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Em busca do Tesouro Perdido

Grupo Teatral CENA’S 2


Em Busca do Tesouro Perdido é uma adaptação (livre) do livro “A Canção de Todas as
Crianças” de Elifas Andreato, com base na última pagina d’O Pequeno Príncipe, de
Antoine de Saint-Exupéry, que encerrava o livro com um recado aos leitores para que, se
vissem um menino de cabelos de ouro, que o avisassem imediatamente. Dessa maneira,
ele saberia que seu pequeno amigo voltara.
Com o objetivo de valorizar a infância e chamar a atenção para os grandes problemas
da criança brasileira, o autor conta uma história interligada aos 10 princípios da
Declaração, que na época de sua criação, em 1979, completava 20 anos.
Nossa história, enfim, começa pelo final da outra, debaixo de uma solitária estrela no
deserto. Descobrimos que o menino desaparecido era a infância do velho aviador, que
envelhecera procurando um tesouro de sonhos e esperanças, sem perceber que jamais
poderia encontrá-lo, porque a infância passa e ficam apenas as lembranças desse tempo
de inventar o mundo e fazer o próprio destino.
As personagens deste espetáculo possuem traços infantis. Com exceção do aviador, são
fruto da imaginação das crianças e da criança que um dia ele foi. São consideradas no
contexto da peça como uma parte fundamental que completa o significado e desvenda
o mistério que envolve o tesouro procurado.
O espetáculo é composto por músicas de Toquinho, que segundo o autor são: “...
Pequenas canções para tentar consertar o futuro. Que, espero sinceramente, seja mais
feliz que meu passado de velho palhaço, que ainda ri – quem sabe de desespero – por
saber que, infelizmente, a vida da grande maioria das crianças não tem graça nenhuma.”
Sinta-se convidado a viajar conosco em busca desse tesouro perdido! Nosso maior
tesouro: A NOSSA INFÂNCIA! PERSONAGENS BASEADOS NA HISTÓRIA DE “O PEQUENO
PRÍNCIPE”, DE ANTOINE DE SAINT-EXUPÉRY: Avoar Passos Dias (aviador)

PERSONAGENS

Avoar Passos Dias (Aviador): É inseguro, sonhador e ansioso. Tem uma relação muito
arinhosa com as outras personagens. Trata-as como se fossem seus brinquedos,
mostrando-se paciente em todas as situações de conflito. É o centro absoluto das
atenções do grupo, uma vez que todas as personagens são resultado da sua imaginação.
As reações e as características da personalidade do próprio Aviador.

Charlito: É uma homenagem ao Carlitos, personagem de Charles Chaplin, ídolo de Avoar,


que o imagina como um anjo. Charlito representa a incapacidade do Aviador de se
comunicar com os outros durante a infância, os tropeços e constrangimentos de seu
crescimento.

Gargalhada: Um palhaço que, na infância do Aviador, era um de seus brinquedos. É um


“saco de risadas”, um dos preferidos de seu dono, que se divertia muito em apenas ouvi-
lo gargalhar. No espetáculo, Gargalhada ganha vida para ser o alter-ego do Aviador, ou
seja, aquela que fala claramente tudo o que Avoar não consegue ou não quer dizer. É
brincalhão, zomba de tudo, mas é também quem provoca todos os conflitos.

Cordélia: É uma boneca de pano, outra lembrança da infância do Aviador. Era a boneca
preferida da irmã de Avoar, mas ele às vezes a carregava até seu quarto, para dormir
com ela. É linda. Inspiração de seus desenhos naquela época em que as crianças brincam
apenas com o que acham bonito e não se preocupam em fazer distinção de sexo.
Tilin: Boneca oriental, também da irmã do Aviador. Tilin é a recordação das dificuldades
de Avoar com a matemática, ainda nos primeiros anos de escola. Ele nunca conseguiu
contar quantas estrelas havia no quimono azul-celeste da boneca. Ela representa seu céu
de dúvidas e confusões mentais.
Soluço: É o alcoólatra divertido e sonhador que perdeu a luta contra a bebida e não se
deu conta disso. Mais do que patético, é emblema de um problema social grave que
aflige várias famílias e constrange milhões de crianças por todo o mundo.
Dr. Fortuna: É a ganância, a riqueza obtusa que só dá valor ao dinheiro. Construiu seu
mundo acumulando bens, sem se preocupar em cultivar qualquer virtude humana.
Eu-de-mim: É a vaidade exacerbada, a falta de diálogo com as crianças, o egocentrismo
dos adultos, preocupados apenas com seu cotidiano. É a indiferença daquelas que não
ouvem as crianças porque não as levam a sério não as consideram indivíduos.
Rei-do-Nada: É o autoritarismo cego que pensa que criança precisa apenas de disciplinas
rígidas e não consegue vê-los como seres humanos pensantes, apesar de jovens e
inexperientes.
Ecoluco: É um espantalho solitário cujo objetivo na vida é espantar todos os predadores
do meio ambiente. É a consciência de que a vida na Terra corre permanente perigo.

CENA 1: UM SONHO
Cenário: Aeroporto no deserto, com algumas caixas e outras lembranças do Aviador. Com
o palco ainda escuro, uma voz gravada ou emitida sem que se veja o locutor anuncia o
espetáculo enquanto a luz ilumina o cenário lentamente, revelando ao público nosso
herói dormindo sobre sua mochila, ao lado de um velho avião vermelho. Durante o sono
do Aviador, um elenco de bailarino, vestindo figurinos com cores e formas de bandeiras
de diversos países, dança uma “representação” da letra da música, que é o sonho do
nosso herói. Este primeiro número musical é a introdução da história que contaremos a
seguir. Por isso, precisa ser atraente e divertida, além de destacar os contrastes contidos
na letra da música.
Voz em off
... Nossa história começa onde acabou uma outra... Quando, debaixo de uma estrela,
nosso herói viu desaparecer seu tesouro... (A fada faz uma mágica, clareando os sonhos
do aviador. Começa música.)
Deveres e Direitos
(1° Princípio – A criança tem direito á igualdade, sem distinção de raça, religião ou
nacionalidade).

Iguais são seus deveres e direitos

Viver sem preconceito é bem melhor

A infância não demora, logo, logo vai passar


Vamos todos juntos brincar

Não olhem religião, nem raça


Chamem que não tem mamãe
Que o papai ta lá no céu
E os que dormem lá na praça

Não olhem religião, nem cor


Chamem os filhos do bombeiro
Os dois gêmeos do padeiro
E a filhinha do doutor
Iguais são seus deveres e direitos

Viver sem preconceito é bem melhor

A infância não demora, logo, logo vai passar


Vamos todos juntos brincar

O futuro ninguém adivinha


Chamem quem não têm ninguém
Pois criança é também
O menino trombadinha

Não olhem cor nem religião


Bons amigos valem ouro
Amizade é um tesouro
Guardado no coração
Chamem quem não têm mamãe
Que o papai ta lá no céu
E os que dormem lá na praça
Bons amigos valem ouro
A amizade é um tesouro
Guardado no coração.
CENA 2: NOSSO HERÓI ENCONTRA SUA IMAGINAÇÃO
Cenário: Aeroporto no deserto, com caixas.
O sol invade o pequeno hangar, despertando nosso herói, que se prepara para partir em
busca de seu tesouro perdido. Ainda sonolento, ele veste sua antiga capa de aviador,
examina mais uma vez o velho “mapa”, que não parece mapa: é apenas uma estrela
desenhada numa paisagem árida com um deserto. Junta as poucas coisas que tem, a
touca de couro, os antigos óculos de piloto, a velha mochila e, quando se dirige ao velho
avião para seguir viagem, ouve uma risada abafada. Desconfia das coisas ali
abandonadas. Vai até as caixas – dessas de madeira que são usadas para transportar
coisas em aeroportos – e decide examinar seus conteúdos. De uma pintada com figuras
de circo salta um palhaçinho gargalhando, rindo muito (ele é um saco risadas).

