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RODRIGO SILVA

Enciclopédia
Histórica da
Vida de
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ENCICLOPÉDIA HISTÓRICA DA VIDA DE

JESU
S
Expediente

E d i to r
C ristian M u n iz

Coordenação Pedagógica e Editorial


G eo v an a M u n iz

Revisão
A n a Paula R ibeiro

Projeto Gráfico e Diagramação


W K E d ito rial

Capa
Rafael C arvalho

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara


Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Silva, Rodrigo Pereira da


Enciclopédia da vida de Jesus / Rodrigo Pereira da
Silva. ‫ ־־‬São Paulo : Pae Editora, 2019.
Bibliografia
ISBN: 978-85-5558-095-6
1. Jesus Cristo - Enciclopédias 2. Jesus Cristo -
Ensinamentos 3. Jesus Cristo - Historicidade 4. Jesus
Cristo - Pessoa e missão I. Título.

17-05187 CDD-232.903

índices para catálogo sistemático:


1. Vida dejesus : Cristologia : Enciclopédias
232.903

f Z & zy Todos os direitos desta edição reservados à PAE Editora


J T L Av. Rudge, 346
01134-000 - São Paulo - SP
Tel: 11 3222-9015
p 1 ‫ח‬ t o p a ww w.pae.com .br Impresso no Brasil
ENCICLOPÉDIA HISTÓRICA DA VIDA DE

JESU
S
RODRIGO SILVA
Prefácio

Conheço o autor desde década de 1990. Rodrigo Pereira da Silva sempre


foi dedicado pesquisador das Escrituras Sagradas, com viés para a área ar-
queológica, da qual é D outor, pela Universidade de São Paulo. Tive o pri-
vilégio de com por a banca que o declarou D outor, após sua tese ter sido
aprovada por unanimidade.
Certam ente sua obra Enciclopédia Histórica da Vida de Jesus é um a grande
contribuição aos leitores interessados em conhecer m elhor a Bíblia Sagra-
da e ver como a Arqueologia tem contribuído para um a m elhor com preen-
são desse livro, em cujas páginas se encontra delineado o plano da salvação
de Deus para o ser hum ano, através de vida e obra do Senhor Jesus Cristo.

M esmo sendo obra de elevada erudição, o autor discorre sobre a pessoa


de Cristo com linguagem acessível, e isso faz com que o leitor consiga,
sem m uito esforço, com preender os assuntos e argum entos relacionados a
Cristo - o Emanuel, Deus Conosco, e como esse conhecim ento é de vital
im portância no que diz respeito à vida eterna, disponível àqueles que o
aceitam como Salvador pessoal.
Certam ente que, após ler essa obra, a leitura da Bíblia Sagrada adquirirá
novo sabor e significado ao leitor atento e interessado em com preender o
plano que Deus tem para sua vida, bem como para toda humanidade.

Ozeas C. Moura
D outor em Teologia Bíblica, pela PUC - RJ
xdução

O Famoso escritor e filósofo Bertrand Russell foi, sem dúvida, um dos


m aiores opositores à existência de Deus e relevância do cristianismo. Em
seu livro “Por que não sou Cristão”, lançado em 1927 ele foi taxativo em
dizer que era praticam ente nula a chance de Jesus ter existido. Sendo assim,
não via porque perder tem po com um personagem cujas características,
em sua opinião, eram pueris e questionáveis.

Em que pese o brilhantism o de Russell, tão aclamado por m uitos, fico


me perguntando o que teria ocorrido para que ele odiasse tanto a figu-
ra bíblica de Jesus? Afinal, caso se trate de um personagem literário mal
construído não há porque sentir-se ameaçado por ele, nem trata-lo com
tam anho desprezo. Jamais vi um filósofo de prestigio escrevendo um livro
apenas para desmerecer a figura mitológica de Papai Noel.

Por isso, o protesto intelectual de Russell me faz perceber que Jesus


é m uito mais do que um m ito natalino, ou personagem inofensivo. Seu
nom e ameaça e não condiz com a tentativa de m inim izar sua mensagem
fazendo-a parecer pueril. Existe algo em suas palavras e história que arre-
piam até o m aior dos descrentes.

John Stuart Mill um dos mais influentes economistas britânicos do sé-


culo 19, admitiu apesar de seu ceticismo religioso que o próprio Jesus era
a m aior prova de sua existência. Afinal, se Cristo não existisse, nem nós
nem seus discípulos não teríam os condições de inventar alguém assim.
C.S. Lewis, ele mesmo um ex ateu, colocou isso de m aneira mais poética:
“seria preciso alguém m aior que Jesus para inventar Jesus. A causa sempre
será m aior que o efeito”.

Caso eu trabalhasse com qualquer hipótese m ínim a de Jesus ter sido


fruto de uma criação hum ana, então deveria adm itir que aquele que o criou
m ereceria mais que um prêm io Nobel em literatura, m ereceria um altar.
Afinal, Jesus é simplesmente, a resposta últim a para a inquietação hum
ana.
Por que, então, alguém da estirpe intelectual de Russell não o admite
como Senhor de sua vida? Não sei com certeza, mas uma coisa posso afir-
mar: aquele que conhece o evangelho e ainda assim rejeita sua mensagem,
tentará em vão preencher o vazio existencial da alma, ampliado por sua
descrença. No lugar de Cristo, Russell sugere que sejamos fascinados por
Pitágoras, um filósofo e m atemático que m uitos historiadores nem sabem
ao certo se existiu.

A filosofia pode existir sem Sócrates e poesia pode existir sem Carlos
D rum m ond de Andrade, mas o cristianism o não terá sentido se Jesus for
fictício. Ele é a razão de nossa fé e o m otivo de nossa esperança. Por isso
revelo m eu sentim ento de alegria e reverência ao apresentar ao público
essa enciclopédia história da vida de Jesus.

Ela não pretende substituir os evangelhos ou torna-los mais completos.


Entenda a obra a seguir como um sinal que aponta para algo m aior que ela
mesma. Ademais, as páginas que se seguem revelam m inha própria con-
fissão acadêmica diante do complexo m undo da teologia: quando adentrei
o seminário, disseram -me que Deus era infinito e eu não entendi nada.
Que ele era todo-poderoso e eu continuei sem entender. Que era eterno,
sem começo e sem fim. Diante disto m inha ignorância aum entava cada
vez mais. Por fim, contaram -m e que ele um dia “se fez carne e habitou no
meio de nós” (Jo 1:14). Ai comecei a ter um a ideia do que poderia ser Deus
e gostei daquilo que descobri.

A história de Jesus é a própria história de Deus, contada de um a forma


que intelectuais se espantam, perdidos criam esperança e crianças com pouco
esforço entendem. Sem dúvida alguma, a maior história de todos os tempos.
Sumário

09 Jesus mito ou realidade

16 Buscando o Jesus histórico


Jesus Existiu?

28 Aspectos físicos da Terra de Jesus

45 Populações da Terra Santa


Família e sociedade

76 Quatro evangelhos - uma


história Jesus Humano

O Messias do Mar Morto

118 Preparação para o Messias

138 Quando Nasceu Jesus?


154 Ministério de Jesus

187 Milagres de Jesus

220 Julgamento e crucifixão de Cristo

265? Conciso dicionário sobre a vida de Jesus


Apêndice Cristológico
Jesus: mito ou realidade? Uma pesquisa feita no shopping Brent Cross, em
Londres, na Inglaterra, e divulgada pelo jornal “Daily
O teólogo René Latourrelle escreveu: “O proble- M irror”, m ostra que as crianças não se preocupam
ma da credibilidade cristã decorre da grandeza do com 0 Natal e não conhecem o significado da data.
cristianismo, principalm ente por causa da radicalida- M il jovens foram entrevistados e 20% deles acharam
de das suas exigências”1. De fato, Jesus de Nazaré foi que Jesus Cristo era um jogador do Chelsea. Mais da
o único hom em que em sã consciência disse ser Deus metade acredita que o dia 25 de dezem bro seja a data
e convidou outros a aceitarem isso. Hoje bilhões de de aniversário do Papai Noel, razão pela qual ganham
pessoas em todo o m undo norteiam sua filosofia de presentes dos familiares.
vida baseadas nos ensinos desse hom em que viveu há
O questionário foi feito com a pergunta “Quem é
mais de dois mil anos. Seria ele um louco? Um em-
Jesus Cristo?”. As opções de resposta eram: A) joga-
busteiro? Ou a figura real de Deus entre os homens?
dor do Chelsea, B) filho de Deus, C) apresentador de
TV, D) candidato de um show de calouros ou E) um
A fê no mundo astronauta. A prim eira opção foi eleita por um em
cada cinco entrevistados3.
Todas as pesquisas sobre filiação religiosa fei-
Este pode parecer um episódio isolado e de pou-
tas até o m om ento m ostram que a m aior parte do
ca im portância, mas não é. Chegaria a ser engraçado,
m undo ocidental se diz cristã. Na verdade, o cris-
se não fosse tragicômico. A perda de conhecim ento
tianism o segue sendo a m aior religião do m undo,
teórico e relacionai dos cristãos com o fundador do
em bora alguns estatísticos pensem que 0 núm ero de
cristianism o tem perturbado m uita gente.
m ulçum anos deve igualar ao de cristãos até 2050 e
superá-lo em 21002. Países fundam entais na história do cristianismo

Em bora países da Europa ocidental tenham se tor- que foram palco de im portantes acontecim entos ou
nado cada vez m enos religiosos, o núm ero de pessoas berço de relevantes m ovim entos estão se tornando
que creem em Jesus ainda é m ajoritário no Ocidente. cada vez m enos cristianizados.
E a tendência, segundo Jean-M arc Leger, presidente
da W IN /G allup International é aum entar.

A Escócia fo i, no in íc io do sé
cu lo XX, p io n e ira de um m o- v
" 0 estu d o revela que 0 to ta l de pessoas que se im e n to m is s io n á rio de alca n ce m
co n sid era m cre n te s é, na verdade, a lto . E com a u n d ia l. H oje, porém , 0 p e rce n - tu
cre sce n te te n d ê n c ia g lo b al de um a ju v e n tu d e a l de c ris tã o s caiu para pouco m ais
re lig io s a , podem os a ssu m ir que 0 núm ero de cre de 5 5 % e, a cada ano, d im i- nui em pelo
n te s co n tin u a rá aum en- ta n d o ", diz J e a n -M a m enos 1 % . Há m u ita in ce rte za e n tre
rc Leger, p re sid e n te da W IN /G a llu p In te rn a tio os m em bros da ig re ja . N as ig re ja s
n a l. p ro te s ta n te s (e va n g é lica s), 23%
dos e n tre v is - ta d o s d isse ra m não a
c re d ita r que J e su s fo i a lg u ém re a l,
e n q u a n to 14% dos m em bros da Ig
re ja Ca- tó lic a pensam 0 m esm o.

Contudo, algumas situações dem onstram que


existe um hiato entre o que a m aioria diz crer e o que
eles, de fato, conhecem sobre essa crença.
História da fé
A com preensão mais com um ente aceita entre cris-
tãos acerca de Jesus é que este seria 0 filho de Deus
em form a hum ana e teria um a natureza divina. Assim
declara o antigo credo apostólico, cujas origens são
desde o final do I ou II século d.C.;

"Creio em Jesus Cristo, seu único Filho,


nosso Senhor, 0 qual foi concebido por obra
do Espírito Santo; nasceu da virgem
Maria; padeceu sob 0 poder de Pôncio
Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado;
ressurgiu dos mortos ao terceiro dia; subiu
ao Céu; está sentado à direita de Deus Pai
Todo-po- deroso, donde há de vir para
julgar os vivos e os mortos. "

Este, contudo, é um dado da fé cujo alcance histó-


rico só se dá em nível testem unhai. Ou seja, ele não
prova que Jesus era o Filho de Deus, mas apenas tes-
tem unha a antiguidade desta crença entre os cristãos.
A informação, contudo, não deixa de ser valiosa.

Jesus era um ser extraordinário de natureza única.


Seu corpo possuía, de um m odo inexplicável, toda a
plenitude da divindade (Col. 2:9). Sua natureza eter-
nam ente divina tornou-se historicam ente hum ana, Sistematszações filosóficas
sem que um a anulasse a existência da outra. Jesus
Cristo é o único ser em todo universo que possui duas Pesa-se, porém , a crítica de que no percurso da
naturezas, divina e hum ana. história alguns concílios a tenham enfeitado demais
com um complicado jogo de conceitos filosóficos que
Essa declaração confessional tem base bíblica
nem sempre ajudaram a esclarecer o sentido mais
(I Cor. 15:3-8 ss), em bora tenha sido form ulada aos
profundo de seu conteúdo.
poucos, à m edida que se com preendia m elhor os en-
sinos do Novo Testam ento. Grupos dissidentes, no Especialmente no período posterior a Niceia (325
entanto, tentaram , desde os tem pos apostólicos, ne- d.C.), os que duvidavam do dogma cristológico eram
gar essa declaração de fé, mas ela “sobreviveu” rela-
reputados por segmentos marginais, à semelhança do
tivam ente bem através dos séculos, sendo ecoada ofi-
arianism o ou, antes dele, dos vários grupos gnósticos
cialmente desde os credos de Niceia e Constantinopla
que produziram os evangelhos apócrifos nunca reco-
até à Reform a Protestante e o Ilum inismo europeu.
nhecidos pela Igreja. Todos os que negassem a
divin-
Hoje o cenário é diametralmente oposto. A Igreja
Medieval perdeu seu poder de indução. Não legisla
mais o conceito de verdades eternas. Apesar da efer-
vescência ainda existente em torno do nom e de Jesus,
é cada vez m aior o núm ero de pessoas dentro e fora das
religiões que questionam a veracidade histórica daque-
le hom em chamado Jesus de Nazaré ou, de modo mais
confessional, Jesus Cristo, o Filho de Deus.

Mudança de rumo
As mudanças de perspectiva sobre a figura de Jesus
começaram no século XVIII, quando os tem pos da
certeza confessional deram lugar a um a nova época
de questionam entos racionais à fé. Vários pensadores
começaram a duvidar das declarações tradicionais da
Teologia. Os critérios desta vez eram m odernam ente
mais racionalistas e baseavam sua argum entação na
m etodologia histórica até então jamais usada para
descobrir algo a respeito da fé. Sabia-se pelo credo
e pelos evangelhos que Jesus veio ao m undo de uma
forma sobre-hum ana, que pregou o am or e realizou
milagres. Depois foi m orto na cruz, ressuscitou ao
terceiro dia e subiu aos céus, deixando a certeza de
que vai voltar, trazendo consigo o juízo final sobre
os homens.

M osaico Bizantino do Cristo Pantocrator. "H ouve te m p o em que os des- crentes,


sem am or a Deus e sem re lig iã o , eram
raros. Tão raros que eles m esm os se
espantavam com sua descrença e a
escondiam , como se ela fosse uma peste
dade de Jesus eram, à uma, relegados à condição de
co n ta g io - sa... M as algum a coisa
hereges,. seguidores de seitas e inimigos de Deus.
ocorreu, 0 céu, m orada de Deus e seus
Se um intelectual da Idade Média mostrasse de- anjos, ficou de repente vazio. V irgens
sejo de encontrar m aiores indícios da historiddade não m ais apareceram em grutas. A ciên-
cia e a te cn o lo g ia avançaram triu n - fa
e divindade de jesus, os teólogos im ediatam ente o
lm e n te , co n stru in d o um m undo em
confrontariam com o princípio agostiniano do fides
que Deus não era m ais necessá- rio " 5.
credere, isto é, “fé é crer”, sem questionar, sem buscar
Ruben A lves
maiores evidências, senão aquelas já oferecidas pela
autoridade eclesiástica. No contexto original d?, ex- I

pressão, Agostinho escreveu que “fé é crer no que não


A história de Jesus não agradava mais aos ouvi‫־׳‬
se vè, pois a recom pensa dessa fé será ver aquilo no
dos do pensador ilum inista, sua realidade histórica
que se acredita” {Est autem fides credere quod nondum
vides; cuiusfidei metres est videre quod credis)4.
deveria ser reestudada à luz dos novos critérios do
racionalism o.

O contexto político e social que resultou nessa


nova m aneira de encarar a Jesus é m uito mais
amplo e precisa ser apresentado. A m udança de
perspectiva em relação à doutrina de Cristo veio se
desenrolando aos poucos e se fez notar principalm ente
durante os séculos que separam a Reform a Protestante
e a Revo- lução Francesa. Neste hiato de 1517 a 1789
acentuou-
-se um processo de desescatologização da mensagem
cristã que já tivera início no século IV d.C., quando
o im perador Constantino pretensam ente declarou-se
convertido ao cristianismo.

Δα.
‫ ב‬..™λ
O
c.
Você Sabia?
A palavra “desescatologização”vem
dees-
chathon, um adjetivo gregopara se referir às
realidades últimas. Assim os teólogosfalam de
escatologia individualpara sereferir aoque
acontecea cada um depois de sua morte
eescatolo- giageral ou coletivapara se referir
àquele evento últimopara onde apontam todos
osacontecimen- tos da história: a segunda O que antes era chamado de "pax romana” passou a
vinda de Cristo, seguida do Juízofinal. ser agora a “pax ecclesiae” (paz da Igreja), a qual se apre-
Desescatologização, portanto, éa perda de sentou para o mundo como um sistema único de legi-
interesse na esperança cristã da segunda vinda timação do poder eclesiástico dentro e fora da Europa.
de Cristo.

‫־‬Grrfc do do poder, quando se tornou, no século VI d.C., a


autoridade máxima de toda a cristandade e de todo
continente europeu.
ü m novo cristianismo
Como se deu a desescatologização do cristianismo?
E preciso esclarecer que esse processo não significou
um a perda total da dimensão escatológica da Igreja,
mas um a diminuição do clima de im inente expectati-
va ou até mesmo anseio pelo final dos tempos. E que
com a chamada “conversão de C onstantino” a Igre-
ja de Roma ganhou um espaço que antes não tinha.
Depois acentuou ainda mais sua instalação no m un-
"A Igreja dos m á rtire s recebe fé ria s de
m a rtírio . A am eaça perm a- nente de te r de te s
te m u n h a r com a vida a própria fé a cada m
om ento
e por isso a necessidade de uma { I
v ig ilâ n c ia esca to ló g ica de to ta l de- sapego
a fa sta -se com a pax cons- ta n tin ia n a . A
Igreja tro ca as cata- cum bas pelos palácios.
Com isso, a p roxim idade im in e n te da Parusia
[i.e. a V olta de C risto] já não se faz nenhum
desejo ardente. A ta re fa é a construção da
Cidade de Deus na te rra ." João B a tista
Libânio6
As expectativas, portanto, deixaram de se estender
para o futuro final. Não se vislum brava m uita coisa
depois do “daqui a pouco ’. A história era uma coleção
de eventos passados e presentes sem, nenhum a rela-
ção com o porvir predito por Deus.

Então veio a Revolução Francesa e com ela a cria-


ção do conceito de progresso que, em bora descorti-
nasse um horizonte mais além, m isturava predições
de anseio messiânico com prognósticos racionalistas
e realidades previsíveis. A esperança na razão e não
mais nas promessas divinas conduzia agora os novos
rum os da hum anidade.

O
j

Fato importante
A Revolução Francesa que se instaurou na
Europafoi fruto do discurso de intelectuais
contrários à religião, que motivaram 0povo a
expurgar por completo a imagem traumati-
zante de Deus quepor séculos lhesfo i imposta.
A modernidade rejeitou as caricaturas de
Deus juntamente com as verdades bíblicas
Cristo e o tem po acerca de sua pessoa. Terminaram negando
importantes conceitos reveladospor Deus,
A acomodação gradual da Igreja, somada às dispu- inclusive sua própria existência e sua
tas teológicas com a Reform a Protestante a partir do revelaçãopor intermédio de Jesus Cristo.
século XVI, fizeram com que o interesse pelo Juízo ‫ר‬
Final e pelos dogmas de fé perdesse sua importância. O
A própria Reform a Protestante começou a dar mais ‫־ס־ם־‬
prioridade a assuntos sociais e políticos (especial-
m ente na Suíça e Alemanha) que aos temas bíblicos
relacionados ao fim do mundo. A sociedade começou a respirar um a nova moda-
lidade de interpretação da história que ecoava aque-
O futuro passou'a ser apenas um campo de pro-
les ideais escatológicos perdidos pela Igreja, porém
babilidades, e o presente, um espaço para o controle
sem a base bíblica que os sustentava. O horizonte era
do Estado absolutista. O passado era a tradição, isto
prom issor, mas não havia nenhum Deus lá na frente.
é, uma form a histórica de legitim ar o poder de quem
As pessoas passaram a ter um a percepção otim ista da
atuava no presente, a saber, o clero e a m onarquia
realidade, destituída da noção de providência divina.
com seus senhores feudais. Os eventos não eram mais Foi-se a terrível Idade M édia e o futuro não seria ape-
articulados à providência divina, mas a um emara- nas novo, seria melhor.
nhado de possibilidades atreladas exclusivamente à
ação política dos hom ens. Cristo não era mais o se- E quanto ao passado? Bem, esse agora não era visto
mais como argum entos para legitimação de um con-
nhor da História.
ceito. A tradição estava sob suspeita, ninguém queria
voltar à Idade das Trevas. O futuro era prom issor e Então um novo conceito surgiu: o term o Historie
o passado sombrio. O que se foi tinha de ser analisa- voltou a ser usado para designar o fato literal, ocorri-
do com cuidado, não só para desmascarar as m enti- do. Geschichte seria a interpretação posterior, rom an-
ras que foram contadas, mas tam bém para im pedir o ceada, que, em bora não precise ser necessariamente
retorno daquilo que consideravam lendas. A história um "engodo”, estaria longe de um a descrição exata do
tradicional de Jesus era alistada entre os antigos mitos que realm ente ocorreu. E um m ito, um exagero que
a serem evitados. nada tem a ver com a realidade dos fatos.

Novo conceito de história


Os pensadores, sobretudo alemães, sugeriram en-
tão um novo conceito de história que rom peu com a
fórm ula “historia m agistra vitae” (a história é a mes-
tra da vida), cunhada por Cícero e apropriada por his-
toriadores ligados à tradição da Igreja. E que até me-
ados do século XVIII, os alemães usavam o vocábulo
estrangeiro Historie, assim sempre no plural, para se
referir à narrativa, ao relato de um evento. Então re-
solveram substituir o term o por outro mais germ âni-
co que seria Geschichte, um a designação do fato em si
e não do relato que se fazia sobre ele. Como é p ra tica m e n te im possível tra -
duzir em português a d is tin ç ã o precisa entre
Com o passar do tem po, Geschichte sofreu semân-
Historie e Geschichte, um exem - pio ta lve z
tica e passou a juntar o sentido de fato, acontecim en-
fa c ilite a com preensão dos dois term o s: Você
to, com o de relato, narrativa. Assim a palavra ficou
c e rta m e n te já viu os clássicos quadros com
m uito filosófica e foi quase impossível elaborar um
a im agem de T iradentes, 0 M á rtir, pin ta d o s
conceito único e inequívoco a partir das m uitas afir-
por ilu stre s a rtis ta s com o Pedro A m érico,
mações que se faziam dela.
Eduardo de Sá, C ândido P ortinari e outros.
Por detrás dessa ebulição intelectual na Alemanha Com uma ou duas exceções, todos m ostram 0
estavam a ideologia francesa e sua poderosa Revo- herói in c o n fide n te de cabelos e barbas
lução no decênio de 1789-1799. A emancipação dos longas ve stin d o um roupão branco à sem elhança
poderes m onárquicos e religiosos, a queda da Basti- de Jesus Cristo.
lha, a prisão do papa Pio VI, a decapitação de nobres,
clérigos e da própria família real em Paris form aram
um ineditism o dos novos tem pos que tom ou toda a Pois bem, de acordo com alguns especialistas, essa
Europa de surpresa. Até o continente americano foi é uma imagem inventada que chega a agredir a his-
atingido. Afinal o que foi a independência dos Esta- tória real e a lógica dos fatos. Tiradentes era m ilitar
dos Unidos e tam bém do Brasil senão o fruto de ide- e, como tal, não teria barba nem cabelo longos. Ade-
ologias francesas? mais, de acordo com os autos da época, ele teve barba
e cabelos raspados no dia do seu enforcam ento, não
Todos esses acontecim entos tam bém cunharam
usou nenhum a túnica branca e m uito provavelm ente
o modo dos alemães interpretarem a história. Nada
não foi traído por um de seus seguidores. Todos esses
podia se com parar aos eventos extraordinários que se
elementos foram criados propositadam ente para as-
seguiram a 1789. O ser hum ano finalm ente se firm ou
semelhar Tiradentes a Cristo e fazer com que os que
como o agente dos acontecim entos, o único com ca-
ouvissem sua história ou vissem sua imagem sentis-
pacidade de avaliar e modificar o curso da história.
sem profunda simpatia por ele. Afinal o Brasil era um
Nem mesmo Lutero conseguiu tam anha proeza.
país de m aioria cristã e a República precisava de um On f Τ JCÜ,
herói para despertar a simpatia do povo.
O Ο
c J
Em bora a história registre a insurreição liderada
por um dentista m ilitar chamado Joaquim José da
J Você sabia?
Silva Xavier, aquele Tiradentes das pinturas a óleo Anacronismo é um erro de cronologia que
jamais existiu! O prim eiro seria um personagem his- consiste em atribuir a uma época ou a uma
tórico (.Historiche) que realm ente existiu. Já o segun- personagem idéias esentimentos que
do (das pinturas), um ser mitológico (Geschíchtlich) ou sãopró- prios de outra época, ou em
representar, nas obras de arte, costumes
,‘h istoriai”, conform e um neologism o inglês sugeri- eobjetos de uma época a que não
do por Heidegger. pertencem. Isso aconteceu muito com as
imagens de Jesus construídas ao longo dos
Note que não se trata de história e estória, pois o fato
séculos. Muitos 0 modelaram de acordo com
realmente aconteceu. O embate é entre história real ver-
seu próprio código de valores, criando uma
sus história romanceada. Tudo para tornar o relato mais
bifurcação entre 0 Jesus que realmente
belo e atrativo, convencendo pessoas a se apaixonarem existiu e outro que a cultura projetou.
por ele ou pela ideologia que ele representa. c
O

JQJ
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Fato importante »í/kSáá*S*&


Existem muitos exemplos de tentativas de
fã ^ P ° È 0 h 0ixlerr ‫ד‬ ^ m T n fc
acon- dicionar Jesus aos interesses ou a
ideologias de um grupo ou indivíduo.
Jefferson, <j«eantes de tudo era descrente,
tornou-se 0primeiro erudito estadunidense
que, em um processo de corte e colagem de
textos bíblicos, deu origem ao que chamam de gue& euiujv, y^ju ò u iica n*1 ΖίπκΓΚΓΤΠΡ!
Jesus Americano. GMáo■epormeio | ‫ ^״‬£
Malcom X, 0líder na luta pelos direitos civis üi f*k
IffKSS?. ’ ^h á m a m o
declarou; “Jesus Cristo era negro!”E Swami
Vivekananda, quefundou várias sociedades
hindus na América, afirmou que Jesus
*
,jet toom^ , a/ «ntes>eisa tíaé b?eflie^
Cristo p7qu e™não* μ

era um Yogui (ou Yogi), isto é, um mestre C Ρ


soΜm
praticante da ioga.
e ‫ר‬
20l mas(jus fan
C O
LTTTTj ■‫ם־תזזד‬

^ 3 E scá tu rz? C r e
m i h x f n í : ‘ ^ [Á PJ® £0- ‫·״‬ ‫־׳‬:
. ;

Desde 0 século XVII, vários teólogos com Y)m7JP Λ Ip Í n n a w « ,·*‫״‬.


eçaram a tra b a lh a r com esta nova percepção
de H istória, mas quem fin a l- m ente a
sugeriu com o m étodo para se 'WÈMf·w»v*
pesquisar a vida de Jesus fo i M a rtin
pJtefaoto ^pela fé, para
d
Kãhler, em sua obra Der sogenann- a graça, a ím de
συ!
te historische Jesus und der % m Ê f * âsm
geschi-
chtliche, biblische Christus, publicada
^- 31z b e m ^ V ; àqueédalei
m>
em 1892 - 0 títu lo é quase m aior que 1[quem ^®àqueédãfédp
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0 próprio livro de apenas 50 páginas!
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Para os escritores liberais da Alemanha, haveria um tória de Jesus. Seu nom e era Herm an Samuel Reima-
Jesus histórico (que realmente existiu) e um Cristo da rus (1694-1768), um professor de línguas Orientais
fé (criado e mantido pela Igreja ao longo dos anos). Se- na cidade de Hamburgo. Influenciado pelo deísmo in-
parar ambos era a tarefa principal de sua teologia. glês, ele não acreditava que Deus estivesse intervindo
nos negócios deste m undo. Sendo assim, a pregação
Porém, antes de eclodir a Revolução Francesa ou evangélica tradicional de um Deus encarnado, que
de Kãhler publicar suas ideias acerca de um Jesus his- entrou na história dos hom ens e possibilitou a salva-
tórico e outro historiai, houve pelo menos um autor ção da hum anidade m ediante sua própria m orte na
que preconizou os ventos da dúvida ao tratar da his- cruz, não fazia o m enor sentido.
‫ □־‬s a q u e m
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ciada,* putado como justiça,
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^und- críto, que lhe fosse wp.
to: conta
‫־‬ás pi-124 Mas também pem ser. Reimarus afirm ou que qualquer investigação
por remos crítica sobre a vida de Jesus Cristo “deve m anter
na
:?aão, tomado em conta; itouajesu
I quelequedos
s pecados foi a distinção clara entre o que Jesus realm ente fez e

eu ensinou em sua vida e aquilo que foi narrado pelos


ãcação,m m apóstolos em seus escritos.” De acordo com sua teo-
* ?touP3^ nos a
just'
i sao ‫ן‬ ‫־· ־‬- ■‫׳‬ ria, Jesus foi apenas um judeu como outro qualquer,
~
:es a | Justificação peta
fê e paz com
Deus Reimarus projetou uma enciclopédia de
4.000 páginas na qual pretendia reconstruir de m
TJe C SENDO pois justificados pela odo científico uma nova versão para a história da
fê religião cristã. E ntretanto, fo i ape- nas após a sua
m orte que a parte dedicada à vida de Jesus fo i
publicada anonim am en- te por um e d ito r cham
ί ***......................... ........................ ---------------------m m m , * ado G. Efraim Lessing. 0 títu lo proposital foi "-
Fragmentos de um es- critor anônimo-"
(Wolfenbütteler Fragmente [1774-1778]), que m unido de um espírito agitador e político. M otiva-
em pouco tem po recebeu 0 apelido de do por um messianismo nacionalista, ele teria em-
Fragmentenstreit ou "fragm en- tos de preendido uma frustrada revolta contra o im pério
controvérsia". 0 te xto não teve m uitos seguidores a rom ano, mas acabou abandonado por seus segui-
princípio, mas causou grande im pacto com 0 dores e condenado à m orte na cruz. Os discípulos,
passar do tem po. então, para não adm itir o fracasso do m ovim ento,
roubaram seu corpo e inventaram a história da res-
surreição e da redenção universal da hum anidade
como form a de m anter aceso o ideal messiânico que
ele havia pregado.

Depois de Reimarus, vários outros teólogos sur-


giram apresentando suas próprias versões sobre o
que seria de fato o Jesus histórico e o que seria o
Cristo da fé, criado pela teologia e m antido pela tra-
dição da igreja.

Teologia liberal
Teólogos liberais criaram um Jesus ético ou ideal;
teólogos racionalistas, um Jesus revolucionário.
Cada grupo pintava o retrato do Messias com as co-
res de sua própria cosmovisão filosófica. No final de
tudo, o que sobrara não foi um quadro de como era
Jesus, mas como cada um queria que ele fosse.
Heinrich Eberhard Gottlob Paulus (1761- 1851), Ferdinand C hristian Baur (1792-1860) foi outro
racionalista alemão e influenciador de Hegel. Procurava discípulo de Hegel que se inspirou no esquema d ia lé
encontrar uma razão natural para todos os supostos
tico para fa la r do m ovim ento de Jesus em term os de
milagres realizados por Cristo. A transfiguração, por
tese, antíte se e síntese. A tese seria os cristãos
exemplo, deu-se porque, depois de Jesus e seus
judaizantes, seguidores de Pedro, que queriam
apóstolos dor- mirem uma noite inteira ao relento,
obrigar os não judeus a cum prirem as leis cerim
Pedro, ain- da sonolento, viu 0 M estre, que havia
oniais do A n tig o Tes- tam ento. A antíte se seria os
acordado antes, de pé diante do sol nascente
cristãos liberais, seguidores de Paulo, que queriam
conversan- do com dois discípulos secretos que já
desobrigar os não judeus da prática cerim onial. A
estavam de partida. Então equivocadamente
síntese seria a Igreja que por m eio dos evangelhos (to-
entendeu os raios do sol como sendo a glória de Cristo
dos posteriores ao séculoll) te n ta ria uma conci-
e os dois seguidores como sendo M oisés e Elias.
ação entre as duas vertentes cristãs.

