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Intolerância é a incapacidade em aceitar o que é diferente.

É não tolerar opiniões ou práticas que se


diferem das suas e muitas vezes são seguidas de atitudes preconceituosas e até mesmo violentas.

A tradição oral é suficiente para validar o nosso saber.

Segundo os europeus, a África é um continente sem história, por não ter registros escritos de seu
passado. Por muito tempo esse foi o discurso repetido no mundo ocidental na tentativa de reduzir a
cultura africana em detrimento da cultura europeia.

"A África não possui consciência exterior que possa resultar em universalidade”. (Friedrich Hegel -
Filósofo Germânico).

A cultura africana é transmitida através da oralidade, do mais velho para o mais novo, pois os
africanos acreditam que as palavras tem um poder de encantamento. Cada vez que repetimos uma
história, ela fica arquivada no tempo e naquilo que chamamos de memória ancestral.

Os responsáveis pela transmissão do conhecimento são os griôs (contadores de histórias) e os


anciãos, por serem os detentores do saber.

“Na África, quando morre um velho, é toda uma biblioteca que queima” (Amadou Hampaté Bâ -
Escritor de Mali)

A cultura africana é contada através das cantigas, dos provérbios, dos contos e dos mitos. E isso é
percebido nas tradições de matrizes africanas, que possuem seus fundamentos alicerçados nessa
oralidade.

Não existem livros que norteiam as práticas de culto africano, diferente do que ocorre nas religiões
ocidentais. O que não quer dizer que os livros não possam ser utilizados como complemento das
informações orais.

Mas é importante elucidar que a escrita não substitui a tradição oral neste contexto de culto
afrodiaspórico. Portanto devemos ter cuidado com excesso de cientificismo em nossas práticas ou até
mesmo em nossos estudos.

É justo lembrar que os cultos africanos surgiram antes mesmo da escrita e foram as tradições orais
que ajudaram a preservar a cultura africana no Brasil, que resistiu ao período de escravidão.

Quando uma pessoa nos pergunta qual é a fonte de nossas informações, ela invalida a nossa vivência
e sabedoria recebida de nossos mais velhos através da oralidade; como se, para obter certa
credibilidade deveríamos estar pautados por livros produzidos por brancos europeus contando a
nossa própria história.

Problemático, não?!
Respeite a nossa cultura e os nossos saberes e pare de nos avaliar sob a perspectiva europeia. Isso é
apagamento!

A última execução por pena de morte no Brasil foi a do escravo Francisco

Francisco (morto em 28 de abril de 1876) foi a última pessoa que foi executada por pena de morte no
Brasil. Escravo negro, ele foi enforcado pelo assassinato de seus senhores.

Em 1874, Francisco e dois outros escravos, Prudencio e Vicente, foram presos por espancar até a
morte seus senhores, João Evangelista de Lima e sua esposa Josepha Marta de Lima. O crime foi
cometido em Pilar, Alagoas. Francisco e Prudencio fugiram para Pesqueira ; em um confronto com a
polícia, Prudencio foi morto e Francisco foi capturado. Vicente havia fugido para Marechal Deodoro,
onde foi capturado.

No julgamento de Francisco e Vicente, ambos foram considerados culpados pelos assassinatos.


Francisco foi condenado à morte por enforcamento e Vicente foi condenado à prisão perpétua.
Ambos apelaram ao imperador Dom Pedro II por clemência; O apelo de Francisco foi negado e o
imperador não respondeu ao de Vicente. Vicente morreu mais tarde na prisão.

A execução de Francisco foi realizada em Pilar em 28 de abril de 1876. Foi a última execução realizada
pelo Brasil. Calcula-se em 2 mil o público de curiosos, inclusive vindos das vilas vizinhas, que se
aglomerou para assistir à execução do negro Francisco.

Jornal de Alagoas narrou em detalhes última pena de morte executada no Brasil

Na edição de 30 de abril de 1876, um domingo, o Jornal do Pilar noticiou com detalhes a execução do
escravo Francisco, ocorrida na sexta-feira anterior. Ele foi condenado à forca por matar duas pessoas.
A seguir, trechos da reportagem:

“À proporção que se aproximava a hora do sacrifício, não procurando esconder a enormidade de seu
crime, voltara-se para Deus. Foi assim que o vimos, logo ao seguir caminho do sacrifício, dirigir- -se a
seu pedido para a Igreja do Rosário com o fim, dizia, de ver Nossa Senhora do Pilar. Ali chegando,
ajoelhou-se e como que orou.

Em todo esse trajeto e em diversos pontos, o oficial de Justiça fazia a leitura da sentença.

O condenado ia vestido com a roupa da prisão, de calça e camisa, algemado e de laço no pescoço,
assim como o carrasco, que, encorrentado, seguia-o alguns passos atrás. Assim chegou ao lugar do
suplício à 1 ½ hora da tarde, no mesmo terreno em que foram assassinados os infelizes capitão João
Evangelista de Lima e sua mulher. Em frente à estribaria onde o condenado praticara seu horroroso
crime, fora levantada a forca.

Declarou que ia morrer, mas que ninguém se gloriasse com a sua morte, que havia sido um dos
assassinos do capitão João de Lima, porém que o fato não se dera como se contava e que só ele e
Deus sabiam, e, finalmente, que pedia perdão a todos e que a todos também perdoava.

Subiu a escada do patíbulo [palanque de execução] a pé firme, seguido de uma praça, e logo após o
carrasco, seguido de outra. Nesse ato, supondo o condenado que o algoz esmorecia, voltou-se para
ele, exortou-o a que se animasse, dizendo-lhe que não tivesse medo, que tomasse coragem, e isso
com o maior sangue frio.

Chegado que foi ao topo da escada, dirigiu-se ao centro do patíbulo, torceu o laço, que estava
colocado sobre a nuca, para a garganta e disse adeus ao povo acenando com o chapéu, que logo após
deixou cair ao chão. Em seguida, ajoelhou-se e principiou a acompanhar um dos sacerdotes que
faziam parte da execução em rezar o Credo. Nessa ocasião, o carrasco vendou-lhe os olhos e, ao
chegar às palavras ‘vida eterna’ desprendeu-se do patíbulo ao simples movimento do carrasco para
impeli-lo.

Depois o carrasco, descendo pela corda, apoiou os dois pés sobre os ombros do condenado e
forcejou por abreviar- -lhe a morte, o que se reproduziu por duas vezes e foi o mais horrível da cena.
Estava consumado o ato.

O cadáver, depois de amortalhado, foi sepultado no cemitério público desta cidade. Deus se
compadeça da alma daquele desgraçado, tão merecedor em vida das penas da lei quanto em morte
da comiseração [compaixão] da humanidade.”

Fonte: Agência Senado

Allan Kardec era racista e isso tem muito a ver com a umbanda contemporânea.

Sim, caros leitores! Allan Kardec, o codificador da doutrina espírita era racista. Sei que isso soa de
maneira impactante, mas infelizmente é uma grande verdade.

Segue aqui um trecho de um artigo intitulado Perfectibilidade da Raça Negra, publicado na revista
espírita em 1862, de autoria de Kardec, que comprova essa afirmativa.

"Assim, como organização física, os negros serão sempre os mesmos; como Espíritos, trata-se, sem
dúvida, de uma raça inferior, isto é, primitiva; são verdadeiras crianças às quais muito pouco se pode
ensinar. Mas, por meio de cuidados inteligentes é sempre possível modificar certos hábitos, certas
tendências, o que já constitui um progresso que levarão para outra existência e que lhes permitirá,
mais tarde, tomar um envoltório em melhores condições. Trabalhando em sua melhoria, trabalha-se
menos pelo seu presente que pelo seu futuro e, por pouco que se ganhe, para eles é sempre uma
aquisição. Cada progresso é um passo à frente, facilitando novos progressos." (Allan Kardec,
Perfectibilidade da Raça Negra. Revista Espírita, abril de 1862.)

