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evolução um longo e polêmico caminho foi percor-

rido. A aceitação das ideias evolutivas não foi fácil


nem livre de disputas acirradas. Até hoje há corren-
tes que contestam a evolução, pautando-se em ex-
Processos Evolutivos plicações que eram as mais comuns até meados do
século XIX. Essa forma de pensar defende a criação
divina dos seres vivos, corrente chamada criacionis-
A biodiversidade (bio = vida) é resultado da evolução
mo, e que os seres vivos, uma vez criados, não
e, para entendê-la, temos de ter em mente que a vida
mudam ao longo do tempo, falando-se em fixismo.
e o ambiente físico estão em constante processo de
Com base nesse modo de pensar, as espécies de seres
interação e de mudança.
vivos são caracterizadas por uma essência própria,
De maneira geral, quando se fala em biodiversidade,
imutável e universal, falando-se em essencialismo.
o que nos vem à mente é a variedade de espécies.
Assim, as variações entre os indivíduos dentro de cada
Embora essa interpretação seja correta, o termo
espécie são entendidas como acidentais ou imperfei-
biodiversidade tem sido ampliado e também inclui a
ções. Apesar da existência dessas interpretações ain-
diversidade de genes em populações e a de ecos-
da nos dias de hoje, as ideias evolutivas são as mais
sistemas.
amplamente aceitas na comunidade científica e são a
Nosso enfoque será nos processos relacionados com a
base dos estudos atuais na área.
evolução biológica, procurando entender como surge
Evolução é central na forma de se pensar hoje em
e se estabelece a diversidade dos seres vivos. A diver-
Biologia, como bem colocado em 1973 pelo cientista
sidade de espécies variou ao longo da história da
ucraniano Theodosius Dobzhansky (1900-1975):
Terra. Atualmente, estima-se que existam cerca de 1,7
“Nada em Biologia faz sentido a não ser sob a luz da
milhão de espécies conhecidas, mas o número exato
Evolução”.
de espécies existentes ainda é desconhecido, esti-
mando-se que esteja entre 5 milhões e 100 milhões. Evidências da evolução
Entender a diversidade da vida passada e da atual Entender a evolução dos seres vivos e suas relações
sempre foi um desafio para os cientistas. Ao longo da de parentesco exige a análise de muitas evidências.
história da vida na Terra, dois fenômenos têm atuado Dentre elas, destacam-se os fósseis, as homologias,
decisivamente sobre a biodiversidade: o surgimento e os órgãos vestigiais, os dados moleculares e a em-
o desaparecimento de grupos de seres vivos. briologia comparada.
A análise dos fósseis, que são vestígios de organis-mos Vamos comentar um pouco sobre cada uma delas.
que viveram em épocas remotas da Terra, indica que Fósseis
o número de espécies novas aumentou muito em É considerado fóssil qualquer indício da presença de
determinados períodos do tempo geológico, assim organismos que viveram em tempos remotos na
como ocorreram eventos de extinção em massa. A Terra. Existem vários processos de fossilização. Um
extinção de espécies é um processo natural e freque- dos mais comuns é o de substituição da parte orgâ-
nte ao longo da história da vida. Houve períodos em nica de estruturas rígidas do corpo por minerais do
que vários grupos de organismos distintos se extin- solo, falando-se em petrificação. É o que acontece na
guiram de forma rápida (considerando o tempo geo- fossilização de tecidos lenhosos das plantas e de
lógico) e praticamente concomitante, o que nos leva a esqueletos.
