsto expressamente no art. 71 do CP. Por isso,
alguns doutrinadores afirmam que ele não é necessário. Sobre o tema, surgiram duas
teorias:

4.1 Teoria objetiva pura (puramente objetiva)


Segundo esta teoria, os requisitos para a continuidade delitiva são apenas objetivos e
estão expressamente elencados no art. 71 do CP. Daí o nome: puramente objetiva.
Não é necessário que se discuta se a intenção do agente era ou não praticar todos os
crimes em continuidade delitiva. No exemplo que demos acima, não interessa
discutir se o objetivo de Carlos era praticar um único furto de R$ 500,00 dividido em
várias vezes ou se sua intenção era ficar subtraindo o dinheiro da padaria por tempo
indeterminado. Essa teoria é minoritária e ultrapassada.

4.2 Teoria objetivo-subjetiva (também chamada de teoria mista)


De acordo com esta teoria, os requisitos para a continuidade delitiva são de natureza
tanto objetiva como subjetiva. Daí o nome da teoria: objetivo-subjetiva. Os requisitos
objetivos estão previstos no art. 71 (mesmas condições de tempo, lugar e forma de
execução). O requisito subjetivo, por sua vez, é a unidade de desígnio, ou seja, o
liame volitivo entre os delitos, a demonstrar que os atos criminosos se apresentam
entrelaçados (a conduta posterior deve constituir um desdobramento da anterior).

Conforme explica Nucci:


“Somente deveria ter direito ao reconhecimento desse
benefício legal o agente criminoso que demonstrasse ao juiz
o seu intuito único, o seu propósito global, vale dizer,
evidenciasse que, desde o princípio, ou pelo menos durante o
iter criminis, tinha o propósito de cometer um crime único,
embora por partes. Assim, o balconista de uma loja que,
pretendendo subtrair R$ 1.000,00 do seu patrão, comete vários
e contínuos pequenos furtos até atingir a almejada quantia.
Completamente diferente seria a situação daquele ladrão que
comete furtos variados, sem qualquer rumo ou planejamento,
nem tampouco objetivo único.” (NUCCI, Guilherme de Souza.
Código Penal Comentado. 6ª ed., São Paulo: RT, 2006, p. 405).

Essa é a teoria adotada pelo STJ e STF:


(...) O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no
sentido de que para caracterizar a continuidade delitiva é
necessária a demonstração da unidade de desígnios, ou seja,
o liame volitivo que liga uma conduta a outra, não bastando,
portanto, o preenchimento dos requisitos objetivos (mesmas
condições de tempo, espaço e modus operandi).
2. No caso, observa-se que o Tribunal a quo, ao aplicar a regra
do art. 71 do Código Penal, adotou a teoria puramente
objetiva, deixando de valorar os aspectos subjetivos. (...)
(REsp 421.246/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma,
julgado em 15/12/2009)

13.2. Arma utilizada no roubo e a majorante do art. 157, §2º, I do CP

É necessário que a arma utilizada no roubo seja apreendida e periciada para que
incida a majorante do art. 157, § 2º, I, do Código Penal?
NÃO. O reconhecimento da referida causa de aumento prescinde (dispensa) da
apreensão e da realização de perícia na arma, desde que o seu uso no roubo seja
provado por outros meios de prova, tais como a palavra da vítima ou mesmo de
testemunhas.
STF. 1ª Turma. HC 108034/MG, rel. Min. Rosa Weber, 7/8/2012.

No entanto, se a arma é apreendia e periciada, sendo constatada a sua inaptidão


para a produção de disparos, neste caso, não se aplica a majorante do art. 157, § 2º,
I, do CP, sendo considerado roubo simples (art. 157, caput, do CP). O legislador, ao
prever a majorante descrita no referido dispositivo, buscou punir com maior rigor
o indivíduo que empregou artefato apto a lesar a integridade física do ofendido,
representando perigo real, o que não ocorre na hipótese de instrumento
notadamente sem potencialidade lesiva. Assim, a utilização de arma de fogo que
não tenha potencial lesivo afasta a mencionada majorante, mas não a grave ameaça,
que constitui elemento do tipo “roubo” na sua forma simples.
STJ. 6ª Turma. HC 247.669-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 4/12/2012.

13.3. Participação de menor de idade em roubo e a sua majoração pelo concurso de


pessoas

Se um maior de idade pratica o roubo juntamente com um inimputável, esse roubo


será majorado pelo concurso de pessoas (art. 157, § 2º do CP).
A participação do menor de idade pode ser considerada com o objetivo de
caracterizar concurso de pessoas para fins de aplicação da causa de aumento de
pena no crime de roubo.
STF. 1ª Turma. HC 110425/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 5/6/2012.
STJ. 6ª Turma. HC 150.849/DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em
16/08/2011.

14. LATROCÍNIO
14.1. O que fazer se foi atingido um único patrimônio, mas houve pluralidade de
mortes? – (Info 855) – IMPORTANTE!!!
Carlos e Luiza estão entrando no carro quando são rendidos por João, assaltante
armado, que deseja subtrair o veículo. Carlos acaba reagindo e João atira contra ele
e Luiza, matando o casal. João foge levando o carro. Haverá dois crimes de
latrocínio em concurso formal de ou um único crime de latrocínio?
 STJ: concurso formal impróprio.
 STF e doutrina majoritária: um único crime de latrocínio.
STJ. 5ª Turma. HC 336.680/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17/11/2015.
STF. 1ª Turma. RHC 133575/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 21/2/17 (Info 855).

(DPERN-2015-CESPE): Plínio praticou um crime de latrocínio (previsto no art.


157, § 3.º, parte final, do CP) no qual houve uma única subtração patrimonial, com
desígnios autônomos e com dois resultados mortes (vítimas). Nessa situação,
segundo o entendimento do STJ, Plínio praticou o crime de latrocínio em concurso
formal impróprio, disposto no art. 70, caput, parte final, do CP, no qual se aplica a
regra do concurso material, de forma que as penas devem ser aplicadas
cumulativamente.

14.2. Agente que participou do roubo pode responder por latrocínio ainda que o
disparo que matou a vítima tenha sido efetuado pelo corréu – (Info 855) –
IMPORTANTE!!! – (TJMG-2018)

Aquele que se associa a comparsa para a prática de roubo, sobrevindo a morte da


vítima, responde pelo crime de latrocínio, ainda que não tenha sido o autor do
disparo fatal ou que sua participação se revele de menor importância.
Ex: João e Pedro combinaram de roubar um carro utilizando arma de fogo. Eles
abordaram, então, Ricardo e Maria quando o casal entrava no veículo que estava
estacionado. Os assaltantes levaram as vítimas para um barraco no morro. Pedro
ficou responsável por vigiar o casal no cativeiro enquanto João realizaria outros
crimes utilizando o carro subtraído. Depois de João ter saído, Ricardo e Maria
tentaram fugir e Pedro atirou nas vítimas, que acabaram morrendo. João pretendia
responder apenas por roubo majorado (art. 157, § 2º, I e II) alegando que não
participou nem queria a morte das vítimas, devendo, portanto, ser aplicado o art.
29, § 2º do CP. O STF, contudo, não acatou a tese. Isso porque João assumiu o risco
de produzir resultado mais grave, ciente de que atuava em crime de roubo, no qual
as vítimas foram mantidas em cárcere sob a mira de arma de fogo.
STF. 1ª Turma. RHC 133575/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 21/2/2017 (Info 855).
(TJMG-2018-Consulplan): “A e B, imputáveis, resolvem cometer um roubo em
um estabelecimento comercial na companhia do menor M, mediante emprego de
um revólver eficaz e completamente municiado. Na ocasião programada, A
conduz os demais comparsas e estaciona em local estratégico próximo ao
estabelecimento comercial para facilitar a fuga e dificultar que testemunhas
anotem a placa do veículo. B e M descem do veículo, entram no estabelecimento
comercial perto do horário do encerramento e anunciam o assalto. A vítima V
reage e entra em luta corporal com os agentes. Para pôr fim à briga, M efetua três
disparos de arma de fogo e foge, em seguida, na companhia de B sem nada
subtrair do estabelecimento comercial. V morre em função dos disparos de arma
de fogo que lhe atingiram. B e M entram rapidamente no veículo conduzido por
A, que empreende rápida fuga do local.” Sobre a punibilidade de A, assinale a
alternativa correta: A responde por latrocínio consumado em concurso formal
com corrupção de menor, sem incidência da causa de diminuição de pena da
participação de menor importância. BL: art. 157, §3º, II; art. 70, 1ª parte; art. 244-
B, todos do CP; Súmula 610, STF; Info 855 do STF.

OBS: Imagine a seguinte situação adaptada: João e Pedro combinaram de roubar um


carro utilizando arma de fogo. Eles abordaram, então, Ricardo e Maria quando o casal
entrava no veículo que estava estacionado. Os assaltantes levaram as vítimas para um
barraco no morro. Pedro ficou responsável por vigiar o casal no cativeiro enquanto
João realizaria outros crimes utilizando o carro subtraído. Depois de João ter saído,
Ricardo e Maria tentaram fugir e Pedro atirou nas vítimas, que acabaram morrendo.

Qual foi o crime praticado por Pedro? Latrocínio (art. 157, § 3º, 2ª parte) em concurso
com sequestro e cárcere privado (art. 148 do CP):
Art. 157 (...)
§ 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de
reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se resulta
morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da
multa.
Art. 148. Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro
ou cárcere privado:
Pena - reclusão, de um a três anos.

João também foi denunciado por latrocínio, mas alegou em sua defesa que deveria
responder apenas por roubo majorado (art. 157, § 2º, I e II), considerando que não
participou nem queria a morte das vítimas, devendo, portanto, ser aplicado o art. 29,
§ 2º do CP. A tese de João foi aceita pelo STF? NÃO. O art. 29, § 2º prevê:
§ 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime
menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será
aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o
resultado mais grave.

No caso concreto, o juiz sentenciante julgou que o réu contribuiu ativamente para a
realização do delito, em unidade de desígnios e mediante divisão de tarefas, com
pleno domínio do fato. O STF entendeu que a decisão do magistrado foi correta.
Segundo decidiu a Corte:
Aquele que se associa a comparsa para a prática de roubo,
sobrevindo a morte da vítima, responde pelo crime de
latrocínio, ainda que não tenha sido o autor do disparo fatal
ou que sua participação se revele de menor importância. O
agente assumiu o risco de produzir resultado mais grave,
ciente de que atuava em crime de roubo, no qual as vítimas
foram mantidas em cárcere sob a mira de arma de fogo. STF.
1ª Turma. RHC 133575/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado
em 21/2/2017 (Info 855).

No caso concreto, o magistrado sentenciante utilizou a seguinte argumentação: No


concurso de pessoas não é necessário que todos os agentes pratiquem os mesmos atos
executivos, sendo suficiente o encontro de vontades para a prática da infração penal.
Assim, embora não existam provas de que João tenha ordenado que o corréu Pedro
matasse as vítimas, não há dúvidas de que ele assumiu o risco de produzir o resultado
mais grave, pois, após terem juntos praticado a subtração e mantido os ofendidos em
cárcere, os deixou com seu comparsa enquanto levava o veículo para a prática de
outros crimes.

Assim, João tinha domínio do fato e sua conduta não pode ser considerada meramente
acessória ou de menor importância, estando ciente de que atuava em um roubo, no
qual as vítimas era mantidas em cárcere sob a mira de uma arma de fogo, tendo anuído
e aderido à conduta violenta do corréu, sendo a sua ação fundamental para a
concretização da subtração do patrimônio visado.

Não tendo havido rompimento do liame subjetivo entre os agentes, não há que se falar
em participação de menor importância, tampouco em responsabilização por crime
menos grave, pois em se tratando de roubo, respondem pelo resultado morte todos
aqueles que, mesmo não tendo de mão própria realizado o ato letal, planejaram e
executaram o tipo básico, assumindo o risco do resultado mais grave durante a ação
criminosa.

15. DANO
15.1. Destruição de acessões feitas em terras indígenas pode configurar dano
qualificado – (Info 760)

Se um indivíduo que tinha uma fazenda em uma terra indígena, ao receber ordem
para desocupar o local, destrói as acessões (construções e plantações) que havia
feito no local, ele pratica, em tese, o delito de dano qualificado (art. 163, parágrafo
único, III, do CP). Isso porque essas terras pertencem à União (art. 20, XI, da CF/88),
de forma que, consequentemente, as acessões também são patrimônio público
federal.
STF. 2ª Turma. Inq 3670/RR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 23/9/2014 (Info
760).

16. ESTELIONATO
16.1. Estelionato e devolução da vantagem indevida antes do recebimento da
denúncia – (Info 796) – IMPORTANTE!!!

O art. 9º, § 2º da Lei 10.684/2003 prevê que o pagamento integral do débito fiscal
realizado pelo réu é causa de extinção de sua punibilidade.
Imagine que determinado indivíduo tenha praticado estelionato causando prejuízo
aos cofres públicos. Antes do recebimento da denúncia, o agente paga integralmente
os danos produzidos. Isso poderá extinguir sua punibilidade, com base no art. 9º, § 2º
da Lei 10.684/2003?
NÃO. A causa especial de extinção de punibilidade prevista no § 2º do art. 9º da
Lei nº 10.684/2003, relativamente ao pagamento integral do crédito tributário, não
se aplica ao delito de estelionato (CP, art. 171).
O art. 9º da Lei 10.684/2003 menciona os crimes aos quais são aplicadas suas regras:
a) arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137/90; b) art. 168-A do CP (apropriação indébita
previdenciária); c) Art. 337-A do CP (sonegação de contribuição previdenciária).
Repare, portanto, que o estelionato (art. 171 do CP) não está listado nessa lei.
Mesmo sem o estelionato previdenciário estar previsto, não é possível aplicar essas
regras por analogia em favor do réu?
NÃO. O art. 9º da Lei 10.684/2003 somente abrange crimes tributários materiais,
delitos que são ontologicamente distintos do estelionato previdenciário e que
protegem bens jurídicos diferentes. Dessa forma, não há lacuna involuntária na lei
penal a demandar analogia.

O fato de o agente ter pago integralmente o prejuízo trará algum benefício penal?
SIM. O agente poderá ter direito de receber o benefício do arrependimento
posterior, tendo sua pena reduzida de 1/3 a 2/3 (art. 18 do CP).
STF. 2ª Turma. RHC 126917/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 25/8/2015
(Info 796).
STJ. 6ª Turma. REsp 1.380.672-SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em
24/3/2015 (Info 559).

17. APROPRIAÇÃO INDÉBITA


17.1. Ressarcimento do prejuízo em acordo homologado no juízo cível e sua
repercussão no processo criminal – (Info 793)

A advogada ficou com o dinheiro recebido pelo cliente e só devolveu a quantia


após ser demandada judicialmente e fazer acordo em ação de cobrança.
Vale ressaltar que, a esta altura, já havia um inquérito policial instaurado para
apurar eventual crime de apropriação indébita.
O STF, com base em peculiaridades do caso concreto, decidiu trancar a ação penal
por falta de justa causa.
Salientou-se que o acordo firmado no juízo cível que colocou fim à pendência
ocorreu em novembro de 2012 e a denúncia só foi formalizada quase um ano após.
Além disso, o juiz do processo cível determinou a comunicação à Delegacia de
Polícia sobre o acordo. Diante desses fatos, a 1ª Turma entendeu que a situação
seria excepcional e suficiente para se trancar a ação penal. Entendeu-se que a
relação jurídica cível repercute porque o acerto de contas se deu em data anterior à
propositura da ação penal.
STF. 1ª Turma. RHC 125283/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 4/8/2015 (Info
793).

18. RECEPTAÇÃO
18.1. Constitucionalidade do §1º do art. 180 do Código Penal

O STF entende que o § 1º do art. 180 do CP é CONSTITUCIONAL.


O objetivo do legislador ao criar a figura típica da receptação qualificada foi
justamente a de punir de forma mais gravosa o comerciante ou industrial que, em
razão do exercício de sua atividade, pratica alguma das condutas descritas no
referido § 1°, valendo-se de sua maior facilidade para tanto devido à infraestrutura
que lhe favorece.
O crime foi qualificado pelo legislador em razão da condição do agente que, por
sua atividade profissional, merece ser mais severamente punido com base na maior
reprovabilidade de sua conduta.
Para o STF, o § 1º do art. 180 pune tanto o agente que atua com dolo eventual como
também no caso de dolo direto.
STF. 1ª Turma. RHC 117143/RS, rel. Min. Rosa Weber, 25/6/2013.
19. CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL
19.1. Legitimidade ativa do Ministério Público e crime de estupro sem lesão
corporal – (Info 905) – IMPORTANTE!!!

A Súmula 608 do STF prevê que “no crime de estupro, praticado mediante violência
real, a ação penal é pública incondicionada.”
O entendimento dessa súmula pode ser aplicado independentemente da existência
da ocorrência de lesões corporais nas vítimas de estupro. A violência real se
caracteriza não apenas nas situações em que se verificam lesões corporais, mas
sempre que é empregada força física contra a vítima, cerceando-lhe a liberdade de
agir segundo a sua vontade.
Assim, se os atos foram praticados sob grave ameaça, com imobilização de vítimas,
uso de força física e, em alguns casos, com mulheres sedadas, trata-se de crime de
estupro que se enquadra na Súmula 608 do STF e que, portanto, a ação é pública
incondicionada.
STF. 2ª Turma. RHC 117978, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 05/06/2018 (Info 905).

A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o advento da Lei nº


12.015/2009.
Assim, em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada mesmo após a Lei nº 12.015/2009.
STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre
de Moraes, j. 27/2/2018 (Info 892).
OBS:
Ação penal no crime de estupro: A ação penal no crime de estupro deve ser analisada
antes e depois da Lei 12.015/09. Veja como essa Lei alterou o art. 225 do Código Penal:
CÓDIGO PENAL
Antes da Lei nº 12.015/2009 Depois da Lei nº 12.015/2009
Art. 225. Nos crimes definidos nos Art. 225. Nos crimes definidos nos
capítulos anteriores, somente se Capítulos I e II deste Título, procede-se
procede mediante queixa. mediante ação penal pública
§ 1º Procede-se, entretanto, mediante condicionada à representação.
ação pública: Parágrafo único. Procede-se, entretanto,
I - se a vítima ou seus pais não podem mediante ação penal pública
prover às despesas do processo, sem incondicionada se a vítima é menor de 18
privar-se de recursos indispensáveis à (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.
manutenção própria ou da família;
II - se o crime é cometido com abuso do
pátrio poder, ou da qualidade de
padrasto, tutor ou curador.
§ 2º - No caso do nº I do parágrafo
anterior, a ação do Ministério Público
depende de representação.

O estupro pode ser praticado mediante grave ameaça ou violência. Se o estupro é


praticado mediante violência real, qual será a ação penal neste caso? Em 1984, o STF
editou uma súmula afirmando que se trata de ação pública incondicionada. Confira:
Súmula 608-STF: No crime de estupro, praticado mediante
violência real, a ação penal é pública incondicionada.
Com a edição da Lei 12.015/09, a maioria da doutrina defendeu a ideia de que esta
súmula teria sido superada. Isso porque o caput do art. 225 do Código Penal falou que
a regra geral no estupro é a ação pública condicionada. Ao tratar sobre as exceções nas
quais o crime será de ação pública incondicionada, o parágrafo único do art. 225 não
fala em estupro com violência real. Logo, para os autores, teria havido uma omissão
voluntária do legislador.

O STF acatou esta tese? Depois da Lei nº 12.015/2009, o estupro praticado mediante
violência real passou a ser de ação pública condicionada? Com a Lei nº 12.015/2009, a
Súmula 608 do STF perdeu validade? NÃO. O tema ainda não está pacificado, mas a
1ª Turma do STF decidiu que:
A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o
advento da Lei nº 12.015/2009. Assim, em caso de estupro
praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada. STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min.
Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,
julgado em 27/2/2018 (Info 892).

Vale ressaltar que é dispensável a ocorrência de lesões corporais para a


caracterização da violência real nos crimes de estupro. Em outras palavras, mesmo
que a violência praticada pelo agressor não deixe marcas, não gere lesões corporais na
vítima, ainda assim a ação será pública incondicionada:
Nos termos da Súmula 608 do STF, no crime de estupro
praticado mediante violência real, a ação é pública
incondicionada.
O entendimento dessa súmula pode ser aplicado
independentemente da existência da ocorrência de lesões
corporais nas vítimas de estupro. A violência real se
caracteriza não apenas nas situações em que se verificam
lesões corporais, mas sempre que é empregada força física
contra a vítima, cerceando-lhe a liberdade de agir segundo a
sua vontade.
Assim, se os atos foram praticados sob grave ameaça, com
imobilização de vítimas, uso de força física e, em alguns casos,
com mulheres sedadas, trata-se de crime de estupro que se
enquadra na Súmula 608 do STF e que, portanto, a ação é
pública incondicionada.
STF. 2ª Turma. RHC 117978, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em
05/06/2018(Info 905).

E no caso de estupro que resulta lesão corporal grave ou morte (art. 213, §§ 1º e 2º)?
Qual será a ação penal nestas hipóteses? A doutrina também defende que neste caso
a ação penal seria pública condicionada. A Procuradoria-Geral da República ajuizou
até mesmo uma ADI contra a nova redação do art. 225 do Código Penal, dada pela Lei
nº 12.015/09. Na ação, a PGR pede que o caput do art. 225 seja declarado parcialmente
inconstitucional, sem redução de texto, apenas “para excluir do seu âmbito de
incidência os crimes de estupro qualificado por lesão corporal grave ou morte, de
modo a restaurar, em relação a tais modalidades delituosas, a regra geral da ação penal
pública incondicionada (artigo 100 do Código Penal e artigo 24 do Código de Processo
Penal)”. Em outras palavras, a PGR pediu que o STF interprete o art. 225 do CP
dizendo que o estupro que resulte lesão corporal grave ou morte será crime de ação
pública incondicionada. O processo é a ADI 4301, que deve ser julgada ainda este
ano. Vale ressaltar que, com a decisão acima explicada (HC 125360/RJ), ganha força
essa ADI proposta pela PGR e a tendência é que ela seja julgada procedente.

Resumindo. Ação penal no caso de estupro (após a Lei nº 12.015/2009):


Regra: ação penal condicionada à representação.
Exceções:
• Vítima menor de 18 anos: incondicionada.
• Vítima vulnerável: incondicionada.
• Se foi praticado mediante violência real: incondicionada (Súmula 608-STF).
• Se resultou lesão corporal grave ou morte: polêmica acima exposta. Deve ser
aplicado o mesmo raciocínio da Súmula 608-STF.

19.2. Em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é


pública incondicionada – (Info 892) – IMPORTANTE!!! Atualize seus livros!

A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o advento da Lei 12.015/2009.
Assim, em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada mesmo após a Lei nº 12.015/2009.
STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre
de Moraes, j. 27/2/2018 (Info 892).
OBS:
Ação penal no crime de estupro: A ação penal no crime de estupro deve ser analisada
antes e depois da Lei 12.015/09. Veja como essa Lei alterou o art. 225 do Código Penal:
CÓDIGO PENAL
Antes da Lei nº 12.015/2009 Depois da Lei nº 12.015/2009
Art. 225. Nos crimes definidos nos Art. 225. Nos crimes definidos nos
capítulos anteriores, somente se Capítulos I e II deste Título, procede-se
procede mediante queixa. mediante ação penal pública
§ 1º Procede-se, entretanto, mediante condicionada à representação.
ação pública: Parágrafo único. Procede-se, entretanto,
I - se a vítima ou seus pais não podem mediante ação penal pública
prover às despesas do processo, sem incondicionada se a vítima é menor de 18
privar-se de recursos indispensáveis à (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.
manutenção própria ou da família;
II - se o crime é cometido com abuso do
pátrio poder, ou da qualidade de
padrasto, tutor ou curador.
§ 2º - No caso do nº I do parágrafo
anterior, a ação do Ministério Público
depende de representação.

O estupro pode ser praticado mediante grave ameaça ou violência. Se o estupro é


praticado mediante violência real, qual será a ação penal neste caso? Em 1984, o STF
editou uma súmula afirmando que se trata de ação pública incondicionada. Confira:
Súmula 608-STF: No crime de estupro, praticado mediante
violência real, a ação penal é pública incondicionada.
Com a edição da Lei nº 12.015/2009, a maioria da doutrina defendeu a ideia de que
esta súmula teria sido superada. Isso porque o caput do art. 225 do Código Penal falou
que a regra geral no estupro é a ação pública condicionada. Ao tratar sobre as exceções
nas quais o crime será de ação pública incondicionada, o parágrafo único do art. 225
não fala em estupro com violência real. Logo, para os autores, teria havido uma
omissão voluntária do legislador.

O STF acatou esta tese? Depois da Lei nº 12.015/2009, o estupro praticado mediante
violência real passou a ser de ação pública condicionada? Com a Lei nº 12.015/2009, a
Súmula 608 do STF perdeu validade? NÃO. O tema ainda não está pacificado, mas a
1ª Turma do STF decidiu que:
A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o
advento da Lei nº 12.015/2009. Assim, em caso de estupro
praticado mediante violência real, a ação penal é pública
incondicionada. STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min.
Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,
julgado em 27/2/2018 (Info 892).

Vale ressaltar que é dispensável a ocorrência de lesões corporais para a


caracterização da violência real nos crimes de estupro. Em outras palavras, mesmo
que a violência praticada pelo agressor não deixe marcas, não gere lesões corporais na
vítima, ainda assim a ação será pública incondicionada. Nesse sentido: STF. 2ª
Turma. HC 102683, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 14/12/2010.

E no caso de estupro que resulta lesão corporal grave ou morte (art. 213, §§ 1º e 2º)?
Qual será a ação penal nestas hipóteses? A doutrina também defende que neste caso
a ação penal seria pública condicionada. A Procuradoria-Geral da República ajuizou
até mesmo uma ADI contra a nova redação do art. 225 do Código Penal, dada pela Lei
nº 12.015/2009. Na ação, a PGR pede que o caput do art. 225 seja declarado
parcialmente inconstitucional, sem redução de texto, apenas “para excluir do seu
âmbito de incidência os crimes de estupro qualificado por lesão corporal grave ou
morte, de modo a restaurar, em relação a tais modalidades delituosas, a regra geral da
ação penal pública incondicionada (artigo 100 do Código Penal e artigo 24 do Código
de Processo Penal)”. Em outras palavras, a PGR pediu que o STF interprete o art. 225
do CP dizendo que o estupro que resulte lesão corporal grave ou morte será crime
de ação pública incondicionada. O processo é a ADI 4301, que deve ser julgada ainda
este ano. Vale ressaltar que, com a decisão acima explicada (HC 125360/RJ), ganha
força essa ADI proposta pela PGR e a tendência é que ela seja julgada procedente.

Resumindo. Ação penal no caso de estupro (após a Lei nº 12.015/2009):


Regra: ação penal condicionada à representação.
Exceções:
• Vítima menor de 18 anos: incondicionada.
• Vítima vulnerável: incondicionada.
• Se foi praticado mediante violência real: incondicionada (Súmula 608-STF).
• Se resultou lesão corporal grave ou morte: polêmica acima exposta. Deve ser
aplicado o mesmo raciocínio da Súmula 608-STF.

19.3. Bisavô é considerado ascendente para os fins da causa de aumento do


art. 226, II, do CP – (Info 866)
No caso de crimes contra a liberdade sexual (arts. 213 a 216-A) e crimes sexuais
contra vulnerável (arts. 217-A a 218-B), se o autor do delito for ascendente da vítima,
a pena deverá ser aumentada de metade (art. 226, II, do CP).
O bisavô está incluído dentro dessa expressão “ascendente”.
O bisavô está no terceiro grau da linha reta e não há nenhuma regra de limitação
quanto ao número de gerações.
Assim, se o bisavô pratica estupro de vulnerável contra sua bisneta, deverá incidir
a causa de aumento de pena prevista no art. 226, II, do CP.
STF. 2ª Turma. RHC 138717/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 23/5/17 (Info
866).
OBS:
Causa de aumento de pena: No caso de crimes contra a liberdade sexual (arts.
213 a 216-A) e crimes sexuais contra vulnerável (arts. 217-A a 218-B), se o autor
do delito for ascendente da vítima, a pena deverá ser aumentada de metade
(art. 226, II, do CP). É o que prevê o art. 226, II, do CP:
Art. 226. A pena é aumentada:
(...)
II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou
madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor,
curador, preceptor ou empregador da vítima ou por
qualquer outro título tem autoridade sobre ela;

O bisavô está incluído dentro dessa expressão “ascendente”? Claro. O bisavô


está no terceiro grau da linha reta e não há nenhuma regra de limitação quanto
ao número de gerações.

19.4. Passar as mãos nas coxas e seios da vítima – (Info 837)

O agente que passa as mãos nas coxas e seios da vítima menor de 14 anos, por
dentro de sua roupa, pratica, em tese, o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A
do CP).
Não importa que não tenha havido penetração vaginal (conjunção carnal).
STF. 1ª Turma. RHC 133121/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/o acórdão Min.
Edson Fachin j. 30/8/2016 (Info 837).

