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A abordagem piagetiana
"Papai, por favor, corte este pinheiro — ele faz o vento. Depois que você
cortar ele, o tempo vai ficar bom e a mamãe me leva para um passeio."
"Mamãe, quem nasceu primeiro, você ou eu?"
(Helen Bee, A criança em desenvolvimento.)
.
Só assim o texto tem algum sentido para você.
Mas, ao mesmo tempo que as idéias e os conceitos do texto são
incorporados ao sistema de idéias e conceitos que você possui, essas
idéias e conceitos já existentes são modificados por aquilo que você leu
(assimilou). Esse processo de modificação que se opera nas estruturas
de pensamento do indivíduo é chamado por Piaget de acomodação.
Tal modo de conceber o funcionamento cognitivo é decorrente do
modelo biológico em que Piaget se baseou. Segundo esse modelo, a
inteligência é um caso particular de adaptação biológica. Um organis-
mo adaptado ao meio é aquele que mantém um equilíbrio em suas tro-
cas com o meio. Ou seja, é aquele que interage com o ambiente manten-
do um equilíbrio entre suas necessidades de sobrevivência e as dificul-
dades e restrições impostas pelo meio. Essa adaptação torna-se possível
graças aos processos de assimilação e de acomodação (que, juntos,
constituem o mecanismo adaptativo), comum a todos os seres vivos.
Assim, a inteligência é assimilação por permitir ao indivíduo incor-
porar os dados da experiência. É também acomodação, pois os novos
dados incorporados acabam por produzir modificações no funciona-
mento cognitivo da pessoa. Logo, "a adaptação intelectual, como qual-
quer adaptação, é exatamente o equilíbrio progressivo entre o mecanis-
mo assimilador e a acomodação complementar" (Azenha, 1994: 26JT
Segundo Piaget, Ao mesmo tempo que, por meio do processo de assimilação/acomoda-
os reflexos, como ção, o indivíduo adapta-se ao meio (elaborando seu conhecimento sobre
o de preensão,
possibilitam ao ele), o seu próprio funcionamento cognitivo vai se estruturando, se organi-
bebê lidar com zando. Uma das primeiras formas de organização cognitiva é o esquema.
elementos do
ambiente,
assimilando-os. A noção de esquema
A criança, ao nascer, é dotada de reflexos que são
reações automáticas desencadeadas por certos estímu1-los.
Esses reflexos (como o de sucção e o de preensão)
possibilitam ao bebê lidar com o ambiente. É através
deles que elementos do meio ambiente (como a chupeta, o
seio materno, a mamadeira, o patinho de borracha, etc.)
vão sendo assimilados pela criança. A assimilação, como
vimos, provoca uma transformação dos reflexos, que
gradativamente vão se diferenciando e se tornando mais
complexos e flexíveis, deixando de ser simples respostas
estereotipadas a estímulos determinados. Esse processo
dá origem a esquemas de ação, tais como pegar, puxar,
sugar, empurrar, etc.
Para entender o que é um esquema de ação, pensemos
no esquema de preensão. Um bebê pode pegar;— por
exemplo, um pequeno cubo de madeira, uma boi a mamadeira ou o dedo
de alguém. Relativamente a cada um desses objetos, a ação de pegar
apresenta pe quenas diferenças quanto aos movimentos que a criança
46 realiza. No entanto, em todas essas situações a ação da criança apresenta
determina-
das características que permitem chamá-la de pegar e que a diferenciam He
outras ações, como puxar, balançar ou empurrar. O esquema de ação t
A organização do
justamente, o que é generalizável em uma ação, o que permite reconhecê-la e real, por meio da
diferenciá-la de outras ações, independentemente do objeto a que se aplica. ação, marca o
É por meio dos es- È j início do
quemas de ação que a criança
começa a conhecer a
realidade, assi-milando-a e
atribuindo-lhe
significações. Quando pega
a mamadeira, ela a
relaciona a seu esquema
"pegar" e atribui-lhe o
sentido de um objeto "que
se pega". Mas a criança
também aplica à mamadeira
o esquema "sugar". Essas
assimilações provocam
transformações nos
esquemas
"pegar" e "sugar", à medida que eles são acomodados ao objeto mamadeira. desenvolvimento
Os esquemas "pegar" e "sugar" acabam então por se coordenar. cognitivo da
Vê-se que, mediante sucessivas assimilações e acomodações, o bebê vai criança.
conhecendo os objetos de seu mundo imediato. Eles são organizados em
objetos "para olhar", "para pegar", "para sugar", "para empurrar", "para
morder", "para olhar e pegar", "para pegar e sugar", "para pegar e morder", e
assim por diante.
A organização do real por meio da ação marca o início do desenvolvi-
mento cognitivo da criança. De acordo com Piaget, os esquemas de ação
ampliam-se, coordenam-se entre si, diferenciam-se e acabam por se
interiorizar, transformando-se em esquemas mentais e dando origem ao
pensamento. Esse desenvolvimento contínuo dos esquemas se dá no sentido
de uma adaptação cada vez mais complexa e diferenciada à realidade.
A noção de equilibração
O processo de desenvolvimento depende, na perspectiva piage-üana, de
fatores internos ligados à maturação, da experiência adquirida P ela criança em
seu contato com o ambiente e, principalmente, de um Processo de
auto-regulação que ele denomina equilibração.
Para Piaget, a equilibração é uma propriedade intrínseca e constj-
*tMtiva da vida mental. Por meio dela é que se mantém um estado de
■RUüíbrio ou de adaptação em relação ao meio, Toda vez que, em nossa
re
lação com o meio, surgem conflitos, contradições ou outros tipos de
dificuldade, nossa capacidade de auto-regulação ou equilibração entra
em ação, no sentido de superá-los. Quando, por exemplo, um bebê tenta
pegar um objeto pendurado sobre o berço, o objeto pode oferecer algu-
ma resistência a seu esquema de pegar, que, em desequilíbrio, obriga-o
a modificá-lo ou a coordená-lo com outro esquema, como o de puxar.
Essa atividade da criança — a acomodação ou coordenação de seus
esquemas de ação — é desencadeada graças à sua capacidade de
auto-regulação, com o objetivo de compensar a resistência oferecida
pelo objeto e alcançar um novo estado de equilíbrio.
Quando falamos em alcançar um novo estado de equilíbrio, quere-
mos destacar que o processo de equilibração não consiste numa volta ao
estado anterior, mas leva a um estado superior em relação ao inicial. No
caso de nosso exemplo, o fato de a criança não conseguir pegar o objeto
já indica que seus esquemas precisam ser aperfeiçoados. A
reequilibra-ção, por meio da acomodação ou da coordenação de seus
esquemas, implica uma ultrapassagem da situação anterior, uma
abertura para novas possibilidades de ação.
O período sensório-motor
O período pré-operatório
F
onte: Nossas crianças. Abril Cultural, 1970. v. 4.
Pesquisa de campo
Exercitando a análise
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