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https://doi.org/10.1590/1982-3703003190125 Artigo
Resumo: Este artigo tem como objeto a pesquisa etiológica sobre a anorexia. Nesse sentido,
expõe os resultados da pesquisa teórica em psicanálise conduzida em 2016, com recursos
públicos para implementação de bolsa de iniciação científica. Por meio da análise e organização
do levantamento conceitual sobre o tema no campo da psicopatologia clássica e da psicanálise,
foi possível problematizar a validade da classe de transtorno alimentar, definida na quinta
edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) para elucidar o
quadro sintomático da anorexia, e conduzir uma pesquisa etiológica, em psicanálise, sobre
os determinantes psíquicos do desencadeamento da anorexia. A pesquisa interrogou a
consistência do diagnóstico psicanalítico de psicose para alguns casos em que vigorariam
características clínicas que, no DSM-5, induziriam ao diagnóstico de anorexia e formulou
a hipótese de que o diagnóstico de psicose, tal como definido pela psicanálise, elucida a
etiologia de determinados casos de anorexia em que vigora a recusa do alimento a serviço da
cadaverização, da desvitalização e da rigidez identificatória à denominação sou anoréxica.
A retomada do caso de Ellen West, paciente do psiquiatra suíço Ludwig Binswanger, cumpre
neste artigo exatamente o papel de verificar a hipótese da pesquisa de que a recusa do alimento,
a serviço da cadaverização e da desvitalização, pode ser tributária da psicose.
Palavras-chave: Anorexia, Psicose, Psicanálise, Diagnóstico, Psicopatologia.
Resumen: El presente artículo tiene como objeto la investigación etiológica sobre la anorexia.
Para ello, expone los resultados de la investigación teórica en psicoanálisis conducida en
2016 con recursos públicos para la implementación de una beca de iniciación científica.
Disponível em www.scielo.br/pcp
Psicologia: Ciência e Profissão 2020 v. 40, e190125, 1-15.
Por medio del análisis y organización del levantamiento conceptual sobre el tema en el campo
de la psicopatología clásica y del psicoanálisis, fue posible problematizar la validez de la clase
de trastorno alimenticio, definida en la quinta edición del Manual Diagnóstico y Estadístico
de los Trastornos Mentales (DSM-5) para la elucidación del cuadro sintomático de la anorexia,
y conducir una investigación etiológica en psicoanálisis sobre los determinantes psíquicos del
desencadenamiento de la anorexia. La investigación interrogó la consistencia del diagnóstico
psicoanalítico de psicosis para algunos casos en que pudieran aplicarse características clínicas
que, en el DSM-5, inducirán al diagnóstico de anorexia, y formuló la hipótesis de que el diagnóstico
de psicosis, tal como es definido por el psicoanálisis, elucida la etiología de determinados casos
de anorexia en los cuales se rige el rechazo del alimento al servicio de la cadaverización, de
la desvitalización y de la rigidez identificatoria a la denominación soy anoréxica. Este artículo
reanuda el caso de Ellen West, paciente del psiquiatra suizo Ludwig Binswanger, para verificar
exactamente la hipótesis de que la negativa del alimento, al servicio de la cadaverización y de la
desvitalización, puede ser tributaria de la psicosis.
Palabras clave: Anorexia, Psicosis, Psicoanálisis, Diagnóstico, Psicopatología.
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Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). Anorexia e Psicose.
Quadro 2.
Critérios diagnósticos para anorexia nervosa no DSM-5.
A. R
estrição da ingestão calórica em relação às necessidades, levando a um peso corporal significativamente
baixo no contexto de idade, gênero, trajetória do desenvolvimento e saúde física. Peso significativamente
baixo é definido como um peso inferior ao peso mínimo normal ou, no caso de crianças e adolescentes,
menor do que o minimamente esperado.
B. M
edo intenso de ganhar peso, engordar ou comportamento persistente que interfere no ganho de peso,
mesmo que este esteja significativamente baixo.
C. P
erturbação no modo como o próprio peso ou a forma corporal são vivenciados. Influência indevida do
peso ou da forma corporal na autoavaliação ou ausência persistente de reconhecimento da gravidade do
baixo peso corporal atual.
Determinar o subtipo:
(F50.01) Tipo restritivo: durante os últimos três meses, o indivíduo não se envolveu em episódios recorrentes
de compulsão alimentar ou comportamento purgativo (i.e., vômitos autoinduzidos ou uso indevido de
laxantes, diuréticos ou enemas). Esse subtipo descreve apresentações nas quais a perda de peso seja
conseguida essencialmente por meio de dieta, jejum e/ou exercício excessivo.
(F50.01) Tipo compulsão alimentar purgativa: nos últimos três meses, o indivíduo se envolveu em episódios
recorrentes de compulsão alimentar purgativa (i.e., vômitos autoinduzidos ou uso indevido de laxantes,
diuréticos ou enemas).