Quando o espiritismo chegou ao Brasil, logo se tornou popular na classe dominante, tendo em vista o
seu caráter científico e filosófico e porque não dizer eugênico, o que casaria muito bem com a
sociedade brasileira da época.

Mas o que isso tem a ver com a umbanda contemporânea ?

Zelio Fernandino de Moraes, tido como fundador da umbanda foi um dissidente do espiritismo. A
primeira manifestação do caboclo das 7 encruzilhadas (Padre Malagrida), ocorreu dentro de um
centro espírita. Obviamente, o espiritismo com sua postura de "superioridade", não admitiu a
presença de um espírito indígena, por considera-lo atrasado. Isso fez com que o caboclo ali
manifestado anunciasse uma nova religião, que falaria a todas as classes. Surge assim, o que mais
tarde Zélio denominaria espiritismo de umbanda.

O Ponto chave de toda essa questão é que a nova vertente de Zélio nunca quis se desconectar do
espiritismo e falar de fato aos pobres, o que se tornou muito evidente a partir da criação das
federações umbandistas, que definiram as obras de Kardec como fundamentais para o espiritismo de
umbanda. A ritualista e a cosmovisão da umbanda de Zélio, que podemos chamar de
contemporânea, é permeada pelo fundamentalismo espírita.

O que é mais aterrador em tudo isso é que as práticas umbandistas já existiam muito antes do
surgimento do espiritismo de umbanda. É uma cultura banto-amerindia. O próprio Zelio conta que foi
aconselhado por uma entidade de uma benzedeira a procurar ajuda espiritual, antes de chegar ao
centro espírita.

O que os "novos" umbandistas fizeram foi se afastar das práticas negras já existentes na umbanda,
para se aproximar das práticas "superiores" do espiritismo, promovendo um apagamento da cultura
das raças subjugadas em nossa sociedade.

Diante de tudo isso, convido-os a refletir:

Se o codificador da doutrina espírita era racista e a umbanda de Zelio buscou se aproximar do


espiritismo, o que podemos esperar da umbanda contemporânea?

Você tem notado a presença de um grande número de brancos nas religiões afrodiaspóricas e mais
negros em religiões cristãs?

Já parou para se perguntar porque isso ocorre?

Isso é reflexo de um passado opressor e da supremacia branca.

Negros e índios foram forçados a se curvar à religião do colonizador e apesar da resistência de nossos
antepassados, ainda colhemos as consequências dessa opressão.

Em contrapartida, a elite branca se acha no direito de se apropriar de outras culturas e adaptá-las a


seu bel prazer.

É por isso que cada vez mais encontramos negros nas igrejas cristãs e brancos nos terreiros.

Parece perverso, não?

Mas isso ainda ocorre nos dias atuais.

A IDEIA DO CONGRESSO

(...)
"Fundada a Federação Espírita de Umbanda há cerca de dois anos, o seu primeiro
trabalho consistiu na preparação deste Congresso, precisamente para nele se
estudar, debater e codificar esta empolgante modalidade de trabalho espiritual,
afim de varrer de uma vez o que por aí se praticava com o nome de Espiritismo de Umbanda, e que
no nível de civilização a que atingimos não tem mais razão de
ser."

Continuando a análise do documento produzido a partir dos assuntos discutidos no I Congresso do


Espiritismo de Umbanda, passaremos a esse trecho encontrado logo na introdução do relatório, que
deixa claro qual é o objetivo do congresso:

"varrer de uma vez o que por aí se praticava com o nome de Espiritismo de Umbanda, e que no nível
de civilização a que atingimos não tem mais razão de
ser."

O que existia por aí e não teria mais razão de ser, aos olhos da comissão organizadora do evento?

Já sabemos que a umbanda não surgiu a partir de Zelio Fernandino de Moraes. Antes dele, já existiam
os famosos cultos no Rio de Janeiro da tradicional makumba carioca, que era muito semelhante ao
que posteriormente a umbanda adotaria em seu culto, com exceção das práticas africanas
consideradas escandalosas aos olhos da sociedade racista da época. Práticas essas, citadas no texto
como: sem razão de ser pelo nível de civilização atingido.

Nesse mesmo período em que o espiritismo de umbanda se organizava para colocar em prática seu
projeto de eugenia e epistemicidio, apagando a cultura originalmente africana; o omoloko ganhava
força no Rio de Janeiro com Tata Tancredo, que reivindicou o nome umbanda ao seu culto, que ele
mesmo denominou UMBANDA Omoloko.

Tata Tancredo era um homem negro, conhecido sambista no Rio de Janeiro, sacerdote de uma
umbanda africanizada, que ele acreditava ter vindo de terras africanas, mais precisamente de
Luanda-Kioko. E é exatamente sobre as práticas da Umbanda Omoloko a que esse trecho do texto se
refere.

Percebeu a perversidade da organização umbandista que hoje tanta gente acredita e defende?

Essa é a História do Padre Gabriel Malagrida, aquele mesmo que quando espírito se travestiu de
indígena brasileiro, com a alcunha de Caboclo das 7 Encruzilhadas, para anunciar a Umbanda,
segundo a narrativa do mito criacional.

Analise a história e veja se há coerência na relação padre/caboclo.

O Último Missionário Jesuíta da América Portuguesa, morto pelo Marques de Pombal

Gabriele Malagrida (1689-1761), foi um padre jesuíta italiano. Tendo sido missionário no Brasil e
pregador em Lisboa.

Nascido na vila de Managgio, a 18 de setembro de 1689. Desde criança deu provas de engenho e ao
mesmo tempo duma tendência para o misticismo. Depois de completar em Milão os seus estudos
entrou na Companhia de Jesus, em Génova, a 27 de setembro de 1711.

pediu ao Superior Geral da Ordem Jesuíta para ser destinado como missionário, para as Índias. No
entanto, em 1721, partiu antes para as missões no Brasil.

Foi mandado para Belém do Pará, a fim de aprender a língua indígena e trabalhar como padre na
cidade. Em 1723 foi enviado, pela primeira vez, como missionário aos Caicazes, tribo indígena que
habitava ao longo do curso dos rios Itapicuru e Munim, na Capitania do Maranhão. Desta nação
indígena passou a outras: os Guanarés e os Barbados, no rio Mearim.

No ano seguinte voltou a catequisar indígenas, conseguindo o elogiado feito de missionar algumas
aldeias dos ferozes Barbados, no vale do rio Itapecuru (Maranhão), cuja missão teve grande
desenvolvimento. Esse fato foi assaz comemorado pelo governo, que exaltou seu ardentíssimo zelo e
piedade cristã, além do destemor, sobretudo depois daqueles bárbaros, em tempos de paz, terem
matado o venerável padre João de Avelar. Em agosto de 1729, com a ajuda dos Barbados tentou
missionar outras nações

Foi retirado definitivamente da missão indígena por volta de 1729 para ensinar no Colégio de São Luís
do Maranhão, a fim de preparar futuros missionários, ensinando Filosofia e Teologia.

A partir de 1735 inicia-se uma nova etapa como "missionário apostólico" ou missionário popular,
quando, ao sair de São Luís, se dirige ao sul, via capitania do Piauí, em direção à Bahia, pregando
missões populares por todas as localidades em que passou, promovendo a renovação espiritual por
meio dos Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola e animando a vida religiosa do sertão da
região Nordeste do Brasil, até então desamparado religiosamente. Em suas orações atraía multidões,
passando a ser chamado por muitos admiradores, de apóstolo do Brasil.

Chegou a Salvador (Bahia) em 1738, onde continuou as suas pregações populares com grandes
conversões, em número e qualidade. Nessa capital iniciou um convento para "convertidas" e um
Seminário para o clero diocesano.