20. INCITAÇÃO AO CRIME


20.1. Deputado que, em entrevista à imprensa, afirma que determinada Deputada
"não merece ser estuprada" pratica, em tese, incitação ao crime (art. 286 do CP) – (Info
831)

O Deputado Federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) afirmou que a também Deputada


Federal, Maria do Rosário (PT-RS), “não merece ser estuprada por ser muito ruim,
muito feia, não faz meu gênero”. E acrescentou que, se fosse estuprador, "não iria
estuprá-la porque ela não merece".
O STF entendeu que a conduta do parlamentar configura, em tese, para fins de
recebimento de denúncia, o delito do art. 286 do CP (incitação ao crime): "Art. 286.
Incitar, publicamente, a prática de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou
multa."
A manifestação do Deputado tem o potencial de incitar outros homens a expor as
mulheres à fragilidade e à violência física, sexual, psicológica e moral,
considerando que foi proferida por um parlamentar, que não pode desconhecer os
tipos penais.
O crime de estupro tem consequências graves, e sua ameaça constante mantém
todas as mulheres em situação de subordinação. Portanto, discursos que
relativizam essa gravidade e a abjeção do delito contribuem para agravar a
vitimização secundária produzida pelo estupro.
O parlamentar, ao utilizar o vocábulo “merece” transformou o estupro em algo
como se fosse um prêmio, um favor, uma benesse à mulher. Além disso, transmitiu
a ideia de que as vítimas podem merecer os sofrimentos a elas infligidos pelo
estupro. Essa fala reflete os valores de uma sociedade desigual, que ainda tolera e
até incentiva a prática de atitudes machistas e defende a naturalidade de uma
posição superior do homem, nas mais diversas atividades.
Para que se consuma o tipo penal do art. 286 do CP, não é necessário que o agente
incentive, verbal e literalmente, a prática de determinado crime. Este delito pode
ser praticado por meio de qualquer conduta que seja apta a provocar ou a reforçar
em terceiros a intenção da prática criminosa.
Ademais, o delito do art. 286 do CP é crime formal, de perigo abstrato, e independe
da produção de resultado. Além disso, não exige o fim especial de agir, mas apenas
o "dolo genérico", consistente na consciência de que o comportamento do agente
instigará outros a praticar crimes.
No caso, a frase do parlamentar tem potencial para estimular a perspectiva da
superioridade masculina e a intimidação da mulher pela ameaça de uso da
violência. Assim, a afirmação pública do Deputado tem, em tese, o potencial de
reforçar a ideia eventualmente existente em outros homens de praticarem violência
contra a mulher.
STF. 1ª Turma. Inq 3932/DF e Pet 5243/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgados em
21/6/2016 (Info 831).

21. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO


21.1. Prefeito que insere artigo em projeto de lei aprovado pelo Parlamento – (Info
832)

Prefeito que, ao sancionar lei aprovada pela Câmara dos Vereadores, inclui artigo
que não constava originalmente no projeto votado pratica o crime de falsificação
de documento público (art. 297, § 1º do CP).
No momento da dosimetria, o fato de o réu ser Prefeito não pode ser utilizado como
circunstância desfavorável para aumentar a pena-base na primeira fase e, em
seguida, ser empregado como causa de aumento do § 1º do art. 297 do CP. Se ele for
utilizado duas vezes, haverá bis in idem.
Assim, essa circunstância (condição de Prefeito) deve ser considerada apenas uma
vez, na terceira fase da pena, como majorante (causa de aumento).
STF. 1ª Turma. AP 971/RJ, Rel. Min. Edson Fachin, j. 28/6/2016 (Info 832).
OBS:
Imagine a seguinte situação adaptada: A Câmara dos Vereadores aprovou
determinada lei municipal. João, Prefeito, quando foi sancionar a lei, incluiu um artigo
que não constava originalmente no projeto aprovado pelo Parlamento. O objetivo foi
possibilitar a prorrogação da dotação orçamentária sem a necessidade de nova
aprovação legislativa.

Qual foi o delito praticado pelo Prefeito? Falsificação de documento público, previsto
no art. 297, § 1º do CP:
Art. 297. Falsificar, no todo ou em parte, documento público,
ou alterar documento público verdadeiro:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
§ 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime
prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.

O Tribunal aumentou a pena na primeira fase da dosimetria (circunstâncias judiciais)


alegando que a culpabilidade do réu era intensa, já que ele, na qualidade de Prefeito,
deveria respeitar a vontade do Poder Legislativo. Além disso, aplicou-se a majorante
do § 1º do art. 297 do CP. Esta dosimetria foi feita corretamente? NÃO. Houve bis in
idem. Como a regra do art. 297, § 1º, do CP, estabelece que a pena deve ser aumentada
de um sexto quando o agente for funcionário público e cometer o crime prevalecendo-
se do cargo, essa circunstância deveria ser considerada apenas por ocasião da
majorante, na terceira fase da dosimetria e não na primeira fase.

22. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PARTICULAR


22.1. Falsidade de contrato social para ocultar o verdadeiro sócio – (Info 758) –
IMPORTANTE!!! – (TJSP-2018)

O contrato social de uma sociedade empresária é documento particular. Assim, caso


seja falsificado, haverá o crime de falsificação de documento particular (e não de
documento público).
Não se pode condenar o réu pelo crime de uso de documento falso quando ele
próprio foi quem fez a falsificação do documento. A pessoa deverá ser condenada
apenas pela falsidade, e o uso do documento falso configura mero exaurimento do
crime de falso.
STF. 1ª Turma. AP 530/MS, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o acórdão Min.
Roberto Barroso, julgado em 9/9/2014 (Info 758).

23. FALSIDADE IDEOLÓGICA


23.1. Necessidade de prova de que o Prefeito que assinou documentos do Município
tinha ciência inequívoca de que a declaração era falsa – (Info 868)

Prefeito que assina documentos previdenciários com conteúdo parcialmente falso


não deve ser condenado por falsidade ideológica se não foram produzidas provas
de que ele tinha ciência inequívoca do conteúdo inverídico da declaração. Neste
caso, ele deverá ser absolvido, nos termos do art. 386, III, do CPP, por ausência de
dolo, o que exclui o crime.
STF. 1ª Turma. AP 931/AL, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 6/6/2017 (Info 868).

23.2. Pratica falsidade ideológica (art. 299 do CP) o candidato que deixa de
contabilizar despesas em sua prestação de contas no TER – (Info 765)
Determinado Parlamentar federal, quando foi candidato ao Senado, ao entregar a
prestação de contas ao TRE, deixou de contabilizar despesas com banners e cartazes
no valor de 15 mil reais.
O STF considerou que havia indícios suficientes para receber a denúncia contra ele
formulada e iniciar um processo penal para apurar a prática do crime de falsidade
ideológica (art. 299 do CP).
STF. 1ª Turma. Inq 3767/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 28/10/2014 (Info
765).

24. CRIME DE ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO


AUTOMOTOR (ART. 311 DO CP)
24.1. Colocação de fita adesiva ou isolante para alterar o número ou as letras da placa
do carro

Segundo a jurisprudência atual do STJ e do STF, a conduta de colocar uma fita


adesiva ou isolante para alterar o número ou as letras da placa do carro e, assim,
evitar multas, pedágio, rodízio etc, configura o delito do art. 311 do CP.
STF. 2ª Turma. RHC 116371/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 13/8/2013.

25. PECULATO
25.1. STF recebeu denúncia contra o Senador Renan Calheiros em razão de ter
desviado recursos públicos da verba parlamentar para pagamento de pensão
alimentícia à filha – (Info 849)

O MP ofereceu denúncia contra o Senador Renan Calheiros pelas seguintes


condutas:
 o denunciado teria desviado recursos públicos da chamada verba
indenizatória (destinada a despesas relacionadas ao exercício do mandato
parlamentar) para pagar pensão alimentícia à filha. Com isso, teria praticado
peculato (art. 312 do CP).
 além disso, ele teria inserido e feito inserir, em documentos públicos e
particulares, informações diversas das que deveriam ser escritas, com o
propósito de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante (sua
capacidade financeira para custear despesas da referida pensão). Isso
porque o parlamentar, ao prestar contas dos valores recebidos a título de
verba indenizatória, teria apresentado notas fiscais fictícias, ou seja, de
serviços que não teriam sido prestados. Ademais, ele teria apresentado
livros-caixa de suas atividades como pecuarista com informações
supostamente falsas. Por conta desses fatos, foi denunciado pelos crimes de
falsidade ideológica (art. 299) e de uso de documento falso (art. 304).
Quanto ao art. 312 do CP, a denúncia foi recebida porque o STF entendeu estarem
presentes indícios de autoria e materialidade minimamente suficientes.
No que tange aos arts. 299 e 304 do CP, a denúncia foi rejeitada em virtude de os
delitos imputados estarem prescritos.
STF. Plenário. Inq 2593/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 1º/12/16 (Info 849).

25.2. Deputado Federal que utiliza do trabalho de assessor parlamentar para


serviços particulares pratica crime de peculato? – (Info 834)
O servidor público (ex: um Deputado Federal) que se utiliza do trabalho de outro
servidor público (ex: assessor parlamentar) para lhe prestar serviços particulares
pratica crime de peculato (art. 312 do CP)?
Situação 1. Servidor público que se utiliza da mão-de-obra de outro servidor
público (normalmente seu subordinado) para, em determinados momentos, fazer
com que este preste serviços particulares a ele. Esta conduta não configura peculato
nem qualquer outro crime. Nesse sentido: STF. 1ª Turma. Inq 3776, Rel. Min. Rosa
Weber, julgado em 07/10/2014. Atenção: se o indivíduo que se utilizou do servidor
público for Prefeito, ele cometerá o delito do art. 1º, II, do DL 201/67.

Situação 2. Servidor público que utiliza a Administração Pública para pagar o


salário de empregado particular. Aqui o chefe contrata um indivíduo supostamente
para ser servidor público (cargo comissionado), mas, na verdade, ele manda que a
pessoa contratada preste exclusivamente serviços particulares ao seu superior. Esta
conduta, em tese, configura peculato. Isso porque o dinheiro público está sendo
desviado para o pagamento de um "servidor" que, formalmente está vinculado à
Administração Pública, mas que, na prática, apenas executa serviços para outro
servidor público no interesse particular deste último.

Caso concreto: o Deputado Federal Celso Russomanno (PRB-SP) contratou para o


cargo de secretária parlamentar, com remuneração paga pela Câmara dos
Deputados, a senhora "SJ". Ocorre que, de acordo com a acusação, "SJ" trabalhava,
na verdade, não na Câmara, mas sim na produtora de vídeo do Deputado, em São
Paulo. Assim, para o MP, o Deputado utilizou a assessora para o exercício de
atividade privada, embora recebendo pelos cofres públicos. A 2ª Turma do STF
absolveu o réu. Segundo ficou decidido, "SJ", ainda que tenha exercido algumas
atividades de interesse particular do Deputado na produtora, dedicou-se
preponderantemente ao cargo de secretária parlamentar no escritório político de
Celso Russomano em São Paulo, atendendo cidadãos que se sentiam lesados em
suas relações de consumo. Assim, a prova dos autos demonstrou que “SJ” exercia
as atribuições inerentes ao cargo de assessora parlamentar, ainda que também,
algumas vezes, desempenhasse outras atividades no estrito interesse particular do
parlamentar. Dessa forma, pela prova colhida, a conduta do Deputado foi
penalmente atípica, uma vez que consistiu no uso de funcionário público que, de
fato, exercia as atribuições inerentes ao seu cargo para, também, prestar outros
serviços de natureza privada. Em outras palavras, o caso de Russomano se
enquadrou na situação 1 acima explicada.
STF. 2ª Turma. AP 504/DF, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min. Dias
Toffoli, j. 9/8/2016 (Info 834).
OBS:
Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor
ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que
tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito
próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

Usar servidor público em atividade privada X usar a Administração para pagar


salário de empregado privado: Existe, portanto, diferença entre usar funcionário
público em atividade privada e usar a Administração Pública para pagar salário de
empregado particular. O primeiro é conduta atípica (salvo para o Prefeito). O segundo
configura peculato.
A utilização dos serviços de um funcionário público por outro funcionário público no
seu interesse particular não é conduta típica na órbita penal, por não encontrar perfeita
subsunção ao art. 312 do CP.
Este tipo penal descreve como criminosa a conduta consistente em apropriar-se ou
desviar em proveito próprio ou alheio "dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel",
público ou particular.
A utilização, em proveito próprio ou alheio, dos serviços executados por quem é
remunerado pelos cofres públicos não se configura em desvio ou apropriação de bem
móvel. Não se pode, sob pena de malferir o princípio da taxatividade (art. 5º, XXXIX,
da CF/88) ampliar o tipo penal para situações que estritamente não se amoldem a ele.
Situação diversa ocorre quando o dinheiro público é desviado para o pagamento de
empregado que, apenas formalmente, está vinculado à Administração Pública, mas
que, na verdade, desempenha e executa serviços para outro servidor público no
interesse particular deste último.
O objeto material do peculato, nessas situações, é o valor desviado para o pagamento
do salário.
Nessas hipóteses, tem-se um pseudo funcionário público, que, na verdade, é um
empregado privado de um outro funcionário, o qual está formalmente na condição de
funcionário apenas como meio para o desvio do dinheiro público utilizado no
pagamento de seus salários.
(STF. 1ª Turma. Inq 3776, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 07/10/2014)

26. CORRUPÇÃO PASSIVA


26.1. Pratica corrupção passiva o Deputado que concede apoio político à
permanência de Diretor da Petrobrás em troca do recebimento de propina – (Info 904)
– IMPORTANTE!!!

Determinado Deputado Federal integrava a cúpula de um partido de sustentação


do governo federal.
Como importante figura partidária, ele exercia pressão política junto à Presidência
da República a fim de que Paulo Roberto Costa fosse mantido como Diretor de
Abastecimento da Petrobrás.
Como “contraprestação” por esse apoio, o Deputado recebia dinheiro do referido
Diretor, quantia essa oriunda de contratos ilegais celebrados pela Petrobrás.
O STF entendeu que esta conduta se enquadra no crime de corrupção passiva (art.
317 do CP).
Obs: foi a primeira condenação do STF envolvendo a chamada “operação Lava
Jato”.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/5/2018 (Info 904).
OBS:
A situação concreta foi a seguinte: O Deputado Federal Nelson Meurer (PP/PR)
integrava a cúpula do Partido Progressista (PP). Como importante figura partidária,
ele exercia pressão política junto à Presidência da República a fim de que Paulo
Roberto Costa fosse mantido como Diretor de Abastecimento da Petrobrás. Como
“contraprestação” por esse apoio, o Deputado recebia dinheiro do referido Diretor,
quantia essa oriunda de contratos ilegais celebrados pela Petrobrás. Essa prática foi
revelada pelo próprio Paulo Roberto Costa em declaração prestada no bojo de acordo
de colaboração premiada. O Deputado foi denunciado pela prática de corrupção
passiva (art. 317 do CP) e também por lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/98).
O que o STF decidiu? O STF condenou o réu pela prática dos delitos. O delito de
lavagem de dinheiro, será apreciado em tópico separado.

E quanto ao crime de corrupção passiva, o que decidiu o STF? O STF entendeu que a
conduta descrita se enquadra no crime de corrupção passiva (art. 317 do CP):
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou
indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-
la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar
promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.

O regime presidencialista brasileiro confere aos parlamentares um poder que vai


além da elaboração e votação de lei e outros atos normativos. Os parlamentares
possuem intensa participação nas decisões de governo, inclusive por meio da
indicação de cargos no Poder Executivo. Essa dinâmica é própria do sistema
presidencialista brasileiro, que exige uma coalizão para viabilizar a governabilidade.
Trata-se do chamado “presidencialismo de coalizão”.

Não se pode esquecer, contudo, que a Constituição Federal atribui ao Congresso


Nacional competência para fiscalizar e controlar os atos do Poder Executivo,
incluídos os da Administração Indireta (art. 49, X, da CF/88). Vale lembrar, inclusive,
que o Congresso Nacional possui poderes próprios de autoridade judicial quando
instituídas comissões parlamentares de inquérito para apuração de fatos
determinados (art. 58, § 3º).

Ademais, para evitar conflitos de interesses, os Deputados e Senadores são


proibidos de:
a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito
público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia
mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo
quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes; e
b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado,
inclusive os de que sejam demissíveis "ad nutum", nas
entidades constantes da alínea anterior.

Isso demonstra que os parlamentares devem manter independência em relação ao


Poder Executivo para o exercício de suas atribuições. Nesse contexto, se um
parlamentar recebe vantagens indevidas em troca de sustentação política a um diretor
da Petrobrás, isso significa evidente omissão em sua função de fiscalizar a lisura dos
atos do Poder Executivo.

O exercício ilegítimo da atividade parlamentar, mesmo num governo de coalizão, é


apto a caracterizar o crime de corrupção passiva. Esse tipo penal tutela a moralidade
administrativa e tem por finalidade coibir e reprimir a mercancia da função pública,
cujo exercício deve ser pautado exclusivamente pelo interesse público.

O STF afastou o argumento da defesa de que se estaria “criminalizando a atividade


político-partidária”. Não é nada disso. A atividade política continua sendo
permitida, sendo lícito que partidos políticos apoiem determinada pessoa para os
cargos de destaque do governo (exs: ministérios, diretorias etc.). O que se está
punindo, neste caso, são atos que transbordaram os limites do exercício legítimo do
mandato, ou seja, puniu-se um Deputado que recebia propina para dar sustentação
política a um Diretor de estatal.

Provas: No caso concreto, o réu foi delatado por Paulo Roberto Costa. No entanto, o
STF afirmou que não estava condenando o réu apenas com base nas declarações do
colaborador. Isso porque tais declarações, de forma isolada, não servem para
fundamentar um decreto condenatório (art. 4º, § 16, da Lei nº 12.850/2013). O STF
afirmou que os fatos retratados encontram consistente suporte em outros elementos
de prova (cruzamento de dados de companhias aéreas; afastamento de sigilo bancário;
perícias em sistemas de contabilidade de pagamentos de propina; depoimentos de
testemunhas; e quebra e disponibilização de dados telefônicos), produzidos sob o
crivo do contraditório. Esse conjunto de provas atesta e reforça a veracidade das
declarações prestadas no âmbito de colaboração premiada e autoriza a sua utilização
como fundamento à resolução do mérito da causa penal.

Lavagem de dinheiro: O Deputado também foi denunciado pela prática de lavagem


de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/98).

Inicialmente, o STF afirmou que o réu não cometeu o crime quando recebeu o
pagamento das propinas em espécie (em “dinheiro vivo”). O mero recebimento de
valores em dinheiro não tipifica o delito de lavagem, seja quando recebido pelo
próprio agente público, seja quando recebido por interposta pessoa.

Por outro lado, o STF entendeu que o Deputado praticou a lavagem pelo fato de ter
recebido a propina em depósitos bancários fracionados, em valores que não
atingem os limites estabelecidos pelas autoridades monetárias à comunicação
compulsória dessas operações. Ex: suponhamos que, na época, a autoridade bancária
dizia que todo depósito acima de R$ 20 mil deveria ser comunicado ao COAF; diante
disso, o Deputado recebia depósitos periódicos de R$ 19 mil para burlar essa regra.
Para o STF, isso configura o crime de lavagem. Trata-se de uma forma de ocultação da
origem e da localização da vantagem pecuniária recebida pela prática do crime
anterior.

Além disso, a apresentação de informações falsas em declarações de ajuste anual de


imposto de renda foi uma forma de tentar dar um ar de licitude a patrimônio
oriundo de práticas delituosas.

Efeitos da condenação: Em relação aos efeitos da condenação, o STF condenou o réu


a pagar danos materiais, mas negou pedido do Ministério Público para condená-lo
em danos morais coletivos.

27. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA


27.1. Denunciação caluniosa exige dolo direto do agente – (Info 753)

Para configuração do delito de denunciação caluniosa, exige-se que o agente saiba


que a pessoa é inocente, ou seja, é necessário dolo direto.
O simples fato de a pessoa “investigada” ou “denunciada” ter sido absolvida não
significa que o autor da “denúncia” deverá responder por denunciação caluniosa,
sendo necessário comprovar a sua má-fé, ou seja, que a sua única intenção era a de
atribuir fato criminoso a pessoa que ele sabia ser inocente.
STF. 1ª Turma. Inq 3133/AC, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 5/8/2014 (Info 753).

28. DESCAMINHO
28.1. Descaminho é crime formal

O descaminho é crime tributário FORMAL. Logo, para que seja proposta ação penal
por descaminho não é necessária a prévia constituição definitiva do crédito
tributário.
Não se aplica a Súmula Vinculante 24 do STF.
O crime se consuma com a simples conduta de iludir o Estado quanto ao pagamento
dos tributos devidos quando da importação ou exportação de mercadorias.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.343.463-BA, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, j.
20/3/14 (Info 548).
STF. 2ª Turma. HC 122325, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 27/05/2014.

É dispensada a existência de procedimento administrativo fiscal com a posterior


constituição do crédito tributário para a configuração do crime de descaminho (art.
334 do CP), tendo em conta sua natureza formal.
STF. 1ª Turma. HC 121798/BA, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 29/5/2018 (Info 904).
OBS:
O delito de descaminho está previsto no art. 334 do Código Penal com a seguinte
redação:
Art. 334. Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito
ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo
de mercadoria:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

O descaminho é crime tributário material? Para o ajuizamento da ação penal é


necessária a constituição definitiva do crédito tributário? Aplica-se a Súmula
Vinculante 24 ao descaminho? NÃO. Tanto o STJ como o STF entendem que o
descaminho é crime tributário FORMAL. Logo, para que seja proposta ação penal
por descaminho não é necessária a prévia constituição definitiva do crédito tributário.

Não se aplica a Súmula Vinculante 24 do STF:


Súmula vinculante 24-STF: Não se tipifica crime material
contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º, incisos I a IV,
da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.

29. DESACATO
29.1. Desacato continua sendo crime – (Info 894)

O crime de desacato é compatível com a Constituição Federal e com o Pacto de São


José da Costa Rica.
A figura penal do desacato não tolhe o direito à liberdade de expressão, não
retirando da cidadania o direito à livre manifestação, desde que exercida nos
limites de marcos civilizatórios bem definidos, punindo-se os excessos.
STF. 2ª Turma. HC 141949/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13/3/2018 (Info 894).
Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela continua a
ser crime, conforme previsto no art. 331 do Código Penal.
STJ. 3ª Seção. HC 379.269-MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Rel. para
acórdão Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 24/5/17 (Info 607).
OBS:
Previsão do desacato no direito brasileiro:
O Código Penal prevê o crime de desacato no art. 331:
Art. 331. Desacatar funcionário público no exercício da função
ou em razão dela:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

Código Penal Militar: O Código Penal Militar tipifica o desacato em três artigos:
 Art. 298: pune o desacato cometido por militar contra outro militar de
hierarquia superior;
 Art. 299: pune o desacato cometido por qualquer pessoa contra militar no
exercício de função de natureza militar ou em razão dela;
 Art. 300: pune o desacato cometido contra funcionário civil no exercício de
função ou em razão dela, em lugar sujeito à administração militar.

Algumas características desse delito:


 Desacatar significa "menosprezar a função pública exercida por determinada
pessoa. Em outras palavras, ofende-se o funcionário público com a finalidade
de humilhar a dignidade e o prestígio da atividade administrativa."
(MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. 4ª ed., São Paulo: Método, 2014,
p. 748).
 O delito de desacato, quer conforme tipificado na legislação penal comum,
quer na militar, tem por sujeito passivo secundário o funcionário público
(civil ou militar), figurando o Estado como sujeito passivo principal.
 O bem jurídico tutelado é a Administração Pública, levando-se em conta seu
interesse patrimonial e moral. A vítima primária deste delito é o Estado. O
servidor ofendido é apenas o sujeito passivo secundário. A tutela penal está
no interesse em se assegurar o normal funcionamento do Estado, protegendo-
se o prestígio do exercício da função pública.
 O destinatário da proteção legal é mais a função pública do que a pessoa (civil
ou militar). Portanto, para a configuração do crime, não é necessário que o
funcionário público se sinta ofendido, sendo indispensável que o menoscabo
tenha alvo certo, de forma que a vítima deve ouvir a palavra injuriosa ou sofrer
diretamente o ato.
 É essencial para a configuração do delito que o funcionário público esteja no
exercício da função, ou, estando fora, que a ofensa seja empregada em razão
dela. Deve, pois, haver o chamado nexo funcional. A crítica ou a censura sem
excessos, por sua vez, não constituem desacato, ainda que veementes.

Convenção Americana de Direitos Humanos: O Brasil é signatário da Convenção


Americana de Direitos Humanos, que ficou conhecida como "Pacto de São José da
Costa Rica". Neste tratado internacional, promulgado pelo Decreto nº 678/92, foi
previsto como um dos direitos ali consagrados a liberdade de expressão. Confira:
Artigo 13. Liberdade de pensamento e de expressão
1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de
expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar,
receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem
consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em
forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo
de sua escolha.
2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não
pode estar sujeito a censura prévia, mas a responsabilidades
ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei e ser
necessárias para assegurar:
a. o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas;
ou
b. a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da
saúde ou da moral públicas.
3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou
meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou
particulares de papel de imprensa, de frequências
radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na
difusão de informação, nem por quaisquer outros meios
destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e
opiniões.
4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura
prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles,
para proteção moral da infância e da adolescência, sem
prejuízo do disposto no inciso 2.
5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem
como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que
constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou
à violência.

Comissão Interamericana de Direitos Humanos: Há muitos anos, a Comissão


Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) vem decidindo que a criminalização do
desacato contraria o artigo 13 do Pacto de San José da Costa Rica. Em 1995, a Comissão
afirmou que as leis de desacato se prestam ao abuso, como meio para silenciar ideias
e opiniões consideradas incômodas pelo establishment, bem assim proporcionam
maior nível de proteção aos agentes do Estado do que aos particulares, em
contravenção aos princípios democrático e igualitário (CIDH, Relatório sobre a
compatibilidade entre as leis de desacato e a Convenção Americana sobre Direitos
Humanos, OEA/Ser. L/V/II.88, doc. 9 rev., 17 de fevereiro de 1995, 197-212). Em 2000,
a CIDH aprovou a Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão, onde
reafirmou sua posição sobre a invalidade da tipificação do desacato:
"11. Os funcionários públicos estão sujeitos a um maior
controle por parte da sociedade. As leis que punem a
manifestação ofensiva dirigida a funcionários públicos,
geralmente conhecidas como 'leis de desacato', atentam contra
a liberdade de expressão e o direito à informação."

Em suma, para a CIDH, as leis de desacato restringem indiretamente a liberdade de


expressão, porque carregam consigo a ameaça do cárcere ou multas para aqueles que
insultem ou ofendam um funcionário público. Por essa razão, este tipo penal
(desacato) é inválido, por contrariar o artigo 13 da Convenção Americana de Direitos
Humanos.
O STJ acolhe esta tese? O desacato deixou de ser crime no ordenamento jurídico
brasileiro por força do Pacto de San Jose da Costa Rica? NÃO. O STJ, apreciando um
caso envolvendo o art. 331 do Código Penal, decidiu que:
Desacatar funcionário público no exercício da função ou em
razão dela continua a ser crime, conforme previsto no art. 331
do Código Penal.
STJ. 3ª Seção. HC 379.269-MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da
Fonseca, Rel. para acórdão Min. Antônio Saldanha Palheiro,
julgado em 24/5/2017 (Info 607).

Desacato não viola a liberdade de expressão: A figura penal do desacato não


prejudica a liberdade de expressão, pois não impede o cidadão de se manifestar,
“desde que o faça com civilidade e educação”. A responsabilização penal por
desacato existe para inibir excessos e constitui uma salvaguarda para os agentes
públicos, expostos a todo tipo de ofensa no exercício de suas funções.

Descriminalizar o desacato não traria benefícios porque o fato constituiria injúria: A


exclusão do desacato como tipo penal não traria benefício concreto para o julgamento
dos casos de ofensas dirigidas a agentes públicos. Isso porque, com o fim do crime de
desacato, as ofensas a agentes públicos passariam a ser tratadas pelos tribunais
como injúria (art. 140 do CP), crime para o qual a lei já prevê um acréscimo de 1/3
da pena quando a vítima é servidor público (art. 141, II).

Corte IDH admite que excessos na liberdade de expressão sejam punidos: Apesar de a
posição da Comissão Interamericana de Direitos Humanos ser contrária à
criminalização do desacato, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão que
efetivamente julga os casos envolvendo indivíduos e estados, já deixou claro em mais
de um julgamento que o Direito Penal pode punir as condutas que representem
excessos no exercício da liberdade de expressão. Assim, o Poder Judiciário brasileiro
deve continuar a repudiar reações arbitrárias eventualmente adotadas por agentes
públicos, punindo pelo crime de abuso de autoridade quem, no exercício de sua
função, reagir de modo autoritário a críticas e opiniões que não constituam excesso
intolerável do direito de livre manifestação do pensamento.