Especificar se:
Em remissão parcial: depois de terem sido preenchidos previamente todos os critérios para anorexia
nervosa, o Critério A (baixo peso corporal) não foi mais satisfeito por um período sustentado, porém ou
o Critério B (medo intenso de ganhar peso ou de engordar, ou comportamento que interfere no ganho
de peso), ou o Critério C (perturbações na autopercepção do peso e da forma) ainda está presente.
Em remissão completa: depois de terem sido satisfeitos previamente todos os critérios para anorexia
nervosa, nenhum dos critérios foi mais satisfeito por um período sustentado.
Especificar a gravidade atual:
O nível mínimo de gravidade se baseia, em adultos, no índice de massa corporal (IMC) atual (ver a seguir)
ou, para crianças e adolescentes, no percentil do IMC. Os intervalos apresentados a seguir são derivados
das categorias da Organização Mundial da Saúde para baixo peso em adultos; para crianças e adolescentes,
os percentis do IMC correspondentes devem ser usados. O nível de gravidade pode ser aumentado de maneira
a refletir sintomas clínicos, o grau de incapacidade funcional e a necessidade de supervisão.
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Psicologia: Ciência e Profissão 2020 v. 40, e190125, 1-15.
Da mesma forma, a leitura dos critérios diag- pulsão em cada estrutura. Dessa forma, a referên-
nósticos para a anorexia deixa claro que o DSM-5 cia de Recalcati aponta para a íntima relação entre
não avança a descrição da fenomenologia clínica teoria e clínica, ao considerar que as características
apresentada na direção de sua etiologia, deslocan- clínicas da anorexia são dependentes do funciona-
do-se rapidamente para a identificação comporta- mento psíquico na neurose e na psicose, e não são
mental dos seus subtipos e especificações. De fato, indicativas da classe dos transtornos alimentares,
o medo intenso de ganhar peso, com ocorrência de conforme sugere o DSM-5.
restrição da ingesta calórica em relação às necessi- A pesquisa que está na origem deste presente
dades – mesmo com peso já inferior ao peso mínimo artigo interrogou, então, a consistência do diag-
normal – e a perturbação no modo como o próprio nóstico psicanalítico de psicose para alguns casos
peso ou a forma corporal são vivenciados indicam a em que vigorariam características clínicas que, no
irrupção de uma perturbação na relação entre o indi- DSM-5, induziriam ao diagnóstico de anorexia.
víduo e a experiência de seu corpo. E que apenas é E formulou a hipótese de que o diagnóstico de psicose,
indicada sem que haja, por exemplo, uma interroga- tal como definido pela psicanálise, elucida a etiologia
ção referente à etiologia psíquica dessa perturbação de determinados casos de anorexia nos quais vigora
para além da descrição de sua fenomenologia obser- a recusa do alimento a serviço da cadaverização, da
vável. O divórcio com a pesquisa etiológica em psi- desvitalização e da rigidez identificatória à denomi-
copatologia é, portanto, inseparável da ascensão de nação sou anoréxica.
uma concepção ateórica cujo resultado é a inflação A apresentação de algumas referências clássicas
diagnóstica, já mencionada anteriormente. em psicopatologia cumpre o papel de expor a com-
O estudo de Alckmin-Carvalho et al. (2016) cor- plexidade da pesquisa etiológica sobre o desencade-
robora com esse ponto, ao apontar que tratamentos amento da anorexia, ao mesmo tempo em que expõe
ambulatoriais e unidades de internação apresentam o cuidado com que os autores de época – Charles
índices desanimadores de aderência ao tratamento Lasègue, William Withey Gull, Jean-Martin Charcot,
e à recuperação da anorexia a ponto de constatarem Pierre Janet, Ludwig Binswanger, Jules Cotard –
que, para esses casos, a recaída e a demanda de novo consolidaram essa pesquisa em torno do eixo
tratamento parecem ser mais regra do que exceção. clínica-teoria-psicopatologia. Com isso, espera-se
Os autores citam dois estudos longitudinais com evidenciar a precisa dimensão desse eixo na condu-
pacientes que deram entrada em uma unidade de ção da pesquisa diagnóstica no século XIX, bem como
internação com diagnóstico de anorexia. O primeiro sua atualidade para o avanço nas referências mais atu-
deles foi conduzido nos anos 1970 e acompanhou, ais em psicanálise sobre o tema em articulação com
durante 41 anos, pacientes com diagnóstico de ano- a pesquisa etiológica sobre a psicose. Obedecendo a
rexia. O estudo registrou percentual de 5% de óbi- esse recurso metodológico à psicopatologia clássica,
tos, 39% de recuperação completa e 66% de recaída o caso de Ellen West, paciente do psiquiatra suíço
e nova demanda de tratamento. O segundo estudo Ludwig Binswanger, cumpre neste artigo exatamente
longitudinal acompanhou, durante noventa meses, o papel de interrogar a validade da hipótese de que a
uma amostra de 243 mulheres com anorexia e obser- recusa do alimento está a serviço da cadaverização e
vou que apenas 33% das participantes se recupera- da desvitalização, podendo ser tributária da psicose.
