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EXCELENTÍSSIMO CHEFE DE TRÂNSITO DA PREFEITURA

MUNICIPAL DE

AIT nº

Qualificação completa, vem respeitosamente, interpor o presente

RECURSO

Em face da notificação supracitada – cópia anexa-, pelos fatos e fundamentos a


seguir expostos.

1- DA NOTIFICAÇÃO
A presente notificação refere-se ao veículo placa1, por uma possível infração
ao art. 181, do CTB, qual seja, ESTACIONAR EM DESACORDO COM A
REGULAMENTACAO - ESTACIONAMENTO ROTATIVO, supostamente
cometida em 20/01/2021, às 09:26, na Rua Alagoas 66, Centro.

2- DA INVALIDADE DA PENALIDADE TENDO COMO AGENTE


AUTUADOR A PREFEITURA DE BELO HORIZONTE
Primeiramente, deve-se deixar clara a incompetência deste Órgão de
Trânsito, Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte – BHTRANS,
PREFEITURA DE BELO HORIZONTE – MG, para multar.

O que ocorre é que a Prefeitura de Belo Horizonte/MG, tem como órgão


autuador de suas multas a BHTRANS, e esta, por ser uma sociedade de economia
mista e ter personalidade jurídica de direito privado, não possui como competência a
aplicação das penalidades, mas apenas e tão somente a fiscalização do trânsito. Sendo
assim, fica impedida de exercer o poder de polícia, próprio dos agentes da
administração pública direta.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de não haver delegação de


competência dos poderes estatais, incluindo nesta seara o poder de polícia,

Conforme decidido pelo colendo STJ, no Resp nº 817.534, "somente os atos


relativos ao consentimento e à fiscalização são delegáveis, pois aqueles
referentes à legislação e à sanção derivam do poder de coerção do Poder
Público". Portanto, ilegal a aplicação de sanção (multa de trânsito) e a
consequente inscrição em dívida ativa, mesmo que do Município de Belo
Horizonte, pela BHTRANS, diante de sua natureza de sociedade de economia

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mista. V.V. EMENTA: ADMINISTRATIVO - APELAÇÃO CÍVEL -
EMBARGOS DE DEVEDOR - EXECUÇÃO FISCAL - MULTAS -
BHTRANS - LEGITIMIDADE DA AUTUAÇÃO - EXERCÍCIO DE
PODER DE POLÍCIA EM SUA PLENITUDE - INOCORRÊNCIA -
LIMITAÇÃO A ATOS DE FISCALIZAÇÃO - IMPOSIÇÃO DE MULTA -
ATO PROCEDIDO DIRETAMENTE PELO MUNICÍPIO - LEGALIDADE
- RECONHECIMENTO - IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS - RECURSO
PROVIDO - SENTENÇA REFORMADA. - Evidente a impossibilidade de
sociedade de economia mista exercer o poder de polícia em sua
plenitude, sendo legítima sua atividade apenas quanto à fiscalização e
autuação; restando impedida, no entanto, de impor sanções, porque
derivado "do poder de coerção do Poder Público", indelegável por
definição.
(TJ-MG - AC: 10024120308473001 MG, Relator: Barros Levenhagen, Data
de Julgamento: 08/05/2014, Câmaras Cíveis / 5ª CÂMARA CÍVEL, Data de
Publicação: 15/05/2014) (Grifo nosso).