De 1741 a 1745 andou pelo sertão da capitania de Pernambuco e da capitania da Paraíba, sempre
pregando retiros e tomando iniciativas de fundação de Conventos e Seminários. A capela existente
até hoje no Colégio Santa Teresa, da Congregação das Irmãs de Santa Doroteia do Brasil, no
Maranhão, também foi fundada por ele, onde existem até hoje objetos pessoais de Malagrida que
podem ser vistos mediante autorização das irmãs

De 1746 a 1749 retorna ao Maranhão e Pará onde continua a sua ação de pregador de missões
populares, até que concebeu a ideia de ir a Portugal, solicitar a aprovação do Rei, para funcionarem
legalmente as suas fundações e conseguir recursos

Em 1749, o padre Gabriel Malagrida retornou à Europa em busca de recursos para auxiliar na
manutenção dos inúmeros conventos e seminários que fundara. Chegando a Lisboa, foi, de fato,
recepcionado como santo. E a imagem que conduzia consigo foi levada pelo povo, em procissão, para
a igreja do colégio de Santo Antão. Por esse tempo, o rei D. João V, que estava enfermo, o acolheu
paternalmente, fazendo-lhe concessões diversas e chamando-o para junto de si.

Foi o padre Gabriel Malagrida, quem o assistiu na hora derradeira, ministrando-lhe a extrema-unção.
Esse fato aumentou ainda mais a sua fama de santidade e o seu crédito entre a nobreza e o povo de
Deus. Em seguida, foi nomeado conselheiro real nas possessões de ultramar. Porém, o ministro
Sebastião José de Carvalho e Melo, futuro marquês de Pombal, que ascendeu no reinado de D. José I,
filho daquele falecido monarca, ensimesmado, não via com bons olhos a pregação mística e
credibilidade popular daquele santo homem.

Por isso mesmo, retornando ao Pará, em 1751, não foi Malagrida bem recebido pelo governador
Francisco Xavier de Mendonça Furtado, irmão do marquês de Pombal, que viajara com ele no mesmo
navio

Permaneceu a capital até 1751, quando regressou ao Maranhão onde permaneceu até 1754. Nesse
ano regressou definitivamente a Portugal, a rogo da rainha viúva D. Mariana de Áustria.

Estava o padre Gabriel Malagrida, em Lisboa, quando sobreveio o terramoto de 1755. Foi, então,
imenso o terror que se abateu sobre a população, atribuindo-o a castigo divino, de que seria
necessária a penitência e a compunção. Como consequência, visando levantar os espíritos abatidos,
encarregou o marquês de Pombal que um padre compusesse um folheto, que ele mandara publicar,
explicando as causas naturais dos terramotos, e se desviando da crença desanimadora de que fora
castigo de Deus. Porém, contra essa atitude, saiu em campo o místico Malagrida, respondendo-o com
um folheto intitulado: Juízo da verdadeira causa do terremoto que padeceu a corte de Lisboa no 1.º
de Novembro de 1755.

Nessa contradita, carregada de fervor religioso, combateu com veemência e indignação as doutrinas
expostas no folheto divulgado por Pombal, e atribuía a castigo de Deus as causas do terramoto,
devido aos intoleráveis pecados que eram ali praticados

Como solução, recomendava procissões, penitencias e, sobretudo, recolhimento e meditação de seis


dias nos exercícios de Santo Inácio de Loyola.

Também, por acreditar que a sua fama de santo, o prestígio que gozava junto à alta nobreza, a longa
folha de serviço missionário, a fundação de muitos seminários e sua eloquente pregação,
respaldavam-lhe lutar contra o despotismo de Pombal. E, parece, que de Setúbal ainda escreveu uma
carta ameaçadora, que teria terrível significado depois do atentado contra o Rei Dom José, em 3 de
setembro de 1758, atribuído ao duque de Aveiro e aos marqueses de Távora, com o apoio da
Companhia de Jesus. Esse episódio serviu para fortalecer o poder do ambicioso ministro, que
trabalhou pela prisão e expulsão dos jesuítas do reino de Portugal, assim como a execução de grande
parcela da alta nobreza naquele que ficou conhecido como processo dos Távora.

Pouco tempo depois, Pombal acusou os jesuítas de conspiração contra a coroa portuguesa, Malagrida
acabou sendo acusado de Heresia pelo Santo Oficio e por seus textos criticando o estado português e
posteriormente condenado ao garrote e fogueira, penas executadas em um auto-de-fé no dia 21 de
setembro de 1761, no Rossio, a praça principal de Lisboa.

Ao manipular o tribunal da Inquisição, o Marquês expulsou os Jesuítas de Portugal provocando uma


onda de analfabetismo no País.

No Brasil, por volta de 1759, muitas escolas que vigoravam pela mão destas Ordens fecharam e
algumas bibliotecas ficaram em ruínas.
Como Malagrida não pôde ser condenado no caso dos Távora por falta de provas, foi solicitada a sua
transferência para uma prisão da Inquisição. Em 12 de janeiro de 1759, foi considerado réu de lesa-
majestade e condenado à pena de garrote e de fogueira. Em seguida, entregue à Inquisição, em 17 de
janeiro daquele ano, em virtude de ser religioso, quando foi encarcerado no cárcere da Custódia,
sofrendo tortura e desumanos interrogatórios, no Palácio dos Estaus, fato que muito contribuiu para
que seu temperamento exaltado resvalasse à insanidade. Acusado de heresia, inventor de novos
erros heréticos, convicto, ficto, falso, confitente, revogante, pertinaz e profitente, foi pela nada santa
Inquisição, condenado no auto-da-fé de 20 de setembro de 1761, à pena de excomunhão maior,
deposto e degredado de suas ordens, relaxado à prisão secular com mordaça e carocha com rótulo
de heresiarca. O suplício foi realizado no dia seguinte, ardendo seu corpo em chamas, na fogueira
armada na Praça do Rossio, em Lisboa, em seguida sendo as cinzas disseminadas pelo mar.

Não satisfeito com essa brutalidade, Pombal ainda agiu para apagar a memória do fanático religioso,
mandando destruir pinturas que existiam com a efígie do mesmo em um recolhimento da vila de
Setúbal, tanto em azulejos quanto em outras espécies, reduzindo umas a pó e outras a cinzas. Cópia
da sentença foi encaminhada para o Estado do Maranhão e Grão Pará, para conhecimento das
pessoas que foram por ele missionadas.

O teatro foi uma das suas grandes paixões, tendo tido mais tarde peças suas encenadas no Brasil e na
Ópera de Lisboa. E foi numa representação teatral no Colégio que frequentava, que vestido
de Rei, olhou para uma imagem de Cristo que estava nas paredes do salão e se sentiu numa situação
que rondava o absurdo. A partir
daquele momento decidiu dedicar a sua vida aos pobres e viver sob o exemplo de Cristo

Reflexões sobre o cristianismo como instrumento de dominação do colonizador.

Recentemente o nosso terreiro, como tantos outros, sofreu intolerância religiosa por parte dos
vizinhos, que se disseram incomodados com o barulho dos atabaques. Eles interromperam nossa
cerimônia, reclamaram e em decorrência disso o dono do imóvel que abriga o terreiro, que é
alugado, pediu para que deixássemos o espaço no término do contrato, que ocorrerá no próximo
mês. O curioso é que a poucos metros do terreiro existe um grandioso templo da Igreja Universal, há
anos e "espantosamente" ninguém se incomodou com ele.

Começamos então a procura de um novo espaço para locação, pois não temos condições de comprar
um imóvel. Iniciamos algumas negociações, mas incrivelmente as portas se fecham quando falamos
que o espaço é para o terreiro.

Toda essa situação me fez refletir sobre a relação das religiões com a sociedade, o racismo e o projeto
de poder instrumentalizado pelo colonizador, que deu muito certo.

