Você está na página 1de 8

Enurese Noturna

Nocturnal Enuresis

dária é caracterizada por recidiva enurese noturna 18. Trata-se de um


Vera H. Koch * da perda urinaria involuntária, após problema gerador de ansiedade pa-
Jesse M. Navarro ** período de controle miccional de ra a criança e sua família n mas acre-
Yassuhiko Okay *** pelo menos 6 meses 57. dita-se que, em média, apenas 30%
dos casos chegam a procurar trata-
Epidemiología mento médico39.
Definição A enurese noturna parece ser
A prevalência de enurese notur- mais freqüente em populações de
Define-se enurese como a elimi- na é muito variável em diferentes baixa renda e em famílias numero-
nação involuntaria de urina pela populações. Esta variabilidade é pro- sas39em crianças institucionalizadas,
criança em idade na qual o contro- vavelmente, devida às diferentes com treinamento esfincteriano ina-
le vesical já deveria estar presente. expectativas e condutas sociais de dequado e em primogênitos12. Apro-
Este limite de idade é, na verdade, cada grupo populacional e às defi- ximadamente 15 a 20% das crian-
arbitrário e decorre do fato de con- nições diferentes do problema, ças com enurese noturna apresen-
siderar-se que após 3 anos de ida- enunciadas pelos diversos autores tam, também, enurese diurna, por-
de a maioria das crianças com de- (Tabela 1). centagem esta que cai rapidamen-
senvolvimento neuropsicomotor A enurese é, em geral, mais co- te após os 5 anos de idade9.
adequado deve apresentar contro- mum em meninos até os 11 anos A distribuição de crianças com
le vesical diurno. O controle mic- de idade. Depois, a diferença de perda involuntária de urina, segun-
cional noturno estabelece-se, em prevalência entre ambos os sexos do a faixa etária, foi investigada
geral, antes dos 6 anos de idade. não é mais significativa36. A preva- em um estudo longitudinal de 1265
A enurese pode ser exclusivamen- lência de enurese noturna diminui crianças, acompanhadas periodica-
te noturna ou diurna e noturna. com a idade e a taxa anual de cura mente em nível ambulatorial16. Veri-
Denomina-se enurese primária a espontânea é de 14% entre 5 e 9 ficou-se que, após os 5 anos de ida-
perda urinaria noturna em pacien- anos de idade, e de 16% para aque- de, 50 a 60% das crianças com per-
tes que nunca chegaram a apresen- les entre 10 e 18 anos de idade8. da urinaria noturna não tinham ain-
tar controle vesical prévio por pe- Aos 15 anos de idade, apenas l a da adquirido controle esfincteria-
ríodo prolongado. A enurese secun- 2% dos adolescentes apresentam no adequado e as demais apresenta-

Trabalho realizado pela Unidade de Nefrolo-


gia do Instituto da Criança "Prof. Pedro
de Alcántara" do Hospital das Clínicas da
FMUSP e pela Divisão de Pediatria do Hos-
pital Universitário da USP.
* Assistente da Unidade de Nefrologia
** Neuropediatria do HU.
***Professor Associado do Departamento
de Pediatria da FMUSP e chefe da Unidade
de Nefrologia.
vam enurese secundária. A par- ça indicar quando a bexiga está Fatores genéticos
tir de 8 anos de idade, 3-3% ain- cheia e a micção é iminente. Esta
da eram enuréticas primárias, ocorre entre o primeiro e segundo A enurese tem sido atribuída a
mas a prevalência global de enu- ano de vida28. Entre os 3 e 6 anos fatores genéticos desde os estudos
rese noturna para esta idade de idade, a maioria das crian- de Frary, em 193519. Outros auto-
era de 7.4% devido aos casos ças consegue controle voluntário res têm confirmado a alta incidên-
de enurese recidivante ou secundá- do esvaziamento vesical com bexi- cia familiar do problema3' 16> 2 3 > 2 6 .
ria. ga cheia. Em crianças maiores, a Em 70% das famílias de crianças
O mesmo estudo mostrou, em micção em geral é voluntária qual- enuréticas, o sintoma pode ser en-
adição, vários fatores preditivos quer que seja o grau de repleção contrado em mais de um parente
de atraso no desenvolvimento de vesical5. e, em 40% dos casos, em pelo me-
controle esfincteriano vesical: histó- Durante o período de maturação nos um dos pais. Da mesma forma,
ria familiar de enurese, ritmo len- do controle da função vesical, a se pelo menos um dos pais apresen-
to de desenvolvimento neuropsico- criança passa por um período de tou antecedente positivo para enu-
motor e número elevado de horas transição onde a continência é efe- rese noturna, a probabilidade de
de sono durante o primeiro ano tuada pela contração voluntária do vir a ter um filho ou filha afetados
de vida. esfíncter externo (padrão infantil) é de 40% e 25% respectivamente23.