E o STF? O STF, ao julgar uma situação envolvendo civil acusado de desacato contra
militar (art. 299 do CPM), também entendeu no mesmo sentido do STJ e decidiu que:
O crime de desacato é compatível com a Constituição Federal
e com o Pacto de São José da Costa Rica.
A figura penal do desacato não tolhe o direito à liberdade de
expressão, não retirando da cidadania o direito à livre
manifestação, desde que exercida nos limites de marcos
civilizatórios bem definidos, punindo-se os excessos.
STF. 2ª Turma. HC 141949/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes,
julgado em 13/3/2018 (Info 894).

Natureza do Pacto de São José da Costa Rica: Os tratados de direitos humanos podem
ser:
a) equivalentes às emendas constitucionais, se aprovados
após a EC 45/2004 e conforme os requisitos do § 3º do art. 5º
da CF/88; ou
b) supralegais, se aprovados antes da EC 45/2004 e sem os
requisitos do § 3º do art. 5º da CF/88.

De toda forma, estando acima das normas infraconstitucionais, são também


paradigma de controle da produção normativa. O Pacto de São José da Costa Rica
possui, portanto, status supralegal, estando hierarquicamente acima das leis, mas
abaixo da Constituição Federal.

Desacato não é incompatível com o Pacto de São José da Costa Rica: Ao se ler o Pacto
de São José da Costa Rica não se identifica uma incompatibilidade do crime de
desacato em relação a esse tratado. Assim, o tratado não revogou a norma penal,
tendo havido a recepção do crime de desacato pela regra supralegal (Pacto de São
José). O texto do Pacto dispõe que o exercício do direito à liberdade de pensamento
e de expressão, embora não sujeito a censura prévia, deve assumir
responsabilidades ulteriores, expressamente fixadas em lei, para assegurar o
respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas. Portanto, o Pacto impõe sim
limites à liberdade de expressão, não tendo havido descriminalização do crime de
desacato ou “abolitio criminis”. A forma como a liberdade de expressão foi tratada
no Pacto de São José é parecida com a disciplina dada pela Constituição Federal ao
tema, sendo que esse direito não possui caráter absoluto. Vale ressaltar que a
Constituição, ao tutelar a honra, a intimidade e a dignidade da pessoa humana,
também recepcionou o crime de desacato na forma como prevista em nossa legislação
penal.

Direito à liberdade de expressão não é absoluto: O direito à liberdade de expressão


deve harmonizar-se com os demais direitos envolvidos, não eliminá-los. Incide o
princípio da concordância prática, pelo qual o intérprete deve buscar a conciliação
entre normas constitucionais. O exercício abusivo das liberdades públicas não se
coaduna com o Estado democrático. A ninguém é lícito usar sua liberdade de
expressão para ofender a honra alheia. O desacato constitui importante instrumento
de preservação da lisura da função pública e, indiretamente, da dignidade de quem
a exerce. Não se pode despojar a pessoa de um dos mais delicados valores
constitucionais, a dignidade da pessoa humana, em razão do “status” de funcionário
público (civil ou militar). O fato de o indivíduo ter se investido em uma função
pública não significa que ele tenha renunciado à sua honra e à sua dignidade.

Corte Interamericana de Direitos Humanos: Vale ressaltar que a Corte Interamericana


de Direitos Humanos, órgão responsável pelo julgamento de situações concretas de
abusos e violações de direitos humanos, tem, reiteradamente, decidido
contrariamente ao entendimento da Comissão de Direitos Humanos, estabelecendo
que o direito penal pode sim punir condutas excessivas no exercício da liberdade de
expressão.

Desacato não tolhe a liberdade de expressão: A figura penal do desacato não tolhe o
direito à liberdade de expressão, não retirando da cidadania o direito à livre
manifestação, desde que exercida nos limites de marcos civilizatórios bem
definidos, punindo-se os excessos. A Constituição impõe à Administração a
observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência, podendo-se dessumir daí a compatibilidade entre a defesa da honra e
intimidade do funcionário público e a liberdade de expressão.
Não se aplica a teoria da adequação social: Não se pode aplicar ao caso o princípio
da adequação social. O princípio da adequação social, desenvolvido por Hanz Welzel,
afasta a tipicidade dos comportamentos que são aceitos e considerados adequados ao
convívio social. De acordo com o referido princípio, os costumes aceitos por toda a
sociedade afastam a tipicidade material de determinados fatos que, embora possam
se subsumir a algum tipo penal, não caracterizam crime justamente por estarem de
acordo com a ordem social em um determinado momento histórico. Havendo lei,
ainda que deficitária, punindo o abuso de autoridade, pode-se afirmar que a
criminalização do desacato se mostra ainda compatível com o Estado democrático.

30. FUNCIONÁRIO PÚBLICO


30.1. Causa de aumento do art. 327, § 2º, do CP – (Info 816)

O simples fato de o réu exercer um mandato popular não é suficiente para fazer
incidir a causa de aumento do art. 327, § 2º, do CP. É necessário que ele ocupe uma
posição de superior hierárquico (o STF chamou de "imposição hierárquica").
STF. Plenário. Inq 3983/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 02 e 03/03/2016
(Info 816).

30.2. Causa de aumento do art. 327, § 2º do CP – (Info 757)

A causa de aumento de pena prevista no § 2º do art. 327 do CP aplica-se ao Chefe


do Poder Executivo (ex: Governador do Estado) e aos demais agentes políticos.
STF. Plenário. Inq 2606/MT, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 4/9/2014 (Info 757).
OBS:
Essa causa de aumento aplica-se também para agentes políticos detentores de
mandato eletivo? SIM. É o caso, por exemplo, de um Governador do Estado que,
valendo-se de seu cargo, pratique crime contra a Administração Pública. Como ele
desempenha uma função de direção do Estado, contra ele incidirá a causa de aumento
do § 2º do art. 327 do CP.

30.3. Agentes detentores de mandato eletivo (agentes políticos)

A causa de aumento prevista no § 2º do art. 327 do Código Penal é aplicada aos


agentes detentores de mandato eletivo (agentes políticos).
STF. 2ª Turma. RHC 110513/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 29/5/2012.

31. CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


31.1. CRIMES FUNCIONAIS: Diretor de organização social é considerado
funcionário público por equiparação para fins penais – (Info 915) – IMPORTANTE!!!

O diretor de organização social pode ser considerado funcionário público por


equiparação para fins penais (art. 327, § 1º do CP). Isso porque as organizações
sociais que celebram contratos de gestão com o Poder Público devem ser
consideradas “entidades paraestatais”, nos termos do art. 327, § 1º do CP.
STF. 1ª Turma. HC 138484/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 11/9/18 (Info 915).
OBS:
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS
O que são as organizações sociais? São pessoas jurídicas de direito privado, sem fins
lucrativos, prestadoras de atividades de interesse público e que, por terem
preenchido determinados requisitos previstos na Lei 9.637/98, recebem a qualificação
(título, selo) de “organização social”. A pessoa jurídica, depois de obter esse título de
“organização social”, poderá celebrar com o Poder Público um instrumento chamado
de “contrato de gestão” por meio do qual receberá incentivos públicos para
continuar realizando suas atividades. As regras relacionadas com as organizações
sociais estão previstas na Lei nº 9.637/98. Veja o que diz o art. 1º:
Art. 1º O Poder Executivo poderá qualificar como
organizações sociais pessoas jurídicas de direito privado, sem
fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à
pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à
proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde,
atendidos aos requisitos previstos nesta Lei.

Quem concede a qualificação de OS? O Ministro do Planejamento em conjunto com


o Ministro da área na qual atua a pessoa jurídica que pretende a qualificação de OS.
Ex: se essa pessoa jurídica desempenha funções na área de educação, quem concederá
será o Ministro da Educação em conjunto com o Ministro do Planejamento.

O que é o contrato de gestão? Contrato de gestão é o instrumento firmado entre o


Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com o objetivo de
que, a partir daí, seja formada uma parceria entre eles para fomento e execução das
atividades que uma OS faz (ensino, pesquisa científica etc.). No contrato de gestão
serão listadas as atribuições, responsabilidades e obrigações do Poder Público e da
organização social. O contrato de gestão deve ser submetido ao Ministro de Estado da
área correspondente à atividade fomentada. Ex: se a OS desenvolve atividades de saúde,
quem aprovará o contrato será o Ministro da Saúde.

Obs.1: apesar de a lei dizer que esse ajuste é um “contrato”, a doutrina critica a
nomenclatura e afirma que, na verdade, o melhor seria chamá-lo de convênio, termo
de colaboração ou termo de fomento. Isso porque no contrato existem interesses
opostos e, nessa relação da OS com o Poder Público, os objetivos são os mesmos, são
convergentes.

Obs.2: os responsáveis pela fiscalização do contrato de gestão, ao tomarem


conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade na utilização de recursos
ou bens de origem pública por organização social, deverão comunicar o Tribunal de
Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária.

As organizações sociais que celebrarem contrato de gestão com o Poder Público


passam a ser consideradas entidades da Administração Pública? NÃO. Mesmo tendo
celebrado contrato de gestão, continuam sendo entidades paraestatais (não estatais).

As organizações sociais que celebrarem contrato de gestão com o Poder Público


podem ser consideradas delegatárias de serviços públicos? NÃO. As organizações
sociais exercem, em nome próprio, serviços públicos, mas não são consideradas
delegatárias, tendo em vista que não recebem uma concessão ou permissão de
serviço do Poder Público. Os setores de saúde, educação, cultura, desporto e lazer,
ciência e tecnologia e meio ambiente são classificados como serviços públicos sociais.
Segundo a CF/88, tais serviços devem ser desempenhados não apenas pelo Estado,
como também pela sociedade (são “deveres do Estado e da Sociedade”). Assim, é
permitida a atuação, por direito próprio, dos particulares, sem que para tanto seja
necessária a delegação pelo Poder Público. Não se aplica, portanto, o art. 175, “caput”,
da CF/88 às atividades desenvolvidas pelas organizações sociais.

Quais são os incentivos que uma OS recebe do Poder Público? As organizações sociais
poderão receber os seguintes incentivos para cumprir o contrato de gestão:
a) Recursos orçamentários: podem receber “dinheiro
público”;
b) Cessão de bens públicos, mediante permissão de uso,
dispensada licitação: podem receber, sem licitação, bens
públicos para serem usados em suas atividades;
c) Cessão especial de servidor, com ônus para o órgão de
origem do servidor cedido: servidores públicos podem ser
colocados à disposição das organizações sociais para lá
trabalharem, continuando recebendo sua remuneração dos
cofres públicos;
d) Contratadas sem licitação: as organizações sociais podem
ser contratadas, com dispensa de licitação, para prestarem
serviço a órgãos e entidades da Administração Pública,
recebendo por isso (art. 24, XXIV, da Lei nº 8.666/93). Desse
modo, quando a Administração contratar serviços a serem
prestados pelas organizações sociais, está dispensada de
realizar licitação, desde que aquela atividade esteja prevista
no contrato de gestão.

CONCEITO DE FUNCIONÁRIO PÚBLICO PARA EFEITOS PENAIS: O CP prevê


diversos crimes que são praticados por “funcionários públicos” contra a
Administração em geral (arts. 312 a 326). Repare que o CP utilizou a nomenclatura
“funcionário público” e não “servidor público” ou “agente público”, expressões que
são atualmente preferidas pelo Direito Administrativo. A fim de que não houvesse
muita dúvida sobre o que é funcionário público, o Código Penal resolveu conceituar
essa expressão no art. 327. No caput, há o conceito padrão de funcionário público e,
no § 1º, o chamado “funcionário público por equiparação”:
Funcionário público
Art. 327. Considera-se funcionário público, para os efeitos
penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração,
exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo,
emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha
para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada
para a execução de atividade típica da Administração Pública.
(...)

Imagine agora a seguinte situação hipotética: O “Instituto de Solidariedade” é uma


organização social que celebrou contrato de gestão com a Administração Pública do
Distrito Federal. João é diretor do Instituto de Solidariedade. A referida organização
social recebeu R$ 300 mil do Governo do DF para prestar serviços de assistência social
a pessoas carentes. Ocorre que João desviou parte dessa quantia em proveito próprio.
Diante disso, o Ministério Público denunciou o agente pela prática de peculato-
desvio, delito tipificado no art. 312 do CP:
Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro,
valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de
que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito
próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

Segundo o Parquet, João deveria ser considerado funcionário público por


equiparação, nos termos do art. 327, § 1º do CP. A defesa do réu refutou essa afirmação
e alegou que João não poderia ser enquadrado no art. 327, § 1º, porque ele era diretor
em um instituto que possui natureza jurídica de “organização social” e as
organizações sociais não fazem parte da Administração Pública nem podem ser
consideradas entidades paraestatais. Para a defesa, o conceito de entidade paraestatal
deve ser interpretado conforme o art. 84, § 1º, da Lei nº 8.666/93, o qual não inclui as
organizações sociais:
Art. 84. Considera-se servidor público, para os fins desta Lei,
aquele que exerce, mesmo que transitoriamente ou sem
remuneração, cargo, função ou emprego público.
§ 1º Equipara-se a servidor público, para os fins desta Lei,
quem exerce cargo, emprego ou função em entidade
paraestatal, assim consideradas, além das fundações,
empresas públicas e sociedades de economia mista, as
demais entidades sob controle, direto ou indireto, do Poder
Público. (...)

Qual das duas argumentações foi acolhida pelo STF? João pode ser considerado
funcionário público por equiparação, nos termos do art. 327, § 1º do CP? SIM. O STF
acolheu a tese do MP.

Organizações sociais que celebram contratos de gestão são consideradas entidades


paraestatais: O STF, adotando lição da Prof. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, entendeu
que as organizações sociais que celebram contratos de gestão devem ser
consideradas “entidades paraestatais”:
“(...) Exatamente por atuarem ao lado do Estado e terem com
ele algum tipo de vínculo jurídico, recebem a denominação de
entidades paraestatais; nessa expressão podem ser incluídas
todas as entidades integrantes do chamado terceiro setor, o
que abrange as declaradas de utilidade pública, as que
recebem certificado de fins filantrópicos, os serviços sociais
autônomos (como Sesi, Sesc, Senai), os entes de apoio, as
organizações sociais e as organizações de sociedade civil de
interesse público.” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito
Administrativo. 27ª ed. Atlas: São Paulo, 2014. p. 566-567).

Luiz Régis Prado posiciona-se no mesmo sentido:


“Entidades paraestatais são pessoas jurídicas de direito
privado, instituídas por lei, ‘para realização de atividades,
obras, serviços de interesse coletivo, sob normas e controle do
Estado’. Inserem-se como modalidades de entidades
paraestatais as empresas públicas, as sociedades de economia
mista, os serviços sociais autônomos e modernamente o que
se denomina ‘terceiro setor’ (entes da sociedade civil de fins
públicos e não lucrativos).” (PRADO, Luiz Régis.
Comentários ao código penal: jurisprudência. Conexões
lógicas com os vários ramos do direito. 11.ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2017. p. 863).

Mas e o art. 84, § 1º, da Lei nº 8.666/93...? Não importa para nada aqui. O art. 84, § 1º,
da Lei nº 8.666/93 tem influência, ou seja, repercute no âmbito administrativo, mas
não constitui parâmetro interpretativo para os crimes definidos no Código Penal.
Para os crimes funcionais, o Código Penal traz uma regra específica no art. 327. Vale
ressaltar que o legislador fez questão de fornecer, no Código Penal, um conceito mais
amplo do que o utilizado no Direito Administrativo. Assim, o conceito de funcionário
público previsto no art. 327 do CP não se confunde com as definições próprias do
direito administrativo. O caput do dispositivo, que serve como referencial
interpretativo dos parágrafos, estabelece que o conceito de funcionário público
agasalhado pelo estatuto é “para os efeitos penais”. Além disso, o título é mais
abrangente do que o geralmente adotado no âmbito do direito administrativo, pois
abarca funções temporárias e não remuneradas. Trata-se, portanto, de um conceito
instrumental concebido pelo legislador unicamente para fins de aplicação da lei
penal. A figura equiparada do § 1º é ainda mais ampla. Considera-se funcionário
público, para fins penais, quem exerce cargo, emprego ou função em entidade
parestatal. Recebe igualmente essa qualificação “quem trabalha para empresa
prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica
da Administração Pública”. Os requisitos não são cumulativos, e sim, disjuntivos.
Isso quer dizer que a acusação não precisa comprovar que a entidade paraestatal
executa atividade típica da Administração Pública.

O art. 327, § 1º, é exemplo de norma penal em branco? NÃO. O art. 327, tanto no caput
como no § 1º, não pode ser considerado como norma penal em branco. Não é
necessário buscar seu complemento em outro ato normativo. Na verdade, o art. 327
do CP é uma norma interpretativa.

VAMOS AGORA REVISAR


SÃO CONSIDERADOS “FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS” PARA FINS PENAIS:
Diretor de organização social: O diretor de organização social pode ser considerado
funcionário público por equiparação para fins penais (art. 327, § 1º do CP). As
organizações sociais que celebram contratos de gestão com o Poder Público são
consideradas “entidades paraestatais”. STF. 1ª Turma. HC 138484/DF, Rel. Min.
Marco Aurélio, julgado em 11/9/2018(Info 915).

Administrador de Loteria: Administrador de Loteria é equiparado a funcionário


público para fins penais porque a Loteria executa atividade típica da Administração
Pública que lhe foi delegada por regime de permissão. STJ. 5ª Turma. AREsp
679.651/RJ, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 11/09/2018.

Advogados dativos: O advogado que, por força de convênio celebrado com o Poder
Público, atua de forma remunerada em defesa dos hipossuficientes agraciados com o
benefício da assistência judiciária gratuita, enquadra-se no conceito de funcionário
público para fins penais. Sendo equiparado a funcionário público, é possível que
responda por corrupção passiva (art. 317 do CP). STJ. 5ª Turma. HC 264.459-SP, Rel.
Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 10/3/2016 (Info 579).
Médico de hospital particular credenciado/conveniado ao SUS (após a Lei 9.983/2000):
Depois da Lei nº 9.983/2000, que alterou o § 1º do art. 327 do CP, o médico credenciado
ao SUS pode ser equiparado a funcionário público para efeitos penais. Vale ressaltar,
no entanto, que a Lei nº 9.983/2000 não pode retroceder alcançar situações praticadas
antes de sua vigência. STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1101423/RS, Rel. Min. Marco
Aurélio Bellizze, julgado em 06/11/2012.

Estagiário de órgão ou entidade públicos: Estagiário de órgão público que, valendo-


se das prerrogativas de sua função, apropria-se de valores subtraídos do programa
bolsa-família subsume-se perfeitamente ao tipo penal descrito no art. 312, § 1º, do
Código Penal (peculato-furto), porquanto estagiário de empresa pública ou de
entidades congêneres se equipara, para fins penais, a servidor ou funcionário público,
em decorrência do disposto no art. 327, § 1º, do Código Penal. STJ. 6ª Turma. REsp
1303748/AC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 25/06/2012.

Cuidado. Depositário judicial NÃO é considerado funcionário público: Depositário


judicial não é funcionário público para fins penais, porque não ocupa cargo público,
mas a ele é atribuído um munus, pelo juízo, em razão do fato de que determinados bens
ficam sob sua guarda e zelo. STJ. 6ª Turma. HC 402.949-SP, Rel. Min. Maria Thereza de
Assis Moura, julgado em 13/03/2018 (Info 623).

31.2. Receber propina sob o disfarce de doações eleitorais oficiais e tipificação penal
– (Info 856)

Determinado Senador solicitou e recebeu de uma construtora R$ 500 mil, valor


destinado à sua campanha política. A quantia foi repassada pela construtora não
diretamente ao Senador, mas sim ao partido político, como se fossem doações
eleitorais oficiais. Ao pedir o valor, o Senador teria se comprometido com a
construtora a manter João como Diretor da Petrobrás.
Isso era de interesse da construtora porque João, em nome da estatal, celebrava
contratos fraudulentos com a empresa. O Senador foi reeleito e, com sua influência
decorrente do cargo, conseguiu manter João na Diretoria.
Em um juízo preliminar, para fins de recebimento da denúncia, o STF entendeu
que a conduta do Senador, em tese, configura a prática dos seguintes crimes:
 Corrupção passiva (art. 317, caput e § 1º, do CP);
 Lavagem de dinheiro (art. 1º, caput, da Lei nº 9.613/98).
STF. 2ª Turma. Inq 3982/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 7/3/2017 (Info 856).
OBS:
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou
indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-
la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar
promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§ 1º A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da
vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de
praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever
funcional.

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,


disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos
ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração
penal.

Segundo entendeu o STF, o repasse de propina ao parlamentar teve por finalidade a


manutenção do Diretor no cargo, fosse pela não interferência nessa nomeação e no
funcionamento do esquema criminoso, fosse pelo apoio político, para sua sustentação,
por parte do parlamentar, forte candidato à reeleição e nome de relevo de partido
político, agremiação partidária da base do Governo Federal e uma das responsáveis
pela Diretoria de Abastecimento da estatal.
A propina foi paga sob o disfarce de doações eleitorais “oficiais” realizadas por
empresa empreiteira que fazia parte do esquema criminoso em questão em favor do
diretório estadual do partido do parlamentar.
Os Ministros entenderam que havia indícios suficientes para o recebimento da
denúncia.

Se condenado, o Senador poderá receber a causa de aumento de pena prevista no art.


327, § 2º do CP? NÃO. O § 2º do art. 327 do CP prevê:
Art. 327 (...)
§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores
dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de
cargos em comissão ou de função de direção ou
assessoramento de órgão da administração direta, sociedade
de economia mista, empresa pública ou fundação instituída
pelo poder público.

Conforme a jurisprudência pacífica do STF:


O simples fato de o réu exercer um mandato popular não é
suficiente para fazer incidir a causa de aumento do art. 327, §
2º, do CP. É necessário que ele ocupe uma posição de superior
hierárquico (o STF chama de "imposição hierárquica").
STF. 2ª Turma. Inq 3982/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado
em 7/3/2017 (Info 856).

No caso concreto, o Senador não exercia função de superior hierárquico na Petrobrás,


de forma que não se deve aplicar a referida causa de aumento.

31.3. Empréstimos consignados retidos pelo Município e dinheiro utilizado para


pagamento de despesas da Administração, sem repasse ao banco mutuante – (Info 826)

Diversos servidores municipais tinham empréstimos consignados cujos valores


eram descontados da folha de pagamento. O Prefeito ordenou que fosse feita a
retenção, mas que tais valores não fossem repassados à instituição e sim gastos com
o pagamento de despesas do Município. Isso foi feito no último ano do mandato
do Prefeito, quando não havia mais recursos para pagar o banco, o que só foi feito
no mandato seguinte.
O STF entendeu que, nesta situação, restou configurada a prática de dois delitos:
arts. 312 e 359-C do Código Penal.
STF. 1ª Turma. AP 916/AP, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 17/5/16 (Info 826).
OBS:
Peculato-desvio, delito previsto no art. 312 do CP e também do art. 359-C do CP:
Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor
ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que
tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito
próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

Art. 359-C. Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação, nos


dois últimos quadrimestres do último ano do mandato ou
legislatura, cuja despesa não possa ser paga no mesmo
exercício financeiro ou, caso reste parcela a ser paga no
exercício seguinte, que não tenha contrapartida suficiente de
disponibilidade de caixa:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

31.4. Desvio de recursos de convênio e sua aplicação em finalidade diversa – (Info


813)

Secretária de Estado que desvia verbas de convênio federal que tinha destinação
específica e as utiliza para pagamento da folha de servidores não pratica o crime de
peculato (art. 312 do CP), mas sim o delito de emprego irregular de verbas ou rendas
públicas (art. 315).
STF. 2ª Turma. Inq 3731/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/2/2016 (Info
813).
OBS: A 2ª Turma do STF rejeitou a alegação de prática de peculato, uma vez que os
recursos desviados foram incorporados ao Tesouro estadual, não havendo utilização
em proveito próprio ou alheio. O STF reconheceu que a conduta da Secretária amolda-
se, em tese, ao crime do art. 315 do CP. No caso concreto, contudo, já havia ocorrido a
prescrição quanto ao delito do art. 315 do CP.

32. CRIMES CONTRA AS FINANÇAS PÚBLICAS


32.1. Ordenação de despesa não autorizada (art. 359-D do CP) – (Info 760)

O art. 359-D do CP prevê, como crime, ordenar despesa não autorizada por lei. Não
comete esse delito o Governador do Estado que faz o remanejamento das verbas
destinadas aos precatórios para outras despesas do Poder Judiciário se a legislação
estadual dava margem para intepretações de que isso seria permitido.
STF. 1ª Turma. Inq 3393/PB, Rel. Min. Luiz Fux, j. 23/9/2014 (Info 760).

33. LEI DE DROGAS


33.1. Atipicidade da importação de pequena quantidade de sementes de maconha –
(Info 915) – IMPORTANTE!!!

Não configura crime a importação de pequena quantidade de sementes de


maconha.
STF. 2ª Turma. HC 144161/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 11/9/18 (Info 915).
OBS:
Imagine a seguinte situação hipotética: João, por meio de um site da internet,
importou da Holanda para o Brasil 26 frutos aquênios, popularmente conhecidos
como “sementes” de maconha (cannabis sativa linneu). Quando as sementes chegaram
ao Brasil, via postal, o pacote foi inspecionado pelo setor de Alfândega da Receita
Federal no aeroporto, que descobriu seu conteúdo por meio da máquina de raio-X e
avisou a Polícia Federal. Diante disso, João foi denunciado pelo MPF pela prática de
tráfico transnacional de drogas (art. 33 c/c art. 40, I, ambos da Lei 11.343/06). O
Procurador da República argumentou que, pela grande quantidade de sementes
encomendadas e pela própria palavra do denunciado, restou demonstrado que ele
pretendia iniciar uma plantação de cannabis sativa (maconha) em seu quintal.

A questão chegou até o STF. Houve crime? NÃO. O STF entende que não há crime na
importação de sementes de maconha. Vamos entender com calma.

O que é considerado “droga” para fins penais? O parágrafo único do art. 1º da Lei
11.343/06 prevê que, para uma substância ser considerada como "droga", é necessário
que possa causar dependência, sendo isso definido em uma lista a ser elencada em
lei ou ato do Poder Executivo federal. Veja:
Art. 1º (...) Parágrafo único. Para fins desta Lei, consideram-
se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de
causar dependência, assim especificados em lei ou
relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder
Executivo da União.

O art. 66 da mesma Lei complementa esta regra:


Art. 66. Para fins do disposto no parágrafo único do art. 1º
desta Lei, até que seja atualizada a terminologia da lista
mencionada no preceito, denominam-se drogas substâncias
entorpecentes, psicotrópicas, precursoras e outras sob
controle especial, da Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio
de 1998.

Assim, o conceito é técnico-jurídico e só será considerada droga o que a lei (em sentido
amplo) assim reconhecer como tal. Mesmo que determinada substância cause
dependência física ou psíquica, se ela não estiver prevista no rol das substâncias
legalmente proibidas, ela não será tratada como droga para fins de incidência da Lei
nº 11.343/2006 (ex: álcool).

Este rol existe? Onde ele está previsto? O rol das substâncias que são consideradas
como “droga”, para fins penais, continua previsto na Portaria SVS/MS nº 344/1998,
considerando que ainda não foi editada uma nova lista. Perceba, portanto, que
estamos diante de uma norma penal em branco heterogênea (em sentido estrito ou
heteróloga). Isso porque o complemento do que é considerado droga é fornecido por
um ato normativo elaborado por órgão diverso daquele que editou a Lei. A Lei
11.343/06 foi editada pelo Congresso Nacional e o seu complemento é dado por uma
portaria, editada pela ANVISA, autarquia ligada ao Poder Executivo.

Tetrahidrocanabinol (THC): Tetrahidrocanabinol, também conhecido como THC, é


uma substância psicoativa encontrada na planta Cannabis Sativa, mais popularmente
conhecida como maconha. A quantidade de THC na maconha pode variar de acordo
com uma série de fatores, como o tipo de solo, a estação do ano, a época em que foi
colhida, o tempo de colheita e consumo etc. A THC é prevista expressamente como
droga na Portaria SVS/MS nº 344/1998, da ANVISA.
Sementes de maconha não têm THC: Os frutos aquênios da cannabis sativa linneu não
apresentam na sua composição o THC. A planta da cannabis sativa linneu está prevista
na lista “E” da Portaria SVS/MS 344/1998. Ocorre que essa Portaria prevê apenas a
planta como sendo droga (e não a sua semente). Assim, a semente de maconha não
pode ser considerada droga.

