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Professora Juliana Cintra Marques Ferreira

Desenvolvimento Humano I
juliana.marques@anhanguera.com
Unidade 2

Seção 2.1

A perspectiva da epistemologia genética de Jean Piaget


Principais conceitos piagetianos

Piaget nasceu no dia 9 de agosto de 1896 em uma cidade pequena na Suíça


chamada Neuchâtel. Seu pai era um homem muito estudioso e tinha como trabalho
principal a produção científica acerca de estudos sobre literatura medieval e a história
de sua cidade natal.
Com relação à sua mãe, Piaget (1980) a define como uma mulher inteligente e
enérgica, dotada de um temperamento difícil, tornando a vida da família um tanto
conturbada. Sua mãe apresentava uma saúde mental fragilizada o que, segundo
Piaget, o influenciou em seu interesse pela Psicologia, em especial pela psicanálise
e as psicopatologias. Embora tal interesse fosse presente, Piaget sempre preferiu
estudar os padrões de normalidade do comportamento e o desenvolvimento da
inteligência.
A teoria de Piaget ficou conhecida como uma epistemologia genética, termo este
que apresenta o seguinte significado: "epistemologia" refere-se ao estudo do
conhecimento e "genética" a origem, a hereditariedade. Portanto, a teoria de Piaget
é considerada uma epistemologia genética ao propor estudar a raiz genética do
conhecimento, ou seja, a origem do conhecimento na criança (PIAGET, 1980).
Nesta sua precoce trajetória científica, Piaget viu a necessidade também de se
debruçar sobre os estudos da Psicologia, uma vez que possuía grande interesse pelo
desenvolvimento humano. Sendo assim, em 1918, após concluir a graduação em
Ciências Naturais e o doutorado com a tese sobre moluscos de Valais, Piaget vai para
Zurich (1918) com o objetivo de trabalhar em um laboratório de Psicologia (PIAGET,
1980).
Em 1919, Piaget foi a Paris e passou dois anos na Sorbonne. Neste tempo,
trabalhou em um laboratório onde era responsável pela aplicação de alguns testes
de raciocínio em crianças pequenas. Esta experiência possibilitou a Piaget que
encontrasse seu grande interesse de pesquisa, que é o desenvolvimento da
inteligência na criança.
Desde suas primeiras entrevistas com as crianças, Piaget compreendeu que, apesar do
mérito científico de seus testes de raciocínios (tão importante para o diagnóstico do
desenvolvimento cognitivo), o diálogo se mostrava mais efetivo para a compreensão
desse desenvolvimento. Neste sentido, Piaget começou a fazer experimentos com as
crianças por meio de perguntas que visavam investigar seus processos de raciocínio,
buscando compreender o caminho lógico que cada uma construía para chegar à
determinada conclusão (PIAGET, 1980).
Nessa experiência com as crianças, Piaget observou que aquelas de mesma faixa
etária apresentavam erros e características similares de raciocínio. A partir de então,
Piaget constatou que crianças de uma mesma faixa etária apresentavam
características semelhantes de raciocínio cognitivo. Esta constatação foi fundamental
em sua teoria, uma vez que ofereceu subsídios para a organização das fases do
desenvolvimento cognitivo (PALANGANA, 1998).
Outra constatação que revolucionou a compreensão sobre o desenvolvimento da
criança, foi a compreensão de que a lógica de funcionamento mental da criança é
muito diferente do adulto (PALANGANA, 1998).
Para Piaget, a criança pequena está construindo sua lógica de pensamento,
possuindo estruturas e funções cognitivas bastante diferentes dos adultos. Isto significa
que a forma como a criança acessa, compreende e interage com o mundo é singular e
não pode ser comparada ao mundo do adulto.
Outro contexto importante para os avanços dos estudos de Piaget foi o nascimento
de seus três filhos que, além de fonte de afeto, também permitiu a ampliação de sua
compreensão sobre o universo infantil. Em 1925, nasceu sua primeira filha, a
segunda em 1927 e um menino em 1931. Com a ajuda de sua esposa, Piaget
observava as reações de seus filhos, submetendo-os a vários experimentos
(PALANGANA, 1998).
Os estudos e interesses de Piaget resultaram na criação do Centro Internacional
de Epistemologia Genética, fundado pelo próprio autor.

Entre 1955 e 1965, Piaget trabalhou na Universidade de Genebra, onde foi


professor de história do pensamento científico e diretor-assistente.