e não pela supressão neurológica17 A incidência de enurese pare-
Etiología da contração do detrusor, como ce ser maior quanto maior a pro-
no adulto. ximidade genética do parente a-
A enurese noturna, primária ou Na avaliação urodinâmica de fetado7, segundo mostra a tabela 2.
secundária, deve ser encarada, pre- crianças com enurese noturna isola-
ferencialmente, como um sintoma da, é freqüente a persistência do Fatores psicológicos
e não como uma doença. Em geral, padrão infantil, com capacidade ve-
não há uma origem única e comum sical diminuída e freqüentes contra- O risco de enurese parece ser
do problema para todos os pacien- ções não inibidas do detrusor. A maior em crianças que aos 3 - 4
tes. Ao contrário, a enurese pode
diminuição da capacidade vesical anos de idade sofreram eventos mar-
resultar de múltiplas causas, conco-
mitantemente. O importante é salien- é, no entanto, apenas funcional e cantes como dissolução familiar por
tar que o paciente com enurese no- não anatômica como anteriormen- morte ou divórcio, nascimento de
turna isolada, raramente apresenta te se pensava pois, em exame sob um irmão, mudança de casa, interna-
base anatômica, neurológica ou psi- anestesia, estas medidas tornam-se ção hospitalar, acidentes ou cirur-
quiátrica passível de tratamen- normais13-30. Estes achados têm re- gias. Estes eventos parecem exercer
to20,21,48 solução espontânea após o desapa- efeito negativo no ''aprendizado"
recimento do sintoma enurese, sen- da continência urinaria, num perío-
Retardo de desenvolvimento do, portanto, considerados como do crítico para o desenvolvimento
neurológico vesical e fatores um padrão de imaturidade neurofi- da criança. No entanto, apesar de a
urodinâmicos siológica vesical13. enurese ser talvez mais comum em
Nas crianças que, além da enure- crianças com problemas emocionais
O controle neurogênico da mic- se noturna, apresentam também sérios, a incidência de dificuldades
ção é realizado pela integração do história de urgência miccional, emocionais entre enuréticos, como
sistema nervoso simpático e paras- micções diurnas freqüentes e jato grupo, não é aumentada, a não ser
simpático, nervo pudendo, centro urinario fraco e intermitente, en- em alguns casos, secundariamente
espinal miccional sacral, centro mic- contram-se achados urodinâmicos à própria enurese60.
cional pontino e córtex cerebral. definitivamente anormais em 80%
Esta integração é complexa e con- dos casos34. Esta é a síndrome da Fatores ligados ao sono
trola as fases de relaxamento e esva- instabilidade ou dissinergia do
ziamento vesical. músculo detrusor, freqüentemen- Por muitos anos a enurese foi
No recém-nascido, a micção é te associada a infecções de repeti- considerada como uma parassonia
um ato reflexo gerado em nível da ção do trato urinario e refluxo específica do estágio de sono NREM
medula espinal. Com a maturação vésico-ureteral 29 . Esta situação ("non rapid eye movement"), espe-
do sistema nervoso, a micção sofre deve ser detectada precocemen- cificamente na fase 442. Estudos re-
processo de encefalização^. te para minimizar os riscos de aco- centes, no entanto, têm demonstra-
A primeira etapa do processo metimento do aparelho urinario do que episodios de enurese podem
maturativõ é a capacidade de a crian- alto. ocorrer em todas as fases de sono
diferença estatisticamente significa-
tiva entre a incidência de anormali-
dades eletroencefalográficas em
crianças normais e enuréticas e que
a freqüência de enurese em crian-
ças epilépticas e normais é semelhan-
te.

Alteração no ritmo circadiano da


vasopressina (HAD)

Estudos recentes 43 ' 56 que com-


param pacientes enuréticos com
voluntários noVmais demonstraram
que, no indivíduo normal, existe
um ritmo circadiano de HAD. Os
níveis séricos de HAD no indivíduo
normal são constantes durante o
dia e sofrem um aumento abrupto
NREM, com uma freqüência direta- Dentre elas, diabetes melito, diabe- e significativo no período noturno.
mente relacionada à duração deste tes insipido, tubulopatias e insufici- O mesmo não ocorre com o pacien-
estágio de sono. Episódios de enu- ência renal crônica. A enurese inci- te enurético, no qual os níveis séri-
rese não são freqüentes durante a de em portadores de anemia falci- cos noturnos de HAD sofrem au-
fase REM ("rapid eye movement") forme em proporção significativa- mento noturno significativamente
do sono 15. Não foram encontradas rnente mais elevada do que na po- menor. Esta diferença tem repercus-
diferenças entre o padrão de sono pulação normal e nos portadores são fisiológica. Assim, os indiví-
de crianças enuréticas e crianças de outras hemoglobinopatias55. A duos normais apresentam volume
normais. enurese é também sintoma freqüen- urinario noturno menor e osmolari-
;emente associado aos casos de be- dade urinaria noturna maior do
Fatores Orgânicos xiga neurogênica e bexiga neurogê- que os enuréticos (estas diferenças
nica não-neurogênica (Síndrome são estatisticamente significativas).