O § 1º do art. 33 da LD prevê que também é crime a importação de “matéria-prima”


ou “insumo” destinado à preparação de drogas. A semente de maconha poderia ser
considerada como “matéria-prima” ou “insumo” destinado à preparação de drogas?
Também não. A semente de maconha não pode ser considerada matéria-prima ou
insumo destinado à preparação de drogas. Isso porque ela não é um “ingrediente”
para a confecção de drogas. Não se faz droga misturando a semente de maconha com
qualquer coisa. Dito de outro modo: não se prepara droga com semente de maconha.
Isso porque a semente de maconha não tem substância psicoativa (ela não tem nada
em sua composição que atue no sistema nervoso central gerando euforia, mudança de
humor, prazer etc.). Em seu voto, o Ministro Gilmar Mendes assentou:
“Na doutrina, afirma-se que a matéria-prima, conforme
Vicente Greco Filho e João Daniel Rassi, é a substância de que
podem ser extraídos ou produzidos os entorpecentes que
causem dependência física ou psíquica (GRECO FILHO,
Vicente; RASSI, João Daniel. Lei de drogas anotada. 3ª edição.
São Paulo: Saraiva, 2009. p. 99). Ou seja, a matéria-prima ou
insumo devem ter condições e qualidades químicas para,
mediante transformação ou adição, por exemplo, produzirem
a droga ilícita, o que não é o caso das sementes da planta
Cannabis sativa, que não possuem a substância psicoativa
(THC)”.

Desse modo, a semente da cannabis sativa não é, em si, droga (não está listada na
Portaria) e também não pode ser considerada matéria-prima ou insumo destinado à
preparação de droga ilícita.

Mas é possível que o indivíduo plante a semente de maconha e que daí nasça a planta
da cannabis sativa linneu... A planta tem THC (substância psicoativa proibida)...: É
verdade. Pode ser que o indivíduo germine a semente, que isso vire uma muda, que
ele cultive a muda e que se torne a planta da maconha. No entanto, a mera importação
da semente não é crime algum porque configuraria, no máximo, mero ato
preparatório da figura típica prevista no § 1º do art. 28 da Lei nº 11.343/2006:
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito,
transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas
sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar será submetido às seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou
curso educativo.
§ 1º Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo
pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à
preparação de pequena quantidade de substância ou produto
capaz de causar dependência física ou psíquica. (...)
Nem chega a ser, portanto, ato executório do § 1º do art. 28 porque o agente não iniciou
a semeadura ou o cultivo.

A importação das sementes não poderia configurar a tentativa da prática do crime do


art. 28, § 1º da Lei nº 11.343/2006? Particularmente, penso que não. Isso porque, como
já dito, o agente não iniciou nenhuma conduta executória dos verbos previstos no
tipo penal (semear, cultivar ou colher). No entanto, ainda que se considere que se
iniciou a execução e que ele não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do
agente, não há razão para a instauração de processo penal. O preceito secundário do
art. 28 da LD prevê como sanções penais:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou
curso educativo.

Logo, como não é prevista pena privativa de liberdade para esta conduta, é inviável a
aplicação da regra da tentativa do art. 14, II, do CP.

A conduta pode ser considerada contrabando (art. 334-A do CP)? Existe divergência
sobre o tema. O contrabando consiste na importação de mercadoria proibida (art. 334-
A do CP). A importação de sementes desprovidas de inscrição no Registro Nacional
de Cultivares é proibida pelo art. 34 da Lei nº 10.711/2003:
Art. 34. Somente poderão ser importadas sementes ou mudas
de cultivares inscritas no Registro Nacional de Cultivares.

A semente de cannabis sativa não consta da lista do Registro Nacional de Cultivares


(RNC), não podendo, portanto, ser importada, salvo para tratamentos de saúde
(Portaria RDC/ANVISA nº 66/2016). No entanto, há vários julgados que defendem
que não se deve condenar o réu porque não há, neste caso, lesão ao bem jurídico
tutelado pela norma prevista no art. 334-A do Código Penal. Isso porque, dada a
pequena quantidade e a natureza das sementes, considera-se que não há ofensa aos
bens jurídicos protegidos pelo delito de contrabando (proteção da saúde, da
moralidade administrativa e da ordem pública). Esse é o entendimento que prevalece,
por exemplo, no TRF3: HC 67576 - 0010869-41.2016.4.03.0000, Rel. Juiz Convocado
Ricardo Nascimento, julgado em 26/07/2016.

Posição do MPF: A 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público


Federal possui o entendimento de que:
 A importação de pequena quantidade de sementes de maconha não configura
o crime do art. 33, § 1º nem o delito do art. 28, § 1º, ambos da Lei nº 11.343/2006;
 Esta conduta, em tese, amolda-se ao crime de contrabando (art. 334-A do CP);
 A importação de pequena quantidade de sementes de maconha para o plantio
destinado ao consumo próprio induz à mínima ofensividade da conduta, à
ausência de periculosidade da ação e o ínfimo grau de reprovabilidade do
comportamento, razões que comportam a aplicação do princípio da
insignificância à hipótese.
 Assim, a conduta é tipificada como contrabando, mas deve-se aplicar o
princípio da insignificância, razão pela qual é correta a decisão do Procurador
da República que não denuncia o indiciado nestes casos.
Foi o que decidiu a 2ª CCR, em 09/11/2018, no processo nº 0001111-51.2018.4.03.6181,
Relatora Subprocuradora Geral da República Luiza Cristina Fonseca Frischeisen. No
mesmo sentido é o entendimento do Conselho Institucional do Ministério Público
Federal – CIMPF: a importação de sementes de maconha pela via postal, em pequenas
quantidades, não deve gerar denúncia, ante a configuração da prática do delito
descrito no art. 334-A, do CP, e, neste, a incidência do princípio da insignificância
(procedimentos 0008476-98.2014.4.03.6181 e 0002458-64.2015.4.03.6104).

Qual é a posição do STJ sobre o tema? O STJ está dividido, por enquanto:
A importação de pequenas quantidade de sementes de maconha configura
tráfico de drogas?
5ª Turma: SIM 6ª Turma: NÃO
A importação clandestina de sementes Tratando-se de pequena quantidade de
de cannabis sativa linneu (maconha) sementes e inexistindo expressa previsão
configura o tipo penal descrito no art. normativa que criminaliza, entre as
33, § 1º, I, da Lei nº 11.343/2006. Não é condutas do art. 28 da Lei de Drogas, a
possível aplicar o princípio da importação de pequena quantidade de
insignificância. matéria prima ou insumo destinado à
STJ. 5ª Turma. REsp 1723739/SP, Rel. preparação de droga para consumo
Min. Jorge Mussi, julgado em pessoal, forçoso reconhecer a atipicidade
23/10/2018. do fato.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AgInt no REsp
1616707/CE, Rel. Min. Antonio Saldanha
Palheiro, julgado em 26/06/2018.

33.2. A grande quantidade de droga, isoladamente, não constitui fundamento


idôneo para afastar a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º da LD – (Info 866)

Se o réu é primário e possui bons antecedentes, o juiz pode, mesmo assim, negar o
benefício do art. 33, § 4º da LD argumentando que a quantidade de drogas
encontrada com ele foi muito elevada?
O tema é polêmico.

 1ª Turma do STF: encontramos precedentes afirmando que a grande


quantidade de droga pode ser utilizada como circunstância para afastar o
benefício. Nesse sentido: não é crível que o réu, surpreendido com mais de
500 kg de maconha, não esteja integrado, de alguma forma, a organização
criminosa, circunstância que justifica o afastamento da causa de diminuição
prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas (HC 130981/MS, Rel. Min. Marco
Aurélio, j. 18/10/16. Info 844).
 2ª Turma do STF: a quantidade de drogas encontrada não constitui,
isoladamente, fundamento idôneo para negar o benefício da redução da
pena previsto no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 (RHC 138715/MS, Rel.
Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 23/5/2017. Info 866).
STF. 2ª Turma. RHC 138715/MS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 23/5/17 (Info
866).
Obs: o tema acima não deveria ser cobrado em uma prova objetiva, mas caso seja
perguntado, penso que a 2ª corrente é majoritária.

33.3. CONFISCO DE BENS: O confisco de bens apreendidos em decorrência do


tráfico pode ocorrer ainda que o bem não fosse utilizado de forma habitual e mesmo
que ele não tenha sido alterado – (Info 865)

É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em


decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade,
reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a
descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito
além daqueles previstos expressamente no art. 243, parágrafo único, da
Constituição Federal.
STF. Plenário. RE 638491/PR, Rel. Min. Luiz Fux, j. 17/5/17 (repercussão geral) (Info
865).
OBS: Art. 243, § único, CF:
Art. 243 (...)
Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico
apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será
confiscado e reverterá a fundo especial com destinação
específica, na forma da lei. (Redação dada pela EC 81/2014)

Mandados constitucionais de criminalização: Os preceitos constitucionais sobre o


tráfico de drogas e o respectivo confisco de bens constituem parte dos mandados de
criminalização previstos pelo poder constituinte originário a exigir uma atuação
enérgica do Estado sobre o tema, sob pena de o ordenamento jurídico brasileiro
incorrer em proteção deficiente dos direitos fundamentais.

Princípios da unidade e da supremacia da Constituição: O confisco previsto no art.


243, parágrafo único, da CF/88, deve ser interpretado à luz dos princípios da unidade
e da supremacia da Constituição, ou seja, não se pode ler o direito de propriedade em
separado, sem considerar a restrição feita a esse direito. Assim, a habitualidade do uso
do bem na prática criminosa ou sua adulteração para dificultar a descoberta do local
de acondicionamento não são pressupostos para o confisco de bens.

Confisco de bens previsto na legislação infraconstitucional: O julgado acima foi


proferido tendo como parâmetro de exame unicamente o texto do art. 243, parágrafo
único, da CF/88. No entanto, que, para a explicação ficar completa, seja necessário
mencionar que a legislação infraconstitucional também prevê hipóteses de confisco
dos bens.

É o caso, por exemplo, do Código Penal:


Art. 91. São efeitos da condenação:
(...)
II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado
ou de terceiro de boa-fé:
a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas
cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato
ilícito;
b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que
constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato
criminoso.

A Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006) também traz uma previsão nesse sentido:
Art. 62. Os veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer
outros meios de transporte, os maquinários, utensílios,
instrumentos e objetos de qualquer natureza, utilizados para
a prática dos crimes definidos nesta Lei, após a sua regular
apreensão, ficarão sob custódia da autoridade de polícia
judiciária, excetuadas as armas, que serão recolhidas na forma
de legislação específica.
(...)

Art. 63. Ao proferir a sentença de mérito, o juiz decidirá sobre


o perdimento do produto, bem ou valor apreendido,
sequestrado ou declarado indisponível.

33.4. Se o réu, não reincidente, for condenado a pena superior a 4 anos e que não
exceda a 8 anos, e se as circunstâncias judiciais forem favoráveis, o juiz deverá fixar o
regime semiaberto – (Info 859)

O condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 anos e não exceda a 8
anos, tem o direito de cumprir a pena corporal em regime semiaberto (art. 33, § 2°,
b, do CP), caso as circunstâncias judiciais do art. 59 lhe forem favoráveis.

Obs: não importa que a condenação tenha sido por tráfico de drogas.

A imposição de regime de cumprimento de pena mais gravoso deve ser


fundamentada, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime,
bem como ao comportamento da vítima (art. 33, § 3°, do CP)
A gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para justificar a
fixação do regime mais gravoso.
STF. 2ª Turma. HC 140441/MG, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 28/3/17 (Info
859).
OBS:
A situação em tela se amolda ao art. 33, § 2º, "c", do Código Penal, que é aplicável
também aos condenados por tráfico de drogas:
Art. 33 (...)
§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas
em forma progressiva, segundo o mérito do condenado,
observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de
transferência a regime mais rigoroso:
c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou
inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em
regime aberto.

Mas o § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90 afirma que o regime inicial no caso de crimes
hediondos e equiparados deverá ser o fechado... O STF decidiu que o § 1º do art. 2º da
Lei nº 8.072/90, ao impor o regime inicial fechado, é inconstitucional. HC 111.840/ES,
Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 27/6/2012 (Info 672).

Assim, o regime inicial nas condenações por crimes hediondos ou equiparados (ex:
tráfico de drogas) não tem que ser obrigatoriamente o fechado, podendo ser também
o regime semiaberto ou aberto, desde que presentes os requisitos do art. 33, § 2º,
alíneas “b” e “c”, do Código Penal.
Logo, o juiz poderá condenar o réu por crime hediondo ou equiparado e fixar o regime
semiaberto ou aberto, desde que cumpridos os requisitos do Código Penal.

33.5. Ocorrendo o tráfico de drogas nas imediações de presídio, incidirá a causa de


aumento do art. 40, III, da LD, não importando quem seja o comprador – (Info 858) –
IMPORTANTE!!! – (TRF5-2017)

Se o agente vende a droga nas imediações de um presídio, mas o comprador não


era um dos detentos nem qualquer pessoa que estava frequentando o presídio,
ainda assim deverá incidir a causa de aumento do art. 40, III, da Lei 11.343/06?
SIM. A aplicação da causa de aumento prevista no art. 40, III, da Lei 11.343/06 se
justifica quando constatada a comercialização de drogas nas dependências ou
imediações de estabelecimentos prisionais, sendo irrelevante se o agente infrator
visa ou não aos frequentadores daquele local.
Assim, se o tráfico de drogas ocorrer nas imediações de um estabelecimento
prisional, incidirá a causa de aumento, não importando quem seja o comprador do
entorpecente.
STF. 2ª Turma. HC 138944/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 21/3/17 (Info 858).
OBS:
A Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006), em seu art. 40, traz sete causas de aumento de
pena. Veja a hipótese do inciso III, com destaque para a parte grifada:
Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são
aumentadas de um sexto a dois terços, se:
(...) III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou
imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou
hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais,
culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de
trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou
diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de
dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades
militares ou policiais ou em transportes públicos;

33.6. A grande quantidade de droga, isoladamente, não constitui fundamento


idôneo para afastar a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º da LD – (Info 849) –
(TRF5-2017) (DPEAM-2018)

Se o réu é primário e possui bons antecedentes, o juiz pode, mesmo assim, negar o
benefício do art. 33, § 4º da LD argumentando que a quantidade de drogas encontrada
com ele foi muito elevada? O tema é polêmico.
1ª Turma do STF: encontramos precedentes afirmando que a grande quantidade de
droga pode ser utilizada como circunstância para afastar o benefício. Nesse sentido:
não é crível que o réu, surpreendido com mais de 500 kg de maconha, não esteja
integrado, de alguma forma, a organização criminosa, circunstância que justifica o
afastamento da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas (HC
130981/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 18/10/2016. Info 844).
2ª Turma do STF: a quantidade de drogas encontrada não constitui, isoladamente,
fundamento idôneo para negar o benefício da redução da pena previsto no art. 33,
§ 4º, da Lei 11.343/06 (HC 138138/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 29/11/16.
Info 849). (TRF5-2017)
STF. 2ª Turma. HC 138138/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 29/11/16 (Info
849).

33.7. A grande quantidade de droga pode justificar o afastamento da causa de


diminuição de pena do art. 33, § 4º da LD – (Info 844)

Não é crível que o réu, surpreendido com mais de 500 kg de maconha, não esteja
integrado, de alguma forma, a organização criminosa, circunstância que justifica o
afastamento da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas.
STF. 1ª Turma. HC 130981/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 18/10/16 (Info 844).
OBS:
Imagine a seguinte situação hipotética: João foi preso enquanto transportava 500kg
de maconha, tendo sido denunciado pela prática de tráfico de drogas (art. 33, caput,
da Lei 11.343/06). A defesa alegou que o réu é primário, possui bons antecedentes e
que agiu na condição de “mula”, de forma que merece ser beneficiado com a
minorante prevista no § 4º do art. 33:

Art. 33 (...) § 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste


artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois
terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos,
desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não
se dedique às atividades criminosas nem integre organização
criminosa.

Requisitos para aplicação da causa de diminuição: Para que o juiz deixe de aplicar a
minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06 é necessário que demonstre na
sentença a existência de conjunto probatório que possa afastar ao menos um dos
seguintes critérios, que são autônomos:
a) primariedade;
b) bons antecedentes;
c) não dedicação a atividades criminosas; e
d) não integração à organização criminosa.

Em suma, se o réu não preencher algum desses requisitos, não terá direito à
minorante.

O que são as chamadas “mulas”? “Mula” é o nome dado a pessoa, geralmente


primária e de bons antecedentes (para que não desperte suspeitas), que é cooptada
pelas quadrilhas de tráfico de drogas para que realize o transporte do entorpecente de
uma cidade, estado, país, para outros, em troca de uma contraprestação pecuniária,
ou por conta de ameaças. Normalmente, a droga é transportada pela “mula” de forma
dissimulada, escondida em fundos falsos de bolsas, junto ao corpo ou até mesmo em
cápsulas dentro do estômago da pessoa. A “mula” também é conhecida como “avião”
ou “transportador”.
É possível aplicar o § 4º do art. 33 da LD às “mulas”?
 STF: SIM. Segundo o entendimento que prevalece no STF é possível aplicar o
§ 4º do art. 33 da LD às “mulas”. O fato de o agente transportar droga, por si
só, não é suficiente para afirmar que ele integre a organização criminosa.
Assim, é possível aplicar a causa de diminuição, não se podendo fundamentar
tal negativa em mera suposição de que o réu se dedique a atividades
criminosas em face da quantidade de droga apreendida. Confira:
(...) O exercício da função de mula, embora indispensável para
o tráfico internacional, não traduz, por si só, adesão, em
caráter estável e permanente, à estrutura de organização
criminosa, até porque esse recrutamento pode ter por
finalidade um único transporte de droga. (...)
STF. 1ª Turma. HC 124107, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 04/11/14.

(...) A atuação da agente no transporte de droga, em atividade


denominada “mula”, por si só, não constitui pressuposto de
sua dedicação à prática delitiva ou de seu envolvimento com
organização criminosa. Impõe-se, para assim concluir, o
exame das circunstâncias da conduta, em observância ao
princípio constitucional da individualização da pena (art. 5º,
XLVI, da CF). (...)
STF. 2ª Turma. HC 131795, Rel. Min. Teori Zavascki, j.
03/05/16.

No mesmo sentido: STF. 1ª Turma. RHC 118008/SP, Rel. Min.


Rosa Weber, j. 24/9/13 (Info 721); STF. 1ª Turma. HC 124107,
Rel. Min. Dias Toffoli, j. 04/11/14.

 STJ: NÃO. O STJ possui vários precedentes afirmando que, em regra, a "mula"
integra a organização criminosa e, portanto, não faz jus ao benefício:
(...) O atual entendimento jurisprudencial do Pretório Excelso
e desta Corte Superior é no sentido de que, regra geral, o
agente que transporta drogas, na qualidade de 'mula' do
tráfico, integra organização criminosa. Na hipótese, a
concessão da minorante em sua fração mínima configura ato
benéfico, já que, considerando o entendimento ora firmado, o
recorrente sequer faria jus à tal redução. (...)
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1407115/SP, Rel. Min. Felix
Fischer, j. 18/08/16.

(...) A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme


em assinalar que o agente que transporta entorpecentes, no
exercício da função de "mula", integra organização criminosa,
o que afasta a incidência do § 4º do art. 33 da Lei n.
11.343/2006, de maneira que a atrair a incidência da Súmula
n. 83 do STJ. (...)
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 411.424/SP, Rel. Min. Rogerio
Schietti Cruz, j. 02/02/16.
Fique atento(a) como a redação do tema pode aparecer na sua prova. Na prática, o que
vale é a análise das circunstâncias do caso concreto, não sendo possível conceder ou
afastar a minorante pelo simples fato de o agente ter desempenhado a função de
"mula".

E no caso concreto acima relatado, o STF concordou com a tese da defesa? Deverá ser
concedido o benefício a João? NÃO. É o que foi decidido no Info 844 do STF. Desse
modo, o Tribunal entendeu que, embora primário, o agente transportava grande
quantidade de entorpecente o que demonstra envolvimento com a organização
criminosa. Existe outro precedente do STF no mesmo caminho:
(...) In casu, a paciente, na condição de “mula”, foi
surpreendida transportando expressiva quantidade de droga
ao exterior. Tal fato afasta o preenchimento dos requisitos do
art. 33, § 4°, da Lei de Drogas (...)
STF. 1ª Turma. HC 123430, Rel. Min. Luiz Fux, j. 14/10/14.

33.8. Regime inicial para condenado não reincidente a pena de até 4 anos com
circunstâncias judiciais favoráveis – (Infos 821 e 843) – (MPAM-2016) (TJRS-2016)

Se o réu, não reincidente, for condenado, por tráfico de drogas, a pena de até 4 anos,
e se as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP forem positivas (favoráveis), o juiz
deverá fixar o regime aberto e deverá conceder a substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos, preenchidos os requisitos do art. 44 do CP.
A gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para justificar a
fixação do regime mais gravoso.
STF. 1ª Turma. HC 129714/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 11/10/16 (Info 843).
STF. 1ª Turma. HC 130411/SP, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, j. 12/4/16 (Info
821). STF. 2ª Turma. HC 133028/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 12/4/16 (Info 821).
(MPAM-2016): Segundo o entendimento do STF, o crime de tráfico de drogas,
conforme o caso concreto, enseja a possibilidade de fixação de regime inicial
diferente do fechado, devendo o magistrado atentar à regra do artigo 33 do Código
Penal.

Imagine que o réu foi condenado a 1 ano e 8 meses de reclusão por tráfico de drogas
(art. 33 da LD). O juiz fixou o regime inicial semiaberto. Vale ressaltar que o
condenado era primário e as circunstâncias judiciais favoráveis a ele. Como
argumento para fixar o regime semiaberto, o juiz alegou que o crime de tráfico de
drogas é muito grave, sendo extremamente nocivo para a sociedade. Agiu
corretamente o magistrado? NÃO.

A situação em tela se amolda ao art. 33, § 2º, "c", do Código Penal, que é aplicável
também aos condenados por tráfico de drogas:

Art. 33 (...)
§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas
em forma progressiva, segundo o mérito do condenado,
observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de
transferência a regime mais rigoroso:
c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou
inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em
regime aberto.

Mas o § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 afirma que o regime inicial no caso de crimes
hediondos e equiparados deverá ser o fechado... O STF decidiu que o § 1º do art. 2º da
Lei 8.072/90, ao impor o regime inicial fechado, é inconstitucional. STF. Plenário. HC
111.840/ES, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 27/6/2012 (Info 672).

Assim, o regime inicial nas condenações por crimes hediondos ou equiparados (ex:
tráfico de drogas) não tem que ser obrigatoriamente o fechado, podendo ser também
o regime semiaberto ou aberto, desde que presentes os requisitos do art. 33, § 2º,
alíneas “b” e “c”, do Código Penal.
Logo, o juiz poderá condenar o réu por crime hediondo ou equiparado e fixar o regime
semiaberto ou aberto, desde que cumpridos os requisitos do Código Penal acima
explicados.

Obs: no caso do exemplo dado, o réu não foi condenado por crime hediondo ou
equiparado considerando que o STF entende que o chamado "tráfico privilegiado",
previsto no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06 não deve ser considerado crime equiparado
a hediondo (HC 118533, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 23/06/2016. Info 831).

33.9. O crime de tráfico privilegiado de drogas não tem natureza hedionda – (Info
831) – IMPORTANTE!!! ATUALIZAR LIVROS!!! – (TRF5-2017)

O chamado tráfico privilegiado, previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006 (Lei


de Drogas) não deve ser considerado crime de natureza hedionda.
STF. Plenário. HC 118533/MS, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 23/06/2016.

O STJ possui um enunciado em sentido contrário (Súmula 512-STJ). Vejamos o que o


Tribunal irá decidir depois desta mudança de entendimento do STF.
Súmula 512-STJ: A aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §
4º, da Lei n. 11.343/2006 não afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas.
OBS:
Tráfico privilegiado: A Lei de Drogas prevê, em seu art. 33, § 4º, a figura do “traficante
privilegiado”, também chamada de “traficância menor” ou “traficância eventual”:

Art. 33 (...)
§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as
penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços,
vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde
que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se
dedique às atividades criminosas nem integre organização
criminosa.

Qual é a natureza jurídica deste § 4º? Trata-se de uma causa de diminuição de pena.

Surgiu uma tese defensiva sustentando que o art. 33, § 4º da Lei 11.343/06 não seria
tão grave e, por isso, não poderia ser equiparado a hediondo. A jurisprudência atual
do STF acolhe esta posição? SIM. O principal argumento invocado pelo STF foi o de
que não seria proporcional tratar o tráfico privilegiado como equiparado a hediondo,
sendo esta conduta incompatível com a natureza hedionda. Além disso, foram feitas
considerações sobre política criminal, aumento da população carcerária etc.

Houve uma mudança de entendimento do STF? SIM. Houve um overruling, ou seja, a


superação de um entendimento jurisprudencial anterior da Corte. Antes deste
julgamento, o STF decidia que o § 4º do art. 33 da Lei 11343/06 era também equiparado
a hediondo. O argumento era o de que a causa de diminuição de pena prevista no art.
33, § 4º não constituía tipo penal distinto do caput do mesmo artigo, sendo o mesmo
crime, no entanto, com uma causa de diminuição. Em outras palavras, o § 4º não era
um delito diferente do caput. Logo, também deveria ser equiparado a hediondo. Nesse
sentido: STF. 1ª Turma. RHC 114842, Rel. Min. Rosa Weber, j. 18/02/14.

E o STJ? O STJ seguia o mesmo caminho do entendimento anterior do STF, ou seja,


também decidia que o § 4º do art. 33 seria equiparado a hediondo. A posição era tão
consolidada que o STJ editou um enunciado:

Súmula 512-STJ: A aplicação da causa de diminuição de pena


prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 não afasta a
hediondez do crime de tráfico de drogas.

O que acontece agora com a Súmula 512 do STJ? Fica SUPERADA e, certamente, será
cancelada em breve. A decisão do STF foi tomada em um HC e, por isso, não possui
eficácia erga omnes e efeitos vinculantes. Apesar disso, como foi proferida pelo
Plenário, na prática, tem uma força de persuasão enorme e, por isso, é extremamente
provável que o STJ acompanhe o novo entendimento do STF e cancele a súmula
passando a também decidir que o § 4º do art. 33 não é equiparado a hediondo.

Na prática, o que muda para o réu condenado por tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da
LD)? Podemos apontar três mudanças principais:

Segundo a posição anterior Conforme o entendimento ATUAL


Não tinha direito à concessão de anistia, Passa a ter, em tese, direito à concessão
graça e indulto. de anistia, graça e indulto, desde que
cumpridos os demais requisitos.
Para a concessão do livramento Para a concessão do livramento
condicional, o condenado não podia ser condicional, o apenado deverá cumprir
reincidente específico em crimes 1/3 ou 1/2 da pena, a depender do fato
hediondos ou equiparados e teria que de ser ou não reincidente em crime
cumprir mais de 2/3 da pena. doloso.
Para que ocorresse a progressão de Para que ocorra a progressão de regime,
regime, o condenado deveria cumprir: o condenado deverá cumprir 1/6 da
- 2/5 da pena, se fosse primário; e pena.
- 3/5, se fosse reincidente.

Vale ressaltar, por fim, que a tese defensiva acolhida pelo STF e acima explicada foi
sustentada levada à Corte pela DPU.
33.10. Valoração negativa da natureza e quantidade da droga autoriza a fixação de
regime inicial de pena mais gravoso – (Info 819)

É legítima a fixação de regime inicial semiaberto, tendo em conta a quantidade e a


natureza do entorpecente, na hipótese em que ao condenado por tráfico de
entorpecentes tenha sido aplicada pena inferior a 4 anos de reclusão. A valoração
negativa da quantidade e da natureza da droga representa fator suficiente para a
fixação de regime inicial mais gravoso.
STF. 2ª Turma. HC 133308/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 29/3/2016 (Info
819).
OBS:
Imagine que o réu foi condenado a 3 anos de reclusão por tráfico de drogas (art. 33 da
LD). O juiz fixou o regime inicial semiaberto sob o argumento de que foi muito grande
a quantidade de droga comercializada e que se tratava de crack, substância
entorpecente cuja natureza é altamente viciante. Agiu corretamente o magistrado? Ele
poderia ter feito isso? SIM.

Segundo entendeu o STF, a decisão respeitou o disposto no art. 33, § 2º, “b”, e § 3º, do
CP c/c o art. 42 da Lei nº 11.343/2006:

CP/Art. 33 (...)
§ 2º As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em
forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os
seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a
regime mais rigoroso:
b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro)
anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la
em regime semi-aberto;
(...)
§ 3º A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-
se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.

LD/Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com


preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a
natureza e a quantidade da substância ou do produto, a
personalidade e a conduta social do agente.

Dessa forma, conjugando o § 3º do art. 33 do CP com o art. 42 da LD, é possível fixar


o regime inicial mais gravoso, no caso de tráfico, com base na natureza e quantidade
da droga.

Existem outros precedentes do STF no mesmo sentido:

(...) 1. É pacífico o entendimento do STF de que a natureza e a


quantidade da droga constituem motivação idônea para a
exasperação da pena-base, nos termos do art. 59 do Código Penal e
do art. 42 da Lei nº 11.343/06. Precedentes.
2. Como o regime inicial de cumprimento de pena deve observar o
disposto no art. 33, § 3º, do Código Penal, e no art. 42 da Lei nº
11.343/06, que expressamente remetem às circunstâncias do crime
(art. 59, CP) e à natureza e quantidade da droga, não há que se falar
em bis in idem na valoração negativa desses mesmos vetores na
majoração da pena-base e na fixação do regime prisional mais
gravoso. (...)
STF. 2ª Turma. HC 131887, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em
02/02/2016.

