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REVOLUÇÃO LIBERAL E REGIME SENHORIAL:
«A QUESTÃO DOS FORAIS»
NA CONJUNTURA VINTISTA
1. Introdução
nos da lei de 1832 (2). A maior parte dos restantes autores limita-
ram-se a fazer breves referências à questão (3).
Curiosamente, a crise dos paradigmas historiográficos domi
nantes até há cerca de dez anos tem vindo recentemente a conduzir
a uma subalternização da problemática da abolição do regime senho
rial, mais por omissão, do que por verificação empírica da sua irre
levância. É o caminho inverso que aqui se busca prosseguir.
Restringindo-me ao período vintista e isolando um tanto artificial
mente a questão do conjunto da legislação liberal, procurarei, den
tro dos apertados limites do espaço consentido, confrontar os dis
cursos e a legislação dos deputados vintistas sobre bens da coroa e
forais e as expectativas («económicas, «sociais» e «políticas») que lhe
eram inerentes, com os diversos e contrastantes contextos regio
nais sobre os quais incidiram.
Para concluir, é conveniente salientar que se deixaram de lado
as dimensões jurisdicionais do regime senhorial. Este procedi
mento justifica-se, fundamentalmente, por três motivos: em pri
meiro lugar, porque a questão suscitou pouca discussão durante o
vintismo; em seguida, porque os poderes jurisdicionais e adminis
trativos dos donatários estavam, aparentemente, bastante restrin
gidos; finalmente, porque subsistiram algumas situações que ainda
não consegui esclarecer devidamente (4).
lation, Paris, 1857, tomo 38, pp. 332 e segs. Depois do Termidor houve
repetidas tentativas para restringir o âmbito da legislação revolucionária.
(21) Cfr. J. Boutier, «Jacqueries en pays croquants: les révoltes
paysannes en Aquitaine», Annales E. 5. C., n.° 4, 1979, e, no mesmo sen
tido, Michel Vovelle, «Les troubles sociaux en Provence de 1750 à 1792»,
De la cave au grenier, Quebeque, 1980. Contra esta interpretação é a perspec
tiva que estende às revoltas do século xvin o modelo «comunitário» das do
século xvii, sustentada por Yves-Marie Bercé en Croquants et nu-pieds,
Paris, 1974, e em Révoltes et révolutions dans L'Europe moderne, XVII-
-XVIII siècles, Paris, 1980. Sobre as implicações que a questão tem na
explicação do fenómeno da contra-revolução camponesa em França, cfr.
T. J. A. Le Goff e D. M. G. Sutherland, «The social origins of counter-
-revolution in Western France», Past and Présent, n.° 99, 1983 e David
Hunt, «Peasant politics in the French Révolution», Social History, vol. 9,
n.° 3, 1984.
(22) Cfr. G. Lefebvre, op. cit., pp. 348 e seg. e F. Furet, Ensaios sobre
a Revolução Francesa, Lisboa, 1978, pp. 40 e segs.
(23) Sob influência do historiador soviético A. Ado, é esta a tese
defendida contra ventos e marés por A. Soboul, «Sur le mouvement paysan»,
op. cit:, e por Hemâni Resende, Igualitarismo Agrario e Socialismo Utópico
na Transição do Feudalismo para o Capitalismo em França no século X V I I I ,
Lisboa, 1979.
(24) A exposição clássica que aponta nesse sentido é o citado artigo
de G. Lefebvre.
150 Nuno Gonçalo Monteiro
(84) Idem, p. 363. O decreto dos banais foi publicado com data de 7
de Abril de 1821.
(85) Há, por exemplo, uma carta de Alberto Carlos de Meneses, em
que isso se denuncia, já em 1824 ( A . H . P . , i /i i , cx. 112).
(86) O artigo 3.° do decreto de 3 de Junho de 1822 veio alargar o
âmbito das prestações abolidas.
(87) D. C., 1821 (Maio), vol. ii, «Memória sobre a Reforma dos Foraes»,
pp. 1112-1113. Já antes se haviam apresentado algumas propostas parcelares.
(88) Idem, p. 1116.
(89) Idem, vol. ni, p. 2922.
Revolução Liberal e Regime Senhorial 165
H Idem, p. 3123.
(91) Cfr. M. Halpern Pereira, op. cit., pp. 162 e segs. O projecto
oficial, ou seja, da comissão de agricultura, foi apresentado com data de 4
de Agosto de 1821 (D. C., 1821, vol. m, pp. 2818-2819).
(92) Cfr., sobre todas as implicações da lei, F. A. da Silva Ferrão,
Repertório comentado sobre Forais e Doações Régias, Lisboa, 1848.