Somente l a 2% dos casos de de Hinman). Nesta situação, os pa- Estes estudos confirmam observa-
enurese noturna estão associados cientes apresentam sinais de uropa- ções anteriores mostrando que o
a uma etiologia de base orgânica5?; tia obstrutiva grave, de base funcio- volume urinario noturno do pacien-
15% dos casos de infecção de tra- nal25. te enurético é maior do que aque-
to urinario apresentam enurese co- A ingestão de aditivos contidos le observado no indivíduo normal52.
mo alteração clínica isolada. Este em alguns alimentos pode, através
sintoma é também freqüente nos de mecanismo alérgico, sensibilizar Avaliação clínica e laboratorial
casos de bacteriúria assintomática35. a bexiga, determinando enurese14.
Lesões obstrutivas do trato urinario, A obstrução parcial de vias aéreas A enurese noturna é, em geral,
assim como a presença de ureter e a apnéia obstrutiva durante o so- uma condição benigna, com alto
ectópico, são feqüentemente asso- no podem também favorecer episó- índice de cura espontânea, que au-
ciadas à enurese 2. dios de enurese noturna42. menta com a idade. Se os familia-
A distenção retal devida à obsti- A enurese associada à polidipsia res e o paciente forem devidamen-
pação intestinal determina a distor- pode, raramente, ser a manifestação te esclarecidos e o grau de ansieda-
ção da anatomia vesical da qual re- clínica de hipertensão arterial reni- de minimizado, mais de 50% dos
sultam contrações não inibidas do no-dependente6. Nestes casos, a casos curam-se em até 4 anos após
músculo detrusor 46. A normaliza- normalização da pressão arterial re- a primeira consulta médica33.
ção do hábito intestinal em crian- solve a enurese. A primeira entrevista médica com
ças com enurese noturna e/ou diur- Quanto ao conceito de que a a criança e seus familiares deve,
na associada à obstipação intestinal enurese seria, em alguns casos, portanto, ocorrer num ambiente
pode promover atenuação ou mes- um "equivalente convulsivo", não calmo. A criança deve participar ati-
mo resolução da enurese 46. parece haver, atualmente, funda- vamente da consulta. Todos os par-
Qualquer situação que cause po- mento para tal afirmação, uma vez ticipantes devem expor suas dúvi-
liuria pode resultar em enurese. que foi demonstrado53 que não há das e medos. Os esclarecimentos
sobre o problema devem ser dados Outro aspecto interessante, ape- sódio de enurese não devem ser
com empatia e de forma tranquiliza- sar de normalmente negligenciado estimuladas pelo pediatra pois não
dora. no exame físico, é a avaliação do resultam em melhora significativa
A história clínica é fundamental, jato urinario. Jatos urinados fracos, da enurese noturna57.
devendo ser completa, com espe- e intermitentes podem sugerir alte- A chave para a resolução da enu-
cial ênfase em: tipo e condições rações anatômicas ou funcionais rese noturna é o estímulo para que
de parto, peso de nascimento, de- do aparelho urinario baixo. A capa- a criança afetada assuma responsa-
senvolvimento neuropsicomotor e cidade vesical adequada para ida- bilidade frente ao problema e quei-
métodos de treinamento esfincteria- de pode ser calculada pela fórmula: ra resolvê-lo. Para tanto, a criança
no. capacidade vesical (ml) .= idade deve participar ativamente de todas
A avaliação gênito-urinária deve em anos x 32 as entrevistas e discussões relativas
incluir dados relacionados a: ao mesmo. Seu sentimento de cul-
- tipo e gravidade da enurese no- O uso desta fórmula associado pa frente à enurese deve ser mini-
turna à observação do jato miccional po- mizado pelo esclarecimento dos
- Instalação do sintoma com início de sugerir a indicação mais preco- prováveis fatores favorecedores,
súbito/associação com dor lombar ce de exames como a urofluxome- dentre eles, a incidência familiar,
ou cervical/ perda de sensibilidade tria e urodinâmica44. Pacientes com se for o caso. As possíveis aborda-
perineal micções infreqüentes apresentam, gens terapêuticas, assim como a al-
- associação da enurese noturna com: em geral, capacidade vesical aumen- ta incidência de cura espontânea,
- enurese diurna tada, jato urinario fraco ou intermi- devem ser expostas à criança. Os
- urgência miccional tente e resíduo pós-miccional signi- familiares devem receber o mes-
- micções infreqüentes ficativo. Por outro lado, os pacien- mo esclarecimento, entendendo
- tipo de jato urinario tes enuréticos apresentam, freqüen- que se trata de uma situação transi-
episódios anteriores de infecção temente, capacidade funcional vesi- tória e não intencional. Deve, no
do trato urinario cal diminuída, conforme comenta- entanto, ficar claro à criança e à fa-
- obstipação intestinal ou encoprese do anteriormente. milia que a maior responsabilidade
Antecedentes pessoais relaciona- A investigação subsidiária da no cumprimento das manobras tera-
dos a cirurgias ortopédicas ou neu- criança com enurese não deve ser pêuticas cabe à criança, pois somen-
rocirúrgicas, assim como anteceden- agressiva, de início. Aconselhamos te a sua participação ativa pode ace-
tes familiares de enurese, anemia o seguimento do esquema apresen- lerar a resolução deste sintoma.