Rudolf Bultmann (1884-1976) - um dos teólogos mais


David Friedrich Strauss (1808 - 1874), te ó
influentes do século 20, professor de Novo Testamento na
lo g o e exegeta form ado em Tübingen, que se
Universidade de M arburg, na Alem anha. Influenciado pelo
tornou m u ito conhecido após publicar, em 1835, uma
filosofia de Heidegger, Bultmann concluiu que a hu- m anidade
co ntrovertida versão sobre a Vida de Jesus.
contem porânea, acostumada com os avanços da ciência, não
Inspirado na filo so fia de He- gel, ele afirm ava
poderia mais aceitar 0 conceito m itológi- co do mundo expresso
que os m ilagres de Jesus e outros eventos de
nos escritos bíblicos. Logo, tudo aquilo na vida de Cristo que não
sua vida eram apenas m itos inventados pelos
fosse alcançado pela razão humana deveria ser tom ado como m
apóstolos e evange- lista s com fins te o ló g ico s e
ito e interpre- tado de form a alegórica. A ressurreição, por
não históricos. 0 detalhe dos ladrões crucificados
exemplo, seria apenas uma form a com parativa de entender 0 res-
com Jesus era apenas um e n fe ite m ito ló g ico para
surgimento da mensagem de Cristo no coração dos discí- pulos,
fazer eco à poesia de Isa. 53:12: "Ele fo i contado
mesmo depois da m orte de seu M estre e não uma ressurreição literal
entre os pecadores".
como anunciava 0 credo cristão.
Fato importante
Apesar de arriscar certas afirmativas sobre
como teria nascido 0 mito da ressurreição de
Cristo, Bultmann não acreditava serposável
alcançar 0Jesus histórico. Em outras palavras,
0Jesus que realmente existiu não pode ser
conhecido dopesquisador atual, por causa da
distância temporal entre ambos. Assim ele
troca 0Jesus histórico pela proclamação de
Cristo (Querigma) eneste busca
sefundamentar.
Um missionário descrente
Albert Schweitzer (1875-1965) destacou-se por
produzir um resumo crítico de todas as principais teo-
rias sobre o Jesus histórico levantadas desde Reimarus
até W rede. Originalmente publicado em 1906, seu li-
vro teve como título De Reimarus a Wrede, uma Histó-
ria da Investigação sobre a Vida de Jesus (von Reimarus zu
Wrede: Geschichte derLeben Jesu-Forschung).

Em 1913, surgiu um a segunda edição ampliada,


e Schweitzer, que ainda era jovem, foi aclamado no
m undo teológico europeu. Suas ideias ficaram mais
populares depois que o livro ganhou um a edição in-
glesa quando foi traduzido por W . M ontgom ery e
publicado em Londres, em 1910.

Schweitzer dizia que Jesus era apenas um religioso


equivocado que com partilhava as ideias escatológicas
do judaísmo de seu tem po. Ele acreditou errônea-
m ente que era o Messias e com base nesta ilusão pre-
gou a chegada im inente do reino.

Como este não veio, Jesus decidiu virar um m ártir


de sua própria causa, pois pensava que assim pode-
ria ter um a intervenção divina em seu favor. Então
provocou a ira dos rom anos e foi pendurado na cruz.
Mais um a vez frustrado, ele questiona: “Deus meu,
Deus meu, por que me desamparaste?”
Além de teologia, Schweitzer era form ado em
m edicina e tocava órgão como ninguém . Chegou a
abandonar a confortável vida em Estrasburgo para
dedicar-se a obras de assistência social como médi-
co m issionário na África. C onstruiu um hospital para
" 0 Jesus de Nazaré que se apre- sentou em carentes e foi agraciado em 1952 com o prêm io Nobel
p ú b lico com o M e ssia s, que pregou a é tica da paz devido às suas atividades hum anitárias.
do reino de Deus, que fun d o u 0 reino do céu
na te rra e m orreu para c o n fe rir uma E claro que é difícil saber se todos os episódios ci-
consagração final à sua obra, ja m a is e tados sobre ele são reais ou lendários. Contudo, é fato
xistiu . Essa im agem fo i traçada pelo ra cio n que esse pensador deixou um a profunda marca no co-
a lism o , re vivifi- cada pelo lib e ra lis m o e ração do povo africano.
revestida pela te o lo g ia m oderna com
Mas, 11o que diz respeito ao sentim ento religio-
roupagens h istó - ric a s ." 7 Schweitzer
so, mesmo sendo um a figura eclética e cosmopolita,
Schweitzer não conseguiu rom per com as estruturas
m entais da cultura franco-germ ânica e sua tendência
para o secularismo.
Oo

Fato importante
Apesar de não acreditar na historicidade de
Cristo, Schweitzer dizia admirar estafigura
lendária chamada Jesus e procuravafazer
dela seupróprio modelo de vida. Jesus, para
ele, foi um homem virtuoso por não desistir de
sua cren- ça mesmo emface da morte eda não
realização de seus planos. Além disso, fo i
coerente com 0 quefalou, não negando sua
mensagem diante dos líderes que
estavampara condená-lo.

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d 0
r f f y 77ri- ^ — ---------- .............. .............. ......‫־‬ ‫^ ־‬f 1.‫ ס‬n 1 ‫״‬

Conta-se que um missionário que ele religião era apenas um movimento e'tico-social
visitou certa vez a ex-colônia francesa do para preservação da vida, nada mais.
Gabão se surpreendeu ao ouvir de um
nativo um curioso depoimento sobre 0 Dr.
Schweitzer. 0 missionário estava tentando f
evangeiizaro homem falando-lhe de como
Jesus era bon- doso com os enfermos e
como tratava bem as pessoas. 0 nativo
então lhe interrompeu: "Eu conheço esse
homem, mas, pelo que eu saiba, 0 nome
dele é Dr. Albert Schweitzer!"

* £L

P
‫ג‬

Você
sabia?
Embora movesse de íntima compaixão pelos
nativos da Africa, Albert Schweitzer considera-
να-os “infantis"por manterem suafe' religiosa
mesmo emface aos piores sofrimentos. Para
Jesus Seminar (Seminário
sobre Jesus) - Fundado em 1985 por R
obert Funk e John D om inique Crossan,
esse in s titu to reúne te ó lo g o s de vá rio s
paí- ses com 0 in tu ito de e stu d a r a vida
e os e n sinam entos de C risto. Sendo a
versão contem porânea m ais atual dos
crítico s alem ães do passado, seus filia d o s
pro- põem uma busca pelo Jesus h istó rico
desvinculada dos e le m e n to s con fe ssio
- nais m ais conservadores.

As conclusões do Jesus Sem inar diferem m uito


do que a quase totalidade das denominações cristãs
acre- dita. Seus m em bros não creem na inspiração
bíblica, na historicidade dos milagres de Cristo e na
sua m or- te expiatória enquanto filho de Deus. Em
bora creiam que os evangelhos contêm verdades
históricas, ape- nas 15 frases citadas de Jesus são
reputadas como pro- vavelm ente verdadeiras. As
demais seriam reconstru- ções teológicas que nada
têm de veracidade histórica.
Jesus existiu? Em term os de conquista, ninguém avançou mais
com seu exército do que Alexandre M agno. No en-
tanto, embora se acredite que m uita coisa tenha sito
Teria Jesus de Nazaré, a quem chamaram de Cris-
escrita a seu respeito, nada sobreviveu que fosse con-
to, existido como um ser hum ano real? O hom em
tem porâneo a ele. A biografia mais antiga que tem os
“Jesus Cristo”, conform e o texto de I Tim óteo 2:5 fez
a seu respeito vem de D iodoro Sículo e foi produzida
parte da história hum ana ou é um personagem fictí-
por volta de 250 anos após a sua m orte.
cio, equiparado a Peter Fan?
O ra se em se tratando de governantes e conquista-
dores há pouquíssimas informações contem porâneas,
Bruno Bauer (1809-1882) fo não se esperaria que com Jesus fosse diferente. Longe
i 0 p rim e iro acadêm ico a du- v id a de um palácio, exércitos e avanços militares, Jesus vi-
r da e xistê n cia h istó rica de Jesus. via cercado de pessoas simples e nunca andou sequer
Sua posição, no entan- to, não a n 10% do trajeto que esses hom ens percorreram . As in-
gariou m u ito s segui- dores nem na formações, portanto, que se têm a seu respeito, apesar
ala m ais liberal da te o lo g ia de poucas, são im portantes, não devendo nada para
europeia. Hoje, até m esm o auto re informações sobre outros vultos da história. O pássa-
s a teus com o B art D. Ehrman do é um objeto que se estuda a partir de fragmentqs!
defendem que, de fa to , e xistiu na h
Ademais, é notório, até onde se pode saber, que
is tó ria um hom em cham ado Jesus
nenhum autor não cristão da Antiguidade (mesmo
de Na- zaré. M a s onde estão as pro-
em seu mais acirrado ataque ao cristianismo) negou a
vas de sua existência?
existência histórica de Jesus de Nazaré. Isso demons-
tra que eles sabiam por diversas fontes que ele real-
m ente existiu, mesmo que não aceitassem ser ele o
Filho de Deus.
Fontes históricas
As fontes históricas extrabíblicas sobre Jesus po-
Embora os documentos cristãos que mencionem dem ser divididas em dois tipos: clássicas (para as fon-
Jesus possuam seu valor histórico, quando a questão é tes greco-rom anas) ou judaicas (Josefo, Talmude). As
verificar se ele existiu, essas fontes parecem não valer fontes cristãs serão discutidas em outra seção.
para m uitos investigadores, porque parece um argu-
m ento em círculos. Ou seja, pessoas piedosas afirman-
do aquilo que elas mesmas acreditam. Assim, quando
Fontes clássicas
alguns pedem provas documentais de que Jesus existiu,
As fontes clássicas mais antigas referindo-se a Je-
geralmente estão se referindo a fontes fora do Novo
sus e aos cristãos datam do final do I século e começo
Testam ento ou dos prim eiros autores eclesiásticos.
do II. Naquele tem po, o seguim ento cristão era consi-
Essas fontes existem? Sim, mas em quantidade derado nos meios rom anos como simples superstiçd,o.
limitada. Não obstante, tal escassez de docum entos
M ara Bar-Serapião era um filósofo estoico da pro-
contem porâneos sobre um personagem histórico não
víncia rom ana da Síria que se tornou am plam ente
é algo incom um. Veja o caso de Pôncio Pilatos. Qual
conhecido em função de uma carta que teria escrito
a evidência arqueológica de sua existência? Apenas
a seu filho, tam bém chamado Serapião, por volta do
um a placa de pedra encontrada em Cesareia M aríti-
ano 73 d.C. M uitos a consideram a mais antiga refe-
m a e dois tipos de moedas cunhadas por seu governo
rência não judaica e não cristã a Jesus Cristo.8
(e nenhum a delas traz seu próprio nom e). Nada além
disso. E note que se trata de um governador rom ano * ‫“ ־‬Que proveito os atenienses obtiveram em■
sobre a Judeia! condenar Sócrates à morte? Fome e peste lhe sobrevieram
como cas- tigo pelo crime que cometeram. Qu.e vantagem
os habitan
tes de Samos obtiveram ao pôr fogo em Pitágoras? Logo só a sua obstinação e teimosia inflexíveis já me são moti- vo
depois sua terra ficou coberta de areia. Que vantagem os de pena capital.
judeus obtiveram com a execução do seu sábio rei? Foi
logo após esse acontecimento que 0 reino dos judeus fo i
aniquilado. Com justiça Deus vingou a morte desses três
sábios: os atenienses morreram de fome; os habitantes
de Samos foram surpreendidos pelo mar; os judeus ar-
ruinados e expulsos de sua terra, vivem completamente
dispersos. Mas Sócrates não está morto, ele sobrevive nos
ensinos de Platão. Pitágoras não está morto; ele sobrevive
na estátua de Hera, Nem 0 sábio rei está morto; ele sobre-
vive nos ensinos que deixou".

*Plínio, o Jovem (61-112A.D.): Procedente de fa-


mília abastada e amigo particular de Trajano, Plínio foi
encarregado pessoalmente pelo im perador para reor-
ganizar a província da Bitínia que se encontrava meio
desordenada. Assim, em 111 - 112 o jovem “legado
rom ano”(título que recebera do império) encontrou-
-se pela prim eira vez com os cristãos e, para ter cer-
teza do agrado do im perador quanto a tudo que fazia,
m andou-lhe um a carta solicitando instruções sobre
como lidar com aquela “seita”. Eis o trecho em que
m enciona o fato:

“Senhor, é norma para mim submetera ti todos ospon-


tos sobre os quais tenho dúvidas; quem melhor do que 0
senhor poderia orientar-me quando hesito ou instruir-me
quando ignoro?

Nunca participei de processos contra os cristãos; não


sei, por isso, a quais fatos e em que medida se aplicam or-
dinariamente a pena ou as execuções. Eu me pergunto, não
sem perplexidade, se há diferenças a serem observadas no
que diz respeito à idade, ou se até 0 neném está no mesmo
nível de um adulto; se se deve perdoar a quem se arrepende
ou se quem é cristão não ganha nada quando se retrata;
se é necessário punir 0 simples fato de se denominarem
cristãos, mesmo que não houver crimes, ou se devo punir
apenas os crimes ligados com 0 nome.

Eis, portanto, a norma que eu mesmo tenho seguido


para com aqueles que me foram denunciados como cris-
tãos: aos que confirmavam, eu pergunto uma segunda e
uma terceira vez, ameaçando-os sempre com 0 suplício.
Aos que perseveram na confissão, eu mando executá-los,
mesmo sem saber detalhes sobre 0 que acreditam, porque
Há alguns outros que, embora dominados pela orientação, princi- palmente devido ao grande número dos
mesma loucura, eram cidadãos romanos. Quanto a estes acusados. Há uma multidão de pessoas de todas as idades,
eu apenas anotei a ocorrência e os enviei para Roma. de todas as classes e dos dois sexos que estão ou serão
Como acontece em casos semelhantes, estendendo-se a postos em perigo. Não so- mente nas cidades, mas também
acusação no proces- so do inque'rito, logo se nos vilarejos e nos campos
apresentam diferentes casos.

Foi afixado uma lista anônima, relacionando vários


nomes [denunciando pessoas que seguiam a seita].
Aos que negavam ser cristãos, quer no presente ou no
passa- do, se invocassem os deuses segundo as
palavras que eu ia ditando e se sacrificavam vinho e
incenso (?) diante da tua imagem que eu mandava
trazer e, alem de tudo isso, se blasfemavam 0 nome do
Cristo - coisas que, segundo se diz, nenhum cristão
legítimo faria - pensei que poderia deixá-los ir. Havia
[ainda] outros cujo nome também esta- va na
denúnciafeita pelo delator e que confessaram terem, de
fato, sido cristãos, mas que abandonaram [a seita], uns
há três anos, outros há mais tempo, até vinte anos; todos
estes adoraram a tua imagem e as imagens dos deuses e
blasfemaram 0 Cristo.

De resto, disseram-me que toda a falta deles, ou seu


erro, limitava-se a um costume de se reunirem num dia
fixo, antes do amanhecer, e então cantarem em seu
meio um hino a Cristo como se estefosse um Deus.
Também, de se comprometerem por juramento a não
cometer nenhum crime, nem roubo, nem pilhagem, nem
adultério, a cum- prirem com 0 prometido e a não
deixarem de dar um de- pósito reclamado em justiça.

Terminados estes ritos, tinham 0 costume de se


separa- rem e de se reunirem outra vez para a sua
refeição, que, a despeito daquilo que muitos dizem,
parece ser simples e inocente; mesmo porque, esta
prática fora por eles re- nunciada depois de meu edito -
baseado nas tuas próprias instruções -, segundo 0 qual
eu proibia as heterias.

Julguei tanto mais necessário extrair a verdade de


duas escravas, que eram chamadas diaconisas, mesmo
subme- tendo-as à tortura. Tudo 0 que encontrei fo i uma
supersti- ção insensata e exagerada.

Devido a tudo isso, resolvi interromper 0


procedimen- to [contra os cristãos] e solicitar teu parecer.
Julguei que a questão mereceria que eu ouvisse sua
espalhou-se 0 contágio desta superstição. Contudo, acredito
ser possível detê-la e curá-la.’ (Carta X, 96)

A resposta de Trajano a Plínio tam bém está pre-


servada:

“Meu caro Plínio, tu seguiste a conduta que devias


ter seguido no exame das causas daqueles que haviam sido
denunciados como cristãos. Afinal, não é posúvel instituir
uma regra geral que tenha, digamos, uma prescrição fix a
para todos. Não há motivos para persegui-los ‘ex-oficcio.
Seforem denunciados e a acusaçãofo r provada, que sejam
condenados, mas com a seguinte ressalva: que aquele que
negar ser cristão, e der provas disto pelos seus atos, quero
dizer, sacrificando aos nossos deuses, mesmo que ele seja
suspeito no que se refere ao passado, obterá 0 perdão como
prêmio de seu arrependimento. * Tácito: descrevendo por volta do ano 115 o in-
cêndio de Roma, ocorrido em 64 d.C., este historia-
Quanto às denúncias anônimas, não devem ser levadas dor fala da perseguição de Nero aos cristãos e m en-
em consideração em nenhum caso; este era 0 costume de ciona o nom e de Cristo que, para seu entendim ento,
um detestável procedimento que não deve mais ser seguido não era um título, mas um nom e próprio:
em nosso tempo.”(Carta X, 97).
“Nenhum esforço humano, nem 0 poder do imperador,
nem as cerimônias para aplacar a ira dos deuses faziam
cessar a opinião infame de que 0 incêndio [de Roma]
havia sido mandado. Por isso, com vistas a abafar 0 ru-
mor, Nero apresentou como culpados e condenou à tortu-
ra aquelas pessoas odiadas por sua própria torpeza, que a
populaça chamava de ‘cristãos’. Tal nome vem de Cristo,
que no principado de Tibério, 0 procurador Pôncio Pilatos
entregou ao suplício. Reprimida na ocasião, essa execrável
superstição fez-se irromper novamente, não só na Judeia,
berço daquele mal, mas tambe'm em Roma, para onde con-
verge e onde se espalha tudo 0 que há de horrendo e vergo-
nhoso no mundo. Começou-se, pois, por perseguir aqueles
que confessavam; depois, por denúncia deles, uma multi-
dão imensa, e elesforam reconhecidos culpados, menos do
crime de incêndio... À sua execução acrescentaram zomba-
rias, cobrindo-os com peles de animais para que morres-
sem devido à mordida de cães de caça, ou pregavam-lhes
em cruzes, para que, após ofim do dia, fossem usados como
tochas noturnas e assim consumidos”. (Anais, XV, 44).

* Suetônio (69? - 122?), outro historiador rom a-


no, apresenta por volta de 120 A.D., dois registros
históricos, um da vida de Cláudio, e outro da vida de
Busto de Nero, imperador de Roma e
opositor dos seguidores de Cristo. Nero, nos quais ele m enciona algo que pode ser uma
referência a Cristo. No prim eiro texto ele com
enta a
tes eram servidas nesses lugares comidas de todos os
tipos; os cristãos, espécie de gente dada a um a supers-
tição nova e perigosa, foram entregues ao suplício;
foram proibidas as perambulações dos condutores
de quadrigas9, autorizados por um costume antigo a
vagabundear pela cidade, enganando e roubando os
cidadãos para se divertirem ; foram proibidos os pan-
tom im os10 e suas atuações.” {A Vida de Nero, XVI).

* Luciano de Samosata (c. 115- c 181 d.C.) - era um


autor satírico greco-siríaco, mas de ancestralidade semi-
ta, que escreveu A Passagem do Peregrino, sobre um ex-
-cristão que mais tarde se tom ou um famoso filósofo cí-
nico e revolucionário, morrendo em 165 d.C.. Em duas
Primeiros cristãos da era pós-apostólica cultuando Cristo. seções do texto, há tuna menção satírica a Jesus, mesmo
que seu nome não seja mencionado diretamente:
expulsão dos judeus de Roma por volta do ano 49 (Cf.
“Foi então que ele [Proteus] conheceu a maravilhosa
Atos 18:2), durante o reinado de Cláudio e ali m en-
doutrina dos cristãos, associando-se a seus sacerdotes e es-
ciona uma estreita ligação entre os judeus e um certo
“Chrésto” que poderia ser um a grafia errada do nom e cribas na Palestina. (...) E 0 consideraram como protetor e 0
de Cristo. tiveram como legislador, logo abaixo do outro [legislador],
aquele que eles ainda adoram, 0 homem que fo i crucifica-
“Como os judeus se sublevavam continuamente por
do na Palestina por dar origem a este culto.(...) Os pobres
instigação de Chrésto; [Cláudio] os expulsou de Roma" (A
infelizes estão totalmente convencidos de que eles serão
Vida de Cláudio, XXV).
imortais e terão a vida eterna, desta forma eles desprezam
Falando de repressões rigorosas instituídas pelo a morte e voluntariamente se dão ao aprisionamento; a
governo de Nero, ele comenta: maior parte deles. Alem disso, seu primeiro legislador os
convenceu de que eram todos irmãos, uma que vez que eles
"... foi proibido vender nas tabernas qualquer ali-
haviam transgredido, negando os deuses gregos, e
m ento cozido, fora legumes e hortaliças, quando
an- adoram 0 sofista crucificado vivendo sob suas leis
’'(Passagem do

Peregrino, 11 - 13 . )

“Os cristãos, vocês sabem, adoram um hom em


neste dia - a distinta personagem que lhes apresentou
suas cerimônias e foi crucificado por esta razão.” (A
M orte do Peregrino, 11-13)

Fontes judaicas
* Flávio Josefo (37/8 - 100 A.D.?) - A partir do
século XVI, m uitos autores colocaram em dúvida a
autenticidade destes parágrafos que, se pertencentes
à obra, datariam do ano 93 /4 A.D. Alguns mais cépti-
cos tentam argum entar que estas partes seriam inter-
0 martírio cristão. polações feitas posteriorm ente por escribas cristãos
que viviam enclausurados em m osteiros
produzindo cópias de manuscritos.
Contudo, vários especialistas hoje advogam a au-

SJ4
tenticidade da m aior parte do trecho. Todas as tradu-
ções mais antigas e todos os m anuscritos gregos de
Josefo (desde os m elhores até os m enos confiáveis)
trazem , com pequenas variações, o conteúdo deste
‫וא‬ * - - - ‫ן ח‬ ‫ע ל ״ פ נ י‬ ‫י ל‬
texto 1 . A versão abaixo é a mais aceita por grande
parte dos acadêmicos:
“Por esse tem po, surgiu Jesus, hom em sábio. Pois
‫י‬
! ‫ו דו‬ 0 ‫ *׳ ל ״י‬, ‫י‬ ,‫״‬ · ‫י‬

‫א *י מ * * ־‬ ·

ele era obrador de feitos extraordinários, m estre dos *‫־‬ ‫!*·״‬


hom ens que aceitam alegremente coisas estranhas e
arrastou após si m uitos judeus e m uitos gregos. Ele ‫כי‬ - ♦
era considerado Messias. Em bora Pilatos, por acusa-
ções dos nossos chefes o condenasse à cruz, aqueles
que o tinham amado desde o princípio não cessariam ψ%
[de proclam ar que] passado o terceiro dia, apareceu-
-lhes novam ente vivo; os profetas de Deus tinham
respeito dele. Ademais, até o presente, a estirpe dos

1
cristãos, assim chamada por referência a ele, não ces-
sou de existir.” (Ant. XVIII, 3, 3).
*m S
Falando do golpe de Estado dado pelo sumo sacer- g M
dote Anã (ou Hananias), após a m orte de Festo (62- ##
A.D.), Josefo diz que o sacerdote saduceu: “Convocou
■MHflIlf
um a assembleia (Sinédrio) de juizes e colocou diante
deles o irm ão de Jesus que é cognominado Messias,
de nom e Tiago, e alguns outros. Acusou-os de terem Um desses textos é um a tradição externa suple-
transgredido a lei e os entregou para serem apedreja- m entar, baraíta, inserida no Talm ude Babilônico para
dos.” (Ant. XX, 9, 1). com entar o procedim ento correto quanto a um con-
denado ao apedrejam ento. Mas ele é confuso porque
fala de apedrejam ento e cita como exemplo uma pes-
* Talm ude Babilônico: Há uns poucos trechos tal- soa que foi pendurada ou enforcada e que, alguns cre-
múdicos que alguns autores entendem fazer referên- Netzer) mais tarde foram aplicados erroneam ente a
cias distantes à pessoa de Jesus. Não se trata, porém , Jesus”12. (Rabino Michael J. Cook).
de um a alusão clara à sua pessoa. Parecem, no máxi-
mo, um eco distante de sua existência.

Mas ele é tratado como personagem histórico. Com


críticas ou não, Yeshua (Jesus) não é negado como per-
sonagem histórico pelos judeus, pelo menos baseados
na tradição Talmúdica. Contudo, existem muitos per-
sonagens que foram confundidos com ele no Talmude.

‫״‬Aum enta o problem a a confusão acerca da pos-


sibilidade de passagens que originalm ente não alu-
diam a Jesus não terem sido mais tarde entendidas
como referentes a ele. Textos rabínicos que tratam de
outras figuras (por exemplo, Ben Stada, Peloni Ben
em, pode ser um a referência a Jesus de Nazaré:

“Na véspera do pessá (Páscoa), penduraram Jeshu


(.há-nozri). D urante 40 dias um arauto esteve
andando à volta dele. [Mas] ele é conduzido ao
apedrejam ento por ter praticado magia e levado 0
povo a com eter idolatria, além de desviar Israel. ‘Se
alguém conhece alguma coisa em seu favor, que
venha e dê o teste- m unho’. Mas não se encontrou
nenhum a testem unha favorável a ele e enforcaram
-no na véspera do pessá.” (Sanhedrin 43a)

Nesta passagem possivelmente m enciona-se


Jesus e seus discípulos - em bora o núm ero pareça
deles equivocado:

“Nossos rabinos ensinaram: Yeshu tinha cinco


discípulos: M atai, Nakai, Netser, Buni e Todá. [...]
‫א‬ ‫?ל א‬ Oo
‫׳‬ *

‫רך‬ F ato importante


• *Ψ | Segundo a apologia de Orígenes escrita
por volta de 178 a um judeu chamado
‫» א ם‬ ‫ ־‬o n y n ,» · S « ; Celso (cuja obra contra o cristianismo se
perdeu completamente), havia uma acu-
sação de que Jesus seria um filho bastardo,
nascido da união adúltera de Maria e um
legionário romano chamado Panthera
(Contra Celsum I, 28 e 68). Como o nome
ben Panthera aparece no Sanhedrin 107b
e no b Sota 47a, é possível que ali exista
uma referência indireta a Jesus.

‫׳צרס״דם‬ ‫כח־סדר‬

Museu de Israel - Ossuário alguém


tam bém chamado Jesus

HiíÉSl
como Geza Vermes e HyamMaccoby
defendem a historicidade
Ομαηάο Matai fo i trazido [perante a corte] ele lhes disse

; os juizes]: Matai deverá ser executado? Pois está escrito:


Quando [ hb. Matai] eu virei e aparecerei perante D ’us? (SI
43.3). Im ediatam ente ele replicou: Sim, M atai será
executado, pois está escrito. Quando [Matai] m orrer,
seu nom e perecerá (SI 41:6). (Sanhedrin 43a)

Ha.

Você
sabia?
A existência histórica de Jesus de Nazaré
não é defendida apenaspor cristãos piedo-
sos. Na verdade épraticamente um
consenso entre os historiadores de que
Jesus existiu defato no século I de nossa
era. Até mesmo acadêmicos ateus
eagnósticos como Bart Ehrman, Maurice
Casey ePaula Fredri- ksen ou ainda judeus
largamente falada nos tempos de Cristo: “Tiago, filho
Uma caixa controversa de José, irmão de Jesus.”

Os judeus do século I costumavam guardar ossos Quem prim eiro anunciou essa descoberta foi o pa-
de seus ancestrais dentro de caixas de pedra chamadas leógrafo André Lam aire13. Ele chamou a atenção para
os- suários e depositá-las em túmulos da família feitos o fato de que a expressão “Tiago, filho de José” pode-
nas rochas. Essas caixas costumavam trazer uma ria não indicar m uita coisa, pois era a fórm ula comum
inscrição tum ular que identificava os restos m ortais daqueles dias (“fulano, filho de sicrano”). Contudo, o
daquele que estava ali sepultado. Um ossuário em com plem ento “irm ão de Jesus” seria algo completa-
especial trazia os seguintes dizeres grafados em m ente inédito pois não se colocava o nom e de outro
aramaico - uma língua próxima ao hebraico e parente além do próprio pai. A menos, raciocinou
Lamaire, que esse parente fosse famoso o bastante
dofundador do O para m erecer tal destaque.
cristianismo. ‫ר‬
ô Daí o que se seguiu foi um jogo de probabilida-
C'O'TU des combinadas. Qual a chance m atem ática de haver
dois Tiagos na Jerusalém do século I que teriam um
pai chamado José e um irm ão famoso chamado Je-
- -C-0-4-P

sus? Praticam ente nenhum a. Logo, cogitou-se a forte CL


possibilidade de ser este Tiago o m esm o m encionado 2l Fato importante:
c
em M ateus 13:55 e M arcos 6:3. Ou seja, o irm ão do
Q “Diremos que a história do Evangelhofoi
Salvador que se tornou um dos prim eiros líderes da inventada por prazer?Meu amigo, não é
Igreja após a ressurreição de Cristo. c
assim que se inventa... Nunca os autores
A favor desta identificação há o fato de que Josefo judeus teriam encontrado nem esse tom
nem essa moral. Os Evangelhos têm traços
de

tam bém m enciona Tiago como irm ão de Jesus em sua verdade tão grandes, tão impressionantes,
obra historiográfica acerca dos judeus. Hoje a questão tão perfeitamente inimitáveis, que seu
está dividida nas seguintes teorias. Para uns, tudo não inventor seria mais espantoso do que 0herói
passa de um a grosseira falsificação feita por algum Contu- do, esses mesmos Evangelhos estão
com erciante de antiguidades, para outros, o ossuário cheio de coisas incríveis queferem a razão.
Coisas que 0homem comum não pode
seria verdadeiro, mas a inscrição não. O utros ainda c
pensam que a prim eira parte, “Tiago filho de José”, C conceber e nem admitir.”Jean Jacques
Rousseau

seria verdadeira, enquanto a segunda, “irm ão de Je- O . ‫־‬t n y r a


T73‫־‬
sus” seria falsa. E há tam bém os que julgam a peça
genuína em todos os aspectos.
Aspectos físicos da terra
Estudos futuros poderão iluminar m elhor a ques-
tão ou deixá-la ainda em aberto, uma vez que questões
de Jesus
políticas e judiciais tam bém fizeram parte do episódio.
Por outro lado, ainda que não se possa afirmar para Ao estudar a narrativa dos Evangelhos, o leitor mo-
longe de qualquer dúvida a autenticidade deste artefa- derno pode perceber a ênfase e a perspectiva geográ-
to, já existem elementos suficientes para apontar Jesus fica dos autores ao apresentar a vida e obras de Jesus.
como uma legítima personalidade histórica. Os textos fazem constantes referências tanto a lugares

Οο Π . ‫ ־־ ־‬..‫־‬ 1 .1 ■ '
O o
t I ‫ג‬

J Você sabia? c
O caso do ossuário deTiagofoi parar nos
tribunais e vários artefatosforam levados a
juízo. Finalmente, no dia 14 de março de
2012, 0juizÁaronFarkash da suprema corte
de Jerusalém, que também tinha graduação
em arqueologia, declarou numa sentença
oficial que “não háevidência alguma de que
qualquer destesprincipais artefatos
[incluindo 0ossuá- rio de Tiago] foram
forjados, eapromotoria não conseguiu
provar que suas acusaçõespode- riam ir além
de uma razoável dúvida".

c ‫ר‬
q o Caixa de pedra contendo os ossos de Tiago;
-j-4 Q —*‫־‬
Γ— — - para alguns, 0 irmão de Jesus Cristo.
ü ‫ ׳‬í ‫״‬g j í ■z z ~ : .......................0 0 ‫כח־־‬
imediatos - beira-mar, alto da m ontanha, interior de uma casa - quanto a territórios mais amplos - as regiões de
Tiro e Sidon, as bandas de Cesareia de Filipe, o deserto da Judeia.

Demarcações geográficas
A superfície da ‫״‬terra de Jesus” variou consideravelmente no decorrer dos séculos, ora sendo mais extensa -
como nos dias de Davi e Salomão - , ora mais reduzida, especialmente quando atacada por povos estrangeiros
como assírios, babilônios, gregos e romanos.

E não se pode deixar de anotar a ruptura interna ocorrida após a m orte de Salomão, que dividiu as 12 tribos
em Reino do N orte e Reino do Sul - um a rivalidade que deixou m uitas conseqüências.

De m odo geral, mas não uniform e, pode-se dizer que estes seriam os limites geográficos aproximados da
terra dos judeus nos dias de Jesus:

N orte - fronteira com a Síria e a Fenícia.

Sul - fronteira com o deserto do Sinai.

Leste - fronteira com parte da Síria e da Arábia.