Outra decisão a respeito da matéria, também do STJ,


EMENTA ADMINISTRATIVO. PODER DE POLÍCIA. TRÂNSITO.
SANÇÃO PECUNIÁRIA APLICADA POR SOCIEDADE DE ECONOMIA
MISTA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Antes de adentrar o mérito da controvérsia,
convém afastar a preliminar de conhecimento levantada pela parte recorrida.
Embora o fundamento da origem tenha sido a lei local, não há dúvidas que a
tese sustentada pelo recorrente em sede de especial (delegação de poder de
polícia) é retirada, quando o assunto é trânsito, dos dispositivos do Código de
Trânsito Brasileiro arrolados pelo recorrente (arts. 21 e 24), na medida em
que estes artigos tratam da competência dos órgãos de trânsito. O
enfrentamento da tese pela instância ordinária também tem por consequência
o cumprimento do requisito do prequestionamento.
2. No que tange ao mérito, convém assinalar que, em sentido amplo, poder de
polícia pode ser conceituado como o dever estatal de limitar-se o exercício da
propriedade e da liberdade em favor do interesse público. A controvérsia em
debate é a possibilidade de exercício do poder de polícia por particulares (no
caso, aplicação de multas de trânsito por sociedade de economia mista).
3. As atividades que envolvem a consecução do poder de polícia podem ser
sumariamente divididas em quatro grupo, a saber: (I) legislação, (II)
consentimento, (III) fiscalização e (IV) sanção.
4. No âmbito da limitação do exercício da propriedade e da liberdade no
trânsito, esses grupos ficam bem definidos: o CTB estabelece normas
genéricas e abstratas para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação
(legislação); a emissão da carteira corporifica a vontade o Poder Público
(consentimento); a Administração instala equipamentos eletrônicos para
verificar se há respeito à velocidade estabelecida em lei (fiscalização); e
também a Administração sanciona aquele que não guarda observância ao
CTB (sanção).
5. Somente os atos relativos ao consentimento e à fiscalização são
delegáveis, pois aqueles referentes à legislação e à sanção derivam do
poder de coerção do Poder Público.
6. No que tange aos atos de sanção, o bom desenvolvimento por
particulares estaria, inclusive, comprometido pela busca do lucro -
aplicação de multas para aumentar a arrecadação.
7. Recurso especial provido (Grifo nosso).

Outro motivo que impede a BHTRANS de autuar ou multar os motoristas


decorre da incompatibilidade da função social da empresa e o princípio da moralidade,
já que, por ser uma sociedade de economia mista, de acordo com o art. 2º da lei
6404/76, tem como finalidade a persecução do lucro.

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Sendo assim, há uma impossibilidade de coincidir os princípios da
Administração Pública, elencados no art. 37 da Constituição Federal com a finalidade
de tal sociedade, que busca sempre o lucro independente de averiguar ou respeitar
princípios essenciais da nossa sociedade.

A partir desse entendimento, necessário se faz a análise a seguir.

Dentre as diversas fontes de recursos da BHTRANS, estabelece a Lei 5.953/91


que criou essa sociedade:

“Art. 5° - São recursos da BHTRANS:


(...)
XII - o produto de arrecadação de penalidades pecuniárias aplicadas a
participantes do sistema de transporte coletivo e tráfego;"

Mais uma questão que deve ser levada em consideração, é que os agentes da
BHTRANS, por serem empregados públicos de uma sociedade de personalidade
jurídica de direito privado, não possuem os mesmos tetos salariais dispostos na
Constituição, pois independe de lei a fixação de suas remunerações bastando apenas a
decisão da Assembleia Geral, conforme dispõe o artigo 15 do Decreto Municipal
10.941/02. Mesmo quando a multa autuada por meio de equipamentos eletrônicos, deve
ser levado em consideração que o agente autuador é a BHTRANS, o que leva ao mesmo
questionamento feito nos parágrafos anteriores.

Em resumo, a imensa capacidade arrecadatória da BHTRANS, decorrente do


exercício do poder de polícia, não se coaduna com os princípios norteadores a que deve
se submeter a administração pública, padecendo de moralidade e legalidade o exercício
de fiscalização do trânsito por aquela sociedade.

Desta feita, porque este Órgão é reconhecidamente incompetente para multar,


seja através dos seus agentes, seja através de equipamentos eletrônicos, devendo os
presentes autos serem devidamente julgados consistentes e, por conseguinte, anular a
penalidade imposta ao recorrente.