ram completamente, com percentual de recaída de O artigo dividirá a descrição dos resultados em
um terço após o tratamento. três partes. A primeira posiciona a psicopatologia
Na direção contrária da perspectiva ateórica clássica como atual na pesquisa psicanalítica sobre a
do DSM, dois estudos de Recalcati (1997, 2011), etiologia psíquica da anorexia, por definir a anorexia
seguindo o marco teórico da psicanálise, já explora- como fenômeno clínico, e não como classe diagnós-
vam a relação entre os sintomas clínicos da anorexia tica. A segunda parte retoma a síndrome de Cotard
e os processos psíquicos em jogo em sua formação, para interrogar os fenômenos clínicos da anorexia à
verificando, assim, a necessidade de elucidar tais sin- luz da hipótese de psicose. O impacto dessa hipótese
tomas à luz dos processos de recalcamento e foraclu- sobre o entendimento da anorexia será analisado na
são – típicos da constituição das estruturas psíquicas terceira parte, com a retomada do testemunho de
(neurose e da psicose) – e do destino assumido pela Ellen West.
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Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). Anorexia e Psicose.
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Ele identifica três fases na formação de quadro tuberculose, o autor associara esse traço clínico a um
clínico e isola sua etiologia. A primeira fase se carac- estado mental mórbido caracterizado pela decisão
teriza pela diminuição na ingestão de alimentos deliberada de deixar de comer presente na histeria
com o objetivo de obter alívio para as dores gástricas sem, no entanto, haver evidências quanto à ocorrên-
experienciadas pelas pacientes após cada refeição. cia dos clássicos sintomas de contratura, convulsão
A segunda fase é denominada de “perversão mental” e hemiplegia.
e é situada por Lasègue (1873/1998) como a fase
de consolidação do quadro principal da anorexia.
Nesta fase, as tentativas de induzir as pacientes a se
alimentarem são ineficazes, evidenciando o estado
psíquico de resistência a se alimentar. A fase final já
evidencia o avanço desse estado de resistência e suas
consequências: amenorreia, ressecamento da pele e
sensação de desfalecimento.
Quanto à etiologia, Lasègue (1873/1998) isola na
recusa, um estado mental comum a todos os casos
estudados. Esse estado mental explicaria a ocor-
rência, de um lado, do excesso de quietude “verda- Miss A. Número 1 Miss A. Número 2
deiramente patológica” testemunhada por meio de
uma fórmula típica – “não conseguia, era mais forte
do que eu e, além do mais, estava passando bem”
(Lasègue, 1873/1998, p. 171) – e, de outro, a irrupção
de um estado de contentamento, de entusiasmo ver-
dadeiramente patológico em que as pacientes não
têm a dimensão da gravidade de seu quadro clínico.
Quanto à direção de tratamento, o autor defendeu
uma conduta bastante atenta por parte do médico,
já que o estado mental de recusa de comer é insepará-
vel de um quadro maníaco de bulimia para expulsão
Miss B. Número 1 Miss B. Número 2
de calorias e adições em geral.
A atenção devida à evolução desse quadro clínico
deve ser o eixo da conduta clínica já que a paciente
nesse estado só aceita ajuda no momento em que o
quadro maníaco fracassa e cede lugar ao sadness-sign
(Lasègue, 1873/1998).
Simultaneamente, William Withey Gull (1874/1997)
apresenta três estudos de caso à Clinical Society of
London, em que concentrou maior atenção aos efeitos
da inanição prolongada do que ao fator psíquico: perda
de apetite, emagrecimento extremo, fraqueza, inquieta-
ção, amenorreia e leve constipação. Seguindo o proce- Miss C. Número 1 Miss C. Número 2
dimento investigativo do século XIX, o autor registra em Figura 1
desenho o quadro clínico das pacientes antes e depois Esboço das pacientes estudadas por Gull (1874/1997).
do tratamento, conforme reproduzido na Figura 1.
O registro em desenho feito por Gull (1874/1997) No quadro do avanço da investigação psicopato-
ressaltava o traço clínico do emagrecimento extremo, lógica em torno da anorexia no século XIX, ressalta-se
da apepsia histérica, como indicador da anorexia. ainda a referência de Jean-Martin Charcot no mesmo
Contrariando a suposição da época, de que o traço sentido de correlacionar o fenômeno clínico da ano-
de emagrecimento poderia estar correlacionado à rexia à etiologia da histeria. Entre os anos de 1882 e
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Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). Anorexia e Psicose.
1885, Charcot desenvolveu 25 estudos de caso com o reconhecimento clínico de seu desencadeamento:
o objetivo de descrever as várias formas da “grande na melancolia ocorre a retração pulsional e o melan-
histeria”. Dentre esses casos, Charcot relata o de uma cólico experiencia essa retração como perda da libido.
jovem que havia estado muito obesa por cerca de seis O “Rascunho G” (Freud,1895/1982) evidencia que o
meses e que passara a, sistematicamente, recusar processo psíquico de constituição da psicose melan-
todo tipo de alimento sem apresentar problemas de cólica será, para Freud, a chave conceitual para o
deglutição ou estomacais como correlatos fisiológicos entendimento da anorexia. De fato, referindo-se ao
para tal recusa. Ele isola, então, na ocorrência da ideia exemplo clínico da anorexia, o autor sustenta que
fixa de obesidade ou fobia de peso, o traço psicopato- esta é uma manifestação da melancolia: “a paciente
lógico que estaria na motivação ao jejum da anorexia afirma que não se alimenta simplesmente porque não
(Silverman, 1997). tem nenhum apetite; não há qualquer outro motivo.