pensar em uma causa comum para o desapareci- Quando um organismo morre, seu corpo fica deposi-
mento. As evidências sugerem que esses grandes tado sobre o solo, no assoalho oceânico ou no leito
eventos de extinção foram causados por alterações dos rios, dependendo do seu hábitat, e sofre decom-
climáticas drásticas por vezes associadas a quedas de posição. Ao longo do tempo, pode ser encoberto por
meteoritos no planeta. camadas de sedimento e sofrer fossilização. Sobre
Estudos recentes indicam que, desde o início do sé- essas novas camadas, outros organismos podem
culo XX, estamos vivendo mais um evento de extin- passar pelo mesmo processo. As camadas de sedi-
ção em massa; há pesquisadores que o consideram o mentos depositam-se umas sobre as outras. Com isso,
mais severo desde o Cretáceo, ocasião do desapare- em geral, as camadas mais inferiores são as que se
cimento dos dinossauros (exceto aves). As principais formaram primeiro e são as mais antigas; os fósseis
causas desse novo evento têm sido atribuídas a nelas encontrados correspondem a organismos que
mudanças no ambiente relacionadas principalmente à viveram em tempos mais remotos. Em função da
interferência humana nos ecossistemas. movimentação da crosta terrestre, as camadas de
Para entender a diversidade de vida como fruto da sedimento podem sofrer dobramentos, quebras ou
ser removidas pela ação erosiva dos ventos e da água.
Algumas vezes, essas alterações na crosta causam a de semelhança não é usado nos estudos que visam
inversão das camadas de sedi-mento, de modo que as estabelecer relações de parentesco evolutivo.
camadas e os fósseis mais antigos acabam ficando na São análogas, por exemplo, as asas das aves e as dos
parte superior, mascarando a interpretação. insetos: ambas desempenham a mesma função, que é
A importância do estudo dos fósseis para a evolução o voo, mas não são derivadas das mesmas estruturas
está na possibilidade de conhecermos organismos que presentes em um ancestral comum exclusivo entre
viveram em épocas remotas da Terra e muitas vezes aves e insetos.
sob condições ambientais distintas das encontradas
atualmente. Isso nos mostra que nosso planeta foi
habitado por organismos diferentes dos atuais e que
muitos deles têm semelhanças com espécies recentes,
o que nos fornece indícios de parentesco evolutivo.
Por isso, os fósseis são considerados importantes
testemunhos da evolução.
Homologia
Estruturas homólogas são aquelas que derivam de Órgãos vestigiais
estruturas já existentes em um ancestral comum Órgãos vestigiais são aqueles que, em alguns orga-
exclusivo, podendo ou não estar modificadas para nismos, são de tamanho reduzido ou atrofiado, mas
exercer uma mesma função. São exemplos de estru- que, em outros organismos, são maiores ou mais
turas homólogas entre si: os ossos dos braços dos desenvolvidos. A importância evolutiva desses órgãos
seres humanos, dos membros anteriores dos cavalos, vestigiais é a indicação de parentesco evolutivo.
das asas dos morcegos e das nadadeiras das baleias. Exemplos bem conhecidos de órgãos vestigiais no ser
Eles são homólogos porque derivam dos ossos dos humano são o apêndice vermiforme, ossos do cóccix,
membros anteriores presentes no grupo ancestral que mamilo no macho, pelos no corpo, músculos na
deu origem aos mamíferos. Nesses casos, como essas orelha, etc.
estruturas não desempenham a mesma função nos
organismos mencionados, fala-se em divergência Evidências Moleculares
evolutiva. Sabemos que todos os organismos com estrutura
Existem, no entanto, estruturas homólogas que tam- celular têm o DNA como material genético e que os
bém estão adaptadas a uma mesma função. É o caso genes são trechos dessas moléculas de DNA. Sabemos
dos ossos das nadadeiras anteriores das baleias e dos também que os genes são transcritos em moléculas
golfinhos, ambos mamíferos com os membros ante- de RNA, que podem ser traduzidas em proteínas.
riores modificados para a vida em ambiente aquático. Portanto, o DNA, o RNA e as proteínas são moléculas
Nos estudos de relações de parentesco evolutivo, presentes em todos os seres vivos. Assim, comparan-
devem ser considerados nas comparações apenas do-se as sequências de bases nitrogenadas do DNA ou
caracteres homólogos. do RNA, ou comparando-se as proteínas de diferentes
espécies de seres vivos, podemos estabelecer o grau
de proximidade evolutiva entre essas espécies. Isso
significa que podemos estabelecer o grau de paren-
tesco evolutivo entre elas. Quanto maior for a seme-
lhança nas sequências das bases nitrogenadas dos
ácidos nucleicos, ou quanto maior a semelhança entre
as proteínas dessas espécies, maior será a proximida-
de evolutiva entre elas.