falciforme, diabete, alergias e episó- tado a seguir. Tendo em mente o que foi ex-
dios convulsivos, devem ser pes- posto, cabe ao pediatra sugerir abor-
quisados. O ambiente psico-emocio- Tratamento dagens terapêuticas condizentes
nal da criança deve também ser in- com a idade do paciente, para que
vestigado. A enurese noturna é, em geral, este possa se responsabilizar pela
O exame físico deve ser cuidado- uma situação transitória benigna de- execução das mesmas, a saber59:
so, incluindo medidas antropomé- vida à imaturidade do controle mic- Crianças até 6 anos de idade -
tricas, pressão arterial, palpação ab- cional. A abordagem terapêutica não reforço positivo
dominal com especial atenção à deve, portanto, se basear em méto- Crianças entre 6 e 8 anos de idade -
palpação de tumores, fecalomas e dos agressivos, devendo-se evitar reforço positivo
+
bexigomas; exame genital deve aten- ações de potencial deletério elevado. treinamento vesical
tar para a presença de processos ir- A enurese noturna complicada, Crianças com mais de 8 anos de
ritativos locais, balanopostites, vul- por outro lado, deve ser, de prefe- idade -
vovaginites, presença de corpos es- rência, orientada pelo pediatra em reforço positivo
tranhos, entre outros. seguimento conjunto com o especia- treinamento vesical
O exame neurológico é funda- lista, para planejamento terapêutico. uso de alarmes
mental e deve incluir o toque retal São múltiplas as abordagens tera- abordagem farmacológica
para avaliação do tônus do esfíncter pêuticas que têm sido utilizadas pa- outros métodos
anal. A presença de anormalidades ra controle da enurese noturna não
da coluna lombo-sacra, como lipo- complicada. Práticas muito difundi- Cada uma destas opções será ana-
mas, hemangiomas, mechas de cabe- das como a proibição da ingestão lisada brevemente a seguir.
lo, hiperpigmentação e assimetria de líquidos no período noturno, a
da prega glútea sugere distúrbio de interrupção freqüente do sono da Reforço positivo
origem neurológica, em geral asso- criança, para esvaziamento vesical É parte fundamental da aborda-
ciado à hipotonia do esfíncter anal29. e as atitudes punitivas frente ao epi- gem terapêutica em todas as idades.
A criança deve manter um calen- talação do sistema todas as noites. da também de efeitos antiespasmó-
dário das noites "secas" e das noi- O paciente, de início, em geral, so- dico, anticolinérgico e outros asso-
tes, ''molhadas". As noites "secas" mente acorda com o som da cam- ciados à interação complexa com
devem ser elogiadas, podendo-se painha, após ter esvaziado comple- a inervação simpática vesical30.
até estabelecer um sistema de prê- tamente a bexiga. Após algumas se- A imipramina é, em geral, reco-
mios à medida que o número de manas, passa a acordar cada vez mendada na dose de 0.9 - 1.5
noites "secas" consecutivas aumen- mais rapidamente, até que não é mg/kg/dia (dose máxim'a 75
te. A criança deve se habituar a es- mais acordado pelo som da campai- mg/dia)32. Deve ser ministrada em
vaziar a bexiga antes de dormir. A nha, mas sim, pela sensação de dis- dose única, horas antes de a crian-
criança nunca, deve ser punida pe- tenção vesical. Este processo dura, ça se deitar. O efeito máximo ocor-
los episódios de enurese noturna. em geral, 4-6 meses. Em caso de re, em geral, na primeira semana
As visitas ao pediatra devem ser recidiva, após a suspensão do uso de uso, devendo-se aguardar pelo
periódicas. A criança deve trazer do alarme, o mesmo deve ser reini- menos duas semanas para avaliar a
consigo o seu calendário para que ciado, obtendo-se, freqüentemen- eficiência e-para eventuais ajustes
o profissional possa acompanhar te, resultados excelentes e duradou- de dose. Quando eficaz, o uso tem
sua evolução. Uma boa maneira ros. sido recomendado por 3 a 6 me-
de atenuar problemas em casa é es- O sistema de alarme somente de- ses, após o que, a dose deve ser
timular a criança a realizar, ela mes- ve ser utilizado se a criança não te- diminuída gradualmente em 3 e 4
ma, a troca da roupa de cama e pi- ve sucesso no controle vesical no- semanas. Esta diminuição gradual
jamas molhados por outros limpos, turno com as técnicas de reforço reduziria a incidência de recidivas
dependendo de sua capacidade, ta- positivo e treinamento vesical. O após suspensão da droga57. No ca-
refa esta sempre desagradável para uso de alarmes não dispensa a ma- so de recidiva, o esquema deve ser
a mãe ou responsável, e a partici- nutenção do reforço positivo. reiniciado.