Comecei pensando sobre a quantidade absurda de pessoas negras na igreja. Isso me leva a crer que
para um negro adotar a religião do colonizador, no mínimo ele não conheceu a história de seus
antepassados, que evidentemente foi apagada. Além disso é muito provável que ele não tenha tido
acesso a educação para compreender a história do Brasil, bem como desenvolver um pensamento
crítico sobre a sociedade onde está inserido. Logo, foi arrebatado pelo cristianismo, que opera
sistematicamente contra a cultura e a religiosidade do seu próprio povo.
E se o negro não teve acesso a educação, tem um motivo muito claro: negro intelectual se torna
problema para o estado. É por isso que o estado/sociedade sempre fez com que esse negro fosse
subjugado e visto como um problema. Não bastaram os 350 anos de escravidão. A população negra
continua sendo escravizada de outras formas.

Por outro lado, temos as igrejas cristãs (católica e evangélica), muito ricas, donas de um patrimônio
incalculável, que ocupam os melhores espaços na sociedade. Possuem universidades e escolas,
hospitais e meios de comunicação, constituem até mesmo um poder político organizado, com
representatividade no Estado. Elas detém a dominação das grandes massas através do controle
desses setores estratégicos. Até mesmo o Estado, que deveria ser laico, se curva às igrejas, pois as
igrejas fazem parte do Estado e isso também é um reflexo do colonialismo.

Seus templos estão sempre localizados no centro das grandes cidades, nos bairros nobres e
ocupando grandes espaços. Ninguém se incomoda com a igreja fechando as ruas para as festividades
religiosas ou com o barulho dos fogos de artifícios em alvoradas, porque a igreja é a dona do
"normal".

E os terreiros?

Os terreiros se obrigam a ir para as periferias, pois o terreiro é a expressão religiosa do preto, apesar
de ser um espaço tomado pelos brancos. Mas lá na periferia também estão as religiões
neopentecostais arrebatando almas marginalizadas e violentas, que também irão combater com
muita agressividade os terreiros, invadindo, depredando e queimando esses espaços sagrados, em
nome de Deus.

Qual é a perspectiva?

Precisamos resistir, assim como nossos antepassados fizeram, pois estamos continuando a luta que
eles iniciaram. Talvez não vejamos resultados, mas os nossos descendentes verão. Sejamos nós os
ancestrais dos que virão amanhã.

Quanto a mim, sigo resistindo e procurando um espaço para que eu possa cultuar os meus
ancestrais.

O epistemicídio e sua aplicação na umbanda

Epistemicídio de maneira simplificada é a destruição de saberes/conhecimento. É quando um grupo


que se considera superior menospreza, inferioriza e até mesmo destrói a cultura do outro, tido como
inferior. O epistemicidio é uma forma clara de opressão que está intimamente relacionado a outras
formas de segregação como o historicídio, o racismo estrutural, eugenia e apropriação cultural.

O exemplo mais claro de epistemicidio é visto nas relações raciais. A raça branca sempre se
considerou superior à raça negra, ao ponto de se apropriar, modificar ou aniquilar as práticas e os
saberes desses povos. Isso foi muito evidente no período escravagista.

Os europeus escravizaram os povos africanos, com o aval da Igreja, pois acreditavam que eles
(negros) não possuiam alma, portanto eram inferiores.
Os negros foram obrigados a se converter ao catolicismo, mudar de nome e deixar para trás, além de
sua terra natal, toda sua história e bagagem cultural. Isso é o que chamamos de apagamento de
identidade.

O período colonial brasileiro foi marcado pela estruturação do epistemicídio. Os negros que aqui
chegaram eram tratados como mercadoria, sem a menor possibilidade de existir enquanto pessoa.
Após a assinatura da Lei Áurea, o epistemicídio continuou na prática e foi se perpetuando com o
passar do tempo, ora de forma explícita, ora de maneira velada.

O negro ganhou a liberdade, porém não teve acesso a cidadania. Não pôde se matricular em escolas,
não pôde trabalhar ou frequentar os mesmos espaços que os brancos, não pôde exercer livremente
suas práticas e costumes. Isso fez com que o negro ficasse a margem da sociedade resultando na
estrutura social que temos hoje.

Baixa escolaridade, altos níveis de pobreza, alta letalidade relacionada a violência, baixo acesso a
informação, insegurança alimentar, péssimas condições de moradia, situações de risco e
vulnerabilidade social . Os negros sempre encabeçam as piores estatísticas, pois não tiveram e ainda
não possuem as mesmas oportunidades que os brancos.

Mas você deve estar se perguntando: o que isso tem a ver com religião?

Tudo! O epistemicidio também acontece no campo religioso, afinal, religião também é saber.

Os primeiros africanos escravizados que chegaram ao Brasil foram os povos bantus, originários da
Angola, Congo, Moçambique e outros países da africa subsariana. Esse gigantesco grupo, tem grande
participação na formação do Brasil.

Nossa cultura é permeada por suas influências, como vocabulário, culinária, músicas, danças e até
mesmo a religião. Foram desses povos que vieram boa parte das práticas espiritualistas, que mais
tarde originaram religiões como a umbanda e o candomblé.

Dos calundus coloniais às macumbas cariocas, todas essas práticas eram manifestações da cultura
negra (bantus, fons e nagôs) e também amerindia, até o aparecimento do chamado espiritismo de
umbanda, alcunhado por Zélio Fernandino de Moraes, um homem branco de classe média. Foi a
partir desse ponto que o epistemicídio se tornou evidente também na religião, que até então era
praticada apenas pelos negros.

O espiritismo de umbanda se apropria de parte das práticas religiosas africanas, inclusive através do
nome (umbanda) que tem origem no kimbundo (dialeto banto) e inicia um processo de apagamento
de identidade através da eugenia e da supremacia branca.

Retira-se do culto a sacralização animal, tida como selvagem, além do uso de roupas coloridas e
atabaques e a manifestação de entidades como exus e pomba giras.

Acrescenta-se a estrutura da doutrina espírita, recém chegada ao Brasil e muito bem aceita pela
classe dominante, por seu caráter científico e filosófico, além de sua origem europeia (França). Aliás,
Zelio foi um dissidente do espiritismo e a primeira manifestação do caboclo das 7 encruzilhadas foi
dentro de um centro espirita, que se identificou não como um indígena nativo, mas como um padre.
Intensifica-se o sincretismo católico afim de fugir das diligências policiais e suas atividades opressivas,
que tinha como alvo os negros. Dissemina-se o discurso separatista da chamada umbanda das
macumbas negras, que passam a ser associadas a feitiçaria (algo negativo) e aos poucos, mais uma
vez, os negros e os índios são roubados de si mesmos.

Dessa forma, criou-se o cenário perfeito para "nova" religião prosperar através de um caráter branco,
ao ponto de se autodenominar umbanda branca, para se diferenciar das práticas dos negros. E assim
a história vai sendo modificada com o surgimento de novas estórias dos colonizadores, que com a
repetição se tornaram "verdades".

Hoje, a maioria dos umbandistas conhecem a história do mito criacional (Fundada em 15 de


novembro de 1908 por Zélio de Moraes), que é contada por todos e tida como verdade absoluta.
Poucos adeptos se interessam pelos fatos históricos e o verdadeiro surgimento da religião, que não
teve um mito fundador, mas sim um processo de construção iniciado por nossos antepassados. Isso
significa que o epistemicídio cumpriu com o seu papel.

Se você chegou até aqui, ao final desse texto com o coração e a mente aberta, você compreendeu o
que é o epistemicidio e sobretudo como ele foi aplicado na umbanda.

É por isso que lutamos pelo resgate histórico-cultural de nossa religião. Devemos isso aos nosso
antepassados que tanto lutaram, sofreram e resistiram para que hoje estivéssemos aqui.

E você, a qual umbanda pertence?

Vamos falar de Intolerância Religiosa entre nós, umbadistas ?!