Embriologia comparada
O estudo comparado da embriologia de diversos
vertebrados mostra a grande semelhança de padrão
de desenvolvimento inicial. À medida que o embrião
Há, no entanto, caracteres que se assemelham
se desenvolve, surgem características individualizan-
simplesmente por exerce-rem a mesma função, mas
tes e as semelhanças diminuem. Quanto mais diferen-
não derivam de modificações de estruturas seme-
tes são os organismos, menor é a semelhança no
lhantes, já existentes em um ancestral comum
desenvolvimento embrionário.
exclusivo. Estas são semelhantes apenas quanto à
função e são chamadas estruturas análogas. Esse tipo
As Teorias Evolutivas
que errou. Lamarck é um dos mais importantes
A Teoria de Lamarck cientistas da história da Biologia graças às suas
O naturalista francês Jean-Baptiste Lamarck (1744- cuidadosas observações da natureza, que deixou
1829) foi o primeiro pesquisador a propor um sistema registradas em muitos livros.
teórico completo para defender e explicar a evolução
biológica pautando-se em fenômenos observáveis da
natureza. Adepto da geração espontânea de orga-
nismos simples, como muitos em sua época, ele não
aceitava, no entanto, essa explicação para organis-
mos complexos. Para esses casos, aceitava ideias
evolutivas que já circulavam na época. Com base em
seus estudos e nas discussões então vigentes, passou
a propor explicações de como poderia ocorrer a
evolução dos organismos mais complexos. Lamarck
publicou suas ideias pela primeira vez em 1801, tendo
ampliado-as em 1809 na sua publicação Philosophie A teoria da seleção natural
Zoologique, e subsequentemente em 1815, na Entre dezembro de 1831 e outubro de 1836, o natura-
introdução do seu Historie Naturelle des Animaux sans lista inglês Charles Darwin (1809-1882) realizou uma
Vertébres. Nesses trabalhos, ele defende a ideia de
viagem ao redor do mundo a bordo do navio H. M. S.
que as espécies, incluindo a humana, são descenden- Beagle. Durante essa viagem, Darwin coletou muitos
tes de outras espécies. Seu trabalho de 1809 tem uma animais, plantas e fósseis de diferentes locais por
composição teórica ampla sobre a progressão dos onde o navio passou. Com base em muitas observa-
seres vivos. Porém, apenas duas leis, dentro dessa ções da natureza, ele começou a contestar a imutabi-
rede teórica, acabaram recebendo um destaque lidade das espécies.
maior. São elas:
• Lei do uso e do desuso: o uso de determinadas
partes do corpo faz com que elas se desenvolvam e o
desuso faz com que elas se atrofiem.
• Lei da herança dos caracteres adquiridos: as
características que os indivíduos adquirem em sua
vida são passadas aos descendentes. Ele não se
preocupou em explicar como ocorre o processo de
herança. Na época, os conhecimentos de genética
eram rudimentares e ele simplesmente se deteve em Nos 20 anos que se seguiram após seu retorno,
dizer que há herança de caracteres adquiridos sem Darwin trabalhou em muitos outros projetos de
explicar como ocorre a herança. Um dos exemplos pesquisa e amadureceu suas ideias sobre evolução.
