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Projeto Diretrizes
Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina
OBJETIVO:
Descrever as principais recomendações em diagnóstico e tratamento da enurese.
CONFLITO DE INTERESSE:
Nenhum conflito de interesse declarado.
DEFINIÇÃO
INCIDÊNCIA
CLASSIFICAÇÃO
QUANTO À EVOLUÇÃO
Primária
Quando a criança sempre teve enurese, isto é, nunca teve
período prolongado de continência noturna. Representa a
maioria dos casos, e considera-se que seja cau- ALTERAÇÃO DA ESTABILIDADE VESICAL
sada por um retardo na maturação neurológica.
A redução na capacidade funcional vesical
Secundária noturna parece ser um importante fator na
Quando a criança volta a apresentar episódios fisiopatologia da enurese noturna. A função
de enurese após um período de controle miccional vesical em 95 crianças portadoras de Enurese
de pelo menos seis meses. Esta forma parece estar Noturna Monossintomática (ENM) foi avaliada
relacionada com uma maior incidência de eventos por meio de cistometria de enchimento natu-
sociais e familiares estressantes. ral, durante o dia, e de cistometria contínua
com EEG simultâneo, durante a noite. Foi
QUANTO AOS SINTOMAS demonstrado que 33 (35%) crianças apresen-
tavam capacidade vesical normal durante o dia,
entretanto, desenvolviam hiperatividade
Simples ou Monossintomática
detrusora e redução significativa da capacidade
Quando a enurese noturna não se associa a
vesical durante a noite, fato confirmado em
nenhum sintoma miccional ou vesical diurno,
outros trabalhos11(B)12(C)2(D).
nem a anomalias neurológicas e do trato urinário.
Corresponde a 70% a 90% dos enuréticos. O
Esta instabilidade seria causada por um
exame de urina é normal e não há antecedentes
retardo da maturação neurológica, responsável
de infecção urinária. Freqüentemente existem
pelo controle vésico-esfincteriano, estando
antecedentes familiares de enurese4(D).
associada a outros distúrbios observados em
crianças enuréticas, tais como retardo na
Polissintomática deambulação, fala ou controle esfincteriano
Quando a enurese está associada a sinto- anal. Este fator explica a tendência natural de
mas diurnos como micções infreqüentes, resolução com a idade13(C)2(D).
polaciúria, urgência, incontinência de urgên-
cia e jato miccional fraco. Também podem ALTERAÇÃO DE REGULAÇÃO NA LIBERAÇÃO
estar presentes a infecção urinária, a obstipação DA ARGININA VASOPRESSINA PELO
intestinal e a encoprese. O exame neurológico HIPOTÁLAMO
pode apresentar pequenas anormalidades, e o
trato urinário baixo também pode evidenciar Sabe-se que em crianças existe uma varia-
alterações estruturais. Este grupo de pacientes ção circadiana no ritmo de secreção de vasopres-
é mais resistente ao tratamento e mais vulne- sina, com um aumento durante o período notur-
rável à recidiva4(D). no, que normalmente causa redução de 50%
na produção noturna de urina e correspondente
FISIOPATOLOGIA aumento da sua osmolaridade nesse período. A
redução no volume urinário permite que o sono
A maioria dos autores considera a enurese não seja perturbado pelo enchimento vesical.
um sintoma e não uma doença. Observou-se que dois terços das crianças com
ENM não apresentam a variação noturna
Provavelmente está associada a três fatores: normal da secreção de vasopressina, o que
acarreta aumento da produção de urina, a se apenas um dos pais foi enurético e 15% se
ponto de ultrapassar a capacidade funcional da nenhum dos pais teve enurese19,20(C)3(D).
bexiga. Esta falta de variação circadiana também
pode estar associada a um retardo no amadure- Fatores Psicológicos
cimento, tendendo a se normalizar com a Não há evidências de causa psicopatológica
idade14,15(B)16,17(C)2(D). para a enurese primária, e a presença de altera-
ção psicológica em paciente enurético deve ser
INCAPACIDADE DA CRIANÇA EM ACORDAR, considerada como comorbidade. Por outro lado,
EM RESPOSTA AO ESTÍMULO DA BEXIGA CHEIA a enurese pode ser causa de uma desordem
comportamental importante. Existe um aumen-
Uma vez atingida a capacidade funcional da to da prevalência de enurese noturna e diurna
bexiga, seja por sua diminuição, seja por exces- em crianças com síndrome de hiperatividade e
so de produção de urina, é necessário esvaziá- déficit de atenção. Já a enurese noturna secun-
la. O episódio de enurese ocorre efetivamente dária está associada a um maior número de even-
pelo fato da criança não ser capaz de inibir as tos causadores de tensão psicológica, como
contrações vesicais durante o sono ou não conse- separação ou brigas dos pais, nascimento de
guir acordar para esvaziar sua bexiga. Apesar do irmão, distúrbios psiquiátricos em um dos pais
padrão de sono não diferir entre crianças enuré- e separação entre os pais e a criança. Inúmeros
ticas e não enuréticas, as primeiras têm mais estudos revelam que crianças com enurese secun-
dificuldade para acordar que crianças normais dária têm maiores dificuldades emocionais e
da mesma idade, e esta dificuldade é mais acen- problemas comportamentais do que crianças
tuada durante o primeiro terço do período notur- com enurese primária2,3,21(D).
no, quando ocorre a maioria dos episódios de
enurese. Do mesmo modo que os fatores ante- Fatores Orgânicos
riores, postula-se que a dificuldade de acordar Embora a grande maioria dos casos de ENM
também faça parte do retardo maturacional, e não tenha causa orgânica, entre 1% a 4% dos
tende a melhorar com a idade11,18(B)12(C). casos podem estar associados a alterações do
trato urinário, como infecção urinária, disfunção
Além dos fatores imediatos acima apresen- miccional e anomalias obstrutivas do colo vesical
tados, discute-se a importância de outros na e uretra. Inúmeras alterações neurológicas
gênese da enurese: podem estar associadas, como os disrafismos, a
bexiga neurogênica e a epilepsia. Outras afecções
Fatores Hereditários também causam enurese, como a apnéia do
Na maioria dos casos, a enurese é um pro- sono, anemia falciforme, diabetes insipidus (pela
blema familiar, sendo a herança autossômica dificuldade de concentração urinária) e obstipação
dominante com penetração variável. O gene intestinal (que pode provocar instabilidade vesical
responsável está localizado no cromossomo 13, e hiperatividade do esfíncter anal e uretral).
podendo também haver ligação com os
cromossomos 8, 12 e 22. Se ambos os pais Fatores Alérgicos
tiveram enurese, a probabilidade de a criança A maioria dos pacientes não apresenta rela-
apresentar enurese é de 77%, caindo para 44% ção objetiva entre enurese e alergia. Mesmo em
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