Intolerância é a incapacidade em aceitar o que é diferente. É não tolerar opiniões ou práticas que se
diferem das suas e muitas vezes são seguidas de atitudes preconceituosas e até mesmo violentas.

Quando se fala em intolerância religiosa o primeiro pensamento que nos vem a mente é o ato
ofensivo praticado por adeptos religiões distintas da nossa, mas acredite, podemos ser intolerantes
dentro da nossa própria religião.

As religiões de matriz africana, por questões historicas e culturais são sincréticas, ou seja, sofrem
influência de outras crenças e isso permite várias formas de culto dentro de uma mesma religião. O
Candomblé, por exemplo, possui nações que são muito diferentes uma das outras, mas nem por isso
deixa de ser Candomblé. A umbanda, talvez a religião mais sincrética de todas, agrega elementos do
catolicismo, do espiritismo, dos cultos africanos e amerindios e isso faz com que a religião seja
bastante diversificada em suas vertentes. E nós umbadistas, como lidamos com toda essa
diversidade?

Somos intolerantes!

Somos intolerantes quando criticamos outras vertentes pelo simples fato de serem diferentes da
nossa; quando acreditamos que somente o que praticamos é o correto; quando olhamos de forma
preconceituosa às vertentes que sacralizam animais; quando criticamos a cobrança comedida do
atendimento que algumas casas efetuam; quando tentamos impor a nossa verdade sem conhecer a
verdade do outro; quando rimos da dúvida de um iniciante; quando fazemos piadas com a crença
alheia...

Precisamos de tolerância entre nós!

Ser tolerante é saber respeitar as diferenças, pois o que é diferente não significa que é errado.

Não adianta cobrar respeito de outra religiões se não conseguimos respeitar a nós mesmos. É preciso
estudar, compreender, se despir do preconceito, pois a intolerância só pode ser combatida através do
conhecimento. O intolerante geralmente é ignorante (falta-lhe descobrir a verdade do outro).

Pessoas não pretas ou não ameríndias sempre se consultaram com os oráculos e entidades dos cultos
ancestrais, para resolver problemas aos quais não conseguiam de forma convencional.
Pessoas da elite, famosas e de altos cargos sempre usufruíram das casas de cultos domésticos de
forma clandestina para buscar o desejado. No Rio de Janeiro, isso era muito normal, por exemplo, no
início do século passado.
Foram essas pessoas que utilizaram da figura de Zélio Fernandino de Moraes para institucionalizar o
culto ancestral banto/ameríndio e ajusta-lo ao que a sociedade elitista da época aceitava,
modificando o nosso culto para parecer com o espiritismo, das culturas Cristã/ kardecista.
Esse ajuste é o que chamamos de embranquecimento dos cultos ancestrais afro/ameríndios, pois a
palavra umbanda, como prática, veio das Macumbas Cariocas, que eram compostas por rituais que se
existiam entre as funções e objetivos de prática.
Nas Macumbas havia um ritual chamado Umbanda, que tinha como fundamento a cura da alma, do
espírito, a cura mental, sentimental, física e até financeira das pessoas. Esse culto de umbanda nos
faz lembrar muito a prática de Luzia Pinta.
Tinha também outros tipos de rituais aos quais as pessoas entendem como feitiço, macumba, magia,
magia negra e que conhecemos, de forma institucionalizada hoje como Kimbanda.
Zélio, com propósito, se apropriou do ritual de umbanda das Macumbas Cariocas para tornar
aceitável parte do culto que ele sabia que os seus iguais buscavam clandestinamente tornando assim
um fragmento de um culto amplo e rico a religião dele e dos seus.
Por causa do preconceito que o kardecismo tinha diante das macumbas, Zélio foi obrigado a abrir o
próprio terreiro de Umbanda e, posteriormente, a própria Federação, para que ele não se igualasse
aos demais espaços de macumba dos fundos de quintais, fazendo assim com que o nosso culto
continuasse à margem da sociedade sofrendo com os preconceitos.
Essa apropriação se deu de forma tão desrespeitosa que desconstruiu muitos dos fundamentos do
culto ao qual a Umbanda foi plagiada com a introdução de práticas baseadas nas culturas
eurocêntricas/cristãs- kardecistas, mantidas até hoje.
Essa prática de umbanda foi sofrendo interferências de outras religiões e culturas que,
consequentemente, causaram deturpações ainda maiores ao longo das décadas. Isso se deu de forma
desastrosa ao nosso culto, pois hoje em dia as cantigas de Umbanda estão sendo tocadas com violão,
guitarra, bateria, as entidades perderam identidade própria e são identificadas por histórias
fantasiosas descritas na internet, assim como as pessoas sem ancestralidade africanas ou indígenas
estão manifestando caboclos e pretos velhos.
Pior, são os umbandistas que hoje estão ajustando as entidades aos padrões aos quais distanciam
estas a própria história e cultura que viviam, acomodando as entidades aos arquétipos,
embranquecendo-as e até fazendo com que o caboclo não tenha um nome, não venha de uma tribo
indígena e, assim, tirando completamente a cultura, a identidade, a origem e a essência dessas
entidades. Assim como a forma com que a Umbanda de hoje cultua a ancestralidade dos povos
ciganos sem a menor preocupação de fazê-lo respeitando a especificidade de cada povo cigano, que é
de uma truculência sem tamanho.
É importante frisar a importância de refletir que quem é o apropriador, o deturpador, quem resgata e
quem age de forma racista diante nessas pautas.
Umbanda é uma palavra de origem preta inserida no culto ancestral de povos afro/ameríndios muito
antes que se entendam por esse nome a religião que carrega pouco da cultura afro/ameríndia.
Nosso objetivo é mostrar que o culto ancestral que praticamos, tem Umbanda, tem Kimbanda, tem
outros rituais tão importantes quanto a cura que muitos praticam sem consciência hoje em dia.

Você sabe o que é um arquétipo e porque ele não se encaixa na umbanda?

Arquétipo, de forma simplificada e sem entrar no conceito psicológico, é um simulacro, um padrão


que pode ser reproduzido, ou uma representação.

Essa definição aparece na umbanda a partir da introdução do espiritismo na macumba,


descaracterizando a prática religiosa ancestral de origem negra e indígena.

O conceito de arquétipo dentro da religião diz que o espírito não possui uma única identidade. Ele
pode plasmar qualquer forma, de acordo com sua necessidade, desde que ele seja um espírito
evoluído.

Por exemplo, um preto velho pode não ser necessariamente preto e velho. Ele assume esse arquétipo
e passa a se apresentar como um negro, idoso, subserviente, geralmente de fé católica, que
representa a humildade.

Outro exemplo muito claro, que inclusive é bastante difundido e está inserido no mito criacional da
umbanda, é a história do Caboclo das Sete Encruzilhadas, entidade chefe de Zélio Fernandino de
Morais, que segundo contam, foi um padre jesuíta italiano que assumiu um arquétipo de um caboclo
(indígena) para anunciar a religião de umbanda.

Mas por que essa questão de arquétipo é inadequada para umbanda?

Porque o arquétipo, na prática, nada mais é do que a reprodução do racismo estrutural de nossa
sociedade. Ele serve para passar uma ideia "superioridade" de um espírito, que pode assumir
qualquer forma, porque negros e índios não são adequados como "mentores espirituais", por se
tratar de espíritos de pouca evolução.

Essa é a lógica perversa do espiritismo, que foi inserida na umbanda, com o objetivo claro de
embranquecer o culto ancestral.

Por que um preto ou um índio, dentro de sua cultura e sabedoria, não poderia se tornar um ancestral
capaz de aconselhar e conduzir seus descendentes?

Por que só o branco europeu é sinônimo de evolução, inteligência e cultura ?

Essa imagem ilustra muito bem

Você tem notado a presença de um grande número de brancos nas religiões afrodiaspóricas e mais
negros em religiões cristãs?
Já parou para se perguntar porque isso ocorre?