(...) A valoração negativa da quantidade, natureza e diversidade do


entorpecente apreendido representa fator suficiente para a fixação
de regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade
mais gravoso e para obstar a substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos. (...)
STF. 2ª Turma. HC 131761, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em
02/02/2016.

(...) A determinação do regime inicial de cumprimento da pena deve


levar em conta dois fatores: (a) o quantum da reprimenda imposta
(CP, art. 33, § 2º); e (b) as condições pessoais do condenado
estabelecidas na primeira etapa da dosimetria (CP, art. 59 c/c art. 33
§ 3º). Nesse contexto, não há ilegalidade na decisão que, mediante
fundamentação jurídica adequada, estabelece o regime inicial mais
grave, como medida necessária e suficiente para reprovação e
prevenção do crime. (...)
STF. 2ª Turma. RHC 129811, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em
24/11/2015.

33.11. Pureza da droga é irrelevante na dosimetria da pena – (Info 818) –


IMPORTANTE!!!

O grau de pureza da droga é irrelevante para fins de dosimetria da pena.


De acordo com a Lei 11343/06, preponderam apenas a natureza e a quantidade da
droga apreendida para o cálculo da dosimetria da pena.
STF. 2ª Turma. HC 132909/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 15/3/2016 (Info
818).
OBS:
O juiz, ao condenar o réu por tráfico de drogas, no momento da dosimetria da pena,
poderá aumentar a pena-base (1ª fase) utilizando como argumento a natureza e a
quantidade do entorpecente? SIM. A natureza e quantidade da droga são fatores
preponderantes no momento da dosimetria da pena, conforme previsto
expressamente no art. 42 da Lei 11.343/2006:

Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com


preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a
natureza e a quantidade da substância ou do produto, a
personalidade e a conduta social do agente.

Algumas drogas são mais nocivas e têm maior potencial viciante do que outras. Ex: a
maconha é considerada uma substância entorpecente mais "leve"; por outro lado, a
heroína é altamente viciante. Assim, o juiz pode aumentar a pena-base (1ª fase da
dosimetria) sob o argumento de que a heroína possui alto potencial destrutivo. De
igual forma, se a quantidade da droga for muito grande, isso também poderá ser
utilizado como fundamento para se aumentar a pena-base.
E o grau de pureza da droga? Pode ser utilizado como argumento para aumentar ou
diminuir a reprimenda? NÃO. No caso concreto julgado, a defesa pediu ao juiz que
realizasse exame pericial para aferir o grau de pureza da droga, tendo sido indeferido
pelo magistrado. Diante da negativa, a defesa alegou que houve nulidade, pedido que
foi rejeitado pelo STF, que entendeu ser desnecessário determinar a pureza do
entorpecente.

33.12. A causa de aumento prevista no inciso V do art. 40 não exige a efetiva


transposição da fronteira (Info 808) – IMPORTANTE!!!

O art. 40, V, da Lei de Drogas prevê que a pena do tráfico e de outros delitos deverá
ser aumentada se ficar "caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre
estes e o Distrito Federal".
Para que incida essa causa de aumento não se exige a efetiva transposição da
fronteira interestadual pelo agente, sendo suficiente a comprovação de que a
substância tinha como destino localidade em outro Estado da Federação.
Ex: João pegou um ônibus em Campo Grande (MS) com destino a São Paulo (SP);
algumas horas depois, antes que o ônibus cruzasse a fronteira entre os dois Estados,
houve uma blitz da polícia no interior do coletivo, tendo sido encontrados 10kg de
cocaína na mochila de João, que confessou que iria levá-la para um traficante de
São Paulo.
STF. 1ª Turma. HC 122791/MS, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 17/11/2015 (Info
808).

33.13. Tráfico privilegiado e “mulas” – (Info 766)

É possível aplicar o benefício do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas às “mulas”.


STF. 1ª Turma. HC 124107/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 4/11/2014 (Info
766).

33.14. Natureza e quantidade da droga: o mesmo fato só pode ser utilizado para
aumentar a pena base ou para analisar o benefício do tráfico privilegiado – (Info 759)
– IMPORTANTE!!! – (PCMT-2017)

A natureza e a quantidade da droga NÃO podem ser utilizadas para aumentar a


pena-base do réu e também para afastar o tráfico privilegiado (art. 33, § 4º) OU para,
reconhecendo-se o direito ao benefício, conceder ao réu uma menor redução de
pena. Haveria, nesse caso, bis in idem.
STF. 2ª Turma. RHC 122684/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 16/9/2014 (Info 759).
(PCMT-2017-CESPE): Com referência aos parâmetros legais da dosimetria da
pena para os crimes elencados na Lei 11.343/06 — Lei Antidrogas — e ao
entendimento dos tribunais superiores sobre essa matéria, assinale a opção
correta: A natureza e a quantidade da droga apreendida não podem ser
utilizadas, concomitantemente, na primeira e na terceira fase da dosimetria da
pena, sob pena de bis in idem. BL: art. 42 da LD e Info 759 do STF.

Explicação:
STF: Natureza e quantidade da droga: o mesmo fato só pode ser utilizado para
aumentar a pena base ou para analisar o benefício do tráfico privilegiado - A
natureza e a quantidade da droga NÃO podem ser utilizadas para aumentar a
pena-base do réu e também para afastar o tráfico privilegiado (art. 33, § 4º) ou
para, reconhecendo-se o direito ao benefício, conceder ao réu uma menor redução
de pena. Haveria, nesse caso, bis in idem. STF. 2ª Turma. RHC 122684/MG, Rel.
Min. Cármen Lúcia, julgado em 16/9/2014 (Info 759).

STJ: HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO PRÓPRIO. [...]


ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM. OCORRÊNCIA. [...] 2. Esta Corte Superior, na
esteira do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal em sede de
repercussão geral (ARE 666.334/MG, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJ
6/5/2014), pacificou entendimento de que a natureza e a quantidade da droga
não podem ser utilizadas, concomitantemente, na primeira e na terceira fase da
dosimetria da pena, sob pena de bis in idem. 3. No caso dos autos, o acórdão
atacado diverge do atual entendimento da Suprema Corte sobre a matéria, pois
considerou a quantidade da droga na primeira e na terceira fases da dosimetria.
[...] 7. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida ex officio para determinar
que o Juízo das Execuções proceda à nova dosimetria da pena, afastando o bis in
idem identificado e reduzindo a pena, em razão da atenuante da menoridade, de
forma fundamentada e proporcional, (HC nº 305.627 - SC, Relator: Min. Reynaldo
Soares da Fonseca - Julg. 10 de dezembro de 2015)

33.15. Dosimetria da pena no caso de tráfico de drogas – (Info 759)

Na dosimetria da pena de tráfico, o juiz não pode aumentar a pena base utilizando
como argumento o fato de terem sido encontradas muitas trouxinhas com o réu, se
o peso delas era pequeno (7,1 gramas), sendo esse fato preponderante.
De igual modo, o magistrado não pode aumentar a pena pelo simples fato de a
venda da droga ocorrer dentro da própria casa do condenado. Isso porque esse fato,
por si só, não enseja uma maior reprovabilidade da conduta delituosa.
Por fim, o julgador não pode aumentar a pena do réu porque este declarou, em seu
interrogatório, que era usuário frequente de droga. O uso contumaz de drogas não
pode ser empregado como indicativo de necessidade de agravamento da
reprimenda, visto que a conduta do réu que vende drogas para sustentar o próprio
vício é menos reprovável do que a daquele que pratica esse crime apenas com
intuito de lucro.
STF. 2ª Turma. RHC 122469/MS, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min.
Celso de Mello, julgado em 16/9/2014 (Info 759).

33.16. Droga transportada em transporte público e causa de aumento do art. 40 da Lei


11.343/2006 – (Info 749) – (DPU-2017)
O art. 40, III, da Lei de Drogas prevê como causa de aumento de pena o fato de a
infração ser cometida em transportes públicos.
Se o agente leva a droga em transporte público, mas não a comercializa dentro do
meio de transporte, incidirá essa majorante?
NÃO. A majorante do art. 40, II, da Lei 11.343/06 somente deve ser aplicada nos
casos em que ficar demonstrada a comercialização efetiva da droga em seu interior.
É a posição majoritária no STF e STJ.
STF. 1ª Turma. HC 122258-MS, Rel. Min. Rosa Weber, j. 19/08/2014.
STF.2ª Turma. HC 120624/MS, Red. p/ o acórdão, Min. Ricardo Lewandowski, j.
3/6/14 (Info 749).
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1.295.786-MS, Rel. Min. Regina Helena Costa, j. 18/6/14
(Info 543).
STJ. 6ª Turma. REsp 1.443.214-MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 22/09/2014.

33.17. Vedação ao indulto para o traficante privilegiado – (Info 745) –


IMPORTANTE!!!

Não é possível o deferimento de indulto a réu condenado por tráfico de drogas,


ainda que tenha sido aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei
11.343/2006 à pena a ele imposta, circunstância que não altera a tipicidade do crime.
Os condenados por crimes hediondos e equiparados não podem ser contemplados
com o indulto, mesmo o chamado “indulto humanitário”.
O fato de o condenado estar doente ou ser acometido de deficiência não é causa de
extinção da punibilidade nem de suspensão da execução da pena.
STF. 2ª Turma. HC 118213/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 6/5/2014.

33.18. A NATUREZA E A QUANTIDADE DA DROGA PODEM SER UTILIZADAS


PARA AUMENTAR A PENA-BASE E TAMBÉM PARA AFASTAR O TRÁFICO
PRIVILEGIADO? – (Info 733)

A natureza e a quantidade da droga podem ser utilizadas para aumentar a pena-base


e também para afastar o tráfico privilegiado?
1ª corrente: SIM. Utiliza-se a mesma regra em finalidades e momentos distintos.
Posição do STJ.
2ª corrente: NÃO. Isso porque haveria, no caso, bis in idem. Posição do STF.
STF. Plenário. HC 112776/MS e HC 109193/MG, Rel. Min. Teori Zavascki, julgados
em 19/12/2013 (Info 733).

33.19. Dever ou não de demonstrar que a droga encontrada consigo seria utilizada
apenas para consumo próprio

O réu não tem o dever de demonstrar que a droga encontrada consigo seria
utilizada apenas para consumo próprio.
Cabe à acusação comprovar os elementos do tipo penal, ou seja, que a droga
apreendida era destinada ao tráfico. Ao Estado-acusador incumbe demonstrar a
configuração do tráfico, que não ocorre pelo simples fato dos réus terem comprado
e estarem na posse de entorpecente.
Em suma, se a pessoa é encontrada com drogas, cabe ao Ministério Público
comprovar que o entorpecente era destinado ao tráfico. Não fazendo esta prova,
prevalece a versão do réu de que a droga era para consumo próprio.
STF. 1ª Turma. HC 107448/MG, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 18.6.2013.

34. LEI MARIA DA PENHA


34.1. Impossibilidade de pena restritiva de direitos em caso de contravenção penal
envolvendo violência doméstica contra a mulher – (Info 884) – IMPORTANTE!!!

Cabe substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em caso


de contravenção penal envolvendo violência doméstica contra a mulher?
NÃO. Posição majoritária do STF e Súmula 588 do STJ.
SIM. Existe um precedente da 2ª Turma do STF (HC 131160, Rel. Min. Teori
Zavascki, j. 18/10/16).
STF. 1ª Turma. HC 137888/MS, Rel. Min. Rosa Weber, j. 31/10/17 (Info 884).
OBS:
Cuidado: Decisão da 2ª Turma do STF:
Afirma que é possível a conversão da pena privativa de
liberdade por restritiva de direito, nos moldes previstos no art.
17 da Lei Maria da Penha, aos condenados pela prática de
contravenção penal. Isso porque a contravenção penal não
está na proibição contida no inciso I do art. 44 do CP, que fala
apenas em crime. Logo, não existe proibição no ordenamento
jurídico para a aplicação de pena restritiva de direitos em caso
de contravenções. Nesse sentido: STF. 2ª Turma. HC 131160,
Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 18/10/2016.

O STJ e a 1ª Turma do STF fazem, portanto, uma ampliação do inciso I do art. 44 do


CP para abranger também os casos de contravenção penal praticados com violência
ou grave ameaça (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1607382/MS, Rel. Min. Sebastião Reis
Júnior, julgado em 27/09/2016). A 2ª Turma do STF não admite essa ampliação e
trabalha com o texto literal do art. 44, I, do CP.

Resumindo:
É possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos nos
casos de crimes ou contravenções praticadas contra a mulher com violência ou grave
ameaça no ambiente doméstico?
1) Crime: NÃO. Posição tanto do STJ como do STF.
2) Contravenção penal:
• 2ª Turma do STF: entende que é possível a substituição.
• 1ª Turma do STF e STJ: afirmam que também não é permitida a substituição.

Em concursos, se o enunciado não estiver fazendo qualquer distinção, fiquem com a


posição exposta na súmula e que também é adotada pela 1ª Turma do STF.

34.2. Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em violência


doméstica – (Info 825) – IMPORTANTE!!!
Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de
violência doméstica.
Os delitos praticados com violência contra a mulher, devido à expressiva
ofensividade, periculosidade social, reprovabilidade do comportamento e lesão
jurídica causada, perdem a característica da bagatela e devem submeter-se ao
direito penal.
O STJ e o STF não admitem a aplicação dos princípios da insignificância e da
bagatela imprópria aos crimes e contravenções praticados com violência ou grave
ameaça contra a mulher, no âmbito das relações domésticas, dada a relevância penal
da conduta.
O fato de o casal ter se reconciliado não significa atipicidade material da conduta
ou desnecessidade de pena.
STJ. 5ª Turma. HC 333.195/MS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 12/4/2016.
STJ. 6ª Turma. AgRg no HC 318.849/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 27/10/15.
STF. 2ª Turma. RHC 133043/MT, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 10/5/16 (Info 825).

34.3. Impossibilidade de penas restritivas de direito – (Info 804)

Não é possível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de


direitos ao condenado pela prática do crime de lesão corporal praticado em
ambiente doméstico (art. 129, § 9º do CP).
A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos pressupõe,
entre outras coisas, que o crime não tenha sido cometido com violência ou grave
ameaça (art. 44, I, do CP).
STF. 2ª Turma. HC 129446/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 20/10/15 (Info 804).

34.4. Competência para o processamento de crimes dolosos contra a vida praticados


no contexto de violência doméstica – (Info 748)

A Lei de Organização Judiciária poderá prever que a 1ª fase do procedimento do


júri seja realizada na Vara de Violência Doméstica em caso de crimes dolosos
contra a vida praticados no contexto de violência doméstica. Não haverá usurpação
da competência constitucional do júri.
Apenas o julgamento propriamente dito é que, obrigatoriamente, deverá ser feito
no Tribunal do Júri.
STF. 2ª Turma. HC 102150/SC, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 27/5/2014 (Info
748).

34.5. Princípio da Igualdade e proteção das mulheres

Não há violação do princípio constitucional da igualdade no fato de a Lei n.


11.340/06 ser voltada apenas à proteção das mulheres.
STF. Plenário. ADC 19/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 9/2/2012.

34.6. Crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher e a Lei
dos Juizados Especiais
Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher não se
aplica a Lei dos Juizados Especiais (Lei n. 9.099/95), mesmo que a pena seja menor
que 2 anos.
STF. Plenário. ADI 4424/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 9/2/2012.

35. ESTATUTO DO DESARMAMENTO


35.1. Posse ou porte apenas da munição configura crime – (Info 844)

A posse (art. 12 da Lei 10.826/03) ou o porte (art. 14) de arma de fogo configura crime
mesmo que ela esteja desmuniciada. Da mesma forma, a posse ou o porte apenas
da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal
conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa
o resultado concreto da ação.
STF. 1ª Turma. HC 131771/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 18/10/16 (Info 844).
OBS:
A posse ou o porte de arma de fogo desmuniciada configura crime? SIM. A posse (art.
12 da Lei 10.826/03) ou o porte (art. 14) de arma de fogo configura crime mesmo que
ela esteja desmuniciada. Trata-se, atualmente, de posição pacífica tanto no STF como
no STJ. Para a jurisprudência, a simples posse ou porte de arma, munição ou acessório
de uso permitido — sem autorização e em desacordo com determinação legal ou
regulamentar — configura os crimes previstos nos arts. 12 ou 14 da Lei 10.826/03. Isso
porque, por serem delitos de perigo abstrato, é irrelevante o fato de a arma apreendida
estar desacompanhada de munição, já que o bem jurídico tutelado é a segurança
pública e a paz social.
STJ. 3ª Seção. AgRg nos EAREsp 260.556/SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j.
26/03/14.
STF. 2ª Turma. HC 95073/MS, red. p/ o acórdão Min. Teori Zavascki, 19/3/13 (Info
699).

A posse ou porte apenas da munição configura crime? SIM. A posse ou o porte apenas
da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal
conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o
resultado concreto da ação. O objetivo do legislador foi o de antecipar a punição de
fatos que apresentam potencial lesivo à população, prevenindo a prática de crimes.
STF. 2ª Turma. HC 119154, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 26/11/13.
STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1442152/MG, Min. Maria Thereza de Assis Moura, j.
07/08/14.

35.2. Uso de munição como pingente e aplicação do princípio da insignificância –


(Info 826) – IMPORTANTE!!!

É atípica a conduta daquele que porta, na forma de pingente, munição


desacompanhada de arma.
STF. 2ª Turma. HC 133984/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 17/5/16 (Info 826).
Obs: vale ressaltar que, em regra, a jurisprudência não aplica o princípio da
insignificância aos crimes de posse ou porte de arma ou munição.
OBS:
A posse ou porte apenas da munição configura crime? SIM. A posse ou o porte apenas
da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal
conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o
resultado concreto da ação. O objetivo do legislador foi o de antecipar a punição de
fatos que apresentam potencial lesivo à população, prevenindo a prática de crimes.
STF. 2ª Turma.HC 119154, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 26/11/2013. STJ. 6ª
Turma. AgRg no REsp 1442152/MG, Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em
07/08/2014.

Aplica-se o princípio da insignificância ao crime de posse ou porte de arma ou


munição? Em regra não. O STJ possui posição consolidada no sentido de que o
princípio da insignificância não é aplicável aos crimes de posse e de porte de arma de
fogo, por se tratarem de crimes de perigo abstrato, sendo irrelevante inquirir a
quantidade de munição apreendida (STJ. 5ª Turma. HC 338.153/RS, Rel. Min. Ribeiro
Dantas, julgado em 03/05/2016).

Caso excepcional de uma munição utilizada como pingente: Os entendimentos acima


expostos configuram a regra geral e devem ser adotados nos concursos caso não seja
feito nenhum esclarecimento adicional. No entanto, em um caso concreto, o STF
reconheceu a incidência do princípio da insignificância para o crime de porte ilegal de
munição de uso restrito.

A situação foi a seguinte: determinado indivíduo foi parado em uma blitz e os


policiais encontraram em seu poder um cartucho de munição calibre 0.40, que é de
uso restrito.
Não foi encontrada nenhuma arma ou outras munições com o homem, que afirmou
que usaria o cartucho para fazer um pingente que utilizaria como colar. O indivíduo
foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 16 da Lei 10826/03 (Estatuto do
Desarmamento). O STF aplicou o princípio da insignificância afirmando que as
peculiaridades do caso concreto justificavam a flexibilização do entendimento
tradicional da jurisprudência. Na situação julgada, o cartucho ainda seria utilizado
para fazer o pingente.

35.3. O porte ilegal de arma de fogo deve ser absorvido pelo crime de homicídio? –
(Info 775) – IMPORTANTE!!!

Se o agente, utilizando arma de fogo, atira e mata alguém, haverá homicídio e porte
de arma de fogo ou apenas homicídio? Se uma pessoa pratica homicídio com arma de
fogo, a acusação por porte deverá ser absorvida? Aplica-se o princípio da consunção?
Depende da situação:
 Situação 1: NÃO. O crime de porte não será absorvido se ficar provado nos
autos que o agente portava ilegalmente a arma de fogo em outras
oportunidades antes ou depois do homicídio e que ele não se utilizou da
arma tão somente para praticar o assassinato. Ex: a instrução demonstrou
que João adquiriu a arma de fogo três meses antes de matar Pedro e não a
comprou com a exclusiva finalidade de ceifar a vida da vítima.

 Situação 2: SIM. Se não houver provas de que o réu já portava a arma antes
do homicídio ou se ficar provado que ele a utilizou somente para matar a
vítima. Ex: o agente compra a arma de fogo e, em seguida, dirige-se até a
casa da vítima, e contra ela desfere dois tiros, matando-a.

No caso concreto julgado pelo STF, ficou provado que o réu havia comprado a arma
3 meses antes da morte da vítima. Além disso, também se demonstrou pelas
testemunhas que o acusado, várias vezes antes do crime, passou na frente da casa
da vítima, mostrando ostensivamente o revólver utilizado no crime. Desse modo,
restou provado que os tipos penais consumaram-se em momentos distintos e que
tinham desígnios autônomos, razão pela qual não se pode reconhecer o princípio
da consunção entre o homicídio e o porte ilegal de arma de fogo.

STF. 1ª Turma. HC 120678/PR, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Marco
Aurélio, j. 24/2/15 (Info 775).

35.4. A posse ou o porte apenas de munição configura crime – (Sem Info)

A posse ou o porte apenas da munição (ou seja, desacompanhada da arma)


configura crime. Isso porque tal conduta consiste em crime de perigo abstrato, para
cuja caracterização não importa o resultado concreto da ação.
STF. 2ª Turma. HC 113295/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 13/11/2012.

36. RACISMO
36.1. Palestra proferida por Bolsonaro com críticas aos quilombolas e estrangeiros
não configurou racismo – (Info 915)

O então Deputado Federal Jair Bolsonaro proferiu palestra no auditório de


determinado clube e ali fez críticas e comentários negativos a respeito dos
quilombolas e também de povos estrangeiros.
No trecho mais questionado de sua palestra, ele afirmou: “Eu fui em um quilombola
em El Dourado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas.
Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador eles servem mais. Mais de um
bilhão de reais por ano gastado com eles. Recebem cesta básica e mais material em
implementos agrícolas. Você vai em El Dourado Paulista, você compra arame
farpado, você compra enxada, pá, picareta por metade do preço vendido em outra
cidade vizinha. Por que? Porque eles revendem tudo baratinho lá. Não querem nada
com nada.”
O STF entendeu que a conduta de Bolsonaro não configurou o crime de racismo
(art. 20 da Lei nº 7.716/89).
As palavras por ele proferidas estão dentro da liberdade de expressão prevista no
art. 5º, IV, da CF/88, além de também estarem cobertas pela imunidade parlamentar
(art. 53 da CF/88).
O objetivo de seu discurso não foi o de repressão, dominação, supressão ou
eliminação dos quilombolas ou dos estrangeiros.
O pronunciamento do parlamentar estava vinculado ao contexto de demarcação e
proveito econômico das terras e configuram manifestação política que não
extrapola os limites da liberdade de expressão.
Além disso, as manifestações de Bolsonaro estavam relacionadas com a sua função
de parlamentar. Inclusive, o convite para a palestra se deu em razão do exercício do
cargo de Deputado Federal a fim de dar a sua visão geopolítica e econômica do País.
Assim, havia uma vinculação das manifestações apresentadas na palestra com os
pronunciamentos do parlamentar na Câmara dos Deputados, de sorte que incide a
imunidade parlamentar.
STF. 1ª Turma. Inq 4694/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 11/9/2018 (Info 915).
OBS: A denúncia oferecida contra Jair Bolsonaro foi recebida pelo STF? NÃO. A 1ª
Turma do STF, por maioria (3x2), rejeitou a denúncia apresentada contra Bolsonaro.
O colegiado entendeu que não ficou configurado o conteúdo discriminatório das
declarações do acusado. As palavras por ele proferidas estão dentro da liberdade de
expressão prevista no art. 5º, IV, da CF/88, além de também estarem cobertas pela
imunidade parlamentar (art. 53 da CF/88).

36.2. A incitação de ódio público feita por líder religioso contra outras religiões pode
configurar o crime de racismo – (Info 893) – IMPORTANTE!!! – (MPRR-2017) (PGERS-
2015)

A incitação ao ódio público contra quaisquer denominações religiosas e seus


seguidores não está protegida pela cláusula constitucional que assegura a liberdade
de expressão.
Assim, é possível, a depender do caso concreto, que um líder religioso seja
condenado pelo crime de racismo (art. 20, §2º, da Lei nº 7.716/81) por ter proferido
discursos de ódio público contra outras denominações religiosas e seus seguidores.
STF. 2ª Turma. RHC 146303/RJ, rel. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli,
j. 6/3/18 (Info 893).
Atenção. Compare com RHC 134682/BA, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/11/16 (Info
849).
OBS:
A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: Tiago, pastor de uma
determinada igreja evangélica, publicou, em seu blog, vídeos e posts de conteúdo
religioso nos quais ofendeu líderes e seguidores de outras crenças religiosas diversas
da sua (católica, judaica, espírita, islâmica, umbandista etc.), pregando inclusive o fim
de algumas delas e imputando fatos ofensivos aos seus devotos e sacerdotes. O pastor
afirmou, por exemplo, que os seguidores dessas outras crenças “sofrem” e “padecem”,
sendo “estuprados”, “violentados” e “destruídos” por seguirem “caminhos de
podridão”. Utilizou expressões como “religião assassina”, “líderes assassinos”,
“prostituta católica”, “prostituta espiritual” e “pilantragem”. Tiago vinculou, ainda,
de forma pejorativa, tais religiões à adoração ao diabo. Diante disso, ele foi
denunciado e condenado pela prática do crime previsto no art. 20, §2º, da Lei nº
7.716/81:
Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou
preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência
nacional.
Pena: reclusão de um a três anos e multa.
(...)
§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por
intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de
qualquer natureza:
Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

A defesa de Tiago interpôs uma série de recursos até que o caso chegou ao STF. No
Supremo, alegou a atipicidade da conduta. Segundo a defesa, a condenação ideológica
de outras crenças é inerente à prática religiosa, e se trataria de exercício de uma
garantia constitucionalmente assegurada.

A tese da defesa foi acolhida pelo STF? NÃO. O STF manteve a condenação e afirmou
que:
A incitação ao ódio público contra quaisquer denominações
religiosas e seus seguidores não está protegida pela cláusula
constitucional que assegura a liberdade de expressão.
STF. 2ª Turma. RHC 146303/RJ, rel. Min. Edson Fachin, red.
p/ o ac. Min. Dias Toffoli, julgado em 6/3/2018 (Info 893).

Conforme explicou o Min. Dias Toffoli, o Brasil, social e historicamente, orgulha-se


de ser um país de tolerância religiosa, valor que faz parte da construção de nosso
estado democrático de direito. De acordo com o Ministro, existem diversos trechos
no discurso do condenado que alimentam o ódio e a intolerância. Assim, se o Estado
não exercer seu papel de pacificar a sociedade, vai se chegar a uma guerra de religiões.
“Ao invés de sermos instrumento de pacificação, vamos aprofundar o que acontece
no mundo”, afirmou o Ministro. O preâmbulo da CF/88 fala na construção de uma
sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social. A ação
do condenado atua contra um importante valor escolhido como fundamento da
República Federativa do Brasil, que é a solidariedade. A despeito da importância
conferida à liberdade de expressão, o próprio texto constitucional determina que
sejam respeitados determinados limites. O art. 220, § 1º, da CF/88 diz que nenhuma
lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à liberdade de informação
jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observados determinados
incisos do art. 5º, onde estão contidas as limitações. O direto de pensar, falar e
escrever sem censuras ou restrições é o mais precioso privilégio dos cidadãos, mas
esse direito não é absoluto e sofre limitações de natureza ética e jurídica.

Os abusos, quando praticados, legitimam a atuação estatal. “Se assim não fosse,
caluniar, injuriar, difamar ou fazer apologia de fatos criminosos não seriam suscetíveis
de punições”, explicou o Min. Celso de Mello.

O abuso no exercício da liberdade de expressão não pode ser tolerado. Assim, a


incitação ao ódio público não está protegida nem amparada pela cláusula
constitucional que assegura liberdade de expressão.

Caso Ellwanger: Os Ministros relembraram ainda o célebre julgamento do “caso


Ellwanger” (HC 82424), em setembro de 2003, quando o STF manteve a condenação
imposta ao escritor gaúcho Siegfried Ellwanger por crime de racismo contra os judeus.
Veja trechos da ementa:
(...) 1. Escrever, editar, divulgar e comerciar livros "fazendo
apologia de idéias preconceituosas e discriminatórias"
contra a comunidade judaica (Lei 7716/89, artigo 20, na
redação dada pela Lei 8081/90) constitui crime de racismo
sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e imprescritibilidade
(CF, artigo 5º, XLII).
(...)
6. Adesão do Brasil a tratados e acordos multilaterais, que
energicamente repudiam quaisquer discriminações raciais, aí
compreendidas as distinções entre os homens por restrições
ou preferências oriundas de raça, cor, credo, descendência ou
origem nacional ou étnica, inspiradas na pretensa
superioridade de um povo sobre outro, de que são exemplos
a xenofobia, "negrofobia", "islamafobia" e o anti-semitismo.
(...) 13. Liberdade de expressão. Garantia constitucional que
não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O
direito à livre expressão não pode abrigar, em sua
abrangência, manifestações de conteúdo imoral que
implicam ilicitude penal.
14. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso
devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os
limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º,
§ 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de
expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo",
dado que um direito individual não pode constituir-se em
salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos
contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da
pessoa humana e da igualdade jurídica. (...)
STF. Plenário. HC 82424, Relator p/ Acórdão Min. Maurício
Corrêa, julgado em 17/09/2003.

