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Processo nº 5727194-97

SENTENÇA

CLARO S.A. protocolou a presente AÇÃO


DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA em
face do ESTADO DE GOIÁS e MUNICÍPIO DE GOIÂNIA todos
devidamente qualificados na Inicial.

Além de todas as obrigações dispostas acima, o


Estado de Goiás instituiu, por meio da edição do Decreto
5.159/1999 que “institui o Programa de Descentralização das
Ações Ambientais no Estado de Goiás" e do Decreto 5.226/2000,
art. 4°, inciso VI que determinou a "atribuição da Agência Goiana
do Meio Ambiente -AGMA" a “apoiar os municípios na implantação
e no desenvolvimento de sistemas de gestão destinados a prevenir
e corrigir a poluição ou a degradação do meio ambiente”, a
necessidade de promover o licenciamento ambiental de suas
Estações de Rádio Base.

Tal obrigação tomou forma com a instituição do


Conselho Estadual do Meio Ambiente (CEMAm), regulamentado
pelo Decreto Estadual n° 5.805, de 21 de julho de 2003 (doc. 05),
que serviu de lastro para edição da Resolução 069/2006 CEMAn
(doc. 06), que incluiu, ao arrepio da Resolução 237/1997 do
CONAMA, a atividade de telefonia em seu rol como atividade
objeto de licenciamento ambiental no âmbito do Estado de Goiás
pelos municípios conveniados.
Discorreu sobre o que lhe era de direito,
pugnando para que seja declarado incidentalmente, em sede de
controle difuso, a inconstitucionalidade da exigência de
licenciamento ambiental de Estações de Rádio Base no Município
de Goiânia/GO, exigida em função do Decreto Estadual n°
5.805/2003 e Resoluções CEMAn 69/2006 e 02/2016, e eventuais
outras normas nesse sentido, antes de sua revogação expressa
provocado pelo Decreto Estadual nº9.679/ 2020 e Lei Estadual n°
20.694/2019, declarando sua proscrição jurídica, determinando
que os requeridos se inibam de exigir qualquer ato/exigência
decorrente do licenciamento ambiental no âmbito Municipal nesse
período, evitando a prática de qualquer ato que impeça a
instalação e funcionamento de Estações de Rádio Base da Autora,
bem como a lavratura ou qualquer ato de cobrança decorrente
auto de infração e imposição de multa.

Citados, os requeridos sustentaram a legalidade


da referida exigência ambiental, pugnando, oportunamente, pela
improcedência da ação.

Réplica a contestação.

Instado a se manifestar, o Ministério Público


opinou pela ausência de interesse em intervir no feito.

Oportunizadas a produzirem provas, as partes


pugnaram pelo julgamento antecipado da lide.

Após, vieram-me conclusos os autos.


É O RELATÓRIO.

DECIDO.

Compulsando os autos, vejo que a presente


demanda já se encontra-se devidamente fundamentada, pronta
para seu deslinde.

Ao que parece, o imbróglio dos autos cinge-se


na legalidade da exigência de licença ambiental para instalação de
torres de telefonia e estações de rádio base.

A Constituição Federal estabelece atribuições


e responsabilidades de cada ente da Federação com o objetivo de
evitar eventuais sobreposições de atribuições e edições de normas
conflitantes e contraditórias. Desse modo, verifica-se que a
disciplina legal dos temas relacionados às telecomunicações e à
exploração dos mesmos devem ser estabelecidas privativamente
pela União.

O art. 21, inciso XI, e art. 22, inciso IV, da


Constituição Federal dispõem o seguinte:

“Art. 21. Compete à União:

(...)

XI - explorar, diretamente ou mediante


autorização, concessão ou permissão, os serviços de
telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a
organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e
outros aspectos institucionais”
“Art. 22. Compete privativamente à União
legislar sobre:

(...)

IV - águas, energia, informática,


telecomunicações e radiodifusão.

Urge obtemperar que o legislador Federal


editou a Lei Geral de Telecomunicações, do qual dispõe sobre a
organização dos serviços, criação e funcionamento de órgão
regulador, in casu, ANATEL, sendo esta ultima competente para
expedir normas.

Pois bem. Em recente julgado, o Supremo


Tribunal Federal, no julgamento da ADI 3.110/SP reconheceu a
inconstitucionalidade de normas municipal e estadual que
disponham acerca de serviços de telefonia, em razão de
usurpação à competência privativa da União.

Em outro julgado, ainda, “ O Plenário do Supremo


Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade de dispositivos de lei do Estado de Alagoas
que previam a obrigatoriedade de licenciamento ambiental para a instalação de redes de
transmissão, estações rádio base e equipamentos de telecomunicações. Na sessão virtual finalizada
em 2/6, o colegiado julgou procedente o pedido formulado pela Associação Nacional das
Operadoras de Celulares (Acel) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7321.”