Gargalhada (depois de gargalhar muito) - Voltou, heim? Finalmente! Deu saudades? A


que devo tão ilustre visita?
Aviador (atônito, sem entender o que está acontecendo) - Ué... você fala?
Gargalhada (tapa a boca com a mão) - Não... Não falo, não.
Aviador - Mas tá falando.
Gargalhada - Não, cara, vê se te acha! É a sua imaginação que inventou a minha voz. Eu
falo o que você imagina. Entendeu?
Aviador - Não.
Gargalhada - É sim. Sou sua imaginação. Você pensa em mim... E eu apareço (aproxima-
se do aviador, cheira-lhe a capa e tapa o nariz com cara de nojo) Ainda é a mesma?
Que nojo!
Aviador - Como, a mesma? Quem é você? Como sabe que eu não lavo a capa?
Gargalhada - Pelo cheiro! (gargalhando) Não. (pára de rir) Vou explicar mais uma vez.
Sou uma lembrança sua, mas não se preocupe, não. É normal falar com brinquedos
quando se está sozinho. E, por falar em solidão, que tal dar uma boa risada, heim?(e
começa a gargalhar)
Aviador (rindo, timidamente) - Pára com isso... Não tenho mais tempo para rir... Acho que
perdi o jeito.
Gargalhada - Vamos, vamos rir. Eu te ensino de novo.
Aviador - Não, preciso partir, tenho muito o que fazer...
Gargalhada - Fazer o quê? Por que a pressa?
Aviador - Procurar um tesouro perdido! (apressado, junta as velhas coisas)
Gargalhada - Êba! Um tesouro! (pensa) Peraí, que tesouro?
Aviador - É uma história longa, não dá pra falar agora. Vamos.
Gargalhada - Calma. Vai precisar de ajuda, não vai?
Aviador - Não sei. Que tipo de ajuda?
Gargalhada - Da sua imaginação... Que sou eu! Pelo menos uma parte dela eu sou.
(gritando)
Meninas, meninas, o “hôme” tá com pressa. Vamos saindo, saindo... (bate nas caixas de
maneira engraçada)
De uma caixa azul, pintada com sóis, luas e estrelinhas, sai uma bonequinha oriental
caminhando em direção ao aviador com passinhos curtos de gueixa.
Tilin - Lembra di mim?
Aviador - Não... e porque lembraria?
Tilin - Lembra sim. Na última vez que contamos estrelas juntos, contamos quatrocentos e
cinqüenta e oito bilhões, trezentos e vinte e quatro milhões, cento e cinqüenta mil e...
quatro... É, acho que foram quatro.
Gargalhada (irritado) - Ela passa a vida contando estrelas e nunca sabe quantas contou.
Dá pra entender um negócio desse! Ou melhor, uma conta dessa? (gargalha)

De uma caixa colorida com as cores do arco-íres sai uma boneca de pano.
Cordélia (saindo da caixa com paleta de pintura na mão) - Ô palhaço! Olha o respeito
com as damas. Não vem, não! Ela tem o direito de contar e recontar quantas vezes quiser
e você não tem nada a ver com isso, tá intendendo?
Aviador - Peraí, peraí, que confusão é essa? Quem são vocês, afinal?
Gargalhada (para o público) - O cara não entende mesmo... (gestos de que o Aviador é
lelê da cuca)

CENA’S 6
Cordélia (mistura as tintas na paleta) - Eu sou a boneca da sua vida . Não lembra, não?
Suas primeiras experiências em cores... E outros que tais, tá intendendo?
Aviador - Não, e porque entenderia?
Cordélia (exagerada) - Quem é que recolhia a sujeirada que você fazia no quarto quando
pintava? Quem era a faxineira das tintas, não lembra, não?
Aviador (encabulado) - Não! Era a mãe que limpava tudo... E brigava comigo.
Cordélia (debochada) - Que mãe, que nada! Eram essas “mães” (mostra as próprias
mãos) que recolhiam restos de tinta e limpavam o que você lambuzava. (calma) Vê essas
cores (mostra a paleta) Se eu misturar todas, que cor vai virar?
Aviador - Nem imagino...
Gargalhada - Como não imagina, cara? Se essa história é só imaginação... É pura
imaginação.
Tilin - E contas...
Aviador (confuso) - Peraí, que história é essa de limpar meu quarto, recolher restos de
tinta...
Cordélia - Ora, se você não quer lembrar, tudo bem. Deixa para lá. (faz cara de quem
acabou de lembrar algo importante) Peraí, tá faltando gente nessa história de
imaginação...
Gargalhada - Não, pelo amor de Deus, Cordélia, deixa ele na caixa! Tá bom assim... vai
ser melhor pra todo mundo, tô avisando.
A última caixa é preta e nela dorme um “Carlitos”.

NESSE MOMENTO CHARLITO DESPERTA, ESPREGUIÇA-SE, ABANA O PÓ DA ROUPA, AJEITA A


GRAVATA BORBOLETA, CAMINHA COMO CARLITOS CAMINHAVA E CUMPRIMENTA TODOS
RETIRANDO DA CABEÇA O CHAPÉU COCO BRANCO, CURVANDO-SE PARA FRENTE, COMO
FAZEM OS ARTISTAS AGRADECENDO OS APLAUSOS.

Aviador (surpreso) - Ele também é minha imaginação?


Gargalhada - A pior parte dela. (gargalha)
Cordélia - Olha o respeito! Deixa de ser preconceituoso. Deixa o Charlito em paz. (bate
em Gargalhada)
Gargalhada (para o público) - Ele não fala, faz tudo errado e vive sonhando... no mundo
da lua. É um chato, isso sim! E tem mais: nunca vai aprender coisa alguma.

NA INTRODUÇÃO, CHARLITO, COM GESTOS, COMUNICA AO PÚBLICO QUE VAI REGER UMA
MÚSICA PARA ENSINAR O BOBALHÃO DO GARGALHADA QUE É ERRADO QUE SE APRENDE.
A coreografia mais uma vez dever realçar as situações de erros e acertos descritas na letra
da música e aproveitar as mais cômicas para explorar a personagem Charlito em cenas
do tipo pastelão dos filmes antigos.
CENA’S 7

Errar é Humano
(2° Princípio – A criança tem o direito de ser compreendida, deve se desenvolver em
condições de igualdade de oportunidades, com liberdade e dignidade).
Não, não é vergonha, não
Você não o melhor da escola
O bom de skate
O bom de bola
Ou de natação
Não, não é vergonha não
Aprender a andar de bicicleta
Se escorando em outra mão
Não, não é vergonha, não
Você não saber a tabuada
Pegar uma onda
Contar piada
Rodar pião
Não, não é vergonha não
Precisar de alguém que ajude
A fazer sua lição
A vida irá, você vai ver
Aos poucos te ensinando
Que o certo é você aprender
Errando, errando, errando
Não, não é vergonha, não
Você ser da turma o mais gordinho
Ter pernas tortas
Ser baixinho
Ou grandalhão
Não, não é vergonha, não
Todos sempre têm algum defeito
Não existe a perfeição.
Aviador - Muito bem, Charlito! Valeu!
Gargalhada - Ô Charlito! Você foi demais! Você é o cara, rapaz! Merece até uma foto.
Faz poseaí! Diga xixi (com uma máquina que sai água, Gargalhada molha Charlito e cai
gargalhando).Tá vendo! Não adianta. Esse cara não tem jeito! Bobão!
Cordélia - Larga do pé dele, Gargalhada! Pára com isso...
Tilin - É isso mesmo, seu saco. Você é só um saco! Saco só de risada, não tem nada por
dentro. Só tem vento!
Gargalhada - Saco, sim, e com muito orgulho... E tem mais meninas (CHARLITO REAGE,
NEGANDO QUE SEJA MENINA): sou o saco que faz todo mundo aqui rir (gargalha). É o meu
saco que faz todo mundo mais feliz. (sério, provocando Charlito) Tá bom pra você, ô
mímico?
CHARLITO AFIRMA QUE SABE QUAL É E ONDE ESTÁ O TESOURO.

Aviador - Você sabe onde ele está?

CHARLITO REAFIRMA E FAZ GESTOS DE QUEM PULA AMARELINHA E SOLTA PIPA. SEMPRE
TENTANDO CHAMAR A ATENÇÃO DE TODO PARA SUAS BRINCADEIRAS.
Gargalhada (contando a linha da pipa de Charlito) - Que sabe, nada. Ele é maluco. Dá
pra levar a sério? Esse cara é coisa de gibi... de filme... sei lá! Mas daqui isso não é mesmo!
Tilin (examinando o Águia Vermelha) - E você vai procurar seu tesouro nessa lata velha?
Não dá para arranjar “algo” mais moderno, não?
Cordélia - Pelo menos mais colorido... Só vermelho cansa. (fresca)
Aviador - Olha, não é bem assim, não. O Águia Vermelha está equipado com o que há
de mais moderno na aviação... Hoje.
Tilin - Se fosse um helicóptero, a gente parava lá no alto e contava mais estrelas. E lá, mais
perto delas, todas seriam mais brilhantes...
Cordélia - Que lindo, Tilin, isso é pura poesia!
Aviador - Não! Não posso trocá-lo por nada... Porque se o meu tesouro, numa dessas
viagens pelo deserto, identificar o Águia Vermelha, saberá que estou chegando...
Voltando para ele...
Todos (espantados) - O quê? Tesouro que vê? Nunca vi... (se olham) Vimos?
Aviador - Tinha olhos, sim. Disso me lembro bem. Via coisas, cores... Pipa no céu, pião,
carrinho brincando não chão...

CENA’S 8

Gargalhada (debochando, andando em círculos) - É a vida, meu irmão. É assim mesmo.