(93) Cfr. Francisco Soares Franco, Explanação à lei de 5 de Junho
de 7822 sobre reforma dos Foraes, Lisboa, 1822, p. 4.
(94) p Xunes Franklin, Memória para Servir de índice dos Forais das
Terras do Reino de Portugal e seus Dcnninios, Lisboa, 1816.
166 Nuno Gonçalo Monteiro
(95) É esta, pelo menos, a minha leitura da lei, embora se tenha pre
tendido alargá-la a todas as formas de enfiteuse em bens da coroa (cfr.
folheto cit., nota 52).
(96) D . C . , 1822, vol. ui, p. 3682.
(97) Cfr. a petição de Cambezés (comarca de Braga), Silbert, op. cit.,
pp. 276-277, e o panfleto sobre o Minho atrás citado. Não oferece dúvidas,
quanto a mim, que os deputados que o aprovaram não alargavam o decreto
sobre os forais à enfiteuse em bens da coroa na ausência de foral : a proposta
da extensão da possibilidade de remição de foros, prevista no decreto, às
capelas da coroa (avançada por Alves do Rio), foi claramente rejeitada
(D. C., 1822, t. iv, p. 900). No entanto, o decreto foi aplicado em alguns
casos àquelas situações.
(") Por 47 votos a favor e 34 contra, D. C., 1822, vol. iv,
p. 526.
(") Depois das províncias referidas na generalidade (a Beira e o
Minho, principalmente), a outra referência é a comarca, zona, etc., de
Coimbra.
Revolução. Liberal e Regime Senhorial 167
( ) Idem, p. 3118
102
168 N uno Gong alo Monteiro
Silva Correia, etc.). A única vitória deste sector foi obtida quando,
contra a proposta da comissão de agricultura, conseguiram que na
votação final do artigo 8.° do decreto se salvaguardasse o princípio
de que as câmaras eram obrigadas a respeitar «o uso e direitos»
dos Povos na administração dos baldios e maninhos (107). De entre
os 15 deputados abolicionistas (5 eleitos pela Estremadura, 4 pelo
Brasil, e 3 por Trás-os-Montes), destacaram-se dois juristas (Manuel
Bortes Carneiro e José J. Ferreira de Moura), dois matemáticos
(Manuel Gonçalves de Miranda e Francisco Simões Marchichi) e
João M. Castelo Branco. Deve notar-se, no entanto, que, depois
da votação das bases da reforma dos forais, a defesa das posições
mais radicais coube, em muitos casos, a deputados não abolicio
nistas, neles se incluindo membros da comissão de agricultura
(B. Pereira do Carmo, F. L. Betencourt, etc.).
Para terminar, convém referir que durante o debate se discuti
ram, ocasionalmente, disposições que afectavam a enfiteuse em
bens patrimoniais. Se já na discussão sobre o decreto dos banais o
problema surgira a propósito dos serviços pessoais, agora voltaria
a ser colocado por causa dos laudémios (o projecto de artigo que os
fixava na quarentena pretendia estender-se a todas as enfiteuses)
e, de forma menos directa, a propósito da remição das prestações
fixas. Na verdade, a maioria dos deputados opôs-se ao projecto
de J. J. Rodrigues de Bastos, que defendia que «a distinção entre
laudémios constantes de forais e de contratos não tem lugar, por
que a iniquidade de uns e outros é a mesma, e para males iguais,
iguais remédios», com o argumento de que «a fé dos contratos deve
ser sagrada : mas é quando eles não ofendem as leis, nem a equidade
natural: ofendendo-as são nulos, e não devem observar-se» (108).
De facto, esta tese ultrapassava a dicotomia bens da coroa (assi
milados em impostos)/bens patrimoniais (identificados com a pro
priedade), característica de quase todo o discurso liberal sobre a
matéria (incluindo Mouzinho e Herculano) (109), para admitir res-
Província
Fogos 0/0/
Povoa
Conce
(1820) 0/0/
ções
ções
Peti
lhos
N.° % % %
Ração. 55 . 67,2
Jugada 10 12,2
Prest, fixa géneros 11 13,4
Prest, fixa dinheiro 0 0
Indeterminado 6 7,3
Total 82 100,0
Eclesiásticos 31 32
Leigos 30 30,9
Ordens militares (comendas) (a) 8 8,2
Universidade 7 7,2
Coroa 1 1
Casas de Bragança, do Infantado
das rainhas e almox. da de
Aveiro (b) 10 10,3
Senhorios nao discriminados 10 10,3
Total de referências 97
Total de povoações 82 (c) —.
5. Conclusões