Isso é reflexo de um passado opressor e da supremacia branca.

Negros e índios foram forçados a se curvar à religião do colonizador e apesar da resistência de nossos
antepassados, ainda colhemos as consequências dessa opressão.

Em contrapartida, a elite branca se acha no direito de se apropriar de outras culturas e adaptá-las a


seu bel prazer.

É por isso que cada vez mais encontramos negros nas igrejas cristãs e brancos nos terreiros.

Parece perverso, não?

Mas isso ainda ocorre nos dias atuais.

Por que não podemos associar a umbanda ao espiritismo?

A resposta é simples, apesar de poucos compreenderem. Espiritismo e umbanda são religiões


distintas, produto de cultruas diferentes. A umbanda é resultado de práticas religiosas afroamerídias,
que tem como característica o culto e a manifestação de espíritos ancestrais. Chegou ao Brasil através
da diáspora africana, logo no início do período colonial. Em terras brasileiras, foi de encontro a outras
culturas, como a dos povos originários. Através dos séculos, foi se reeorganizado e resistindo às
perseguições e apagamentos impostos pela sociedade racista, o que ainda ocorre hoje.

Já o espiritismo é uma doutrina que se originou na França em meados do seculo XIX e tem um caráter
cientificista, que estuda a manifestação de espíritos e seus desdobramentos. No Brasil o espiritismo
assumiu a identidade de religião cristã, que logo se popularizou na alta sociedade, pelas
características eugenistas que possui. O espiritismo entende que os ancestrais cultuados na umbanda
são espíritos pouco evoluídos e que por isso não estão em condições de nos orientar. Para isso,
precisariam reencarnar diversas vezes, em diferentes corpos e cultura, afim de evoluir até chegar a
perfeição. Além disso, a doutrina espírita reprova os recursos utilizados pela umbanda, como o álcool,
o tabaco, o uso de ervas e outros elementos ritualísticos, que são indispensáveis para a prática do
culto ancestral, logo umbanda e espiritismo são incompatíveis.

Mas por que as pessoas insistem em associar essas religiões ?

Porque houve um projeto perverso de apagamento e apropriação cultural por parte de uma elite
branca, que encantada com o culto ancestral se apossou da cultura afroameríndia. Mais do que isso,
utilizaram recursos higienistas, para embranquecer o culto já existente e torná-lo mais aceitável aos
olhos da sociedade, dentre esses recursos houve a aproximação com o espiritismo, que era bem
aceito no meio social, mesmo sabendo que o espiritismo não gosta de ser confundido com outras
práticas espiritualistas.

Ainda hoje é conveniente falar em umbanda espírita ou cristã, pois a sociedade reproduz
constantemente um racismo que é estrutural e qualquer manifestação religiosa que fuja do padrão
cristão, branco e eurocêntrico, está sujeito a ser repreendido, execrado e combatido.

Não necessitamos do espiritismo para explicar os fenômenos que ocorrem na umbanda, tão pouco
das nomenclaturas e compreensões espiritas sobre o mundo. A umbanda está muito bem
fundamentada em suas práticas ancestrais e possui sua própria cosmovisão, que advém de culturas
muito mais antigas que o próprio cristianismo. Pare e reflita!

A falta de aceitação das filosofias africanas pelos pretos e pretas do Brasil, mostra o quão o racismo e
quem os pratica, são perversos.

Lara Saião, na introdução do livro, Filosofia Africana uma introdução, que tem Nei Lopes e Luiz
Antônio Simas ... como autores, diz:
"A Filosofia deve ser livre ligada a sabedoria em geral e não, tanto ao conhecimento técnico"

A filosofia Ocidental se torna dura e excludente e acaba sendo uma filosofia muito racional perante a
nossa realidade...

Filosofia não é monopólio de um determinado povo, lugar ou continente (europeu), como é ensinado
nas academias e reproduzido nas escolas.

Os povos do continente africano sempre tiverem uma forma de pensar estruturada.

O epistemicídio (apagamento/eliminação de saberes e conhecimentos), que tanto citamos,


infelizmente está muito vivo nos conceitos filosóficos, que esses povos trouxeram na Diáspora.

Conceitos sobre a morte, a ancestralidade, a alimentação, viver em comunidade, entre outros, são
confundidos e apagados da memória das pessoas pretas, isso é visível pela quantidade de mulheres
pretas, que fazem parte de igrejas pentecostais e neopentecostais, comparando a quantidade que
fazem parte dos terreiros.

A retirada da figura feminina preta, dos terreiros, apaga e interfere ao meu ver, não somente nos
saberes ancestrais, mas também causa a morte prematura dessas pessoas e dos que vem depois, que
vivem sem compreensão de quem são e seguem sem saber para onde vão...
O racismo é perverso .

A intolerância religiosa consiste na violação do direito fundamental de liberdade de crença e exercício


de culto religioso, assegurado na legislação brasileira. O combate à desinformação é uma das
principais ferramentas na luta pelo fim da intolerância religiosa, pois, por meio do conhecimento, é
possível romper as barreiras do preconceito e assegurar a todos o livre exercício de seus credos.
Portanto, torna-se importante promover espaços e eventos dedicados a sensibilizar, informar e
debater o tema com a população, sendo essencial o envolvimento da sociedade civil para que assim
seja possível alcançar o respeito a todas as religiões. É necessário informar a população sobre a
importância da tolerância a todo tipo de culto. A informação é a principal ferramenta para esse
trabalho.

A data foi oficializada em 2007 através da Lei n.º 11.635, de 27 de dezembro, e a sua escolha feita em
homenagem à Mãe Gilda, do terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum, localizado em Salvador.

Esse foi o dia em que ela, vítima do crime de intolerância religiosa, faleceu com um infarto no ano
2000.

Isso aconteceu na sequência de agressões físicas e verbais, bem como de ataques à sua casa e ao seu
terreiro quando Mãe Gilda foi acusada de charlatanismo por adeptos de outra religião.

Mãe Gilda tornou-se um símbolo do combate a esse tipo de intolerância, especialmente pelo fato de
simbolizar religiões de matriz africana. Este grupo representa o maior número de vítimas de
intolerância religiosa na atualidade.

Por esse motivo, como forma de combater a intolerância religiosa, surge um dia dedicado ao tema,
cujos crimes aumentaram de forma substancial nos últimos anos.

No mesmo dia 21 de janeiro é comemorado o Dia Mundial da Religião.

Iemanjá branca - a africanidade embranquecida

Adentramos no mês de fevereiro, aquele que é consagrado ao orixá Iemanjá e isso me faz refletir
sobre a representação da Iemanjá branca, que frequentemente vemos por aí.

Por que um orixá africano de terras iorubás é representado por uma imagem de uma mulher branca,
sensual, de cabelos longos e lisos? Talvez a resposta para essa indagação seja a mesma que explicaria
como surgiu um Jesus branco de cabelos castanhos e olhos claros, nascido no oriente médio.

Isso nos chama atenção para os padrões de beleza e referência que nossa sociedade impõe. O negro
não pode ser a representação do que é bonito e vice versa e o nome disso é racismo..

Me acenda um Pito!

Eu fico pensando, porque a nossa religião incomoda tanto.

Esse tipo de discurso que parte de uma "liderança religiosa" pode resultar em intolerância, agressão,
violência e morte. Qual é a responsabilidade desse pastor frente ao seu rebanho? Frente a
sociedade?

Todos os dias lidamos com a intolerância e o racismo religioso de forma gratuita. As pessoas são
violentadas na rua e até mesmo em seus espaços sagrados pelo simples fato de exercer a sua fé.

É por esse e outros motivos que não faz o menor sentido manter as influências cristãs dentro do
nosso culto! Você é macumbeiro e tem imagem católica no seu altar? Por favor, repense essa prática!
Eles (cristãos) não gostam de nós e não nos respeitam e não pense você que fazer discurso
politicamente correto de paz e amor vai mudar alguma coisa.