Oeste - limite litorâneo banhado pelo M ar M editerrâneo.


Um roteiro limitado m édia nacional da população brasileira no m esm o
espaço de tem po!
Tudo começa com um a viagem de Nazaré para
Mas esses limites geográficos da atuação de Jesus
Belém, onde nasce o m enino Jesus. A seguir ele é le-
tornam -se secundários se comparados ao alcance pos-
vado em fuga para o Egito. Depois aparecem em cena
terior de seus ensinos que hoje percorrem o m undo
Nazaré, o deserto da Judeia, um m onte não nom eado
inteiro e trazem especial atenção para aquelas antigas
e sua pregação na Galileia, Judeia e arredores, onde
paisagens que hoje com preendem Israel, o território
ele exerceu praticam ente todo seu m inistério público.
Palestino e parte da Jordânia, Síria e Líbano.
Regiões como Decápolis, Pereia e Samaria tam bém
contaram com a presença física de Jesus, mas em si-
tuações raras e bastante específicas. Esses lugares não
parecem ter sido parte de sua rota costumeira. £ lsx . s£L
c O
‫ג‬
c
Οί
Fato
importante
O território que Jesus percorreu em vidafora
bem menor que 0 imaginado para alguém
Você sabia? que teve tantafama em seu tempo edepois
dele. Com base nos relatos evangélicos,
Ao contrário de Paulo, que era um homem de
pode-se esti- mar que 0“país" de Jesus tinha
edu- cação urbana, Jesus identifica-se mais
uma extensão aproximada de 25 a 30.000
com uma pessoa do interior. Com exceção de
km2. Seu compri- mento em direção norte-
Jerusalém, ele parecia evitar osgrandes centros,
sul era de 250 km e a largura média de 120
concentran-
km. Uma área 12 vezes menor que a atual
do-se apenas nas vilas e arredores (cf. Marcos Itália. Comparando-se com Estados
7:31;8:27). Seus exemplos, parábolas e brasileiros, é um território pouco maior do
expressões revelam a profundidade de um que 0Estado do Espírito Santo.
homem sábio, mas acostumado ao dia a dia
do campo.

O 773“
c
C
‫־‬773‫־‬

base nos relatos evangélicos das várias idas e vin- das


Considerando que a m aior parte dos três anos e de Cristo pelo território, pode-se calcular que ele
meio do m inistério de Jesus fora concentrada na re- tenha cam inhado pelo m enos 34.600 km durante seu m
gião da Galileia, com poucas idas a Jerusalém e outros inistério terrestre. Isso é dez vezes mais que a
territórios, a extensão geográfica de seus milagres e
pregações fica anda mais reduzida.

Nos três anos e m eio que passou pregando, Jesus


não se distanciou mais que 200 km da cidade de Na-
zaré, onde fora criado. C ontudo, isso não significa
que ficou ocioso ou parado num único lugar. Consi-
derando que m uitas de suas viagens eram a pé, com
Encruzilhada das nações
A terra que em Jesus nasceu era o mesmo territó-
rio prom etido por Deus ao patriarca Abraão e seus
descendentes (Gên. 12:7; 13:14-17). Em term os geo-
gráficos, aquele pedaço de chão tornou-se o entron-
camento de grandes povos do antigo O riente
Médio. As m aiores civilizações da Antiguidade
(Egito, Babi- lônia, Assíria, Pérsia e reino Hitita) se
assentaram ao redor do território comum ente
conhecido por ‫״‬T erra Santa” que é apenas um nom e
piedoso para o Israel descrito na Bíblia. Não é por m
enos que antigos au- tores, desde os tem pos bíblicos
(Ezequiel 5:5; 38:12) até à Idade Média, referiam-se a
Jerusalém como o “centro” do m undo.
O mundo de Jesus de sua vida em Roma. Antipas (o mesmo que m an-
dou m atar João Batista) ficou com a Galileia e Arque-
O m undo geográfico em que Jesus viveu integrava lau, m encionado textualm ente em M ateus 2:22, 23;
o im pério rom ano, que abrangia todo o entorno do herdou a Judeia, Samaria e Idumeia, mas governou
M ar M editerrâneo, envolvendo territórios da África, pouco tem po devido a um a desastrosa atuação que
Ásia e Europa. É difícil atualm ente precisar os limites desagradou o centro do poder em Roma.
fronteiriços da terra dos judeus no tem po de Cristo. Após o banim ento de Arquelau, a Judeia passou a
O que se sabe é que a Judeia foi conquistada pelos ro- ficar sob a jurisdição de prefeitos e mais tarde de procu-
m anos em 63 a.C. e anexada ao im pério como reino radores rom anos que tinham residência oficial não em
sem iautônom o, isto é, com direito a ser governado Jerusalém , mas em Cesareia M arítim a, junto ao m ar
por um rei local. M editerrâneo. Pilatos, que participou do julgam ento
Esse rei, apontado pelos romanos, era Herodes, o de Jesus, foi um desses representantes legais do impe-
Grande, o "rei da Judeia” por ocasião do nascimento de rador, adm inistrando com mão de ferro o país.
Cristo e de João Batista, que recebera extensas porções
de terra concedidas pelo senado rom ano (Lucas 1:5). Com exceção de um breve reinado de Herodes
Agripa, como rei da Judeia (Atos 12:1), e outro parcial
No auge de seu poder, seu dom ínio incluía as re- de Agripa II, a terra dos judeus nunca mais teve um rei
giões da Judeia, Galileia, Idumeia, Pereia, Samaria e local que dominasse todo o território. Os enviados de
outros redutos m enores. Porém, após sua m orte, o Roma permaneceram governando a região até à re-
território foi dividido entre seus filhos. Filipe ficou volta dos judeus em 66 d.C.; que culminou na destrui-
com a parte leste do Jordão, mas viveu a m aior parte ção de Jerusalém e do Templo Judeu no ano 70 d.C.

Geografia - 0 mundo mediterrâneo dos


tempos de Cristo
O AUGE DO
IMPÉRIO ROMANO

·.·<■‫׳‬

OCEAN
Gália
ATLÂNTICO
Macedonia
Mar Negro

Espanha V *Λ V ^ ‫·־‬ , .‫־ ־ ל‬


Greeia ASIA MENOR

it '*
Mar Mediterrâneo
AFRICA
Os Herodes da Bíblia
Após a m orte de Herodes, o Grande, alguns de
seus herdeiros usaram o designativo “Herodes” como
título de realeza. Desse modo é possível encontrar no
NT a menção de pelo m enos seis Herodes:
1 - Herodes, o Grande, que m andou m atar as
crianças em Belém; (Mat. 2:2);
2 - Herodes Arquelau ou etnarca, que assumiu a
Judeia após a m orte do pai (Mat. 2:22);
3 - Herodes Antipas ou Tetrarca, pois governou
um quarto do território. Foi ele que assassinou João
Batista e teve um breve encontro com Cristo durante
seu j ulgamento em Jerusalém (Luc. 3:19; 9:7; 23:7);

4 - Herodes Filipe, outro Tetrarca que governou a


Itureia, Traconites, Gaulanites, Auanites e Bataneia.
Não sendo uma figura central, foi rapidamente mencio-
nado em Mateus; 16:13; Marcos 8:27 e Lucas 3:1 [19];
5 - Herodes Agripa I, neto de Herodes, o Grande,
chamado de “rei Herodes”, em Atos 12:1, que m andou
m atar Tiago, à espada;

6 - Herodes Agripa II, bisneto de Herodes, o G ran-


r>O
de, famoso por seu encontro com o apóstolo Paulo, cc
conform e registrado em Atos 25:13; 26:32.

Fato importante
0 famoso Herodes, 0Grande, escolhido como
rei dosjudeus pelos romanos, não era
elemes- mo judeu, masldumeu. Herodes
nascerafilho de uma princesa nabateia
fQ ‫ח‬ chamada Cypros e nãopossuía nenhum
parentesco com osjudeus senão mediante
Você sabia? uma tribo distante deEsaú, a saber,
osedomitas.
Herodes, 0 Grande, era um individuo tão
Apesar de seus esforços para adular Roma
odiado que, quando os arqueólogos
encontra- e ao mesmo tempo ganhar simpatia
dosjudeus comgrandes construções no seu
território, ele
m O
ram seu túmulo em 2007, se depois de um acidente, no mesmo local da
orr
surpreenderam ao ver quefora destruído eu descoberta.
não por ação do tempo, maspor vândalos
que provavelmente 0profanaram poucas
décadas depois de sua morte. Quem disse
issofo i EhudNetzer, 0 chefe da expedição
que, tragicamente,
‫ס‬ C era um monarca odiado pela população e
vivia
sob 0constante temor de ser assassinado ou
deposto a qualquer momento. Em virtude
disso, mandou matar vários membros de
suafamí- lia, inclusivefilhos, 0que explica
0genocídio de Belém que ele ordenou ao

e saber queali havia nascido um menino que


‫ג‬
seria 0“rei dosjudeus".

173 3 7 ?‫־‬
i ‫־‬r 5 ‫־‬f ‫־סדי‬
u ‫־‬

........
.............. .............. .............. .............. ‫י ״‬


:......- ........... -— :— — — .................
Cronologia
4.a.C.
Octaviano (o futuro Augusto Cé- Possível ano do nasci- Herodes, o Grande, m orre entre
sar) assume o poder em Roma e, m ento de Jesus. m arço e abril na cidade de Jericó.
após a batalha de Ácio, m antém Seu filho Arquelau leva seu corpo
Herodes no controle da região. para 0 Herodion, palácio no de-
No mesmo ano Herodes se casa serto que serviu de túm ulo do rei.
com M ariana I, neta de Aristó-
bulo II e Hircano II e conquista

X1 d .,M®
M orre Augusto César (Luc. 2:1)
Pilatos governa como Jesus inicia seu m inistério
e Tibério assume seu lugar (Luc. prefeito da Judeia a

44 d.C. 48 d.C. 56 d.C.


Herodes m orre em Cesareia co- Passado um tem po após
a m orte de seu pai, He- Nero aum enta o território domi-
mido por verm es, conform e Atos
rodes Agripa II é no- nado por Agripa II que, para adu-
12:20-25. Após sua m orte a Ju-
meado por Cláudio rei lar o im perador, m uda o nom e da
deia é incorporada à prefeitura da
de parte norte e nordes- cidade de Cesareia para Neronias.
Síria e volta a ser controlada por
te do território judeu. Neste interim ele ouve a defesa de
representantes de Roma, desta
Paulo, conform e Atos 25:13-32,
vez, procuradores.
admite (por sinceridade ou zom-
baria) que este por pouco fez dele
um cristão - Atos 26:28.
Principais províncias e cidades
TERRITORIO DE FELIPE
^ GRANDE HÉRM( IN

o CESAREIA DE FiLIPE

OPAS DEJESUS TRACON T

IDROSCENA

O AKCIB
LAGO
O GISCALA '
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NEFTALIO t MEROM
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JERUSALÉMO
NARQUERONTE

M MAGDALGAD O AZOTO
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BELÉI/lo,
O YAI A i
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BETSUR O

o HÉBRON

YUTTA O

O KERIOT

MASADA

M OABE

EDOM

PETRA
■4‫־‬ .

A região na qual Jesus viveu é uma terra de muitas


vez mais até desembocar no M ar M orto a 390 m abai-
montanhas, vales e um imenso deserto. Daí a Bíblia cha-
xo do nível do mar. Sua extensão é de, aproximada-
má-la de “terra de montes e vales” (Deut. 11:11). Prati- m ente 190 km .
camente todas as cidades do tempo de Jesus estavam si-
tuadas em algum ponto de uma extensa cordilheira que A com panhando o vale do Jordão, desde o M ar da
desce desde os atuais limites com o Líbano e a Síria, até Galileia até o M ar M orto, é possível identificar com
às áreas desérticas do Negev ao sul do país. A parte norte mais facilidade algumas das principais regiões, cida-
está a aproximadamente 1300 metros acima do nível do des, localidades e acidentes geográficos m encionados
M editerrâneo e a parte sul, bem ao contrário, acerca de no Novo Testam ento. Vindo do N orte para o Sul, são
400 metros abaixo do nível do mar. estas as regiões ou divisões políticas da T erra Santa,
durante a vida de Jesus:
Essa cadeia m ontanhosa que inicia com os maci-
ços do Líbano e o M onte H erm on é entrecortada pelo 1 - G alileia - Um lugar complicado na época por-
vale de Jezreel (Josué 17:16) que a divide deixando ao que, ainda que a população fosse judaica em sua m aior
norte os m ontes da Galileia e ao Sul os desvios das parte, ali era território comum de m uitos judeus
m ontanhas de Samaria. E do Herm on, cuja parte sul e não judeus. Por isso era chamada de “Galileia dos
se funde com as famosas colinas do Golan, que des- gentios” (Isa. 9:1 e Mat. 4:15). Gentio era uma alcunha
cem as principais nascentes do Rio Jordão. Este, por não m uito amistosa para falar do não judeu; seria o
sua vez, atravessa os lagos Hulé e segue até form ar m esm o que chamar alguém de pagão.
o M ar da Galileia, na verdade um lago de água doce
Ao contrário do que se pensava anteriorm ente, a
com com 21 km de com prim ento e area de 166 km 2.
arqueologia revelou um am biente bem religioso na
A seguir, esse rio continua seu curso descendo cada
Galileia, porém , m enos piedoso que o de Jerusalém.
BMggjgggg

Modernos samaritanos celebrando a páscoa


sobre 0 monte Gerizin.

Tanto era assim que os habitantes da Judeia consi- Era no entorno do M ar da Galileia que ficavam as
deravam os da Galileia “judeus de segunda categoria” principais cidades pelas quais Jesus se m ovim entava-
(João 1:46; 7:25). em bora nem todas estejam precisam ente localizadas:
O sotaque e a dicção dos galileus era outra m oti- Cafarnaum (Mat. 17:24; M c 1:23-28); Corazim (Mat.
vação para serem discriminados pelos que viviam na 11:21), Betsaida (M t 11.21; 6.45; 10: 13; Jo 1.44),
Judeia. Um galileu geralm ente usava expressões ara- Caná (João 2:1 e 21:2), Genesaré (Marcos 6:53-56),
maicas estranhas, com descuido gramatical e pronún- Magadala (Luc. 8:2), Gergesa ou Gadara M at 8:28 e
cia indistinta de algumas letras. Isso perm ite entender Luc. 8:26 e Naim (Luc. 7:11-17). Outras cidades não
porque Pedro foi im ediatam ente reconhecido como mencionadas no relato bíblico seriam M erom , Tela,
galileu por sua “form a de falar” quando estava no pá- Giscala, Tiberíades, Tesá, Cabul, Aczibe. Mas é bom
tio do palácio de Caifás por ocasião do aprisionam en- lem brar que a parte leste do M ar da Galileia tem uma
to de Cristo (Mat. 26:73). jurisdição mais imprecisa, de m odo que as cidades
que estão do outro lado do Lago são às vezes m ostra-
Tudo isso torna mais que curiosa a informação bí- das como pertencentes a Decápolis, à Tetrarquia de
blica de que Jesus inicia justam ente ali seu m inistério Felipe ou à própria Galileia.
e todos os seus apóstolos (com possível exceção para
Judas) eram galileus. Considerando que Nazaré ficava 2 - D ecápolis - Conform e o próprio nom e grego,
na Galileia e Jesus fora criado neste vilarejo, ele mes- significa literalm ente as “dez” (deka) “cidades” (pólis).
m o fora, em virtude disso, considerado galileu (Mat. De acordo com Plínio, o Velho, essas cidades seriam:
26:69 e 73). Damasco, Filadélfia, Rafana, Citópolis (Bete-Seã),
Gadara, Flipos, Diom, Pela, Gerasa e Canata (Natu-
A região era ainda subdividida em alta e baixa Ga-
ralis Historia V, 74). Em bora exista certa divergência
lileia. A prim eira, m uito m ontanhosa e isolada, não se
sobre o que representavam essas cidades, a opinião
destaca no relato bíblico. Já a segunda, a baixa Gali-
prevalecente é a de que se tratava de um a confede-
leia, serviu de am biente para a m aioria dos episódios
ração cosmopolita fortem ente marcada por um a cul-
descritos nos evangelhos. Era um lugar fértil, com
tura helenística comum. O único problem a é que o
bastante chuva que, segundo Flávio Josefo, não teria
estudo das fontes até agora realizado não descobriu
nenhum a terra sem ser cultivada (Guerra dos Judeus
nenhum a evidência de arranjos comerciais, políticos
3.42-43).
ou militares entre seus m em bros.
Seja com o for, eram todas cidades greco-rom a- gares com o Betel e Dan. A capital do reino do N
nas que partilhavam um a m esm a cultura não judai- orte ficou sendo Samaria.
ca, mas que se sentiram atraídas pelo m inistério de
Jesus de Nazaré. Assim, m uitos de seus seguidores Em 722 a.C., Israel fora conquistado p o r Sal-
vinham dessas cidades e, em bora fosse um lugar m anazar, rei da Assíria, e m uitos israelitas foram
evitado p o r religiosos judeus mais conservadores, transportados para outras partes do seu im pério.
não é inverossím il concluir que Jesus ten h a tido al- Em contrapartida, pessoas de outras nações tam -
gum tipo de atividade efetiva na região (M at. 4:25; bém subjugadas foram trazidas para a Sam aria (II
M ar - 5:1-20; 7:31). M esm o porque, recentes pes- Reis 17:23-24).
quisas m ostram que algum as cidades da Decápolis Esses novos cidadãos assim ilaram m uito da re-
tinham presença judaica em seu territó rio com o é o ligião judaica, mas a m isturaram com sua própria
caso de Bete Sean, Gerasa e H am ate Gader. cultura, criando um a visão ainda mais sincrética da
3 - P e re ia - Localizada logo abaixo da Decá- fé judaica. Tal situação, agravada pelos casam entos
contínuos de judeus e não judeus, fez com que os
polis, a Pereia não é diretam ente citada no N ovo
habitantes de Judá desprezassem os sam aritanos e
Testam ento, a não ser p o r um a variante textual de
não mais os considerasse gente de sua própria etnia.
Lucas 6:17. Q uem a cham a p o r esse nom e é Flávio
Josefo. Todavia, sabe-se que “Pereia” vem do gre-
go “Peran” e quer dizer “além ”. Logo, nos vários
m om entos em o Evangelho m enciona a expressão
"além do Jordão’', certam ente está se referindo a
0 rabi E liezer é c ita d o no Tal- m
esta região (M at. 4:15, 25; 8:18; M ar. 3:8; 10:1 etc.).
ude com o te n d o d ito que "a q u e -
Tam bém era ali que ficava a cidade de Jericó do le que a c e ita um pedaço de pão dado
Novo T estam ento, local do palácio de Herodes, da por um s a m a rita n o é sem e- lh a n te à
pregação de João Batista e do batism o de Jesus. Foi q u e le que com e carne de p o rc o " - a
tam bém na Pereia que Jesus jejuou por 40 dias, na lg o c o m p le ta m e n te im - pensado
parte que conhecem os com o deserto da Judeia. para um ju d e u .54

A Pereia era o cam inho ideal para o judeu que


quisesse ir de Judá para a Galileia (ou vice-versa),
evitando passar pelas terras da Sam aria, pois os ju-
deus não se davam com os sam aritanos.
Os samaritanos, portanto, seguiram uma form a
4 - S a m a r ia - A rivalidade dos judeus com os
modificada da Lei de Moisés. Acreditavam que o local
habitantes da Sam aria era acentuada nos tem pos de
correto de adoração a Deus era no m onte Gerizim,
Cristo, mas as origens dessa disputa vem de m ui-
em Samaria, não no Tem plo de Jerusalém . Assim,
tos séculos antes. Tudo com eçou após a divisão do
tanto judeus quanto sam aritanos evitavam um o ca-
povo de Israel em duas nações, após a m orte de Sa-
m inho do outro, m esm o sendo Samaria a rota mais
lom ão em to rn o de 930 a.C. U m a foi o reino do Sul,
curta entre a Judeia e a Galileia. Jesus, portanto, deve
chamado Judá e a outra o reino do N orte, cham ado
ter escandalizado bastante os mais conservadores ao
Israel.
optar algumas vezes por passar pela Samaria em sua
O povo de Judá seguia adorando Deus em Jeru - trajetória entre a Judeia e a Galileia (Luc. 9:51, 52;
salém. Mas o povo de Israel m isturou seu culto com 17:11; Jo. 4:4 e 5).
tradições de outros povos, criando um sincretism o
5 - J u d e ia - Nos dias de Jesus a judeia era,
incongruente com a Lei de M oisés. Sendo assim,
indubi- tavelm ente, a região mais im portante para os
deixaram de ir a Jerusalém para as festas religiosas e
judeus.
se voltaram para santuários m istos erguidos em lu
Mas o m otivo disso não estaria na sua geografia nem
na sua beleza natural. Pelo contrário, a Galileia era
um lugar m uito mais aprazível em term os de tem pe-
Mas era na Judeia que ficava a grande cidade de
ratura, fontes d agua, vegetação e terreno fértil.
Jerusalém , capital escolhida por Davi. Ali estava o
A Judeia, em contrapartida, revela-se um a região Tem plo do Senhor, o centro da religiosidade judaica,
por um lado m ontanhosa (o que dificulta a agricultu- para onde peregrinavam judeus do m undo inteiro a
ra) e, por outro, desértica, o famoso deserto da Judeia fim de adorar o Deus de Israel.
várias vezes m encionado no Novo Testam ento (Mat.
Belém, a cidade do rei Davi; Jericó, a prim eira
3 :1; 4 :1 ). Ela tam bém varia grandem ente em altitude,
conquista hebreia da região e Hebron, local do túm u-
pois um a de suas partes, o m onte Hebron, eleva-se a
10 de Abraão e Sara eram outros im portantes sítios na
1.020 m etros, enquanto outra - na direção do M ar
região da Judeia. Tudo isso aum entava a im portância
M orto - desce a pouco mais de 400 m etros abaixo do
daquele território, fora o fato de que, após o fim do
nível do mar, sem dúvida a depressão mais profunda
cativeiro babilônico, a Judeia tornou-se essencial-
do planeta Terra.
m ente o território ocupado pelo rem anescente que
Q uanto às chuvas, a quantidade de água que cai na voltou do exílio. E como a m aioria deles era da tribo
Judeia (entre 100 e 600 mm) é m ínim a se compara- de Judá, o term o “ju deu” passou a designar indistinta-
da à que cai na Galileia (900-1.200 mm). Isso fora o m ente todos os descendentes de Abraão ou seguido-
clima bem complicado. É que, localizada num a zona res da fé abraâmica e seu território reconhecido como
fronteiriça entre o clima úm ido do M editerrâneo a como Judá ou Judeia.
oeste e a zona desértica a leste, a Judeia acaba produ- 6 - A D iáspora - Em bora não exista nenhum a re-
zindo um a vegetação em parte desértica, em parte de gião na T erra Santa chamada “diáspora”, essa poderia
estepes, próprias do clima árido e semiárido. Assim a ser considerada um território simbólico para abarcar
região fica pobre de árvores, sendo mais caracteriza- aquela grande parcela dos judeus que não m oravam
da, por um grande tapete de gramíneas (herbáceas). nas terras bíblicas, mas no estrangeiro.
A diáspora refere-se aos diversos deslocamentos üa.
forçados dos judeus pelo m undo, devido à conquista
de sua terra por uma nação estrangeira (especialmen-
te assírios e babilônios). Em virtude disso, m uitas co-
m unidades judaicas foram fundadas m undo afora e, V‫׳‬òcê
mesmo quando tiveram a oportunidade de regressar
a Israel, preferiram continuar vivendo no exterior.
sabia?
Sempre houve espaço, entre osjudeus, para
Assim, já no tem po de Cristo havia grandes popu-
um aculturamento greco-romano. Tanto
lações de judeus vivendo no Egito, na Síria, Grécia e
que a língua principal deles passou a ser
também em Roma. Estima-se que som ente a popula-
0grego, razão pela qual os
ção judaica vivendo na capital do im pério ultrapas-
evangelhosforam escritos nesse idioma
saria 100 mil pessoas e a de Alexandria, 1 milhão! A
enão em hebraico ou aramaico, que seriam
estimativa de é que havia cerca de 6 m ilhões de ju- as línguas mais comuns para os discípulos
deus espalhados pelo im pério rom ano. Desse modo, é de Jesus. 0 intuito seria usar 0 grego para
possível dizer que os judeus da T erra Santa represen- disseminar a mensagem de Jesus além do
c
tavam apenas um a pequena fração de um conjunto G território de Israel.

m aior de pessoas, cuja m aioria vivia fora de (ΓΓζΤΤ a . ‫־‬c13‫־‬m


Israel.

o
"a nação ju d a ic a invadiu quase to d a s as ‫־סדר‬
cidades, a ponto de to rn a r d ifíc il enco n tra r um
único lu g a r em to d o 0 universo em que não haja
ju d e u s ". Estrabão, geó g ra fo grego, I século
a.C.15

Ha.

Fato importante
Sinagogas eram espalhadaspor todo esse
território estrangeiro e 0desafio dosjudeus
que moravam ali era alinhavar 0equilíbrio
entre 0diálogo com seus vizinhos não judeus
e, ao mesmo tempo, preservar sua
identidade étnica. A tarefa não erafácil eos
modos de li- dar com 0problema variavam
de cidadepara cidade. Em algumas
localidades osjudeus começam a ir ao teatro
eassumir comporta- mentos comuns da vida
greco-romana. Em outras sefechavam,
mantendo certa distância entre si mesmos e
0ambiente que os envolvia.
Apesar das diferenças entre si, as
comunidades ju- daicas da diáspora tinham
alguns elem entos em co- m um , que as
faziam perm anecer unidas mesmo num am
biente tão desafiador. Elas m antinham toda
sema- na o culto sabático em suas sinagogas,
eram rigorosos quanto às leis alimentares do
Levítico, observavam o calendário das festas
judaicas e, em ocasiões de sole- nidade, m uitos
se esforçavam para peregrinar até 0 Tem plo
em Jerusalém.

Foi por isso que a cidade de Jerusalém


estava tão cheia por ocasião da m orte de
Cristo. Era a festa da Páscoa e judeus do m
undo inteiro vieram para ceie- brá-Ia na
cidade sagrada. Um a vez ali, puderam tes-
tem unhar a execução de Jesus de Nazaré, fato
que provavelm ente os im pactou bastante. T
anto que, semanas mais tarde, em outra festa
chamada Pente- costes, os discípulos pregam
para um a m ultidão de judeus da diáspora e
vários deles voltam crendo que Jesus era o
Messias.

Um pouco antes disso, líderes judeus,


tentando entender as palavras de despedida
de Jesus, pergunta- ram uns aos outros se ele
não objetivava com aquilo dizer que sua
intenção era pregar aos judeus da “Dis-
persão, entre os gregos, com o fim de lhes
ensinar” (Jo. 7:35). Ora, essa é um a
referência explícita aos ju- deus da diáspora
que viviam fora de Israel.
A origem dos gafifeus Bíblia

Um grande debate que se arrasta nos congressos


e publicações acadêmicas sobre Jesus tem a ver com
as origens e diferenças entre os judeus da Judeia e os
demais que viviam na Galileia. O ponto da discussão
que divide opiniões é: Quem seriam, de fato, os gali-
leus durante os tem pos de Cristo?

A controvérsia torna-se especialm ente signi-


ficativa para o estudo de Jesus porque, em bora ele
nascesse em Belém da Judeia, a m aior parte de seu
m inistério foi vivida na Galileia. Ali ele operou a
m aior parte de seus m ilagres (27 dos 35 que a
m enciona), deu seus principais ensinam entos, cha-
m ou seus discípulos e deu instruções após ressusci-
tar dentre os m ortos.

O problem a começa séculos antes de Cristo quan-


do a Galileia foi dividida para as tribos de Zebulom,
Naftali, Isacar e Aser. Na época da unificação, o ter-
ritório foi incorporado ao reino de Davi. Mas após a
m orte de seu filho Salomão, houve um a ruptura no
reino. Dez tribos se juntaram ao norte tendo por ca-
pitai Samaria e duas ficaram ao sul tendo por capi-
tal Jerusalém. A Galileia pertencia ao norte e assim
form aram -se os reinos de Israel (norte) e Judá (sul),
quase sempre em conflitos um com o outro.
Então veio Tiglat Pilezer III e conquistou Israel, mesmo com os idumeus, antes dele. Isso foi em 106 a.C.
em 733 a.C. Um a década depois, sob a administração e, sendo assim, os judeus da Galileia seriam "distintos”
de Salmanazar V, aquele reino havia desaparecido. daqueles que viviam na Judeia. Eles não eram judeus por
Neste ponto m uitos historiadores acreditam que o ascendência, mas itureanos convertidos à força.
costume assírio de relocar populações inteiras de um
lugar para o outro fez com que o território do antigo A princípio, pode parecer coisa comum, de m enor
reino do norte ficasse praticam ente vazio. im portância ou até inspirada em segregação racial.
Mas não é o caso. Se a Galileia não era composta por
De acordo com o testem unho bíblico (II Rs 17), o judeus “de fato” isso teria implicações m uito sérias
rei da Assíria repovoou a Samaria com estrangeiros para o m ovim ento de Jesus que nasceu naquele lugar.
vindos da Babilônia, mas não há menção alguma de
que a Galileia tam bém tenha sido repovoada. Ao que É como se Nagasaki e Hiroshim a fossem comple-
parece, ela perm aneceu vazia e fora dos registros his- tam ente repovoadas com coreanos naturalizados ja-
tóricos por, pelo menos, 600 anos. poneses. Com o tem po, a cultura nipônica produzida
naquelas cidades já não seria tão “japonesa” como
Estudos arqueológicos na região dem onstram que aquela produzida em outros redutos com m enor pre-
foi exatamente isso que aconteceu. Uma investigação sença de estrangeiros.
de superfícies indica que não houve ocupação hum ana
na Galileia por pelo menos 200 anos após a conquista Porém nenhum docum ento do passado identifica
dos assírios. E o que se encontra despois disso são as- ou acusa os habitantes da Galileia de serem m eio-ju-
sentamentos ínfimos e pequenas ocupações militares. deus. Ademais, verifica-se uma singular ausência de
indícios arqueológicos que confirm e a presença de
Contudo, a evidência arqueológica m ostrou que itureanos vivendo na Galileia. Ainda que seja verda-
esse quadro foi alterado no século I a.C. Quando uma deiro o relato da conversão forçada de estrangeiros
grande leva populacional concorreu para a região ao judaísmo - algo totalm ente estranho ao judaísmo
tornando-a novam ente habitada. Em poucas décadas - , não se pode dizer que a Galileia foi o destino desse
várias vilas e depois cidades começaram a ser funda- grupo de estrangeiros recém -convertidos.
das, especialmente no entorno do M ar da Galileia.

A pergunta, pois, que se faz nesta sequencia dos fa- Migrações judaicas
tos é: Quem seriam esses novos habitantes da Galileia?
Josefo diz que Alexandre Janeu, lider dos judeus de

Galileus: judeus ou 102 a 76 a.C., estendeu para o norte as fronteiras do


reino centralizado em Judá e, a partir daí, a Galileia
itureanos? voltou a fazer parte do território judeu - embora al-
guns entendam que ela já estaria anexada como heran-
Uma leitura equivocada de um texto ambíguo de ça israelita desde os tempos de Aristóbulo e Hircano.
Josefo e do I Livro dos Macabeus, fez m uitos histo-
Num prim eiro m om ento, apenas m ilitares haviam
riadores acreditarem por gerações que os galileus não
sido enviados para lá. Contudo, com o tem po, outras
eram 100% de sangue judeu. Eram descendentes de itu-
famílias vindas da Judeia tam bém m igraram para a re-
reanos convertidos à força ao judaísmo. Isso colocaria
gião. Os ancestrais do carpinteiro José, originalm ente
o m ovim ento de Jesus num eixo central m uito afastado
vindos de Belém, poderiam estar nessa leva dos novos
daquela herança judaica que chega até Abraão.
habitantes do lugar.
O relato em questão diz que, quando Aristóbulo, o fi-
Os achados arqueológicos tam bém confirm am , a
lho de João Hircano, assumiu o poder como governador
partir de cerâmicas e utensílios domésticos, hábitos
hasmoneu da Judeia, ele repovoou o lado ocidental da
comuns àqueles encontrados na Judeia. Tratava-se,
baixa Galileia com famílias da Itureia que foram obriga-
portanto, de famílias judaicas que m igraram da Judeia
das a se converter ao judaísmo. Seu pai já havia feito o
para o norte e não de agrupam entos de não judeus.
suir Jerusalém e o Tem plo - símbolos m áximos do
judaísmo daquele tem po.

A evidência é fragm entária, mas perm ite dizer que


os galileus não sustentavam em massa o Tem plo em
Jerusalém com seus impostos, dízimos e ofertas. Não
que eles rejeitassem a Torá, mas talvez fosse um a for-
m a de protesto contra a obrigatoriedade de m andar
esses recursos para um a aristocracia subserviente a
Roma. Jesus, porém , preferiu não sonegar este tribu-
to (Cf. Mat. 17:24-27).