par, sem caracter punitivo, da lava- Dentre as complicações do uso Efeitos colaterais da imipramina
gem dos mesmos. do sistema de alarme podemos ci- são raros incluindo, insônia, ansie-
tar o eritema, a descoloração e a ir- dade e irritabilidade. A intoxicação
Treinamento vesical ritação de pele em contato com o com o medicamento é grave e de-
eletrodo. Quando isto ocorrer, a termina arritmias cardíacas por blo-
A criança deve ser estimulada a utilização do sistema deve ser sus- queios de condução, hipotensão e
aumentar a ingestão de líquidos pensa44. convulsões. A droga de escolha pa-
no período diurno, para que, duran- ra os casos de intoxicação é a fisos-
te várias vezes ao dia, possa sentir Abordagem farmacológica tigmina. Níveis urinarios e séricos
o estímulo à micção. Quando da do medicamento não se correlacio-
ocorrência do mesmo, a criança 1. Imipramina nam com o grau de intoxicação e
deve ser orientada a tentar "segu- A droga mais freqüentemente não têm se mostrado úteis para o
rar a urina" por algum tempo, vi- utilizada no controle da enurese controle clínico do paciente49.
sando ao aumento de sua capacida- noturna é o antidepressivo tricícli-
de funcional vesical e, ao urinar, co, imipramina. Desmopressina
deve fazê-lo de maneira completa O mecanismo de ação farmacoló- Vários estudos4- 10» 47>51' 6l têm
mas com a orientação de realizar gica desta droga na enurese não é demonstrado resultados promisso-
exercícios de interrupção do jato conhecido. O efeito anti-enurético res com o uso desta droga que é
miccional, para a melhoria do con- não parece estar relacionado à ação um análogo da vasopressina. A ba-
trole voluntário da micção. antidepressiva, pois o primeiro é se fisiopatológica de ação seria a
quase imediato enquanto que o efei- de promover o pico de HAD ausen-
Uso de sistemas de a/arme to antidepressivo, em geral, ocor- te ou subnormal, na criança enuré-
re 10 dias após o início de sua utili- tica43' 56. As doses utilizadas variam
O sistema de alarme é baseado zação. Outra possibilidade seria a de 10 - 40 ug, via intranasal. Efeitos
em sensores de umidade colocados relação do efeito anti-enurético com colaterais graves não foram verifica-
na roupa íntima da criança, os quais, a diminuição da fase REM do sono, dos. Hiponatremia foi descrita em
quando ativados, fazem soar uma na qual, como anteriormente se casos raros e pode ser evitada atra-
campainha. pensava, os episódios de liberação vés de controle da ingestão hídri-
A criança, como exposto anterior- de conteúdo vesical ocorreriam ca. A recidiva é, no entanto, freqüen-
mente, deve participar da opção mais freqüentemente50. Estudos re- te, após a suspensão do medicamen-
da escolha deste método terapêuti- centes não confirmam esta teoria15- to. A desmopressina parece ser es-
37 5 4
co e deve ser responsável pela ins- > . A imipramina parece ser dota- pecialmente útil em crianças com
mais de 9 anos de idade e naquelas de especial utilidade em casos de dos. A maioria dos casos é do tipo
que necessitam de uma droga de extrema ansiedade familiar relacio- não complicado. Há várias aborda-
ação rápida e segura por tempo cur- nada ao problema e /ou fatores pre- gens terapêuticas possíveis para o
to, por exemplo, para um fim de cipitantes emocionais especifica- manejo clínico da enurese noturna
semana na casa de amigos27. Ou- mente ligados ao sintoma8. não complicada. Cabe ao pediatra
tros estudos têm demonstrado que orientar a escolha daquela que me-
o uso da droga por período de pelo 4. Acupuntura lhor se adeque a cada paciente, in-
menos 2 meses, com diminuição A acupuntura, método raramen- dividualmente. O esclarecimento
gradual posterior do medicamento te utilizado para controle da enure- da família e da criança sobre a be-
por 3 a 6 meses, aumentada a chan- se noturna, parece ser particular- nignidade e transitoriedade do pro-
ce de sucesso terapêutico prolonga- mente eficaz no controle dos casos blema é fundamental em todos os
