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A hermenêutica de Boas

Elementos para uma releitura da matriz disciplinar da Antropologia

Cristhian Teófilo da Silva


PPGAS/DAN/UnB
silvact@unb.br

Resumo

Este artigo visa continuar uma reflexão sobre a receptividade da Antropologia Social ao
paradigma hermenêutico. Fez-se necessário apontar os contornos dos chamados “paradigmas
da ordem” que compõem a matriz disciplinar da Antropologia, bem como sua natureza e
interrelação, para enfocar o paradigma “histórico-cultural” (ou boasiano) como um veículo de
comunicação da noção de “compreensão” para os demais paradigmas da disciplina, bem como
para permitir uma revisão do programa etnográfico de Franz Boas.

Palavras-chave

Paradigmas da Antropologia - Hermenêutica – Etnografia - Compreensão – Franz Boas

Abstract

The goal of this article is to consider the receptivity of Social Anthropology to the
hermeneutical paradigm. It has been made necessary to point the limits, nature and
interrelation of the so called “order paradigms” that constitute the disciplinary matrix of
Anthropology in order to emphasize the “historic-cultural” paradigm (or boasian) as a vehicle
of communication of the “comprehension” notion towards the other paradigms of the
discipline as well as to allow a revision of the ethnographic program of Franz Boas.

Key-words

Anthropological Paradigms – Hermeneutics – Ethnography - Comprehension – Franz Boas

O estudo dos paradigmas ... é o que prepara


principalmente o estudante para o pertencimento na
comunidade científica particular a qual ele
praticará futuramente.
T. S. Kuhn

Introdução
Meu objetivo aqui é o de continuar a refletir sobre a receptividade geral da

Antropologia Social a uma tendência ou movimento contemporâneo que questiona as

pretensões de objetividade e universalidade dos assim chamados “paradigmas da ordem”

(CARDOSO DE OLIVEIRA, 1988, p. 92), principalmente no que tange aos esforços destes

1
paradigmas em orientar a elaboração de teorias do social.1 Os efeitos deste movimento

implicaram na proposta de “enxertar” um outro paradigma, hermenêutico e desordeiro, que

convivesse e tencionasse os demais pontos de vista epistemológicos existentes na matriz

disciplinar da Antropologia. Optei por resgatar e explicitar os contornos dessa matriz - como

proposta por Cardoso de Oliveira (op. cit.) – de modo a entrever nesta os lugares que a

“compreensão” ocuparia, como noção central, para o desenvolvimento de novos problemas,

hipóteses e interpretações acerca dos fenômenos sociais.

Ressalto que não pretendi revisar todos os paradigmas existentes ou sequer identificar

outros que compõem o pensamento antropológico. Muito menos ambicionei um escrutínio da

permeabilidade de cada um dos paradigmas já identificados nesta disciplina ao “enxerto

hermenêutico”, o que seria inviável diante da extensão e esforço que este trabalho alcançaria

no desenvolvimento de tamanha proposta. Ao contrário, busquei uma abordagem econômica

ao tema proposto. A exemplo do que fez Cardoso de Oliveira (1988, p. 17) parti para a

localização de “autores/atores” que por seu desempenho tenham contribuído decisivamente

para a inserção daqueles paradigmas que melhor revelam a permeabilidade da Antropologia à

Hermenêutica. Nesta busca, reconheci, e espero que nos coloquemos de acordo com relação a

este ponto, que o paradigma culturalista ou “histórico-cultural” (na Antropologia Social) pode

ser antevisto como uma espécie de “vaso comunicante” da vertente hermenêutica na

Antropologia, na medida em que é permeável e permeado pela noção de “compreensão”.

1
Ressalto que não é meu objetivo traçar as origens ou tradições de uma suposta “Antropologia Intepretativa
Estadunidense”. Minha proposta busca uma sintonia com os objetivos apresentados por Cardoso de Oliveira em
artigo publicado em 1988, intitulado: “A categoria de (des)ordem e a pós-modernidade da Antropologia”, no
qual lê-se: “A despeito de uma eventual condição pós-modena prevalecente, tenho procurado entender o
surgimento dessa ‘antropologia interpretativa’ examinando a receptividade da consciência hermenêutica pela
disciplina”. (CARDOSO DE OLIVEIRA, 1988, p. 99) O artigo que ora se apresenta carece ainda de
considerações sobre em que medida a “sociologia compreensiva” proposta por Max Weber contribui para esta
receptividade no mesmo sentido que o “paradigma culturalista” em Antropologia. Me parece pertinente
reconhecer neste autor - mesmo que ele esteja posicionado paradigmaticamente na matriz de uma disciplina
distinta, a Sociologia - uma influência importante no processo de reconhecimento da “compreensão” como noção
central para a futura realização da assim chamada “Antropologia Interpretativa”. Isso quer dizer, ao menos
hipoteticamente, que as matrizes disciplinares não se constituem em isolamento. Para uma discussão pertinente
ao contexto da Sociologia, cf. artigo de Anthony Giddens, “Hermeneutics and Social Theory” (1984), no qual o
movimento hermenêutico se consolida entre aqueles sociólogos não partidários do “consenso ortodoxo”.
2
Dito de outro modo, o objetivo deste trabalho limita-se a revelar o lugar proeminente ocupado

pela idéia de compreensão (Verstehen) no interior do pensamento antropológico boasiano,

considerando que a origem desta proeminência reside acima de tudo na tradição germânica

trazida por Boas para os Estados Unidos.

Admito, porém, duas limitações à plena realização desta proposta. Em primeiro lugar

é evidente que uma análise completa e consistente da tradição que informa o paradigma

“culturalista” deveria ser buscada em diálogo com autores representativos dos demais

paradigmas da Antropologia, bem como da Sociologia (cf. nota 01 mais acima), pois, como

veremos, todos estão em constante intercomunicação, não se estranhando totalmente (pelo

menos não no plano das idéias). Em segundo lugar é preciso reconhecer que um olhar rápido

sobre as propostas e concepções metodológicas presentes nos trabalhos e artigos que cito mais

abaixo não são suficientes para revelar o movimento da idéia de compreensão na antropologia

ou na etnografia boasiana como um todo, pois percursos outros podem ter existido – além da

tradição germânica - na constituição deste paradigma enquanto um paradigma permeável à

idéia de compreensão. Me parece pertinente esclarecer, portanto, o que se entende por

paradigma e matriz disciplinar no caso de uma ciência como a Antropologia.

A matriz disciplinar da Antropologia

Creio que uma discussão sobre a matriz disciplinar da Antropologia é fundamental

para nos colocarmos de acordo quanto à fecundidade de uma correlação ente os paradigmas

mencionados (“histórico-cultural” e “hermenêutico”) no sentido de revelar alguns dos

caminhos da noção de “compreensão” na história de formação da Antropologia enquanto uma

disciplina científica.