3- DO NÃO ENVIO DA AUTUAÇÃO A RECORRENTE E CONSEQUENTE


ARQUIVAMENTO DA NOTIFAÇÃO

A Resolução 404/12 do CONTRAN que dispõe sobre padronização dos


procedimentos administrativos na lavratura de Auto de Infração, na expedição de
notificação de autuação e de notificação de penalidade de multa e de advertência, dispõe

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em seu art. 3º, acerca dos requisitos técnicos mínimos para a fiscalização de veículos
automotores:

Art. 3º À exceção do disposto no § 5º do artigo anterior, após a verificação da


regularidade e da consistência do Auto de Infração, a autoridade de trânsito
expedirá, no prazo máximo de 30 (trinta) dias contados da data do
cometimento da infração, a Notificação da Autuação dirigida ao proprietário
do veículo, na qual deverão constar os dados mínimos definidos no art. 280
do CTB e em regulamentação específica. (grifo nosso)

No caso concreto, mais uma norma foi desrespeitada. A recorrente não recebeu
em seu domicílio a autuação, e posteriormente, recebeu apenas a multa, o que está em
desacordo com os parágrafos 2º e 4º do mesmo art. 3º,

§ 2º A não expedição da notificação da autuação no prazo previsto no


caput deste artigo ensejará o arquivamento do Auto de Infração.

§ 4º A autoridade de trânsito poderá socorrer-se de meios tecnológicos para


verificação da regularidade e da consistência do Auto de Infração.

Se quem autuou diz que o fato foi cometido pelo recorrente, mas não há provas
disso, não há motivo para que a notificação continue.

Logo, pugna para que o agente autuador comprove que realmente enviou a
notificação de autuação para a residência do recorrente tendo em vista que não ficou
demonstrada nem comprovada essa emissão. Por conta dessa ausência de certeza do
envio, requer seja arquivado o auto de infração, nos moldes do art. 3º, § 2º da Resolução
404/12 do CONTRAN.

4- DO CTB, DA RESOLUÇÃO 404/12 DO CONTRAN E DA NÃO


COMPROVAÇÃO DO COMETIMENTO DA INFRAÇÃO
O CTB, que institui o código e as normas de trânsito, dispõe em seu art. 280 as
informações necessárias que devem conter no auto de infração:

“Art.. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á


auto de infração, do qual constará:
I - Tipificação da infração;
II - local, data e hora do cometimento da infração;
III - caracteres da placa de identificação do veículo, sua marca e espécie, e
outros elementos julgados necessários à sua identificação;
IV -o prontuário do condutor, sempre que possível;
V - identificação do órgão ou entidade e da autoridade ou agente autuador
ou equipamento que comprovar a infração;
(...)”(grifo nosso)

Sendo assim, após uma análise da notificação, verifica-se que a autoridade


autuadora não cumpriu o determinado pelo art. 280, IV, CTB, que é a juntada do
prontuário do condutor, infringindo uma das regras do mencionado artigo.

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E nem se argumente que tal fato adequa à segunda parte do mesmo art. 280,
CTB, posto que é inegável a impossibilidade de juntada do prontuário por parte do
órgão competente, tendo em vista que este possui absolutamente todas as informações
do suposto condutor infrator.
Ainda no mesmo art. 280 do CTB, só que no § 2º, há a exigência de que sejam
feitas comprovações por qualquer meio tecnologicamente disponível do fato que gerou
a autuação ou notificação,

Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á


auto de infração, do qual constará:
§ 2º A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do
agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento
audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente
disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN. (Grifo nosso)
Após rever o artigo 280 há a clara certeza de que essa autuação não pode
prosperar. Isso porque não há equipamento que evidencie tal infração, não há como
levá-la adiante e querer culpar a recorrente por algo que não tem comprovações
fáticas.
Além disso, também dispõe a Resolução nº 404/12 do Conselho Nacional de
Trânsito, menciona a mesma obrigatoriedade do artigo do CTB mencionado acima,
Art. 2° Constatada a infração pela autoridade de trânsito ou por seu agente,
ou ainda comprovada sua ocorrência por aparelho eletrônico ou por
equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio
tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN,
será lavrado o Auto de Infração que deverá conter os dados mínimos
definidos pelo art. 280 do CTB e em regulamentação específica.