É que o Sinédrio de Jerusalém , trabalhando mais


com a diplomacia e a adulação dos rom anos, conse-
guira instituir uma lei que obrigava judeus de todas as
partes a devolverem tributos para o Templo.

Para com plicar a situação, a Judeia estava sendo


com andada p o r um procurador rom ano que vivia
em Cesareia M arítim a - região da Samaria. Os ga-
lileus ainda eram governados pelos descendentes de
Herodes, sem nenhum a interm ediação rom ana entre
As cidades e aldeias escavadas revelam que os que ali o povo e o governado. Assim, praticam ente nenhum
m oravam tinham com portam ento religioso simi- galileu poderia participar da representatividade ju-
lar dos demais que m oravam em Jerusalém. A dieta daica reunida no Sinédrio. Todos eram da região de
local, por exemplo, não continha nada proibido em Judá. O term o “galileu”, em algumas circunstâncias,
Levítico 11. N enhum osso de porco foi encontrado passou a ser sinônim o pejorativo de “estrangeiro”,
nas cozinhas, no mercado ou nos lugares de refeição “cidadão de fora”.
com unitária.
Os m oradores de Jerusalém , especialm ente da
Assim, pode-se dizer que é errado supor que os ha- elite dos anciãos, consideravam os galileus fracos
bitantes da Galileia eram descendentes de pessoas que espiritual, política e intelectualm ente. Não que seja
tinham se convertido ao judaísmo som ente cem anos verdade afirm ar que fossem rudes e pouco intelectu-
antes. Tam bém é m ito dizer que os galileus eram em ais, contudo, sua interpretação da T orá e dos demais
sua m aior parte pessoas incultas, rudes ou sem serie- escritos judaicos era vista com reservas pela elite do
dade religiosa. Pelo contrário, algumas cidades eram Tem plo. Os fariseus, em particular, eram os m enos
tão rigorosas em seu judaísmo como qualquer bairro im pressionados com a observância religiosa dos ga-
dentro da cidade de Jerusalém. lileus que consideravam frouxa.

A Galileia, por sua vez, era m uito mais engajada


Judeia versus Galileia em lutas armadas que o resto do país. A m aior parte
dos líderes rebeldes que se ergueram contra os rom a-
As evidências dem onstram que havia sérias rivali- nos veio dali. A Judeia era por demais acomodada em
dades entre as províncias da Judeia e Galileia, prin- aceitar a presença do invasor estrangeiro no seu país.
cipalmente no que diz respeito às interpretações re-
As acusações e preconceitos eram m útuos e foi
ligiosas. Com o já foi dito anteriorm ente, os judeus
provenientes da Galileia eram recebidos com certo neste turbilhão de preconceitos internos que surgiu o
desdém na Judeia que arvorava a vantagem de pos m ovim ento de Jesus.
Or, Jdü
C .

c
0 Talm ude de Jerusalém recorda 0 deses- pero de
um sábio judeu do século I, chamado
Você
sabia?
Yohanan ben Zakkai, que não pode fazer mais que As narrativas dos Evangelhos e 0simbolismo
duas perguntas sobre a lei em todos os 18 anos das parábolas de Cristo remetem
que passou ensinando na G alileia: "Oh G alileia, Oh constantemente a uma geografia eaum
G alileia! No final das contas você vai acabar cheia ecossistema que perma- neceram em grande
de m a lfe ito re s !"16 parte inalterados até os dias de hoje. A cidade
“edificada sobre um monte" (Mat. 5:14), os
lírios do campo (Mat. 6:28), as

raposas em seus covis (Mat. 8:20) são


elementos ainda vistos em diversos cantos da
Terra Santa, especialmente na Galileia onde
Jesus exerceu a maiorparte de seu ministério.

c
G
eH‫־‬c r ‫׳‬b ü '3 ‫־‬T u

e Séforis. Para muitos, a convivência gerava uma perda de


valores e uma paganização cultural do ambiente.
Fato importante
Lugar inapropriado para surgir umMessias!
—co ».....

Mateus, citando Isaias, chama as cidades do


entorno do Lago de “Galileia dosgentios", isto
‫ס‬
o

é, “Galileia dos nãojudeus" (Mat. 4:15). O qua-


dro demográfico da região ajuda a entender ‫־‬U^r
0 apelido.

Mesmo que a miscigenação entre judeus enão


...............

judeus na Galileia não tenha sido uma realidade


histórica propriamente dita ou confirmada, sua
‫־‬

região era literalmente cercadapor territórios


cujos moradores, além de estrangeiros, não
eram bem aceitos na convivência com judeus
-
........ - ............■

mais zelo- sos da Lei. Estas regiões seriam:


Samaria, Pereia e os centros romanos da extensa
Decápolis.

Isso inseriu geograficamente a região num


1

mosaico de culturas, cujo contato com


elementos estrangeiros era inevitável. Centros
urbanos mais conservadores como Cafarnaum
eMagdala tinham de conviver com cidades
completamente romanizadas como T iberíades
Populações da
Terra Santa
De acordo com dados oficiais, a
população de Is- rael entrou no
segundo decênio do século XXI com
aproxim adam ente 8 milhões de
habitantes, sendo 6 m ilhões judeus e 2
milhões de palestinos, árabes e ou- tras
etnias. Mas os núm eros no tem po de
Jesus eram bem inferiores a isso17.

Dados recolhidos da arqueologia,


m étodos dedu- tivos, análise
demográfica, restos de censos rom a-
nos e escritos de alguns autores
(como Tácito, Filo e Josefo) perm
item ter um a ideia da quantidade de
pessoas existentes nas regiões por
onde passou Je- sus. O problem a,
porém , é que essas fontes não são
precisas. Algumas m ostram -se
exageradas, publici- tárias ou
incongruentes.

M esmo entre os autores m odernos,


os núm eros variam de estudo para
estudo. Assim, o que se pode ter são
estimativas, sem a m enor pretensão de
serem núm eros exatos ou absolutos18.

Acredita-se que o território


percorrido pelo M estre da Galileia
contava com algo entre 500 e 700 mil
habi- tantes ou 1 milhão se forem
incluídos os não judeus. De modo mais
específico, eis alguns núm eros aproxi-
mados de lugares de destaque na vida
de Jesus Cristo:
LOCAL NÚMERO APROXIMADO DE HABITANTES

Jerusalém 50 mil (chegando a 250 mil durante as festas religiosas)

Cafamaum 600 a 1.500

Belém 1.000 '

Nazaré 200 a 500

Magdala 40.000 (de acordo com Josefo)

Betsaida 200

200 a 400 mil - Josefo fala de 3 milhões, mas os historiadores consideram isso um
Galileia exagero

Judeia 100 a 150 mil

jClq . £ 2 ‫׳‬. e essênios), m uitos pensam que o judaísmo seria um


O bloco m onolítico de características não m uito diver-
o sificadas. Trem endo erro!
Você sabia?
Tal negligência torna-se ainda mais agravante
Especialistas em demografia afirmam
quando estas noções m onolíticas são im portadas
que nos tempos de Cristo a população de
para um a tentativa de reconstrução histórico-con-
todo 0 planeta girava em torno de 300
textual do m undo que recebeu o cristianism o prim
milhões de habitantes, menor que a
i-
população atual dos
Estados Unidos. O número dejudeus tivo. Na realidade, a própria esperança m essiânica
espalha- dospelo império romano, deveria ser vista dentro de um arcabouço m ultifa-
residindofora de Israel, seria de4a6 milhões cetado. Com o diz Neufeld, aludindo ao judaísm o do
de pessoas. ‫ר‬ Segundo Tem plo: “C ontrário à suposição tradicio-
O nal de um m essianism o inequívoco e consistente
c
G no judaísm o prim itivo, num erosos estudos recentes
t‫ ׳‬o
têm dem onstrado que o m essianism o era um
fenô-
conheçam a existência de um ou outro segmento ju-
Um judaísmo pfurai daico m encionado no N T (fariseus, saduceus, zelotas

Um dos erros mais comuns cometidos por deter-


minadas abordagens do judaísmo dos dias de Jesus é a
desconsideração de seu caráter plural. Ainda que re-
m eno fluido e diversificado”19.

Kay Sm ith completa: “A partir, aproxim adam en-


te, do III século a.C. ao II século d.C., o m undo do judaísm
o era trem endam ente pluralístico. D uran- te o
período do Segundo Tem plo, os judeus inter-
pretaram e interagiram com suas Escrituras de um
m odo bem diferente do atual.”20
Uma das características dominantes entre os judeus relação com um m ovim ento chamado apocalipsis-
que viveram no período em que nasceu o movimento m o, que surgiu nos tem pos do A ntigo Testam ento,
de Jesus era justamente a proliferação de múltiplas seitas gerou estilos de livros chamados “apocalipse”, den-
judaicas, embora várias delas possivelmente ainda per-
tre eles o que aparece por últim o nas Bíblias de hoje.
maneçam desconhecidas para nós. O curioso, no entan-
to, era que o povo comum da época (talvez a maioria) Prisioneiros da Assíria, Babilônia e depois de An-
não se filiava oficialmente a nenhum desses segmentos tíoco e Roma, o povo judeu quase perdeu suas espe-
que propositalmente advogavam certo elitismo em seu ranças e sua alegria. Com essas perdas, uns viam sua
processo de filiação.21 fé esm orecer enquanto outros se sentiam atraídos
pela idolatria pagã. E, como se não bastasse, os en-
É im portante tam bém evitar o anacronism o de
sinos da palavra de Deus estavam ficando cada vez
encarar essa diversidade dentro do judaísm o anti-
mais esquecidos, especialm ente depois da ameaça
go como sendo um decalque exato dos segm entos
ideológica do helenism o. O chamado “m ilagre gre-
independentes que hoje tem os no Ocidente, onde é
go” m ergulhara o m undo num m odo de com preen-
possível reconhecer m últiplas ‫״‬religiões” dentro da
são da realidade bem diferente daqueles ensinados
religiosidade m aior chamada “cristianism o”. Fari-
por M oisés e os profetas.
seus e Saduceus não são segm entos do judaísm o se-
m elhantes a presbiterianos e adventistas dentro do O povo precisava de um a revelação, de um a de-
cristianism o. m onstração divina de que ainda havia esperança. E
é exatamente isso que significa o term o apocalip-
Do mesmo m odo, o conceito de "seitas” judaicas
se e seus derivados (apocalipsismo, apocalíptica).
não se enquadra dentro da caracterização m oderna
Etmologicam ente falando, a palavra vem da junção
de “seitas” com um ao debate evangélico atual acerca
de dois term os gregos: Apó - que quer dizer ‫״‬afastado
da ortodoxia versus sectarismo no m ovim ento cris-
de”, “contrário a” e kaliptô - esconder, ocultar. Assim,
tão. Josefo, por exemplo, usa prodigam ente a palavra
apocalipse é literalm ente a ação de retirar do escon-
grega hairesis para todos os segmentos judaicos que
derijo, trazer para as claras, em suma, “revelar”.
menciona, mas mais frequentem ente para fariseus e
saduceus. O livro de Atos, por sua vez, aplica o term o Foi, portanto, vivendo a realidade do cativeiro
ao próprio m ovim ento de Jesus (24:5,14; 28:22). Essa e a necessidade de um a resposta espiritual para o
term inologia, como lem bra M aier, corresponde ao povo que escritores anônim os com eçaram a produ-
uso corrente das escolas helênicas de filosofia2 . zir livros num estilo “apocalíptico”, com o objetivo
Ademais, é im portante reconhecer que o que de restaurar a tradição perdida e dar algum confor-
geralm ente cham am os de “cristianism o prim itivo” to para aqueles que já haviam perdido a esperança
ou, talvez m elhor, “o m ovim ento de Jesus” é, na quanto ao futuro. Seus tratados consistiam , pois, de
verdade, um dentre m uitos grupos ou seitas judai- visões e experiências místicas acerca do fim do m un-
cas que disputavam espaço tan to no corredor sírio do e da intervenção de Javé para libertar seu povo.
palestinense do prim eiro século quanto na diáspora Alguns, de linha mais messiânica, transform avam
estabelecida na geografia do M editerrâneo. Ao que seu escrito num a defesa à vinda do Salvador prom e-
tudo indica, essas distinções no judaísm o são frutos tido. A perspectiva, porém , era de um a salvação poli-
do apocalipsismo que se acentuou na cultura judaica tica. Alguém que viria com um exército, enviado por
especialm ente a p artir do cativeiro babilônico 23. Deus, para libertar o povo judeu de seus opressores.

A m aioria desses autores, é claro, não seria ins-


O que é apocalipsismo? pirada p o r Deus. Eram apenas judeus, talvez de boa
intenção, refletindo sobre sua fé e procurando con-
Quando se fala em Apocalipse, m uitos im ediata- solar o povo. M as houve entre eles alguns autores
m ente pensam no fam oso livro que leva esse nom e. inspirados como João, no N ovo T estam ento e Da-
Mas a palavra tem um sentido mais amplo. Ela tem niel, no Antigo.
Toda a literatura apocalíptica é, portanto, esca- É claro que não temos condições de afirmar os
tológica e messiânica em sua essência. Ela aborda a graus de relacionamento entre Zoroastro e os judeus
questão do tem po do fim, 0 térm ino deste m undo no período Persa (ou se houve efetiva comunicação
conform e o conhecemos e o começo de um novo ci- entre ambos). Contudo, percebe-se que já havia mes-
cio, ou, em alguns casos, o começo da eternidade. Seu mo naquele ambiente gentílico a ideia de uma renova-
objetivo principal era dar esperança aos que a liam. ção cosmológica do m undo trazida por uma persona-
Contudo, é inseguro afirm ar que essa literatura tenha gem singular na história que os judeus reconheceriam
se tornado 0 centro do judaísmo pensante. como sendo o Messias.

O rabinism o contem porâneo a Jesus praticam en- No que diz respeito ao judaísm o propriam ente
te ignorou essa literatura. Porém, na boca do povo dito e aos livros que com põem o cânon do Antigo
simples, tais relatos parecem ter ganhado m uita fama. Testam ento, é notório que as concepções de fim do
Afinal, eles eram sofredores nas mãos romanas, não m undo e juízo universal de Deus são anteriores até
tinham a cultura dos escribas, não sabiam brigar m esm o ao período Persa. Os Salmos 96 a 98, por
como os zelotas, nem podiam fazer política como os exemplo, são claram ente do período m onárquico e
saduceus e fariseus. Sua esperança repousava na cer- trazem vividas descrições da intervenção últim a de
teza da intervenção divina. Como a m aior parte des- Deus na história. Logo, ao contrário do que defen-
tes foi atraída pela palavra de Cristo, não é sem razão deu N orm an C ohn 26, não se pode afirm ar que os he-
que o espírito apocalíptico tam bém tenha feito parte breus tenham derivado de Zoroastro aa noção apo-
do ensino de Cristo, conform e visto em M ateus 24, calíptica de fim do m undo.
por exemplo, e tam bém da pregação da Igreja cristã
prim itiva. As raízes do apocalipsismo judaico não estão de
m odo algum fincadas no m undo não judeu que o
circundava. As coincidências entre um a e outra es-
Movimento apocalíptico e catologia (judaica e persa, por exemplo) podem ser

esperança messiânica explicadas na possível interação durante o cativeiro,


na influência deixada pelos judeus no m undo pérsico
ou no fato de ambos os m ovim entos estarem ecoando
A perspectiva apocalíptica do antigo Israel não
um a tradição escatológica longínqua que se conhecia
nasceu de nenhum a revolução do período dos maca-
desde os prim órdios da hum anidade. Seja como for,
beus como intentam alguns autores m odernos24. Nem
a linha de desenvolvim ento do apocalipsismo judeu
mesmo a literatura apocalíptica apócrifa ou pseudepí-
deve ser traçada até aos próprios profetas hebreus e
grafa, em bora fortem ente influenciada pelos aconte-
não a oráculos pagãos27.
cimentos intertestam entários, pode ser identificada
como produto de um a crise política ou de uma revol- Um fenôm eno curioso, observado especialmente
ta arm ada como aquela liderada por Judas Macabeu nos profetas, é o exercício herm enêutico de m istu-
contra o governo dos selêucidas em 164 a.C. rar eventos histórico-contem porâneos com eventos
escatológicos do futuro. O profeta Amós, por exem-
Autores como Bickerman têm procurado de-
pio, já anunciava no século VIII a.C. que o fim estava
m onstrar que os prim eiros textos apocalípticos fora
chegando para Israel (Amós 8:2). Aqui é claro que ele
da Bíblia, como, por exemplo,, algumas partes do
se referia ao fim do reino do N orte, mas no capítulo 5:18-
livro de Enoque, seriam anteriores ao período dos
20, que faz parte da mesma tem ática profética, ele
macabeus25. Sua argum entação talvez não seja total-
descreve exponencialm ente o chamado “dia do Se- n h
m ente conclusiva, mas supõe um a razoável probabi-
o r”, que certam ente abarca m uito mais do que um juízo
lidade. O próprio tom escatológico encontrado no
im inente sobre a casa de Israel. Isaías igualmen- te m
zoroastrism o do século VI a.C. aponta para essa rea-
istura as promessas de um novo céu e um a nova terra
lidade mais antiga, senão da literatura, pelo m enos do
escatológica com as promessas históricas de um Israel
sentim ento apocalíptico no seio do judaísmo.
abençoado m ediante à fidelidade a Deus (Isa.
66). E mesmo nos tempos de Davi, Natã fez-lhe uma para a m anutenção de seu santuário. Até Jesus pagou
promessa que misturava o acompanhamento divino esse imposto (cf. Mat. 17:24-27).
sobre Salomão com o estabelecimento eterno do trono
davídico (II Sam. 7:11-17) - esse com portam ento do A ordem pública era assegurada internam ente pelo
oráculo é um claro sinal de perspectivas messiânicas. prefeito e pelas milícias romanas. Mas deixavam para
os juizes locais e a polícia judaica a jurisdição de ques-
Jesus tam bém usou o mesmo recurso de m istura tões ordinárias do judaísmo em si. Os rom anos não
de eventos atuais com eventos futuros em seu discur- queriam envolvim ento com polêmicas da religião dos
so escatológico registrado em M ateus 24. Os motivos, judeus, em razão disso poderiam legislar sobre seus
evidentem ente, poderiam ser outros, mas o m étodo é casos. Só não poderiam sentenciar alguém à m orte.
trem endam ente parecido. Isso cabia exclusivamente a Roma. Por isso Jesus foi
A Bíblia hebraica, portanto, m uito antes e além de preso pela guarda do Tem plo, mas transferido poste-
qualquer influência estrangeira, m ostra-se fortem en- riorm ente para o palácio de Pilatos.
te marcada pela esperança de um “m undo vindouro”
Olam habbah) e um a personagem messiânica que
propiciaria a Salvação. Mas a versão profética mais
A centralidade do Templo
antiga não lim ita a esperança do Messias à vinda de No tem po de Cristo, o poder judaico se centraliza-
um futuro rei, idealizado aos moldes m onárquicos,
va no Tem plo de Jerusalém . Logo, m esm o que'a Ju-
que traria a projeção política de Israel entre as nações.
deia pertencesse à jurisdição rom ana como qualquer
Pelo contrário, ela apontava para a natureza vicária
outra província, o governador respeitava a organiza-
do Messias visto como o servo sofredor de Isaías 53.
ção interna do território ocupado e só intervinha em
casos extremos, a fim de evitar desnecessários confli-
Estrutura política tos com os subjugados.

do judaísmo Assim, todos os cerca de 6 milhões de judeus espa-


lhados pelo im pério rom ano dependiam da jurisdição
Toda estrutura política é demarcada por três pila- de Jerusalém para tratar de assuntos internos do ju-
res nos quais o poder é exercido: daísmo. E qual era a dinâmica política para atender a
todo esse contingente de pessoas?
1) a cobrança e o direcionam ento dos impostos;

2) a ordem pública;
O Sinédrio
3) a elaboração e a execução do direito e da justiça.
Configurou-se junto ao Tem plo o Sinédrio ou Sa-
Nos tem pos de Cristo esses três setores eram es- nhedrin, um a assembleia de anciãos existente desde os
rritam ente controlados por Roma, m esm o que tem pos helenísticos, mas cujas raízes conceituais vêm
usasse dos dias de Moisés (Números 11:16). O Sinédrio - pa-
:uncionários judeus para o exercício do dever. Era o lavra que literalm ente significa “assembleia sentada”
caso dos publicamos que coletavam impostos da po- - era uma espécie de Suprema Corte da lei judaica que
pulação para entregar aos rom anos e, por isso, eram tinha por função adm inistrar a justiça, interpretando
:‫׳‬diados pelo povo. M ateus, um dos apóstolos de e aplicando a T orá (ou Lei de Moisés), tanto em seu
Cristo, era um ex-publicano. aspecto oral quanto escrito. Ele exercia, simultanea-
Os judeus, é claro, não suportavam m uito essa m ente, a representação legal do povo judeu perante a
"intromissão adm inistrativa” de estrangeiros em sua autoridade rom ana.
:erra. Contudo, admitia-se que os rom anos tam bém
Existem várias referências nos evangelhos ao Siné-
Deneficiavam o povo ao pavim entar estradas de aces-
drio e àqueles que o com punham . Sobre o julgamento
so a Jerusalém e garantir a segurança e o transporte
de Cristo é dito: “Então os principais sacerdotes e os
áo imposto do Tem plo cobrado dos próprios judeus
anciãos do povo se reuniram no palácio do sumo sa-
cerdote, chamado Caifás” (Mat. 26:3). De igual modo, 0
os evangelhos esclarecem que foram os com ponentes c ‫ג‬
do Sinédrio que processaram Jesus junto a Pilatos e
instigaram o povo a escolher Barrabás para ser solto, Você sabia?
ao invés de libertar Cristo (Mat. 27:11-26; cf. Mat.
Roma ergueu em seu território um conjun-
5:22; 26:59 e M ar. 15:1).
to defortificações, delimitações e
Todas as cidades que tinham um a com unidade ocupações chamadas “limes”que
judaica poderiam possuir um pequeno Sinédrio, ou configuram as bor- das de seu império.
Sinédrio M enor, com posto por 23 juizes. Mas ape- Para eles, os limites de Roma eram os
nas Jerusalém poderia ter o Grande Sinédrio com limites do mundo civilizado. O que
71 m em bros, a saber: o sumo sacerdote (presiden- estavafora dessas linhas deveria ser
te), um vice presidente ou chefe de justiça e mais 69 considerado bárbaro, inferior, sub-huma-
m em bros rotativos. Apenas o chefe dos no. Assim, reforçava-se apropaganda que
sacerdotes, insistia em dizer aospovos conquistados
que considerassem um privilégiofazer
parte do

anciãos, escribas, fariseus e saauceus eram elegíveis grandioso império romano.


C.

h
para assum ir um a cadeira no concilio. Exigia-se dos c ' ‫ר‬
m em bros: m odéstia, decência, força, coragem e po- d p
pularidade entre seus pares. 9 ^ 5 ^ ζ ιιζ ιζ ιιζ τ ζ τ ζ ^ ζ ζ ζ ζ ζ ζ ζ ζ ^ τ π τ Ε

- ^ 5 ...... -
. .. .. .. .. .. ... ......... · = = - :........
ri Partidarismos e b

fcüf ........................................Lp? messianlsmos


‫ץ‬ FFa iimmppoor c
attoo rttaannttee Em bora houvesse diferentes e divergentes expec-
A política no tempo de JJessus era instável. Os jjudeus . . , , , ‫ ך‬T ‫׳‬ , . ,.
, • 1 1 i . , . tativas entre os judeus do século 1, e possível dizer que
jâa vinham traumatizados de uma longa trajettóornia
j ~ · . r ■. m uitos deles ag uardavam com ansiedade um
d e ocupaçcõo es e conqui st asfje i t as por &
. Messias clue fosse um conquistador político e
out ros povos
religioso. Al-
sobre seupróprio território. Primeiro vieram os §uém <lu e‫ ׳‬à semelhança do rei Davi, os liderasse num
asúrios, depois os babilônios, osgregos ea cada grande exército e expulsasse os rom anos de seu terri-
nova ocupação, 00povo era espalhadopelos tório. T al anseio não parecia corresponder à proposta
quatro ventos 00 que aumentava 00 desafio de trazida p or Jesus de Nazaré.
manter sua identidade e sua etnia. Alguns
eram circunstan- cialmente mais liberais ou Nesse quadro messiânico e pluricultural, diferen-
“tolerantes" em relação ao estrangeiro tes grupos rivalizavam pelo poder e pela influência
"invasor”, enquanto outros acalen- tavam sobre o povo. Destes, pelo m enos três disputavam as
maiorxenofobia.
Foi em meio a essecaos que emergiam os A ■ ‫י‬ c ‫׳‬, 3 1 · ‫י‬
romanos, . ·
‫י‬ * ' cadeiras do Sm edno: os saduceus (o m aior partido,
os novos dominadores estrangeiros. Eles eram r , , , , ‫\י‬ ,,
. , · ■ _ , . , . form ado pela ciasse sacerdotal), os anciaos (chefes
efetivos na adminmistração dos territóorioes con-
.. j u .· de fam ília rica q ue eram indicados p elos
n r
qui s tad os e naão aceitavam nen hum t ipo
j ‫ג‬ c■ rom anos) e os escribas (° Partido m inoritário, form
d e d esa f io à soberania de Roma. Para eles, ado em sua m aior parte por fariseus). Os três nem
quem não era cidadão romano, erabbáárbaro e, sempre esta-
portanto, incapaz degovernar a si mesmo. vam de acordo, mas acabavam fazendo alianças por
Defato, elesforam tão m otivos políticos de interesse comum entre eles.
bem-sucedidos queum terço do mundo conhecido de

.^ então estava sob 00 domínio de César. ÇJ


cc l b ‫׳‬j Os dois prim eiros partidos, form ados pelos sadu-
^‫כ‬ ^ p ^o ceus e anciãos, tinh am m ais pon tos de afinidade. Já o
u ütõo nà L9·- ......... ....... .................‫״‬,.,.. ..‫״‬ ‫ל‬.F Ct p ITl 3u TD partido dos fariseus
representava a oposição. Segun-
Maquete do antigo Templo de Jerusalém

do Flávio Josefo, havia cerca de 6.000 fariseus apenas,


tilo legalista, mas inteiram ente inovador. Assim, os fa-
mas o núm ero de simpatizantes era elevado se com-
riseus eram irrepreensíveis aos olhos do povo, ao pas-
parado aos demais. O segredo de sua influência era
so que os sacerdotes-saduceus eram quase totalm ente
o duplo com portam ento que m antinham . Prim eira-
desconhecidos e os anciãos do povo, irrelevantes.
mente, diante da massa popular, os fariseus demons-
travam um a piedade judaica tão elevada (orações Considerando que os três principais partidos
públicas, guarda do sábado, pagam ento integral dos
juntos somavam algo em torno de 10.000 a 25.000
dízimos etc.), que os mais simples lhes consideravam
partidários, pode-se dizer que 95% da população de
homens santos.
todo o território judeu não era diretam ente filiada a
Por outro lado, se opunham à nobreza sacerdotal nenhum a dessas correntes. A população era leiga em
e dos anciãos da área religiosa, constituindo-se uma relação à m aioria das discussões religiosas dessa elite
nova classe de interpretação das Escrituras com um es
da fé judaica.
Os partidos Judaicos afastam ento das massas populares, ignorantes, vulga-
res e pecadoras.
Antes de apresentar os partidos ou seitas do tem po
Com o se não bastasse tal incoerência, os fariseus
de Jesus, é im portante esclarecer que esta linguagem
ocuparam um lugar no Sinédrio por causa de sua ori-
não deve ser confundida com o sentido m oderno de
gem hum ilde e sua suposta influência sobre o povo.
partido político ou seita religiosa. Tratava-se antes
Considerados inicialmente um grupo religiosamente
de um a escola de pensam ento com ensinam entos ou
leigo (embora alguns fossem levitas), os fariseus re-
princípios que deviam ser observados por aqueles que
presentavam certa imagem de democracia no conse-
se filiam àquela agremiação.
lho dos sacerdotes e anciãos do povo.
Para falar dos partidos existentes entre os judeus
Os fariseus eram, portanto, trem endam ente con-
do tem po de Cristo, tam bém é preciso levar em con-
servadores, avessos às influências estrangeiras sobre
sideração duas realidades históricas: prim eiro, que o
o judaísmo e teoricam ente inim igos tanto da aris-
judaísmo do século I, longe de ser um bloco m onolí-
tocracia sacerdotal (os sacerdotes-chefes) quanto da
tico, revelava-se um mosaico de ideias e segmentos
aristocracia leiga (os anciãos). O m otivo estava no
com m uitas diversidaaes de interpretação. Segundo,
com prom etim ento desses segmentos tanto com a
que a distinção m oderna entre política e religião não
política rom ana quanto com as influências gregas na
era com um naqueles tempos; as questões políticas
com preensão da Lei de Moisés. Isso fora certas diver-
mesclavam-se com as religiosas, de m odo que a hber-
gências doutrinárias. Mas o poder político os m anti-
tação dos rom anos, por exemplo, era tanto um anseio
nha, pelo m enos em. parte, unidos. Era como se fos-
social quanto um a expectativa messiânica. A seguir,
sem um congresso nacional com partidos de situação
você verá os principais partidos judaicos dos tem pos
e oposição discutindo leis e votações.
de Cristo, tanto os que atuavam no Sinédrio quanto
os que coexistiam paralelos a ele: Os fariseus são constantem ente associados aos es-
cribas, isto é, profissionais jurídicos especializados na
1 - F ariseu s - com punham um a associação de explicação da lei ou torá (Mat. 22:35; 23:2; Luc. 5:17
judeus piedosos cujas origens rem etem ao período etc.). M uitos fariseus tornaram -se escribas até para
dos macabeus. No período de João Hircano (135-104 assegurar m elhor seu lugar no Sinédrio, mas nem to-
a.C.) e Alexandre Janeu (103-76 a.C.), já existem, re- dos os escribas eram de fato fariseus.
ferências a esse grupo religioso. Eles tratavam -se en-
tre si como “com panheiros”, organizavam-se em co- 2 - S aduceus - em bora as origens desse
grupo
munidades, tom avam refeições em comum e tinham 0 próprio nom e dá a entender, seu ideal de vida
intervenções piíblicas quando preciso. O regime de era o
admissão e exclusão do grupo era bem severo. Seu tí-
tulo ‫״‬fariseu” vinha da palavra hebraica perushim, que
quer dizer ‫״‬separados ou separatistas”.

A tradição rabínica posterior usou uma ironia para


retratar o separatismo dos fariseus ao dizer que um fa-
riseu jamais comeria, por exemplo, na presença de um
hom em com doença venérea, mesmo que ele próprio
já estivesse antes contaminado pela mesma doença.

O curioso, no entanto, é que a m aioria dos fari-


seus vinha das classes medianas da sociedade, m uitos,
antes de serem recrutados para a seita, haviam sido
artesãos ou pequenos comerciantes. Contudo, como
ainda sejam incertas, tudo leva a crer que seu poder
começou tam bém nos dias de João Hircano, cerca de
130 anos antes de Cristo, quando certas questões públicas
começaram a surgir perante o povo. Talvez viessem das
classes ricas, mas tudo leva a crer que a aristocracia
sacerdotal foi o berço desse seguimento. Tanto que o Tem
plo e o sumo sacerdote foram sem- pre a coluna m estra
do poder dos saduceus. Não se deram bem com Herodes e
seus filhos, mas agiram desde o ano 6 a 70 d.C. como
árbitros na política de conciliação dos judeus com os
romanos.