Em uma série de trabalhos publicados em 1988, Cardoso de Oliveira (op. cit.) se

ocupa em cristalizar uma visão da natureza (ou SER) do pensamento antropológico através de

um modelo. Como em todos os modelos o problema sempre presente destes preponderarem

3
sobre os dados que deveriam informá-los deve ser encarado e contornado. Na verdade, é uma

relação de informação recíproca que deve existir entre dados e modelo. Quanto mais próximo

da realidade mais fecundos serão os modelos. No caso do pensamento antropológico sua

realidade está manifesta em noções, conceitos, perspectivas teóricas, metáforas e debates

inscritos em textos e obras dispersas temporal, institucional e idiomaticamente nos diversos

locais em que a disciplina foi gerada e consolidada. O trabalho de mapeamento dos

elementos que conformam e orientam esta modalidade do pensamento científico deve ser

fruto, portanto, de uma verdadeira etnografia e como tal refere-se sempre a um momento

específico de sua manifestação, a um estado de sua existência.

O modelo de açambarcamento do pensamento antropológico como proposto por

Cardoso de Oliveira (1988) não foi feito com a pretensão de abrangê-lo em todas as suas

dimensões, mas sim de acessar sua lógica interna. Este modelo é obtido através de uma

matriz multiparadigmática adequada diante da visão khuniana de ciência e de paradigma, logo

que, para Thomas Kuhn paradigma e matriz são fundidos em um único conceito na sua

percepção do que seja a estrutura do pensamento nas “ciências normais”.

Não estamos diante de nenhum confronto entre percepções do que seja o pensamento

científico (como parece ocorrer entre as visões de Thomas Kuhn e Karl Popper – cf.

MASTERMANN, 1981) e nem mesmo diante de um antagonismo de representações do que

seja o paradigma, mas sim, diante de um desdobramento da noção de paradigma proposta por

Kuhn em um modelo que dê conta da especificidade do pensamento antropológico. Nesse

caso, caberiam as perguntas: até onde a noção de paradigma desenvolvida para as “ciências

normais” pode vir a ser transferida (desdobrada) para as ciências sociais, como fez Cardoso de

Oliveira, principalmente quando esta noção é alvo de tantas interpretações nas ciências ditas

“rígidas” ou “duras? Nas palavras de Eckberg e Hill: “Por que então os sociólogos (e

antropólogos) parecem se sentir livres para dividir sua disciplina em várias e inconsistentes

4
perspectivas e chamar a estas divisões ‘paradigmas’?” (ECKBERG & HILL, 1980, p. 120 –

tradução livre CTS)

A noção de paradigma impõe alguns dilemas para quem tenta apreender a modalidade

ou natureza do pensamento das Ciências Sociais, bem como sua dinâmica. Poucas são as

disciplinas que podem dispor, como meta, da linguagem matemática para a proposição de

teoremas (como ocorre na Física, pensada aqui enquanto uma ciência rígida, com a equação

“força = massa x aceleração”). O propósito nomotético não é, portanto, imperativo, e nem

mesmo viável na mesma proporção, para todas as ciências, muito menos para as “flexíveis”.

De que modo, então, apreender as “revoluções científicas” nas ciências sociais?

Diante destas questões pode-se redargüir em que medida a tentativa de apreensão da

estrutura do pensamento científico das ciências sociais nos mesmos moldes propostos por

Khun para as “ciências normais” não implicaria uma distorção do que seriam as primeiras,

bem como uma má interpretação da própria visão khuniana de ciência. Entretanto, o que

temos com a elaboração de Cardoso de Oliveira de um modelo de interpretação do

pensamento antropológico, através da distinção entre “paradigma” e “matriz disciplinar”, é

justamente a promoção de uma visão própria das ciências sociais inspirado na noção khuniana

de paradigma e no modo como Khun desenvolveu tal noção, ao invés de um empréstimo

irrefletido dos argumentos deste autor para compreender um objeto que reconhecemos ser de

natureza distinta, nas palavras de Cardoso de Oliveira:

Para mim, uma matriz disciplinar é a articulação sistemática de um conjunto de paradigmas, a


condição de coexistirem no tempo, mantendo-se todos e cada um ativos e relativamente
eficientes. À diferença das ciências naturais, que os registraram em sucessão – num processo
contínuo de substituição -, na antropologia social os vemos em plena simultaneidade, sem que
o novo paradigma elimine o anterior pela via das “revoluções científicas” de que nos fala
Khun, mas aceite a convivência, muitas vezes num mesmo país, outras vezes numa mesma
instituição. (CARDOSO DE OLVIERA, 1988, p. 15)

Ao conceber a “matriz disciplinar da Antropologia Social” como uma articulação de

um conjunto de paradigmas e não uma sucessão linear dos mesmos no tempo, Cardoso de

5
Oliveira não descarta a definição metafórica do paradigma como “quebra-cabeças” (puzzles).

Dito de outro modo, os paradigmas continuam sendo nas “ciências normais” e nas “ciências

sociais” sistemas heurísticos, artifícios que permitem engendrar meios de construção de

problemas e de obtenção de resoluções no interior de uma comunidade integrada de

praticantes que passam a fixar cotidianamente todo um universo de proposições, valores e

idéias. Mais do que “paradigmas envolventes de uma disciplina como um todo”, o que

ocorrem nas ciências sociais são “paradigmas sub-disciplinares” ou “sistemas sociais

articulados por paradigmas” (cf. ECKBERG & HILL, 1980).

Cardoso de Oliveira parte, portanto, desta noção “comunitária” e “exemplar” de

paradigma para ampliá-la em seguida através de uma segunda analogia. Nesse caso, o autor

equipara os paradigmas a campos semânticos, alargando a noção de paradigma khuniana pela

característica intercomunicativa que lhe é então proporcionada. Quando fala desta

característica “intercomunicativa” ou numa “interrelação” entre os paradigmas Cardoso de

Oliveira pretende dizer que há um “ar de familiaridade” entre eles, i.e., que os paradigmas

dialogam, informam e se questionam mutuamente. Cada paradigma engendra métodos

próprios para resolução de problemas que são insensíveis para dimensões do real que não

entram nos quadros de sua preocupação. Tratam-se de “pontos cegos” que são

complementados ou reduzidos pelos demais paradigmas que possuem eles próprios seus

respectivos “pontos cegos”. O paradigma hermenêutico vem justamente preencher o espaço

criado pelos vários “pontos cegos” dos momentos metódicos dos demais paradigmas, fazendo

com que ele próprio se constitua como um momento “não-metódico” dos demais paradigmas.2

Há aqui uma relação complementar que engendra dois tipos de interpretação, como veremos

logo abaixo através do paradigma “culturalista”.

2
Esta interpretação parte de minhas anotações de aula no 2º semestre de 1999, quando o Prof. Roberto Cardoso
de Oliveira ministrou no Centro de Pós-Graduação e Pesquisa para América Latina e o Caribe – CEPPAC da
Universidade de Brasília, o curso intitulado “Epistemologia da Antropologia: A compreensão na construção da
teoria social”.
6
Parece-me apropriado observar, após estes esclarecimentos, a matriz disciplinar da

Antropologia propriamente dita, como proposta por Cardoso de Oliveira. Esta consiste de

duas tradições (empirista e racionalista) – identificadas na história de formação da disciplina e

representada por distintas “escolas” – que devem ser posicionadas lado a lado de modo a

serem posteriormente entrecruzadas por duas perspectivas fundadas em torno da “categoria”

tempo (uma perspectiva seria atemporal, “pois mesmo negando o tempo por ele se define” –

trata-se de uma perspectiva sincrônica -, e outra temporal ou histórica, quer dizer, diacrônica).