O tempo passa... E ficam as lembranças...
Tilin - E o tempo também faz contas. Conta os dias e as noites, e quando vai passando,
deixa no seu rastro estrelinhas brilhantes que são lembranças... Da vida vivida, minutos,
segundos, horas... (atrapalha-se com o raciocínio) sei lá...
Gargalhada (enfezado) - Pode parar! Nós viemos aqui pra rir ou pra chorar? Parem com
isso, gente! Isso aqui é uma história pra crianças! Tem que ser divertida! Saco!
Cordélia (choramingando) - É, mas as cores desbotam com o tempo, e isto é muito triste,
sabe?
Aviador (interrompendo o choro de Cordélia) - Tudo bem. Vamos mudar de assunto,
vamos pensar em outra coisa. Já que vocês são a minha imaginação, vamos juntos
procurar o tesouro.
Gargalhada - Não! Nesta lata velha eu não vou. Tô novo, cara. Tenho muito que viver... e
você também, cara... sem você eu não existo, só tô vivo na sua imaginação e, se você
não imaginar mais, o que é que eu faço? E esse público (dirige-se ao público) que vem
me prestigiar, como é que fica?
Aviador - É seguro, não tenha medo. Vamos.
Tilin - Eu não!
Cordélia - Também não! Não tô maluca.

CHARLITO SINALIZA QUE TAMBÉM NÃO VAI.

Gargalhada (para o Aviador) - Vai não, ele tá dizendo, viu?


Aviador - Tudo bem. Se não querem ir... Vou sozinho...
Todos - Não! É perigoso! (com medo) Nós vamos...

Dirigem-se ao avião e a luz apaga. No escuro ouve-se barulho de motor, lata batendo e
gritos de medo.
CENA 3: SOZINHO NO DESERTO
Cenário: Deserto.
No palco pouco iluminado, nosso herói tira o pó da velha capa e tosse muito, envolvido
por uma densa nuvem de fumaça e poeira. O pouso no deserto foi desastroso. Quando
percebe que está sozinho, se desespera.
Corre de um lado para outro chamando sua imaginação.
Aviador - Ei! Onde estão vocês? Respondam, por favor! (tenta desesperadamente
expulsar a nuvem de poeira do palco) Voltem! Preciso de vocês, não me deixem aqui! (de
repente, pára e pensa) Peraí, se são todos a minha imaginação... é só imaginar e eles
aparecerão. (fecha os olhos)
Aparece Gargalhada.
Gargalhada (também tirando o pó da roupa, indignado) - Eu não falei, cara? Essa lata
velha não funciona mais. Pra que insistir... Vai acabar matando todo mundo...
Aviador - Não tem nada a ver com o Águia Vermelha, foi só mau tempo, coisa comum no
deserto. Foi só uma tempestade de areia, tá tudo bem.
Gargalhada - E põe areia nisso! E os outros? Vai imaginá-los ou abandoná-los na poeira?
Se vai, pensa bem, imagina só as meninas, deixa o... Aquele... Deixa ele na poeira, ele
gosta...
Aviador - Nada disso. Ou imagino todos ou você desaparece. Cada um não é uma parte
de mim?
Gargalhada (vaidoso) - São, mas algumas partes são mais importantes... Divertidas...
Aviador (ameaçando) - Nada disso. Ou são todos...
Gargalhada - Tá legal! Chama a corja toda. Se é o que você quer. (indiferente)
Aviador - Não são todos minhas lembranças, recordações de minha vida?
Gargalhada - Tá bom, chega de choradeira, daqui a pouco tá todo mundo chorando na
platéia. Vamos, imagina logo!
Cordélia e Tilin entram espanando o pó da roupa do Charlito com um grande espanador
de penas.
CHARLITO COM GESTOS, AVISA O AVIADOR QUE NÃO ENTRA MAIS NAQUELE AVIÃO.
Cordélia - E agora, mané? Quem conserta essa geringonça?
Tilin - Eu não entendo nada de aviões.
Gargalhada - E quem entende? O cara aí (mostra o Aviador) passou a vida toda nessa
porcaria. Diz que não pode abandoná-lo, que tá equipado, e me faz um pouso desse?
Tenha dó, tá de mal com a vida, só pode ser!
Aviador - Não é nada disso. A gente dá um jeito. Me lembrei de uma coisa. Quando vocês
se perderam...
Gargalhada (zombando) - No desastre!
Aviador - É. Eu não sabia como chamá-los, não sei o nome de vocês.
Cordélia - Ué? Já esqueceu? Mas é cara-de-pau, meu usou tantos anos, deitou e rolou,
dormiu comigo um tempão e agora vem com essa, não lembra o nome. Isso é pior que
traição. Não suporto indiferença (fazendo pouco caso).
CHARLITO, COM GESTOS, PEDE AO AVIADOR QUE ELE DIGA SEU NOME.
Gargalhada - Não! Ele não vai dizer, vai? (para o Aviador)
Aviador - Não me lembro, é só Aviador.
Gargalhada - Não, não, não! Sabichão! Você sabe sim e não quer falar. Olha que eu falo.
Tilin - Ué, nome é nome, todo mundo tem... ou não?
Aviador - Meu nome não interessa, quero saber o de vocês.
Gargalhada - É, não vai falar? Então falo eu (o Aviador tenta impedi-lo). O nome dele é
“Avoar Passos Dias”. (e cai gargalhando. Todos riem).
Para este balé, sugerimos que atores e bailarinos brinquem com placas ou bandeirolas
com sílabas que possam,
durante a coreografia, formar nomes próprios e apelidos.
CENA’S 10

Gente Tem Sobrenome


(3° Princípio – A criança tem direito a um nome e uma nacionalidade)
Todas as coisas têm nome
Casa, janela e jardim
Coisas não têm sobrenome
Mas a gente sim
Todas as flores têm nome
Rosa, camélia e jasmim
Flores não têm sobrenome
Mas a gente sim
O Jô é Soares, Caetano é Veloso
O Ary foi Barroso também
Entre os que são Jorge
Tem um Jorge Amado
E o outro que é o Jorge Bem
Quem tem apelido
Dedé, Zacarias, Mussum e a Fafá de Belém
Tem sempre um nome
E depois do nome
Tem sobrenome também
Todos brinquedos têm nome
Bola, boneca e patins
Brinquedos não têm sobrenome
Mas a gente sim
Coisas gostosas têm nome
Bolo, mingau e pudim
Doces não têm sobrenome
Mas a gente sim
Renato é Aragão, que faz confusão
Carlitos e o Charles Chaplin
E tem um Vinicius, que era de Moraes
E o Tom Brasileiro é o Jobim
Quem tem apelido
Zico, Maguila, Xuxa, Pelé e He-Man
Tem sempre um nome
E depois do nome
Tem sobrenome também.
Os bailarinos saem, os atores ficam em silêncio tentando ouvir um som estranho que
começa baixinho e vai aumentando. É um som de barriga roncando.
TODOS SE APROXIMAM DE CHARLITO, O SOM AUMENTA E ELE, DESENGONÇADO, TENTA
DISFARÇAR O BARULHO.
Tilin - Charlito, quantas vezes já roncou?
O som continua intermitente e alto. O Aviador, à distância, assiste à cena e se diverte.
Cordélia - Gente, eu também tô com fome.
Gargalhada - Tudo bem, mas vamos devagar, devagarinho. Se encher demais a barriga
do mímico, o som pode sair por outro lugar. (faz gestos de soltar pum, imita o barulho com
a boca e gargalha)
Tilin - Ô cara sujo! Pára com isso...
Cordélia - É um grosso... é você, seu saco de risada, quem faz essas malcriações. Cansei
de ver, em circos, essa sua raça de palhaços soltando pum para ganhar dinheiro!
Gargalhada - Não ofende, não! Não mexa com a minha turma. Palhaço é coisa séria.
(trocam empurrões e o Aviador intervém)
Aviador - Calma, minha gente. Minha imaginação tá nervosa... e isso é fome.
Tilin - É, barriga vazia dá nos nervos... irrita...
Cordélia - E como irrita! (peitando o palhaço)
Gargalhada - Ô Avoar (rindo), dá pra imaginar comida?
Tilin - E tem que ser pronta. Aqui não dá pra escolher feijão. E olha que eu adoro escolher
“feijões”.
CORDÉLIA CHAMA CHARLITO, QUE CHEGA COM AS MÃOS NA BARRIGA, SE
CONTORCENDO DE FOME, E O RONCO AUMENTA.
Aviador - Vamos todos comer.
Todos - Comer o quê?
Aviador - Imaginação!
CENA’S 11
Para esta coreografia, sugerimos o uso de cordões e fitas coloridas, em movimentos de
balé clássico.
De Umbigo A Umbiguinho
(4° Princípio – A criança tem direito à alimentação, deve crescer com saúde e a mãe deve
ter cuidados médicos antes e depois do parto).
Muito antes de nascer
Na barriga da mamãe já pulsava sem querer
O meu pequenino coração
Que é sempre o primeiro a ser formado
Nesta linda confusão
Muito antes de nascer
Na barriga da mamãe
Já comia pra viver
Cheese salada, bala ou bacalhau
Vinha tudo pronto e mastigado
No cordão umbilical
Tanto carinho, quanta atenção
Colo quentinho
Ah! Que tempo bom
De umbigo a umbiguinho
Um elo sem fim
Num cordãozinho da mamãe pra mim
Num cordãozinho da mamãe pra mim
Muito antes de nascer
Na barriga da mamãe me virava pra escolher
A mais confortável posição
São nove meses sem se fazer nada
Entre água e escuridão
Muito antes de nascer
Na barriga da mamãe começava a conviver
Com as mais estranhas sensações
Vontade de comer de madrugada
Marmelada ou camarões
Tanto carinho, quanta atenção
Colo quentinho
Ah! Quem tempo bom
De umbigo a umbiguinho
Um elo sem fim
Num cordãozinho da mamãe pra mim
Num cordãozinho da mamãe pra mim
No final, os bailarinos e o Aviador deixam o palco. Gargalhada bate na barriga estufada.