Enquanto os fariseus se espalhavam por todo o


território, os saduceus cstavam mais concentrados em
Jerusalém. Na verdade eram poucos em núm e- ro, mas
influentes em term os políticos. Tinham total apoio dos
rom anos que m antinham seus privilégios
em troca de sua fidelidade. Praticam ente todos os sa- cinco livros de M oisés a qualquer outro produzido
cerdotes e aristocratas dos tem pos de Cristo eram sa- pelo judaísm o.
duceus. Pouquíssimos evitaram o envolvim ento com
Assim, o que im portava era a sobrevivência atu-
o partido. Provavelm ente Zacarias, o pai de João Ba-
al da nação. Assuntos como ressurreição de m ortos,
tista, fosse um desses.
existência de anjos e recom pensa eterna era algo que
Mas, apesar de poderosos e influentes, os sadu- reputavam como acréscimos tardios que nada t inham
ceus não gozavam da sim patia do povo e viviam ex- a ver com a revelação dada a Moisés (Mat. 22:23-33;
cluídos (mais que os fariseus). Se por um lado eram Mar. 12;18-27; Luc. 20:27-40).
bastante liberais no diálogo com o m undo greco-ro-
3 - A nciãos do P o v o - diferente da sociedade atual
m ano, por outro, seguiam um doutrinam ento con- que tende a considerar os mais velhos como ultrapas-
servador, coerente com sua posição política. Eram sados, o “ancião do povo” foi um a figura sempre res-
defensores da ordem estabelecida e privilegiavam os peitada na cultura do O riente M édio, especialmente
na Bíblia. O hom em idoso era costum eiram ente tido Herodes, o Grande, quanto seu sobrinho, Herodes
em alta estima tanto por sua experiência quanto pelo Agripa, pretenderam ser os escolhidos de Deus para
seu conhecim ento, sabedoria e bom senso. Assim não governar Israel. Logo, não é estranho supor que este
era incom um as pessoas recorrerem aos anciãos para m onarca, ou pelo m enos seus defensores, tivessem
decidirem casos litigiosos, pendências jurídicas ou até pretensões messiânicas ao defender o reinado de al-
mesmo disputas doutrinárias (Núm. 16:25; Lev. 4:15; guém tão odiado pela m aioria da população.
ISam . 15:30; I Reis 20:7).
Talvez essa possível visão messiânica explique o
Porém , com o crescim ento da população em áre- porquê da forte oposição que os herodianos fizeram
as urbanas e o estabelecim ento de certas form as de contra Jesus, unindo-se até mesmo com fariseus para
governo, a expressão “ancião do povo” já não dizia destruí-lo (M at.l4 :l-12 ; 22:16; M ar. 3:6; 12:13; Luc.
respeito a todos os idosos da nação, mas apenas a 23:7-12). Afinal de contas, se Herodes era seu Mes-
um a elite assim designada para orientar e legislar
sias, Jesus de Nazaré seria um forte concorrente e ti-
sobre todos.
nha de ser eliminado.
No tem po de Cristo, os anciãos eram aqueles che-
5 - Essênios - representavam um a comunidade
fes de família de origem pura e rica que poderiam ser
m onástica que vivia no deserto da Judeia, separada
elegíveis para atuar no Sinédrio. Os rom anos esco-
dos grandes centros urbanos, especialmente Jerusa-
lhiam dentre eles aqueles que deveriam servir de lí-
lém. Acredita-se que, pelo fato de não aceitarem a po-
deres sobre o povo judeu ao lado dos sacerdotes. A
lítica incorreta que se fazia no Sinédrio e no Tem plo,
ideia é que os anciãos m anteriam o povo calmo e, em
um grupo de levitas rom peu com suas funções sacer-
contrapartida, Roma faria certa “v ista grossa” acerca
dotais, fundando a seita que existiu do II ou III século
de suas próprias fortunas que estariam atreladas ao
a.C. até cerca do ano 68 d.C. no deserto da Judeia,
recolhim ento de impostos no país. Tudo não passava
próxim o ao M ar M orto.
de um jogo de interesses.
Norm alm ente, acredita-se que eles form avam a
4 - H erodianos - após a morte de Herodes, o Gran-
comunidade que havia em Q um ran, da qual só resta-
de, e a divisão do reino entre seus filhos, quem mais se
ram ruínas. Tam bém associa-se a eles a produção ou
destacou no governo foi Herodes Antipas que ficou com
pelo m enos preservação dos famosos m anuscritos do
a jurisdição da Galileia onde morava Jesus. Ali, Flávio
M ar M orto, descobertos em 1947.
Josefo afirma ter surgido um grupo de judeus militan-
tes cuja função era apoiar a todo custo a permanência de O Novo Testam ento não faz menção deles, contu-
Herodes no poder e a ampliação de seu controle. do, seus textos perm item ter uma ideia do que acre-
ditavam, além de lançar luz em m uitos aspectos do
Tam bém na Judeia havia partidários dessa agre-
ensino de Cristo. Eles, por exemplo, consideravam o
miação que, certam ente, eram beneficiados com a ad-
sacerdócio de Jerusalém ilegítimo, uma vez que mui-
m inistração herodiana desde os tem pos de Herodes, o
tos já não eram mais da família de Zadoque. Rejeita-
Grande. Ele nom eou como sumo sacerdote um certo
vam a validade dos ofícios do Tem plo e entendiam ,
Simão, filho de Boetos, e com isso teve grande apoio
por estudos de antigas profecias, que o Messias estava
desta poderosa família de judeus até mesmo nas gera-
por vir em seu tem po. Alguns de seus textos, porém ,
ções seguintes.
dão a entender que eles aguardavam a vinda de não
Não eram um grupo expressivo. Ao que tudo indi- apenas um , mas de dois Messias.
ca, seu objetivo era fortalecer o poder de Herodes An-
6 - Z elotes - como o próprio nom e diz, “Zelote”
tipas sobre toda a nação, obtendo tem porariam ente o
ou “Zelota” significa alguém que tem um zelo, uma
apoio de Roma, até que estivessem fortes o bastante
paixão, um fervor, em bora com certo tom de fana-
para quebrar o jugo dos romanos.
tism o. Eles eram tam bém conhecidos com o sicários
Em bora não haja nenhum a alusão direta a Hero- ou hom ens do punhal. “Sica” era um pequeno pu-
des Antipas como Messias, é sabido que tanto seu pai, nhal rom ano.
Os zelotes eram , enfim, um grupo intensam ente serem a mais baixa classe de funcionários públicos
patriótico. Eles advogavam que qualquer m étodo, do que recolhiam os im postos para César. Com o se não
m artírio ao assassinato, seria válido na tentativa de bastasse, eles eram reconhecidos por sua desonesti-
livrar os judeus do jugo de Roma. dade, desvio de fundos e extorsão de pessoas m enos
Em term os religiosos, Josefo diz que eles separa- favorecidas (Mat. 6:46).
vam-se até mesmo dos fariseus, por considerá-los Os publicanos cobravam taxas ilegais e, de alguma
m uito indulgentes com a presença de estrangeiros em m aneira, Rom a não parecia se im portar com isso. O
seu país. Mas tam bém eram fervorosos com a lei ju- que im portava era que o m ontante m ínim o esperado
daica. T anto que censuraram os judeus que aceitavam chegasse aos cofres do império. O que o coletor lu-
pagam ento vindo do tributo dado aos rom anos e por crasse além disso era problem a dele, os representan-
adm itirem chefes m ortais ao lado de Deus. Seu intui-
tes do im pério não se m eteriam. Afinal, o interesse do
to era prom over uma reform a radical que envolveria
próprio coletor em angariar mais impostos a fim de
a sociedade, uma revitalização das instituições mais
aum entar sua propina term inava deixando o sistema
im portantes do país (especialmente o Templo) e uma
seguro para o governo, que tinha seu m ontante m ini-
m anutenção de sua identidade original.
m o sempre garantido.
Contudo, não eram tão bons na arte da guerra,
N orm alm ente, os publicanos não tinham respon-
muito m enos nas reformas que pretendiam . Seu m o-
sabilidade sobre as taxas de propriedade ou decla-
vim ento foi um verdadeiro fracasso, embora insistis-
ração de renda dos indivíduos. Sua função era taxar
sem em m uitas investidas contra Roma.
produtos comerciais que entravam e saiam no país -
Um dos apóstolos de Jesus chamado Simão é re- im portação e exportação. Em bora trabalhassem para
conhecido pela alcunha de “o zelote” (Luc. 6:15 e At. o governo, eram contratados: um a espécie de funcio-
1:13). Mas isso pode ser tanto por um a possível asso- nário público terceirizado.
ciação anterior com o partido dos zelotes quanto por
Seus direitos e deveres não podem ser definidos
causa de sua personalidade em relação à lei. Afinal,
em detalhes. C ontudo se sabe que um coletor de im-
Paulo era fariseu antes de se unir ao cristianismo, mas
postos que lograsse o título de cidadão rom ano teria
também se descreveu certa vez como um zelote reli-
total isenção das taxas impostas por outros publica-
gioso (At. 22:3).
nos provinciais.
Contudo, mesmo sendo impossível afirm ar cate-
A expressão “publicanos e pecadores” (Luc. 15:1;
goricamente se Simão era um ex-zelote que resol-
M at. 21:31) é um a evidência clara do nível de impo-
veu seguir Cristo, pode-se dizer que o pensam ento
pularidade que estes cidadãos gozavam. Associar-se a
revolucionário desse grupo estava presente entre os
eles sem ser mal visto ou torná-los honestos era uma
discípulos de Jesus. Eles esperavam que seu M estre
tarefa impossível para a mentalidade daquela época.
expulsasse os rom anos e reestabelecesse o reino a
Israel (At. 1:6). Em algumas ocasiões m ostravam -se Os rabinos diziam que quem entrasse na casa de um
violentos e prontos para o combate arm ado, mas Je- cobrador de impostos estaria im undo e quem recebesse
sus recusou a violência (Mat. 26:51 e 52). O reino que um em casa também. Os publicanos eram vulgarmente
Jesus proclam ara não seria deste m undo (Jo. 18:36). comparados a prostitutas, e os romanos os compara-
vam aos donos de bordel. Talvez por isso Jesus disse
7 - Publicanos - não constituíam bem um parti- ironicamente aos líderes judeus: “Publicanos e prosti-
do político, m uito m enos religioso, mas um a classe de tutas vos precedem no reino de Deus” (Mat. 21:31).
cidadãos odiados por todo m undo. Apenas os lepro-
sos e estrangeiros dom inadores eram mais rejeitados As conversões de Zaqueu, em Jericó, e Levi Ma-
que eles. teus em Cafarnaum, certam ente assom braram muitas
pessoas e escandalizaram os que estavam consideran-
Os publicanos tam bém eram judeus, mas a abo- do a mensagem de Cristo. O fato de Jesus associar-se
minação de seus com patriotas se dava pelo fato deles a esse tipo de gente trouxe interrogações ao seu mi-
nistério. Afinal os publicanos não eram bem -vindos "Dai a César 0 que é de César"
nem na sinagoga nem nas dependências do Templo. Estima-se que a Judeia era uma das pro- víncias
Poucos deles devem ter tido a chance de ouvir uma com m aior taxa de impostos no império romano. Na
pregação de Jesus dentro de um a sinagoga. Se fossem, época de Herodes, 0 Grande, have- ria peio menos
seriam banidos dali (Luc. 15:1 e 2). 250,000 trabalhadores ativos do sexo masculino e
todos deveriam pagar impos- tos para 0 governo - 0
Contudo, talvez pela influência de M ateus, que se
que certam ente engor- dava os cofres de Roma e do
tornara seu discípulo, m uitos outros publicanos pas- próprio Herodes. Em síntese, havia quatro tipos de
saram a seguir Jesus (Mar. 2:14 e 15). A lista dos m ar- tributos:
ginalizados em sua companhia não parecia pequena. Tributo da terra (Tributum soli)- agriculto- res,
A todos, porém , Cristo ordenava o abandono da de- grandes e pequenos, fazendeiros e demais homens do
sonestidade e da corrupção (Luc. 3:12-13; 19:18). campo deveriam tributar 10% de tudo que produziam
anualm ente para os cofres do governo. Quem morava
nas cidades pagava 0 mesmo percentual como imposto
pela casa, ainda que fosse alugada.
Tributo do censo (Tributum capitas) - b a -
seado na contagem da população. Depen- dendo
do núm ero de h a bitantes, poderia ser de 1 denário
por pessoa, ta n to m ulheres de 12-65 anos, quanto
homens de 14-65 anos. Crianças eram isentas.
Imposto aduaneiro (Portoria) - t a x a s de co- mércio
eram cobradas por oficiais de porto, de fronteira e
tam bém de coletoria que fiscaliza- va todos os que
entrassem e saíssem de uma cidade. 0 percentual
variava entre 2% e 5% sobre 0 valor do produto
comercializado. Con- tudo, cabia ao publicano avaliar 0
preço real do produto. Além disso, numa longa viagem,
pas- sando por diferentes cidades, portos e postos
aduaneiros, um mercador poderia te r seu pro- duto
taxado diversas vezes.
Tributo do Templo - meio Shekel (ou si- cio)
de prata era exigido como imposto para 0 Templo em
Jerusalém. Este imposto já estava previsto na lei dos
judeus (Êx. 30:11-16) e foi m antido na
administração romana dos tempos de Jesus (M at.
20:2). Nesta época 0 meio Siclo eqüivaleria a 2
dracmas.
Todo judeu que residisse dentro ou fora de
Jerusalém deveria pagar esse tributo oficial- mente e os
publicanos tam bém ficavam res- ponsáveis por arrecadá-
lo, embora em algumas circunstâncias outros poderiam
ser encarrega- dos de fazê-lo para que pessoas tão
execrá- veis moralmente não tivessem contato com 0
dinheiro consagrado para Deus (M a t 17:24-27).
8 - 0 p o v o da Terra - apesar de toda a concor-
debilitava as mãos do povo de Judá e inquietava-os no
rência política e religiosa que os diferentes grupos
edificar”. Vários comentaristas creem que o texto se re-
provocavam, um a boa parte da população (talvez a
fira aos agricultores e camponeses que, por não serem
maioria) não professava seguir nenhum desses seg-
transportados com a aristocracia judaica para a Babi-
m entos em particular. Por isso foram com um ente
lônia, ficaram para trás, adquirindo costumes pagãos.
chamados de am há- ’aretz, isto é, “povo da terra”.
Seja qual for a identificação desse grupo, fica claro
Esse grupo não negava suas raízes judaicas, mas que o sentido de am há- ’aretz não é dos m elhores. Por
não era tão meticuloso no cum prim ento de certos isso, o Talm ude vai identificar o “povo da terra” como
rituais como, por exemplo, as leis de purificação. A "judeus ignorantes da Torá” (ignoramus).
m aioria dos que se identificavam como ‘am há- ’aretz
eram camponeses, artesãos, gente do povo. Contu- Jesus parece ter sido simpático a esse tipo de gente.
do, em term os gerais, mesmo um rico judeu que não Seu interesse era salvá-los, pois eram “como ovelhas
seguisse ao pé da letra os rituais do judaísmo poderia que não têm pastor” (Mar. 6:34). Ademais, o fato de
ser classificado com essa alcunha. alguns seguidores de Cristo com erem sem lavar ceri-
m onialm ente as mãos dem onstra que Jesus se asso-
O interessante é que a expressão am há- ’aretz não ciou ao “povo da terra”.
tinha nos tem pos antigos o caráter pejorativo dos dias
de Cristo. Em Gênesis 23, ela aparece com o sentido
de “conselho tribal”, eram os interm ediários da com-
Família e sociedade
pra que Abraão fez da cova de Macpela. Em outras
Os evangelhos ainda oferecem um retrato m uito
passagens, ‘am há- ’aretz significava apenas “povo, na-
específico da form a de vida dos judeus daquela época.
ção” e poderia ser aplicado a Israel, Judá ou a qualquer
De um m odo geral, as famílias eram monogâmicas,
outro grupo étnico especificado ou não (Gên. 42:6;
patriarcais e indissolúveis - em bora houvesse legali-
Lev. 4:27; 20:2; Jó 12:24).
dade para o divórcio. Jesus faz seu prim eiro milagre
Ao que tudo indica, foi com o fim do cativeiro ba- num a festa de casamento e usa o tem a das bodas em
bilônico e o retorno dos judeus para Jerusalém e Judá várias de suas parábolas.
que a expressão começou a assumir um tom negativo.
Era, enfim, uma sociedade com elem entos tanto
Esdras 4:4 afirma que “o povo da terra (am há- ’aretz)
comuns como estranhos à cultura ocidental moderna.
Aqui você verá alguns temas comuns sobre profissões, saíam da aldeia local para m orar em outro centro. O
educação, infância e entenderá melhor o dia-a-dia dos com um era ficarem por ali mesmo, casarem-se entre
tem pos de Jesus Cristo. si e fortalecerem a perm anência do lugar, gerando a
m aior quantidade possível de filhos.
Gerando filhos A principal tarefa da m ulher era cuidar da casa e
gerar filhos para seu marido. Poucas escapavam dessa
Nos tem pos bíblicos, a união de um hom em e uma função social. Num a sociedade com poucos recursos
m ulher em casamento era a semente de um a nova de segurança e, talvez, elevada m ortalidade infantil,
família. Várias famílias reunidas num mesmo espaço ter m uitos filhos era um seguro de vida. Principal-
rural ou urbano geraram um a sociedade que seria tão m ente quando esses filhos se encarregavam de levar
forte quanto a união daqueles que viviam dentro de adiante o nom e e a linhagem daquela família.
seus limites.
As grávidas, de modo geral, não davam à luz dei-
M esmo que cada casa norm alm ente fosse cercada tadas, mas sentadas e com o amparo de um a ou duas
por m uros altos com apenas um a porta de entrada, as parteiras. O pai, pelos costumes da época, não partici-
residências eram praticam ente coladas umas às outras, pava do parto; esse era um trabalho em que só m ulhe-
de m odo que todos viviam m uito próximos. res tom avam parte. O hom em ficava fora e só podia
Poucos
entrar na casa depois de autorizado pelas mulheres. seguida. Jesus, por exemplo, teve o nom e revelado
Porém, assim que a criança nascia, ele recebia um antes do nascimento.
mensageiro - dependendo de onde estivesse - que lhe
informava se era um m enino ou uma menina. No m undo ocidental o nom e de um bebê é escolhi-
do por m otivos mais convencionais que qualitativos.
O recém-nascido tinha im ediatam ente seu um bi- Por exemplo: nasce um a criança e os pais revolvem
go cortado e atado, a seguir era lavado com água e
dar a ela o nom e de um dos avós ou de um famoso
delicadamente esfregado com sal e óleo, depois dis-
artista da TV e tam bém tem o caso de que o nom e
so o bebê era envolto em faixas geralm ente de linho.
escolhido sim plesm ente é um nom e que a mãe achou
Foi por essa razão que Lucas 2:7 m enciona que M aria
bonito e resolveu registrar assim o seu filho.
enfaixou o m enino e que, em seguida, ele foi visitado
pelos pastores que estavam no campo. Nos tem pos bíblicos não era assim. Cada nom e
hebreu tinha um significado, e ele se tornava parte
As faixas eram geralm ente tiras de aproximada-
im portante da vida da criança. Conhecer o nom e era
mente 10 cm de largura, que enrolavam todo o cor-
conhecer a própria pessoa. Basta citar a escolha do
pinho da criança incluindo suas pernas e braços. Só
nom e Jacó, que quer dizer “agarrador de calcanhar”,
a cabeça ficava parcialm ente de fora. E um pouco es-
ou “suplantador”. Quando ele m udou de vida, Deus,
tranho para a cultura m oderna, mas eles literalm en-
em pessoa, m odificou seu nom e para Israel.
re empacotavam o recém-nascido como se fosse um
pequeno em brulho. Essa era uma form a de proteger O significado de um nom e tinha, geralmente, algo
o corpinho do bebê contra o frio da m adrugada ou da a ver com o caráter, personalidade ou com a história
picada de algum inseto, e tam bém ajudava na hora de de vida de uma pessoa. Por isso, o anjo disse a M aria
:ransportá-lo juntam ente com sua mãe no lombo de que seu m enino deveria se cham ar Jesus, que quer di-
im animal. zer "O Senhor Salva”. Afinal, o que seria ele senão o
salvador do povo? Isso está em M ateus 1:21.
Bebês eram sempre bem -vindos. Contudo, se fos-
5e um a m enina, seu valor social era m enor em relação
2 um bebê do sexo masculino. Não havia a igualdade Educação
que se busca hoje.
De acordo com o Talm ude e a M ishná, a prim eira
Para eles, o m enino continuaria para sempre par-
grande redação da tradição oral judaica, as crianças do
:e da família. Mas a m enina, ao se casar, passaria a
tem po de Jesus deveriam freqüentar a escola dos 5 ou
pertencer à família de seu esposo e já não teria mais
6 até os 13 anos28. Então eram entregues a um rabino
relação social com a família que a gerou. Seus filhos
local e aprendiam um a profissão - geralm ente a mes-
seriam para perpetuar a geração de seu esposo e não
ma do pai - e começavam a trabalhar como aprendi-
ie seu próprio pai.
zes. Era um trabalho pedagógico conjunto que envoi-
via o pai do aluno e o professor da comunidade.
Dando nome ao bebê Foi talvez baseado nisso, que Josefo afirm ou or-
Geralm ente quem escolhia o nom e de uma criança gulhosam ente a elevada alfabetização do povo judeu:
era a mãe. Contudo, a Bíblia relata m om entos - como “Acima de tudo, podemos nos orgulhar da educa-
no caso de João Batista - em que o pai se encarregou ção de nossos filhos, pois esta encontra-se entre os
dessa tarefa e até os vizinhos intentaram participar na aspectos essenciais da vida na observação de nossas
escolha (Luc. 1:57-66). leis e práticas piedosas, baseadas, sobretudo, naquilo
que tem os recebido”.29
De modo geral, era comum esperar até o oitavo
dia, no m om ento da circuncisão, para então escolher Seria esse um program a educacional realístico
du pelo m enos anunciar o nom e da criança. Embora, que, de fato, atingia todos os filhos de judeus espa-
novamente, houvesse casos em que essa regra não era lhados m undo afora? Ou seria apenas um ideal não
concretizado, senão na m ente do autor? A limitação flitantes dos rabinos a esse respeito. Em bora ten-
das evidências impede um a resposta absoluta. dência m aior era excluir as m ulheres do “m undo dos
hom ens” - tradicionalm ente elas não pudessem jurar
Considerando, pois, que apenas entre 5% e 10%
num tribunal, nem ensinar num a sinagoga - , havia
da população greco-rom ana saberia ler e escrever,
rabinos que vetavam e rabinos que aceitavam partici-
alguns pensam que os judeus seriam um a exceção à
pação fem inina no universo das discussões religiosas.
regra pois tinham sua identidade étnica baseada nas
“Escrituras”, o que fazia deles um a população m ajori- Uns, como o rabino Eliezer, do século I, chegam à
tariam ente letrada ou, pelo menos, com índices m ui- beira da misoginia. Ele dizia que ensinar a T orá para
to acima das culturas em redor. A m aior parte dos um a filha seria o mesmo que ensiná-la um a obsce-
acadêmicos, porém , sugere que este seria um a visão nidade. As m ulheres não têm inteligência para com-
idealística e que o percentual de judeus alfabetizados preender a Torá. M elhor ver a T orá queimada que
não passaria de 3%.30 recitada pelos lábios de um a m ulher.
Seja como for, a m aioria daqueles que tinham a Já o rabino Ben Azzai defendia que era obrigação
oportunidade de estudar encerrava os estudos nesta de um pai ensinar a T orá para sua filha. Em um a pas-
época dos 13 anos. Uns poucos jovens, porém , se- sagem do Talm ude (Meguilá 23-A) fala-se da “pos-
guiam a carreira estudantil, aprofundando-se até se sibilidade”, porém desaconselhada, de que a m ulher
tornarem discípulos formais de algum grande rabino lesse a T orá em público no Shabat.
que os aceitasse. Som ente m uito tem po depois, quan-
do o jovem já estava com no m ínim o 30 anos, ele te- Em outro trecho, ainda, os sábios afirmavam que
ria a oportunidade de se tornar um m estre da Lei. Ele diante dos m andam entos de Deus, os hom ens e as
seria, então, um rabino. Mas nem todos os que foram m ulheres eram iguais, de m odo que era até aconse-
alunos ( talmidim) logravam esse status. Ihável que elas conhecessem a T orá para que instruir
seus filhos e instar seus m aridos a cum prirem suas
A sala de aula era simples e o currículo bem especí- obrigações religiosas. Recorde a m ulher virtuosa de
fico. Era geralm ente um anexo da sinagoga separado Provérbios 31, que adm inistra os negócios da família,
para esse fim. Por causa de sua ênfase nos livros ins- a fim de que seu m arido tenha mais tem po para as
pirados, essa escola foi, mais tarde, apelidada de Beyth discussões judiciais do dia a dia.
Há Sefer, que quer dizer “casa do livro”.
Um grupo de opinião m oderada entendia que em-
Os alunos sentavam-se no chão e escreviam na bora os preceitos de estudo da T orá não fossem uma
areia ou em pedaços de cerâmica quebrada - o papel obrigatoriedade fem inina, não eram tam bém uma
de rascunho da época31. O professor tam bém ensina- proibição, de modo que as m ulheres seriam benefi-
va sentado e o livro texto eram as Escrituras Judaicas ciadas de seu estudo.
- que os cristãos chamam de Antigo Testam ento. Eles
aprendiam a ler os livros sagrados, copiá-los e m em o- De m odo geral, as m eninas ficavam sob os cuida-
rizá-los. As principais passagens eram repetidas vá- dos da mãe até o m om ento em que se casavam e iam
rias vezes, até estarem decoradas. De m odo especial, em bora de casa. Já os m eninos eram cuidados até aos
cada aluno deveria aprender os textos que coinciden- 5 ou 6 anos, quando então passariam a ser tutoreados
tem ente começaram e term inavam com a prim eira e pelo pai e um rabino local.
a última letra de seu próprio nome.

Ocupações profissionais
E as mulheres?
A m aior parte dos hom ens do tem po de Jesus, tal-
A posição das m ulheres no judaísmo antigo não vez 80% ou 90%, trabalhava na agricultura. As mu-
parece ser algo uniform e, mesmo naquela época. O lheres e crianças, em bora não tivessem necessaria-
próprio Talm ude m ostra, por meio de opiniões m ente um a “vida profissional”, participavam nos dias
con de colheita. Na verdade, toda a comunidade - caso se
tratasse de um a aldeia ou pequena vila - era comis- não se pode esquecer dos servidores domésticos,
sionada a se envolver na colheita dos grãos. Portanto, escravos, diaristas contratados para serviços braçais
mesmo aqueles que não fossem agricultores por pro- e cobradores de impostos (certam ente um dos mais
fissão, tinham - por essa tarefa com unitária - uma odiados pelo povo).
experiência agrícola.
Como acontece em toda sociedade urbana, era
Essa talvez seja a razão porque temas agrícolas per- inevitável a prática da prostituição e da mendicância
fazem a m aior parte das parábolas de Jesus: a parábola
mesmo na cidade de Jerusalém.
do semeador (Mat. 13:24-30), a semente de m ostarda
Mar. 4:30-32), o joio e o trigo (Mat. 13:30-43), a co‫״‬
iheita (Mar. 4:26-29). Agricultura
Além das profissões mais comuns de agricultura e A vida era dura naqueles dias e o clima não coope-
pescaria, exerciam-se tam bém outras de caráter mais rava m uito. Estudos em solo revelam que apenas 15%
^rtesanal como perfumistas, tecelões, curtidores, car- do que se plantava retornava em form a de colheita -
pinteiros, oleiros e fabricantes de tendas. Tam bém isso num a boa safra.

BI
A razão para um percentual tão pequeno se deve
ao fato de que a terra boa de plantio era pouca e a Atividade pesqueira
região m ontanhosa. O costume então era construir
terraças de cultivo que eram um a espécie de degraus Os evangelhos não falam detalhes sobre a vida da
escalonados num a encosta. M uretas de arrim o feitas m aior parte dos apóstolos de Cristo. Sobre suas pro-
de pedra eram colocadas para segurar a terra e o sur- fissões, fala-se apenas de M ateus como coletor de
gim ento de espinhos era inevitável nesse ambiente. impostos (Mat. 10:3) e de quatro outros que seriam
pescadores, a saber: Pedro, André, Tiago e João (Mat.
Tal cenário condiz perfeitam ente com a parábo- 4:18-22; M ar. 1:16-20; Luc. 5:1-11).
la do semeador e as sementes que caíram nas pedras,
nos espinhos e na terra fértil (Mat. 13:1-23; M ar. 4:1- É difícil precisar quão valorizada era a atividade
20; Luc. 8:4-15). A proporção de colheita m encionada pesqueira dos judeus antes de Jesus. Contudo, há vá-
por Cristo (“a cem, a sessenta e a trinta por um ”) pode rias passagens do Antigo Testam ento aludindo à arte
ser considerada m uito acima do que norm alm ente se da pesca (Isa. 19:8; Ezeq. 26:5, 4; 47:10; Hab. 1:15). O
colhia. Esse era um indicativo espiritual dos resulta-
dos prom etidos por Deus diante do em penho pelo
anúncio do Reino.

Em term os gerais, um a colheita farta ou pobre era


o indicativo de um ano próspero ou amargo e todos
tinham consciência disso. Períodos de estiagem ge-
ralm ente traziam consigo épocas de fome e priva-
ção, como m encionado na parábola do filho pródigo
(Luc. 15:14).

Os produtos mais comuns colhidos da terra e que


ocupavam a m aior parte das plantações eram: trigo,
cevada, figos, uva (para a produção de vinho), romã,
tâm aras (para a produção de mel) e azeitonas (para a
produção de azeite).

Ha_

Fato importante
Essa ocupação da terra colocava 0povojudeu
em contraste direto com a cultura idealizada
pela elite greco-romana, especialmente nos
grandes centros. Sua ênfase estava na ociosi-
dade, no teatro e nosjogos.) udeus
helenizados tinham a tendência de
abandonar a vida no campo em busca de
diversão num ambiente mais urbano e liberal
- novamente evoca-se 0 quadro dofilho
pródigo esua buscapor prazer (Luc. 15:13).

Ό
O
~ü"3~
nom e “peixe” associado a vários lugares pode ser uma A cidade de Magdala, na encosta do M ar da Ga-
pista da im portância desse ofício para os judeus. A lileia, era conhecida em grego por Tarichaeae, que
existência de um mercado de peixe regular em Jeru- quer dizer “o lugar onde os peixes são salgados”. Era,
salém é sugerida pelo nom e dado a um a das portas da portanto, um centro especializado em salgar pesca-
cidade: porta do peixe (II Cro. 33:14; Ne. 3:3; 12:39; dos para a venda no mercado. O sal era justam ente o
Sof. 1; 10). produto que garantia a viagem dos peixes desde sua
origem até alguma cidade interiorana e não m arítim a
Essa atividade estava mais concentrada no M ar da como no caso Jerusalém.
Galileia, em bora tam bém houvesse alguma indústria
A pesca podia ser realizada com anzol (Mat. 17:27;
de pesca no litoral m editerrâneo. O peixe do Grande
Isa. 19:8), lança (conforme ilustrações do antigo Egi-
M ar, ou peixe do M editerrâneo era um a iguaria na
to), arpão (em form a de um garfo grande) e gancho
ocasião (Ezeq. 47:10). (Jó 41:1-7). Mas a pesca com redes era a mais comum
de todas (Ezeq. 26:5, 4; 47:10). O m odelo mais usado, te de caráter duvidoso. Só não perdiam em desprezo
conform e ilustrações da época e restos arqueológicos, para os publicanos, mas não ficavam m uito atrás des-
era parecido com a tarrafa usada em algumas regiões tes. Isso realm ente é um a surpresa para m uitos, con-
do Brasil. siderando o status que a atividade pastoral recebeu ao
De form a circular, com pesos de pedras nas bor- longo da história do cristianismo.
das, ela era usada da seguinte maneira: seja à m argem
Se você voltasse no tem po indo para os dias de
das águas, de dentro de um barco ou submerso até
Abraão e os patriarcas, veria que a atividade pastoral
a cintura, o pescador via o cardume, então lançava
era um a nobre ocupação. Jabal era o ancestral dos que
a rede projetando-a no ar. Os pesos de pedra faziam
habitavam em tendas e possuíam gado (Gên. 4:20).
com que a rede descesse e os peixes ficassem presos,
Pastores eram , geralm ente, mais ricos que agriculto-
enroscados nela. O dispositivo era puxado por uma
res. E não se pode esquecer que o prim eiro hom icídio
corda atada ao meio do círculo que a fechava como se
da hum anidade se deu por causa de uma celeuma en-
fosse um a bolsa cheia de peixes.
tre dois irmãos: um agricultor, outro pastor de ove-
Ao que tudo indica, Pedro e A ndré estavam lan- lhas (Gên. 4:8-16).
çando esse tipo de rede da m argem ou de bem perto
Todos os grupos nôm ades eram invariavelmente
dela, o que possibilitou que Jesus os chamasse e fosse
constituídos de pastores com seus rebanhos (Gên.
ouvido (Mar. 1:16-17).
30:29; 37:12; Êxo. 2:16). Assim eram os filhos dejacó
que, ao m igrarem para o Egito, depararam -se com um
Ü3- ..c Q ambiente bastante diferente daquele ao qual estavam
acostumados. Os egípcios eram mais agricultores!

Dando mais valor ao plantio que ao pastoreio, os


Você sabia? egípcios evitavam os pastores pelo fato de que um re-
banho de ovelhas, cabras e bodes perto de um a plan-
Na época doNovoTestamento, havia tação era desastre na certa. E mais, na cultura egípcia,
muitos peixes no Mar da Galileia. Acredita- a ovelha e o carneiro eram inapropriados para fazer
se que algo em torno de 18 ou 24 sacrifício aos deuses. Sua carne, em bora consumida
diferentes espécies povoavam as águas
em algumas raras ocasiões, não era o cardápio mais
locais, sendo aprincipal delas a tilápia ou 0
apreciado nas terras de faraó. Pastores eram um a abo-
“peixe de São Pedro”, que se adapta bem a
minação para os egípcios (Gên. 46:34).
viveiros e açudes de águas mornas em
várias partes do mundo32.

Assim os anos que passaram vivendo no Egito, os


hebreus tiveram sempre de enfrentar o preconceito
"ÜU egípcio contra a antiga profissão de seus ancestrais. É
claro que, uma vez estabelecidos ali, eles passaram a
trabalhar com a terra e o oficio pastoril, em bora ainda
Atividades pastoris m antido, já não era sua principal ocupação. Note que
na ocupação da terra de Canaã nem todas as tribos
O ofício de pastor merece um destaque à parte, como trabalhadores de segunda categoria, sujos,
por causa da sua ambigüidade social. É que a atividade gen
pastoril era por um lado essencial à vida dos judeus,
tanto no suprim ento de necessidades básicas (pro-
dução de lã, leite, carne) quanto na m anutenção do
Tem plo (sem sacrifício de ovelhas não haveria ritual).