Nem todo mundo sabe, mas o Sincretismo na Umbanda está intimamente ligado ao Arquétipo Preto
Velho e à influência do Catolicismo sobre os escravos e também sobre a nossa religião. Isso fez com
que se emergisse um grande “caldeirão” com a mistura de santos católicos e orixás do panteão
africano.

Mas, afinal, o que é o SINCRETISMO? O Sincretismo se estabelece quando unimos dois elementos
através de suas semelhanças em culturas ou crenças diferenciadas, para criarmos um terceiro
elemento. Então, quando reunimos as características do grande soldado São Jorge do Catolicismo
com as características do Orixá Ògún, o guerreiro cultuado pelos yorubás, eis que surge Pai Ogum, o
nosso Orixá da Umbanda.

Os Escravos trazidos para o Brasil vinham de várias regiões da África, principalmente, os negros
oriundos das culturas nagô, gegê e bantu, que traziam consigo a sua fé e seus valores. Aprisionados
nas senzalas, não tinham nenhuma possibilidade de cultuar seus “deuses”, já que suas religiões eram
totalmente abominadas pelos grandes Senhores de Engenho.

Mas esses negros, embora estando longe de seu povo e do seu “chão”, nunca deixaram de manifestar
as suas crenças. Então, eles se utilizavam dos valores da religião católica, a religião predominante em
nossas terras, para criar subterfúgios que os permitissem realizar seus cultos, sem que pudessem ser
incomodados por seus algozes. Catequisados, eles encontravam nos santos da igreja semelhanças
que os ligavam aos deuses da sua terra natal. Com isso, eles conseguiam reafirmar as suas convicções
e a sua fé.

E de geração em geração, a prática foi repetida tantas e tantas vezes, até que depois de um longo
tempo, não se poderia mais determinar a diferença conceitual entre os santos e os orixás.

Este é o grande “caldeirão” da Terra Brasilis! A fé rompe as barreiras do tempo e mostra que não
existem limites para quem crê!

Religião de matriz AFRICANA não é sobre europeus. Acho que não é muito difícil compreender isso !

O protagonismo dentro dessas religiões sempre será de pessoas pretas! Ponto!

Ain, mas meus ancestrais eram portugueses!

E daí? A religião não vai mudar para que você se sinta melhor ou para que você se encaixe nesse
contexto. Os ancestrais da umbanda são basicamente pretos, indígenas e brasileiros (sertanejos).

Deixa eu te contar um coisa que talvez você não saiba:

Quando a escravização do negro no Brasil chegou ao fim em 1888 o governo brasileiro iniciou um
processo de higienização da população. Tinha preto demais por aqui!

Trouxeram italianos para trabalhar nas lavouras de café e em troca deram a esses imigrantes TERRA. E
não só os italianos foram contemplados. Sírios, espanhóis, alemães, dentre tantos outros também
vieram nessas mesmas condições. Sem falar nos portugueses que invadiram e exploraram essas
terras.

Hoje, a maioria dos descendentes desses povos que receberam terras, lá atrás, são latifundiários no
Brasil. E escravizam brasileiros em suas propriedades. Lembra da vinícola no sul? Pois é! É sobre isso!

E os negros?

Eles foram marginalizados e tiveram que se aquilombar. Sobrou a periferia!


Por muito tempo o negro foi proibido de acessar o mesmo espaço que o branco. Isso gerou uma
enorme lacuna social!

Aí eu te pergunto... porque não deram terra para os negros ou remuneraram seu trabalho?

A resposta é simples! Não queriam negro prosperando no Brasil.

A verdade é que os Brancos, de qualquer ascendência, possuem uma dívida histórica com os negros.
Estamos falando de um passado muito recente (135 anos, apenas).

E sabe o que é pior?

O branco continua execrando o negro e se apropriando de sua cultura.

Quando um branco chega e fala que a religião de matriz africana também é dele, ele está cometendo
o mesmo erro que seus ancestrais europeus.

Entenda!! A umbanda é preta, o candomblé é preto e o branco que estiver nessas religiões precisa
compreender isso e não se sentir ofendido quando for colocado no canto, pois branco nesse espaço
não tem lugar de fala!

Obrigado e de nada!

Iemanjá é uma divindade do panteão africano cujo nome original é Yemonjá (Yeye Omo Ejá), mãe dos
filhos peixes, orixá regente da pesca. Seu culto é realizado às margens do rio Ògum em Abeocutá. Sua
saudação africana "Odoyá", ainda mantida pelo candomblé, significa mãe do rio. Iemanjá só ganha
status de rainha do mar aqui no Brasil e com isso se populariza muito, principalmente na Bahia e no
Rio de Janeiro. É por ela que as pessoas vestem branco e realizam oferendas na virada no ano.

Com o advento do espiritismo de umbanda no início do século, a figura de Iemanjá sofre um


embranquecimento. Pelo sincretismo, Iemanjá foi associada a Senhora dos Navegantes,
tradicionalmente a padroeira dos pescadores, cultuada em 02 de fevereiro. Também é relacionada as
sereias pagãs erupeias e ainda as Iaras do culto amerindio.

Iemanjá acaba se aproximando muito dos santos católicos, inclusive pela representação de sua
imagem: uma mulher branca, de cabelos lisos, vestida de manto azul, com uma coroa na cabeça
trazendo uma estrela do mar. Essa imagem construída não deixa de ser um apagamento de
identidade, pois Yemonjá é definida como uma mulher negra, africana, de seios fartos e quadril largo,
simbolizando a maternidade e a fecundidade, ou seja, o oposto dessa representação criada.

Em Salvador, milhares de pessoas de diferentes religiões se reúnem em 2 de fevereiro, quando a


imagem católica sai em procissão acompanhada pelos barcos dos pescadores. Esta manifestação
popular é de fato grandiosa e além da religiosidade é uma oportunidade comercial. A venda de
quadros e imagens nessas épocas se torna muito lucrativa e talvez seja mais lucrativo a representação
de uma imagem socialmente mais aceitável, mais próxima a um santo católico do que de um orixá
africano.

E é dessa forma que ganha força a figura da Iemanjá branca. A colonização européia e suas
imposições refletem ainda de forma muito viva em nossa cultura, a começar pelo apagamento da
cultura negra e amerindia pelo eurocentrismo. A representação da Iemanjá branca, nada mais é do
que um epistemicidio.

Devemos urgentemente discutir essas questões em nossos terreiros. Não porque precisamos de uma
imagem negra para adorar, porque Orixá é energia, mas sim como uma forma de respeito aos nossos
ancestrais que trouxeram essa cultura e tanto sofreram na mão dos colonizadores. É muito cruel
saber que uma cultura pode ser anulada em detrimento de outra que se julga superior

Para além de incorporar nossos ancestrais precisamos incorporar os seus valores, caso contrário
nossa prática religiosa será nula.

Não adianta receber o preto velho e não ser antirracista;

Não adianta receber o caboclo e ser contra a demarcação de terras indígenas;

Não adianta receber o baiano e ser xenofóbico;

Não adianta receber a pombagira e ser misógino ou homofóbico;

Não adianta ter orixá e não lutar pela preservação da natureza;

Ainda sobre religião e política

É assustador ver que a maioria dos umbandistas não possuem pensamento crítico e repetem
discursos prontos e frases de efeito que se espalham rapidamente, porém são extremamente
equivocadas.

Uma dessas frases é:

"Religião e política não se misturam"

Será mesmo?

Todos nós temos interesses, sejam eles individuais ou coletivos e de alguma forma procuramos
defendê-los. Suprir as nossas necessidades e buscar aquilo que desejamos faz parte da nossa
natureza humana.

Quando um grupo de pessoas se unem pela mesma causa, para defender os mesmos interesses, esse
grupo está se organizando para fazer política.