Mais tarde, atuou como codiretor do Instituto Jean-Jacques Rousseau e diretor


do Departamento Internacional da Educação da mesma instituição (PIAGET, 1980).
Muitas vezes, a teoria de Piaget é compreendida somente pela influência dos
aspectos biológicos no desenvolvimento da inteligência, acreditando-se que ele exclui
de sua teoria a importância do social no desenvolvimento humano.
No entanto, segundo La Taille (1992) isto não é verdade pois, apesar de Piaget não
ter focalizado a importância das interações sociais ao longo de sua obra, não as excluía
como fatores importantes do desenvolvimento humano.

Entretanto, o que é consenso com relação à obra de Piaget é que ele enfatiza o papel
do amadurecimento biológico no desenvolvimento infantil, não se detendo à explicação de
que forma o social interfere no desenvolvimento e nas capacidades da inteligência
humana, assim como fizeram autores como Vigotski (LA TAILLE, 1992).
Para Piaget, no processo de interação da criança com seu meio social, o
organismo humano depara-se com diversas situações que favorecem seu
desequilíbrio, sendo necessário que a criança desenvolva mecanismos de adaptação
à realidade circundante (PALANGANA, 1998).
Neste processo de interação com o meio, em que inúmeras dificuldades e situações
são impostas à criança e que precisam ser superadas, há um impacto nas estruturas
cognitivas preexistentes e seu ajustamento, favorecendo o desenvolvimento de novas
estruturas cognitivas e a adaptação do sujeito à realidade.
Tal pressuposto parte da ideia de que o desenvolvimento é um processo contínuo,
em que cada habilidade aprendida se liga a uma estrutura cognitiva preexistente, a
qual é transformada para atender a novas exigências do meio e favorecer o
processo de adaptação.
Portanto, Piaget deriva de seus estudos da biologia dois conceitos
fundamentais para explicar o desenvolvimento humano: esquemas e
adaptação (PALANGANA, 1998).
No processo de adaptação e desenvolvimento das estruturas cognitivas, a
criança aprende a organizar suas ações no espaço e no tempo, surgindo as noções
de causalidade, constância do objeto, conservação, velocidade, entre outros fatores
importantes para o desenvolvimento cognitivo da criança.
Essas habilidades são aprendizados importantes que permitem à criança construir
uma lógica de pensamento, na medida em que atribui significado ao que vivencia,
ocorrendo primeiramente no âmbito do concreto para, em seguida, ocorrer no plano
abstrato. Em outras palavras, o processo de aprendizagem da criança é
caracterizado pela elaboração constante de novos esquemas (PALANGANA, 1998).
É por meio do mecanismo de adaptação a novas e diferentes circunstâncias que
as mudanças nas estruturas ou esquemas mentais são possíveis. A função
adaptativa é constituída por dois processos distintos e complementares: assimilação
e acomodação.
O primeiro refere-se à incorporação de novas experiências ou informações à
estrutura mental, sem, contudo, alterar a estrutura cognitiva. Já o processo de
acomodação é responsável pela reorganização das estruturas cognitivas.
Em outras palavras, pode-se entender o conceito de assimilação relacionado à
capacidade do sujeito incorporar um novo objeto ou conceito a um esquema
mental já existente, ou seja, a um esquema que já é construído e consolidado pela
criança.
Já o processo de acomodação pode ser entendido como o conhecimento que
altera os esquemas de ações e conhecimentos já adquiridos pelo sujeito,
visando adequar o novo objeto.
Neste processo de assimilação e acomodação, a criança passará a ter domínio
sobre o novo objeto, alcançando seu ponto de equilíbrio. (PALANGANA, 1998)
O ideal, para o desenvolvimento humano, é que os processos de assimilação e
acomodação ocorram em harmonia e de modo simultâneo, tendo em vista que
somente com a interligação desses dois processos é que de fato a adaptação
acontecerá (PALANGANA, 1998).
Quando Piaget refere-se ao termo equilíbrio, é importante destacar que tal
estado em um desenvolvimento saudável é momentâneo. Isto porque, à medida
que o sujeito interage com o social, novos desequilíbrios acontecem e novas
demandas de adaptação surgem às estruturas cognitivas, surgindo novos
processos de assimilação e acomodação.
A busca pelo equilíbrio guia o desenvolvimento humano na direção da autonomia,
em que o sujeito constrói suas próprias certezas sobre si e sobre o mundo,
libertando-se das ideias do senso comum e das imposições sociais que procuram
projetar concepções e ideologias no sujeito.
Na concepção de Piaget, em função do desenvolvimento cognitivo, o sujeito é
capaz de construir sua própria lógica de pensamento, questionando a realidade e
as
diversas imposições sob as quais vive, possibilitando o desenvolvimento da
autonomia (LA TAILLE, 1992).

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