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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRADE DO SUL

INSTITUTO DE ARTE
ARTES VISUAIS BACHARELADO

RELAÇÕES ENTRE ARTE E MÍDIA

Por Amanda Moreira Ferreira

Resenha do livro Arte e Mídia de Arlindo


Machado (2007)

Porto Alegre, 20 de Setembro de 2016.


RELAÇÕES ENTRE ARTE E MÍDIA

Por Amanda Moreira Ferreira

"Arte e mídia" (Zahar, 2010, 84 páginas), do escritor Arlindo


Machado, traz uma série de questionamentos sobre o que é a “media
arts”, termo em inglês, para designar uma forma de arte que se utiliza de
tecnologias atuais, e sobre como e o quanto se contrapõe e se agregam a
arte e a mídia nesta nova forma de fazer arte.

O autor começa discorrendo como no passado sempre foi se


utilizado dos meios disponíveis para expressar a sua arte, seja ela qual
for, música, pintura, escultura. E utiliza este argumento para validar a
utilização da tecnologia nas artes em geral. Este é um argumento
consistente e devemos concordar que os meios utilizados, os meios
atuais ao nosso tempo, são uma ótima ferramenta de trabalho que não
deveria desqualificar e, sim, somar as outras formas mais tradicionais de
praticar a arte.

Porém estes meio, a tecnologia, ela surgiu como uma demanda


industrial, ela surgiu como uma “automatização dos procedimentos para a
produção em larga escala, mas nunca a produção de objetos singulares,
singelos e ‘sublimes’”, como cita o autor. E este deve ser uma das
barreiras para se transpor quando se utiliza este meio. Fazer com que a
obra de arte produza algo a que chamamos de arte, sem ser algo
automatizado. E como toda arte que envolve uma criatividade, alguns
artistas se utilizam da tecnologia de forma inusitada, de forma que se
contrapõe ao objetivo ou à funcionalidade esperada desta tecnologia.

Este contraponto em relação à utilização da mídia, em geral, busca


criticar este próprio meio. O artista se utiliza dos próprios meios de

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programação para debater sobre o uso desta tecnologia, sobre o que ela
representa na sociedade. Como no exemplo que o autor apresenta, o
vídeo de David Hall, “This is a Television Receiver”, de 1971, onde o
artista se utiliza de gravação de um determinado programa e vai
desconstruindo até que apenas seja reduzido a sua essência de luz
pulsante do vídeo. São obras como estas que fazem o público refletir
sobre a própria obra.

Não obstante, o autor também critica que definir que esta é a única
forma de arte aceita dentre a mídia arte, é estabelecer que a própria arte
tem uma definição fechada. E também é afirmar que a arte tem que ser
apenas arte e não ter nenhum outro significado. O que podemos ver que
não é correto, embora controverso, que o cinema é considerado uma
forma de arte, mas também é um veículo de comunicação em massa,
dentre outras coisas. A arte tem um conceito muito fluído. Seja ela uma
arte com uma crítica política sobre o meio em que é produzida, ou como
uma forma de expressão individual. Mas é correto que a distribuição dela
em massa, a torna mais democrática, senão mais acessível.

Esta acessibilidade e globalização que, não só a arte, mas a


comunicação atingiu com o estabelecimento da tecnologia, faz com que a
sociedade tenha um discurso ameno e “glorificado”, principalmente dentre
os encontros de arte e tecnologia. E é fato que a tecnologia está em todas
as sociedades e suas camadas, mas isto não significa que ela seja
democrática. Ela é dominada e produzida por poucos. E está modificando
a essência da sociedade e sua comunicação. É importante que haja uma
crítica. E é importante que a arte que se utilize deste meio tenha um olhar
crítico sobre esta.

Vilém Flusser, segundo Machado, é o crítico mais importante a


cerca de questionar os fundamentos desta tecnologia e a forma como ela
interfere na nossa sociedade. Vindo refugiado da segunda guerra, ele

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estabeleceu moradia no Brasil e ainda aqui ele escreveu suas críticas nos
primórdios d crescimento da tecnologia. Ele foi o primeiro a apresentar
uma crítica e também o que teve uma visão mais assertiva e, de certa
forma, antecipada em relação ao rumo que a utilização dela tomaria na
sociedade.