Esta disposição gera um diagrama que nos permite avaliar o lugar de pelo menos quatro

paradigmas no interior da matriz disciplinar. Temos, assim, o seguinte diagrama:

Tempo Tradição INTELECTUALISTA EMPIRISTA


SINCRONIA “Escola Francesa de “Escola Britânica de
Sociologia”, Paradigma Antropologia”, Paradigma
racionalista e, em sua forma Estrutural-Funcionalista
moderna, estruturalista
(1) (2)
DIACRONIA “Antropologia Interpretativa”, “Escola Histórico-Cultural”,
Paradigma hermenêutico Paradigma culturalista

(4) (3)
Retirado de “Tempo e tradição: Interpretando a Antropologia”, de Roberto Cardoso de
Oliveira. Sobre o Pensamento Antropológico. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1988, p.
16.

Como foi explicitado no início deste trabalho, mas que pode ser melhor visualizado

neste momento, pretendo elucidar o terceiro paradigma da matriz acima, reavaliando sua

constituição, i.e., vendo em que medida um paradigma “empirista” traz em si um elemento

racionalista, principalmente em função de sua preocupação simultânea com a história dos

fenômenos culturais e com a compreensão de suas particularidades. Tudo isso tem o objetivo

7
de elucidar o “paradigma histórico-cultural” como uma porta de acesso intercomunicativa do

paradigma hermenêutico para os demais. Esta “via de acesso” só é apreensível caso

atentemos para um aspecto particular da matriz acima. Trata-se do lugar central que os

paradigmas da matriz disciplinar dão aos conceitos de “estrutura” e “cultura”. Nesse sentido,

os paradigmas (1) e (2) poderiam ser identificados como os “paradigmas da estrutura”,

enquanto os paradigmas (3) e (4) compreenderiam os “paradigmas da cultura”. Parti da

ênfase especial que o paradigma boasiano proporciona ao conceito de “cultura” para

investigar sua permeabilidade ao “enxerto hermenêutico”.

A tradição hermenêutica e o pensamento científico de Franz Boas

A proposta metodológica de Franz Boas (1858-1942) para a Antropologia revelou-se,

após uma (re)leitura orientada pelos argumentos e objetivos acima, exemplar para a

observação do movimento de conceitos e posturas teóricas centrais para a disciplina.

Refiro-me, evidentemente ao antagonismo entre pontos de vista preocupados, por um lado,

com a manutenção de um viés interpretativo que antevê na unidade do espírito humano a

possibilidade de sua explicação por leis e generalizações, como é o caso da perspectiva

evolucionista britânica e por outro, como é o caso do próprio Boas, com a construção de um

novo quadro de referência para se pensar a diversidade cultural dos povos numa perspectiva

histórica, sem necessariamente abrir mão de um conhecimento sistemático e geral dos

fenômenos sociais. Acredito que o escrutínio das idéias de Boas sobre o empreendimento

antropológico, através de sua proposta ou programa etnográfico, aponta para o modo pelo

qual “autores/atores chave” transportam para o interior da disciplina elementos de origens

diversas que acabam configurando uma matriz disciplinar multiparadigmática e de

paradigmas polivalentes.

Esta crença se pauta em uma “descoberta”. A “descoberta” de uma origem ou de uma

relação pertinente entre o pensamento filosófico e científico alemão e a “Escola

8
Histórico-Cultural” estadunidense (cf. STOCKING JR., 1968 e BUNZL, 1996) representada

por Boas e seus alunos. Isto nos leva a re-conhecer a existência de uma dupla face da

antropologia boasiana, apontando ora para o geral, ora para o particular, ora para a explicação,

ora para a compreensão, ora para o estético, ora para o afetivo, sem nunca privilegiar

totalmente um aspecto em detrimento de outro.

Gostaria de delinear não tanto o aspecto externo do programa metodológico de Boas,

mas sim o pano de fundo desta proposta, ou melhor, seu avesso, sua trama ou costura interna,

visando: 1) identificar as fundações de uma Antropologia que em dado momento veio a

constituir-se numa “escola”, a “Histórico-Cultural” ou “Culturalista” e 2) sugerir possíveis

(re)interpretações deste paradigma como representado na matriz disciplinar proposta por

Cardoso de Oliveira há quinze anos. Tais objetivos serão agora desenvolvidos através da

consideração hipotética de que há apenas uma única tradição intelectual a informar o

pensamento boasiano e esta comporta uma convivência simultânea, uma síntese, de

epistemologias distintas que se debruçam sobre um mesmo objeto, mas com objetivos

distintos.

Para muitos autores as fundações tradicionais da proposta antropológica de Boas

encontram-se em seu texto: “The Study of Geography” (“O estudo da geografia”, original de

1887). Segundo Julia Liss (1996):

“The Study of Geography”, publicado em Science logo após Boas ter assumido suas
obrigações editoriais, quando ele era ainda otimista quanto a sua entrada na ciência
americana, foi a formulação máxima da visão científica que ele trouxera consigo da
Alemanha para os Estados Unidos. Tanto uma expressão de sua experiência enculturativa
(enculturative, no original) pessoal quanto de seu trabalho científico e reflexão
epistemológica anterior, tratava-se de uma justaposição mais do que uma síntese, legitimando
simultaneamente duas abordagens distintas da “verdade eterna”: de um lado, a busca pelo
universal, pelas leis científicas objetivas, válidas para todas as eras e todos os lugares; por
outro lado, um modo mais subjetivo de compreensão (understanding, no original), mais
próximo da arte do que das ciências físicas, o qual era expressado na apreciação das
particularidades do momento histórico e do lugar geográfico. (LISS, 1996, p. 182, tradução
livre e parêntesis CTS)

9
Liss não menciona que por trás da busca pela “verdade eterna” e da “apreciação das

particularidades” encontrava-se uma dualidade fundamental do pensamento

filosófico-científico alemão, qual seja a díade “explicação/compreensão”

(Erklären/Verstehen). Ela não situa, desse modo, o interesse pelo universal e pelas leis

científicas objetivas como um desejo originário no impulso de explicação. Por outro lado,

reconhece o desejo de compreensão no impulso de apreciação do “momento histórico e do

lugar geográfico”. Outro intérprete da obra de Boas, Matti Bunzl, parece ter sido mais

completo na análise do texto acima referido:

Em “The Study of Geography”, Boas contrasta duas metodologias científicas: a física e a


histórica. Para a primeira “o objetivo da ciência (era) deduzir leis dos fenômenos”, e o
“fenômeno singular por si mesmo” era insignificante, mas servia meramente como uma
“exemplificação de uma lei”, como um meio de “achar novas leis ou corroborar as antigas”.
Em contraste, o método histórico tinha como seu objetivo “a investigação dos fenômenos por
si mesmos”, e era “indesejável considerá-los como sujeitos a leis rigorosas”. Os dois métodos
tinham sua origem em “dois desejos diferentes da mente humana”. Emergindo de “seus
desejos estéticos”, o método físico buscava dispor a miríade de fenômenos do mundo
“sistematicamente”, de modo a “colocar as confusas impressões em ordem”. O método
histórico, em contraste, emergiu de um impulso “afetivo”, “a mera ocorrência de um evento”
disparava o desejo de estudar sua “verdadeira história”. (1887a: 640-644). (BUNZL, 1996, p.
17, tradução livre CTS)

É evidente que estamos diante da separação germânica entre Naturwissenschaften e

Geisteswissenschaften, ou entre as ciências ditas nomotéticas (preocupada com a proposição

de leis explicativas e sintéticas) e as ciências do espírito (preocupada com a interpretação dos

fenômenos sociais). Bunzl deixa bastante evidente em seu artigo o papel de Wilhelm

Humboldt e seu irmão Alexander Humboldt na construção do pensamento científico na

Alemanha, fazendo com que Erklären (explicação) se tornasse um aspecto central das

ciências da natureza e Verstehen (compreensão) se tornasse: “... o aspecto central das ciências

históricas.” (BUNZL, 1996, p. 27, tradução livre CTS)

Verstehen também era um conceito central para Wilhelm Dilthey. Em 1883 ele

publicou seu Einleitung in die Geisteswissenschaften (“Introdução às Ciências do Espírito”),

no qual se estabelece um quadro filosófico para as ciências humanas ou sociais independente

10
das ciências da natureza. A preocupação central de Dilthey residia na possibilidade da

“compreensão” servir como base para o conhecimento objetivo da condição humana, pois

somente por meio dela era possível ao intérprete “re-experenciar” (nachempfinden) a situação

histórica do autor (leia-se “outro”) através da empatia. Segundo Bunzl, Dilthey influenciou

Boas diretamente o que se evidencia pelas referências deste ao filósofo. (Cf. BUNZL, 1996,

p. 27)

Estes comentadores ou historiadores da antropologia boasiana tem estreitado o elo

entre Boas e a tradição intelectual germânica, porém uma leitura desatenta da nossa parte

veria aí a bifurcação entre modalidades incompatíveis de investigação científica, duas

tradições que culminariam em ciências distintas (“naturais” e “do espírito”). Uma

consideração das questões formuladas pelo próprio Boas, por outro lado, elucidariam uma

natureza híbrida do paradigma “histórico-cultural”. Na verdade estaríamos, no caso da

Antropologia como pensada por Boas, diante não de duas tradições, mas de apenas uma com

uma dupla face. A Antropologia seria a ciência tanto da “natureza” (humana, em todos os

seus aspectos e generalizações) e do “espírito” (humano, em todos os seus aspectos e

particularidades) Como questionou o autor em sua obra seminal: 1) “Seria o estudo dos

fenômenos por si mesmos iguais em valor à dedução de leis?”; e 2) “Seria o estudo de uma

série de fenômenos que possuem uma mera conexão subjetiva igual em valor às pesquisas

daqueles que formam uma unidade objetiva?”

Como se pode notar tratam-se de questões preocupadas com a ordem subjetiva de duas

inclinações do pensamento científico. Inclinações que Boas compreenderá pelos impulsos

“estético” e “afetivo” contido nas investigações científicas. Ambos os impulsos não se

excluem, mas antes constituem inclinações subjetivas dos pendores intelectuais do

pesquisador.

Uma resposta (para as questões anteriores) pode apenas ser subjetiva, sendo uma confissão do
respondente para qual é mais querida para ele – seu sentimento pessoal frente aos fenômenos
que o cercam, ou sua inclinação para abstrações; caso ele prefira reconhecer a individualidade
11
na totalidade, ou a totalidade na individualidade. (BOAS, 1996 [1887], p. 14, tradução livre e
parêntesis CTS)

Sob este ponto de vista a Antropologia somente implicaria em dois empreendimentos

distintos, um para se referir às teorias gerais e comparativas (em busca de uma satisfação

estética, diria Boas) e outro para descrever os resultados empíricos e descritivos da ciência do

homem (guiado por sentimentos afetivos diante da particularidade dos fenômenos culturais),

caso não se percebesse por trás de ambos uma dupla interpretação dos fenômenos sociais e

culturais.

Um parêntesis para melhor entender o pensamento boasiano

Em artigo intitulado: “A Dupla Interpretação na Antropologia” (1998), Cardoso de

Oliveira elabora uma resposta aqueles que visavam exorcizar, através de uma leitura

particular da hermenêutica, a possibilidade de explicação dos fenômenos sociais pela

Antropologia. Cardoso de Oliveira propõe uma alternativa ao antagonismo promovido pelos

mesmos entre “explicação e compreensão”. A meu ver esta alternativa guarda um “ar de

familiaridade” frente aos argumentos elaborados por Boas em termos de desejos “estéticos e

afetivos” da investigação científica. Introduzir neste momento os argumentos de Cardoso de

Oliveira para repensar o paradigma “histórico-cultural” representado por Boas me parece

promover uma elucidação do aspecto hermenêutico do pensamento boasiano:

... seguindo aqui, Paul Ricoeur, quando este autor examina a relação dialética entre
compreensão e explicação em vários de seus escritos, (...) se considerarmos que o conceito de
interpretação é mais extenso – logicamente falando – que os de explicação e compreensão,
uma vez que os recobre, totalizando-os em uma única categoria cognitiva, verificaremos que
tanto a explicação como a compreensão passam a ter as funções de adjetivar a interpretação.
(...) Teríamos assim a interpretação explicativa e a interpretação compreensiva. Essas duas
modalidades de interpretação guardam em si uma relação dialética, isto é, de mútua ou
recíproca contaminação. (CARDOSO DE OLIVEIRA, 1998, p. 96-97)

Diante desta distinção podemos observar a oposição proposta por Boas entre

“estético” e “afetivo” sob outro prisma e, fazendo o caminho de volta, constatar que a

oposição entre “explicação” e “compreensão” não passa da antiga controvérsia entre os

12
métodos físicos e os históricos, em que os adeptos de cada um deles clamam ora pelo

descobrimento de leis gerais em detrimento da investigação dos fenômenos em si e por si

mesmos ora pela investigação dos fenômenos particulares em detrimento das leis objetivas.

Trata-se de um antagonismo que Boas pretendeu superar. Em suas palavras:

Um grande número de modernos geógrafos (leia-se etnógrafos) tem sido educados como
historiadores, e eles devem tentar se por de acordo com os naturalistas (leia-se cientistas da
natureza) que, por sua vez, devem aprender a acomodar seus pontos de vista aqueles dos
historiadores. É evidente que uma resposta para essa questão fundamental sobre o valor da
ciência física e histórica só pode ser encontrada por uma investigação metódica de sua relação
uma frente a outra. (BOAS, 1996 [1887], p.11)

A compreensão no programa etnográfico culturalista

Uma investigação metódica da relação entre as inclinações estéticas e afetivas na

Antropologia pode ser iniciada através de uma abordagem do desenvolvimento do conceito de

cultura no interior do próprio pensamento boasiano. Gostaria de tentar demonstrar neste

momento de que modo a proposta metodológica de Boas para a disciplina encontra-se

localizada entre uma ambição estético-nomotética e um desejo afetivo-compreensivo, o que

será finalmente evidenciado através de sua idéia acerca do fazer etnográfico.