do38. associados a contrações não inibi- casos. Os benefícios psicológicos
das do músculo detrusor40. O meca- para a criança que conseguir supe-
Oxibutinina nismo terapêutico no qual se funda- rar o problema da enurese são bem
O efeito benéfico desta droga menta esta ação é ainda desconhe- estabelecidos41. Por outro lado, têm
nas crianças que apresentam contra- cido. Estudos posteriores são neces- sido reconhecidos, recentemente,
ções não inibidas do destrusor, co- sários para que o método possa ser os riscos de abordagens terapêuti-
mo por exemplo, na síndrome de indicado com segurança. cas mal conduzidas. Cerca de 30%
dissinergia vesical e em alguns ca- Após esta breve exposição das das crianças seguidas por enurese
sos de bexiga neurogênica e neuro- várias abordagens terapêuticas exis- noturna, em um centro de referên-
gênica não-neurogênica, é bem esta- tentes para o controle da enurese cia, manifestaram potencial de apre-
belecido44' 62. O uso desta droga noturna, analisaremos a porcenta- sentar em sua evolução, alterações
nos casos de enurese noturna não gem de sucesso obtido em múlti- funcionais da micção, do tipo bexi-
complicada não tem dado bons re- plos estudos, com os vários méto- ga neurogênica não-neurogênica1.
sultados31. A dose recomendada é dos utilizados mais freqüentemen- Portanto, o aconselhamento ade-
de 5 mg, via oral, 2 vezes ao dia te27' 38> 4 4 > 5 7 ' 5 9 (Tabela 3). quado, a escolha correta da aborda-
(máximo 3 vezes ao dia). Os efeitos gem terapêutica e o acompanha-
colaterais são os mesmos das dro- Conclusão mento periódico dos afetados são
gas anticolinérgicas. de fundamental importância para
O manejo dos casos de enurese detecção precoce dos casos suscep-
Outros métodos noturna inicia-se definindo-os co- tíveis ao desenvolvimento de seqüe-
mo complicados e não complica- las.
L Psicoterapia
Como a maioria das crianças afe-
tadas não tem alterações psicopaló-
gicas graves de base, a indicação
não seria fundamental para a gran-
de maioria dos casos afetados.

2. Dietoterapia
A possível relação entre alérge-
nos presentes nos alimentos e enu-
rese, em um pequeno número de
afetados, já foi mencionada14. Nes-
tes casos, a exclusão seriada de ali-
mentos como derivados de leite,
chocolate, refrigerantes, sucos de
frutas, poderia ser tentada. Estes
dados, entretanto, não encontraram
respaldo em outros estudos.

3. Hipnoterapia
Alguns resultados positivo foram
conseguidos com esta técnica cujo
uso não é disseminado. Parece ser
Referências (The Hinman Syndrome) -15 years later. J. Urol. 136: 769, J. Dis. Child. 173: 962,1983.
1986. 52. POULTON, E.M. - Relative nocturnal polyuria as a fac-
26. JARVELIN, M.R. et al. - Enuresis in seven-year-old chil- tor in enuresis. Lancet 2: 906,1952.
1. ANDERS, D. et. al. - The clinical significance of wetting: dren. Acta Pediat. Scand, 77: 148, 1988. 53. POUSSAINT, A.F; KOEGLER, R.R. & RIEHL, J.L. - Enu-
children at risk of developing functional obstruction of 27. KLAUBER, G.T. - Clinical efficacy and safety of desmo- resis, epilepsy and the electroencephalogram. Amer. J.
the urinary tract. Abstracts of the VIII Congress of the In- pressin in the treatment of nacturnal enuresis. J. Pediat. Psychiat. 123: 1.294, 1967.
ternational Pediatric Nephrology Association. Toronto, 1989. 54. RAPOROTJ.L. etal. - Childhoodenuressisss. II. Pycho-
114: 719,1989.
2. ARNOLD, SJ. et al. - Enuresis. Incidence and pertinen- 28. KLIMBEY, I. - The development of voiding control. pathology, tricyclic concentration in plasma nad antienu-
ce of genitourinary disease in healthy enuretic children. AUA Update Series, 1988. retic effect. Arch. Gen. Psychiatry 37: 1.146,1980.
Urology 2: 437, 1973. 29. KOFF, S.A. - Evaluation nad management of viding 55. READETT, D.R.J.; MORRIS, JJ. & SERJEANT, G.R. -
3. BAKWIN, H. - The genetics of enuresis. In KOLVIN, I. diorders in children. Urol. Clin. N. Amer. 15: 769, 1988. Nocturnal enuresis in sickle cell haemoglobinopathies.