Em 1903, Pierre Janet apresenta o estudo de caso Perda do apetite – em termos sexuais, perda da libido”
de Nadia, de 22 anos, como anorexia mental, ressal- (Freud, 1895/1982, p. 150).
tando o seguinte conteúdo discursivo da paciente Essa posição epistemológica contraria a hipótese
durante as consultas: “você acredita que eu estou tão de Lasègue (1873/1998), Gull (1874/1997), Charcot
magra quanto da última vez? Por favor, diga-me que (Silverman, 1997) e Janet (Cordás & Claudino, 2002),
serei sempre magra” (Cordás & Claudino, 2002, p. 4, que localizam na recusa do alimento o fator etioló-
tradução nossa). Seguindo a hipótese de Lasègue
gico da anorexia histérica. Ela exige, então, interro-
(1873/1998) sobre a associação entre histeria e ano-
gar pela etiologia da recusa do alimento situando
rexia, Janet distinguiu duas formas de anorexia com
nos conceitos de recalcamento e rejeição a chave de
base na presença ou ausência de apetite: a forma obses-
interpretação teórica para elucidar sua etiologia na
siva, na qual o apetite estava preservado, e a forma his-
neurose e na psicose. Seguindo essa interrogação,
térica, em que se evidenciava a perda do apetite.
Freud (1895/1982) sustenta que a anorexia seria uma
A fundação da psicanálise, na passagem do
manifestação clínica do processo de luto pela perda
século XIX para o século XX, traz o debate vivo com
da libido, típica da melancolia.
a psicopatologia da época em torno da relevância
A hipótese de Freud é de extrema sofisticação na
da hipótese da casualidade inconsciente na etiolo-
medida em que conduz a pesquisa etiológica nesse
gia da histeria.
campo para a elucidação da recusa do alimento à luz
Se o conjunto das referências conceituais extraí-
do luto pela perda da libido. Esse ponto reaparece no
das da psicopatologia clássica trabalhava com a hipó-
texto de Freud (1911/1982) quando interroga a ocor-
tese de que a anorexia era uma manifestação clínica
rência das ideias de emagrecimento em Schreber e
da histeria, para Freud, a própria investigação etioló-
gica da histeria exigia da teoria a formulação de novos formula a hipótese de que a etiologia de tais ideias
conceitos: inconsciente, pulsão e recalcamento. Dessa deveria ser buscada na ocorrência da hemorragia
forma, para Freud, a recusa do alimento não elucida- pulsional típica do processo de retração do investi-
ria o desencadeamento da anorexia; antes, ela era o mento pulsional na psicose. Avançando na referência
efeito de um processo psíquico mais fundamental. específica da hemorragia pulsional típica da psicose
O caso de Emmy Von N. é, nesse sentido, exemplar. melancólica, observa-se, em “Luto e melancolia”
Freud (1893/1982) estabelece uma articulação entre (Freud, 1917 [1915]/1982), o aprofundamento dessa
a recusa alimentar e o sintoma conversivo a partir teorização sobre a hemorragia pulsional por retração
da evidência clínica de que a abulia de Emmy seria o do investimento pulsional em relação ao objeto para
resultado da ligação entre a ideia de comer e lembran- o eu, ressaltando o efeito melancólico de avanço da
ças repugnantes de refeições frias que era obrigada a sombra do objeto sobre o eu. Essa referência concei-
ingerir junto com seus irmãos doentes. tual confere à recusa do alimento na anorexia e seus
A investigação acerca do processo psíquico, sub- efeitos clínicos de emagrecimento extremo, o cará-
jacente à recusa do alimento, avança em Freud para ter de manifestação clínica do luto pela hemorragia
além da clínica da histeria. De fato, No “Rascunho G”, pulsional. A imagem do corpo cada vez mais magro
Freud (1895/1982) dedica-se a detalhar a etiologia da expõe a sujeição do funcionamento psíquico, na
melancolia elaborando uma hipótese essencial para anorexia, à essa hemorragia.
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Psicologia: Ciência e Profissão 2020 v. 40, e190125, 1-15.
O debate com a psicopatologia também ceram. Quem eram seu pai e sua mãe? Não tem pai,
foi fundamental no trabalho de Jacques Lacan nem mãe, nem mulher, nem filhos. Perguntamos
(1955-1956/2002) e, em especial, na elaboração de se estão com dor de cabeça, no estômago ou em
uma teoria psicanalítica sobre a foraclusão, que: alguma parte do corpo. Não tem cabeça, nem estô-
1. Distingue, estruturalmente, o processo de recal- mago; alguns até não tem corpo. . . . Para alguns a
camento e a conversão do afeto na neurose his- negação é universal, nada existe mais, eles mesmo
térica e o processo de foraclusão e a irrupção dos não são mais nada (Cotard, 1882/1998, p. 157).
fenômenos elementares na psicose.