Stocking (1968) em trabalho intitulado: “Franz Boas and the Culture Concept in

Historical Perspective” (“Franz Boas e o conceito de cultura numa perspectiva histórica”) nos

proporciona uma argumentação convincente do papel de transição desempenhado por Boas

quando move a centralidade de noções biológicas como artifícios de explicação dos

fenômenos culturais, assim como para a definição dos objetivos da Antropologia,

substituindo-as pelo conceito de cultura. Stocking reconhece que a idéia de cultura atravessa

mudanças de significado em outras mentes além de Boas, e que seria esclarecedora uma

investigação do uso da palavra nesse período, especialmente na Alemanha. Entretanto,

Stocking pretende chamar atenção para a contribuição significativa de Boas para o

desenvolvimento da concepção moderna do conceito, principalmente no que tange à criação

13
das condições de possibilidade para seu estabelecimento como conceito heurístico na

Antropologia.

Stocking identifica na idéia boasiana de cultura uma ausência de elementos cruciais na

definição clássica de cultura cunhada por E. Tylor, são eles: historicidade, pluralidade,

integração, determinismo do comportamento e relatividade.3 Compartilho da tese deste autor

quando diz que Boas desempenhou um papel crucial na emergência e consolidação de uma

nova noção de cultura a partir destes elementos. Esta noção partiu de uma concepção ainda

encerrada dentro de uma visão humanista tradicional e evolucionista, presente em graus

baixos ou altos entre todos os povos, para uma percepção da cultura como um fenômeno

particular, próprio a cada um dos povos que a detém. Nesse movimento conceitual, Stocking

afirma:

A cultura pré-antropológica é singular em sua conotação, a antropológica é plural. Em toda


minha leitura de Tylor, eu não notei nenhuma instância na qual a palavra cultura tenha
aparecido no plural. Em pesquisas extensas nas ciências sociais norte-americanas entre 1890
e 1915, eu não encontrei nenhuma instância da forma plural em escritores outros senão em
Boas antes de 1895. Haviam referências a “estágios culturais” ou “formas de cultura”, como
de fato Tylor o fez antes, mas elas não falavam de “culturas”. O plural aparece com
regularidade apenas na primeira geração dos alunos de Boas por volta de 1910. (STOCKING,
1968, p. 203, tradução livre CTS)

Não é possível, e nem mesmo convém, reproduzir os argumentos de Stocking em toda

sua extensão. Aproveito seu estudo seminal apenas para promover a tese de que a mudança

de significado do conceito de cultura promovida por Boas propiciou uma reavaliação dos

objetivos últimos da Antropologia dando lugar à experiência de campo como instrumento de

3
Vale lembrar que no estudo da receptividade da Antropologia à hermenêutica Cardoso de Oliveira (1988) aponta
três elementos que haviam sido domesticados pelos paradigmas da ordem e que foram reformulados pelo
paradigma hermenêutico, são eles: “a subjetividade que, liberada da coerção da objetividade, toma sua forma
socializada, assumindo-se como inter-subjetividade; o indivíduo, igualmente liberado das tentações do
psicologismo, toma sua forma personalizada (portanto o indivíduo socializado) e não teme assumir sua
individualidade; e a história, desvencilhada das peias naturalistas que a tornavam totalmente exterior ao sujeito
cognoscente, pois dela se esperava fosse objetiva, toma sua forma interiorizada e se assume como historicidade.
(Cardoso de Oliveira, 1988: 97) Estes três elementos estão contidos no pensamento boasiano, o que nos permite,
amparado em Stocking, identificar em Boas o precursor da receptividade da Antropologia ao paradigma
hermenêutico, justamente por ser ele um primeiro “agitador” dos paradigmas da ordem. Apesar de não ter
desempenhado esse papel radicalmente frente aos demais paradigmas com os quais conviveu [(1) e (2) da matriz
disciplinar acima], Boas desempenhou um importante papel de agente “desordeiro” frente ao “paradigma
evolucionista”, não presente na matriz.
14
interrogação das premissas e proposições da disciplina como vinha sendo pensada até então

pelos evolucionistas. A sociogênese da diferença entre kultur e zivilisation na Alemanha (cf.

Elias, 1997) já havia se consolidado na tradição intelectual de Boas que então carregava a

idéia de kultur como bildung. O que é confirmado por Liss (op. cit.):

...os interesses (de Boas) eram de fato marcadamente ecléticos e amplamente envolventes,
incluindo história e literatura, música e arte, assim como as ciências naturais. Essa amplitude
de formação (cultivation, no original) era consistente com o ideal educacional do Gymnasium
germânico, e que era epitomizado na palavra Bildung, significando “cultivação”, “formação”,
ou “educação” num sentido espiritual. Refletindo uma concepção idealista do
desenvolvimento humano, Bildung se referia ao processo pelo qual o indivíduo se formava
organicamente através da imersão afetiva no material de aprendizagem. (LISS, 1996, p.160,
tradução livre e parêntesis CTS)

É justamente sobre a idéia de bildung que se constrói a proposta etnográfica de Boas,

fazendo com que o vejamos em primeiro lugar como um fieldworker (idem: 204).4 Vale a

pena aprofundar a importância do conceito de bildung para as ciência humanas,

principalmente através das considerações de Gadamer (1998), que cito aqui visando ampliar a

importância de Boas para a Antropologia e para a consolidação da etnografia como sua

prática central, essencialmente preocupada com a “compreensão” da cultura:

Assim, mesmo um olhar preliminar sobre a história lingüística de Bildung nos introduziria na
cadeia de idéias históricas que Hegel primeiro introduziu no interior da esfera da “primeira
filosofia”. De fato, Hegel trabalho bem o que é Bildung. Nós o seguimos, inicialmente. Ele
também viu que filosofia (e, nós podemos adicionar, as ciências humanas,
Geisteswissenschaften) “tem, no Bildung, sua condição de existência”. Porque o ser do Geist
(espírito) possui uma conexão essencial com a idéia de Bildung. (GADAMER, 1998,
p.12-13, tradução livre CTS)

E mais adiante, Gadamer nos proporcionaria mais argumentos analíticos, que

poderíamos relacionar diretamente à experiência etnográfica como proposta por Boas:

4
Para um debate sobre o lugar da “compreensão” (Verstehen ou Understanding) na observação participante,
como procedimento principal da etnografia, cf. o texto de Michael Martin (1974) intitulado: “Understanding and
Participant Observation in Cultural and Social Anthropology” (“Compreensão e observação participante na
Antropologia Social e Cultural”). Organizado por Marcello Truzzi na obra: “Verstehen: Subjective
Understanding in the Social Science”. Massachusetts: Addison-Wesley. Neste trabalho de Martin há uma
sistematização dos tipos de envolvimento (empatia) que pode encetar o antropólogo durante o trabalho de campo
que visa em última instância a “compreensão de uma comunidade”. Martin deixa escapar, entretanto, a idéia de
empatia informada pelo conceito de bildung, reduzindo-a a idéia de “pôr-se no lugar no outro” (adoption sense)
ou “manejar os códigos de conduta do outro” (assimilation sense).
15
Procurar a si próprio no outro, tornar-se em casa nele, é o movimento básico do espírito, o
qual ser é apenas retornar do que é outro para si mesmo. Daí todas as teorias de Bildung,
mesmo a aquisição de línguas estrangeiras e mundos conceituais, é meramente a continuação
do processo de Bildung o qual começa muito antes. (GADAMER, 1998, p.15, tradução livre
CTS)

Precisamos analisar a proposta etnográfica de Boas mais atentamente. Sua

preocupação em elaborar um método de investigação objetivo que se contrapusesse ao

método comparativo fundamentado em conjecturas é em larga medida resultado de uma

postura científica indutiva desenvolvida enquanto estudioso das “ciências naturais” em

consonância a um contato íntimo com populações nativas no noroeste do Canadá (os

Kwakiutl e Inuit, principalmente), com quem trabalhou por toda a vida, desde 1885 até sua

última viagem em 1930. Tratava-se de uma busca por empatia num sentido muito próximo ao

elaborado por Dilthey. Nas palavras de Boas: “Nossa consideração nos leva à conclusão que

a geografia (leia-se etnografia) é parte da cosmografia, e tem sua fonte no impulso afetivo, no

desejo de entender os fenômenos e história de um país ou de toda a Terra, lar da humanidade.”

(1996 [1887]: 16, tradução livre CTS)

Em um texto de R. Lowie (aluno de Boas), provavelmente escrito em 1953, podemos

identificar como a proposta metodológica de Boas veio a se enraizar na Antropologia

estadunidense.5 Seja como uma observação e registro sistemático, como uma descrição

representativa do outro, ou ainda, como um exercício comparativo entre sociedades distintas,

obtido em colaboração com outras ciências, a etnografia aparece aqui como sendo uma

atividade pretensamente universal para abordar os fenômenos culturais através da dialética

entre parte e todo:

A etnografia deve se tornar um estudo não só de todas as culturas primitivas, mas


de todas as culturas passadas e presentes, deve integrar descobertas entre
“selvagens” com aquelas pré-históricas e pesquisas culturais entre todas as
civilizações. (...) como uma ciência ela deve atingir objetividade, a mesma
qualidade que distingue o historiador “historical-minded” das crônicas partidárias.
(LOWIE, 1953, p. 489, tradução livre CTS)

5
Me refiro aqui ao texto: “The Development of Ethnography as a Science” (“O desenvolvimento da Etnografia
como uma ciência”), presente na coletânea organizada por Cora Dubois.
16
Nota-se aqui os elementos identificados anteriormente como próprios da tradição

intelectual alemã, refiro-me ao uso do termo cultura no plural e equiparada à civilização, bem

como à preocupação com a objetividade na história. O etnógrafo deve aceitar todas as

culturas para a formulação de generalizações enquanto etnólogo, e estas generalizações não

precisam ser sempre universais para serem úteis à etnografia (idem, p. 493). Nesse sentido,

várias técnicas que evitem interpretações valorativas (etnocêntricas) por parte do etnógrafo

são sugeridas por Lowie (fazendo eco ao pensamento de Boas), sem que isso minimize a

importância do estudo dos valores em cada sociedade. Análises de documentos históricos

(quando houver), abordagens estatísticas (sugeridas por antropólogos anteriores como Tylor e

Frazer), dados estatigráficos, e principalmente, o aprendizado e registro da língua indígena e

sua estrutura (segundo proposta de Wilhelm Humboldt, cf. BUNZL, 1996), são exemplos das

iniciativas desta escola em fazer da “observação etnográfica” uma análise e registro da

“integração processual ou histórica” dos fenômenos observados em culturas particulares.

O programa etnográfico boasiano ou culturalista pode ser, portanto, assim resumido:

1) A etnografia como um empreendimento que cubra todos os aspectos de uma cultura, do

homem com a natureza, dos homens entre si e do homem consigo mesmo (sua natureza

psíquica). “É necessário compreender a vida e a cultura como um todo.” (BOAS, 1938b,

p. 04-05, cf. CODERE, 1966, p. xiii, tradução livre CTS) Nas palavras de Lowie (1953):

“... o etnógrafo lida com a totalidade da atividade humana socialmente determinada (...).6

O cientista individual não controla o segmento da realidade que ele escolheu como objeto

de estudo, seu negócio é investigá-lo em todas as suas manifestações.” (idem, p. 485,

tradução livre CTS) A partir de uma concepção dinâmica de cultura, nenhum aspecto da

vida de uma sociedade deveria ser privilegiado em detrimento de outros, onde, os

6
O trabalho de campo surge aqui como condição sem a qual as singularidades culturais entre as sociedades não
poderiam ser desvendadas. Era preciso um olhar aproximado, a closer investigation, ao invés de um hasty
glance. (cf. CODERE, 1966)
17
resultados de uma etnografia não se referem a uma enumeração pura e simples dos vários

aspectos da vida social, mas antes, a interconexão dos fenômenos culturais historicamente

associados e que são determinantes da particularidade de uma cultura; isto nos leva ao

segundo ponto.

2) Os resultados de uma etnografia nunca estarão apropriadamente compostos sem um

conhecimento etnográfico total das culturas relacionadas, logo que o estudo detalhado dos

costumes e instituições em relação à cultura de uma sociedade que a pratica deve se dar

em concomitância à investigação de sua distribuição geográfica entre sociedades vizinhas,

o que vem a promover uma compreensão das causas históricas que levaram à

implementação de tais costumes e instituições, bem como aos processos psicológicos que

lhe subjazem. (BOAS, 1946, p. 276, cf. CODERE, 1966, p. xiii)

3) A objetividade de uma etnografia deve estar pautada em um conhecimento sistemático da

língua falada pelos nativos da sociedade-objeto. Nesse sentido, Boas ocupa-se em

assegurar que registros textuais do conhecimento e discursos nativos estejam o mais livre

possível de preconceitos interpretativos e premissas etnocêntricas tanto do etnógrafo

quanto de possíveis tradutores. A justificativa principal para o domínio da língua indígena

reside em objetivos que estão além de questões propriamente lingüísticas, na verdade: “...

o serviço que a língua nos presta é primeiramente de ordem prática – um meio de melhor

compreendermos os fenômenos etnológicos que em si mesmos não tem nada a ver com

problemas lingüísticos.” (BOAS, s/d, p. 52, tradução livre e sublinhado CTS) Em outras

palavras, fenômenos lingüísticos não se expressam na consciência dos indígenas, mas a

consciência destes (o “gênio do povo”) se expressa em sua língua. Esta perspectiva

encontra-se em consonância direta com a tradição intelectual exemplificada por W.