Gargalhada - Não é que esse negócio de imaginar funciona mesmo. Que maravilha... eu,
por exemplo... (faz suspense) tô com uma baita fome! (cai gargalhando) Olha só!
(apontando) O Charlito comeu tanto que não consegue nem falar. Entendeu? Nem falar!
(gargalha)
Tilin - Pára, Gargalhada! Você não pode zombar da deficiência das pessoas assim. Deixa
o Charlito em paz!
Gargalhada - Ah é? E quem falou isso pra você? Peraí! Deixa eu adivinhar. Foi o Charlito?
(cai novamente gargalhando. Cordélia e Tilin o expulsam do palco e saem com ele)
CHARLITO FICA SOZINHO NO PALCO, ILUMINADO POR UM ÚNICO REFLETOR.
Inicia-se mais um número musical, Natureza Distraída. Este é o mais delicado tema da
Declaração dos Direitos da Criança, por isso, dever ser encenado com muito ensaio para
que o público compreenda sua mensagem.
Natureza Distraída
(5° Princípio – A criança deficiente tem direito à educação e cuidados especiais).
Como as plantas somos seres vivos
Como as plantas temos que crescer
Com elas precisamos de muito carinho
De sol, de amor, de ar, pra sobreviver
Quando a natureza distraída
Fere a flor ou um embrião
O ser humano, mais que as flores,
Precisa na vida
Muito afeto e toda compreensão.
A luz se apaga.
CENA 4: NASCE UM NOVO DIA
Cenário: Deserto
A luz desta cena deve parecer o sol nascendo de mansinho, até estalar de quente. Deve
provocar aflição nos espectadores, afinal, as personagens estão ainda no deserto, longe
de tudo e sem o velho avião, avariado no último pouso. E todos têm um missão a cumprir:
encontrar o tesouro do Aviador.
Gargalhada (pensativo, andando em círculos e estalando no assoalho as pontas das suas
grandes botinas) - Preciso descobrir que tesouro é esse. Passei a noite toda pensando
nele... e cá entre nós... (para o público) não dá pra entender um tesouro que vê, se a
gente passar por ele... (Aviador aparece e Gargalhada disfarça)
Aviador (efusivo) - Bom dia, Gargalhada!!!
CENA’S 12
Gargalhada - Ta rindo de que? Como bom dia? Estamos aqui neste fim de mundo e com
essa latavelha enguiçada... me diga como é que vamos encontrar esse seu tesouro que
tem olhos?
Aviador - A pé!
Gargalhada - O quê? Nesse calor... Você ta maluco!
Aviador - Não tem outro jeito... Com o Águia quebrado...
Gargalhada (irritado) - Que Águia, nada, isso aí é sucata. Isso não voa nunca mais.
Aviador - Calma, vamos consertá-lo. Mas só depois de acharmos o tesouro.
Gargalhada - E como é que você vai carregar esse tal tesouro? Se é que existe tal
tesouro...
Aviador - Boa pergunta (pensativo). Afinal, eu nem sei como é esse tesouro e talvez não
possa mesmo carregá-lo...
Gargalhada - E, por falar em carregar, onde estão os outros “malas” da sua imaginação?
Aviador - E como vou saber?
Gargalhada - Vê se te liga, cara! Estão aí na sua cabeça. Vamos, imagina, que o tempo
ta passando.
ENTRAM CHARLITO, TILIN E CORDÉLIA, CHATEADOS.
Aviador - O que foi?
Cordélia - Não entendemos a demora.
Aviador - Demora de quê?
Cordélia - Da tua imaginação, tá ficando esquecido.
Tilin - Mas do Gargalhada ele não esquece.
Gargalhada - Lá vem cena de ciúme.
CHARLITO, MAIS UMA VEZ, INSISTE QUE SABE QUAL É E ONDE ESTÁ O TESOURO. COM GESTOS,
BRINCA DE PIÃO E CARRINHO DE CORRIDA.
Gargalhada (furando o pneu do carro do Charlito) - Ô, Charlito, pára com esse negócio.
Ninguém entende isso...
Tilin - Eu entendo, sim! Ele tá brincando de criança... Ou de ser criança.
CHARLITO, ANIMADO, MOSTRA QUE ELA TEM RAZÃO, MAS É INTERROMPIDO PELO AVIADOR
E FICA TRISTE.
Aviador - Pra saber como é o tesouro, temos que achar e, para achar, temos que
procurar... Vamos!
Cordélia - Vem cá (puxa o Aviador). Você não sabe mesmo como é o seu tesouro? (todos
prestam atenção, curiosos)
Aviador - Bem, saber mesmo, eu não sei. Tenho algumas lembranças, mas são vagas,
antigas... Mas, mesmo esmaecidas, essas lembranças são lindas... (todos se comovem).
Gargalhada (num susto) - Olha aí, eu já avisei. Se bobear, a melancolia pega vocês...
Cuidado!
CENA’S 13
Aviador - Tem razão, Gargalhada. Vamos fazer o que tem que ser feito. Vamos descobrir
que tesouro é esse.
Tilin - Tudo bem, mas temos que começar por algum lugar.
Cordélia - Eu acho que está no pé do arco-íris!
CHARLITO DIZ QUE PODE SER.
Gargalhada - Não! Acho que está num circo!
CHARLITO SINALIZA QUE TAMBÉM ESTÁ.
Tilin - Já sei! Está numa estrela!
CHARLITO PULA, COMEMORA, DÁ CAMBALHOTAS, MAS É INTERROMPIDO MAIS UMA VEZ
PELO AVIADOR.
Aviador - Mas, como vamos encontrá-lo se ele está em todos esses lugares?
CHARLITO AVISA QUE SERÁ PRECISO BUSCAR O TESOURO EM TODOS ESSES LUGARES E EM
OUTROS TAMBÉM. AFIRMA, COM GESTOS, QUE NÃO SERÁ UMA TAREFA FÁCIL.
Gargalhada (chateado) - É uma estraga prazeres... tava tudo bem, a gente já ia pro
circo... (de repente, divaga) Ah... o circo! Que saudades daqueles palhaços lindos que
faziam rir as crianças em picadeiros humildes...
Cordélia - Vejam só o saco de risada. Teve uma recaída, tá voltando a ser gente.
Tilin - Quem bom, assim vai contar estrelas de novo...
CHARLITO ABRAÇA E AFAGA GARGALHADA.
Aviador - É, parece que a minha imaginação está voltando ao normal de novo...
Gargalhada (empurrando Charlito) - Não vem, não. Não fica alegrinho não, porque a
gente tem uma parada dura pra resolver... Como é que a gente vai sair desse deserto,
com esse avião encrencado?
Aviador - Encontrando o tesouro. Vamos procurá-lo. E cada um faz sua proposta.
Cria-se uma grande confusão, porque cada um quer seguir seu próprio plano.
Cordélia - O meu é mais bonito, colorido!
Tilin - O meu é preciso, exato!
Gargalhada - O meu é mais engraçado e cheio de risadas!
O AVIADOR TENTA ORGANIZAR A BAGUNÇA, QUANDO PERCEBE QUE O CHARLITO ESTÁ
TRISTE, QUASE CHORANDO.
Aviador - O que foi, Charlito?
CHARLITO, AINDA TRISTE, INSISTE QUE SABE QUAL É E ONDE ESTÁ O TESOURO E DIZ,
GESTICULANDO, QUE AQUELA CONFUSÃO NÃO AJUDA EM NADA.
CENA’S 14
Aviador - Vamos encontrar um jeito de procurar o meu tesouro respeitando todas as
opiniões e pessoas aqui presentes... pessoas que sou eu, feito de cada um de vocês.
Certo?
Todos - Mais ou Menos, buaaaá!
Sugerimos para este número musical a utilização de móveis e objetos domésticos como
adereços e a exploração de situações cômicas da vida familiar de cada participante do
grupo. Será divertido remeter ao público intimidades leves e engraçadas descritas na letra
da música.
Cada Um é Como É
(6° Princípio – A criança tem direito ao amor e compreensão, deve crescer sob a proteção
dos pais, com afeto e segurança para desenvolver sua personalidade).
Papai é como é
Entendo ele até
Sua vida não é mole, não
Sai pra trabalhar
Só volta pro jantar
Cochila em frente da televisão
Mamãe foi sempre assim
Cuidou sempre de mim
Uma adorável chateação
É um tal de toma banho
Escova os dentes
Troca de roupa
E vai fazer sua lição
Homem e mulher, que confusão
Cada um é como é
Por fora tudo bem
Por dentro, não