mais clássicos dessas leis é a herança do pescoço da Na mesma época, o naturalista inglês Alfred Russel
girafa. Reproduzimos aqui o trecho da obra de Wallace (1823-1913) realizou no período de 1848 a
Lamarck em que isso é relatado: “A girafa vive em 1850 uma viagem pelo Amazonas, acumulando valiosa
lugares onde o solo é quase invariavelmente seco e coleção de organismos dessa região, que infelizmente
sem capim. Obrigada a comer folhas e brotos no alto foi perdida em um incêndio quando retornava à
das árvores, ela é forçada, continuamente, a se esticar Inglaterra. Wallace sobreviveu a esse acidente e
para cima. Esse hábito, mantido por longos períodos conseguiu salvar muitas de suas anotações, que se
de tempo por todos os indivíduos da raça, resultou tornaram a base para a publicação de um livro.
nas pernas anteriores mais longas que as posteriores Depois, viajou pelo arquipélago malaio entre 1854 e
e o pescoço tão alongado que a girafa pode levantar a 1862, retornando ao seu país, onde se dedicou a
cabeça a uma altura de 5 metros, sem tirar as pernas inúmeras pesquisas cientificas e à publicação de
anteriores do solo.” muitos livros.
Somente muito mais tarde os cientistas puderam Quando Wallace estava no arquipélago malaio,
repensar a herança dos caracteres adquiridos. Uma escreveu uma carta a Darwin apresentando as ideias
pessoa que pratica atividade física, por exemplo, terá que vinha desenvolvendo a respeito de evolução das
musculatura mais desenvolvida, mas essa condição espécies por seleção natural. Ao ler a carta de
não é transmitida aos seus descendentes. A não Wallace, Darwin constatou a semelhança com ideias
aceitação de algumas das ideias de Lamarck não deve que ele também vinha desenvolvendo. Desse modo,
fazer com que ele seja reconhecido como o cientista
em 1858, Darwin e Wallace escreveram separada- contribuiu para a formulação da teoria da seleção
mente textos sobre evolução por seleção natural que natural. Nesse ensaio, Malthus afirmava que a
foram apresentados à comunidade científica. Em produção de alimentos cresce em escala aritmética,
1859, Darwin publicou o livro que começou a mudar a enquanto a população humana cresce em escala
história da Biologia: A origem das espécies por meio geométrica, o que é um dos fatores determinantes da
da seleção natural, ou a preservação das raças fome e da competição por alimento. Se não ocor-
favorecidas na luta pela vida. Em seu livro, Darwin rerem fatores que impeçam esse crescimento popu-
propunha algumas premissas (que serão discutidas lacional humano, não haverá comida suficiente para
mais adiante), e, dentre elas, duas ideias centrais: todos. Ao ler esse ensaio em 1838, Darwin imaginou
• todos os organismos descendem, com modifi- que isso deveria acontecer também com os demais
cações, de ancestrais comuns; seres vivos, e não somente com a espécie humana.