2. Esclarece a etiologia de fenômenos clínicos da Nessa condição, o sujeito recusa indistintamente
psicose – desde o automatismo mental até os fe- todos os alimentos por não ter estômago, porque
nômenos de corpo verificados na esquizofrenia e “a carne e outro nutriente cai-lhes como couro na bar-
na síndrome de Cotard, típica da melancolia. riga” ou, ainda, por não ter como pagar. Além disso,
devido à culpa, o sujeito pode escolher seus alimen-
Atualidade da síndrome de Cotard e tos: como penitência, ingere pão seco ou se priva de
diagnóstico psicanalítico de psicose sobremesa. Assim, já em Cotard (1882/1998), teste-
A síndrome de Cotard foi inicialmente des- munha-se o posicionamento da recusa de alimento
crita por Jules Cotard, em 1880, para compreensão no campo da experiência crepuscular da psicose:
dos processos subjacentes ao quadro melancólico.
Seu traço específico é a ocorrência do delírio de nega- Em geral ela é total e tem por objeto indistinta-
ção, cuja forma típica (forma especial de delírio hipo- mente todos os alimentos; os doentes se recusam
condríaco melancólico) se caracteriza pela ocorrência a comer porque não têm estômago, “a carne e
de ideias de negação de órgãos internos ou orifícios outro nutriente cai-lhes como couro na barriga”,
(boca, ânus), de estar podre, sem sangue até a radica- porque os danados não comem, porque não têm
lidade da inexistência ou da morte e que se estende a com o que pagar. Alguns, no entanto, domina-
familiares e amigos, a todo o tempo e a todo o campo dos por um delírio de culpa ou de ruína menos
da realidade (o mundo deixa de existir). Ao mesmo
intenso, escolhem seus alimentos: comem
tempo em que se instalam tais ideias, pode ocorrer,
somente pão seco por penitência ou privam-se
paradoxalmente, o delírio de imortalidade e enormi-
de sobremesa (Cotard,1882/1998, p. 89).
dade, cujo testemunho é dado pela afirmação de ser
um morto-vivo (Cotard, 1882/1998).
Em contrapartida, no delírio de perseguição,
Com a finalidade de especificar os delírios de
a recusa do alimento está relacionada à certeza
perseguição e de negação, Cotard (1882/1998) carac-
quanto a seu envenenamento. Considerando a descri-
teriza o delírio de perseguição pela ocorrência desde
ção da síndrome de Cotard e, em particular, a irrupção
a hipocondria inicial até a megalomania, e o delírio
da recusa do alimento à luz da negação hipocondrí-
de negação por uma profunda depressão com ansie-
dade. No primeiro, o sujeito acusa seus perseguidores; aca característica da síndrome e a certeza de enve-
no segundo, a acusação incide sobre a própria perso- nenamento do alimento, no delírio de perseguição, é
nalidade do sujeito até a radicalidade de sua negação – possível avançar no referencial psicopatológico para
caracterizada como “negação hipocondríaca” (a nega- a associação entre anorexia e psicose. Alinhando a
ção que atinge a integridade do corpo e dos órgãos) elaboração da teoria sobre a psicose ao debate com a
típica da psicose melancólica e sem correlato em uma psicopatologia, ressalta-se em Lacan uma referência
lesão anátomo-fisiológica identificável. Nesse caso, direta à síndrome de Cotard e ao processo de cons-
o sujeito não tem mais estômago, nem cérebro, nem tituição da psicose em O seminário, livro 2: o eu na
cabeça. Não se alimenta mais, não digere mais, não teoria e na técnica da psicanálise (1954-1955/1985).
troca mais a roupa e recusa os alimentos, além de, No debate com Alexandre Koyré sobre a ruptura
algumas vezes, não liberar matéria fecal: imposta pela revolução científica no século XVII,
Lacan responde à pergunta: “por que os planetas não
Perguntamos seu nome? Eles não têm nome. Sua falam?”, estabelecendo uma analogia com os testemu-
idade? Não têm idade. Onde nasceram? Não nas- nhos das pacientes com síndrome de Cotard:
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Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). Anorexia e Psicose.
Aquilo a que elas se identificaram é uma ima- Cottet (1997) exemplifica esse efeito recorrendo a um
gem a qual falta toda e qualquer hiância, toda e testemunho que Ferenczi endereça a Freud:
qualquer aspiração, todo o vazio do desejo, isto é,
o que constitui propriamente a propriedade do Ontem, domingo à tarde, antes de Madame G
orifício bucal. Na medida em que se opera a iden- chegar, estado de profunda depressão com insu-
tificação do ser à sua pura e simples imagem, não perável tendência para chorar. . . . Este sintoma
há tampouco lugar para a mudança, ou seja, para que se poderia classificar de histérico devo inter-
a morte. É justamente disto que se trata na temá- pretá-lo como sinal de luto: eram manifestações
tica delas – elas, ao mesmo tempo, estão mortas e de sentimentos na ocasião do adeus a Gizella. . . .
não podem mais morrer, elas são imortais – como Em companhia de Gizella e somente dela, melhora
o desejo (Lacan, 1954-1955/1985, pp. 299-300). o meu humor e sinto outra vez interesse pela ciên-
cia (Ferenczi, 1916, citado por Cottet, 1997, p. 26).