Ninguém parece com ninguém
Vovó é genial
Da casa é a mais normal
Com suas manobras radicais
Escondido ela me dá
Dinheiro pra gastar
E nunca conta nada
Pros meu pais
Vovô é o que há
Tem sempre pra falar
Uma novidade genial
Se esquece e conta
Sempre a mesma história
E adormece entre as notícias
Do jornal
Homem e mulher, que confusão
Cada um é como é
Por fora tudo bem
Por dentro, não
Ninguém parece com ninguém
Terminada a música, o balé sai.
CHARLITO, AINDA MAIS ANSIOSO, PEDE PARA PROCURAR O TESOURO. NOVAMENTE
BRINCA. DESSA VEZ DE BILA.
Gargalhada o interrompe.
Cordélia - Gargalhada! Outra vez?
Gargalhada (irritado) - Eu não agüento mais não entender o que esse cara quer dizer.
Temos que dar um jeito nisso, senão eu vou ficar maluco.
Cordélia (pensando um pouco) - Já sei! Vamos ensiná-lo a ler.
Tilin - Fazer conta, contar estrelas...
Aviador - Não temos tempo... E o tesouro? (preocupado)
Todos (gritando) - Vai esperar!
O balé para esta música ficará divertido se os bailarinos e atores vestirem jalecos com
letras do alfabeto e segurarem em cada mão outras letras, recortadas, de modo que
possam formar palavras enquanto dançam.
CHARLITO DEVE ESTAR COM AS MÃOS SOLTAS, TENTANDO DESCOBRIR AS PALAVRAS
FORMADAS. COMO SEMPRE, PARECE TRAPALHÃO, CONFUSO E ENGRAÇADO.
CENA’S 15
Bê-a-bá
(7° Princípio – A criança tem direito à educação, para desenvolver as suas aptidões, as
suas opiniões e o seu sentimento de responsabilidade moral e social).
Quando a gente cresce um pouco
É coisa de louco o que fazem com a gente
Tem hora pra levantar
Hora pra se deitar
Pra visitar parente
Quando se aprende a falar
Se começa a estudar
Isso não acaba nunca
E só vai saber ler
Só vai saber escrever quem aprender o bê-a-bá
E além do abecedário
Um grande dicionário vamos todos precisar
Com A escrevo amor
Com B bola de cor
Com C eu tenho corpo, cara e coração
Com D ao meu dispor, escrevo dado e dor
Com E eu sinto emoção
Com F falo flor
Com G eu grito gol
Com H de haver eu posso harmonizar
Com I desejo ir
Com J volta já
Com L eu tenho luar
Com M escrevo mão, mamãe, manjericão
Com N digo não e o verbo nascer
Com O eu posso olhar
Com P papai e pá
Com Q eu quero querer
Com R eu posso rir
Com S sapoti
Com T tamanduá
Com U Urubupungá
Com V juro que vi
Com X faço xixi
No fim o Z da zebra.
Os bailarinos deixam o palco e um foco de luz no proscênio ilumina o primeiro dos cinco
planos que levará nosso herói e seus companheiros ao tesouro perdido.
Aviador - Bem, vamos ao sorteio do primeiro endereço... Quem tira o primeiro? (todos
querem)
Tilin, tira você.
Tilin retira do saquinho azul com estrelinhas brancas o enigma que o aviador lê em voz
alta.
Aviador - “Procurar o Rei-do-Nada na rua da Solidão, sem número”.
Todos (surpresos) - Rei-do-Nada???
Tilin - E sem número! Que tristeza...
Gargalhada (para o público) - Viva a imaginação
A luz se apaga.
CENA 5: EM BUSCA, FINALMENTE, DO TESOURO
Um foco de luz azul suave ilumina um rei como aqueles de antigas fábulas, dormindo
sentado num velho trono dourado ficando no deserto.
Tilin (na penumbra) - É aqui. (falando baixinho, chama os companheiros)
Gargalhada (andando na ponta dos pés, aproxima-se do rei) - Seu rei, sou eu, o
Gargalhada. Sou a imaginação dele (aponta o Aviador), e esses aqui também. Sou só
imaginação, acorda, seu rei! (sacode o rei, que acorda parecendo confuso).
Rei-do-Nada (acordando, irado) - Guardas! Cadê a polícia? Guardas! (grita)
Tilin - Majestade, desculpe.
Rei-do-Nada - Guardas, onde estão os guardas?
O Aviador, aflito, tenta acalmar o velho rei.
Rei-do-Nada - Quem são vocês? O que querem de mim?
Gargalhada - Calma, seu rei. Nós somos a imaginação dele (aponta novamente o
Aviador). Eu faço rir, seu rei. Sou um palhaço...
CENA’S 16
Cordélia (provocando) - Um saco... de risadas.
Gargalhada - E fazer rir é minha profissão...
Rei-do-Nada - Um rei não ri nunca! Rei é autoridade, e autoridade não ri, não gargalha!
Não brinca!
Tilin - Calma, senhor, é só um tesouro... deve estar numa estrela.
Rei-do-Nada - Estrela, bobagem! Preciso de guardas, não de estrelas!
Cordélia - Majestade, o tesouro dele não é desses que o senhor conhece, com moedas
de ouro... aquelas taças grandes de prata...
Gargalhada - É, seu rei, ele não lembra bem do tesouro. Sabe apenas que jogava bola,
andava de patins, de skate... era muito divertido.
CHARLITO TENTA CHAMAR A ATENÇÃO DE SEUS AMIGOS E DO REI, BRINCANDO DE PULAR
CORDA.
Gargalhada - Ô, Charlito, olha o respeito com o seu rei...
Tilin - Sabe, majestade, esse tesouro dele são lembranças...
Rei-do-Nada - Fora daqui! Não quero saber de lembranças. Guardas! Chamem os
guardas! (e volta a dormir)
Tilin - Tadinho... é tão velhinho.
Gargalhada - Tadinho sou eu, que nasci pelado. Esse cara aí (aponta o rei) já nasceu com
tudo, por isso é que precisa de GUARDAS! GUARDAS! (imita os gritos do rei)
Cordélia (delirando) - De que valem as cores... E todas as belezas.. Se ninguém tem olhos
para vê-las?
Tilin - Cordélia, que beleza! Adorei!
Aviador - Não entendi o que você quis dizer, Cordélia.
Cordélia - Deixa pra lá.Vamos ao que interessa.
CHARLITO PEDE PARA ELE SORTEAR O PRÓXIMO ENIGMA.
Gargalhada - Será que ele consegue, sem rasgar o saco ? (rola de rir)
CHARLITO AMEAÇA GARGALHADA COM A SUA BENGALA, MAS É CONTIDO POR
CORDÉLIA, TILIN E PELO AVIADOR.
Aviador - Vamos ao próximo sorteio, Charlito, é a sua vez.
CHARLITO, IMITANDO AINDA MAIS O “CARLITOS”, FAZ POUCO CASO DE GARGALHADA E
RETIRA GARBOSAMENTE DO SAQUINHO O PRÓXIMO ENIGMA.
Aviador (CHARLITO AO LADO FAZ QUE LÊ TAMBÉM) - “O tesouro tem soluço e se vai até lá
pela rua do mé”.
Todos - Méééééé!!!!!!
Gargalhada - É mé de bode ou de beber?
CENA’S 17
Cordélia - Se tem soluço, é bêbado.
Aviador - Peraí, gente, estou me lembrando dele...
Todos - Dele, quem???
Aviador - Dele! (aponta o soluço, que entra cambaleando, pára no centro e adormece)
Gargalhada - Era só o que faltava! Você também imagina isso! Isso também tá na sua
cabeça?
Aviador (confuso) - Acho que sim... Como vou saber?... Pode ser.
Cordélia - Essa não! A gente andando feito tonto por esse maldito deserto, atrás do “seu”
tesouro, e você com essas facilidades de só imaginá-los para eles aparecerem. Ah, tenha
dó!
Aviador - Eu não sabia, desculpem...
Tilin - Ah, coitado... coitadinho.
Aviador - Já que ele apareceu...
Cordélia (irritada) - Porque VOCÊ imaginou.
Aviador - Vamos ver se ele sabe do tesouro.
Aproximam-se todos do Soluço, que está dormindo.
Cordélia - Ô, seu mé, estamos procurando o tesouro dele. (aponta o Aviador) Acorda!
Soluço (despertando, surpreso) - Oi, boneca, hic, toma um trago, hic, comigo? Hic!
Cordélia - Não, obrigada. Não bebo. Só pinto e bordo.
Soluço - Pinto? Hic, oba!
Cordélia - Não, seu Soluço, eu disse “pinto”, de pintar, pintura, desenhos... cores,
entendeu?
Soluço - Não hic, mas tudo bem. Hic. (chama o Gargalhada) Ô, palhaço, hic, faça um