Decisão: O Tribunal, por maioria, conheceu da ação direta e julgou


procedente o pedido, para declarar a inconstitucionalidade dos itens 10.5 e 10.6 do Anexo I, objeto
do art. 4º, §1º, da Lei Estadual nº 6.787/2006 de Alagoas, e, por arrastamento, dos itens 10.5 e 10.6
do Anexo VI da mesma Lei nº 6.787/2006, nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro
Edson Fachin. Falou, pelo interessado Governador do Estado de Alagoas, o Dr. Gustavo Henrique
Maranhão Lima, Procurador do Estado. Plenário, Sessão Virtual de 26.5.2023 a 2.6.2023.
Sobre o tema, colaciono aos autos precedentes deste Tribunal de
Justiça, in verbis:

DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO N. 5585923-


17.2020.8.09.0132 COMARCA DE POSSE AUTOR : CLARO S/A
RÉU : MUNICÍPIO DE POSSE APELAÇÃO CÍVEL APELANTE :
MUNICÍPIO DE POSSE APELADO : CLARO S/A RELATOR : DES.
ZACARIAS NEVES COÊLHO EMENTA: DUPLO GRAU DE
JURISDIÇÃO E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO
ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE REABERTURA DE PRAZO PARA
INTERPOSIÇÃO DA APELAÇÃO CÍVEL: IMPOSSIBILIDADE.
ESTAÇÃO RÁDIO BASE. INSTALAÇÃO E LICENCIAMENTO.
COMPETÊNCIA LEGISLATIVA PRIVATIVA DA UNIÃO.
HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA FIXADOS COM BASE NO
VALOR DA CAUSA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1.
Não comprovada a justa causa para a reabertura de prazo de
apresentação do recurso de apelação, deve ser considerado
intempestiva a insurgência, isso porque o Município recorrente,
por haver outorgado procuração a mais de um advogado, poderia
se valer de qualquer deles para a interposição do recurso, ainda
que o(a) primeiro(a) estivesse impossibilitado de fazê-lo, por
motivo de saúde. 2. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da
ADI 3.110/SP, reconheceu a inconstitucionalidade de normas
municipais e estaduais editadas para regulamentar instalação e
licenciamento de antenas de telefonia celular, por usurpação de
competência privativa da União. Em sendo assim, considera-se
nulo o auto de infração lavrado pelo apelante, tendo como
justificativa o descumprimento de legislação loca e estadual. 3.
Tratando-se de ação declaratória, os honorários de sucumbência
devem ser fixados com base no valor dado à causa. REMESSA
CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO CÍVEL
NÃO CONHECIDA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO
TRABALHO -> Recursos -> Apelação / Remessa Necessária
5585923-17.2020.8.09.0132, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR
ZACARIAS NEVES COELHO, 2ª Câmara Cível, julgado em
08/08/2023, DJe de 08/08/2023)

Neste diapasão, ainda que com a intenção de


proteção e defesa do meio ambiente, a lei estadual, ao criar uma
nova obrigação às empresas prestadoras de serviços de
telecomunicações e estipular critérios para a instalação de
infraestruturas de telecomunicação, invadiu a competência
privativa da União, e ainda, interferiu diretamente na relação
contratual formalizada entre o poder concedente e as
concessionárias.

Não se pode olvidar que nos termos do artigo


22, inciso IV, da Constituição Federal, e da jurisprudência do STF
e dos tribunais infraconstitucionais, é da União a compêtencia
privativa. Consequentemente, não cabe ao recorrente exigir
licenciamento ambiental para instalação e funcionamento de
estações de rádio base. Ademais, não há vácuo legislativo a
respeito dessa matéria, pois a própria legislação federal já
contempla todo um arcabouço legal (Leis federais 6.938/1981,
11.934/2009 e 13.116/2015), além da Resolução n. 700/2018,
editada pela Anatel, que é o órgão regulador específico.

Noutro lado, tratando-se de controle difuso,


enquanto perdurar o interesse jurídica das partes em ver
reconhecida a inconstitucionalidade de determinada lei, ainda que
revogada, a apreciação deverá passar pelo crivo do Judiciário

Portanto, e sem maiores delongas, verifico que


as multas lavradas com base nas Resoluções CEMA nº 69/2006 e
02/2016, do qual exigia licenciamento ambiental são ilegais.
Explico. As leis posteriores que revogaram as referidas
Resoluções frente a incompetência para legislar sobre
telecomunicações, a retiraram do ordenamento do jurídico,
contudo, em sede de controle concentrado difuso de
constitucionalidade, há de se reconhecer que Decreto Estadual n°
5.805/2003 e Resoluções CEMAn 69/2006 e 02/2016 são
inconstitucionais frente a usurpação de competência privativa, e
portanto, nulas, o que de per si, torna ilegal qualquer ato
proveniente dela.

Ante ao exposto, sem mais delongas,


reconheço a inconstitucionalidade do Decreto Estadual n°
5.805/2003 e Resoluções CEMAn 69/2006 e 02/2016 e de
consequência declaro a NULIDADE de qualquer auto de infração
decorrente da exigência de licenciamento ambiental no período
anterior a revogação dos diplomas citados.

Determino ainda que os requeridos se


abstenham de praticar qualquer ato que impeça a instalação e
funcionamento de Estações de Radio Base, bem como lavratura de
qualquer auto de infração.

Em tempo, condeno o promovido à restituir os


valores indevidamente exigidos nos últimos cinco anos, em valor a
ser apurado em fase de liquidação de sentença, devidamente
atualizado com base com base no IPCA-E, e juros moratórios a partir da
citação, com base nos índices oficiais de remuneração básica aplicável à
caderneta de poupança, nos termos da Lei nº11.960/09 (Tema 810 do STF e
Tema 905 do STJ), até novembro de 2021. Após essa data, que sejam aplicados os
ditames da EC 113/2021.
Condeno o requerido ao pagamento de
honorários advocatícios a serem fixados em sede de liquidação de
sentença, nos termos do artigo 85, § 4º, inciso II, do CPC.

Transcorrido o prazo para a interposição do


recurso voluntário, arquivem-se os autos com a devidas cautelas.
Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição,
em atenção ao artigo 496, inciso I, do Código de Processo Civil.

P.R.I.

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