Flusser, em seu livro, Filosofia da caixa-preta, livro este reeditado


na tradução para o português brasileiro, ele compara a tecnologia ao
principio da caixa-preta onde o interlocutor se depara com uma caixa e
tenta compreender qual o interior da caixa utilizando apenas de artifícios
externos, sem realmente desvendar o seu interior. E como a tecnologia
apresenta um fator semelhante. Deparamo-nos com um equipamento que
sabemos manejar externamente, mas não sabemos como funciona
realmente. Como a máquina fotográfica que nos limita a fotografar apenas
até onde a própria tecnologia permite. Sendo que esta é coautora dos
trabalhos ou, até mesmo, a autoria correta, pois muitas vezes o fotógrafo
apenas mira o equipamento e dispara o obturador.

No Brasil, a poética tecnológica teve início nos anos 50, como a


arte cinética de Abraham Palatinik, na próxima década com a música
eletroacústica de Jorge Antunes e posteriormente a introdução do
computador na arte, por Waldemar Cordeiro.

A arte mídia no Brasil teve por característica a parilidade com a


arte externa, como o que estava sendo produzido em outros países até
mesmo mais tecnológicos. Isso fez com que a arte fosse atual e até
mesmo inovadora em alguns casos.

E teve como outro traço o viés crítico que o diferiu dos outros
trabalhos do mesmo tempo. Esta abordagem se deu devido ao momento
político do país. Um momento de ditadura e de tragédia social. E a arte
como expressão deste período, a tornou mais rica e expressiva.

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Cordeiro, já citado anteriormente, foi um dos nomes que fez com
que esta parilidade e abordagem diferente da arte mídia fossem
reconhecidas internacionalmente. Ele já era reconhecido dentre a arte
concreta e junto com o físico italiano Giorgio Moscati trabalhou com a
computer art. Ele era comunista assumido e seu trabalho foi uma crítica
ao regime ditatorial do país. E uma das suas contribuições foi a criação de
um encontro, em São Paulo, sobre esta arte, que pôs o Brasil no circuito
internacional deste tipo específico de arte.

Mesmo assim, este tipo de arte foi sendo introduzido aos pouco no
Brasil. O estudo das tecnologias foi se desenvolvendo sem a parte das
artes. E a parte cultural ainda criticava a parte tecnológica. Entretanto,
hoje já está estabelecida e com este estabelecimento, a arte mídia se
tornou mais padronizada. Uma busca pela excelência dentro da
tecnologia, a um mercado cada vez mais exigente. E os encontros como o
criado por Cordeiro, hoje, tem apenas considerações quanto à linguagem
dos computadores e não à crítica que tinha naquele tempo.

As formas de arte que se utilizam de tecnologias podem ser


separadas em alguns grupos, ou principais grupos, dentre os quais: a
fotografia, a música e o cinema se destacam. Eles são independentes e
foram assim, desde o início. Mas com o crescente uso da tecnologia e
sua evolução, eles possuem uma borda em comum, uma proximidade.
Esta proximidade se define longe de um núcleo puro, que seria a arte em
sua essência.

Algumas teorias, dizem que estas artes podem se fundir, e se


sobrepor. Até mesmo em seu núcleo mais profundo. Esta hibridização não
é unânime entre os críticos. Alguns consideram esta fusão não possível.
E outros a consideram não benéfica.

De toda forma, é um fato que a tecnologia está estabelecida mas


não está finalizada. Ela está em constante evolução. E muitas vezes não

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temos e não teremos tempo de acompanhar esta. E assim saberemos
como a acompanhar? Acredito que a crítica à arte mídia deve se
prevalecer. Os artistas devem se utilizar da tecnologia para expressar seu
tempo. Criar algo novo. Ou até mesmo estabelecer novas formas de arte.

MACHADO, Arlindo, Arte e Mídia, Rio de Janeiro: Zahar, 2007.

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