Você está na página 1de 4

Princípios Gerais do Contencioso Administrativo

Em termos gerais, os Princípios Jurídicos, entendidos no sentido de valores


estruturantes do ordenamento jurídico, têm como função dar coerência ao sistema[1],
sendo necessária a sua apreensão, de forma a compreender as valorações subjacentes
aos institutos e normas jurídicas de um dado sistema.

Assim, o conhecimento e compreensão, dos Princípios Jurídicos, que modelam o


sistema de contencioso administrativo, é “vinculativo”, para quem pretenda interpretar e
aplicar as normas que o compõe.

Com as duas últimas reformas do contencioso administrativo, houve uma aproximação


considerável, entre os sistemas processuais civil e administrativo. Creio, fazer sentido,
afirmar, que cada vez mais, o Direito Processual civil é o ramo de Direiro Processual
Geral, e o Contencioso Administrativo, um ramo de Direito Processual Especial, tendo
em contas as suas especificidades, nomeadamente, devido ao facto, das relações
jurídico-administrativas estarem sujeitas a um regime de Direito Público, o Direito
Administrativo. Assim sendo, muitos dos Princípios que encontramos no Contencioso
Administrativo, encontramos, igualmente, no Processo Civil, que tem contribuído para
as transformações ocorridas no Processo Administrativo, havendo uma confluência de
soluções.

A exposição dos vários Princípios, vai seguir de perto, a sistematização adotada pelo
Prof. José Carlos Viera de Andrade[3]. Assim, agrupamos os Princípos nos seguintes
termos:
1. Princípios relativos à iniciativa processual;
2. Princípios relativos ao âmbito do processo;
3. Princípios relativos à prossecução processual;
4. Princípios relativos à prova;
5. Princípios relativos à forma processual.

1.Princípios relativos à iniciativa processual

1.1 Princípio da Necessidade do Pedido


Trata-se de um Princípio decorrente do Direito Processual Civil. Cabe às partes,
elaborar um Pedido, de forma a que o Tribunal, se possa pronunciar sobre a questão e
elaborar, consequentemente, uma decisão de fundo. (arts. 3/1, CPC; 2/1, CPTA).

1.2 Princípios do Dispositivo e da Oficialidade


O Princípio do Dispositivo, encontra-se, igualmente, presente em ambos os ramos
processuais, civil e administrativo. Trata-se do Princípio, segundo o qual,
a iniciativa, no âmbito do Contencioso Administrativo, cabe em regra, aos particulares,
que são os titulares das posições subjetivas de vantagem, isto é, titulares de direitos
subjetivos face à Administração[4].
Regra geral, cabe aos particulares a iniciativa, de proposição da respetiva ação; porém,
em certas situações, outras entidades que não os titulares dos direitos subjetivos, podem
dar início a uma Ação. Designadamente, o Ministério Público, que pode intentar ações,
quando estas, tenham conexão com as competências que lhe são conferidas, nos termos
da lei. Assim, pode intentar Ações, quando estas visem a defesa da legalidade, de
valores comunitários, protecção de direitos, liberdades e garantias, bem como,
promoção do interesse público (neste sentido, arts. 9/2; 55/1 al.b; 73/4; todos do CPTA).
Relevante, neste âmbito, são as Ações populares, que podem ser intentadas, com a
finalidade de obter tutela sobre “interesses difusos”, ou, mais corretamente, de
verdadeiros direitos subjetivos.(art. 9/2, CPTA)

2. Princípios relativos ao âmbito do processo

2.1 Princípio da resolução global da situação litigiosa


Diz-nos, este Princípio, que todos os aspetos relevantes da situação jurídica em litígio
devem ser apreciados no mesmo processo, de forma a assegurar os interesses das partes,
bem como, a efetividade e celeridade do processo. Como manifestações deste Princípio
temos: 1) Permissividade de cumular pedidos (art. 4, CPTA); 2) Conhecimento oficioso
de certos vícios em determinadas espécies de ações; 3) Plenitude da execução, no
sentido de se permitir uma fase declarativa dentro da fase executiva, assegurando a
resolução global da situação litigiosa (ver. P. Ex. Art.164/3, CPTA).

2.2 Princípio da correspondência entre a decisão e o pedido


Este Princípio desdobra-se em duas vertentes: 1) Vertente positiva: o juíz só pode
apreciar as situações jurídicas que lhe são trazidas pelas partes (decorrência do
Dispositivo), bem como, pronunciar-se sobre todas as questões relevantes no âmbito da
situação jurídica em análise (arts. 660/2 e 668/1 al.d; ambos CPC); 2) Vertente
Negativa: o juíz não pode exceder o âmbito do pedido das partes, isto é, se for pedido ao
juíz a impugnação do Ato administrativo x, o juíz não pode aferir da legalidade do Ato
administrativo y. Exceções: 1) nas providências cautelares, o juíz não está vinculado, ao
pedido de um concreto tipo de providência cautelar, podendo optar pela providência
mais adequada ao caso concreto. 2) Convolação processual nos termos do art.121,
CPTA. 3) Nos termos do art. 45, CPTA; o juíz, em vez de satisfazer o pedido,
reconhece antes, o direito do autor a uma indemnização genérica, caso se mostrem
preenchidos os pressupostos deste artigo.