; MacKEITH, R.C. & MEADOW, S.R, eds. - Bladder Con- 30. KOFF, S.A - Enuresis. In WALSH, P.C.; GITES, R.F. & Arch Dis. Child. 65: 290,1990.
trol and Enuresis. London, W. Heinemann, 1973. p. 73. PERLMUTTER, A.D., eds. - Campbell's Urology. 5 th. ed. 56. RETTIG, S. et al.'- Abonormal diurnal rhythm of plas-
4. BIRKASOVA, M. et al. - Desmopressin in the manage- Philadelphia, Saunders, 1986. ma vasopressin and urinary output in patients with enure-
ment of nocturnal enuresis in children. A double blind 31. LOVERING, J.S; TALLET, S.E. & McKENDRY, J.B.J. - sis. Amer. J. Physiol. 256 (Renal Fluid Electrolyte Physiol.)
study. Pediatrics 62: 970, 1978. Oxybutynin efficacy in the treatment of primary enuresis. 25: F664,1989.
5. BLAIVAS, J.G. - The neurophysiology of micturition: a Pediatrics 82: 104, 1988. 57. RUSHTON, H.G. - Nocturnal enuresis. Epidemiology,
clinical study of 550 patients. J. Urol. 727: 958, 1982. 32. MAXWELL, C.&SELDRUP, J. - Imipramine in the treat- evaluation and currently available treatment options. J.
6. CHEVALIER, R.L. - Polydipsia and enuresis in childho- ment of childhood enuresis. Practitioner 207: 809, 1971. Pediat. 4: 691, 1989.
od renin dependent hypertension.]. Pediat. 104:591,1984. 33. McKENDRY, J.B. et al. - Enuresis. A study of untreated 58. RUTTER, M.; YULE W. & GRAHAM P. - Enuresisi and
7. COHEN, M.W. - Symposium on behavioural Pediatrics. patients. Appl. Ther. 10: 815, 1968. behavioural deviance. Some epidemiological considera-
Pediat. Clin. N. Amer. 22: 545,1975. 34. McLORIE, G.A. & HUSMANN, D.Á. - Incontinence and tions. /flKOLVIN, I.; MacKEITH, R.C & MEADOW, S.P.,
8. COLLISON, P.R. - Hypotherapy in the management of enuresis. Pediat. Clin. N. Amer. 34: 1.159, 1987. eds. - Bladder control and enuresis. Philadelphia, Lippin-
nocturnal enuresis, Med. J. Ast. /: 52, 1970. 35. MEADOW, S.R; WHITE, R.H.R. & JOHNSTON, N.M. cott, 1973- p. 47.
9. De JONGE, G.A. - Epidemiology of enuresis. A survey - Prevalence os symptomless tract disease in Birmingham 59. SCHIMITT, B.D. - Nocturnal enuresis. An update on
of the literature. In KOLVIN, I.; MacKEITH, R.C. & MEA- school children: pyuria and bacteriuria. Br. Med. J. 3:81,1969. treatment. Pediat. Clin. N. Amer. 29: 21, 1982.
DOW, S.R., eds. - Bladder Control and Enuresis. Philadel- 36. MEADOW, S.R. - Enuresis. In EDELMANT, C.H, ed. 60. SHAFFER, D. - The association between enuresis and
phia, Lippincott, 1973- p. 39. - Pediatric Kidney Disease. Boston, Little, Brown, 1978. emotional disorder: areview if the literature. In KOLVIN,
10. DIMSON, S.B. - DDAVP and urine osmolarity in refrac- p. 1.116. I.; MacKEITH, R.C & MEADOW, S.P, eds. - Bladder Con-
tory enuresis. Arch. Dis. Child. 61: 1.104, 1986. 37. MIKKELSON, EJ. et al. - Childhood enuresis. I. Sleep trol and Enuresis. Philadelphia, Saunders, 1973. p. 118.
11. DISCHE, S. - Childhood enuresis. Practitioner227:-323, patterns and psychopathology. Arch. Gen. Psychiatry 37: 61. TERHO, P & KEKOMAKI, M. - Management of noctur-
1978. 1.139, 1980. nal enuresis with a vasopressin analogue. J. Urol. 131:925,.
12 DOUGLAS, J.W.B - Early disturbing events and later 38. MILLER, K.; GOLDBERG, S. & ATKIN B. - Nocturnal 1984.
enuresis. In KOLVIN, I.; macKEITH, R.C. & MEADOW, enuresis experience with long term use of intranasally ad- 62. THOMPSON, I.M. & LAURENTZ, R. - Oxybutynin in
S.R., eds. - Bladder Control and Enuresis. Philadelphia, ministered vasopressin. J. Pediat. 114: 723, 1989. bladder spasm, neurogenic bladder and enuresis. Urology
Lippincott, 1973. p. 109. 39. MILLER, F.J.W. - Children who wet the bed. In KOL- 8: 452,1976.