Essa analogia com a síndrome de Cotard é, na ver-
dade, a ocasião para definir o valor assumido pelo corpo A leitura do trecho acima deixa claro como a
na psicose e, em especial, o que Freud (1895/1982, 1917 etiologia do estado depressivo de Ferenczi depen-
[1915]/1982) situa como sendo os efeitos clínicos da dia da presença ou ausência de sua mulher, Gizella.
hemorragia pulsional na melancolia. Atenta-se, aqui, Em contraste à etiologia da falta, localizada nos efeitos
para a possibilidade de se interrogar sobre o estatuto da de mortificação da pulsão pelo significante, a experi-
recusa de alimento e da rigidez identificatória à luz do ência subjetiva do vazio está relacionada ao processo
destino assumido pelo sujeito na síndrome de Cotard: de retração da pulsão em relação ao significante.
1. Experiência subjetiva de vazio como proprie- Na experiência do vazio, a pulsão vigora hegemo-
dade do orifício bucal e indicativa do que Freud nicamente sobre o sujeito, seja pela hemorragia pul-
(1917[1915]/1982) localizara como a hemorragia sional, nos casos de melancolia (Freud, 1895/1982),
pulsional na melancolia. seja pelo desligamento da pulsão em relação ao
1. Identificação do ser a sua pura e simples imagem mundo externo na esquizofrenia. Recalcati (1997)
como exposição do luto pela perda do objeto. toma essa experiência como referência para pensar
certos casos de anorexia nos quais vigoraria um ape-
Certeza de que se está morto e de tite de morte, uma tendência ao zero. O testemunho
que se é, ao mesmo tempo, imortal de um paciente, reproduzido pelo autor oferece a
Retomando a pesquisa da etiologia da anorexia dimensão dessa experiência, contrária à experiência
à luz da psicose, interroga-se aqui qual seria o valor da falta articulada à mortificação pelo significante:
assumido pela cadaverização na experiência de vazio
e na identificação do ser a sua pura e simples imagem. Quando me preencho de tudo, quando alcanço
A indicação de Lacan (1954-1955/1985) acerca da o ponto extremo da repugnância, me sinto além
experiência do vazio na síndrome de Cotard é consi- desse asco, além de tudo, em um estado de ausên-
derada por Cottet (1997) e Recalcati (1997, 2011), que cia, de não-ser e não-pensamento. . . . O vazio que
avançam na elucidação do diagnóstico diferencial sinto dentro de mim quando consigo prorrogar o
entre neurose e psicose a partir da distinção entre jejum até o limite é mais real que qualquer outra
duas experiências subjetivas: a falta e o vazio. coisa. É tão real, é uma presença tão absoluta,
Com base, então, na formulação de Freud que todo o demais desaparece, deixa de existir.
(1895/1982, 1911/1982, 1917[1915]/1982), a respeito do Existe só esse vazio (Recalcati, 1997, p. 51).
destino da retração pulsional na neurose e na psicose,
e de Lacan (1954-1955/1985) a respeito da síndrome de A distinção entre falta e vazio, por Cottet (1997) e
Cotard, Cottet (1997) e Recalcati (1997, 2011) definem Recalcati (1997), permite esclarecer a etiologia psíquica
dois critérios etiológicos para distinguir neurose e psi- da recusa do alimento na anorexia, tomando como
cose: a experiência subjetiva da falta e a do vazio. referência o diagnóstico diferencial entre neurose e
A experiência subjetiva da falta corresponde ao psicose. Definidas nesses termos, as experiências de
efeito de mortificação determinado pela incidência falta e vazio funcionam como índices importantes na
do significante sobre o funcionamento pulsional. elucidação da recusa do alimento na anorexia – desde
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Psicologia: Ciência e Profissão 2020 v. 40, e190125, 1-15.
o conjunto dos fenômenos clínicos já elencados no no estudo de caso de Castanet e De Georges (2012),
século XIX, por Lasègue (1873/1998), até os fenômenos e como síndrome de Cotard, em que o sujeito dá o
elementares relacionados ao corpo e ao sentido e a ver- testemunho da inexistência dos órgãos, de seu apo-
dade na psicose (petrificação do corpo na síndrome de drecimento, até a radicalidade de sua inexistência e
Cotard, delírio de envenenamento da comida). paradoxal imortalidade. A superidentificação inter-
A partir do estudo de caso de uma paciente crítica, nesses casos, seria uma solução imaginária
depressiva, Castanet e De Georges (2012) retomam compensatória em relação à experiência subjetiva de
a denominação de doença da mentalidade, repor- vazio foraclusivo, em relação a um quadro de com-
tada por Miller (1998), para se referir a casos em que pleto deserto referencial, e produziria uma continui-
o paciente dá o testemunho de uma experiência de dade rígida de ser já mencionada anteriormente neste
corpo em que a anatomia está em pedaços. Os autores artigo: ser uma pedra ou, mesmo, ser anoréxica.