número, hic, pra mim, hic. Tô precisando rir, hic.
Gargalhada (constrangido, com vergonha) - Mas... Agora?
Soluço - É hic, você não é, hic, palhaço?
Gargalhada - Sou... Mas agora não dá... Desculpe. Eu sou imaginação dele e, se ele não
ri, eu não consigo ser engraçado. Ele agora está preocupado com um tesouro que
perdeu.
Soluço - É. Se você na faz seu número, eu faço o meu (solta um pum).
Gargalhada - Ah! Agora fiquei inspirado. Adivinha essa: você sabe qual a diferença entre
o homem e o porco?
Soluço - Não, hic.
Gargalhada - É que o porco quando bebe, não vira homem (gargalha). Entendeu? Não
vira homem (continua gargalhando).
Soluço - E o homem, hic?
Gargalhada - Quando bebe, vira um porco! (aponta para o soluço e cai
gargalhando).Entendeu? Um porco! (imita um porco)
Soluço - Boa, palhaço, hic. Ei? Quem, hic, são esses aí, hic? (aponta todos) Tô vendo gente
demais, hic.
CENA’S 18
Gargalhada - São um só. É verdade! É só ele (aponta o Aviador). O resto é figuração, é só
imaginação.
Soluço - Tô mal, hic. Antes, quando bebia, hic, via tudo dobrado, hic, agora, hic, to vendo
mais de quatro, hic, em um só, hic. Tô piorando, hic.
Cordélia (com pena) - Mas, e o tesouro dele? Você sabe onde está?
Soluço - Tesouro? Hic, ah, hic, já tive muitos, hic, todos...
Aviador (constrangido) - Vamos, ele não pode ajudar... Desse jeito, não...
Soluço (chamando Cordélia) - Ei, boneca, hic, meu tesouro é, hic, você. (volta a dormir)
Cordélia (indignada) - Eu, heim!!!!
Gargalhada (para o Aviador) - Tu tá imaginando mal, heim, cara! E aquelas boas
recordações onde estão?
Tilin - A vida é assim, tem coisas boas e ruins.
Cordélia - Mas aturar bêbado é demais! Não há tesouro que valha isso...
CHARLITO, NO PROSCÊNIO, NA LUZ, PEDE AO AVIADOR QUE “IMAGINE” O PRÓXIMO
PLANO.
Aviador - Sem sorteio?
Cordélia - Ah, não, eu também quero meter a mão no saquinho! (fica encabulada com
a frase)
Gargalhada - Ah, eu sabia que no fundo tinha uma certa “atraçãozinha”! Ah, isso tem!
Cordélia - Cala a boca, seu obsceno!
Aviador - Parem! Vem, Cordélia, vem por a mãozinha no saquinho tirar o próximo plano.
Quando Cordélia põe a mão no saquinho, todos a observam maliciosamente.
Cordélia (lendo) - “Rapaz solteiro procura espelhos, rua da Vaidade, n° 1.”
Todos (espantados) - Rapaz solteiro?
Aviador (encabulado) - Isso eu não imaginei, não!
Gargalhada - Imaginou, sim! Vamos, faça uma forcinha (tapa os olhos do Aviador) que
ele aparecerá. Vamos, pensa! Seja homem!
Eu-de-Mim entra em cena, segurando um espelho em uma das mãos e fica imóvel.
Cordélia, vaidosa, fazendo pose para o espelho, chama os outros.
Gargalhada - Eu não.
Aviador - Por que não?
Gargalhada - Porque não posso me ver!
Cordélia - Porque, não?
Gargalhada - Porque, quando eu me vejo morro de rir! (cai, gargalhando)
Todos riem e se esquecem da presença do Eu-de-Mim.
CENA’S 19
Eu-de-Mim - Olhem-me, contemplem-me. Ninguém será jamais tão deslumbrante quanto
eu!
Cordélia (para o Eu-de-Mim) - Menos, menos... Ô, seu ego, estamos procurando
(apontando o Aviador) o tesouro dele.
Eu-de-Mim - Tesouro sou eu! Sou corpo dos meus próprios carinhos, tudo o que sou
pertence a mim! Eu sou o meu tesouro! Sou lindo! (começa a dançar)
Gargalhada (abraçando o Aviador, fala ironicamente) - Que franga! Tu tá dando
bandeira... Pega leve... Isso aqui é teatro pra criança...
Aviador - Mas eu não sou vaidoso assim!
Cordélia - Isso é o que você queria que fosse...
Aviador - Então, eu não sei?
Cordélia - Tá no inconsciente... Toma cuidado, você tá ficando “vulnerável”.
Tilin - O que é “vulnerável”?
CHARLITO MOSTRA QUE VULNERÁVEL É ELE, QUE É FRÁGIL, INDEFESO, E FICA TRISTE. VAI
ATÉ O EU-DE-MIM E O TIRA PARA DANÇAR. DANÇANDO, OS DOIS SAEM DE CENA.
Tilin (aplaudindo) - Que coisa linda! O Charlito é o máximo!
Gargalhada - Não sei, não. Tesouro que é bom, ninguém procura mais. E o palhaço aqui
tá pagando o maior mico, vendo coisas que esses olhos aqui, ó (mostra os próprios olhos
arregalados e pisca exageradamente), nunca imaginaram que iriam ver.
Aviador (disfarçando) - Calma, não há motivo para tanta preocupação. Vamos achar o
tesouro e tudo isso desaparecerá.
Cordélia (abraçando o Aviador) - Vem cá, o tal Eu-de-Mim é você, não é?
Aviador - É... Eu acho que é uma parte, como vocês...
Gargalhada - Esses “elementos” que surgem de repente das áreas escuras do “seu eu”
são de lascar. Toma cuidado, já disse que isso aqui é teatro pra criança. Tem que ser
instrutivo, leve...
Tilin - Educativo.
Cordélia - Já rolou de tudo, cara! Rei autoritário, bêbado safado e, agora, esse poço de
vaidade.
Gargalhada - E algo me diz que vem mais por aí...
Aviador - Mas, afinal, que mal eu fiz?
Todos (gritando) - Deixou de ser criança!!!
Começa mais um número musical. Esta música é a essência e a inspiração da história que
estamos contando.
Portando, divirtam-se: brinquem à vontade, façam do palco uma grande festa.
CENA’S 20
É Bom Ser Criança
(8° Princípio – A criança, em qualquer circunstância, deve ser a primeira a receber
proteção e socorro.
É bom ser criança
Ter de todos atenção
Da mamãe, carinho
Do papai, a proteção
É tão bom se divertir
E não ter que trabalhar
Só comer, crescer, dormir, brincar
É bom ser criança
Isso às vezes nos convém
Nós temos direitos
Que gente grande não tem
Só brincar, brincar, brincar
Sem pensar no boletim
Bem que isso podia nunca mais ter fim
É bom ser criança
Não ter que se preocupar
Com a conta no banco
Nem com os filhos pra criar
É tão bom não ter que ter
Prestações pra se pagar
Só comer, crescer, dormir, brincar
É bom ser criança
Ter amigos de montão
Fazer cross saltanto
Tirando as rodas do chão
Soltar pipas lá no céu
Deslizar sobre patins
Bem que isso podia nunca mais ter fim.
NO FINAL DA MÚSICA, CHARLITO FICA OUTRA VEZ SOZINHO NO PALCO E BRINCA DINOVO
DE AMARELINHA.
Aviador (entrando, vê Charlito e fica curioso) - O que é isso, Charlito? Tá triste?
CHARLITO DIZ QUE AQUILO QUE FAZIA, AS BRINCADEIRAS, ERA O SEU TESOURO.
Aviador - Meu tesouro?
CHARLITO FAZ QUE SIM, COM A CABEÇA.
Gargalhada (interrompendo, malcriado) - Olha aqui, ô mímico! Ou você explica isso de
uma vez por todas ou eu vou ter um troço! Vamos acabar com esse baixo astral! Isso, pra
um palhaço, é IN-SU-POR-TÁ-VEL!
Cordélia - Sai pra lá, seu saco! (empurra Gargalhada) Vamos, Charlito, explica isso! Mostra
como é o tal tesouro.
CHARLITO COMEÇA, MAIS LOGO DESANIMA. IMITA QUE BATE UMA BOLA JOGANDO-A DE
LADO.
Aviador - Por que parou, Charlito?
CHARLITO, IRRITADO, FAZ GESTO OBSCENO COM AS MÃOS PARA DIZER QUE ESTÁ COM O
“SACO CHEIO” DE EXPLICAR E NINGUÉM ENTENDER.
Gargalhada (irônico) - É. Eu entendo você, companheiro de imaginação. Eu sei como é,
não ser compreendido e ser tratado como um idiota, que faz tudo errado. Então, aperta
aqui minha mão, amigão! (finge levar um choque e cai gargalhando) Eu não acredito