Questão de concurso:
(PGEPA-2011): No HC 82424-2 – “Caso Ellwanger” –, o STF julgou pedido de “habeas
corpus” em favor de editor de obras que veiculavam ideias supostamente antissemitas.
Analise as proposições abaixo e assinale a alternativa correta: A ordem de “habeas
corpus” foi indeferida com fundamento, entre outros, de que o direito à liberdade de
expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral
que implicam em ilicitude penal. (CERTA)

Hate speech (discurso de ódio): O tema acima exposto está ligado ao que a doutrina
chama de hate speech (discurso de ódio). Discurso de ódio (hate speech) são
“manifestações de pensamento que ofendam, ameacem ou insultem determinado
grupo de pessoas com base na raça, cor, religião, nacionalidade, orientação sexual,
ancestralidade, deficiência ou outras características próprias. (...) No direito norte-
americano, prevalece o entendimento de que até o discurso de ódio (hate speech)
inclui-se no âmbito de proteção da liberdade de expressão.” (BERNARDES, Juliano
Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito Constitucional. Tomo II. 7ª
ed. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 128).

No Brasil, ao contrário dos EUA, prevalece que o hate speech não é protegido pela
ordem constitucional. Isso porque o direito à liberdade de expressão não é absoluto,
podendo a pessoa que proferiu o discurso de ódio ser punida, inclusive
criminalmente, em caso de abuso. Esse tem sido, por exemplo, o entendimento das
bancas examinadoras:

(PGE-RS FUNDATEC 2015): Ao tratar do alcance da liberdade de expressão em


relação ao chamado “discurso do ódio” (“hate speech”), o STF sustentou que o direito
à liberdade de expressão é um direito relativo, objeto de ponderação, à luz dos
princípios da dignidade humana, proporcionalidade e razoabilidade, não podendo
acolher a incitação ao ódio racial ou religioso. (certo)

Situação deve ser analisada com base no caso concreto: Assim, podemos concluir que
é possível a condenação de um líder religioso pelo crime de racismo (art. 20, §2º, da
Lei nº 7.716/81) em caso de discursos de ódio público contra outras denominações
religiosas e seus seguidores. Vale ressaltar, no entanto, que essa condenação
dependerá do caso concreto, ou seja, das palavras que foram proferidas e da intenção
do líder religioso de suprimir ou reduzir a dignidade daquele que é diferente de si.
Desse modo, não é qualquer crítica de um líder religioso a outras religiões que
configurará o crime de racismo. Nesse sentido, recentemente o STF absolveu um líder
religioso dessa imputação por falta de dolo. Relembre:
Determinado padre escreveu um livro, voltado ao público da
Igreja Católica, no qual ele faz críticas ao espiritismo e a
religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé.
O Ministério Público da Bahia ofereceu denúncia contra ele
pela prática do art. 20, § 2º da Lei nº 7.716/89 (Lei do racismo).
No caso concreto, o STF entendeu que não houve o crime.
A CF/88 garante o direito à liberdade religiosa. Um dos
aspectos da liberdade religiosa é o direito que o indivíduo
possui de não apenas escolher qual religião irá seguir, mas
também o de fazer proselitismo religioso.
Proselitismo religioso significa empreender esforços para
convencer outras pessoas a também se converterem à sua
religião.
Desse modo, a prática do proselitismo, ainda que feita por
meio de comparações entre as religiões (dizendo que uma é
melhor que a outra) não configura, por si só, crime de
racismo.
Só haverá racismo se o discurso dessa religião supostamente
superior for de dominação, opressão, restrição de direitos ou
violação da dignidade humana das pessoas integrantes dos
demais grupos. Por outro lado, se essa religião supostamente
superior pregar que tem o dever de ajudar os "inferiores" para
que estes alcancem um nível mais alto de bem-estar e de
salvação espiritual e, neste caso não haverá conduta
criminosa.
Na situação concreta, o STF entendeu que o réu apenas fez
comparações entre as religiões, procurando demonstrar que
a sua deveria prevalecer e que não houve tentativa de
subjugar os adeptos do espiritismo.
Pregar um discurso de que as religiões são desiguais e de
que uma é inferior à outra não configura, por si, o elemento
típico do art. 20 da Lei nº 7.716/89. Para haver o crime, seria
indispensável que tivesse ficado demonstrado o especial fim
de supressão ou redução da dignidade do diferente, elemento
que confere sentido à discriminação que atua como verbo
núcleo do tipo. STF. 1ª Turma. RHC 134682/BA, Rel. Min.
Edson Fachin, julgado em 29/11/2016 (Info 849).

Desse modo, em concursos públicos deve-se ficar atento para a redação do enunciado.

36.3. Análise do caso "Jonas Abib" – (Info 849) – IMPORTANTE!!!

Determinado padre escreveu um livro, voltado ao público da Igreja Católica, no


qual ele faz críticas ao espiritismo e a religiões de matriz africana, como a umbanda
e o candomblé.
O MP da Bahia ofereceu denúncia contra ele pela prática do art. 20, § 2º da Lei
7.716/89 (Lei do racismo).
No caso concreto, o STF entendeu que não houve o crime.
A CF/88 garante o direito à liberdade religiosa. Um dos aspectos da liberdade
religiosa é o direito que o indivíduo possui de não apenas escolher qual religião irá
seguir, mas também o de fazer proselitismo religioso.
Proselitismo religioso significa empreender esforços para convencer outras pessoas
a também se converterem à sua religião.
Desse modo, a prática do proselitismo, ainda que feita por meio de comparações
entre as religiões (dizendo que uma é melhor que a outra) não configura, por si só,
crime de racismo.
Só haverá racismo se o discurso dessa religião supostamente superior for de
dominação, opressão, restrição de direitos ou violação da dignidade humana das
pessoas integrantes dos demais grupos. Por outro lado, se essa religião
supostamente superior pregar que tem o dever de ajudar os "inferiores" para que
estes alcancem um nível mais alto de bem-estar e de salvação espiritual e, neste
caso não haverá conduta criminosa.
Na situação concreta, o STF entendeu que o réu apenas fez comparações entre as
religiões, procurando demonstrar que a sua deveria prevalecer e que não houve
tentativa de subjugar os adeptos do espiritismo.
Pregar um discurso de que as religiões são desiguais e de que uma é inferior à outra
não configura, por si, o elemento típico do art. 20 da Lei 7.716/89. Para haver o crime,
seria indispensável que tivesse ficado demonstrado o especial fim de supressão ou
redução da dignidade do diferente, elemento que confere sentido à discriminação
que atua como verbo núcleo do tipo.
STF. 1ª Turma. RHC 134682/BA, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/11/16 (Info 849).

37. CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO


37.1. O art. 305 do CTB é constitucional e não viola o princípio da não
autoincriminação – (Info 923) – IMPORTANTE!!!

A regra que prevê o crime do art. 305 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é
constitucional, posto não infirmar o princípio da não incriminação, garantido o
direito ao silêncio e ressalvadas as hipóteses de exclusão da tipicidade e da
antijuridicidade.
STF. Plenário. RE 971959/RS, Rel. Min. Luiz Fux, j. 14/11/18 (repercussão geral)
(Info 923).
OBS:
Evasão do local do acidente para evitar responsabilidade penal ou civil: O Código de
Trânsito Brasileiro (CTB) prevê o seguinte delito em seu art. 305:
Art. 305. Afastar-se o condutor do veículo do local do acidente,
para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser
atribuída:
Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa.

Em que consiste o crime: O agente se envolve em um acidente de trânsito e foge do


local para não ser identificado e não ter que responder a um processo criminal ou
uma ação de indenização. Arnaldo Rizzardo dispõe: “(...) o condutor, uma vez
verificado o acidente, simplesmente abandona o local, não aguardando a realização
das providências de identificação dos veículos, dos condutores, e demais anotações, a
cargo da autoridade de trânsito, e mesmo dos outros envolvidos.” (RIZZARDO,
Arnaldo. Comentários ao Código de Trânsito brasileiro. 9ª ed., São Paulo: RT, 2013, p. 627).

Bem jurídico tutelado: De forma imediata, o crime protege a administração da


justiça, que fica prejudicada pela fuga do agente do local do evento, uma vez que tal
atitude impede sua identificação e a consequente apuração do ilícito, para fins de se
promover a responsabilização cível ou penal de quem, eventualmente, provocar um
acidente de trânsito, dolosa ou culposamente. De forma mediata, tutela o direito da
vítima à reparação do dano.

Sujeitos do crime: Tanto o sujeito ativo como o sujeito passivo podem ser qualquer
pessoa. Trata-se, portanto, de crime bicomum.

Elemento subjetivo: É o dolo. Vale ressaltar que se exige especial fim de agir (dolo
específico), considerando que o agente deve ter saído do local “para fugir à
responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída”. Não admite
modalidade culposa.

Consumação: É crime material. Assim, o delito se consuma quando o agente


consegue se afastar (evadir-se, fugir) do local do acidente. Se ele tenta fugir, mas é
impedido pela vítima, por populares ou pela polícia, por exemplo, haverá tentativa.

Outras informações:
• a ação penal é pública incondicionada;
• trata-se de infração de menor potencial ofensiva, de forma que o rito é
sumaríssimo (Lei 9.099/95), cabendo transação penal e suspensão condicional do
processo.

Discussão quanto à constitucionalidade deste crime: Os Tribunais de Justiça dos


Estados de São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina e Rio Grande do Sul possuíam
entendimento no sentido de que este crime do art. 305 do CTB seria inconstitucional
ou, pelo menos, inconvencional. Isso porque ele violaria o direito à não
autoincriminação. O direito à não autoincriminação é uma decorrência da ampla
defesa, prevista no art. 5º, LV e LXIII. Além disso, o Pacto de San José da Costa Rica
(Convenção Americana de Direitos Humanos), que vige em nosso ordenamento
jurídico com caráter supralegal, estabelece em seu artigo 8º, inciso II, alínea “g”, que
“toda pessoa tem direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a declarar-
se culpada”.

Essa discussão chegou finalmente ao STF. O que decidiu o STF? O art. 305 do CTB é
constitucional ou não? O art. 305 do CTB é constitucional. O STF, em repercussão geral,
fixou a seguinte tese: A regra que prevê o crime do art. 305 do Código de Trânsito
Brasileiro (CTB) é constitucional, posto não infirmar o princípio da não
incriminação, garantido o direito ao silêncio e ressalvadas as hipóteses de exclusão
da tipicidade e da antijuridicidade. STF. Plenário. RE 971.959/RS, Rel. Min. Luiz Fux,
julgado em 14/11/2018 (repercussão geral) (Info 923).

Vou fazer um breve resumo dos argumentos invocados.

Flexibilização do princípio da vedação à autoincriminação: De fato, a CF/88 prevê,


como uma decorrência da ampla defesa, o direito à não autoincriminação (nemo tenetur
se detegere). De igual modo, o Pacto de San José da Costa Rica também assegura esse
direito aos acusados. No entanto, para o STF, é “admissível a flexibilização do
princípio da vedação à autoincriminação proporcionada pela opção do legislador de
criminalizar a conduta de fugir do local do acidente”. O legislador, ao exigir que o
agente envolvido no acidente continue no local do fato até que sejam feitos os
procedimentos de identificação das pessoas e do sinistro, “não afeta o núcleo
irredutível” do direito fundamental à não autoincriminação. O direito à não
autoincriminação preconiza que jamais se pode obrigar o investigado ou réu a agir
ativamente na produção de prova contra si próprio. Ocorre que o tipo penal do art.
305 do CTB apenas obriga a permanência do agente no local para garantir a
identificação dos envolvidos no sinistro e o devido registro da ocorrência pela
autoridade competente. Assim, ele não viola o núcleo da garantia de não
autoincriminação.

Obriga-se o condutor a permanecer no local, mas não a “assumir a culpa” (continua


“garantido o direito ao silêncio”): O art. 305 do CTB exige que o agente permaneça
no local do acidente e se identifique perante a autoridade de trânsito. Mas o tipo
penal não obriga que o condutor assuma eventual responsabilidade cível ou penal.
Se ele permanecer no local e negar que tenha culpa, não incide o crime do art. 305 do
CTB. Vale ressaltar, inclusive, que o condutor, após sua identificação pela autoridade
de trânsito, pode optar por permanecer em silêncio quanto à dinâmica do acidente e
não prestar nenhum esclarecimento sobre como ocorreu o sinistro. Em suma, depois
de se identificar, pode exercer seu direito ao silêncio, que não significará confissão
nem poderá ser interpretado em prejuízo da defesa (art. 186, parágrafo único, do CPP).

Princípio da proporcionalidade: Eventual declaração de inconstitucionalidade da


conduta tipificada no art. 305 do CTB, em nome de uma leitura absoluta e irrestrita do
princípio da vedação à autoincriminação, caracterizaria afronta ao princípio
constitucional da proporcionalidade em sua dimensão que proíbe a proteção
deficiente. Desse modo, o princípio que veda a não autoincriminação pode ser
relativizado pelo legislador, considerando que, segundo a teoria geral dos direitos
fundamentais, havendo conflito entre dois princípios, é necessário um juízo de
ponderação. Assim ocorre, por exemplo, com os postulados da proibição de excesso e
da vedação à proteção insuficiente.

Fragilização da tutela penal: A criação de empecilhos à responsabilização penal do


condutor que foge do local do acidente fragiliza a tutela penal do Estado e deixa
descoberto o bem jurídico que o referido crime deveria proteger. Além disso,
indiretamente, deixa sem proteção direitos fundamentais que um trânsito seguro
busca preservar, dentre eles o direito à vida.

Negar a vontade do Parlamento: Descriminalizar o crime de fuga significaria


efetivamente negar a vontade do Parlamento. Essa conduta é criminalizada porque a
Constituição promete, em nome do povo, uma sociedade justa e solidária, o que não
poderia ser garantido caso afastada a juridicidade de uma conduta de quem abandona
o local do acidente para fugir à responsabilidade penal e civil.

Convenção de Trânsito de Viena: Importante mencionar que existe uma norma de


direito internacional que abona (avaliza) essa opção feita pelo legislador no art. 305
do CTB. Trata-se da Convenção de Trânsito de Viena, promulgada pelo Decreto
86.714/1981. Esta Convenção prevê que o condutor e demais envolvidos em caso de
acidente devem comunicar a sua identidade, caso isso seja exigido (artigo 31).

Precedente do STF na análise do art. 307 do CP: Vale ressaltar que o STF já tem um
precedente análogo. Isso porque o STF reconheceu que o art. 307 do CP é
constitucional e não viola o princípio que veda a autoincriminação. Relembre o que
diz o art. 307 do CP:
Falsa identidade
Art. 307. Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade
para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para
causar dano a outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato
não constitui elemento de crime mais grave.

O STF entende que há crime quando o agente, para não se incriminar, atribui a si uma
identidade que não é sua. Essa questão já foi, inclusive, analisada pelo Pleno do STF
em regime de repercussão geral:
O princípio constitucional da autodefesa (art. 5º, inciso LXIII,
da CF/88) não alcança aquele que atribui falsa identidade
perante autoridade policial com o intento de ocultar maus
antecedentes, sendo, portanto, típica a conduta praticada pelo
agente (art. 307 do CP). STF. Plenário. RE 640139 RG, Rel. Min.
Dias Toffoli, julgado em 22/09/2011.

No mesmo sentido:
Súmula 522-STJ: A conduta de atribuir-se falsa identidade
perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de
alegada autodefesa.

A persecução penal admite a relativização dos direitos na hipótese de justificável


tensão entre o dever do poder público de promover uma repressão eficaz às
condutas puníveis e as esferas de liberdade ou intimidade daquele que se encontre
na posição de suspeito ou acusado. Nesse âmbito, o direito à não autoincriminação
se insere no mesmo conjunto de direitos subjetivos e garantias do cidadão brasileiro,
de que são exemplos os direitos à intimidade, à privacidade e à honra. Essa
relativização é admissível, embora mediante a observância dos parâmetros
constitucionais pertinentes à harmonização de princípios eventualmente
colidentes. Diante desse quadro, trata-se de garantia que não pode ser interpretada
como o direito do suspeito, acusado ou réu a não participar da produção de medidas
probatórias. A referida flexibilização possibilita que se efetivem, em maior medida,
outros princípios fundamentais com os quais aquele colide no plano concreto, sem
que isso acarrete qualquer violação à dignidade da pessoa humana.

Mesmo no caso de condutas ativas do acusado/investigado têm sido admitidas


flexibilizações: O direito do investigado de não realizar condutas ativas que
importem na introdução de informações ao processo também comporta níveis de
flexibilização, muito embora a regra geral seja a da sua vedação. A jurisprudência do
STF, historicamente, adotava uma postura restrita quanto à admissibilidade das
intervenções corporais. Contudo, na linha do que se visualiza no cenário
internacional, o STF, gradativamente, iniciou uma caminhada em sentido oposto. Um
precedente exemplificativo desse processo é a Rcl 2.040/DF, na qual se decidiu que a
autoridade jurisdicional poderia autorizar a realização de exame de DNA em material
colhido de gestante mesmo sem sua autorização, tendo em vista o objetivo de
investigar possível crime de estupro. O direito comparado à luz da legislação e da
jurisprudência dos principais países da Europa Continental admite a intervenção
corporal coercitiva, desde que autorizada judicialmente, restrita à cooperação passiva
do sujeito investigado ou acusado e sem ofensa à dignidade humana.

Se o agente fugiu com medo de eventuais agressões ou para cuidar de um ferimento


sofrido, não haverá crime (“hipóteses de exclusão da tipicidade e da
antijuridicidade”): Vale ressaltar, por fim, que o abandono do local do acidente pode
ser legitimado em caso de eventual risco de agressões que o condutor possa vir a
sofrer por parte dos populares presentes ou ainda caso ele esteja ferido e precise se
deslocar imediatamente em busca de atendimento médico. Para o Min.
Lewandowski, nos casos concretos em que houver perigo de vida do causador do
evento caso permaneça no local do acidente, o juiz poderá aferir a exclusão da
antijuridicidade da conduta, tal como a legítima defesa ou o estado de necessidade.
Já para o Min. Alexandre de Moraes, essas situações realmente não configuram
crime, mas por outra razão: atipicidade. Segundo o Ministro, esses casos representam
condutas atípicas, uma etapa anterior à excludente de ilicitude, porque o tipo penal
exige que o condutor do veículo se afaste do local do crime “para fugir à
responsabilidade penal ou civil”. Havendo necessidade de o agente evadir-se pelas
circunstâncias apresentadas, não ocorre dolo específico do tipo.

Votos vencidos: Ficaram vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso
de Mello e Dias Toffoli, que entendiam que o tipo penal do art. 305 do CTB viola o
princípio da não autoincriminação.

37.2. Crime de dirigir sem habilitação é absorvido pela lesão corporal culposa na
direção de veículo – (Info 796)

Se um indivíduo, que não possui habilitação para dirigir (art. 309 do CTB), conduz
seu veículo de forma imprudente, negligente ou imperita e causa lesão corporal em
alguém, ele responderá pelo crime do art. 303, parágrafo único, do CTB, ficando o
delito do art. 309 do CTB absorvido por força do princípio da consunção.
O delito de dirigir veículo sem habilitação é crime de ação penal pública
incondicionada. Por outro lado, a lesão corporal culposa (art. 303 do CTB) é crime
de ação pública condicionada à representação. Imagine que a vítima não exerça seu
direito de representação no prazo legal.
Diante disso, o Ministério Público poderá denunciar o agente pelo delito do art.
309?
NÃO. O delito do art. 309 já foi absorvido pela conduta de praticar lesão corporal
culposa na direção de veículo automotor, tipificada no art. 303 do CTB, crime de
ação pública condicionada à representação. Como a representação não foi
formalizada pela vítima, houve extinção da punibilidade, que abrange tanto a lesão
corporal como a conduta de dirigir sem habilitação.
STF. 2ª Turma. HC 128921/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 25/8/15 (Info 796).

38. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (LEI 8.137/90)


38.1. O prazo da prescrição da pretensão punitiva fica suspenso durante o
parcelamento do débito tributário – (Info 911) – IMPORTANTE!!!
O que acontece se o réu de um crime contra a ordem tributária aderir ao
parcelamento da dívida?
Haverá a suspensão do processo penal. Nos crimes contra a ordem tributária,
quando o agente ingressa no regime de parcelamento dos débitos tributários, fica
suspensa a pretensão punitiva penal do Estado (o processo criminal fica suspenso).

Durante o parcelamento o que ocorre com o prazo prescricional?


Também fica suspenso. O prazo prescricional não corre enquanto estiverem sendo
cumpridas as condições do parcelamento do débito fiscal. É o que prevê o art. 9º, §
1º da Lei nº 10.684/2003.
Se, ao final, o réu pagar integralmente os débitos, haverá a extinção da
punibilidade.
STF. 2ª Turma. ARE 1037087 AgR/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 14/8/2018 (Info 911).
OBS:
Imagine a seguinte situação: Após procedimento administrativo fiscal, ficou
comprovado que João praticou apropriação indébita previdenciária (art. 168-A, § 1º, I
do CP) e sonegação de contribuição previdenciária (art. 337-A, III do CP). Diante disso,
o devedor, com medo do processo penal, decidiu aderir a um parcelamento do débito
fiscal, ou seja, ele foi até a Receita Federal e pediu para pagar parceladamente a
quantia devida.

Esse parcelamento terá influência na esfera penal? SIM.


 Quando o agente ingressa no regime de parcelamento dos débitos
tributários: fica suspensa a pretensão punitiva penal do Estado.

 Caso o agente pague integralmente os débitos: haverá extinção da


punibilidade.

Isso está previsto no art. 9º da Lei 10.684/03. Veja:


Lei nº 10.684/2003
Art. 9º É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente
aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de
dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº
2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, durante o
período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente
dos aludidos crimes estiver incluída no regime de
parcelamento.
(...)
§ 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste
artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente
efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos
e contribuições sociais, inclusive acessórios.

Também é a redação do art. 83 da Lei 9.430/96, com redação dada pela Lei 12.382/11:
Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos
crimes contra a ordem tributária previstos nos arts. 1º e 2º da
Lei n.° 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra
a Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do
Decreto-Lei n.° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código
Penal), será encaminhada ao Ministério Público depois de
proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a
exigência fiscal do crédito tributário correspondente. (Redação
dada pela Lei nº 12.350/2010)
(...)
§ 2º É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos
crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa
física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos
aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que
o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do
recebimento da denúncia criminal. (Incluído pela Lei
12.382/2011)
(...)
§ 4º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput
quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o
agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de
tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de
concessão de parcelamento. (Incluído pela Lei 12.382/2011)

Durante o parcelamento, o que ocorre com o prazo prescricional? Também fica


suspenso. É o que foi decidido no Info 911 do STF. Vimos que o parcelamento da
dívida tributária acarreta a suspensão do processo penal. Em outras palavras, o Estado
não pode julgar criminalmente este réu enquanto ele estiver no parcelamento tributário.
Ora, como está suspensa a pretensão punitiva durante o período do parcelamento do
débito, também deve ficar suspenso o prazo prescricional. Se o Estado está impedido
legalmente de julgar e punir o indivíduo, não se pode dizer que o Estado está inerte.
A prescrição é um instituto relacionado com a inércia do titular. Além disso, permitir
que a prescrição siga seu curso normal durante o período de adesão voluntária do
contribuinte ao programa de recuperação fiscal serviria como estratégia do réu para
alcançar a impunidade. Por essas razões, o legislador estabeleceu expressamente a
suspensão da prescrição nestes casos. Veja:
Lei nº 10.684/2003
Art. 9º É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente
aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de
dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº
2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, durante o
período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente
dos aludidos crimes estiver incluída no regime de
parcelamento.
§ 1º A prescrição criminal não corre durante o período de
suspensão da pretensão punitiva.
(...)

Lei nº 9.430/96
Art. 83. (...)
§ 3º A prescrição criminal não corre durante o período de
suspensão da pretensão punitiva. (Incluído pela Lei
12.382/2011)

38.2. Causa de aumento do art. 12, I, da Lei nº 8.137/90 – (Info 882) –


IMPORTANTE!!!
O art. 12, I, da Lei 8.137/90 prevê que a pena do crime de sonegação fiscal (art. 1º, I,
da Lei nº 8.137/90) deverá ser aumentada no caso de o delito “ocasionar grave dano
à coletividade”.
A jurisprudência entende que se configura a referida causa de aumento quando o
agente deixa de recolher aos cofres públicos uma vultosa quantia. Em outras
palavras, se o valor sonegado foi alto, incide a causa de aumento do art. 12, I.
A Portaria nº 320, editada pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, prevê que
os contribuintes que estão devendo acima de R$ 10 milhões são considerados
“grandes devedores” e devem receber tratamento prioritário na atuação dos
Procuradores.
Diante disso, surgiu uma tese defensiva dizendo que somente as dívidas acima de
R$ 10 milhões poderiam ser consideradas de grande porte, justificando a incidência
da causa de aumento do art. 12, I.
Essa tese não foi acolhida pelo STF e STJ.
Não é razoável dizer que somente deverá incidir a causa de aumento de pena do
art. 12, I, se o valor dos tributos sonegados for superior a R$ 10 milhões, previsto
no art. 2º da Portaria nº 320/PGFN. Isso porque este dispositivo define "quantia
vultosa" para fins internos de acompanhamento prioritário pela Fazenda Nacional
dos processos de cobrança, não limitando ou definindo o que seja grave dano à
coletividade.
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1274989/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 19/08/14.
STF. 2ª Turma. HC 129284/PE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 17/10/17 (Info
882).
OBS:
Art. 12. São circunstâncias que podem agravar de 1/3 (um
terço) até a metade as penas previstas nos arts. 1°, 2° e 4° a 7°:
I - ocasionar grave dano à coletividade;

38.3. Não se pode invocar a teoria do domínio do fato, pura e simplesmente, sem
nenhuma outra prova – (Info 866)

O diretor-geral da empresa de telefonia Vivo foi denunciado pelo fato de que na


filial que funciona no Estado de Pernambuco teriam sido inseridos elementos
inexatos em livros fiscais.
Diante disso, o Ministério Público denunciou o referido diretor pela prática de
crime contra a ordem tributária (art. 1º, II, da Lei nº 8.137/90).
A denúncia aponta que, na condição de diretor da empresa, o acusado teria domínio
do fato, o poder de determinar, de decidir, e de fazer com que seus empregados
contratados executassem o ato, sendo responsável pelo delito.
O STF determinou o trancamento da ação penal afirmando que não se pode invocar
a teoria do domínio do fato, pura e simplesmente, sem nenhuma outra prova,
citando de forma genérica o diretor estatutário da empresa para lhe imputar um
crime fiscal que teria sido supostamente praticado na filial de um Estado-membro
onde ele nem trabalha de forma fixa.
Em matéria de crimes societários, a denúncia deve apresentar, suficiente e
adequadamente, a conduta atribuível a cada um dos agentes, de modo a possibilitar
a identificação do papel desempenhado pelos denunciados na estrutura jurídico-
administrativa da empresa.
Não se pode fazer uma acusação baseada apenas no cargo ocupado pelo réu na
empresa.
STF. 2ª Turma. HC 136250/PE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 23/5/17 (Info 866).
OBS:
Teoria do domínio do fato: Nos crimes tributários, é muito comum o Ministério
Público invocar a aplicação da teoria do domínio do fato para pedir a condenação do
réu. Isso porque, na maioria dos casos, quem pratica a conduta de suprimir ou reduzir
tributo é o empregado, gerente ou contador da pessoa jurídica. No entanto, o MP alega
que a orientação para essa conduta partiu de um sócio-administrador ou diretor-geral
da empresa.

Pela teoria tradicional, o autor é aquela pessoa que pratica o verbo nuclear do tipo.
Logo, o empregado, gerente ou contador seriam os autores do delito.

A teoria do domínio do fato, criada na Alemanha, em 1939, por Hans Welzel, teve a
finalidade de ampliar o conceito de autor. Por força dessa teoria, pode também ser
considerado autor aquele que, mesmo não realizando o núcleo do tipo, domina
finalisticamente todo o seu desenrolar. Welzel dizia que autor é o “senhor do fato”.
Dessa forma, pela teoria do domínio do fato, o autor seria o sócio-administrador que
decidiu e determinou que fossem praticados os atos necessários à supressão ou
redução do tributo.