localizaram no encontro com o sexo a conjuntura de Retomando o levantamento preliminar das refe-
desencadeamento da experiência dramática de estar rências em psicopatologia sobre o tema da anorexia
diante do abismo da dissolução do corpo: realizado ao longo deste trabalho e à luz dessas refe-
rências mais atuais, há a indicação para a pesquisa
Adotava um estilo clínico, ora horrorizado, ora
diagnóstica de que não só é fundamental preservar
irônico, para descrever, como observadora, as
a correlação mais clássica entre histeria e anorexia
manobras que os homens fazem com seu corpo,
como também avançar no aprofundamento da inves-
sua relação tão estranhamente interessada pelos
tigação de quadros clínicos de anorexia em que vigora
pedaços de sua anatomia que parecem soltos uns
uma identificação imaginária (sou anoréxica) susten-
dos outros. O que sente é, ao mesmo tempo, uma
tada por um conjunto de práticas de caráter metódico
desfalicização radical e uma insustentável depre-
e rígido: obediência estrita a dietas e, no extremo,
ciação (Castanet & De Georges, 2012, p. 33).
abstinência alimentar, autoimposição de exercícios
Na paciente, a estatuificação a protege da dissolu- físicos cada vez mais intensos, testemunhos regula-
ção corporal. Ela se define como uma pedra, em refe- res relativos ao mal-estar de habitar o laço social, que
rência direta a seu primeiro nome e à identificação chega ao extremo de seu desinvestimento massivo.
com a virgem santa. A partir, então, da localização de Essa solução imaginária é, também, abordada
um recurso ao nome para se preservar da dissolução no estudo de Maleval (2014) em torno da etiologia
do corpo, os autores recorrem ao conceito de supe- e diagnóstico das psicoses ordinárias. Por meio do
ridentificação intercrítica a papéis sociais, demons- levantamento clínico de uma série de experiências
trada por Tellenbach para os casos de melancolia, subjetivas – que vão desde a localização de um excesso
e propõem a denominação de suplência intercrítica res- de consistência no Outro até a experiência mais radi-
saltando o trabalho psíquico de apagamento do vazio cal dos fenômenos de autoscopia – o autor localiza a
aberto pela foraclusão, conforme expõe a Figura 2. ocorrência hegemônica de identificações ordinárias
em espelhamento (uma verdadeira deriva imaginá-
Phi0-empuxo a ser ninguém/ ria, por sua característica de deslocamento metoní-
Superidentificação
Solução compensatória →
mico no eixo a-a’) como parte do trabalho psíquico
dissolução anatômica de elaboração de uma estratégia para compensação
Nome próprio
Nome próprio da foraclusão do Nome-do-Pai. O autor comenta o
estudo de caso de Madame T, exposto por Czermak,
Figura 2
O processo de superidentificação no quadro da para ressaltar o modo de funcionamento da identifi-
foraclusão. cação imaginária – já detectável anos antes do desen-
Fonte: Adaptado de Castanet & De Georges (2012). cadeamento da psicose, como é o caso de Madame T:
O esquema elaborado por Castanet e De Georges Desde sua infância . . . eu percebi que ela era
(2012) deixa claro que a experiência de vazio responde muito influenciável, ao menor contato ela ade-
à falência fálica típica da foraclusão (PHI0). E é expe- ria muito facilmente. . . . Quando ela estava
rienciada por meio de fenômenos elementares relati- em boa companhia, então ela era formidável,
vos ao corpo, como é o caso da dissolução do corpo apreciada. Mas quando ela estava em má com-
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Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). Anorexia e Psicose.
panhia. . . . ela poderia ter se prostituído. . . . A anorexia de Ellen West seria tributária
Ela não tem um comportamento único. Ela faz do desencadeamento da psicose?
isso porque não tem direção pessoal. Ela é bas- Ellen West foi admitida na Clínica Bellevue de
tante mitônoma. . . . quando ela era pequena, Kreuzlingen, no início do século XX, onde L. Binswanger
com seis anos, teve na escola uma colega, mais era o superintendente. Ela dá cabo de sua própria vida
velha e mais burra. Ela agia como essa colega: aos 33 anos com uma dose mortal de veneno.