Humboldt:

Alheia à investigação empírica de línguas individuais, a principal preocupação de Humboldt


era com processos psicológicos a elas associados: a relação entre língua e Nationalcharakter e
entre língua e pensamento. (BUNZL, 1996, p. 32, tradução livre CTS)
18
Para Boas, o conhecimento do idioma da sociedade estudada, não só amplia o leque de

investigação etnográfico, mas, principalmente, sofistica a compreensão antropológica de uma

cultura estranha. Em suas palavras: “Se é o nosso propósito sério de compreender os

pensamentos de um povo, toda a análise da experiência deve se basear em seus conceitos e

não nos nossos.” (BOAS, 1943a, p. 314, cf. CODERE, 1966, p. xviii, tradução livre e

sublinhado CTS)

O estilo etnográfico resultante de tais condições rigorosas para obtenção de dados,

associado às metas ambiciosas e nomotéticas propostas poderia vir a ser encarado como uma

acumulação exaustiva de fatos sobre fatos, traços culturais sobre traços culturais, onde o

etnógrafo seria pensado como tendo nenhuma ou quase nenhuma participação na seleção ou

no ordenamento do que estaria sendo observado, pois se tudo deve ser considerado em todas

culturas, o antropólogo deveria ser antes de tudo um “aspirador de culturas” do que um

tradutor ou intérprete de costumes e instituições. Entretanto, a “descoberta” da tradição

intelectual alemã no pensamento científico e no programa etnográfico de Franz Boas parece

sugerir justamente o oposto. No interior dos três pontos levantados acima, nota-se um

movimento hermenêutico constante de relacionar a parte e o todo, i.e., de relacionar os

costumes e instituições à cultura total da sociedade, e esta à área geográfica em que está

inserida. A linguagem desempenha aqui o instrumento de captação do sentido vivido pelos

indígenas em seus próprios termos. Eis como se pretendia conjugar a

interpretação-explicativa com a compreensão de culturas individuais.

Este mesmo esforço pode ser notado ainda em outro texto. Em “The limitations of the

Comparative Method of Anthropology” (“As limitações do método comparativo da

Antropologia”), datado de 1896, Boas critica a pretensão falaciosa de se tentar compreender

as motivações primárias das invenções, costumes, crenças, línguas e demais instituições e

artefatos produzidos pelo homem a partir de um único elemento concebido como universal,

19
i.e., a unidade psíquica da mente humana. Boas argumenta, ao seu modo, que os mesmos

fenômenos podem ter se originado em áreas distintas por diversas causas (argumento que se

tornará central em todo seu pensamento), logo que a mente humana é formada de tal modo

que tanto pode inventar espontaneamente quanto aceitar o que quer que se lhe ofereça.

(BOAS, 1973) Seus exemplos etnográficos sobre como tribos primitivas estão universalmente

divididas em clãs aos quais são atribuídos totens ou sobre como formas geométricas na arte

primitiva se desenvolveram, apontam para conclusões de que aspectos idênticos em diferentes

culturas têm sido alcançados por diferentes trajetos históricos de desenvolvimento, bem como

por um número infinito de pontos de partida. (BOAS, 1973, p. 87)

Nesse sentido, o papel da etnografia seria o de procurar fazer com que as causas para

determinados fenômenos culturais sejam historicamente reconstruídas em áreas geográficas

definidas, e que as comparações se restrinjam aos fenômenos que comprovadamente tenham

sido efeito das mesmas causas. O método histórico subjacente a esta visão da etnografia

consiste em revelar as condições do ambiente que criaram ou modificaram os elementos

culturais, esclarecer os fatores psicológicos que contribuíram na formação da cultura e

conduzir a investigação para os efeitos que as conexões históricas tiveram sobre o

desenvolvimento da cultura. O autor não abandona, portanto, a agenda universalista e

nomotética (ou melhor estética) da Antropologia, continuando a conceber o descobrimento de

leis que governam a mudança dos estágios culturais (ou da civilização) como o propósito

último da disciplina, entretanto, o caminho pelo qual isto deve ser perseguido é adiado pela

promoção de uma história das culturas. Nas palavras de Bunzl (op. cit.):

... se o impulso afetivo e estético estavam ambos presentes através da carreira de Boas, a
busca por leis gerais encontrava-se sempre constrangida pelo desejo do cosmógrafo de
descrever e entender fenômenos individuais. Ao mesmo tempo em que ele nunca abandonou
completamente a busca por leis do comportamento humano, ele gradualmente se tornou
menos confiante em algum dia conseguir encontrá-las, e o corpo de seu trabalho implicou
amplamente em descrições detalhadas de particularidades ao invés de tentativas de
generalização. (cf. Stocking, 1968: 154-155; Kluckhohn & Prufer, 1959: 24-25). (BUNZL,
1996, p.18, tradução livre CTS)

20
Uma ênfase nas singularidades pertinentes à cada cultura acaba se constituindo na

marca da proposta boasiana mais do a que ênfase que ele também visava encontrar do que

lhes seria supostamente semelhante. Isto porque as diferenças promovem descontinuidades

em áreas geográficas circunscritas e indicam a multiplicidade de fatores que podem levar à

diferenciação cultural (diferença que era pensada pelos evolucionistas como “atraso”,

“anterioridade” ou “estágio” de uma única “cultura humana” e que para Boas é alvo do desejo

“afetivo” de investigação). As limitações do método comparativo (evolucionista) residiam

justamente na incapacidade do pensamento antropológico, até então, de compreender que

desenvolvimentos históricos semelhantes podem, pelas particularidades inventivas de cada

povo em relação ao ambiente e aos povos vizinhos, implicar em diferenciações dos

fenômenos culturais. Esta insensibilidade se justifica pela ausência mesma de significação do

termo cultura como Volkgeist, que Boas compartilhava:

A celebração de Herder da individualidade cultural como um reflexo da plenitude de Deus foi


combinada, entretanto, com um olhar genuinamente cosmopolita no Humanitätsideal, o qual
reafirmava o elo comum da humanidade, mas que o via expresso em sua diversidade ao invés
de vê-lo na similaridade das formas humanas. Em oposição ao Iluminismo francês, que
baseava seu universalismo na semelhança essencial dos seres humanos enquanto atores
racionais, Herder apontou a contribuição individual de cada entidade cultural para a
humanidade como um todo. E desde que a humanidade era uma totalidade de seus elementos
multitudinais, cada Volk deve ser estudado em sua individualidade (1774: 43). (BUNZL,
1996, p. 20, tradução livre CTS)

É conhecida a influência do pensamento alemão nas idéias antropológicas tanto na

França (Escola Sociológica Francesa) quanto na Inglaterra (Tylor, Frazer, Spencer etc.),

entretanto, é curioso notar que este sentido de “cultura” não tenha se disseminado, talvez isto

tenha ocorrido em virtude da maneira diferenciada como “ao longo da história, os alemães

vêm interpretando o comportamento dos franceses e ingleses, e como franceses e ingleses

vêem o comportamento alemão.” (ELIAS, 1997, p. 14) Tudo isso sugere hipoteticamente por

que Boas só viria a consolidar um sentido de cultura pluralista, relativista, histórico e

determinista, além de ressaltar uma preocupação com a individualidade (Geist) das culturas,

21
nos Estados Unidos, i.e., longe das disputas no campo científico de franceses, ingleses e

alemães quanto à representação de sua civilização. Por outro lado, sugere uma interessante

hipótese para pensarmos porque a “compreensão” não floresceu em paradigmas voltados para

a “estrutura”.