38.4. Investigação preliminar antes da constituição definitiva do crédito tributário –


(Info 819)

Imagine que determinada empresa deixou de pagar tributos, fraudando a


fiscalização tributária (inciso II do art. 1º da Lei nº 8.137/90). Ocorre que o Fisco
ainda não terminou o processo administrativo-fiscal instaurado para apurar o fato.
É possível que seja instaurado inquérito policial para apurar o crime mesmo não
tendo havido ainda a constituição definitiva do crédito tributário?
SIM. Nos crimes de sonegação tributária, apesar de a jurisprudência do STF
condicionar a persecução penal à existência do lançamento tributário definitivo, o
mesmo não ocorre quanto à investigação preliminar. Em outras palavras, mesmo
não tendo havido ainda a constituição definitiva do crédito tributário, já é possível
o início da investigação criminal para apurar o fato.
STF. 1ª Turma. HC 106152/MS, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 29/3/2016 (Info
819).
Sonegação fiscal: O art. 1º da Lei nº 8.137/90 tipifica o chamado delito de sonegação
fiscal:

Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir


tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as
seguintes condutas: (Vide Lei nº 9.964, de 10.4.2000)
I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades
fazendárias;
II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos,
ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro
exigido pela lei fiscal;
III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda,
ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;
IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que
saiba ou deva saber falso ou inexato;
V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou
documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou
prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em
desacordo com a legislação.
Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade,
no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em
razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da
dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a
infração prevista no inciso V.

Os crimes dos incisos I a IV do art. 1º da Lei nº 8.137/90 são materiais. Assim, para
que se configurem, é indispensável a constituição definitiva do crédito tributário, nos
termos da SV 24-STF:

Súmula vinculante 24: Não se tipifica crime material contra a ordem


tributária, previsto no artigo 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90,
antes do lançamento definitivo do tributo.

Imagine que determinada empresa deixou de pagar tributos, fraudando a fiscalização


tributária (inciso II do art. 1º da Lei nº 8.137/90). Ocorre que o Fisco ainda não
terminou o processo administrativo-fiscal instaurado para apurar o fato. É possível
que seja instaurado inquérito policial para apurar o crime mesmo não tendo havido
ainda a constituição definitiva do crédito tributário? SIM. A 1ª Turma do STF decidiu
que nos crimes de sonegação tributária, apesar de a jurisprudência do STF condicionar
a persecução penal à existência do lançamento tributário definitivo, o mesmo não
ocorre quanto à investigação preliminar. Em outras palavras, mesmo não tendo
havido ainda a constituição definitiva do crédito tributário, já é possível o início da
investigação criminal para apurar o fato.

O argumento utilizado pelo STF foi o de que, mesmo antes da constituição definitiva,
já teria havido o início da execução e, portanto, seria possível a investigação.

Obs: A decisão acima é polêmica e se mostra contrária a alguns precedentes anteriores


do STJ. Será necessário aguardar para ver se irá se consolidar. Por enquanto, fique
atento(a) porque poderá ser cobrada em concursos no sentido do que foi decidido.

38.5. Dosimetria da pena – (Info 799)

Determinado réu foi condenado por sonegação fiscal (art. 1º, I, da Lei 8.137/90).
O STF considerou correta a sentença do juiz que, na 1ª fase da dosimetria da pena,
aumentou a pena-base com fundamento em dois argumentos:
1) Na análise das circunstâncias, o magistrado aumentou a pena sob a alegação de
que o réu omitiu seu nome do quadro societário da empresa com o objetivo de
esconder que era ele quem realmente administrava a empresa.
O STF afirmou que o ardil utilizado pelo réu (omissão do seu nome do quadro
societário da empresa) teve como objetivo acobertar sua real condição de
administrador da empresa investigada e, com isso, furtar-se de possível aplicação
da lei penal. Essa omissão do nome do réu no quadro societário não é a mesma
omissão de que trata o inciso I do art. 1º.
A omissão que é elementar do tipo é a omissão para suprimir ou reduzir tributo. A
omissão do nome do réu foi para evitar que ele fosse descoberto. Logo, punir a
omissão do nome do réu não significa punir o condenado duas vezes pelo mesmo
fato.
2) No exame das consequências do crime, o juiz também majorou a pena
argumentando que o crime praticado gerou um grande prejuízo ao erário (mais de
2 milhões de reais), o que autorizaria a elevação da pena-base. Segundo entende o
STF, em se tratando de infrações penais contra a ordem tributária, a extensão do
dano causado pode ser invocada na 1ª fase da dosimetria como critério para
exasperação da pena-base, sem que tanto implique bis in idem.
STF. 2ª Turma. HC 128446/PE, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 15/9/2015 (Info
799).

38.6. Sonegação fiscal e art. 42 da Lei 9.430/96 – (Info 750) – IMPORTANTE!!!


CONCURSOS FEDERAIS!!!

A Lei n. 9.430/96 trata sobre procedimentos de fiscalização tributária realizados pela


Receita Federal. Em alguns dispositivos, a Lei define omissão de receita, ou seja,
situações em que a fiscalização considera que o contribuinte não declarou
corretamente as receitas ou rendimentos obtidos. Veja o que diz o art. 42:
Art. 42. Caracterizam-se também omissão de receita ou de rendimento os valores
creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição
financeira, em relação aos quais o titular, pessoa física ou jurídica, regularmente
intimado, não comprove, mediante documentação hábil e idônea, a origem dos
recursos utilizados nessas operações.

Em outras palavras, se é depositada uma determinada quantia na conta bancária do


indivíduo e este não consegue provar a origem desses recursos, a Receita Federal
irá presumir que são rendimentos e, consequentemente, irá lavrar auto de infração
e cobrar o valor do imposto de renda sobre tais quantias.
Se o contribuinte não se defender administrativamente ou se a sua defesa não for
acatada, haverá a constituição definitiva desse crédito tributário.
A partir daí, a RFB comunica o fato ao MPF que, então, irá formular denúncia (ação
penal) contra o contribuinte alegando que ele praticou o delito do art. 1º, I, da Lei
n. 8.137/90.

Caso o contribuinte/réu seja condenado por esse fato, haverá violação ao princípio
da presunção de inocência?
NÃO. Não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência a exigência
de comprovação da origem de valores estabelecida no art. 42 da Lei n. 9.430/96.
Para o STF, o contribuinte, ao não comprovar a origem dos recursos depositados
em sua conta bancária, cria, contra si, uma presunção relativa de que houve omissão
de rendimentos, ensejando a condenação criminal.
Não há ofensa ao princípio da presunção de inocência porque se trata de um
procedimento legalmente estabelecido e disciplinado, sendo certo que ao
contribuinte é garantido o contraditório e a ampla defesa.
STF. 2ª Turma. HC 121125/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 10/6/2014 (Info
750).

39. CRIMES TRIBUTÁRIOS


39.1. Aplicação da SV 24-STF a fatos anteriores à sua edição – (Info 786) –
IMPORTANTE!!!
A SV 24-STF diz que o crime tributário material só se consuma com o lançamento
definitivo do tributo. Em outras palavras, não existe crime antes da constituição
definitiva do crédito tributário. Logo, indiretamente, a SV afirma que o prazo
prescricional só começa a ser contado no dia da constituição definitiva do crédito
tributário já que é nessa data que o delito se consuma (art. 111, I, do CP).
Perceba, portanto, que sob o ponto de vista da prescrição, a SV 24-STF é prejudicial
para o réu porque mesmo ele tendo praticado a conduta anos antes, o prazo
prescricional nem começou a correr se ainda não houve constituição definitiva do
crédito tributário. Fica assim mais difícil de o agente escapar da prescrição. O
Estado-acusação acaba “ganhando” mais tempo para oferecer a denúncia antes que
o crime prescreva.
Desse modo, surgiu a tese defensiva de que a SV 24-STF, por ser mais gravosa ao
réu, não poderia retroagir para ser aplicada a fatos anteriores à sua edição, sob pena
de isso ser considerado aplicação retroativa “in malam partem”. Esse argumento foi
aceito? É proibido aplicar a SV 24-STF para fatos anteriores à sua edição?
NÃO. A tese não foi aceita. A SV 24-STF pode sim ser aplicada a fatos anteriores à
sua edição.
Não se pode concordar com o argumento de que a aplicação da SV 24-STF a fatos
anteriores à sua edição configura retroatividade “in malam partem”. Isso porque o
aludido enunciado apenas consolidou interpretação reiterada do STF sobre a
matéria.
A súmula vinculante não é lei nem ato normativo, de forma que a SV 24-STF não
inovou no ordenamento jurídico. O enunciado apenas espelhou (demonstrou) o
que a jurisprudência já vinha decidindo.
STF. 1ª Turma. RHC 122774/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/5/2015 (Info
786).

40. EVASÃO DE DIVISAS


40.1. Dinheiro mantido no exterior integrando trust revogável cujo instituidor e
beneficiário é a mesma pessoa deverá ser declarado ao Banco Central – (Info 831)

Foi encontrada conta bancária em nome de um Deputado Federal no exterior na


qual estavam depositados milhões de dólares. Vale ressaltar que o Parlamentar não
comunicou a existência dessa conta ao Banco Central e que, na declaração que os
candidatos a cargos eletivos devem prestar à Justiça Eleitoral sobre seus bens, ele
também não mencionou a existência desse dinheiro no exterior.
Diante disso, ele foi denunciado pela prática de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei
9.613/98), evasão de divisas (art. 22, § único, da Lei 7.492/86) e falsidade ideológica
para fins eleitorais (art. 350 do Código Eleitoral).
Em sua defesa, o denunciado alegou que a conta bancária encontrada não está em
nome dele. A sua titularidade pertence a um trust e, portanto, ele não teria
obrigação de declará-la ao BACEN nem à Justiça Eleitoral.
Esta tese não foi aceita pelo STF no momento do recebimento da denúncia.
O Deputado Federal foi o instituidor do trust e figura como beneficiário. Além
disso, o trust era revogável, de forma que a relação contratual poderia ser a
qualquer momento desfeita e o patrimônio voltaria à sua titularidade. Logo, para o
STF, ele detém a plena disponibilidade jurídica e econômica dos valores que
integram o trust.
Assim, se ele não declarou a existência de tais valores ao Banco Central e à Justiça
Eleitoral, praticou, em tese, os crimes de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei
9613/98), evasão de divisas (art. 22, § único, da Lei 7.492/86) e falsidade ideológica
para fins eleitorais (art. 350 do Código Eleitoral).
O fato de as quantias não estarem formalmente em seu nome é absolutamente
irrelevante para a tipicidade da conduta.
A manutenção de valores em contas no exterior, mediante utilização de interposta
pessoa ou forma de investimento (trust), além de não desobrigar o beneficiário de
apresentar a correspondente declaração ao BACEN, revela veementes indícios do
ilícito de lavagem de dinheiro.
STF. Plenário. Inq 4146/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 22/6/16 (Info 831).

41. LAVAGEM DE DINHEIRO


41.1. Simples fato de ter recebido a propina em espécie não configura lavagem de
dinheiro – (Info 904)
41.2. Recebimento de propina em depósitos bancários fracionados pode configurar
lavagem – (Info 904)

O mero recebimento de valores em dinheiro não tipifica o delito de lavagem, seja


quando recebido pelo próprio agente público, seja quando recebido por interposta
pessoa.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/5/18 (Info 904).

Pratica lavagem de dinheiro o sujeito que recebe propina por meio de depósitos
bancários fracionados, em valores que não atingem os limites estabelecidos pelas
autoridades monetárias à comunicação compulsória dessas operações.
Ex: suponhamos que, na época, a autoridade bancária dizia que todo depósito
acima de R$ 20 mil deveria ser comunicado ao COAF; diante disso, um Deputado
recebia depósitos periódicos de R$ 19 mil para burlar essa regra. Para o STF, isso
configura o crime de lavagem. Trata-se de uma forma de ocultação da origem e da
localização da vantagem pecuniária recebida pela prática do crime antecedente.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/5/2018 (Info 904).
OBS:
A situação concreta foi a seguinte: O Deputado Federal Nelson Meurer (PP/PR)
integrava a cúpula do Partido Progressista (PP). Como importante figura partidária,
ele exercia pressão política junto à Presidência da República a fim de que Paulo
Roberto Costa fosse mantido como Diretor de Abastecimento da Petrobrás. Como
“contraprestação” por esse apoio, o Deputado recebia dinheiro do referido Diretor,
quantia essa oriunda de contratos ilegais celebrados pela Petrobrás. Essa prática foi
revelada pelo próprio Paulo Roberto Costa em declaração prestada no bojo de acordo
de colaboração premiada. O Deputado foi denunciado pela prática de corrupção
passiva (art. 317 do CP) e também por lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/98).

O que o STF decidiu? O STF condenou o réu pela prática dos delitos. O crime de
lavagem de dinheiro é tipificado nos seguintes termos:
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização,
disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos
ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração
penal.
Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa.
O Ministério Público apontava uma série de condutas que configurariam o crime de
lavagem de dinheiro. Inicialmente, o STF afirmou que o réu não cometeu o crime
quando recebeu o pagamento das propinas em espécie (em “dinheiro vivo”).
O mero recebimento de valores em dinheiro não tipifica o
delito de lavagem, seja quando recebido pelo próprio agente
público, seja quando recebido por interposta pessoa.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado
em 29/5/2018(Info 904).

Assim, se uma pessoa recebe propina em dinheiro, isso não significa, necessariamente,
a prática de lavagem de dinheiro.

Por outro lado, o STF entendeu que:


O agente praticou a lavagem pelo fato de ter recebido a
propina em depósitos bancários fracionados, em valores que
não atingem os limites estabelecidos pelas autoridades
monetárias à comunicação compulsória dessas operações.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado
em 29/5/2018(Info 904).

Ex: suponhamos que, na época, a autoridade bancária dizia que todo depósito acima
de R$ 20 mil deveria ser comunicado ao COAF; diante disso, o Deputado recebia
depósitos periódicos de R$ 19 mil para burlar essa regra. Para o STF, isso configura o
crime de lavagem. Trata-se de uma forma de ocultação da origem e da localização da
vantagem pecuniária recebida pela prática do crime anterior.

Além disso, a apresentação de informações falsas em declarações de ajuste anual de


imposto de renda foi uma forma de tentar dar um ar de licitude a patrimônio
oriundo de práticas delituosas.

41.3. Lavagem de dinheiro, na modalidade “ocultar”, é crime permanente – (Info


866)

O delito de lavagem de bens, direitos ou valores (“lavagem de dinheiro”), previsto


no art. 1º da Lei nº 9.613/98, quando praticado na modalidade de ocultação, tem
natureza de crime permanente.
A característica básica dos delitos permanentes está na circunstância de que a
execução desses crimes não se dá em um momento definido e específico, mas em
um alongar temporal. Quem oculta e mantém oculto algo, prolonga a ação até que
o fato se torne conhecido.
Assim, o prazo prescricional somente tem início quando as autoridades tomam
conhecimento da conduta do agente.
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/17 (Info 866).

41.4. Culpabilidade de parlamentar que exerce mandato há muitos anos é mais


intensa – (Info 866)

Na primeira fase da dosimetria em caso de condenação por lavagem de dinheiro, o


órgão julgador poderá aumentar a pena-base do Deputado Federal que exerce
mandato há muitos anos, sob o argumento de que sua culpabilidade é mais intensa.
A transgressão da lei por parte de quem usualmente é depositário da confiança
popular para o exercício do poder enseja juízo de reprovação muito mais intenso
do que seria cabível em se tratando de um cidadão comum.
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/17 (Info 866).

41.5. Reprovabilidade do crime cometido por “homem público” é maior – (Info 866)

Se um Deputado Federal que exerce mandato há muitos anos é condenado, o órgão


julgador poderá aumentar a pena-base atribuindo destaque negativo para a
“reprovabilidade”.
A circunstância de o réu ser homem de longa vida pública, acostumado com regras
jurídicas, enseja uma maior reprovabilidade em sua conduta considerando a sua
capacidade acentuada de conhecer e compreender a necessidade de observar as
normas.
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/2017 (Info 866).

41.6. Pena pode ser aumentada se o crime de lavagem envolveu grandes somas de
valores – (Info 866)

Se a lavagem de dinheiro envolveu valores vultosos, a pena-base poderá ser


aumentada (“consequências do crime”) tendo em vista que, neste caso, considera-
se que o delito violou o bem jurídico tutelado de forma muito mais intensa do que
o usual.
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/17 (Info 866).

41.7. Pena pode ser aumentada se a lavagem de dinheiro ocorreu por meio de várias
transações financeiras envolvendo diversos países – (Info 866)

A pena-base pode ser aumentada, no que tange às “circunstâncias do crime”, se a


lavagem de dinheiro ocorreu num contexto de múltiplas transações financeiras e
de múltipla transnacionalidade, o que interfere na ordem jurídica de mais de um
Estado soberano.
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/2017 (Info 866).

41.8. Condenação por lavagem no “caso Maluf” – (Info 866)

Pratica o crime de lavagem de dinheiro o Deputado Federal que encobre (oculta) o


dinheiro recebido decorrente de corrupção passiva, utilizando-se, para tanto, de
contas bancárias e fundos de investimentos situados na Ilha de Jersey, abertos em
nome de empresas “offshores”, com o objetivo de encobrir a verdadeira origem,
natureza e propriedade dos referidos aportes financeiros.
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/2017 (Info 866).

42. CRIMES DE RESPONSABILIDADE DOS PREFEITOS (DL 201/67)


42.1. Para a configuração do delito do art. 1º, XIV, é indispensável a inequívoca
ciência do Prefeito – (Info 802)
O art. 1º, XIV, do DL 201/67 prevê que o Prefeito pratica crime quando nega
execução a lei federal, estadual ou municipal, ou deixa de cumprir ordem judicial,
sem dar o motivo da recusa ou da impossibilidade, por escrito, à autoridade
competente.
Vale ressaltar, no entanto, que, segundo entende o STF, para a configuração do
delito em tela é indispensável que o MP comprove a inequívoca ciência do Prefeito
a respeito da ordem judicial.
Ex: em Joinville (SC), o juiz expediu ordem judicial determinando que o Município
se abstivesse de praticar determinado ato administrativo. A ordem judicial foi
endereçada à Procuradoria do Município. Mesmo após a intimação ser efetivada, o
ato administrativo questionado foi praticado. Diante disso, o Ministério Público
ofereceu denúncia contra o Prefeito, imputando-lhe a prática do crime previsto no
art. 1º, XIV, do DL 201/67. O STF absolveu o réu. Segundo entenderam os Ministros,
não foram produzidas provas de que o réu tenha tido conhecimento da ordem
judicial ou que tenha concorrido para seu descumprimento. Para configuração do
delito em tela, é indispensável que o MP comprove a inequívoca ciência do Prefeito
a respeito da ordem judicial, não sendo suficiente que a determinação judicial
tenha sido comunicada a terceiros. Para que o Prefeito pudesse ser
responsabilizado criminalmente, seria indispensável a sua intimação pessoal.
STF. 1ª Turma. AP 555/SC, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 6/10/2015 (Info 802).

42.2. Delito do inciso I do DL 201/67 – (Info 788)

O crime do art. 1º, I, do Decreto-Lei 201/1967 é próprio, somente podendo ser


praticado por prefeito, admitida, porém, a participação, nos termos do art. 29 do CP.
Ex: Deputado Federal apresentou emenda parlamentar ao orçamento da União
autorizando o repasse de recursos para o Município “X”, verba destinada à
aquisição de uma ambulância. O recurso foi transferido, foi realizada a licitação,
mas o certame foi direcionado em favor de determinada empresa que superfaturou
o preço. Ficou demonstrado que o Prefeito, o Deputado e os donos da empresa
vencedora estavam em conluio para a prática dessa conduta. Desse modo, todos
eles irão responder pelo delito do art. 1º, I, do DL 201/67.
STF. 2ª Turma. Inq 3634/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 2/6/15 (Info 788).

43. LEI DE SEGURANÇA NACIONAL


43.1. Transporte de granada sem motivação política não configura crime contra a
segurança nacional – (Info 827) – IMPORTANTE!!!

O agente que é preso com duas granadas de uso exclusivo do Exército que seriam
utilizadas para roubar um banco não pratica crime do art. 12 da Lei 7.170/83. Isso
porque não há, no presente caso, a motivação política, que consiste no "dolo
específico" (elemento subjetivo especial do tipo) exigido para a configuração dos
crimes de que trata a Lei de Segurança Nacional.
Se o sujeito praticar uma conduta semelhante a esta, em tese, ele deverá responder
pelo crime do art. 16 do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03).
STF. Plenário. RC 1472/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 25/5/16 (Info 827).
OBS:
O agente não responderá por tentativa de roubo? NÃO. Isso porque ele não chegou a
praticar nenhum ato executório do crime de roubo. Não houve início de execução. O
agente percorreu apenas as fases de cogitação e de preparação, tendo sido
interrompido nos atos preparatórios. Como regra, os atos preparatórios não são
punidos.

44. CRIMES HEDIONDOS


44.1. Natureza hedionda do estupro e do antigo atentado violento ao pudor – (Info
835)

Os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, mesmo que cometidos antes da


edição da Lei 12.015/09, são considerados hediondos, ainda que praticados na forma
simples.
Em outras palavras, seja antes ou depois da Lei 12.015/09, toda e qualquer forma de
estupro (ou atentado violento ao pudor) é considerada crime hediondo, sendo
irrelevante que a prática de qualquer deles tenha causado, ou não, lesões corporais
de natureza grave ou morte.
STF. 1ª Turma. HC 100612/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min.
Roberto Barroso, j. 16/8/16 (Info 835).
OBS:
Atualmente, o crime de estupro simples (art. 213, caput, do CP) e de estupro de
vulnerável são considerados hediondos? SIM. Isso está previsto expressamente no art.
1º, V e VI, da Lei nº 8.072/90:
Art. 1º São considerados hediondos os seguintes crimes, todos
tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940
- Código Penal, consumados ou tentados:
(...)
V - estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º); (Redação dada pela Lei
nº 12.015/2009)
VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1º, 2º, 3º e 4º);
(Redação dada pela Lei nº 12.015/2009)

E antes da Lei 12.015/09, o estupro e o atentado violento ao pudor eram considerados


hediondos? SIM.

45. TORTURA
45.1. Regime inicial de cumprimento de pena – (Info 789)

O STF já decidiu que é inconstitucional a Lei que impõe o regime inicial fechado
para os crimes hediondos e equiparados (STF. HC 111.840-ES).
Para o STJ, isso se aplica também ao delito de tortura, por ser este equiparado a
crime hediondo. Logo, o juiz deve desconsiderar a regra disposta no art. 1º, § 7º, da
Lei nº 9.455/1997, por ser esta norma também inconstitucional. Assim, não é
obrigatório que o condenado por crime de tortura inicie o cumprimento da pena no
regime prisional fechado. O juiz, no momento da dosimetria da pena, deverá seguir
as regras do art. 33 do CP.
No julgado noticiado neste Informativo, o Min. Marco Aurélio manifesta posição
pessoal de que o art. 1º, § 7º, da Lei nº 9.455/1997 seria constitucional, ou seja, seria
legítima a regra que impõe o regime inicial fechado para o crime de tortura. O
inteiro teor do julgado ainda não foi divulgado, mas penso que se trata de uma
posição minoritária e isolada do Min. Marco Aurélio. Os demais Ministros
acompanharam o Relator mais por uma questão de praticidade do que de tese
jurídica. Isso porque os demais Ministros entendiam que, no caso concreto, nem
caberia habeas corpus considerando que já havia trânsito em julgado. No entanto,
eles não aderiram expressamente à tese do Relator.
STF. 1ª Turma. HC 123316/SE, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 9/6/15 (Info 789).

46. CRIMES NA LEI DE LICITAÇÕES


46.1. Ausência do crime do art. 89 em conduta de Secretário de Estado que compra,
sem licitação, livros didáticos escolhidos por equipe técnica, de fornecedor exclusivo,
sem sobrepreço – (Info 913)

Não comete o crime do art. 89 da Lei nº 8.666/93 Secretária de Educação que faz
contratação direta, com base em inexigibilidade de licitação (art. 25, I), de livros
didáticos para a rede pública de ensino, livros esses que foram escolhidos por
equipe técnica formada por pedagogos, sem a sua interferência. Vale ressaltar que
havia comprovação, por meio de carta de exclusividade emitida por entidade do
setor, de que a empresa contratada era a única fornecedora dos livros na região.
Além disso, não houve demonstração de sobrepreço.
Diante dessas circunstâncias, o STF absolveu a ré por ausência de “dolo específico”
(elemento subjetivo especial).
STF. Plenário. AP 946/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 30/8/18 (Info 913).
OBS:
Administrador inábil ≠ administrador ímprobo: Para a responsabilização penal do
administrador público com base no art. 89 da Lei de Licitações (norma penal em
branco), cumpre analisar se foram violados os pressupostos de dispensa ou
inexigibilidade de licitação previstos nos arts. 24 e 25 da Lei, bem como se houve
vontade livre e consciente de violar a competição e de produzir resultado lesivo ao
patrimônio público. Tal compreensão busca distinguir o administrador probo que,
sem má-fé, agindo com culpa, aplica equivocadamente a norma de dispensa ou
inexigibilidade de licitação, daquele que afasta a concorrência de forma deliberada,
sabendo-a imperiosa, com finalidade ilícita.

Acusada não interferiu na escolha dos livros: Segundo observou o Min. Relator dos
embargos, a acusada não interferiu na escolha dos livros que foram adquiridos,
tendo eles sido selecionados por uma equipe técnica formada por pedagogos. Não
há também qualquer prova de que a ré tenha manifestado preferência por qualquer
uma das obras, editoras ou distribuidoras específicas. Não há qualquer vínculo entre
a Deputada e os sócios das empresas contratadas nem qualquer indício de acerto
prévio entre eles. Ademais, a escolha dos livros ideais para alcançar os objetivos do
programa governamental em questão é matéria circunscrita ao mérito do ato
administrativo. Desse modo, a seleção do melhor material didático não está vinculada
a critérios estritamente objetivos sobre os quais o Poder Judiciário possa exercer
controle jurisdicional.

Formalidades foram atendidas: As etapas necessárias para a declaração de


inexigibilidade de licitação por inviabilidade de competição foram cumpridas
conforme exige a lei e não ficou demonstrado o “dolo específico” da acusada para
favorecer empresas e lesar o Estado, o que afasta o enquadramento da conduta como
crime.

Carta de exclusividade: A empresa que foi contratada apresentou, na época, uma


“carta de exclusividade” na qual informa haver uma divisão regional de atuação
entre os concorrentes e que, naquela localidade, somente ela poderia comercializar
os livros. Isso justifica a inexigência de licitação com base no art. 25, I, da Lei nº
8.666/93:
Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade
de competição, em especial:
I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que
só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou
representante comercial exclusivo, vedada a preferência de
marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita
através de atestado fornecido pelo órgão de registro do
comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou
o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação
Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;

Vale ressaltar que essa prática (“carta de exclusividade”) é reconhecida como lícita
pelo Tribunal de Contas da União desde que emitida por entidade idônea vinculada
ao setor de mercado respectivo. No caso concreto, a carta de exclusividade foi emitida
pela Câmara Brasileira do Livro.

Compatibilidade dos preços: Outro ponto ressaltado é que os preços contratados são
compatíveis com aqueles praticados no mercado, não havendo provas de que tenha
havido sobrepreço (superfaturamento).

Faltou dolo: Assim, no caso concreto, o STF entendeu que não restou demonstrado
o “dolo específico” (elemento subjetivo especial) na conduta da ré. Em outras
palavras, não ficou provado que ela agiu com o intuito de beneficiar as empresas
contratadas nem que tenha agido com o objetivo de lesar o erário.

46.2. Aspectos importantes sobre o crime do art. 89 da Lei de Licitações – (Info 891)
– IMPORTANTE!!!

Elemento subjetivo
Para a configuração da tipicidade subjetiva do crime previsto no art. 89 da Lei
8.666/93, exige-se o especial fim de agir, consistente na intenção específica de lesar
o erário ou obter vantagem indevida.

Exige-se descumprimento de formalidades mais violação aos princípios da


Administração Pública
O tipo penal previsto no art. 89 não criminaliza o mero fato de o administrador
público ter descumprido formalidades. Para que haja o crime, é necessário que,
além do descumprimento das formalidades, também se verifique que ocorreu, no
caso concreto, a violação de princípios cardeais (fundamentais) da Administração
Pública.
Se houve apenas irregularidades pontuais relacionadas com a burocracia estatal,
isso não deve, por si só, gerar a criminalização da conduta.
Assim, para que ocorra o crime, é necessária uma ofensa ao bem jurídico tutelado,
que é o procedimento licitatório. Sem isso, não há tipicidade material.

Decisão amparada em pareceres técnicos e jurídicos


Não haverá crime se a decisão do administrador de deixar de instaurar licitação
para a contratação de determinado serviço foi amparada por argumentos previstos
em pareceres (técnicos e jurídicos) que atenderam aos requisitos legais, fornecendo
justificativas plausíveis sobre a escolha do executante e do preço cobrado e não
houver indícios de conluio entre o gestor e os pareceristas com o objetivo de fraudar
o procedimento de contratação direta.
STF. 1ª Turma. Inq 3962/DF, Rel. Min Rosa Weber, j. 20/2/2018 (Info 891).
OBS: A Lei de Licitação (Lei nº 8.666/93) prevê alguns tipos penais. O art. 89 tipifica
como crime a dispensa ou inexigibilidade indevida de licitação. Veja:
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses
previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades
pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena — detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo
comprovadamente concorrido para a consumação da
ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade
ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.