Logo, a notificação não merece prosperar tendo em vista que não há nenhum
registro do cometimento da infração, e certamente o agente autuador tinha um meio
disponível para comprovar tal fato e mesmo assim não o fez, sendo, portanto, a
notificação de autuação neste caso é nula, por descumprir um importante
procedimento, conforme destacado acima, ao constatar a suposta infração cometida
pelo recorrente.
O art. 4º da mesma resolução, menciona a mesma obrigatoriedade do artigo do
CTB mencionado acima,

“Art. 4º Sendo a infração de responsabilidade do condutor, e este não for


identificado no ato do cometimento da infração, a Notificação da
Autuação deverá ser acompanhada do Formulário de Identificação do
Condutor Infrator, que deverá conter, no mínimo
(...)
XI - esclarecimento sobre a responsabilidade nas esferas penal, cível e
administrativa, pela veracidade das informações e dos documentos
fornecidos. ” (Grifado)

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O artigo também deixa bem claro que há a obrigatoriedade do esclarecimento
da responsabilidade nas esferas cível, administrativa e penal pelas declarações
fornecidas. Todavia, não consta nenhum esclarecimento acerca de qualquer
responsabilidade. Por isso deve ser considerada nula de pleno direito.
De igual modo, não consta qualquer menção ou advertência em relação à
penalidade que poderá ser imposta à recorrente, acarretando novamente em mais um
desrespeito à ordem legal em vigor.
Mesmo após a comprovação do erro do agente autuador, ainda há vícios que
impedem a multa de ser efetivamente legal, haja vista a não comprovação fática
do cometimento da infração ora em análise. Não há elemento fático algum que
caracterize a conduta ilegal, fato este que opõe ao que está disposto no art. 280, § 2º
do CTB.
Há irregularidades também no que diz respeito à configuração da infração, que
tem como requisitos necessários a materialidade e autoria, conforme ensinamentos da
doutrina. Isso porque não há elemento algum que justifique ou caracterize a infração.
Não há qualquer menção a tais fatos o que descaracteriza a infração. Sem essas
condições, como no caso em análise, o ato é nulo, não surtindo efeito jurídico algum.
Conforme dito acima, é claro que a recorrente teve seu direito prejudicado por
ter havido total inversão do ônus da prova, demonstrada pela ofensa ao princípio
constitucional da presunção da inocência que está disposto no art. 5º, LVII da CF/88.
Logo, ao invés de ser provada a existência da infração, que de fato não ocorreu, o
recorrente tem que utilizar de um recurso para provar que não desobedeceu a ordem
legal.
Portanto, verificada a existência de vícios de forma insanáveis, já que ferem
dispositivos constitucionais e infraconstitucionais elementares, não há outra solução,
senão a declaração de nulidade de pleno direito do presente auto de infração, com seu
consequente arquivamento, tendo seu registro julgado irregular, nos termos do art. 281,
parágrafo único, I, do CTB.

DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer o conhecimento e o provimento do presente recurso
para:

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I – Deferir o efeito suspensivo do presente recurso, caso o mesmo não seja
julgado em até 30 dias da data de seu protocolo, conforme o artigo 285, § 3º do CTB;

II- Acolher a preliminar apresentada, reconhecendo a incompetência deste órgão


para multar, determinando-se o arquivamento dos presentes autos;

III- Deferir a presente defesa, já que não haverá outra solução, senão a
declaração de inconsistência do registro, com seu posterior arquivamento, nos termos do
art. 281, parágrafo único, inciso I do Código de Trânsito Brasileiro, e a extinção da
respectiva pontuação eventualmente anotada no prontuário da recorrente;

IV- Deferir a substituição da punição de multa pela advertência, tendo em vista


não haver outras no prontuário da autora no período.

Pede deferimento.

Belo Horizonte, ______ de _________________ de 2023.

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