• a seleção natural atua sobre as variações indi- Adaptando as ideias de Malthus, Darwin dizia que as
viduais, favorecendo as mais aptas. populações têm maior capacidade de crescer por re-
As ideias de Wallace foram publicadas posteriormen- produção do que o meio tem de sustentar esse au-
te, no livro intitulado Contribuições para a teoria da mento no número de indivíduos; assim, muitos não
Seleção Natural, de 1870. Suas ideias não eram conseguem sobreviver, pois não há os recursos
idênticas às de Darwin, mas os dois princípios acima necessários para todos. O crescimento populacional
mencionados estavam presentes. Em função, seria controlado, portanto, por limites impostos pelo
principalmente, da publicação do livro A origem das meio. A falta de recursos disponíveis para todos
espécies, a teoria da seleção natural ficou conhecida levaria à competição, e os indivíduos com caracte-
como sendo desenvolvida apenas por Darwin. No rísticas mais vantajosas para determinado ambiente
entanto, Wallace merece créditos na elaboração teriam maiores chances de sobreviver e de se repro-
dessa teoria. Um dos muitos elementos que contri- duzir, passando as características vantajosas aos seus
buíram para as ideias de Darwin foi a fauna do descendentes. Essa é a essência da teoria da seleção
arquipélago de Galápagos (do espanhol: galápago = natural. Assim, o ambiente é o agente que seleciona
jabuti), localizado no Oceano Pacífico, a cerca de 1 naturalmente aqueles indivíduos com características
000 km do continente sul-americano e formado por que lhes conferem maiores chances de sobrevivência
um conjunto de ilhas vulcânicas. Darwin ficou e sucesso reprodutivo em uma dada condição ambi-
impressionado com os jabutis gigantes e com as ental. Para reforçar sua teoria, Darwin baseou-se
espécies de tentilhões que ocorrem nas diferentes também nas diferentes raças de animais e variedades
ilhas. de plantas que surgem pelo processo de seleção
artificial, isto é, feito pelo ser humano. Nesse caso, há
a seleção de indivíduos, para a reprodução, que
tenham características consideradas vantajosas para
um determinado propósito humano, e que devem ser
mantidas na prole (reprodução seletiva). Por meio
desse processo de seleção artificial, o ser humano
consegue produzir, por exemplo, raças muito dife-
rentes de cães.
Diversas variedades de plantas também foram e ainda
A semelhança entre essas espécies de tentilhões e a são produzidas por seleção artificial, como acontece
que vive no continente sul-americano levou Darwin a com repolho, couve-flor, couve-de-bruxelas e brócolis,
supor que indivíduos da população de tentilhões do todas derivadas de uma espécie selvagem, a Brassica
continente teriam migrado, há muito tempo, para oleracea (mostarda-selvagem). Os agricultores sele-
essas ilhas. Por seleção natural, teriam surgido cionaram diferentes características dessas plantas e
populações adaptadas a diferentes modos de vida, realizaram cruzamentos seletivos.
dando origem às diferentes espécies. Darwin dizia que o mesmo poderia ter acontecido na
Com base na análise de dados semelhantes a esses e natureza e que o agente selecionador seria a própria
de muitos outros, inclusive de fósseis, Darwin ficou natureza, que atua sem uma intenção. Na seleção
convencido de que as espécies podem mudar ao artificial, por outro lado, há uma intenção, uma
longo do tempo, ou seja, evoluir, e começou a buscar finalidade. Dentro dessa perspectiva, Darwin evitou,
explicações para esse processo. O livro Ensaio sobre o em seus trabalhos publi-cados, utilizar o termo
princípio da população, do economista britânico “evolução”, para não ficar implícita a ideia de pro-
Thomas Malthus (1766-1834), publicado em 1798, gresso ou aperfeiçoamento, referindo-se ao processo
como “descendência com modificação”. O resultado
da evolução biológica não é a perfeição nem o pro- Mutações
gresso das espécies. A seleção natural deve ser enten- As mutações são uma das fontes primárias de varia-
dida como um mecanismo evolutivo e, como tal, não bilidade. As mutações não ocorrem para adaptar o
tem finalidade ou intenção. Deve-se evitar dizer que indivíduo ao ambiente:
uma espécie “desenvolveu” uma adaptação ou que os elas ocorrem ao acaso e, por seleção natural, tendem
organis-mos “tentam” ou “querem” se adaptar, o que a ser mantidas quando adaptativas (seleção positiva)
seria um linguajar finalista, com um fim determinado. ou eliminadas em caso contrário (seleção negativa).