13. ELBADAWI, A. & SCHENKE, E.A. - A new theory of VIN, I.; MacKEITH, R.C. & MEADOW, S.R., eds. - Bladder
the innervation of the bladder musculature. I. Morpho- Control and Enuresis, Philadelphia, Lippincott, 1973, p. 47.
logy of the intrinsic vesical innervation apparatus. J.'Urol. 40. MINNI, B. et al. - Bladder instability and enuresis trea-
99: 585:, 1968. ted by acunpuncture and eletro-therapeutics. Early urodi-
14. ESPERANÇA, M. & GERRARD, J.N. - Nocturnal enure- namic observations. Pediat. Nephrol. 4: C214,1989.
sis. Comparison of the effect of imipramine and dietary 41. MOFFATT, M.E.K.; KATO, C. & PLESS, I.E. - Improve-
restrictions on bladder capacity Can. Med. Assoc. J. 101: ments in self concept after treatment of nosturnal enure-
721, 1969. sis. Randomized controlled trial. J. Pediat. 110: 647, 1987.
15. FERBER, R. - Sleep associated enuresis in the child. 42. NINO-MURCIA & KEENAN, S.A. - Enuresis and sleep.
In KRYGER, M; ROTH, T. & DEMENT, W.C., eds. - The In GUILLEMINAULT, C., ed. - Sleep and its Disorders in
Principles and Practice of sleep Disosrdens in Medicine. Children. N. York, Raven Press, 1987. p. 253-
Philadelphia, Saunders, 1989. p. 643. 43. NORGAARD, J.P.; PEDERSEN, E.B. &DJURHUUS, J.C.
16. FERGUSSON, D.M. et al. - Factors related to the age - Diurnal antidiuretic hormone levels in enuretics. J. Urol.
attainement of nocturnal control. Pediatrics 78:884,1986.
#41.029,1985.
17. FERNANDES, E.T. - Instabilidade vesical na infancia. 44. NOVELLO, A.C. & NOVELLO, J.R. - Enuresis. Pediat
J. Brás. Urol. tá l, 1990. Clin. N. Amer. 34: 719, 1987.
18. FORSYTHE, W.I. & REDMOND, A. - Enuresis nad spon- 45. OPPEL, W.C.; HARBER, P.A. & RIDER, R.V. - The age
taneous cure rate. Arch. Dis. Child. 49: 259, 1974. of attaining bladder control. Pediatrics 42: 614,1086.
19. FRARY, L.G. - Enuresis. A genetic study. Amer. J. Disc. 46. O'REGAN, S. et al. - Constipation a commonly unrecog-
Child.V5>: 553, 1935. nized cause of enuresis. Amer. J.Dis.Child. 140: 260,1986.
20. FRASER, M.S. - Nocturnal enuresis. Practitioner 208 47. PEDERSEN, P.S.; HEJL, M & KJOLLER, S.S. - Desami-
203, 1987. no-D-arginine vasopressin in childhood nocturnal enure-
21. GARRET, R.A. - Enuresis. Lesson 34, vol. 2 AUA Upda- sis. J. Urol. 133: 65,1985. Aceito para publicação
te Series, 1983. 48. PERLMUTTER, D. - Enuresis. In KELALIS, P.P.; KING, em 22 de novembro de 1990.
22. GROSS, R.T & DORNBUSCH, S.M. - Enuresis. In LE- L.R. & BELMAN, A.B., eds. - Clinical Pediatric Urology.
VIN, Nf.D. et al., eds. -.Developmental Behaviour Pedia- 2nd. ed. Philadelphia, Saunders, 1985. Endereço para correspondência -
trics. Philadelphia, Saunders, 1983. p. 757. 49. PERRY, R. - Imipramine poisoning in childhood. Instituto da Criança -
23. HALLGREN, B. Enuresis. A clinical and genetic study. Amer.J. Dis. Child. 116: 181, 1968. Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 647 -
Acta Psych. Neurol. Scand. (Suppl) M l , 1957. 50. PIERRE, C.M. et al. - Enuresis and dreaming: experi- ão Paulo - SP -
24. HAWKINS, D.N - Enuresis: a survery. Med. J. Aust. 1: mental studies. Arch. Gen. Psychiatr 4: 116, 1961. 05403
979, 1962. 51. POST, E.M. et al. - Desmopressin response of enuretic
25. HIÑMAN,' F., Jr. - Nonneurogenic neurogenic bladder children: effect of age and frequency of enuresis. Amer.

Você também pode gostar