Não é fácil definir política, mas de maneira generalista, ela pode ser compreendida como a
organização de ideias, interesses e necessidades de um grupo, que elegerá um representante para
que este fale e atue na luta pelos interesses em comum.

Perceba que todas as nossas relações humanas estão permeadas pela política. Existe política na
família, no trabalho, no condomínio, no bairro e também na igreja.

Por muito tempo, a Igreja Católica representou e influenciou o estado/monarquia em diversas nações
europeias, defendendo obviamente os seus interesses. A escolha do papa, líder da Igreja e chefe do
estado do Vaticano é um ato político.

Quando os evangélicos se unem e elegem representantes para ocupar as cadeiras do congresso


nacional formando uma bancada evangélica, eles estão defendendo seus próprios interesses.

Mas será que as religiões de matrizes africanas não possuem necessidades e interesses?

É evidente que sim!

Precisamos de políticas públicas que reconheçam nossos terreiros como espaços sagrados e de
preservação cultural, que nos defenda da intolerância e do racismo religioso, que nos garanta os
mesmos direitos que as igrejas possuem, que proteja as nossas comunidades marginalizadas, que
lute contra o racismo, a homofobia, a misoginia, a xenofobia e qualquer forma de discriminação.

Perceba que possuímos muitas pautas enquanto comunidade de terreiro e que por isso precisamos
nos unir para escolher um representante que defenda e lute pela nossa causa.

Todo terreiro é um espaço político, por acolher as minorias e por ser uma organização historicamente
recriminada por outros setores da sociedade. Não podemos fechar os olhos e fingir que não existe
política na religião, porque enquanto acreditarmos nisso seremos consumidos pela sociedade que
nos oprime.

Para cada umbandista que reproduz a frase: "política e religião não se misturam"; existem vários
"cristãos" se articulando para defender seus próprios interesses, que não são os mesmos que os
nossos.

Por que não podemos associar a umbanda ao espiritismo?

A resposta é simples, apesar de poucos compreenderem. Espiritismo e umbanda são religiões


distintas, produto de cultruas diferentes. A umbanda é resultado de práticas religiosas afroamerídias,
que tem como característica o culto e a manifestação de espíritos ancestrais. Chegou ao Brasil através
da diáspora africana, logo no início do período colonial. Em terras brasileiras, foi de encontro a outras
culturas, como a dos povos originários. Através dos séculos, foi se reeorganizado e resistindo às
perseguições e apagamentos impostos pela sociedade racista, o que ainda ocorre hoje.

Já o espiritismo é uma doutrina que se originou na França em meados do seculo XIX e tem um caráter
cientificista, que estuda a manifestação de espíritos e seus desdobramentos. No Brasil o espiritismo
assumiu a identidade de religião cristã, que logo se popularizou na alta sociedade, pelas
características eugenistas que possui. O espiritismo entende que os ancestrais cultuados na umbanda
são espíritos pouco evoluídos e que por isso não estão em condições de nos orientar. Para isso,
precisariam reencarnar diversas vezes, em diferentes corpos e cultura, afim de evoluir até chegar a
perfeição. Além disso, a doutrina espírita reprova os recursos utilizados pela umbanda, como o álcool,
o tabaco, o uso de ervas e outros elementos ritualísticos, que são indispensáveis para a prática do
culto ancestral, logo umbanda e espiritismo são incompatíveis.

Mas por que as pessoas insistem em associar essas religiões ?


Porque houve um projeto perverso de apagamento e apropriação cultural por parte de uma elite
branca, que encantada com o culto ancestral se apossou da cultura afroameríndia. Mais do que isso,
utilizaram recursos higienistas, para embranquecer o culto já existente e torná-lo mais aceitável aos
olhos da sociedade, dentre esses recursos houve a aproximação com o espiritismo, que era bem
aceito no meio social, mesmo sabendo que o espiritismo não gosta de ser confundido com outras
práticas espiritualistas.

Ainda hoje é conveniente falar em umbanda espírita ou cristã, pois a sociedade reproduz
constantemente um racismo que é estrutural e qualquer manifestação religiosa que fuja do padrão
cristão, branco e eurocêntrico, está sujeito a ser repreendido, execrado e combatido.

Não necessitamos do espiritismo para explicar os fenômenos que ocorrem na umbanda, tão pouco
das nomenclaturas e compreensões espiritas sobre o mundo. A umbanda está muito bem
fundamentada em suas práticas ancestrais e possui sua própria cosmovisão, que advém de culturas
muito mais antigas que o próprio cristianismo. Pare e reflita!

Reflexões sobre o cristianismo como instrumento de dominação do colonizador.

Recentemente o nosso terreiro, como tantos outros, sofreu intolerância religiosa por parte dos
vizinhos, que se disseram incomodados com o barulho dos atabaques. Eles interromperam nossa
cerimônia, reclamaram e em decorrência disso o dono do imóvel que abriga o terreiro, que é
alugado, pediu para que deixássemos o espaço no término do contrato, que ocorrerá no próximo
mês. O curioso é que a poucos metros do terreiro existe um grandioso templo da Igreja Universal, há
anos e "espantosamente" ninguém se incomodou com ele.

Começamos então a procura de um novo espaço para locação, pois não temos condições de comprar
um imóvel. Iniciamos algumas negociações, mas incrivelmente as portas se fecham quando falamos
que o espaço é para o terreiro.

Toda essa situação me fez refletir sobre a relação das religiões com a sociedade, o racismo e o projeto
de poder instrumentalizado pelo colonizador, que deu muito certo.

Comecei pensando sobre a quantidade absurda de pessoas negras na igreja. Isso me leva a crer que
para um negro adotar a religião do colonizador, no mínimo ele não conheceu a história de seus
antepassados, que evidentemente foi apagada. Além disso é muito provável que ele não tenha tido
acesso a educação para compreender a história do Brasil, bem como desenvolver um pensamento
crítico sobre a sociedade onde está inserido. Logo, foi arrebatado pelo cristianismo, que opera
sistematicamente contra a cultura e a religiosidade do seu próprio povo.

E se o negro não teve acesso a educação, tem um motivo muito claro: negro intelectual se torna
problema para o estado. É por isso que o estado/sociedade sempre fez com que esse negro fosse
subjugado e visto como um problema. Não bastaram os 350 anos de escravidão. A população negra
continua sendo escravizada de outras formas.

Por outro lado, temos as igrejas cristãs (católica e evangélica), muito ricas, donas de um patrimônio
incalculável, que ocupam os melhores espaços na sociedade. Possuem universidades e escolas,
hospitais e meios de comunicação, constituem até mesmo um poder político organizado, com
representatividade no Estado. Elas detém a dominação das grandes massas através do controle
desses setores estratégicos. Até mesmo o Estado, que deveria ser laico, se curva às igrejas, pois as
igrejas fazem parte do Estado e isso também é um reflexo do colonialismo.

Seus templos estão sempre localizados no centro das grandes cidades, nos bairros nobres e
ocupando grandes espaços. Ninguém se incomoda com a igreja fechando as ruas para as festividades
religiosas ou com o barulho dos fogos de artifícios em alvoradas, porque a igreja é a dona do
"normal".

E os terreiros?

Os terreiros se obrigam a ir para as periferias, pois o terreiro é a expressão religiosa do preto, apesar
de ser um espaço tomado pelos brancos. Mas lá na periferia também estão as religiões
neopentecostais arrebatando almas marginalizadas e violentas, que também irão combater com
muita agressividade os terreiros, invadindo, depredando e queimando esses espaços sagrados, em
nome de Deus.

Qual é a perspectiva?

Precisamos resistir, assim como nossos antepassados fizeram, pois estamos continuando a luta que
eles iniciaram. Talvez não vejamos resultados, mas os nossos descendentes verão. Sejamos nós os
ancestrais dos que virão amanhã.

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