Por outro lado, porém , os pastores eram vistos


eram pastoralistas (Núm. 32:lss).

A medida que os hebreus se assentavam na terra


prometida, o ofício de criar rebanhos foi perdendo cada
vez mais a proeminência. Com a ascensão de Davi ao
trono, um ex-pastor de ovelhas, esse ofício teve certa
evidência principalmente nos hinos que ele com- punha
falando de Deus como um pastor que cuida e protege. Mas
no tem po dos profetas, transform ar uma
terra em campo de pastores era o mesmo que torná-la Porém, considerando que havia realmente pastores
abominável, desamparada (Sof. 2:6). mal-intencionados, Jesus não se limita a dizer: “Eu sou

O velho preconceito parece haver voltado e au-


m entado em tam anho até os dias de Cristo e tam bém
nas gerações seguintes. O tratado judaico da M ishná
descreve os pastores como incom petentes, de má ín-
dole e chega a insinuar que era perda de tem po salvar
um pastor que caísse num buraco.

D ocum entos antigos m ostram que pastores de


ovelhas não tinham todos os direitos civis resguar-
dados. Eles não podiam ser ouvidos como testem u-
nha num processo judicial. O judaísm o rabínico os
considerava perm anentem ente im undos e não ade-
quados para entrar num a sinagoga, nem me outro
am biente público.

M uitos pastores talvez tivessem mesmo um com-


portam ento reprovável que reforçasse o preconceito.
Outros talvez fossem apenas vítimas de um estereótipo
social. Seja como for, os principais rabinos e sacerdotes
de Jerusalém haviam banido os pastores e seus reba-
nhos para lugares que ficassem distantes do perím etro
urbano. E m uito surpreendente, neste contexto, que
Lucas abra a narrativa do seu evangelho com um grupo
de pastores visitando o recém-nascido m enino Jesus.

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‫־‬c
0
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Você
sabia?
Mediante tais informações históricas, a
imagem de Jesus como “0 bompastor" deve
surpreender muita gente. E, defato,
surpreende, não somente hoje, mas também
no passado quando Jesus se equiparou a um
deles dizendo: “Eu sou 0bom pastor, conheço as
minhas ovelhas e elas me conhecem”(Jo. 10:1 ).
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c
TTTJTÜ

Assim como fez com outros grupos marginaliza-


dos pela tradição e pelo sistema, Jesus não tratou os
pastores como inimigos. Ele, ao contrário, viu virtude
que pode até usar para descrever sua própria missão.
o pastor”, mas sim “Eu sou o bom pastor”. E descreve as
características que o apontavam como tal.

Dia a dia
Assim como nos dias atuais, a vida nos tempos de Cris-
to era um palco de contrastes. Isso pode ser graficamente
visualizado na parábola do Rico e Lázaro: “Ora, havia um
homem rico, e vestia-se de púrpura e de linho finíssimo,
e vivia todos os dias regalada e esplendidamente. Havia
também um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia
cheio de chagas à porta daquele; e desejava alimentar-se
com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios
cães vinham lamber-lhe as chagas”(Luc. 16:19-21).

Tal descrição não implica um exagero. Embora al-


guns resistam usar a expressão “classe média” para os
dias de Cristo, é fato que havia os mais ricos (mino-
ria), os miseravelmente pobres ou excluídos e entre
ambos os mundos uma classe mediana de pessoas que
não passavam fome, mas tam bém não tinham grandes
somas de dinheiro e conforto.

Os ricos, portanto, viveriam mais no luxo com aces-


so a coisas que os mais simples talvez passariam toda a
vida sem ver ou experimentar. Um banheiro dentro
de casa ou a oportunidade de comer carne diariamente
eram privilégios que, naquela época, só pertenciam a
famílias m uito abastadas.

No extremo oposto estaria a realidade de grupos


excluídos, como mendigos, leprosos ou viúvas que
não tinham herança nem parentes para cuidar de suas
necessidades básicas. Jesus provavelmente pertencia
àquela classe média, mas os evangelhos o m ostram
tanto relacionando-se com ricos quanto com pobres.

Um a família comum, nos dias de Cristo, teria seu


dia começando bem cedo, com o raiar do sol. As pesso-
as naquele tem po dormiam cedo e acordavam cedo! O
pai sairia para o labor diário e a mãe ficava em casa com
os filhos pequenos. Juvenis poderiam ir para a escola
rabínica ou com o pai para o trabalho, onde já começa-
riam a aprender uma profissão.
Considerando, porém , que havia épocas de escassez de alimento e desemprego, não era incom um encontrar
profissionais de um a área exercendo outra atividade. Diaristas e trabalhadores avulsos {freelances) poderiam ser
facilmente encontrados por alguém que desejaria, por exemplo, contratar pessoas apenas para vindim ar as uvas
de sua fazenda. É o caso da parábola dos trabalhadores na vida citada em M ateus 20:1-16.

Pirâmide social
Assim seria um a pirâm ide social da sociedade onde viveu Jesus:

Classe abastada, mas não tão poderosa politicamente, representada por


fazendeiros, oficiais de governo e militares.

Classe média: artesãos, mercadores, construtores (carpinteiros), tecelões, pescadores/pro-


prietários (que tinham barcos e empregados), servos especiais (alguns escravos letrados eram
secretários especiais de um hom em rico).

Classe baixa: pequenos agricultores, pescadores avulsos (que trabalhavam para outros ou pesca
apenas para consumo próprio), trabalhadores braçais diaristas, escravos por causa de dívidas contr

Rejeitados e marginalizados: leprosos, mendigos portadores de necessidades especiais, viúvas sem ampu

Refeições
Enquanto os romanos costumavam ter quatro refeições ao dia, os judeus restringiam-se a duas ceias, uma prefe-
rencialmente às 10 horas ou perto do meio-dia e outra ao final da tarde e cair da noite. Não havia um horário rígido.

A prim eira refeição deveria ser leve: pão, peixe, frutas secas, grãos torrados, queijo ou coalhada (Ecl. 10:16;
Jo 21:4,5, 9). Podia ser tom ada no local de trabalho ou a caminho dele (Mat. 14:15; Ru. 2:14). Note que após sua
ressurreição, Jesus aparece para seus discípulos nas m argens do M ar da Galileia e os convida para um a refeição
m atutina, que pode ter sido por volta das 10 horas Nessa segunda ceia, geralm ente havia algum ali-
ou meio-dia. O cardápio era peixe e pão! (Jo. 21:5, 9-
m ento quente, como um a sopa de lentilhas e pão à
12).
vontade. N orm alm ente um único prato era servido
A outra refeição que era a mais im portante - em- num só recipiente do qual participavam todos. Isso
bora não fosse necessariamente mais sofisticada - explica o trocadilho de Cristo usado com M arta quan-
ocorria no fim do dia com toda a família reunida e do ela, preocupada com a comida, estaria perdendo o
convidados especiais, se fosse o caso (Luc. 7:36; 10:40; ensino de Cristo. “Pouco é necessário [Marta] ou uma
17:7-9 e Jo. 12:2).
só coisa, M aria escolheu a m elhor parte e essa não M ar. 6:35; Luc. 9:12); celebrou a ceia pascal com os
lhe será tirada” (Luc. 10:42). discípulos (Luc. 22:15; Jo. 13:2;21-30) e foi ungido
Banquetes especiais como a comemoração pela por M aria M adalena (Jo. 21:1-8).
volta do filho pródigo (Luc. 15:23 e 25) e a grande No sábado havia um a refeição familiar especial ao
ceia (Luc. 14:15-24) eram geralm ente refeições no- pôr do sol de sexta feira e outra após o serviço da si-
turnas ou servidas ao cair da tarde. Foi nesse horário nagoga ou do Tem plo na m anhã seguinte (Luc.
que Cristo m ultiplicou os pães e peixes (M at 14:15; 14:1).

Regras de etiqueta
No O riente M édio, desde os tem pos de Abraão e
tam bém nos dias de Jesus, com partilhar um a refeição
é assinar um a garantia de paz, confiança e, em alguns
casos, reconciliação. Com partilhar a mesa é com par-
tilhar a própria vida. Até hoje, dependendo de onde
você viajar pelo O riente M édio, quando alguém o
convida para comer em casa, está dizendo que quer
iniciar um a amizade com você. Por isso, m uitos en-
contros de Cristo ocorriam durante uma refeição.

Mas se você fosse convidado para com er na casa


de alguém naqueles dias, certam ente estranharia os
costumes bem diferentes dos atuais. Com er sem lavar
as mãos e os pés num a bacia, nem pensar! Todos de-
veriam fazer isso e na frente uns dos outros. Todavia,
os três hábitos mais espantosos seriam: comer com as
mãos, reclinar-se sobre um fino acolchoado e ter todo
o cerim onial em cima da laje de um a casa.

Talheres resum iam -se à colher e faca (o garfo só


foi usado a partir da Idade Média). M esmo assim
eram raram ente usados. Na m aior parte das vezes, era
a mão que levava o alim ento à boca. Sempre a mão
direita, como se deduz do costume oriental visto até
hoje entre tribos beduínas. Pedaços de pão molhados
em vinho, sopa ou m olho substituíam bem as colhe-
res e pareciam mais apetitosos que comer de colher
(Veja Ru. 2:14).

As mãos eram cerim onialm ente lavadas antes e de-


pois das refeições. Eles não precisavam lavar a louça,
mas tinham de lavar as mãos - não necessariamente
por m otivo de higiene como se pensaria na cultura
m oderna, mas por um a questão de purificação ritu-
alística - ; era, enfim, um com portam ento religioso.

Em bora não fosse incom um os convidados terem


pratos individuais, onde a porção de comida era co-
locada, havia m om entos em que apenas um
prato era
colocado ao centro e todos juntos participavam dele
(Mat. 26:23). Os pratos geralm ente eram feitos de pe-

C Fato importante
dra, m adeira ou argila e pareciam tigelas, como aque-
O lavar das mãos antes de comer era, mais do
c que um processo higiênico, um ritual religioso
de purificação. N ão sepodia colocar as mãos
las próprias para comer cereais. numa bacia d'água e esfregá-las com sabão. A
ideia e ter cerimonialmente outra água limpa
Devido ao intenso calor, as refeições judaicas em
despejada sobre as mãos para mostrar que
geral eram feitas ao ar livre ou no terraço das casas,
0participante estava limpo.
às vezes, sob um a cobertura feita de pele de animal ou
palha e nada mais que isso. A exceção, é claro, seria no Era com grande orgulho que osfariseus e
inverno, quando a família era quase confinada dentro líderes religiosos desempenhavam essa
cerimônia na frente de outraspessoas com
de casa.
ofim de serem admirados por sua
A mesa greco-rom ana - tam bém usada por judeus religiosidade. Havia muitas tradições e muitos
- era chamada “triclínio” (triclinium). Um a espécie detalhes, que incluíam até mesmo aposição
de sofá não m uito distante do chão, dividido em três daspontas dos dedos.
partes como se formasse um “U” ou um retângulo in- As escolas rabínicas deHillel e Shammai
completo. Essa abertura perm itia que os alimentos e sustenta- vam posições distintas sobre
bebidas fossem trazidos para a “mesa” e nela distribuí- 0procedimento exa- to, mas concordavam que
dos. Um exemplar de triclínio encontrado em Pom- 0ritual de limpeza era essencial. Se alguém
peia m ostrou que o mesmo era um pouco elevado em 0deixasse de observar estaria impuro diante de
relação ao chão, perm itindo que um em pregado de pé Deus evulnerável à pobreza, à destruição e aos
ao centro pudesse servir a seus senhores. ataques de um demônio específico chamado
Shibta.
Nas regras romanas, cada parte acomodaria três
Foi por causa destas superstições
pessoas, mas os gregos iam além disso e os judeus
semfundamento nasEscrituras queJesus,
tam bém - Jesus comeu com doze e seu “triclínio” tal-
depropósito, deixa dese- guir 0ritual quando
vez fosse um acolchoado mais simples e rente ao chão,
convidadopara comer na casa deum
conform e o costum e judaico. Almofadas ou “tatam es” dosprincipaisfariseus (Luc. 11:37-44). Em outra
especiais eram usados para acolchoar o chão em volta ocasião, seus discípulos também não seguem
do triclínio. Para comer, os convivas se reclinavam 0protocolo cerimonial (Mat. 15:1e2) e, em ambas
sobre seu braço esquerdo e m anuseavam alimentos e ocasiões, 0questionamento surge, dando
bebidas com a mão direita. oportuni- dadepara queJesus demonstre
afragilidade de tal tradição.

O cardápio de Jesus
M uitos são curiosos para saber quais eram as re-
ceitas mais com uns dos dias de Cristo, como era a
culinária daquele tem po. Alguns ingredientes são
conhecidos até hoje e alguns pratos tam bém , mas
outros seriam totalm ente estranhos à cultura oci-
dental m oderna.

A carne verm elha era pouco consum ida. Um a


fam ília norm al teria a oportunidade de com er car-
ne um as duas ou três vezes ao ano. Lem bre-se,
pão nosso de cada dia nos dai hoje”, para referir-se ao
o local era desértico com pouca pastagem . Logo,
alim ento diário. Falar do “pão de cada dia” era como
som ente em ocasiões m uitos especiais com o um
dizer “o arroz com feijão”, para o brasileiro.
casam ento, o nascim ento de um a criança ou um a
festa religiosa poderiam te r carne em seu cardápio O ingrediente básico era farinha de trigo ou ceva-
(Luc. 15:29 e 30). Tam bém não se espante em saber da. O pão de cevada era m enos apreciado, mas por ser
que o tem pero principal de um a carne era m el m is- mais barato, era geralm ente consumido pelos mais
turado com ervas! pobres (Jo. 6:9). Poderia ou não levar ferm ento, des-
de que não fosse usado em cerimônias religiosas. Aí
As pessoas no tem po de Jesus comiam um a dieta
deveria ser um pão ázimo, isto é, não ferm entado.
leve, baseada em vegetais. Naquela região do m undo,
lentilhas, grãos integrais, frutas, verduras, 'tâmaras, O pão diário poderia ainda ser acompanhado de uma
nozes e peixe eram m uito populares. Para lanches, pasta feita de figos, mel de tâmara (mais comum que o
até mesmo algumas espécies de gafanhotos e grilos mel de abelha) ou coalhada salgada.
podiam fazer parte de um a refeição! Todos esses ali-
m entos forneciam nutrição adequada e satisfatória,
sem excesso de gorduras ou colesterol.
Uma receita de pão
M uitos alimentos eram consumidos crus. Como O processo de preparo do pão começava na co-
não havia geladeira, 0 sal era um bom elem ento de lheita. Para se fazer a farinha, prim eiro "separava-se
conservação, e frutas geralm ente eram desidratadas o joio do trigo”. Os grãos eram batidos na eira, tritu-
para serem comidas como passas. rados com um a prancha de m adeira puxada por ani-
mais, depois jogados para cima (para separar a palha)
O pão, é claro, era a refeição de todos os dias. Daí
e finalm ente abanados num a peneira grande e grossa
as expressões “partir o pão”, “comer o pão” com um en-
para elim inar qualquer elem ento estranho que pu-
te usadas para referir-se a um a ceia ou refeição. O utro
desse ter sobrado, como ervas daninhas, sementes de
exemplo seria a famosa expressão do “Pai nosso”: “O
outras plantas ou a própria palha.
Depois, os grãos eram moídos, esmagados entre
duas pedras de mó, um a por cima - que girava - e O fermento dos fariseus
outra por baixo, que era fixa. Assim você teria sua
porção de farinha. O próxim o passo era preparar a Έ Jesus disse-lhes: Adverti e acautelai-vos do fer-
massa, juntando água ou azeite, sal e ferm ento (não m ento dos fariseus e saduceus. Com o não com pre-
se punha este últim o ingrediente quando se tratava de endeis que não vos falei a respeito de pães? E sim:
pães para fins religiosos). acautelai-vos do ferm ento dos fariseus e dos sadu-
ceus. Então, entenderam que não lhes dissera que se
Um pedaço de massa fermentada, chamada “leve- acautelassem do ferm ento de pães, mas da doutrina
dura”, tirada da fornada anterior, era amassada com a dos fariseus e dos saduceus. (Mat. 16:6,11-12).
massa nova, que era deixada para crescer. Antes de as-
sar, parte da massa era reservada para a “levedura” do O pano de fundo dessas enigmáticas palavras de
dia seguinte. O pão era assado como uma torta acha- Jesus vem dos tem pos do Êxodo, quando o povo de
tada, em fornos rústicos, emborcados sobre fogueiras. Israel saiu do Egito. Para celebrar a libertação, os ju-
deus tinham a festa da Páscoa e antes dela a festa dos
pães Ázimos (ou Asmos), isto é, pães sem ferm ento.

No dia em que o povo foi liberto (14 de nisã, pe-


ríodo que com preende os meses de março e abril),
Você sabia? Deus ordenou que todo ferm ento deveria ser retirado
Quem introduziu 0 uso dofermento na das casas, pois implicaria contam inação, simbolizan-
massa foram os egípcios, e elefo i do 0 pecado, a corrupção e a maldade. O povo tinha
descobertopor acaso, quando 0fermento de confiar em Deus, obedecendo a cada ordem nos
silvestre caiu sobre a massa antes de ser m ínim os detalhes (Êx. 12:6, 18).
levada aoforno. Daí des- cobriu-se que um
pouco de massafermentada poderia iniciar
0 processo defermentação na próxima
massa a serpreparada, e, por isso, um
pouco depãofermentado era sempre
guardado para isso.

Pão preparado sem fermento.


Nos tem pos do Novo Testam ento, os fariseus soas tinham um guarda roupas repleto de peças como
eram m uito zelosos com cada detalhe das cerimônias os de hoje em dia. As roupas eram caras e, dificilmente,
religiosas e condenavam quem falhasse num só ponto um cidadão comum teria mais que duas ou três peças de
que fosse. Mas como m uitos só faziam isso por ce- vestuário. É este contexto que deve-se entender a exor-
rim onialism o e não de coração, Jesus os cham ou de tação de João Batista: “Quem tiver duas túnicas dê uma
hipócritas e ironicam ente fez o trocadilho falando do a quem não tem nenhuma; e quem possui o que comer,
“ferm ento (isto é, a contaminação) dos fariseus”. da mesma maneira reparta” (Luc. 3:11).

Vestuário e acessórios Oí SL s l χ,Ω.,,ί,,ρ


O
‫כ‬
Existe algo sobre a m oda que vale tanto para os
tem pos bíblicos como atualmente. As vestim entas Você sabia?
são trem endam ente ligadas a fatores culturais, étni- Nos dias deJesus, não era costumeusarpijamas
cos e valores sociais. Alguns chegam a conectar as ou roupas de dormir nofim dodia.
vestimentas a questões de ética e bom senso.
0 cidadão apenas afrouxava 0cinto edeitava-
É claro que neste turbilhão de opiniões e estilos, exis- se com a sua túnica, usando 0 manto de
te espaço para a individualidade e gosto pessoal, embora, c cobertor.
C
a rigor, o modo “pessoal” de cada um se vestir reflete de
modo inconsciente ou não um coletivo com o qual ele(a)
se identifica por circunstância ou ideologia.
‫־ס־סי‬
Nos tempos de Cristo, não havia tantos “estilos”
como hoje, o que não significa que as pessoas andassem £LSL· f»Q
uniformizadas. Contudo, o tipo de roupa que cada um
‫?ד‬
usava era diretam ente ligada à sua etnia e sua posição
social. Romanos vestiam-se diferente dos gregos e sa-
cerdotes vestiam-se diferente de filósofos. Fato importante
A peça de roupa mais característica dos romanos Considerando que aspessoas tinham bem
teve origem com os etruscos. Somente quem gozava menos peças de roupa em seu vestuário eque
da cidadania rom ana tinha o direito de trajar a toga, e as roupas ficavam imundas pelo uso diário e
contínuo, 0 sistema de lavagem de roupas era
muito apre- ciado e caro (Mal. 3:2).

as autoridades deviam cuidar para que os estrangeiros JQ


não a vestissem. Quem, por exemplo, era condenado eH -grt
J'‫־‬c 0 ‫ט ׳‬
ao exílio perdia o ius togae (direito à toga).

Objetos adicionais, adereços ou acessórios pode- evento (Mat. 22:1-14). Mas isso não significa que as pes-
riam acom panhar a indum entária para dar mais des-
taque ao status da pessoa ou até mesmo para identi- ficá-
la profissionalm ente. Como advogados rom anos que
carregavam varas nas mãos (fasces) ou médicos que
traziam um a bolsa com unguentários.

Por fim, havia também roupas especiais para oca-


siões especiais: trajes para dias de luto, para casamento,
para cerimônias religiosas. Jesus mesmo se referiu numa
de suas parábolas à embaraçosa condição de um homem
que entrou numa festa sem as vestes apropriadas para o
Por isso, as roupas não eram lavadas com a fre-
quência dos dias atuais, de m odo que um a veste
branca, isto é, limpa ou alvejada era um símbolo
de trem endo significado naqueles dias. Essa é a
razão porque as vestes de Jesus na transfiguração
chama- ram tanto a atenção dos discípulos, pois
estavam “res- plandecentes e sobrem odo brancas,
como nenhum lavandeiro na terra as poderia
alvejar” (Mar. 9:3).

Vestes limpas e bem lavadas eram exigidas da-


queles que adentrassem o pátio do Tem plo levando
consigo sacrifícios ou ofertas para oferecer a Deus.
As roupas comuns, por estarem geralmente sujas,
eram inapropriadas para o ambiente.
Trajes comuns dos tempos bíblicos

Assim a pessoa se purificava nas águas correntes tes que eram mais usados pela classe dos mais
de um tanque especial e em seguida vestia as roupas abasta
limpas, de modo a estar apto para comparecer peran-
te o santuário de Deus (cf. Zac. 3:1-10 e, dependendo
da versão, Apoc. 22:14).

Moda masculina
A principal peça de vestuário usada por hom ens e
m ulheres contem porâneos de Jesus era a túnica. As
diferenças básicas eram o tipo de tecido, os adereços e
o com prim ento: a túnica dos hom ens era mais curta e
ia até o tornozelo; a das m ulheres ia até os pés.

No caso dos homens, apenas anciãos em posição de


destaque, como os sacerdotes, ou monarcas, usavam tú-
nicas compridas o bastante a ponto de cobrirem os pés.
São as chamadas “vestes talares” como as que Jesus usa
na visão do Apocalipse 1:13. A palavra “talar” vem do la-
tim talus e quer dizer “calcanhar”. Daí a expressão “veste
talar”, aquela cujo comprimento vai até os calcanhares.

Cada judeu norm alm ente usava duas peças básicas.


Mateus 5:40 faz referência a elas: um a seria a túnica (
‫׳‬Chalouk ou Ketoneth) e a outra a capa (simlah ou talith)

- um forro parecido com um cobertor pequeno que as


pessoas usavam nas costas em substituição aos turban-
dos. As capas eram mais usadas quando o cidadão saía para
uma viagem ou em local público (At. 12:8).

Com o acessórios havia um a cobertura para a ca-


beça na form a de um pequeno gorro, um cinto que
poderia ser feito de couro ou de tecido e outro mode- lo
de túnica (meil), sobreposta externam ente à túnica
básica e que funcionava como um sobretudo ou pale- tó.
Poderia ser aberta na frente (im itando um casaco m
oderno) ou inteiriça, mas com mangas e cumpri- m
ento um tanto mais curtos que a túnica de baixo. Era
usada mais na época do frio ou, como as vestes talares,
por anciãos, sacerdotes e rabinos do povo.

Os calçados também eram opcionais e muita gente an-


dava descalço, exceto quando empreendiam viagem para
algum outro território e teriam de caminhar a pé. Por fim,
é provável, mas não conclusivo, que houvesse ainda uma
tanga ou saiote sob a túnica como roupa de baixo. Pedro
possivelmente usava uma tanga assim quando fi- cou “nu ”
ou “despido” no barco de pesca da família (Jo. 21:7). Jesus foi
crucificado usando apenas a tanga, porque os soldados já
haviam removido suas vestes (Jo. 19:23).

Moda feminina
Segundo o tratado judaico do Shabbath, as mulhe- res
mais ricas costumavam usar fitas de lã e seda nos
cabelos, além de arcos, presilhas e pentes feitos de to de um inseto do carvalho-querm es, o mesmo que
marfim, madeira, casco de tartaruga e couro enfeita- produz a cochinilha.
do de pedras preciosas.
Os tecidos mais baratos eram feitos de lã. Os de li-
Os cabelos eram a parte mais sensual para a mu- nho eram mais dispendiosos. A diferença estava tanto
lher da época, de modo que era costum e daquelas no trabalho quanto no resultado final. De poucas ove-
mais influenciadas pela moda grega tingi-los por in- lhas era possível obter lã para uma família. Já o linho,
teiro ou apenas um a mexa, às vezes de preto, ou mais colhido de um a planta que leva o mesmo nom e, tinha
frequentem ente de ruivo e loiro (principalm ente as um longo processo de colheita e fabricação. Além do
que já tinham algum tom grisalho). fato de que necessitava m uito mais m atéria-prim a
As mais jovens m andavam encaracolar a cabelei- para se produzir um a única capa do tam anho de um
ra aplicando grande quantidade de óleo e perfume. adulto. No Egito, os faraós eram embalsamados com
Perucas tam bém eram bem -vindas num a região, por o linho, símbolo de poder e riqueza.
exemplo, infestada de piolhos. E, para com pletar o vi- O algodão já era comumente utilizado pelos persas,
suai, xales eram com um ente amarrados nos om bros e gregos e indianos, mas não há indícios de que os judeus
havia abundância de anéis, braceletes, argolas presas o cultivassem. A seda, por sua vez, era, mais do que qual-
no nariz e brincos, embora, ao que tudo indique, as quer outro, o tecido mais caro do Oriente. Luxuoso e pró-
igrejas cristãs em seus prim órdios baniram esse cos- prio para reis que o compravam nas mãos de comercian-
tum e entre as m ulheres que se convertiam ao cristia- tes vindos do Extremo Oriente (Veja Apo. 18:11 e 12).
nismo (veja I Tim. 2:9 elO e I Ped. 3:3 e 4).

Cores e tecidos
Fato importante
As variações ficavam por conta do clima, do terre-
no ou das cores que cada um escolhia. M esmo assim Alguns autores pensam que já no tempo de
Jesus, a capa tinha umafunção religiosa como
não havia muitas mudanças. Falando especificamente
0 talith usadopelos modernos judeus. Se
das cores, 0 processo de obtenção dos diferentes ma-
assimfosse, esta seria uma peça indispensável
tizes era bastante caro e artesanal.
para se aproximar do Templo ou entrar numa
Por isso nem todos tingiam suas vestes que, nor- sinagoga. Outros, no entanto, afirmam que
malmente feitas de lã, podiam ter um a variedade de esse costume litúrgico de cobrir a cabeça em
cores naturais, desde o branco até o m arrom escuro sinal de reverênciafora praticado apenas a
com vários tons interm ediários. Uma lã tingida de partir do IVséculo d.C. Seja comofor, a capa era
púrpura era no m ínim o 40 vezes mais cara que um a uma peça tão importante quepodia ser usada
sem nenhum tipo de tintura. como sinal depenhora no pedido de algum
empréstimo (Luc. 6:29).
Sem m isturas sintéticas como as que existem hoje,
Quando era esta a situação, a lei exigia que
os antigos recorriam a extratos do m undo animal e
um credor que tivesse por garantia de débito
vegetal a fim de produzir sua variedade de cores e
uma capa, a devolvesse ao devedor antes do
tons. Havia um caramujo do m ar chamado Murex
escurecer (Ex. 22:26 eDeut. 24:12), pois em
trunculus, cuja glândula liberava um fluido amarelo
muitos casos ela poderia servir de cobertor,
que, quando exposto à luz solar, tornava-se azul púr-
colchão (se a pessoa dormisse ao relento),
pura e era utilizado para tingir tecidos finos.
capuz e até como tapete para dar as boas-
O amarelo era tirado das folhas da am endoeira vindas a um soberano muito importante. Daí
e
a atitude dos cidadãos, na entrada triunfal
de Jesus em Jerusalém, ao estender seus
mantos para que elepassassepor

da casca m oída de romãs. O preto vinha da casca de made ira da rom ãzeira e o verm elho poderia vir
tanto de uma planta chamada ruiva dos tintureiros cima montado no jumentinho (Mat. 21:1 ).
quan ‫ג‬
urgir ‫ב‬
‫״‬pQ Quatro evangelhos -
uma história
HO

Você sabia?
Profetas itinerantes e eremitas, em A tradição cristã reconhece como oficiais quatro
alguns casos, para proclamar a apostasia evangelhos que contêm a vida e as obras de Jesus de
do povo

ou anunciar quem eles eram,


costumavam
usar uma peça única geralmente sem capa Nazaré. São eles: M ateus, M arcos, Lucas e João. Ape-
ao estilo das que usou João Batista. nas dois (Mateus e João) teriam sido discípulos de
Eramfeitas depelo de camelo tecido ena Jesus, ao passo que os demais (Marcos e Lucas) per-
cintura traziam uma tira de couro. Para os tenceriam possivelmente a um a segunda geração de
demais que não se enquadravam na
crentes, ambientados num tem po de pregação apos-
descrição deperegrinos era comum usarem
tólica ocorrido após a m orte e ressurreição de Jesus.
capas e tornozeleiras de couro durante uma
longa viagem, principal- Em bora um a antiga tradição aponte M arcos como
‫ר‬
0 presente nos eventos últimos da santa ceia, m orte e
c mente para terras maisfrias que Israel.
C
a .
‫־כ־ס־־דם‬ ‫כדז־ס־דד‬ ressurreição de Cristo em Jerusalém.
Representações medievais
Na iconografia medieval, os evangelistas costum am aparecer em quatro diferentes símbolos extraídos de
uma visão de Ezequiel (capítulo 1) refletida no livro do Apocalipse cap. 4. As imagens norm alm ente aparecem
com asas e formas que m isturam a face hum ana e a face de animais.

. ‫ ־‬- V-

Mateus: Homem com asas, pois des-


creve Jesus em seu aspecto humano.
Enfatiza a genealogia de Cristo e sua
ligação com 0 povo judeu.

Marcos: Leão com asas, pois sua cena


de abertura é a de Jesus em meio ao
deserto da tentação cercado de animais
selvagens. Sendo 0 ieão um símbolo
de realeza, também acentua‫־‬se Jesus
como rei dos reis.
Lucas: Novilho com asas, pois apre-
senta Jesus de um modo mais ecléti-
co e manso. Um Jesus que aceita sua
missão e não titubeia em cumpri-la.

Jo ã o ; Águia com asas, pois João é 0


que mostra Jesus descendo das altu-
ras para habitar entre os homens. É a
visão mais divina de Cristo e sua en-
carnação.