Por outro lado, também, é comum se deparar com a Há também mutações gênicas que são neutras.
ideia errônea de que a seleção natural é um processo Podem ocorrer em células somáticas ou em células
aleatório, que ocorre totalmente ao acaso. A varia- germinativas; neste último caso, as mutações são de
bilidade genética de uma população é resultado de fundamental importância para a evolução, pois são
mecanismos aleatórios, como a mutação e a recom- transmitidas aos descendentes.
binação. Na seleção natural, porém, as variedades Permutações e reprodução sexuada
fenotípicas que são positivamente selecionadas são Esses dois processos aumentam a variabilidade gene-
aquelas que aumentam a chance de sobrevivência e tica nas populações.
de sucesso reprodutivo, não sendo algo aleatório. Durante a gametogênese, a célula germinativa diploi-
Surgem assim características adaptativas que são o de sofre meiose, produzindo quatro gametas – células
resultado da seleção natural atuando ao longo de haploides que contêm um cromossomo de cada par
várias gerações. Do mesmo modo que Lamarck e de homólogos. Como se sabe, os cromossomos segre-
Wallace, Darwin também não conseguiu explicar gam-se independentemente, o que possibilita grande
corretamente como surgia a variação nem como número de combinações entre eles, dando origem a
ocorria a transmissão das características hereditárias vários tipos de gametas.
ao longo das gerações. Os conhecimentos de gene- Todas as considerações feitas até agora não incluíram
tica eram rudimentares na época e, apesar de o tra- a ocorrência de permutação, que é a troca de seg-
balho de Mendel sobre as leis da herança ter sido di- mentos entre cromossomos homólogos na meiose
vulgado em 1865, só passou a ser considerado impor- (não confundir com translocação, que é a troca de
tante na virada do século XX, duas décadas após a segmentos entre cromossomos não homólogos).
morte de Darwin. Assim, a variabilidade genotípica aumenta, pois, pela
A teoria sintética da evolução permutação, podem-se estabelecer novas combina-
Com o redescobrimento, em 1900, dos trabalhos de ções entre os genes e há aumento também do núme-
Mendel com ervilhas e as discussões sobre mutações ro de gametas diferentes.
gênicas, surgidas na época, os adeptos da genética Uma vez formados os gametas, podem ocorrer:
mendeliana passaram a propor que apenas as muta- • fecundação cruzada: união entre gametas de indiví-
ções seriam responsáveis pela evolução. A seleção duos diferentes, mas da mesma espécie;
natural, segundo essa interpretação, não teria • autofecundação: união entre gametas masculinos e
participação nesse processo. Somente mais tarde, femininos produzidos pelo mesmo indivíduo.
vários pesquisadores voltaram a dar importância à Populações de indivíduos que apresentam fecundação
seleção natural e a relacionar as contribuições da cruzada têm maiores possibilidades de aumentar a
genética, da paleontologia e da sistemática em uma variabilidade genética sem adição de genes novos por
nova teoria, que ficou conhecida como teoria mutação gênica ou imigração.
sintética da evolução. O aumento da variabilidade genética é vantajoso, pois
Desde a década de 1930 essa teoria vem ganhando aumenta a chance de sobrevivência da população em
força. Novas informações sobre DNA, biologia mole- caso de modificações no meio. Até mesmo em herma-
cular, ecologia, biologia reprodutiva e muitos outros froditas foram selecionados, ao longo de sua evolu-
aspectos têm sido incorporadas à interpretação dos ção, vários mecanismos que dificultam a autofecun-
processos evolutivos. dação e favorecem a fecundação cruzada, possibili-
Segundo a síntese evolutiva, os principais fatores que tando, desse modo, aumento na variabilidade.
atuam em uma população são mutação, recombina- Por recombinação, a variabilidade genética de uma
ção genética (permutação), migração, seleção natural população pode aumentar sem adição de genes no-
e deriva genética. vos, produzidos por mutação ou por imigração de
Vamos analisar esses fatores: indivíduos de outras populações.