OBRIGATORIEDADE DE LICITAÇÃO
Regra: obrigatoriedade de licitação: Como regra, a CF/88 impõe que a Administração
Pública somente pode contratar obras, serviços, compras e alienações se realizar uma
licitação prévia para escolher o contratante (art. 37, XXI).

Exceção: contratação direta nos casos especificados na legislação: O inciso XXI afirma
que a lei poderá especificar casos em que os contratos administrativos poderão ser
celebrados sem esta prévia licitação. A isso, a doutrina denomina “contratação
direta”.

Resumindo: A regra na Administração Pública é a contratação precedida de licitação.


Contudo, a legislação poderá prever casos excepcionais em que será possível a
contratação direta sem licitação.

CONTRATAÇÃO DIRETA
A Lei de Licitações e Contratos prevê três grupos de situações em que a contratação
ocorrerá sem licitação prévia. Trata-se das chamadas licitações dispensadas,
dispensáveis e inexigíveis. Vejamos o quadro comparativo abaixo:
Dispensada Dispensável Inexigível
Art. 17 Art. 24 Art. 25
Rol taxativo Rol taxativo Rol exemplificativo
A lei determina a não A lei autoriza a não Como a licitação é uma
realização da licitação, realização da licitação. disputa, é indispensável
obrigando a contratação Mesmo sendo dispensável, que haja pluralidade de
direta. a Administração pode objetos e pluralidade de
decidir realizar a licitação ofertantes para que ela
(discricionariedade). possa ocorrer. Assim, a lei
prevê alguns casos em que
a inexigibilidade se verifica
porque há impossibilidade
jurídica de competição.
Ex.: quando a Ex.: compras de até R$ 8 Ex.: contratação de artista
Administração Pública mil. consagrado pela crítica
possui uma dívida com especializada ou pela
o particular e, em vez de opinião pública para fazer
pagá-la em espécie,
transfere a ele um bem o show do aniversário da
público desafetado, cidade.
como forma de quitação
do débito. A isso
chamamos de dação em
pagamento (art. 17, I,
"a").

Procedimento de justificação: Mesmo nas hipóteses em que a legislação permite a


contratação direta, é necessário que o administrador público observe algumas
formalidades e instaure um processo administrativo de justificação.

CRIME DO ART. 89
Tipo objetivo: O crime do art. 89 da Lei 8.666/93 ocorre se o administrador público...
• dispensar a licitação fora das hipóteses previstas em lei;
• inexigir (deixar de exigir) licitação fora das hipóteses previstas em lei; ou
• deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade (as
formalidades estão previstas especialmente no art. 26 da Lei).

Desse modo, haverá o crime tanto na hipótese em que a licitação é dispensada mesmo
sem lei autorizando ou determinando a dispensa, como na situação em que a lei até
autoriza ou determina, mas o administrador não observa os requisitos formais para
tanto.

Norma penal em branco: Como as hipóteses de dispensa e inexigibilidade estão


previstas na Lei nº 8.666/93, este tipo penal é taxado como:
 norma penal em branco (porque depende de complemento normativo);
 imprópria, em sentido amplo ou homogênea (o complemento normativo
emana do legislador);
 do subtipo homovitelínea ou homológa (o complemento emana da mesma
instância legislativa).

Tipo subjetivo: Para a configuração da tipicidade subjetiva do crime previsto no art.


89 da Lei 8.666/93, exige-se o especial fim de agir, consistente na intenção específica
de lesar o erário ou obter vantagem indevida. Esse entendimento é pacífico na
jurisprudência do STF e STJ:
Para a caracterização da conduta tipificada no art. 89 da Lei
8.666/93, é indispensável a demonstração, já na fase de
recebimento da denúncia, do elemento subjetivo consistente
na intenção de causar dano ao erário ou obter vantagem
indevida. STF. 2ª Turma. Inq 3965, Rel. Min. Teori Zavascki,
julgado em 22/11/2016.

O delito em questão exige, além do dolo genérico (representado pela vontade


consciente de dispensar ou inexigir licitação com descumprimento das formalidades),
a presença do especial fim de agir, que consiste no dolo específico de causar dano ao
erário ou de gerar o enriquecimento ilícito dos agentes envolvidos na empreitada
criminosa.

• Dolo genérico: vontade de dispensar ou inexigir licitação com descumprimento das


formalidades;
• Especial fim de agir (“dolo específico”): intenção de causar dano ao erário ou de
gerar o enriquecimento ilícito dos agentes envolvidos na empreitada criminosa.
Só há o crime do art. 89 se houver o dolo genérico mais o especial fim de agir.

Exige-se descumprimento de formalidades mais violação aos princípios da


administração pública:
O tipo penal previsto no art. 89 não criminaliza o mero fato de
o administrador público ter descumprido formalidades. Para
que haja o crime é necessário que, além do descumprimento
das formalidades, também se verifique que ocorreu, no caso
concreto, a violação de princípios cardeais (fundamentais)
da administração pública.
Se houve apenas irregularidades pontuais relacionadas com a
burocracia estatal, isso não deve, por si só, gerar a
criminalização da conduta.
Assim, para que ocorra o crime é necessária uma ofensa ao
bem jurídico tutelado, que é o procedimento licitatório. Sem
isso, não há tipicidade material.
STF. 1ª Turma. Inq 3962/DF, Rel. Min Rosa Weber, julgado em
20/2/2018 (Info 891).

Decisão amparada em pareceres técnicos e jurídicos:


Não haverá crime se a decisão do administrador de deixar de
instaurar licitação para a contratação de determinado serviço
foi amparada por argumentos previstos em pareceres
(técnicos e jurídicos) que atenderam aos requisitos legais,
fornecendo justificativas plausíveis sobre a escolha do
executante e do preço cobrado.
Exceção a essa regra seria o caso de haver provas de que o
administrador estaria em conluio com os pareceristas, com o
objetivo de fraudar o procedimento de contratação direta.
Ausentes essas provas, não há crime por falta de conduta
dolosa do gestor público.
STF. 1ª Turma. Inq 3962/DF, Rel. Min Rosa Weber, julgado em
20/2/2018 (Info 891).

Caso semelhante julgado pelo STF:


O objetivo do art. 89 não é punir o administrador público
despreparado, inábil, mas sim o desonesto, que tinha a
intenção de causar dano ao erário ou obter vantagem
indevida. Por essa razão, é necessário sempre analisar se a
conduta do agente foi apenas um ilícito civil e administrativo
ou se chegou a configurar realmente crime.
Deverão ser analisados três critérios para se verificar se o
ilícito administrativo configurou também o crime do art. 89:
1º) existência ou não de parecer jurídico autorizando a
dispensa ou a inexigibilidade. A existência de parecer jurídico
é um indicativo da ausência de dolo do agente, salvo se
houver circunstâncias que demonstrem o contrário.
2º) a denúncia deverá indicar a existência de especial
finalidade do agente de lesar o erário ou de promover
enriquecimento ilícito.
3º) a denúncia deverá descrever o vínculo subjetivo entre os
agentes.
STF. 1ª Turma. Inq 3674/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em
7/3/2017 (Info 856).

46.3. Se o software adquirido sem licitação tinha mais especificações do que os das
concorrentes e era mais adequado ao seu objeto, não há o crime do art. 89 – (Info 861)

Determinado Secretário de Educação fez contratação direta, com inexigibilidade de


licitação, com a empresa "X", por meio da qual adquiriu mil licenças de uso do
software "XX" para organizar os horários e grades escolares da rede de ensino
estadual, no valor total de R$ 1 milhão.
O Ministério Público denunciou o Secretário pela prática do crime do art. 89 da Lei
8.666/93 argumentando que outras empresas ofereciam softwares diferentes, mas
com as mesmas funcionalidades, por preço menor. Dessa forma, o Parquet alegou
que seria possível sim a concorrência entre as empresas, não sendo caso de
inexigibilidade de licitação.
O STF entendeu que não houve crime.
O laudo pericial constatou que o “software” da empresa escolhida tinha mais
especificações do que os das concorrentes e era mais adequado ao seu objeto.
O STF afirmou também que não há nos autos prova de conluio com a empresa
escolhida e de recebimento de qualquer vantagem econômica pelo então Secretário.
Por fim, asseverou que o crime previsto no art. 89 da Lei nº 8.666/1993 exige o dolo,
consubstanciado na vontade livre e consciente de praticar o ilícito penal, que não
se faz presente quando o acusado atua com fulcro em parecer da Procuradoria
Jurídica no sentido da inexigibilidade da licitação.
STF. 1ª Turma. Inq 3753/DF, Rel. Min. Luiz Fux, j. 18/4/2017 (Info 861).
OBS: A Lei de Licitação (Lei nº 8.666/93) prevê alguns tipos penais. O art. 89 tipifica
como crime a dispensa ou inexigibilidade indevida de licitação. Veja:
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses
previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades
pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena — detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo
comprovadamente concorrido para a consumação da
ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade
ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.

46.4. Administrador que contrata empresa para reforma de ginásio sem situação de
emergência e que depois faz aditivo para ampliar o objeto pratica, em tese, os delitos
dos arts. 89 e 92 – (Info 859)

Determinado Deputado Federal, na época em que era Secretário de Estado,


contratou, sem licitação, empresa para a realização de obras emergenciais em um
ginásio. Depois de o contrato estar assinado, o Secretário celebrou termo aditivo
com a empresa para que ela fizesse a demolição e reconstrução das instalações do
ginásio.
O parlamentar foi denunciado pelos crimes dos arts. 89 e 92 da Lei nº 8.666/93.
Algumas conclusões do STF no momento do recebimento da denúncia:
1) A declaração de emergência feita por Governador do Estado, por si só, não
caracteriza situação que justifique a dispensa de licitação;

2) O crime do art. 89 da Lei de Licitações não é inconstitucional nem viola o


princípio da proporcionalidade;

3) O aditamento realizado descaracterizou o contrato original e, portanto,


configura, em tese, a prática do art. 92. O aditamento, neste caso, ao contrário do
que permite a Lei, foi qualitativo. Além disso, houve uma ampliação contratual
acima de 50% do valor original do contrato, o que é proibido pelo art. 65, § 1º da
Lei nº 8.666/93.

4) O fato de a dispensa de licitação e de o aditamento do contrato terem sido


precedidos de parecer jurídico não é bastante para afastar o dolo caso outros
elementos externos indiciem a possibilidade de desvio de finalidade ou de conluio
entre o gestor e o responsável pelo parecer.
STF. 1ª Turma. Inq 3621/MA, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o ac. Min. Alexandre
de Moraes, j. 28/3/2017 (Info 859).
OBS:
Art. 89 (dispensa indevida de licitação):
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses
previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades
pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo
comprovadamente concorrido para a consumação da
ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade
ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.

Art. 92 (modificação ilegal do contrato administrativo)


Art. 92. Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer
modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual,
em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos
celebrados com o Poder Público, sem autorização em lei, no
ato convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos
contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem
cronológica de sua exigibilidade, observado o disposto no art.
121 desta Lei:
Pena - detenção, de dois a quatro anos, e multa.
Parágrafo único. Incide na mesma pena o contratado que,
tendo comprovadamente concorrido para a consumação da
ilegalidade, obtém vantagem indevida ou se beneficia,
injustamente, das modificações ou prorrogações contratuais.

Art. 65, §1º (vedação à ampliação contratual acima de 50% do valor original do
contrato)
Art. 65 (...)
§ 1º O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas
condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se
fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco
por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso
particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o
limite de 50% (cinquenta por cento) para os seus acréscimos.

46.5. O crime do art. 89 da Lei 8.666/93 exige dano ao erário? Critérios para
verificação judicial da viabilidade da denúncia pelo art. 89 – (Info 856)

O crime do art. 89 da Lei 8.666/93 exige resultado danoso (dano ao erário) para se
consumar?
1ª corrente: SIM. Posição do STJ e da 2ª Turma do STF.

2ª corrente: NÃO. Entendimento da 1ª Turma do STF (Info 813).

O objetivo do art. 89 não é punir o administrador público despreparado, inábil, mas


sim o desonesto, que tinha a intenção de causar dano ao erário ou obter vantagem
indevida. Por essa razão, é necessário sempre analisar se a conduta do agente foi
apenas um ilícito civil e administrativo ou se chegou a configurar realmente crime.
Deverão ser analisados três critérios para se verificar se o ilícito administrativo
configurou também o crime do art. 89:
1º) existência ou não de parecer jurídico autorizando a dispensa ou a
inexigibilidade. A existência de parecer jurídico é um indicativo da ausência de
dolo do agente, salvo se houver circunstâncias que demonstrem o contrário.

2º) a denúncia deverá indicar a existência de especial finalidade do agente de lesar


o erário ou de promover enriquecimento ilícito.

3º) a denúncia deverá descrever o vínculo subjetivo entre os agentes. Assim, a


imputação do crime definido no art. 89 da Lei 8.666/93 a uma pluralidade de agentes
exige a descrição da existência de vínculo subjetivo entre os participantes para a
obtenção do resultado criminoso. Não basta que a denúncia narre o ato
administrativo formal eivado de irregularidade.
STF. 1ª Turma. Inq 3674/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, j. 7/3/2017 (Info 856).
OBS:
A Lei de Licitação (Lei nº 8.666/93) prevê alguns tipos penais.
O art. 89 tipifica como crime a dispensa ou inexigibilidade indevida de licitação. Veja:
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses
previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades
pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena — detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo
comprovadamente concorrido para a consumação da
ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade
ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.

Tipo subjetivo: Para a configuração da tipicidade subjetiva do crime previsto no art.


89 da Lei 8.666/93, exige-se o especial fim de agir, consistente na intenção específica
de lesar o erário ou obter vantagem indevida. Esse entendimento é pacífico na
jurisprudência do STF e STJ:
Para a caracterização da conduta tipificada no art. 89 da Lei
8.666/1993, é indispensável a demonstração, já na fase de
recebimento da denúncia, do elemento subjetivo consistente
na intenção de causar dano ao erário ou obter vantagem
indevida. STF. 2ª Turma. Inq 3965, Rel. Min. Teori Zavascki, j.
22/11/2016.

46.6. Requisitos para a configuração do crime do art. 89 – (Info 813)

Para que haja a condenação pelo crime do art. 89 da Lei nº 8.666/93, exige-se a
demonstração de que houve prejuízo ao erário e de que o agente tinha a finalidade
específica de favorecimento indevido.
Assim, mesmo que a decisão de dispensa ou inexigibilidade da licitação tenha sido
incorreta, isso não significa necessariamente que tenha havido crime, sendo
necessário analisar o prejuízo e o dolo do agente.
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar
de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
STF. 2ª Turma. Inq 3731/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/2/2016 (Info
813).
OBS:
A jurisprudência do STF, ao interpretar o art. 89 da Lei 8666/93, exige a demonstração
do prejuízo ao erário e a finalidade específica de favorecimento indevido para
reconhecer a adequação típica.
O objetivo desse entendimento é separar os casos em que ocorre interpretação
equivocada das normas, ou mesmo puro e simples erro do administrador daqueles
em que a dispensa buscara efetivo favorecimento dos agentes envolvidos.
As provas constantes dos autos não demonstram que a denunciada tenha agido com
intenção de causar prejuízo ao erário ou favorecer a empresa contratada. Não há
elementos que indiquem que a denunciada tenha pessoalmente exercido influência na
escolha.
Em princípio, a denunciada agiu com a crença de que a contratação seria conveniente
e adequada e de que a licitação seria inexigível de acordo com os critérios jurídicos.
Por fim, não se vislumbrou elementos suficientes a indicar vontade de causar prejuízo
ao erário ou favorecer a contratada.

46.7. Art. 89 da Lei n. 8.666/93 – (Info 756)

O STF julgou denúncia contra ex-prefeito pela prática do delito previsto no art. 89
da Lei n. 8.666/93.
Para ser válida, a contratação direta de escritório de advocacia por inexigibilidade
de licitação precisa atender aos seguintes requisitos:
a) é necessário que se instaure um procedimento administrativo formal;
b) deverá ser demonstrada a notória especialização do profissional a ser contratado;
c) deverá ser demonstrada a natureza singular do serviço;
d) deverá ser demonstrado que é inadequado que o serviço a ser contratado seja
prestado pelos integrantes do Poder Público (no caso, pela PGM); e
e) o preço cobrado pelo profissional contratado deve ser compatível com o
praticado pelo mercado.
Sendo cumpridos esses requisitos, não há que se falar em crime do art. 89 da Lei n.
8.666/93.
STF. 1ª Turma. Inq 3074/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 26/8/14 (Info 756).
47. CRIMES ELEITORAIS
47.1. Para configurar o delito de calúnia eleitoral, é necessária a comprovação da
lesividade da conduta e, se o suposto atingido afirma não ter se ofendido, não há prova
da materialidade – (Info 920)

O comitê de campanha do candidato Ronaldo foi arrombado e de lá furtados dois


computadores.
Em entrevista concedida a um jornal, Ronaldo teria afirmado que o maior suspeito
do crime era o governo.
Em razão das declarações, o Ministério Público eleitoral ofereceu denúncia contra
Ronaldo pela prática de calúnia eleitoral (art. 324 c/c art. 327, III, do Código
Eleitoral), figurando como suposta vítima Teotônio, Governador e candidato a
reeleição.
O réu se defendeu alegando que apenas emitiu opinião sobre o ocorrido e que não
citou o nome do Governador.
Vale ressaltar que Teotônio (suposta vítima) afirmou que não se sentiu
pessoalmente ofendido.
Diante disso, o STF absolveu o réu afirmando que, para configurar o delito de
calúnia é necessária a comprovação da lesividade da conduta e que, como o suposto
atingido afirma não ter se ofendido com as declarações, não há prova da
materialidade da conduta delituosa.
STF. Plenário. AP 929 ED-2º julg-EI/AL, Rel. Min. Luiz Fux, j. 17/10/2018 (Info 920).
OBS:
O Ministério Público denunciou Ronaldo Lessa, imputando-lhe a prática do crime de
calúnia eleitoral, delito tipificado no art. 324 c/c art. 327, III, do Código Eleitoral:
Art. 324. Caluniar alguém, na propaganda eleitoral, ou
visando fins de propaganda, imputando-lhe falsamente fato
definido como crime:
Pena - detenção de seis meses a dois anos, e pagamento de 10
a 40 dias-multa.

Art. 327. As penas cominadas nos artigos 324, 325 e 326,


aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido:
(...)
III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a
divulgação da ofensa.

Por que a denúncia foi oferecida pelo Ministério Público (e não pelo suposto
ofendido)? Porque os crimes eleitorais (inclusive os delitos eleitorais contra a honra)
são de ação penal pública incondicionada, conforme prevê o art. 355 do CE, sendo
desnecessária representação do ofendido para que o Ministério Público ofereça a
denúncia. Veja a redação legal:
Art. 355. As infrações penais definidas neste Código são de
ação pública.

O réu foi condenado ou absolvido pelo Plenário do STF? Absolvido. O Plenário do


STF absolveu o Deputado da acusação de calúnia eleitoral. Ademais, o depoimento
da vítima – sujeito passivo direto dos crimes contra a honra – assume papel de
relevância, porquanto é o titular do bem jurídico protegido pela norma
criminalizadora. No caso, a suposta vítima pronunciou-se nos autos expressando
que tudo não passou de querela, inerente ao calor do debate eleitoral, e que seus
efeitos se exauriram naquele contexto, sem sofrer qualquer ofensa a sua honra
pessoal. Consectariamente, não há prova segura da materialidade da conduta.

Suposto ofendido não se sentiu ofendido: O Min. Rel. Luiz Fux afirmou que o suposto
ofendido, Teotônio Vilela Filho, na qualidade de assistente da acusação, juntou
petição aos autos pedindo a absolvição de Lessa alegando que “as afirmações do réu
não lhe foram pessoalmente ofensivas”. A suposta vítima afirmou que o episódio
“não passou de querela, inerente ao calor da campanha; que seus efeitos se exauriram
naquele contexto, sem que tenha soçobrado ofensa alguma à sua honra pessoal”.

Ausência de lesividade da conduta: Para configurar o delito de calúnia, é necessária a


comprovação da lesividade da conduta. Como o suposto atingido afirma não ter se
ofendido com as declarações, não há prova da materialidade da conduta delituosa.
Além disso, o réu, cujo comitê fora invadido, teria dito suspeitar do governo, mas de
forma genérica, sem imputar especificamente a conduta a Teotônio Vilela Filho. A
maior parte da gravação da entrevista é inaudível, ou seja, não dá para entender o que
o réu falou. O único trecho audível da gravação da entrevista contraria a versão que
foi publicada pelo jornal. “O simples fato de o acusado ter se referido, na parte audível da
entrevista gravada, ao ‘governo’ como maior suspeito, não permite deduzir que a imputação do
fato criminoso foi feita, especificamente, ao então governador do estado, Teotônio Vilela”,
afirmou o Ministro Dias Toffoli. A prova da lesividade da conduta há de ser aferida
no curso da ação penal, perquirindo-se, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa,
a configuração ou não da materialidade delitiva, acima de dúvida razoável.

48. CRIMES POLÍTICOS


48.1. Para a configuração do crime político exige-se o preenchimento de requisitos
objetivo e subjetivo – (Info 885) – Atenção! Concursos Federais!

O réu ingressou clandestinamente em uma Usina Hidrelétrica e alterou a posição


da chave da bomba de alta pressão de óleo.
O MPF denunciou o agente pela prática do delito de sabotagem, previsto no art. 15
da Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/83), que consiste em crime político.
O STF entendeu que não houve crime político considerando que:
 Não houve lesão real ou potencial a um dos bens jurídicos listados no art.
1º da Lei nº 7.170/83 (requisito objetivo); e
 O agente não tinha motivação política (requisito subjetivo).
Além disso, o Tribunal entendeu que se tratava de crime impossível, considerando
que essa alteração da posição da chave não tinha condão de provocar qualquer
embaraço ao funcionamento da Usina.
STF. 1ª Turma. RC 1473/SP, Rel. Min. Luiz Fux, j. 14/11/17 (Info 885).
OBS:
(...) O Supremo Tribunal Federal, a partir de interpretação
sistemática da Lei nº 7.170/83, assentou que, para a tipificação
de crime contra a segurança nacional, não basta a mera
adequação típica da conduta, objetivamente considerada, à
figura descrita no art. 12 do referido diploma legal. 2. Da
conjugação dos arts. 1º e 2º da Lei nº 7.170/83, extraem-se dois
requisitos, de ordem subjetiva e objetiva: i) motivação e
objetivos políticos do agente, e ii) lesão real ou potencial à
integridade territorial, à soberania nacional, ao regime
representativo e democrático, à Federação ou ao Estado de
Direito. (...)
STF. Plenário. RC 1472, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 25/5/16.

49. PEDERASTIA
49.1. Inconstitucionalidade das expressões que mencionem homossexualismo (Info
805)

O tipo penal do art. 235 do CPM continua sendo crime mesmo com a CF/88. No
entanto, devem ser consideradas incompatíveis com a CF/88 as expressões
empregadas que falem em homossexualismo. Isso porque o crime em tela se
configura tanto quando o militar pratica relação sexual com alguém do mesmo sexo,
como também de sexo diferente, não devendo haver distinção de tratamento.
Assim, as expressões “pederastia ou outro” — mencionada na rubrica enunciativa
referente ao art. 235 do CPM — e “homossexual ou não” — contida no aludido
dispositivo — não foram recepcionadas pela CF/88.
STF. Plenário. ADPF 291/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 28/10/2015
(Info 805).

50. HOMOFOBIA
50.1. Manifestação homofóbica é conduta ATÍPICA – (Info 754) – IMPORTANTE!!!
– (MPBA-2015)

Proferir manifestação de natureza discriminatória em relação aos homossexuais


NÃO configura o crime do art. 20 da Lei n. 7.716/86, sendo conduta atípica.
STF. 1ª Turma. Inq 3590/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12/8/2014 (Info
754).
(MPBA/15): A L.7.716/89 tipifica e estabelece punição de crimes resultantes de
discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional,
estando excluída a discriminação ou preconceito relativo à orientação sexual.

(PCRN/09): A L.7.716/89 não considera crime de racismo o ato preconceituoso


contra homossexual praticado em razão da opção sexual da vítima.

(GDF/15): De acordo com o que dispõe a L.7.716/89, não caracteriza crime de


discriminação ou preconceito: c) Patrão que ameace causar a empregado, por meio
de palavra, gesto ou qualquer outro meio simbólico, mal injusto e grave, em
virtude de esse empregado ser homossexual.

51. CRIMES AMBIENTAIS


51.1. PESCA ILEGAL: Pessoa presa sem peixes, mas com equipamentos, em local
onde a pesca é proibida comete crime? – (Info 845)

A Lei de Crimes Ambientais tipifica a pesca ilegal, nos seguintes termos:


"Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados
por órgão competente:"
Se a pessoa é flagrada sem nenhum peixe, mas portando consigo equipamentos de
pesca, em um local onde esta atividade é proibida, ela poderá ser absolvida do delito
do art. 34 da Lei de Crimes com base no princípio da insignificância?
A 2ª Turma do STF possui decisões conflitantes sobre o tema:
SIM. Inq 3788/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 1°/3/16 (Info 816).

NÃO. RHC 125566/PR e HC 127926/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26/10/16 (Info 845).

STF. 2ª Turma. RHC 125566/PR e HC 127926/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26/10/16
(Info 845).

51.2. Aplica-se o princípio da insignificância aos crimes ambientais – (Info 816)

É possível aplicar o princípio da insignificância para crimes ambientais.


Ex: pessoa encontrada em uma unidade de conservação onde a pesca é proibida,
com vara de pescar, linha e anzol, conduzindo uma pequena embarcação na qual
não havia peixes.
STF. 2ª Turma. Inq 3788/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 1°/3/2016 (Info
816).
OBS:
A jurisprudência do STF é no sentido da aplicabilidade do princípio da insignificância
aos crimes ambientais, tanto com relação aos de perigo concreto — em que haveria
dano efetivo ao bem jurídico tutelado —, quanto aos de perigo abstrato, como no art.
34, caput, da Lei nº 9.605/98.
No processo em exame, não se produziu prova material de que tenha havido qualquer
dano efetivo ao meio ambiente. Ademais, mesmo diante de crime de perigo abstrato,
não é possível dispensar a verificação “in concreto” do perigo real ou mesmo potencial
da conduta praticada pelo acusado com relação ao bem jurídico tutelado. Esse perigo
real não se verificou no caso concreto.

51.3. Responsabilidade penal da pessoa jurídica – (Info 714) – IMPORTANTE!!! –


(TRF3-2016) (TJCE-2018)

É possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais


independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia
em seu nome. A jurisprudência não mais adota a chamada teoria da "dupla
imputação".
STJ. 6ª Turma. RMS 39.173-BA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 6/8/15 (Info
566).
STF. 1ª Turma. RE 548181/PR, Rel. Min. Rosa Weber, j. 6/8/13 (Info 714).
(TRF3-2016): Relativamente à responsabilidade penal da pessoa jurídica, é
possível afirmar que: Independe da responsabilização das pessoas físicas
envolvidas, conforme decidiu o STF, ao julgar o RE 548181/PR, de relatoria da
Ministra Rosa Weber. BL: Info 714, STF.

52. ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÕES (LEI 9.472/97)


52.1. Transmitir sinal de internet como provedor sem autorização da ANATEL
configura o crime do art. 183 da Lei nº 9.472/97? – (Info 883) – Atenção! Concursos
Federais!

A conduta de transmitir sinal de internet, via rádio, como se fosse um provedor de


internet, sem autorização da ANATEL, configura o crime do art. 183 da Lei nº
9.472/97?
STJ: SIM. A transmissão clandestina de sinal de internet, via radiofrequência, sem
autorização da ANATEL, caracteriza, em tese, o delito previsto no art. 183 da Lei nº
9.472/97. Nesse sentido: STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1077499/SP, Rel. Min.
Reynaldo Soares da Fonseca, j. 26/9/17.

STF: NÃO. A oferta de serviço de internet é concebida como serviço de valor


adicionado e, portanto, não pode ser considerada como atividade clandestina de
telecomunicações, não caracterizando o crime do art. 183 da Lei nº 9.472/97. Foi o
que decidiu a 1ª Turma do STF no HC 127978, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 24/10/17
(Info 883).
STF. 1ª Turma. HC 127978, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 24/10/17 (Info 883).
OBS:
Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de
telecomunicação:
Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade
se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil
reais).

53. CRIME MILITAR


53.1. Configuração de crime militar e licenciamento

Na configuração de crime militar observa-se a data do evento delituoso,


considerado neutro o fato de o autor estar licenciado.
STF. Plenário. HC 132847/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 26/6/2018 (Info 908).

O fato de o paciente não mais integrar as fileiras das Forças Armadas não tem
qualquer relevância sobre o prosseguimento da ação penal pelo delito tipicamente
militar de abandono do posto, visto que ele, no tempo do crime, era militar da ativa.
STF. 2ª Turma. HC 130793, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 02/08/2016.

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