0 se n tid o desses ícones é co m p le ta m e n te po é tico e não se pode dizer que re fle te m re a lm e n te 0 sig n ifica d o de cada evangelho
ou a inte n çã o o rig in a l das visões do A p o ca lip se e de Ezequiel. A dem ais, sua e xplicação variou de tem pos em tem p o s desde
que apareceu num a das p rim e ira s sugestões fe ita s por Je rô n im o . Seu v a lo r hoje é apenas a rtís tic o e não nece ssa ria m e n te te o
ló g ico . Perm anece, contudo, a certeza de que os evangelhos são visões d ife re n te s , porém , co m p le m e n ta re s e harm ônicas
da vida e das obras de Jesus de Nazaré.
O que é evangelho? ções geográficas ou tem porais das narrativas são, na
m aioria das vezes, genéricas: “na cidade”, “num alto
Com um ente, a palavra “evangelho" é usada para se m onte”, “em casa”, “no cam inho”, “naquele tem po”,
referir às boas novas da Palavra de Deus - o que não “naquela hora”.
é de m odo algum errado, levando-se em conta que
Assim, os evangelhos não são relatos biográficos
o term o grego euangélion, evidentem ente significa
de Cristo no sentido atual da palavra. São o anúncio
"boa notícia”. Essa era uma palavra com um no passa-
do Kerygma, isto é, da mensagem proclamada por
do, mesmo antes de surgir no m undo o m ovim ento aqueles que foram as prim eiras testem unhas do even-
cristão. A inscrição de Priene, datada do ano 9 a.C. e to e, a seguir, pela igreja de um m odo geral.
encontrada na Ásia M enor, celebra o nascim ento de
Augusto como sendo as “boas novas” (euangelia) da Sua intenção é apresentar a Jesus como Messias,
história da hum anidade. filho de Deus e Salvador. Seu conteúdo não pode ser
lido de modo indiferente. Trata-se de quatro teste-
Em term os de ciências bíblicas, evangelho é um gê- m unhos, mas um mesmo convite à graça manifestada
nero literário, m arcado por características e estilos na história da humanidade.
que precisam ser anotados para a boa compreensão
de seu conteúdo. Mas ainda que se trate de um gêne-
ro literário, cada autor m anifestou sua peculiaridade, Contradições ou
seu objetivo e seus enfoques pessoais, conform e as
necessidades de seus destinatários. Não eram, porém ,
peculiaridades?
meras biografias de Jesus Cristo.
Há autores que tom am certos trechos aparente-
Os evangelistas não intentaram escrever porm e- m ente divergentes dos evangelhos e assumem que
nores da vida de Jesus determ inando o que ele fez estes seriam contradições nunca harm onizáveis que
em certa época do calendário. N ote que as indica indicam um a falta de coerência na produção de
cada
um deles. Mas essas mesmas divergências podem ser
lidas sob outro prism a legitim am ente válido, tanto à
luz da lógica quanto da crítica literária.
"Im aginem os dois livros escritos sobre M ar- tin h
M ateus, por exemplo, acentua m uito mais as po- o Lutero por dois autores católicos, um em 1900, 0 outro
lêmicas entre Jesus e os fariseus do que o faz Lucas. em 1980. 0 prim eiro, de modo Ia- m entoso,
Este últim o chega a sugerir um a amizade entre Jesus escreverá nestes term os: lu te r o , este m onge que
e alguns fariseus no início de seu m inistério, algo to- abandonou 0 hábito, que desprezou uma religião, levou,
talm ente inexistente no relato de M ateus. por seu próprio orgulho, a Igreja e a Europa ao fogo e
ao sangue 0 se- gundo, por sua vez, já dirá: lu te r o teve
Com pare a pregação agressiva do Batista, segundo
sua fra- queza como qualquer um de nós; mas devemos
Lucas, endereçada à m ultidão que o ouvia e de acor-
considerar que aqui estam os diante de um monge trem
do com M ateus, voltada especificamente para os fari-
endam ente religioso, apaixonado por Deus e preocupado
seus (Mat. 3:5 -10 e Luc. 3: 7 -9 ). M ateus é o único a
com a salvação dos homens; ele per- cebeu que a Igreja
apresentar todo um discurso de lamentação dedicado
devia se reformar, voltar-se para as Escrituras, e a Igreja,
inteiram ente aos escribas e Fariseus (Mat. 23:13-36).
por sua recusa, 0 expulsou de seu seio..,". Etienne
Enquanto isso, Lucas, em bora tam bém apresente
Charpentier3
conflitos entre Jesus e o farisaísmo, não se esquiva de
Ora, nenhum h isto ria d o r sensato questionaria a h
apresentar Jesus comendo em casa de um líder fari-
istoricidade de Lutero com base nesses depoi- m entos
seu (11: 37-44; 14:lss) e mais, sendo alertado por eles
diferentes. Nem poderia dizer que, embo- ra diferentes,
contra o perigo de Herodes, como se quisessem sal- eles sejam contraditórios. Am bos fazem uma leitura do m
var-lhe a vida (13: 31-33). esm o fato: Lutero rompeu com 0 catolicism o. Um
acentuou a responsabili- dade do m onge no processo,
João, por sua vez, enfatiza m uito mais a superio-
enquanto 0 outro acrescentou a intolerância como tam
ridade de Jesus em relação ao Batista do que fazem
bém respon- sável por m uito do que aconteceu. Possivelm
os demais evangelistas. Isso, como você verá mais à
ente houve, entre am bos os autores, 0 concilio Vatica-
frente, tam bém tinha um m otivo próprio que justifi-
no II, que tornou os católicos m ais o tim ista s em relação ao
cava essa linguagem.
protestantism o. Sendo assim , 0 que viveu depois disso
Cada evangelho, pois, apresenta sua própria carac- esboçou em seu livro as ca- racterísticas do am biente
terização do Cristo, que não deve de m odo algum ser mais to le ra n te no qual vivera, enquanto 0 prim eiro
entendida como contradição histórica. apenas ecoou os ares apologéticos de sua época.
Essa mesma analogia pode ser usada para explicar
as peculiaridades de cada evangelho ao descrever
Jesus de Nazaré, mesm o que pareçam, a princípio,
contraditórias. Cada evangelista nar- rou a vida de
Cristo com um colorido próprio de personalidade, am
biente e propósitos. Contudo, nada há de dram aticam
ente sério que coloque em dúvida a reputação
historiográfica daqueles que produziram ta is textos. A
final, pequenos er- ros, ainda que ocorram , são
peculiares até mes- mo dos mais exím ios historiadores
m odernos e da A ntiguidade.
,.,CLa- -Cn .
p

Fato
n On .,C.,D Π
importante
Muitos pensam erroneamente que, seosevangelis-
o
tas estivessem num tribunal, seu testemunho
seria imediatamente rejeitadopor causa Você sabia? J

dascontradições queelesapresentam. A cura J


doscegos(ou do cego) de Jericó éum casoclássico.
J. Warner Wallacefoi um detetive de Los
Mateus, a única testemu- nha ocular a relatar
Angeles, EUA, especializado em resolver casos
0episódio, diz queeram dois cegos, mas não
envolven- do homicídios. Ele éum especialista
oferece 0nome denenhum deles.
em utilizar
Lucas eMarcos, por sua vez, dizem que era
técnicas de investigação policial para resolver
apenas um eMarcos aindafornece seunome
casos complicados de assassinato eapontar
“Bartimeu”.
0criminoso.
E não para por aí. Mateus eMarcos dizem quea
Sendo um ateu, ele utilizou sua especialização
cura se realizou quando Jesus estava saindo
investigativa para avaliar 0grau de credibilidade
deJericó. Lucas, porém, diz que issoocorreu quando
do testemunho dos evangelhos acerca de Cristo. A
Jesus estava chegando à cidade( c f Mat. 20:29-
princípio pensava que encontraria razões de
34; Mar.
sobra para continuar incrédulo em relação ao
10:46-52; Luc. 18:35-43). conteúdo bíblico. Mas suas investigações
honestas 0 levaram para outro rumo - 0 da
Mas será que contradições comoessasinvalidariam convicção de que a narrati- va evangélica é
um testemunho diante deum tribunal? Veja histórica e real.
0quediz uma especialista no assunto, aDra.
Suas conclusõesforam posteriormente
Suzana Camar- goMiranta, desembargadora:
publicadas num livro intitulado Cold Case
E possível divergências e ambas as testemunhas Christianity - c
estaremfalando a verdade - as culturas e conceitos Cristianismo: Caso encerrado.
pessoais são agregados à pessoa. Toda testemunha c ‫ג‬
capta apenas parcialmente ofato (0 cérebro C ‫ס‬
seleciona as informações ocorridas). É impossível a T73‫־‬
existência de depoimentos idênticos. Testemunhos
iguais revelam que as testemunhas foram
orientadas - a
A origem e formação Não se pode provar a existência da fonte Q. Por
isso, enquanto m uitos acadêmicos apostam nela, ou-
dos evangelhos tros a consideram inexistente.

Segundo as conclusões mais atualizadas sobre a his-


tória da produção dos evangelhos, um a grande parte O testemunho de Papias
dos estudiosos têm chegado às seguintes ponderações:
Já no século II, Papias de Hierápolis (que segundo
1 - Por conterem um a grande quantidade de his- um a antiga tradição teria sido o secretário do apóstolo
tórias em com um , na m esm a seqüência, e, algumas João, que escreveu o evangelho sob seu ditado) afirma
vezes, utilizando a m esm a estrutura de palavras, que M arcos fora um. intérprete da pregação de Pedro.
os evangelhos de M ateus, M arcos e Lucas são cha- Ele não escreveu tudo cronologicam ente organizado,
m ados sinópticos, isto é, possuidores de um a visão mas procurou expor ao m áximo as preleções do após-
conjunta. João, por sua vez, pertence a um a tradição tolo relativas aos feitos e ditos do Senhor. Tam bém
independente, form ada na Ásia M enor, no fim do afirma que M ateus com pusera os ditos de Cristo em
prim eiro século. língua hebraica, que cada um depois interpretou se-
gundo suas capacidades. Segundo suas palavras:
2 - Cronologicam ente falando, M arcos é o evan-
gelho mais antigo, que serviu de fonte inform ativa Marcos, tendo se tornado 0 intérprete de Pedro, escre-
para M ateus e Lucas, e João foi o últim o evangelho a veu acuradamente tudo 0 que ele lembrava. Contudo, não
ser produzido. foi na ordem exata que Marcos relatou os ditos ou feitos
de Cristo. Pois ele nem ouviu 0 Senhor nem 0 acompanhou
3 - Há uma probabilidade, mas não certeza abso-
pessoalmente. Por outro lado, porem, como eu disse, ele
luta, que houve num tem po anterior aos evangelhos
acompanhou Pedro que proveu as instruções necessárias
canônicos um ou mais documentos (agrapha) que
[para seus destinatários], mas não com a intenção de ofe-
continham as chamadas Logia de Jesus ou sentenças
ditas por Cristo. Esses docum entos, em especial um recer uma regular narrativa dos ditos do Senhor. De qual-
livro que os exegetas dão o nom e de Q, serviriam de quer forma, deve ser dito que Marcos não cometeu erros
fonte para os sinópticos. ao escrever as coisas como ele as lembrava com respeito a

Com o se chegou a essas três conclusões? Tudo Mateus, este ajuntou os oráculos [do Senhor] em língua he-
começou com Karl Lachmann em 1835. Ele perce- braica, e cada um os interpretou 0 melhor que pôde. [ ] há
beu que M ateus e Lucas coincidem na ordem de seus
também uma história de uma mulher que fo i acusada de
relatos apenas quando seguem o enredo de M arcos.
Quando um deles difere, o outro sempre concorda muitos pecados perante 0 Senhor e que pode ser
encontrada no Evangelho segundo os hebreus35.

I
com Marcos. Além disso, as passagens que apareciam -‫ * ־ * י ״ ·׳־״‬v v .n 1 ·‫׳· ״ "'>'־‬ -N J b v ' ‘ * ! · * * +- · ‫־׳‬-” I
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Lachmann, deve-se concluir três coisas: que M arcos < 14 a ‫י‬ í~ aí#*‫*׳‬V"
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precedia Lucas e M ateus, que M ateus e Lucas utili- .. . .t 4 e ® ,» ■ ‫«״‬ ‘ * *f*-


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zaram-se de M arcos na produção de seus evangelhos ‫ ·■ ן י‬í■λ I ί “ί -'5« 1 ‫וי‬#!‫יז ־‬:* ·IV?' ‫׳‬:‫·־‬
* ‫י*»*״*״־‬-*«* ' ‫»־'׳'״‬
e, finalmente, que haveria outro docum ento anterior
t -- i »t ‫זי ו״־־‬
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1 1 ‫ף^׳י י‬
‫ז— י· ־‬ i Á , . ,» M r d l w
V\, ‫·״‬ « -
a M arcos que possuía uma coletânea de ditos do Se- iírf« ‫־‬ Lr s, ‫· י ־‬ .‫' « · ? »־‬ |i í 'l
* '“£»·‫׳־‬ ^
‫■ ־י‬ “
JjÃ? 1fe. 161 ‫־‬- » ‫׳‬
nhor. Este seria posteriorm ente chamado docum 1•‫'־‬ :J.* ·‫ ׳‬ru. 1 ‫־‬T^ ‘ <· ‫־‬
ento Q, que vem do alemão Quelle e quer dizer fonte. Canon Muratoriano ‫*״־‬
* ‫ “ י‬í^■ ”Wi*

- 4^ 5 ‫ *־‬- ' : - · ^ í
Como se pode ver, o fragm ento de Papias omi- já ocorreu) e gloriosa, com magnífico poder, na segunda
te qualquer alusão ao Evangelho de João, a não ser (que ainda ocorrerá)Cânon Muratori ou Muratoriano
que se queira entender a “h istória da m ulher acusada”
como sendo um a referência ao controvertido trecho Como se pode ver, por últim o, na ordem de com-
da m ulher pecadora em João 8 e o título Evangelho posição, estaria o Evangelho de João produzido em
segundo os hebreus como um a titulação variada para o Éfeso, na Ásia, logo após o apóstolo ter sido libertado
IV Evangelho. da ilha de Patmos onde escrevera o Apocalipse.

Ele tam bém não m enciona Lucas. Porém , o Câ-


non Muratori (ou Muratoriano), que, segundo alguns, Ώ
a
pertence igualm ente ao século II, apresenta -0 como
sendo posterior a M arcos e M ateus. C
c
Este Cânon Muratori, tam bém conhecido por frag- Fato Importante
mento m uratoriano ou fragm ento de M uratori, é
Quanto a Mateus, osfilólogos mais conceituados
uma cópia da lista mais antiga que se conhece dos li- têm concluído que 0 texto mateano, conforme
vros do Novo Testam ento. Foi descoberta na Biblio- apa- rece na Bíblia hoje, não tem característica
:eca Am brosiana de Milão, por Ludovico A ntonio de ter sido uma tradução grega de um original
M uratori (1672-1750), e publicada em 1740. Na lista hebraico. Logo, existe uma possibilidade de
figuram os nom es dos livros que o autor considerava quePapias este- ja falando justamente daquela
idmissíveis, com alguns comentários. suposta coletânea de ditos de Jesus que
osacadêmicos chamaram fonte Q. Note que
A lista está escrita em latim e encontra-se incom -
0clamor de Cristo “Deus meu, Deus meu, por
pleta, daí ser chamada de fragm ento. Contudo, apa-
que me desamparaste? ’é apresen- tado em
rentem ente, o cânon aceita quatro evangelhos,
Marcos no aramaico, enquanto Mateus 0 traz
dos
em língua hebraica (compare Mateus 27:46
quais dois são os evangelhos de Lucas e João. Os ou-
com Marcos 15:34).
c
G
tros podem ser M ateus e M arcos, mas falta o princí- O

J pio do m anuscrito, onde estariam os nom es dos dois


primeiros evangelhos. O texto diz assim: _cj GL

"... 0 terceiro evangelho é 0 de Lucas. Lucas era me'dico c


c
Você
?or profissão. [Mas] Depois da ascensão de Cristo, Paulo
sabia?
‫ י‬tomou consigo porque era um estudante de leis [jurista],

Lucas escreveu sua narrativa a partir de opiniões [pes- de conformidade com todos, João escrevera em seu nome.
juisadas] e afirm ou com seu próprio nome. Mesmo Assim, ainda que pareça que ensinem coisas distintas
sem nestes distintos Evangelhos, a f é dos fié is não difere, já
que 0 mesmo Espírito inspira para que todos se contentem
:er tido contato com 0 Senhor pessoalmente, se aplicou
sobre 0 nascimento, paixão e ressurreição [de Cristo], assim
. começando] seu relato pelo nascimento de João Batista. O como sua permanência com os discípulos e sobre suas duas
juarto Evangelho é 0 de João, um dos discípulos. Questio- vindas, depreciada e humilde na primeira ( que
nado por seus condiscípulos e bispos, disse: “A ndai comigo
durante três dias a partir de hoje e que cada um de nós
conte aos demais aquilo que lhe fo r revelado”. Naquela
mesma noite fo i revelado a André, um dos apóstolos, que,
Existem hoje cerca de5.500 antigas cópias
manus- critas do Novo Testamento espalhados
em museus ebibliotecas do mundo inteiro. Eles
podem estar em forma de rolo, códices, ou até
mesmofragmentos de 6 x 8 cm como é 0caso
do Papiro 52, depositado na Biblioteca de Johns
Rylands, em Manchester. Nenhum texto original
saído das mãos do escritor bíblico sobreviveu
até osdias de hoje. Contudo, a despeito das
diferenças entre as cópias, técnicas de colação
textual permitem reconstituir com precisão mais
de 95% do texto original. Ospontos conflitantes
sãoporções textuais periféricas que não
prejudicam 0 teor central do livro. É 0caso, por
exemplo, do binômio Gadara/Gerasa, ou da

discutível terminação do Evangelho de Marcos. ^.

O
‫כ‬
9:1). Som ente depois do desapontam ento, isto é,
A data de décadas mais tarde quando viram que ele realm en
composição dos
evangelhos
No auge do questionam ento quanto à autenticida-
de histórica dos evangelhos, m uitos autores alemães
diziam que eles foram escritos no século II d.C. Atual-
m ente essa ideia não é mais defendida na academia.
Os posicionam entos quanto à data de composição dos
evangelhos podem ser divididos em três linhas:

Conservadores: sinópticos anteriores ao ano 60 e


João c. 90AD

M oderados: M arcos ano 60, M ateus e Lucas ano


70; João 90-100 AD

Liberais: M arcos (talvez 50 ou 60) M ateus e Lucas 80-


90; João 90-110 AD

Com o não existem docum entos originais dos


evan- gelhos, mas apenas cópias feitas posteriorm ente,
os argum entos acerca de cada um desses posicionam
en- tos possuem um m ínim o de subjetividade e
depen- dem do pressuposto de cada investigador.
Contudo, esse é um ponto im portante porque, se os
evangelhos estão demasiadam ente distantes dos
eventos que eles descrevem, aum enta-se o nível de
confiança na preci- são histórica daquilo que eles
narram .

Documentos tardios?
De ambos os lados da questão, o que se pode dizer
é que os argum entos em favor de um a data mais anti-
ga ou mais recente dos evangelhos são em sua maio-
ria de ordem subjetiva ou interna.

Os que afirmam que os evangelhos seriam do-


cumentos tardios, escritos m uito tem po depois dos
acontecim entos que anunciam, apresentam os se-
guintes argum entos:

Os discípulos viviam na expectativa da segunda


vinda de C risto, tecnicam ente cham ada de parousia.
E nquanto esperavam pelo próxim o fim do m undo,
não tin h am m otivos para preservar escritos sobre a
vida d e jesu s (Veja I Tes. 4:16,17; M at. 10:23; M ar.
te não havia voltado, é que resolveram escrever sua
história.

Em M ateus 24 e Lucas 21:20 Jesus fala da destrui-


ção de Jerusalém , que ocorreu no ano 70 A.D. E im-
possível que alguém conseguisse falar com tanta pre-
cisão de algo que ainda haveria de ocorrer. Por isso,
alguns autores dizem que essa mensagem profética
seria um vaticinium ex eventu, uma expressão teoló-
gica vinda do latim, que traduzida significa “profecia
feita depois do fato ocorrido”. Logo, os evangelhos não
podem ser anteriores ao ano 70 d.C.

A divindade de Jesus está claram ente exposta nos


evangelhos, mas esta só foi com preendida ou siste-
matizada pela Igreja depois do ano 70. Os que assim
pensam afirmam que Jesus nuncase proclam ou Deus ,
o que ocorreu foi uma deificação.

0 conceito de Igreja, conforme expressão em Ma- teus


16:18; 18:17 e 18, tam bém reflete uma teologia tar- dia. Os
prim eiros cristãos iam às sinagogas. Não havia ideia de
igreja, senão depois da destruição do Templo.

A postura antirrabínica de M ateus 23:23ss parece


ecoar o contexto de Jam nia nos anos 80, quando os
judeus sistematizaram vários ais contra os cristãos.
Logo, não poderia ter sido escrito antes disso.

Não há nada no texto que confirme a autoria de M


ateus, M arcos, Lucas ou João (a não ser indireta- m
ente em Jo. 21:24). M arcos, Lucas ou João (a não ser
indiretam ente em Jo. 21:24). Argum enta-se que foram
as comunidades.

Documentos antigos?
Os autores que afirm am que os evangelhos se- riam
docum entos antigos, próxim os aos eventos que
apresentam , oferecem as seguintes respostas às
proposições apresentadas pelos defensores da data-
ção tardia:

1 - Expectativa quanto à parousia. Não há evi-


dência conclusiva disto. I Tes. 5:1-11, o docum en-
to mais antigo do N T fala da volta de C risto como
algo repentino, não necessariam ente " próxim o”.
Adem ais, não há na carta nada que indique uma
m udança radical de vida em face à chegada do fim
saberia que o referido cerco de Jerusalém ocorreu
em o u tu b ro /n o v em b ro de 66 d.C. (sob o com
ando de Cestio Galo). Isso foi no outono, não no
inver- no. De igual m odo, os cristãos fugiram para
Pela, na T ransjordânia. Logo, não faria sentido a
ordem genérica: “Fujam para os m ontes”...

3 - A divindade de Jesus - a afirm ação de que


os discípulos não entenderam nada da divindade de
C risto é m eram ente conjectural e baseada no silên-
cio. Ademais, as afirm ações da divindade de Cristo
nos evangelhos são progressivas e dedutíveis, assim
com o a com preensão dos discípulos. Veja confissão
de Pedro: “T u és o Filho de D eus” (M ateus 16:16),
a exclamação de Tom é: ‘M e u Senhor, m eu D eus”
(João 20:28). Até seus inim igos entenderam sua au-
toafirm ação divina, do contrário não teriam tenta-
do apedrejá-lo por blasfêm ia (João 10:33). A citação
encontrada em I Cor. 8:6 é unanim em ente rêco-
nhecida com o um prim itivo credo cristão, anterior
até m esm o a Paulo, o que indica a antiguidade da
crença em Jesus como sendo Deus.

4 - Igreja, conceito tardio? Ora, Jesus não falou


Antigo manuscrito grego do Evangelho de Mateus grego e sim aram aico/hebraico. Logo, em bora o
term o “igreja” possa p ertencer a um a fase posterior
do cristianism o, ele poderia naturalm ente estar se
do m undo. N ote que ninguém é aconselhado a ven-
referindo ao vocábulo hebraico qahal, com unidade,
der tudo, fugir das cidades ou estocar alim ento etc.
e que os tradutores judeus da LXX já haviam diver-
(veja I Tes. 4:9-11). No 4:15, a expressão “os que
sas vezes traduzido p o r ecclesia no III século a.C.
ticarm os vivos” era, segundo o gram ático da língua
grega, A. T. R obertson, um a situação hipotética, 5 - A postura antirrabínica de M ateus não pre-
não um a certeza de que alguns ficariam vivos. cisa ser tardia. Ela se acom oda naturalm ente ao
contexto de Atos 9 e 12, quando a Igreja começa
2 - Seria um vaticinium ex eventu? Ora, se de fato a ser perseguida p o r certos líderes do judaísm o de
se tratasse de um prognóstico dado após o cum pri- Jerusalém .
m ento, o texto deveria ser mais explícito em alguns
detalhes fundam entais. D everia haver, p or exem- 6 - A utoria confirm ada - Todos os autores cris-
pio, um a nota do evangelista dizendo que aquilo tãos do século II e III são unânim es em confirm ar as
realm ente aconteceu, conform e previsto por Cris- respectivas autorias dos evangelhos. A ausência de
to. Veja que ele testem unha a profecia, mas não seu nom e no corpo textual do livro não deve cau-
diz nada de seu cum prim ento. N ote que quando sar espanto algum. Era com um , na A ntiguidade, o
M ateus fala de um evento ocorrido para cum prir nom e do au to r não aparecer dentro de seu próprio
algo dito an teriorm ente, ele sem pre usa a expressão texto, mas no sillybos ou sittybos - um a etiqueta em
“para que se cum prisse o que fora dito pelo profeta” form a de couro ou papiro que ficava colada na haste
(1:22; 2:6, 17, 23; 12:17; 13:35; 21:4). O utro aspec- do rolo ou aplicada em seu verso à vista do vende-
to: o pedido “para que a fuga não se dê no in v ern o ” dor ou leitor. Estas etiquetas eram a prim eira coisa
(Mat. 24:20) não faz sentido se o evangelho estives- que se perdia num eventual estrago do m anuscrito,
se sendo escrito após o ocorrido. Neste caso, o autor mas isso não seria um problem a se a obra já estives
se popularm ente identificada. Hoje, por exemplo, tória apenas até à prisão de Paulo não fazendo qual-
não há necessidade de colocar Shakespeare como quer m enção ao seu m artírio. É estranho que um
autor de “Rom eu e Julieta” - todos que conhecem a livro que pretende “historiar” a igreja m encione
obra, sabem por quem foi escrita. a perseguição de Cláudio e Herodes, mas não diga
nada sobre N ero e 0 incêndio em Rom a (embora
Paulo m orresse sob o governo de N ero). Tam bém
q,,cO silencie sobre a destruição de Jerusalém , a fuga para
O Pela etc. Atos tam bém não m enciona a m orte por
‫ג‬ apedrejam ento do principal líder da Igreja, Tiago,

‫כ‬ c ocorrida em 62 d.C. e citada por Flávio Josefo. Atos


24:27-25:1 diz que Festo, apontado como procura-
Fato importante dor, m anteve Paulo encarcerado. Depois disso, ele
assum iu o governo da província. Ora, Festo subs-
Os que negam a autoria tradicional dos evan-
titu iu Felix em 60 d.C. e ficou no poder até 62. É
gelhos supõem, que a escolha dos atuais nomes
difícil, portanto, supor que 0 livro de Atos seja es-
se deupara legitimar 0conteúdo que outras
crito depois disso; e como Lucas é anterior ao livro
pessoas menos conhecidas escreveram. Será isso
verdade? Veja que Lucas só é mencionado de Atos, sua composição teria de ocorrer ainda mais
poucas vezespelo nome no NT. Marcos era um cedo na história do cristianism o.
rapaz que abandonou Paulo (Atos 15), Mateus
3 - João (que certam ente é depois de 70) é o único
era um apóstolo pouco destacado e marcado
dos quatro evangelistas que não m enciona a profecia
pelopassado sombrio de cobrador de impostos.
da destruição do Tem plo e da cidade de Jerusalém. Os
Se a intenção fosse dar autoridade ao
documento, 0ideal seria que escolhessem demais que a m encionam não falam nada do fim do
nomes como de Pedro, Apoio, Paulo, Tiago. E Tem plo, nem da fuga dos cristãos para Pela. Era de
que deixassem bem explícita a autoridade de se esperar que o fizessem, caso fossem obras tardias
quem escreve. Oprópriofato dos nomes dos (veja, por exemplo, João 21:18).
autores não aparecerem no texto interno dos
4 - A mais antiga citação do Evangelho de Ma-
evangelhos demonstra que tal teoria não
sesustenta à luz da evidência literária. teus vem de Clem ente (I Clem ente 13:1 e 2) de Iná-
cio de A ntioquia (Aos Esm irnianos, 1 e 5). Clemente
£ '‫־‬C'0 Im orreu em 95 /6 e Inácio m orreu p o r volta de 115,
Ü então o evangelho já deveria estar em circulação
bem antes disso. Afinal, diferente dos dias de hoje,
a reprodução e circulação de um livro m anuscrito
Evidências de dem orava m uitos anos. Era grande o hiato entre o
datação mais antiga texto original e as cópias que se faziam dele, a pon-
to de poder ser citado por alguém geograficamente
1 - A com unidade cristã não aceitaria os evan- distante de seu local de origem .
gelhos se não tivesse um a m ínim a ideia de quem
5 - Se os evangelhos são posteriores a 70 e foram
os escreveu. Com o os autores não são figuras clás-
escritos para "instruir” a igreja, ficam sem sentido os
sicas, nem fundadores de Igrejas (exceto João), sua
conselhos de Cristo como os registrados em Mateus
autoridade estaria na proxim idade entre autores e
5:23 e 24, pois, afinal, o Tem plo já estaria destruído.
destinatários que reconheceriam seu caráter e seu
testem unho. 6 - I Tim. 5:18 m enciona Lucas 10:7 com o “Es-
critura”. Isso indica que o referido texto já estava es-
2 - E difícil supor que o livro de Atos tenha sido
crito e, de algum a form a, consolidado como “Palavra
escrito depois da m orte de Paulo, pois conta a his- de Deus”.
q o
c >3
C O J Você sabia? c
: Fato importante £: Um grupo de cientistas encontrou 0que talvez
O Papyrus P52 da Biblioteca de Rylands, seja a cópia mais antiga do evangelho em um
conhecido como ofragmento de São João, é papiro reutilizado para construirá máscara de
um fragmento de papiro exposto na Biblio- uma múmia egípcia. Craig Evans, um dos res-
teca de John Rylands, Manchester, Reino ponsáveis pela descoberta, anunciou que 0
Unido. Escrito em grego e datado por volta mesmo traz umfragmento do Evangelho
de 125 d.C., estefragmento contém parte deMarcos. Os pesquisadores acreditam que a
do Evangelho de João, sendo que na frente origem dopapiro remonta ao século I d.C., entre
con- tém partes do capitulo 18:31-33, e no os anos 80 e90 d.C., 0que representa uma
verso, os verdculos 37-38. grande novidade.

Até então, as cópias mais antigas


dosevangelhos datavam do século II em
diante.

c ‫ר‬
G O
rO sO —‫־־ ”׳־‬
c ‫׳״ ־‬g u —r — r j C ‫ב־ ״׳‬

As palavras de Jesus
De um m odo geral, acredita-se que os evangelhos
canônicos procedem de uma tradição oral aramaica e
hebraica que foi posteriorm ente traduzida para o gre-
go. Os ditos originais de Jesus certam ente não foram
proferidos em grego. Ele falava a m aior parte do tem -
po em aramaico. Sendo assim, o que os evangelhos
atuais apresentam seria um a tradução do que Jesus fa-
lou e não suas palavras originais.

A data de composição deste manuscrito é .^ lugar da descoberta dofragmento. ^ .


importante, porque muitos críticos diziam
c ‫רן‬
que o Evangelho de João teria sido escrito
G p
por alguém que não 0próprio apóstolo
num tempo tardio do século II, .............. ... 1 ^ f ‫־‬T õ ‫־‬m
provavelmente depois do ano 130 d.C.
Contudo, a descoberta deste documento
mostra que 0evangelho

já deveria ter sido escrito bem antes


disso, ainda no século I, para que desse
tempo de ser copiado e estar em
circulação no Egito -
Os que defendem a hipótese da fonte Q
incluem a possível existência de algum docum
ento escrito em hebraico ou aramaico, mas que
se perdeu ao longo do tem po. Ele conteria o
que os teólogos chamam de Logia de Jesus, isto é,
alguns ditos originais de Jesus, pronunciados em
seus discursos e ensinam entos.

Alguns autores trabalham com a hipótese de


que Jesus possuía entre seus ouvintes uma espécie
de co- pistas ou estenógrafos, isto é, indivíduos
capazes de acom panhar na escrita a rapidez da
fala usando téc- nicas de estenografia. Em outras
palavras, taquígra- fos que copiaram alguns ditos
de Jesus enquanto ele discursava e, posteriorm
ente, tiveram suas anotações usadas pelos autores
dos evangelhos.
papel.

O que se pode dizer de mais concreto é que os


evangelhos às vezes possuem trechos que denotam a
l i A N È AYO>N A i A Y r ‫ ׳‬v A Y NA'l·
citação de algum docum ento ou dito original em he-
^ Μ« ‫י‬ , n AYU)í ΝΤΟΥΝ ο ύ
braico e aramaico, possivelmente rem etente aos ditos
originais de Jesus.

Seja como for, ainda que não se possa saber com


certeza absoluta quais foram as ipsissima verba de
Cris

A.Τ Α 1^ ΓΛΝ4 N U N

s T
a k pY cj>«N

fjAa 5
2s:o o V.vyco A<jetiu c o Ynó ÍAIAYnmq c

io y m c &comac AYamexA'f^e-ri e Ίΐίχχε


e<3efμ h n ei a n wee*

"X !fn eiN MnM0Yn^<eiCMNTpeMv

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S -

‫ץ‬po exMn‫־‬r tj><jne5cetc*ice«Y<^ a

^:o o c n h t n JN{Ç1Nerècoií^Hrrttyr^

X e«c^n^eer'M t*T ef
ei €N^Mvm‫־‬NAfc\)Qfn'epcmft1ir‫־‬r e -
TTie^Y c9aníío octo HTF4kec^,a‫»־‬A.
A A c c X e e je tv n ^ r N A fφ ο ρ n e p c u tn

ΑΛΑΑγγμMTej>ocmΓτβτ13ί.ογκΐΆΥ
ω
C m n e ^ g A A jtc rrX N e T e rN tu x M

NTrtYTMTO TeceNA COYcÕ

M anuscrito apócrifo do Evangelho de Tomé


encontrado em 1945 no Egito.

Essa é uma hipótese m uito difícil de ser confir-


mada. Contudo, não deixa de ser possível. Sabe-se
atualm ente que o uso de estenógrafos não era algo in-
comum no período greco-rom ano. Antigos registros
m ostram profissionais desta área atuando desde o sé-
culo II a.C. E, curiosamente, eram escravos letrados,
na m aioria das vezes, que desem penhavam esse
to, isto é, as palavras exatas que ele falou, pode-se cer- hebraico/ aramaico, mas afalta de elementos
tam ente conhecer sua ipssima vox, isto é, sua voz exata quepossam fazer um link entre esse texto
ou, o verdadeiro conteúdo de seus ensinamentos. perdido eos evan-

.? gelhos atuais torna 0 tema um tanto especulativo. ^ .

J Você sabia? L
c
j
‫ר‬
0
b c ... ::...................==‫ ־‬Ê f ^ 5 ‫־‬rfa
Em Roma havia um escravo liberto chamado
MaroTúlioTiro, que trabalhou com Cícero e
inventou um sistema chamado “notas T
irone-

‫)ך‬ anas”, a fim depoder anotar “em tempo real" ç


c "j os discursos de Cícero.