Migração Exemplos de Seleção Natural
A migração corresponde aos processos de entrada Resistência a antibióticos ou a inseticidas
(imigração) ou saída (emigração) de indivíduos de A resistência de bactérias a antibióticos e de insetos a
uma população, geralmente associada à busca por inseticidas tem aumentado muito nos últimos anos,
melhores condições de vida. havendo sempre a necessidade de se desenvolver
Na imigração, a chegada de novos indivíduos pode novos antibióticos e novos inseticidas.
introduzir novos genes na população, o que aumenta Coloração de advertência e mimetismo
sua variabilidade genética. Por outro lado, na emi- Alguns animais produzem ou acumulam substâncias
gração, com a saída de indivíduos, pode haver redu- químicas nocivas e apresentam cores vistosas, carac-
ção da variabilidade genética da população. terística chamada coloração de advertência, sinali-
Populações grandes que estão sofrendo o processo de zando que eles não devem ser ingeridos. Quando um
migração geralmente não apresentam alterações predador tenta se alimentar de um desses organis-
significativas nas frequências de alelos. Já em popu- mos, aprende a não mais comer outro semelhante.
lações pequenas, a migração pode alterar significati- Existem casos de animais e de plantas de sabor
vamente essas frequências. agradável (palatáveis) para quem deles se alimenta
A migração permite que se estabeleça fluxo gênico que se assemelham a outras espécies não palatáveis,
entre populações distintas, diminuindo as diferenças o que confunde seus predadores. É o que ocorre com
genéticas entre elas. a borboleta-vice-rei, palatável a pássaros, que se asse-
Seleção natural melha à borboleta-monarca, não palatável. Esses ca-
Já discutimos os princípios gerais da seleção natural e, sos são chamados mimetismo.
aqui, vamos apenas acrescentar mais algumas consi- Camuflagem
derações e exemplos. A seleção natural atua sobre os A ação da seleção natural também é verificada no
fenótipos, que resultam da interação entre genótipos estabelecimento de características que tornam os
e meio. organismos semelhantes a outros componentes do
O ambiente não representa um sistema estável, nem ambiente, de modo que passam despercebidos de
ao longo do tempo, nem ao longo do espaço, o que seus predadores, ou estes de suas presas.
propicia diferentes pressões seletivas na população. Deriva genética
Isso evita a eliminação de determinados fenótipos que A deriva genética corresponde a processos aleatórios
em um ambiente constante e estável não seriam que reduzem a variabilidade genética de uma popula-
mantidos. Dessa forma, a variabilidade genética sofre ção sem relação com maior ou menor adaptabilidade
menor redução. dos indivíduos. Um exemplo de deriva genética é a
Dependendo do ambiente, por exemplo, pode ser que modificação da composição genética de uma popula-
sejam mantidas na população até mesmo caracterís- ção em função de queimadas; em decorrência delas,
ticas fenotípicas que normalmente seriam eliminadas são eliminados aleatoriamente indivíduos da popula-
por serem pouco adaptativas. Um exemplo na espécie ção, e os que ficam não são necessariamente os mais
humana é a doença chamada anemia falciforme ou capazes de sobreviver e ter sucesso reprodutivo. Em
siclemia. populações pequenas, os efeitos da deriva sobre a
Essa doença é causada por um alelo que condiciona a variabilidade genética são mais evidentes, pois, em
formação de moléculas anormais de hemoglobina algumas gerações, certas variações podem sumir e
com pouca capacidade de transporte de oxigênio. As outras podem aumentar de frequência.
hemácias que as contêm adquirem o formato de foi- Ao contrário da seleção natural, que é um processo
ce. Por essa razão são chamadas hemácias falcifor- não aleatório de seleção de indivíduos com caracte-
mes. rísticas vantajosas a uma dada condição ambiental, a
deriva genética é um processo totalmente ao acaso.

Os indivíduos heterozigóticos apresentam tanto


hemácias e hemoglobinas normais como hemácias
falciformes. Apesar de ligeiramente anêmicos, sobre-
vivem, embora com menor viabilidade em relação aos
homozigotos normais.

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