que você caiu nessa, bobão. (gargalha)
CHARLITO SE IRRITA E AMEAÇA GARGALHADA.
Gargalhada (ainda irônico) - Ui! A boneca zangou!...
Tilin - Pára, Gargalhada! Que saco você é!!!
Cordélia (para o Aviador) - Como é que alguém pode viver com uma tranqueira dessa
(aponta Gargalhada ) dentro da cabeça e não ficar maluco?
Gargalhada - Não sou eu o problema, é ele (aponta o Aviador). Ele é que não é normal.
(começa a gargalhar) Eu, ou melhor, nós somos ele, e você também já foi melhor, viu,
Cordélia?
CENA’S 21
Aviador - Eu é que sou toda essa confusão?
Todos - É!!!!
Aviador - Só tem um jeito de resolver tudo isso e deixá-los em paz. E a solução é encontrar
o tesouro. (tira do bolso o saquinho e chama o Gargalhada) Vem, Gargalhada, é a sua
vez.
Gargalhada enfia a mão no saquinho e grita como se algo o tivesse mordido. Mexe a mão
dentro do saco como se quisesse pegar um bicho que emite som de miado de gato que
ele próprio faz com os lábios semicerrados.
Quando percebe que todos estão atentos a seus movimentos, gargalha.
Gargalhada (ainda com a mão dentro do saquinho) - Tilin, vem cá, pega o bicho
(gargalha).
Vem, Cordélia, mete a mão no saquinho, vem. Ô, você aí (pro Charlito), tá com medo?
CHARLITO VAI ATÉ ELE E DIZ QUE NÃO TEM MEDO, QUE SABE QUE É UMA BRINCADEIRA.
RETIRA, NERVOSO, O SAQUINHO DA MÃO DE GARGALHADA E ENTREGA O OUTRO ENIGMA
PRO AVIADOR.
Aviador (lendo) - “Tem tanto dinheiro dentro que quase não pára em pé. Rua da
Ganância, com milhões de números.”
Tilin - Êba! Esse, sim, deve saber onde o tesouro está! Vamos!
A luz apaga.
É bom lembrar que todo sorteio acontece no proscênio, iluminado por um foco de luz,
enquanto o restante do palco está na penumbra, quase na escuridão. Esse é um recurso
teatral para facilitar as mudanças de adereços para a cena seguinte.
CENA 6: NO COFRE DO DR. FORTUNA
Dr. Fortuna é um grande saco de dinheiro amarrado no pescoço do ator, que tem a
cabeça e os braços para fora. Ele se balança o tempo todo, como se fosse João Bobo, e
conta dinheiro distraído ao lado da mesa.
Atenção: a iluminação deve começar sempre muito leve e depois ir aumentando, para
criar suspense. Ou seja: o público perceberá aos poucos as características da
personagem.
Tilin (a primeira a entrar em cena, vê o Dr. Fortuna contando dinheiro) - Dr. Fortuna,
estamos procurando um tesouro. O tesouro dele (chama o Aviador)
Dr Fortuna (sem prestar atenção nos visitantes, sempre se balançando) - Cento e trinta e
cinco mil, quatrocentos e vinte e seis...
Tilin - Eu também faço contas... Sou uma grande calculadora... Eu conto estrelas...
Cordélia (puxando Tilin pelo braço) - Não adianta, Tilin, ele não vai ouvir nada.
Tilin - Eu conto os sóis e as luas...
Gargalhada (desanimado, tenta retirar as amigas dali) - É bom tomar cuidado. Se a gente
der alguma pista, esse cara vai achar o tesouro e ficar com ele...
Dr. Fortuna (parado de fazer contas) - Tesouro? Alguém aí falou em tesouro? É meu!!!
Gargalhada - Não falei?
Tilin - Não sabemos como é...
CENA’S 22
CHARLITO VOLTA A IMITAR BRINCADEIRAS DE CRIANÇA: SOLTA PIPA.
Tilin (apontando para as brincadeiras do Charlito) - É assim, preste atenção. Vamos,
Charlito, continue...
Dr. Fortuna - Tragam aqui. Eu compro, posso comprar o que quiser... Posso comprar a sua
risada, palhaço. Quando custa?
Gargalhada (sem graça) - Não é minha... o riso é de quem ri. Não posso vender alegria.
Dr. Fortuna - Bobagem, dinheiro compra qualquer coisa. Posso comprar suas estrelas,
boneca.(aponta Tilin)
Tilin - Não são minhas. São de quem olha o céu... E algumas nem existem mais. São apenas
luz viajando no espaço. Não posso vender o que não existe.
Dr. Fortuna - Bobagem, Posso comprar o que não existe e mandar fazer o que não existe
como eu bem entender. Você aí... (chama Charlito) você me parece o mais sensato, não
diz besteiras. Venha cá, tome uma moeda... CHARLITO RECUSA A OFERTA.
Dr. Fortuna - É um cretino, recusar dinheiro... Onde se viu! Dinheiro é tudo. Posso comprar
suas cores, boneca (para Cordélia), quanto quer por elas?
Cordélia - Não são minhas, eu só misturo... É a luz que faz as cores... E ninguém pode
comprar a luz.
Dr. Fortuna - Tolice! Eu posso mandar construir uma usina hidrelétrica e ter a minha própria
luz.
Cordélia - Mas a luz que você fabricar, quando acender, será de todos.
Dr. Fortuna (nervoso, gesticulando, balançando) - Não! A minha luz, não, é só minha.
Saiam da minha luz! Vou mandar castigá-los por estarem na minha luz!
Cordélia - Não é sua, bobão! É de todos!
Tilin - E sem essa de castigo!
Gargalhada - E, se bater, leva o troco!
Iniciamos aqui mais um número musical. Para esta coreografia é recomendável que se
representem situações descritas na letra, dando especial atenção ao público. Esse
número deve ser uma advertência aos pais e educadores, para que, nas situações de
conflito com os filhos, procurem sempre o diálogo.
Castigo Não
(9° Princípio – A criança não deve ser abandonada, espancada ou explorada, não deve
trabalhar quando isto atrapalhar sua educação, saúde e seu desenvolvimento físico,
mental ou moral).
Um dia você crescerá
Será gente grande também
Depois você vai namorar
Gostar muito, muito de alguém
E quando você se casar
Virá com certeza um neném
Não deixe nunca
Seu filho sozinho, sem proteção
Castigos não fazem ninguém mais bonzinho
Não fazem não
Não levante a voz
Não levante a mão
Não bata, não xingue
Nem dê beliscão
Não trate as crianças como bem entender
Gritos não vão resolver
Criança que apanha não aprende a lição
Com jeito ela vai aprender
Não deixe nunca
Seu filho sozinho, sem proteção
Castigos não fazem ninguém mais bonzinho
Não fazem não.
No final do número musical, o balé sai e os atores voltam ao proscênio.
Aviador (retirando o saquinho do bolso da capa) - Bem... Só falta um. Vamos ver. (tira o
enigma e lê) “A terra é um tesouro azul”.
Saem. A luz apaga no proscênio e lentamente ilumina o cenário.
CENA’S 23
CENA 7: EM ALGUM LUGAR DA TERRA
Um espantalho colorido e com roupas remendadas guarda um pequeno jardim circular,
com placas fincadas ao redor que mostram, em mapas, a devastação das florestas e das
espécies animais na Terra. Gargalhada entra sozinho e muito cuidadoso.
Gargalhada (comparando sua roupa com a do espantalho) - Só pra saber... o senhor
trabalha em algum circo?
Ecoluco (ajeitando-se, arrumando a roupa e o chapéu) - Não, meu caro palhaço, não
tenho tempo.
Gargalhada - Que alívio! Pensei que fosse um concorrente meu. (chama os outros,
gritando)Podem vir, não é palhaço, não.
Cordélia (entrando, com os outros) - Ufa! Que alívio. Mais um palhaço eu não agüentaria...
Ecoluco - O que desejam? (preocupado com as flores do jardim) Cuidado com as flores.
Aviador - Procuramos um tesouro que perdi há muito tempo...
Cordélia - Ele não sabe mais como era...
Tilin - O tesouro dele está numa estrela...