2.3 Princípio da Substanciação


Diz-nos este Princípio que, o juíz, está vinculado aos factos principais, trazidos ao
processo, pelas partes, isto é, está vinculado aos factos que fundamentam o pedido das
partes (causa de pedir). Devido ao Princípio do Interesse Público subjacente às Ações de
de impugnação de normas, outros fundamentos, podem ser tidos em conta pelo juíz, nos
termos do art. 75, CPTA.[5]

2.4 Princípio da estabilidade objetiva da instância


Nos termos deste Princípio, o objeto do processo, isto é, o pedido e a causa de pedir,
contidos na Petição inicial, deve manter-se igual, até à fase da decisão final (art. 95,
CPTA). Porém, existem várias restrições ao conteúdo deste Princípio: 1) Permite-se a
ampliação, ou, substituição do objeto processual, à luz dos arts. 63 e 64, ambos CPTA;
2) Permite-se a alteração da causa de pedir, nos termos dos art. 70, CPTA; 3) Quando
seja possível às partes invocar factos supervenientes, a causa de pedir, pode ser
ampliada, restringida, ou alterada, nos termos do art. 85, CPTA; 4) Ainda nos termos do
art.85, CPTA; o Ministério Público, pode, invocar vícios, que tenham como
consequência a Nulidade ou Inexistência de determinados Atos ou Normas,
modificando, a causa de pedir. Relativamente à atendibilidade de factos supervenientes,
nas Ações de Reconhecimento e Ações de Condenação, não há qualquer problema de
atendibilidade neste domínio. Porém, no âmbito, das Ações constitutivas, já há
problemas específicos: 1) Caso se trate, de atos de eficácia instantânea, visto que, para
apreciar da validade destes, tem de se atender, ao momento da sua prática, então, os
factos supervenientes não são atendíveis, pois, aquando da propositura da ação, já todos
os efeitos jurídicos do ato se verificaram; 2) Caso se trate, de atos de eficácia duradoura
e atos ainda não executados, a atendibilidade dos factos supervenientes é possível e é
desejável. Ainda que, dentro deste ponto, existam certas especificidades[6].

3. Princípios relativos à prossecução processual

3.1 Princípio da tipicidade dos trâmites processuais


Os trâmites processuais, bem como a sua sequência, devem ser tipificados na lei do
processo.

3.2 Princípio da compatibilidade e adequação formal


Este Princípio, visa atenuar a rigidez do Princípio da tipicidade, designadamente através
da cumulação de pedidos e do instituto da adequação formal, nos termos do art. 31,
CPC[7].

3.3 Princípio do Dispositivo


Relativamente, à condução do processo, cabe às partes, e não ao juíz, dinamizar o
mesmo. Encontra-se, manifestações deste Princípio nos artigos seguintes: 62, 88/4,
159/1; todos CPTA. Existem restrições a este Princípio quando este colide com o
Princípio da oficialidade, oficiosidade e inquisitório.

3.4 Princípio da Igualdade das partes, cooperação e Boa-fé processual


As partes, no processo, têm de ter um estatuto de igualdade efetiva, no que concerne aos
meios de defesa, à prova, à possibilidade de responder à outra parte etc. Decorrente da
igualdade, todos os sujeitos que participam no processo, devem colaborar entre si, com
o objetivo de se chegar a uma solução justa, de forma célere e eficaz. Subjacente a estes
Princípios encontra-se o Princípio da Boa-fé processual, pois só assim, se consegue
atingir tais desideratos. (art. 8, CPTA)[8].

3.5 Princípio do Contraditório


Trata-se de um Princípio que decorre da igualdade das partes no processo. Assim, em
caso de decisão desfavorável (evitar decisões-surpresa), deve ser dada hipótese, à parte
prejudicada, de responder, bem como, responder, sempre que a outra parte intervenha
no processo (art. 3, CPC)[9].

3.6 Princípio pro actione


O Princípio pro actione, decorre da tutela jurisdicional efetiva, nos termos do art.2,
CPTA; favorecendo o acesso ao tribunal, e evitando situações de denegação de justiça,
através da interpretação e aplicação das normas processuais tendo em conta esta
teleologia. A tutela dos direitos subjetivos dos particulares, face à administração, tem de
ser eficaz e eficiente, combatendo, se necessário, o excessivo formalismo e a sua
consequente rigidez, procurando soluções materiais mais conformes com o objetivo de
tutela dos direitos dos particulares, bem como, resolver definitivamente a situação
litigiosa, através de um decisao de mérito, não através de uma decisão formal[10].

4. Princípios relativos à prova

4.1 Princípio da verdade material


Na procura da verdade material pelo juíz, os fundamentos da sua decisão, não se
limitam aos factos que as partes trouxeram ao processo. Ainda assim, o juíz tem de
respeitar o objeto processual, delimitado pelas partes, e, adotar os trâmites processuais
fixados na lei. Em termos probatórios, este Princípio, confere ao juíz, inquisitoriedade,
podendo, ordenar a prática de determinadas diligências probatórias com a finalidade de
apurar a verdade material (art. 90/3, CPTA). Este Princípo, apresenta especial
relevância, quando haja momentos objetivistas, em dado tipo de Ação; neste sentido,
pode o juíz, alargar a instrução a factos instrumentais e conhecer oficiosamente certas
causas de invalidade dos atos ou normas[11].

4.2 Princípio da livre apreciação da prova


O Tribunal “aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente
convicção acerca de cada facto” (art.º 655.º/1 do CPC); isto é, o juíz dá como provado
um facto, se com base na sua experiência da vida/comum, obter um elevado grau de
convicção, acerca da veracidade ou não desse facto. No entanto, este Princípio é
limitado: 1 Contraditório; 2) Força probatória legal e 3) Presunções[12].

5. Princípios relativos à forma processual

5.1 Princípio da forma escrita e da oralidade


Para além, das peças escritas, há lugar a audição das partes na Audiência final, nos
termos gerais do CPC, por remissão do disposto no art. 35, CPTA.

5.2 Princípio da fundamentação das sentenças


As sentenças têm de ser fundamentadas expondo as razões de facto e de direito que
conduziram ao sentido da decisão (art. 94/3, CPTA).[1]

Você também pode gostar