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CRIADORES E CRIAS DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR:

(DES)AUTORIDADES CHAMADAS A FALAR SOBRE EDUCAÇÃO


Shayane França Lopes
(Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da UFF)

Esta comunicação tem como objetivo propor algumas reflexões acerca da


presença de grupos da iniciativa privada, em forma de patrocinadores de fundações e
organizações não governamentais, na educação pública brasileira. A formação discursiva
característica do mercado globalizado que está presente na convocação de vozes que são
chamadas como autoridades a falar sobre o cenário da educação, em práticas em que se
mostra a (ir)relevância de sua presença na área educacional, mas, ao mesmo tempo, a sua
afirmação como autoridade financeira e política no ensino público brasileiro. Cesar
Calligari, Lauri Cericcato, Patrícia Diaz, Mozart Ramos, Priscila Cruz, Maria Helena
Guimarães de Castro, Claudia Costin, entre outros representantes do Todos pela
Educação, da Fundação Itaú Social, do Instituto Ayrton Senna e da Fundação Lemann.
Quando esses nomes são convocados pela mídia como autoridades a falar, por exemplo,
sobre o cenário em que a educação brasileira se encontra, é possível supor que o foco não
está na educação em si, já que nenhuma delas tem propriedade sobre essa questão, mas,
sim, em uma perspectiva mercadológica de educação. Trata-se de práticas em que se
mostra a inexperiência profissional na área da educação, e, ao mesmo tempo, a sua
autoafirmação como autoridade financeira e política no contexto do ensino público
brasileiro. São pessoas consideradas especialistas em educação enquanto, na verdade, não
têm sequer formação acadêmica nessa área e que jamais passaram por salas de aula do
ensino básico privado ou público. Pela análise dos dados disponibilizados no Portal da
Transparência, vê-se que não há investimento das instituições citadas em serviços ou
melhorias educacionais. O que ocorre é dinheiro público proveniente sobretudo do MEC
sendo enxertado no Instituto Ayrton Senna e na Fundação Lemann (entre outras
instituições/fundações), seja em forma de convênios ou em forma de viagens e encontros
para promover tanto o Instituto quanto a Fundação. A Fundação Lemann, com
participação ativa na Base Nacional Comum Curricular, tem acesso a políticas públicas
por meio de troca de favores proporcionada por uma extensa agenda de contatos. De
acordo com a perspectiva teórica de Dominique Maingueneau (2008, 2014), definimos
discurso, intertextualidade e interdiscurso, e, a partir daí, traçamos as relações entre a
Base Nacional Comum Curricular – BNCC, a Reforma do Ensino Médio (Lei
13.415/2017) e as pessoas chamadas a falar sobre educação em programas de televisão,
rádio e internet. A partir daí, aprofundamos a relação entre a Reforma do Ensino Médio
e a Base, traçando uma linha que liga o interesse pelo controle do ensino público brasileiro
aos idealizadores da BNCC, passando pela secretaria executiva do Ministério da
Educação, pelo Conselho Nacional de Secretários de Educação – Consed, pela União
Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação – Undime e pelo Movimento pela Base,
que foi retirado da BNCC em sua versão definitiva. Como ponto comum a todas essas
entidades, órgãos e Movimento está a Fundação Lemann. Ilustramos de que maneira as
estratégias das organizações, institutos e fundações se concretizam nas salas de aula dos
colégios estaduais do Rio de Janeiro. O Ensino Médio é formalizado com a matriz
curricular (Resolução SEEDUC Nº 5.597 de 04 de janeiro de 2018), fixando componentes
curriculares do chamado Núcleo Articulador, atendendo ao estabelecido na Reforma em
conjunto com a BNCC, tornando obrigatórios os componentes curriculares em parceria
com o IAS e com o Sebrae. É preciso desnaturalizar um cenário que se constitui
discursivamente como transformador. Dar visibilidade a suas inúmeras incoerências,
encontrar formas de desarticular a força de um discurso mercadológico e fazer ouvir
aqueles que compartilham a sala de aula, os efetivamente envolvidos na Educação: alunos
e professores. É preciso expor o caminho pelo qual a educação está sendo carregada no
Brasil: um caminho feito por estradas de despublicização do ensino gratuito brasileiro.

Palavras-chave: Base Nacional Comum Curricular. Despublicização. Educação pública


brasileira. Iniciativa privada. Reforma do Ensino Médio.

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