Ecoluco (agora imóvel, de braços abertos) - Como, numa estrela? Não! É aqui na Terra
que está o nosso tesouro. Ele é o chão que você está pisando.
Todos olham para o chão.
Gargalhada - Bingo! É claro, só agora que a ficha caiu. Se é tesouro, tem que estar
enterrado! (se joga no chão, fingindo cavar a terra, rindo muito)
Cordélia (para o espantalho) - Não liga, não. Isso aí é assim mesmo, não liga pra nada,
não leva nada a sério.
Gargalhada (sério) - E rir não é sério? Você só ri quando está feliz. Ou não? E o mundo está
precisando disso... de felicidade. O mundo precisa rir, ora bolas!
Pede aplausos ao público, para o que acabou de dizer.
Ecoluco - Você tem razão, meu caro palhaço. Mas para o mundo todo rir, precisamos
repartir a felicidade com os mais tristes... e lutar muito para que os homens deixem de
matar florestas, rios, mares e animais... e que parem de maltratar outros seres humanos que
julgam inferiores e mais fracos...
Neste próximo número musical, como os bailarinos já vestem figurinos com cores das
bandeiras e de outros países, podem usar máscaras étnicas e trajes típicos de outros
países, para reforçar a idéia de confraternização universal.
CENA’S 24
Imaginem
(10° Princípio – A criança deve ser protegida do preconceito, deve ser educada com o
espírito de amizade entre os povos, de paz e fraternidade, deve desenvolver suas
capacidades para o bem de seus semelhantes)
Imaginem todos vocês
Se o mundo inteiro vivesse em paz
A natureza talvez
Não fosse destruída jamais
Russo, cowboy e chinês
Num só país sem fronteiras
Armas de fogo seria tão bom
Se fossem feitas de isopor
E aqueles mísseis de mil megatons
Fossem bombons de licor
Flores colorindo a terra
Toda verdejante, sem guerra
Nenhum seria tão rico
Nem outro tão pobrinho
Todos num caminho só
Os rios e mares limpinhos
Com peixes, baleias, golfinhos
Faríamos as usinas e as bombas nucleares
Virarem pão-de-ló
Imaginem todos vocês
Um mundo bom
Que um Beatle sonhou
Peçam a quem fala inglês
Versão da canção
Que John Lennon cantou
Russo, cowboy e chinês
Num só país sem fronteiras
Armas de fogo seria tão bom
Se fossem feitas de isopor
E aqueles mísseis de mil megatons
Fossem bombons de licor
No final da grande confraternização (balé), todos saem.
FICA CHARLITO QUE TENTA CHAMAR A ATENÇÃO DO ESPANTALHO PARA SUAS
BRINCADEIRAS DE CRIANÇA: PUXA CARRINHO.
Ecoluco (bate palmas só mexendo os braços. O corpo fica imóvel) - É isso mesmo!
(contente) Esse é o maior tesouro do ser humano! O maior tesouro do mundo! (é
interrompido pelas botinas do Gargalhada, estalando no palco).
Gargalhada (para o espantalho) - Até você foi envolvido por essa panacéia... No caso,
acho que é uma “pantomima”.
Cordélia - Todo mundo sabe o que ele tá mostrando, seu burro.
Tilin - Você é um cabeça dura. (bate na cabeça do palhaço)
Ecoluco - O tesouro dele (aponta o Aviador), que vocês procuram... Passou, mas há
milhares pelo mundo todo que precisam de cuidado... (e dorme)
CHARLITO FICA TRISTE.
Aviador - Não desanima, não, Charlito. O tesouro não está aqui, mas vamos encontrá-lo
em outro lugar.
Tilin - Está numa estrela...
Gargalhada (irritado) - Deixa de sonhar. O espantalho já falou que está no chão. E vamos
supor que estivesse numa estrela... Naquela ali! (aponta) Como é que a gente vai buscá-
lo?
Todos compreendem que não poderiam e ficam mais tristes ainda.
Aviador - Acho melhor a gente descansar agora. Vamos dormir. Amanhã a gente
continua.
Todos deitam-se no mesmo lugar que dormiam na primeira cena do espetáculo.
... Ou (A fada reaparece. Se aproxima do Charlito e com sua mágica, lhe dá voz. Sai em
seguida. Ele acorda e fala com a platéia.)
CHARLITO CERTIFICA-SE QUE TODOS ADORMECERAM E VAI SOZINHO ATÉ O PROSCÊNIO E
FALA PELA PRIMEIRA VEZ. APENAS UM FOCO DE LUZ O ILUMINA NO PALCO ESCURO.
CENA’S 25
Charlito (falando) - O tesouro que procuramos nessa história não pode ser encontrado. Ele
(aponta o Aviador) o perdeu quando cresceu. O tesouro é aquele pequeno espaço de
tempo na vida de todos nós que chamamos de infância. Se somos felizes enquanto ela
dura, seremos felizes para sempre. A infância é um lindo tesouro, como se fosse um baú
cheio de lembranças...
Gargalhada acorda e chama Cordélia e Tilin.
CHARLITO FICA MUDO NOVAMENTE, MAS SEGUE GESTICULANDO, COMO SE FALASSE SEM
SOM.
Gargalhada - Pode parar, Charlito. Não adianta, não tem tesouro nenhum, escafedeu-se.
Tilin - Fale baixo, ele (aponta o Aviador) está dormindo.
Cordélia - Está sonhando.
Gargalhada - Sonhando. É só isso que ele faz. Sonha. E a gente é que rala. Na próxima
peça, quero ser imaginador. Ser imaginação dos outros, nunca mais!
Tilin - E o avião? Tá quebrado, como é que a gente vai voltar?
Cordélia - Voltar pra onde, Tilin? Nós somos a imaginação dele e ela não vai desistir de
continuar procurando seu tesouro.
CHARLITO CONCORDA COM CORDÉLIA E MOSTRA QUE ESTÁ FELIZ POR CONTINUAR
PROCURANDO O TESOURO.
Gargalhada - Eu não vou.
Cordélia - Vai, sim, palhaço. Só assim você vai continuar existindo.
Tilin - E, enquanto ele precisar de ajuda, vai pensar na gente...
CHARLITO, COM GESTOS DE CARINHO, DIZ QUE SERÁ PARA SEMPRE, QUE ELES SÃO A LUZ
NA VIDA DO AVIADOR. NISSO, UMA LUZINHA COMEÇA A BRINCAR NO PALCO E CHARLITO
TENTA PEGÁ-LA, COM UMA GRANDE REDE DE CAÇAR BORBOLETAS.
Gargalhada - Ô “Avoar Passos Dias” (rindo), tá de novo o amolecado do Charlito dizendo
que nós somos o seu tesouro (olha para si e para os outros). Que lixo, que pobreza. Tu tá
mal de tesouro, heim?
Aviador (levantando) - Mal do quê?
Cordélia (rindo) - É um palhaço, mesmo... Ô, Gargalhada, você também é parte disso...
Gargalhada - A mais divertida.
Aviador - Parte de quê?
Tilin (correndo a trás do Charlito) - Vem Charlito, vem! O Charlito já explicou... Mas você
estava dormindo e não ouviu.
Aviador (confuso) - Ouviu o quê?
Todos (correndo atrás do Charlito e da luzinha) - Que nós somos o seu tesouro! Somos as
suas lembranças.
CENA’S 26
Gargalhada (eufórico) - As melhores da sua infância!
Aviador (feliz) - Quer dizer que vou precisar de vocês pelo resto da minha vida?
Todos (parando de cansados) - VAI!!!!!
Neste último musical, os bailarinos trazem uma grande bandeira do Brasil.
Todo o elenco e equipe técnica surge e cantam com a platéia.
Herdeiros do Futuro
A vida é uma grande
Amiga da gente
Nos dá tudo de graça
Pra viver
Sol e céu
Luz e ar
Rios e fontes
Terra e mar
Somos os herdeiros do futuro
E pra esse futuro ser feliz
Vamos ter que cuidar
Bem desse país
Será que no futuro
Haverá flores?
Será que os peixes
Vão estar no mar?
Será que os arco-íris
Terão cores
E os passarinhos
Vão poder voar?
Será que a terra
Vai seguir nos dando
O fruto, a folha
O caule e a raiz?
Será que a vida
Acaba encontrando
Um jeito bom
De a gente ser feliz?
Vamos ter que cuidar
Bem desse país.
FIM

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