Em um outro texto, elaborado anos mais tarde (“The method of Ethnology” – “O

método da Etnologia”, 1920), Boas retoma suas questões de método e esclarece o que tem

sido a questão condutora do seu pensamento:

Em primeiro lugar, todo o problema da história cultural aparece para nós como um problema
histórico. Para se entender a história é necessário conhecer não apenas como as coisas são,
mas como elas vieram a ser o que são. (...) É verdadeiro, claro, que nós nunca esperamos
obter dados incontrovertidos relativos à sequência cronológica dos eventos, mas certas
direções amplas podem ser acertadas com um alto grau de probabilidade, mesmo de certeza.
Tão logo quanto esses métodos são aplicados, as sociedades primitivas perdem sua
aparência de absoluta estabilidade como são concebidas pelo estudante que as conhece apenas
num dado período de tempo. Todas as formas culturais aparecem, ao invés disso, num
constante estado de fluxo e sujeita à modificações fundamentais. (BOAS, 1973, p. 95,
tradução livre CTS)

O problema da mudança cultural, i.e., das dinâmicas transformadoras das sociedades

se impôs desde as primeiras experiências etnográficas de Boas como uma questão premente

para a Antropologia, o que em parte foi responsável pela atribuição à Escola

Histórico-Cultural do desenvolvimento de uma “etnografia de resgate” (salvage

anthropology) das sociedades em vias de desaparecimento. Entretanto, mais do que uma

prática preocupada com a preservação de registros completos destas culturas em nome da

ciência, a proposta ulterior de Boas de se analisar os processos dinâmicos de mudança cultural

parece ter sido recebida como um projeto intelectual no mínimo ambicioso para a

Antropologia da época. Em suas palavras:

Brevemente, portanto, o método que nós tentamos desenvolver é baseado no estudo das
mudanças dinâmicas de uma sociedade que podem ser observadas no momento presente. Nós
retraímos a tentativa de resolver problemas fundamentais acerca do desenvolvimento geral da
civilização até que tenhamos nos tornado aptos a desemaranhar os processos que estão se
passando sob nossos olhos. (BOAS, 1973, p. 96, tradução livre CTS)

22
Esta perspectiva encontra-se profundamente enraizada na tradição humboldtiana da

Antropologia germânica como nos foi apresentada por Bunzl (op. cit.). Este autor,

comentando a obra de Bastian, atribui a própria “antropologia salvacionista” à tradição

intelectual alemã, porém, o que nos parece mais pertinente, refere-se a uma visão dinâmica de

cultura aí colocada. Esta encontra-se num fluxo e transformação constante que deve ser

compreendido no momento presente sob a luz da história, ou melhor, sob a luz da

historicidade da cultura. Segundo Bunzl: “Alinhado com seus esforços como um “salvage

anthropologist”, o quadro teórico de Bastian foi concebido no espírito do Humanistätsideal,

unindo um sentido do universal a uma apreciação dos aspectos particulares da humanidade.”

(BUNZL, 1996, p. 48-49, tradução livre CTS) Entretanto, é preciso reconhecer com Cardoso

de Oliveira que:

A história, agora, menos do que se propor a estabelecer grandes seqüências de eventos


culturais, passa a se propor a estudar “a dinâmica das mudanças que podem ser observadas
pelo pesquisador” e não meramente inferidas pela via da reconstrução especulativa. Mas vale
notar aqui que mesmo essa história, voltada para entender processos de mudança, é
apreendida em sua exterioridade; a saber, procura-se nela a objetividade dos fatos
socioculturais. É o tempo do objeto cognoscível – que passa, se transfigura, muitas vezes
desaparece – enquanto o sujeito cognoscente permanece estático, mudo, intocável por uma
realidade que se movimenta ao seu redor. O que significa que a temporalidade do outro nada
tem a ver com a do antropólogo observador, neutro, ou, melhor diria, neutralizado por uma
simples questão de método. (CARDOSO DE OLIVEIRA, 1988, p. 20)

A premissa central da proposta etnográfica de Boas reside, portanto, sobre o fato de

que formas culturais são resultantes de processos históricos e que a difusão de traços e

instituições é um componente da realidade empiricamente observável. Esta premissa, quero

ressaltar, estabelece uma perspectiva dinâmica da cultura e da sociedade, que se sustenta

somente sobre a produção de dados etnográficos numa perspectiva histórica permitindo um

movimento dialético entre passado e presente via etnógrafo (cf. BOAS, 1966).

Este movimento nos faz reportar a Gadamer para quem a tradição se constitui no

excedente de sentido presente no texto (ou obra de arte) envolvendo as próprias intenções do

autor. É a tradição que permite uma abertura do texto. No uso da história promovido por

23
Boas, percebe-se o propósito de se alcançar a subjetividade da cultura pela tradição através de

uma Völkpsychologie que reconhece os limites da compreensão do “espírito de um povo” no

grau de compreensão da língua falada por este mesmo povo.

Entretanto, a leitura que faço neste momento destes aspectos hermenêuticos da

antropologia boasiana implica na elaboração de algumas ressalvas para que não se pense que

o paradigma histórico-cultural é hermenêutico por natureza. É justamente a vinculação de

Boas à uma tradição intelectual alemã de “dupla face” (isto é, estética e afetiva, explicativa e

compreensiva) que permite ser o mesmo o precursor da receptividade da Antropologia Social

à hermenêutica sem ser ele próprio um paradigma formalmente hermenêutico.

Os escritos de Boas deixam uma imagem clara sobre quais seriam os objetivos do

trabalho etnológico e etnográfico. A idéia de que a etnografia deveria ser o registro escrito de

um modo de vida alheio aquele do etnógrafo, não sendo omitido nenhum aspecto, por mais

corriqueiro ou insignificante, além de ser fundamentado no conhecimento da língua do povo

estudado, aponta para a pretensão de Boas em alcançar de forma compreensiva a efetivação

recíproca da vida mental e social dos indígenas. Trata-se de uma compreensão da

subjetividade, do irrefletido da cultura do outro, que somente poderia ser alcançada por

métodos comparativos (estéticos) assim como pelo excedente de sentido que escapa aos

métodos objetivos de observação, registro e descrição dos fenômenos sociais. Trata-se uma

compreensão via empatia e bildung, alcançado na e pela experiência de campo. Tudo isso

quer dizer que caso não possamos considerar a antropologia de Boas uma “Antropologia

Hermenêutica”, certamente poderemos considerar uma influência da hermenêutica na

Antropologia proposta e praticada por Boas.

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