tomava para si, imitava. . . . Com seu primeiro O diagnóstico da paciente sofreu variações enor-
amante, ela era tão mentirosa e desajustada mes e, mesmo após sua morte, não houve concordân-
quanto ele. Isso quer dizer que falar com ela não cia quanto ao diagnóstico: seu médico de cabeceira
é suficiente, é a imagem (Czermak, 1986, citado a diagnosticou com psicastenia; um segundo profis-
por Maleval, 2014, p. 118). sional formulou o diagnóstico de histeria; um terceiro
levantou a hipótese de neurose obsessiva grave com
A observação sobre a pregnância do imaginário oscilação maníaco-depressiva; Kraepelin sugeriu o
no campo das psicoses leva Maleval (2014) a inter- diagnóstico de melancolia; Bleuler e Binswanger con-
rogar por que determinados sujeitos que recorrem a cordaram no diagnóstico de esquizofrenia e outro psi-
esse modo de compensação mais frágil para produ- quiatra supôs uma constituição psicótica de evolução
zir uma solução que é compensatória à foraclusão do progressiva – e todos os três discordaram do diagnós-
Nome-do-Pai acabam procurando tratamento psica- tico de neurose obsessiva com oscilação maníaco-de-
nalítico e o que os leva ao tratamento. O autor estabe- pressiva. Mas quais eram os sintomas apresentados
lece um elenco variado de motivos que evidenciam por Ellen West que estariam na origem dessa contro-
essa fragilidade na compensação pelo imaginário: vérsia diagnóstica?
desde a deflagração de um episódio depressivo, uma Villegas i Besora (1997) ordenara os sintomas
inibição nos estudos ou no trabalho, um transtorno apresentados pela paciente a partir de seu testemu-
psicossomático, até a vontade de se transformar em nho identificando os fenômenos clínicos elencados
psicanalista ou mesmo porque alguém lhe comentou no DSM-3 para anorexia (317.10): medo intenso de
a respeito do modo de funcionamento da psicaná- ganhar peso e ficar gorda, perda significativa de peso,
lise. Além desses motivos variados, não raramente recusa em manter o peso dentro dos limites de nor-
se observa, nesses casos, a ocorrência de uma gama malidade e amenorreia a partir dos 29 anos. A perda
variada de fenômenos clínicos de fobia, obsessões e de peso dessa paciente fora documentada pelo autor,
conversões indicando o vazio na subjacente ao fun- segundo os valores e as práticas e rituais para perda de
cionamento psíquico – no lugar da fantasia – e a ten- peso, e sintetizada neste artigo no Quadro 3.
tativa de construção da solução compensatória.
A referência recente, na literatura psicanalí- Quadro 3
Curva ponderal da paciente de Binswanger segundo
tica, ao tema da psicose (Maleval, 2014, Miller, 2012,
Villegas i Besora (1997).
Redmond, 2017) e comentada neste artigo pre-
serva, em primeiro lugar a recomendação de Lacan Práticas e rituais relacionados
(1977/1992) para que o psicanalista não retroceda Idade Peso
a dietas e uso de laxantes
diante da clínica da psicose e, em segundo lugar,
24 anos 78 kg Dietas e ingestão de 60 a
a importância da detecção do diagnóstico para a
70 comprimidos laxantes,
direção de tratamento. Tais referências avançam na tomates e 20 laranjas por dia.
investigação etiológica acerca da psicose e apontam
28 anos 72 kg Dietas, exercícios exagerados,
para o aprofundamento dessa pesquisa na direção de
ingestão 60 a 70 comprimidos
reconhecer a fenomenologia clínica decorrente do de laxantes, tomates e
processo de foraclusão do Nome-do-Pai e seu corre- 20 laranjas por dia.
lato a nível da função fálica. Este trabalho reconhece
31 anos 47 kg Dietas, exercícios exagerados,
nesse avanço a possibilidade de contribuir para a ingestão 60 a 70 comprimidos
clínica da recusa do alimento na anorexia, elucidan- de laxantes, tomates e
do-a como uma posição subjetiva inteligível à luz do 20 laranjas por dia.
processo de foraclusão. continua...
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Psicologia: Ciência e Profissão 2020 v. 40, e190125, 1-15.
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Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). Anorexia e Psicose.
concentração, e eu anseio a morte com o mesmo mantém e a leva a mais uma tentativa de suicídio e, por
ardor com que o pobre soldado preso na Sibéria fim, à interrupção do tratamento. Sua morte acontece
anseia regressar a sua pátria (Ellen West, citada no terceiro dia após a saída de Kreuzlingen, quando
por Villegas & Besora, 1997, p. 40). ingere uma dose de veneno e dá cabo de sua vida.
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Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). Anorexia e Psicose.
Recebido 13/01/2018
Aceito 22/08/2018
Received 13/01/2018
Approved 22/08/2018
Recibido 13/01/2018
Aceptado 22/08/2018
Como citar: Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). Uma Hipótese Psicanalítica acerca do Desencadeamento
da Anorexia na Psicose. Psicologia: Ciência e Profissão, 40, 1-15. https://doi.org/10.1590/1982-3703003190125
How to cite: Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). A Psychoanalytic Hypothesis about the Effects of
Anorexia in Psychosis. Psicologia: Ciência e Profissão, 40, 1-15. https://doi.org/10.1590/1982-3703003190125
Cómo citar: Henschel de Lima, C., & Souza, D. A. (2020). Una Hipótesis Psicoanalítica acerca del Desencadenamiento
de la Anorexia en la Psicoses. Psicologia: Ciência e Profissão, 40, 1-15. https://doi.org/10.1590/1982-3703003190125
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