J 0
l ‫ " ־‬λ 01,9........................ , —Sj c q ‫ב־‬

Tábuas forradas com um a camada de cera eram


geralm ente utilizadas para fazer essas anotações abre-
viadas, podendo ser reutilizadas assim que o trans-
crito era decifrado e passado em escrita norm al para
um a folha de papiro ou pergam inho. O problem a é
saber até que ponto essa prática estaria em voga no
judaísmo e acessível ao m ovim ento de Jesus.

...............
: O
c ‫ג‬
j Fato importante c
E mínimo 0número deacadêmicos que ainda
acre- dita na velha hipótesede que osquatro
evangelhos, oupelomenos alguns deles, teriam
sido original- mente escritos em hebraicoou
aramaico.

Tradicionalmente, a chamada Igreja Oriental


ou Igreja N estoriana defende a originalidade
de um novo testamento aramaico que
elespossuem.

Mas 0consenso éde que esse texto também é


uma tradução dogrego e não 0que deu origem
a ele. Contudo, existe certo consenso em torno
da hipótese de que os evangelhos atuaisforam
compilados a partir de váriasfontes, algumas
delasem hebraico e aramaico. Também acredi-
ta-se que houvepossivelmente uma antiga
versão judaico-cristã do evangelho escrita em
Semitismos nos Palavras hebraicas
evangelhos nos Evangelhos
Semitismos são certas características peculiares às lín- αμήν (amén) = ‫( מן א‬amén) - M ateus 5:18, 26; 6:2,
guas semíticas, neste caso específico, o hebraico e o ara- 5, 16; 8:10; 10:15, 23, 42; 11:11; 13:17; 16:28; 17:20;
maico. Por isso, muitos preferem falar de hebraísmos ou 18:3, 13, 18, [19]; 19:23, 28; 21:21, 31; 23:36; 24:2,
aramaísmos que, em síntese, teriam o mesmo sentido. 34, 47; 25:12, 40 ,45 ; 26:13, 21, 34; M arcos 3:28; 8:12;
9:1,41; 10:15,29; 11:23; 12:43; 13:30; 14 :9 ,18 ,25 ,30 ;
No caso dos evangelhos, esses term os eqüivalem
[16:20]; Lucas 4:24; 12:37; 18:17, 29; 21:32; 23:43
a certas expressões e m aneiras peculiares do idioma
hebreu ou aram eu que ocorrem no texto grego dos βάτος (batos) = ‫( בת‬bat, uma medida de
evangelhos e podem ser percebidos até mesmo nas quantida- de) - Lucas 16:6
traduções m odernas. O reconhecim ento prévio de al-
guns desses semitismos ajuda no m om ento de se fazer ήλ'ι (heli) = ‫( אלי‬eli, "meu Deus”) - Mateus 27:46 (2xx)
o devido uso das regras de interpretação bíblica.
λαμά (lama) = ‫( למה‬lama, "Por que?”) - Mateus. 27:46

Os antigos hebreus, por exemplo, exprimiam m σαβαχθανί (sabachthani) = ‫שבק תני‬ (shevaktani,
ui-

tas vezes a qualidade ou característica de um a pessoa, bém Deus, o Pai.


utilizando não o adjetivo, mas uma expressão de
filiação”, tendência essa seguida no grego do Novo
- estamento. Assim, uma pessoa que tinha um a virtu-
ie ou era inclinada a certo mal era chamada filho (a)
!essa virtude ou desse mal.

“Filho da perdição” = perdido (Jo. 17:12)

“Filho da paz” = pacífico (Luc. 10:16)

“Filhas de Jerusalém” = hierosolimitas (Luc. 23:28)

Não havia nas línguas semíticas a ideia de gostar


de duas coisas, porém mais de um a do que da outra,
?ara eles, o am ar e o aborrecer eram usados para ex-
?ressar ideias de preferência de um a coisa à outra. De
igual modo, as comparações eram geralmente expres-
ias m ediante negações. Assim fica mais fácil entender
expressões como estas:

“Se alguém vem a mim e não aborrece a seu pai, e sua


mãe, e m ulher e filhos, e irmãos, e irmãs e ainda a sua
própria vida, não pode ser meu discípulo” (Luc. 14:26).

“Qualquer que a m im me receber, não recebe a


mim, mas ao que me enviou” (Mar. 9:37).

O sentido da prim eira expressão é que de todos os


bens que um discípulo possui, Jesus deveria ser o mais
precioso. Já a segunda emite o conceito de que aquele
que recebe Jesus não recebe som ente ele, mas tam -
“você me rejeitou”) - M ateus 27:46

ώ σα 1Λ‫׳‬ά (hosanna) = ‫ ע ש הו‬-‫( א ג‬hosha-na) - Mateus.

21:9 (2xx); M arcos 11:9, 10

Palavras comuns do hebraico e do aramaico

άββά (abba) = ‫( אבא‬heb./aram . aba, "pai”)


Marcos 14:36

γέεν‫־‬να (geenna) = ‫; פ הנ ] א [ י ג‬.(heb. ge hinom,


"gehen- na,” "inferno,” “Vale de H innom ”); ‫פ נ‬
‫ יה ג‬..(aram. gehi- nam, “gehenna,” "inferno”) -
M ateus 5:22, 29, 30;
10:28; 18:9; 23:15, 33; M arcos 9 :43 ,45 ,47 ; Lucas 12:5

έφφαθά (ephphatha) = ‫( הפתח‬heb. hipatah, "ser


aberto”); ‫ תא??חו‬or ‫( אפתח‬aram. etpetah o ephtah,
“ser aberto”) ‫ ־‬M arcos 7:34

κορβάν (korban) = ‫( קרבן‬heb. korban, “dedicado


ao Tem plo”); ‫( קרבנא‬aram. korbana, "dedicado ao
Tem - pio”) - M arcos 7:11

κορβανάς (korbanas) = ‫( קרבן‬heb. korban,


“dedica- do ao Tem plo”); $«‫( קרב‬aram.
korbana,“dedicado ao Tem plo”) - M ateus 27:6

κόρος (koros) = ‫( כד‬cor, uma medida de


quantida- de); ‫( בורא‬Aram. cora, um a medida
de quantidade) -
Lucas 16:7

μαμωνάς (mamonas) = ‫( מון מ‬heb. mamon,


"mam- m on,” “riqueza”); ‫( מוגא מ‬aram. mamona,
“m am m on,’ “riqueza”) - M ateus 6:24; Lucas
16:9, 11, 13
πάσχα (pascha) = ‫( פסח‬heb. pesah, “Cordeiro Pas- pQ
cal”); ‫( פסחא‬aram. pasha, “Cordeiro Pascal”) - M ateus. C =‫יס‬
c
26:2, 17, 18, 19; M arcos 14:1, 12 (2xx), 14, 16; Lucas Você
2:41; 22:1, 7, 8, 11, 13, 15 sabia?
Mateusl2:18 diz: “Porei meu Espírito sobreele,
ραββί (rabbi) = ‫( רבי‬heb./aram . rabi, “rabbi,” “meu e aosgentios anunciará 0 julgamentoA
m estre”) - M ateus 23:7, 8; 26:25, 49; M arcos 9:5; palavra “julgamento”(mishpat) no contexto
11:21; 14:45 hebreu era sinônimo dapalavra “salvação”. Veja
Sal. 89:14 “Justiça eJulgamento (salvação) são
ραββουνεί (rabbounei) = ‫רבוני‬ (heb. rabuni, “m eu
0funda- mento de teu trono, 0amor
m estre”) ; ‫(_ רבתי‬aram . raboni, “m eu m estre”) - Marcos eafidelidade vão adiante de ti.”Assim,
10:51 0semitismo naspalavras de Jesus esclarece
seu ágnificado. Ele viria para
paxá (raka) = ‫( ריקה‬rekah, “em pty head”); ‫ ריקא‬c (Aram,
G anunciara “salvação”aos gentios.
reka, “cabeça vazia”) - M ateus 5:22
‫ר‬
O
GJ ‫־ס־זז‬
σάββατον (sabbaton) = ‫( שבת‬heb. shabat, “Sabbath”);
‫( תא שב‬hram. shabata, “Sabbath”) - M ateus 12:1, 2,
5,
A narrativa
8, 10, 11, 12; 24:20; 28:1 (2xx); M arcos 1:21; 2:23,
evangélica: Mito ou
24,
história real?
27 (2xx), 28; 3:2, 4; 6:2; 16:1, 2, [9]; Lucas 4:16, 31;
6:1, 2, 5, 6, 7, 9; 13:10, 14 (2xx), 15, 16; 14:1, 3, 5;
18:12; 23:54, 56; 24:1
χούμ ( koum ) = ‫ ( קום‬k m , “lev ante”) - M arcos 5:41
σατανάς (satanas)^= '‫( שטן‬heb. satan, “satan,” “acu-
λειμά (leima) = ftTih (lema, “por que?”) - M arcos
sador”); 0‫( טנא‬aram. satana, “satan,” “acusador”) - Ma-
teus. 4:10; 12:26 (2xx); 16:23; Marcos 1:13; 3:23 (2xx), 15:34

26; 4:15; 8:33; Lucas 10:18; 11:18; 13:16; 22:3, 31 σαβαχθανεί (sabachthanei) = ‫ ( תן קי ב ש‬shevaktani ,
“você me deixou”) - M arcos 15:34
σάτον (saton) = ‫( סאה‬heb. seah, um a medida de
quantidade); ‫( סאתא‬aram. sata, um a medida de quan- ταλιθά (talitha) = ‫ טליתא‬or ‫( טלתא‬talyeta or
tidade) - M ateus 13:33; Lucas 13:21 telita,

“pequeno cordeiro/garota”) - M arcos 5:41


σίκερα (sikera) = ‫שכר‬ (heb. shechar, “bebida fer-
m entada,” “cerveja”); ‫( רא שכ‬aram. shichra, “bebida
ferm entada,” “cerveja”) - Lucas 1:15

Palavras aram aicas nos evan gelh os

έλωϊ (eloi) = ‫( אלהי‬elahi, “m eu Deus”) - Marcos

15.34 (2xx)
Considerando que os evangelistas não intentaram
escrever uma “biografia” de Jesus - no sentido mo- derno
da palavra alguns têm concluído que essa narrativa sobre
Ele não pode ser considerada histó- rica. Estaria isso
certo? Tudo vai depender de como é compreendido
esse “não com prom etim ento” do evangelista com as
norm as historiográficas usadas atualm ente para se
reproduzir um acontecim ento.

De fato, não era o principal interesse dos autores


bíblicos escrever os anais da vida de Cristo para deixar à
história um legado de sua existência. Não obstante, alguns
fatores históricos e literários dem onstram que nem M
arcos, nem Lucas, M ateus ou João ficaram à mercê de
suas próprias imaginações e devaneios bus- cando criar
mitologias ou lendas à semelhança de La Fontaine
escrevendo suas fábulas.

É preciso lem brar que “evangelho” é um gênero


bíblico-literário que dem anda um texto, um a teologia e
um a história real. E um a narração “querigmática”, isto
é, de proclamação de certos feitos e ensinos de Jesus
escolhidos segundo o propósito de cada autor (Cf. Luc.
1:1 - 4 e Jo. 21:24 e 25).

Relatos lendários?
O apóstolo Paulo, que era sem dúvida um dos mais
eruditos autores do Novo Testam ento, adm itiu fran
camente o problem a evangélico de seu tem po. Ele dalo constante causado pelo Jesus dos evangelhos.
cisse que pregava a um Cristo que era “escândalo para Desde a ótica m oderna será talvez difícil perceber to-
os judeus e loucura para os gregos” (I Cor. 1:23). Den- dos os “atos escandalosos” de Jesus. Mas, num a com-
tre os prim eiros destinatários de Paulo, havia pessoas paração com o contexto da época, torna-se claro que
altamente intelectuais, instruídas na filosofia grega, nenhum autor do passado, intencionado em produzir
cue era o suprassumo cultural daqueles dias. um m ito, preservaria as ocorrências que os evange-
Sua admissão, no entanto, pode ser um grande lhos apresentam . Veja alguns exemplos:
argumento a favor da historicidade dos evangelhos.
Os discípulos (que seriam líderes da Igreja C ristã
Otto Borchert, falecido teólogo alemão, usou esse
prim itiva) são apresentados como indivíduos com
‫ ־‬rincípio da loucura e contradição para argum entar
m uitas falhas de caráter, inconstantes, precisando
porque os evangelhos são docum entos confiáveis.
sem pre ser repreendidos. Por que p erm itir que tais
Tudo se resume num a questão única e factual: Quais elem entos venham ao conhecim ento do público?
são as características de um a obra lendária? Ora, le- Se os apóstolos queriam apenas sustentar sua capa-
vando-se em conta que o questionamento de hoje não
cidade de liderança do grupo, não haveria porque
e historicidade de Jesus, mas, sim, se ele fora de fato
p erm itir que seus defeitos fossem assim apresenta-
iquilo que a Bíblia diz que ele era, é im portante en-
dos sem a m enor cerim ônia. Pedro negando Cris-
:ender por “lendária” uma referência àquelas biografias
to, T om é duvidando de sua ressurreição, Tiago e
mitológicas que transform am o sujeito de m ero m ortal
João pedindo autorização para d estruir um a cidade.
i semideus com poderes sobre-humanos.
E praticam ente todos abandonando-o no m om ento
Em outras palavras, Jesus era realm ente aquele su- da cruz.
rito formidável que os evangelhos apresentam? Ou
esses textos seriam apenas o Photoshop de um rosto Pior que isso era a apresentação em detalhes da
:omum sem nenhum atrativo em especial? crucifixão de seu M estre. A cruz hoje pode até ser
um objeto sagrado para grande parte do cristianismo.
Ninguém questiona que a prática de “maquiagem bio- Porém , nos tem pos do im pério rom ano, era a form a
gráfica” era algo bastante comum na literatura antiga. O mais vexatória de alguém ser m orto. A palavra crux
ronto é saber se os evangelhos também seguiram por esse (cruz em latim) foi usada por algum tem po como um
zaminho. Uma mera leitura das biografias “encomenda- xingam ento pelos rom anos e até os judeus conside-
:as por antigos líderes revela a prática de uma série de ravam maldito aquele que m orria no m adeiro (Deut.
riogios sutis, mesclados a certas descrições nada modestas
21:23 e G ál. 3:13).
icerca de determinado “herói”. E o caso da famosa Vida de
Zonstantino, escrita por Eusébio no século IV, ou a Vida de Se a intenção fosse atrair os que gostam de es-
Zaúdio, escrita por Díon Cássio, no século III. cândalos ou fossem politicam ente incorretos, os
evangelistas deveriam m odificar o relato da m orte
São todas verdadeiros panegíricos de louvor aos
de Cristo ou, pelo m enos, ocultar o m odo como ela
:eitos do biografado, escondendo ao m áximo seus
ocorreu. Um revolucionário m ártir que tirasse a
.‫־‬exames e suas fraquezas. Em bora sejam histórias de
tranqüilidade de César seria respeitado se m orres-
personagens reais, devem ser avaliadas com certo ce-
se decapitado, esfaqueado, envenenado, picado por
dcismo devido ao seu próprio conteúdo político que
um a serpente ou, principalm ente, num a batalha,
i e nega uma imparcialidade no relato.
com o alguns entendem poderia ter sido o caso de

O escândalo dos Bar Kochba, um pretenso Messias, que se rebelou


contra o im perador Adriano. A cruz era reservada
evangelhos para escravos, pobres ou ladrões de pequena im por-
tância. Em outras palavras, a m orte de Jesus nem
E por que os evangelhos não podem ser incluídos poderia ser classificada na conta de um m ártir res-
nessas biografias tendenciosas? Por causa do escân peitado. (Mat. 26:37; Luc. 12:50).
0 d ra m a tu rg o Sêneca (4 a .C - 6 5
d.C.) escrevendo a seu am igo Luci- liu s
arg u m e nta va que p re fe ria 0 sui- cídio à
m o rte de cruz. (Epístola 101). A ssim , a
ênfase que os evangelhos dão à cruz de C
risto - Jo ã o diz que ali ele fo i g lo rifica d o
- não faz ne- nhum se n tid o , a m enos
que fosse h is tó ria real. Pois uma
propaganda bio g rá fica tra ria coisas
acerca de C risto que a gradariam às m u
ltid õ e s. E não era esse 0 p e rfil do C risto
que os ju d e us esperavam ou que os não ju
d e us a c e ita ria m de bom grado.

Cicero, num a defesa que fez no ano


63 a.C., um senador rom ano cham ado R
abirius, disse:
"C‫׳‬h ! Quão grave seria ser desgra- çado
p u b lica m e n te por uma co rte , quão grave
seria so fre r um ca stig o , quão grave seria ser
banido. M e sm o assim , ainda em m eio a um
desastre, gozaria- m os ce rto grau de
liberdade. M e sm o se fo rm o s condenados
à m orte podem os m orrer com o hom ens livres.
M a s [...] a sim p le s m enção da palavra
'cruz‫ ׳‬deve- ria ser rem ovida não apenas da
pessoa de um cidadão rom ano, mas até m esm
o de seus pensam entos, olhos e ouvidos. [...]
A sim ples m enção dela é um des- re sp e ito
a q u a lq u e r cidadão rom ano ou hom em liv
re ." (Rab. Perd. 16).

Sêneca, ( 4 a.C - 65) foi um dos mais célebres


advogados, escritores e intelectuais do império romano
Jesus humano Üa.
7 S£L
c
Como se não bastasse a vergonha de m orrer cru- c
cificado, os m om entos finais de Jesus envolvem dois
Faío im
portante
elementos desconcertantes na biografia de um herói: Ottfro aspecto a ser considerado sobre a
historiei-
a relutância e o medo que ele dem onstrou.
Jade dos evangelhos, seriam as contradições dos
Jesus, em bora submisso, não parece aceitar na- relatos. Sefosse uma propaganda intencional, elas
turalm ente o destino que lhe estava reservado. Tal deveriam ser corrigidas, senão na compilação dos
com portam ento contrasta com o famoso m artírio de textos, pelo menos ao longo dos anospelos
Sócrates. O filósofo grego, na hora de m orrer, brin- copistas. Masforam estranhamentepreservadas.
ca com a própria sorte, até parece ansiar por aquele Nenhuma manifestação houvepara harmonizá-
m omento! Jesus, por sua vez, encontra-se apavorado las alteran- do dramaticamente 0conteúdo dos
e não esconde sua angústia ao dizer: “Pai, se possível evangelhos. Isso demonstra que nadafoi
afasta de m im esse cálice”. “editado”com ofim de

Note que os evangelhos não om item o medo e a minimizar posúveis desconfianças.


d
relutância hum ana de Cristo. Eles descrevem a an- ‫ר‬
gústia de seu Messias em cores vivas, mesmo que isso O
soasse uma covardia para quem lesse ou ouvisse o TT^‫־‬
episódio. Odisseu dizia dos grandes heróis que, ainda
que fossem perseguidos pelos deuses, não tem eriam
nada, nem vacilariam diante da m orte. Sófocles dizia Super Jesus?
que os nobres m orrem gloriosamente.
Um a comparação com as tendências da época,
Enfim , um Jesus C risto judeu que, em pleno conform e a compilação de O tto Borchert36, m ostra
O riente M édio do século I, conversa com m ulheres como deveria ser um “herói” fabricado para agradar
de vida duvidosa, tom a criancinhas no colo, m an- o gosto das multidões e seu contraste com o Cristo
da tolerar os rom anos e m orre vergonhosam ente descrito nos evangelhos.
num a cruz era um grande escândalo. Esses e outros
detalhes de sua vida form ariam um a propaganda
ü
mais repulsiva que atrativa, do ponto de vista po-
lítico-ideológico.

Logo, não é possível concluir que os autores do


Novo Testam ento, em especial os evangelistas, es-
tivessem intencionados em “fabricar” um a imagem
atrativa de Jesus apenas para angariar a simpatia do
grupo. E veja que não se tratava de criar uma ima-
gem politicam ente incorreta com o fim de atrair pelo
escândalo, pois o Cristo dos evangelhos tam bém não
possuía nenhum a característica revolucionária que se
identificasse com grupos radicais ou pessoas de m en-
te rebelde.

Era, enfim, uma imagem autêntica e não um perso-


nagem criado para alimentar determinado setor social.
SEGUNDO OS PADRÕES DA ÉPOCA, 0 QUE UM
HOMEM DEVERIA FAZER (OU EVITAR) PARA SER 0 QUE 0 JESUS DOS EVANGELHOS FEZ:
CONSIDERADO 0 HERÓI DE UM MOVIMENTO

Homero dizia que um homem magnânimo deve ser Jesus ensinou que quem quisesse ser 0 primei- ro, que
sempre 0 primeiro e estar antes dos demais. se tornasse 0 último (Mat. 9:35).

Aristóteles disse que um homem de mentalidade elevada, Jesus ensinou que 0 maior deve ser aquele que serve aos
não se acanha de receber grandes coi- sas, demais: Luc. 22:27 e Jo. 13:4ss. Em ou- tra ocasião
principalmente se a honra vier de homens de prestígio, referiu-se a si mesmo como jamais recebendo a honra
pois ele sabe que é merecedor delas. que vem dos homens: Jo. 5:41.

Ainda em Aristóteles, neste ponto seguido de uma


canção de Horácio, temos a prescrição de que um
Jesus várias vezes aceitou homenagens de pes- soas
homem de mentalidade elevada, não se permite receber
simples e de perfil moral duvidoso. Exem- pios: Zaquel,
homenagens da população mais simples, pois isso não é
0 ladrão; Maria, a mulher adúltera em casa de Simão;
bom para sua reputação de sábio. Já dizia Horácio odi
os pobres de Jerusalém, du- rante sua entrada triunfal na
profanum vulgus etarceo ("odeio a populança e a
cidade. Veja Lucas 15:1-3.
conservo longe
de mim").
!
- Jesus contava parábolas que 0 povo entendia e os
mestres religiosos não. Veja: Mat. 9:29; 11:5, 25; Jo.
Um filósofo sábio, segundo a cartilha aristoté- lica,
7:49.
deve falar a verdade com clareza para os doutos e com
ironia para a população inculta.

Teognis sugere que se um médico recebesse dos


deuses 0 poder de operar curas, deveria ti- rar proveito Que diríamos do episódio em casa de Zaqueu, 0
disso e, para a preservação de sua publicano? 0 próprio Mateustambém era um co- brador
imagem, nunca tentar a recuperação de um ho- mem de impostos detestado por todos.
imoral ("não se pode reformar um vilão").

Jesus ensinou os discípulos a não revidarem 0


mal que lhes era feito pelos romanos e, ao ser ele
Voltando a outra máxima de Aristóteles, este ainda diz
mesmo vítima deste mal, agiu de igual manei- ra.
que só um homem estúpido aceitaria os insul- tos e
Aceitou até mesmo 0 beijo de Judas que era
ensinaria seus discípulos a fazer 0 mesmo.
0 pior insulto que se podia suportar. Jo. 8:1 e 23;
Mat. 5:43-48.

Jesus várias vezes pediu sigilo daqueles a quem curou.


Por fim, Aristóteles dizia que 0 sigilo é conheci- do Por isso Marcos é considerado 0 evan- gelho do Messias
apenas dos medrosos. sigiloso. Veja ainda Jo. 8:59; 12:36.
M esm o em face a esses e outros escândalos, os com m aterial sintético. Com esse molde, a face do
evangelistas não cederam nem à omissão desses deta- contem porâneo de Cristo começou a ser delineada.
lhes, nem à distorção de como tudo aconteceu. Algo Os olhos, os lábios, o queixo. Então, finalm ente, ca-
realmente estranho para uma obra, caso esta não ti- madas de argila foram usadas para form ar os traços
vesse um a fidelidade histórica para com aquilo que do rosto, como nariz, queixo e bochechas.
estava narrando.
O resultado foi um rosto nada similar às figuras e ico-
nes tradicionais do cristianismo. Um Jesus, como disse
O rosto de Jesus o teólogo Joseph James, bem difícil de ser aceito. Mas
a despeito da seriedade do estudo e do sensacionalismo
M esmo para aqueles que não se reconhecem como
da mídia, é importante mencionar, conforme admissão
cristãos, a figura de Jesus de Nazaré ainda é, sem dú-
do próprio professor Neave, que essa tentativa forense
vida, uma das m aiores personalidades da história.
também possui suas limitações. Questões como cor da
Seus extraordinários feitos, hoje, levam pelo m enos
pele e dos olhos, forma e tamanho do cabelo e certas car-
dois bilhões de pessoas a se dizerem - ainda que no-
tilagens exteriores são fruto exclusivo da imaginação do
minalm ente - seguidoras de sua doutrina.
especialista, o que torna o resultado parcialmente artís-
Recentem ente um a pergunta de cunho confessio- tico e não 10096 científico como se supõe.
nal tem se tornado objeto de estudo de alguns cientis-
Ademais, ele usou um crânio qualquer de um judeu
tas ao redor do m undo: Qual teria sido a fisionomia
que se supõe ter vivido nos tempos de Cristo, mas ain-
de Jesus Cristo? Com o ou com quem ele se pareceria?
da que assim o seja, o crânio usado como modelo pode
Seria alguém belo pelos padrões de nossa época?
m uito bem ter sido o crânio de alguém como Barrabás,
Em 27 de m arço de 2001, foi divulgada pela BBC Judas, Simão Pedro, José de Arimateia, enfim, qual-
de Londres a notícia sobre uma pesquisa feita com quer um dos contem porâneos de Cristo, e isso, por si
ajuda de sofisticados com putadores e a impecável só, desfaz a conclusão de que temos em mãos a recons-
coordenação de Richard Neave, um dos m aiores es- trução exata do rosto do filho de Deus, a não ser que
pecialistas em reconstituição facial do m undo. aceitemos a tese, nada coerente, de que todos os judeus
do tem po de Jesus eram extremamente parecidos entre
Seu m aior fascínio, como ele mesmo admitiu, é re-
si, quase como irmãos gêmeos uns dos outros. Algo, é
constituir rostos de pessoas que viveram na Antiguida-
claro, completamente sem sentido.
de. Um de seus mais curiosos trabalhos foi a reconstru-
ção do rosto de Luzia, um a m ulher convencionalmente
considerada pré-histórica que, segundo a opinião de Visão europeia de Cristo
alguns, teria vivido no Brasil acerca de 11.500 anos.
De qualquer m odo, os traços característicos da
No entanto, Neave tinha um novo desafio: desco-
época tam bém tornam quase nula a possibilidade de
brir como seria o rosto de Jesus de Nazaré. Para estu-
Jesus ser fisionom icam ente como a tradição o com-
dos dessa natureza, Neave evidentem ente se basearia
pôs, em outras palavras, seu rosto teria pouco ou qua-
no crânio do indivíduo. Mas como não tem os os os-
se nada a ver com o que a cultura e a arte eclesiástica
sos de Jesus, afinal ele ressuscitou dentre os m ortos,
im puseram ao longo dos anos. Jesus definitivam ente
alguns arqueólogos israelenses tiveram a ideia de en-
não seria um hom em esguio, caucasiano, de cabelos
viar para o especialista um crânio do século I retirado
loiros, m uito m enos de olhos azuis.
de um antigo cem itério perto de Jerusalém.
O que pouca gente sabe é que grande parte dos
A partir daí, a técnica empregada foi a m esm a uti-
quadros clássicos de Jesus eram feitos com base num
lizada em 1999 para reconstituir o rosto de Luzia. O
program a de imitação dos perfis greco-rom anos, que
crânio em questão foi submetido a um a tom ografia
foram por m uito tem po reconhecidos como o padrão
que proporcionou imagens tridim ensionais que, por
m undial da beleza em detrim ento a todas as demais
sua vez, serviram de base para fazer um novo crânio
culturas do planeta.
C ontudo, até m esm o esse padrão era “adaptado” e compassiva, o que, é claro, são realm ente atributos
para se tornar o mais próxim o possível das feições fi- do Salvador. Mas do ponto de vista histórico, ainda
sionômicas da família real francesa, especialmente a estariam m uito distantes do biotipo judaico dos tem -
partir de Luís XIV. Afinal, até que eclodisse a Revolu- pos de Jesus.
ção em 1789, aquela era a m onarquia que mais trou-
xe transtornos ao catolicismo europeu. A tendência n s -C.Q..LP
,0,0■
forçada de retratar Cristo como um m em bro da corte
francesa era um a form a de dizer que “a Igreja ainda
pertencia ao Rei de França”.
Você
sabia?
Um pouco antes da Segunda G uerra M undial, ou- Nâofoi por mero capricho ou somentepara
tro m ovim ento se difundiu na Alemanha que come- dar uma dose maior de humor à sua obra
çava a abraçar os ideais nazistas de governo. O teó- que Ariano Suassuna, em “O Auto da
logo e político nacionalista Paul A nton de Lagarde Compade- cida”, apresentou um Jesus negro,
passou a divulgar na Alemanha a tese de que Jesus causando impacto, eaté mesmo risos nas
tinha sido um judeu ariano da Galileia, perseguido e platéias e nos leitores de modo geral. Seu
sacrificado por judeus semitas da Judeia. objetivo era, sem dúvida alguma, quebrar
O 0estereótipo do Jesus inteiramente europeu.
c
C
Ele procurava com isso convencer seus compa-
triotas de que Jesus não podia descender de um povo -gjX ^T
semita do deserto, culturalm ente pobre, de pele mo- C
rena, olhos escuros e nariz achatado. Antes, ele deve-
ria provir de um a raça superior como dos nórdicos,
cujas características faciais exibem traços nobres e η,.,,ΓΟ
bem delineados, pele clara, olhos e cabelos castanhos.
J Fato importante L
Esse m ovim ento nacionalista, envolvendo um va- 0 maisfamoso quadro de Cristofo i pintado
lor religioso de profundo significado para a fé popu- por Warner Sallman em 1941. Esta obrajá
lar foi um dos precursores do nazismo de Hitler, que vendeu mais de 500 milhões de cópias em
propagou um a das mais vergonhosas e sangrentas ex- todo 0 mundo. Aqui vê-se retratada
term inações raciais de toda a história. apercepção mais amplamente aceita de um
homem belo conforme ospadrões
Seja como for, nestes e em outros exemplos que po-
ocidentais.
deriam ser dados, o Ocidente term inou idealizando um
Cristo que se parecia com tudo, menos com um judeu A Segunda Guerra Mundial ea conseguinte
do século I. Um hom em de rosto meigo, quase femini- GuerraFria também contribuíram para a di-
no, cabelos lisos, pele clara, olhos azuis e lábios finos. fusão da obra intitulada “A Cabeçade Cristo”.
Um rosto, enfim, sublime, de todos o mais sublime: o Algumas organizações religiosas distribuíam
mais belo retrato masculino na visão ocidental. aos soldados quepartiam dosEUA para a
Europa ea Ásia versões debolsoda imagem.
As Igrejas, é claro, sempre se valeram dessa arte
para aproxim arem -se dos fiéis. E para isso, tiveram Assim, milhões decópiasforam
sempre os mais renom ados artistas de todas as escolas levadaspara asmais diferentes partes do
e de todas as épocas trabalhando em templos, cate- mundo.
drais ou em quadros clássicos que tivessem alguma Sallman alcançou tanta popularidade que
ligação pedagogia ou litúrgica com a fé. mesmo alguns protestantes, que histórica-
mente têm resistência ao uso de imagens,
contavam com um exemplar de seu quadro
em suas casas ou nas salas de O crianças. Dizem que ele criou um verdadeiro C
evangelização das

Reconhecidamente, muitas dessas gravuras popu- c “imaginário coletivo". ‫ר‬


lares evocam um a resposta emocional da m aioria das C
0
pessoas, pois elas veem ali um a figura suave, amorosa ü 6 ‫ג‬
uO U
Uma falsa descrição de Cristo
Circula pela internet o conteúdo dessa antiga carta latina escrita por um certo Públius
Lêntulus, que des- creve a fisionomia de Jesus. Esse suposto autor seria um "oficial de
Roma na província da Judeia no tem po de Tiberius Caesar” . O núcleo essencial do
documen- to é este:

"Apareceu na Judeia um hom em de virtude singu- lar, cujo nom e é Jesus Cristo, a
quem os bárbaros es- tim am como profeta, mas que seus discípulos amam e adoram
como se fosse a geração do Deus imortal. Ele chama os m ortos para que saiam das
sepulturas e cura toda sorte de doenças com um a única palavra
ou toque. (...), é um hom em alto, bem modelado (...) seu cabelo é da cor do vinho,
desce ondulado sobre os ombros; dividido ao meio, ao estilo nazareno. (...) Barba
abundante, da mesma cor do cabelo; [.‫ ] ״‬as mãos, finas e compridas; olhos claros,
[plácidos e bri- lhantes]. (...) Afirma publicam ente que os reis e es- cravos são iguais
perante Deus”.

A verdade dos fatos, no entanto, é que não exis- te na história nenhum


governador de Jerusalém ou procurador da Judeia chamado Públius Lentulus. O
único Públius Lêntulus registrado em docum entos rom anos viveu no prim eiro
século a.C.

Além disso, um procurador rom ano não escreve- ria cartas para o senado como
parece vir na introdu- ção, mas diretam ente para o im perador. Fora o fato de

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