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Associação Brasileira de Veterinários de Animais Selvagens - ABRAVAS

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BOLETIM
TÉCNICO
ABRAVAS
Publicação digital da Associação Brasileira de Veterinários de Animais Selvagens - Ano IV - Mai/2020 - nº 46

Foto da capa:

Todos os direitos são reservados a Associação Brasileira de


Veterinários de Animais Selvagens – ABRAVAS. É proibida
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(eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição pela
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Associação.

Profissional convidado:
M.V. André Grespan, MSc

Médico veterinário proprietário e responsável técnico


da Clínica Veterinária Wildvet (desde 2003).

Mestrado em epidemiologia Aplicada à Zoonoses -


USP (2009).

E-mail: grespan@gmail.com

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CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DA ENROFLOXACINA DE LONGA AÇÃO
E DA CEFOVECINA SÓDICA EM ANIMAIS SILVESTRES E EXÓTICOS

RESUMO

A utilização de antibióticos de longa ação (LA) em animais silvestres e exóticos minimiza


o estresse causado por uma terapia prolongada, oferece menos risco ao animal e a equipe,
aumenta a eficácia e reduz a incidência de resistência. Porém, devido as diferenças
fisiológicas e metabólicas da espécie animal em conjunto com a farmacodinâmica e
farmacocinética das drogas, o uso de antimicrobianos LA nem sempre é possível e
funcional. Cabe ao médico veterinário que trabalha com animais silvestres e exóticos ser
responsável e balizar sua conduta com informações que fundamentem a decisão de uso,
considerando o microrganismo envolvido, o local de infecção e os efeitos esperados da
ação da droga em cada indivíduo. O médico veterinário deve considerar seu papel de
importância na saúde pública na prevenção da propagação da resistência bacteriana.

Palavras-chave: antibioticoterapia; animais silvestres; exóticos; antibiótico longa ação.

Introdução
Médicos veterinários que trabalham com animais silvestres e exóticos vivem um
constante desafio em busca de métodos terapêuticos mais eficazes que combinem
facilidade de aplicação ao mínimo estresse, pois lidam com espécies que, em cada evento
de tratamento podem estar sendo submetidos a riscos que poderiam comprometer a saúde
dos animais ou mesmo da equipe. O desejo de qualquer profissional que atue nesta área
seria o uso de medicamentos que combinem um longo tempo de ação com uma única e
fácil administração. Invariavelmente, o uso de uma droga que necessite de várias
aplicações ao dia para manter sua eficácia terapêutica inviabiliza sua utilização para estes
animais1.
Porém, essa busca não é exclusiva do médico veterinário de animais silvestres e
exóticos, mas sim de todos os profissionais envolvidos em saúde humana e animal. A
vantagem destes outros profissionais é que há grande investimento em pesquisa e
desenvolvimento de medicamentos que atendam essas expectativas, resultando no
surgimento de novas drogas, cada vez mais eficazes e seguras. Resta ao médico
veterinário que trabalha com animais silvestres e exóticos o trabalho árduo e, muitas vezes
empírico, de tentar adaptar e levar tais descobertas ao seu paciente.
A primeira barreira vem do ponto de vista legal e ético, no qual o profissional deve
estar ciente ao utilizar “extra bula” produtos desenvolvidos para animais domésticos ou
para medicina humana; há necessidade de adotar condutas baseadas em trabalhos técnicos
e científicos que forneçam subsídios para tal utilização, evitando assim os “achismos” ou
simples extrapolação linear entre espécies tão diferentes. O profissional deve ter em conta
o máximo de informações sobre composição, farmacocinética, farmacodinâmica,
toxicidade, fisiologia e metabolismo da droga e do indivíduo antes de prescrever um
medicamento; isso envolve dedicação pessoal na busca destas informações que vão dar
suporte, inclusive jurídico, à decisão de uso de determinado medicamento2.
Dentro desta perspectiva, o uso de antibióticos em animais silvestres e exóticos se
enquadra perfeitamente no problema acima descrito, pois praticamente todas as drogas
atualmente utilizadas foram desenvolvidas para animais domésticos ou para uso humano.
O surgimento de antibióticos de longa ação cria uma tentação quase irresistível para o uso
em espécies difíceis de serem medicadas regularmente.

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A prática em clínica veterinária de animais silvestres e exóticos visa tratar uma
gigantesca gama de espécies, e o conhecimento da farmacocinética e farmacodinâmica,
bem como a real eficácia destas drogas nestes animais tornam-se praticamente
impossível.
Em se tratando do uso de antimicrobianos, não se pode dar ao luxo de falhas
terapêuticas, uma vez que a resistência antimicrobiana é um desafio global em saúde
pública e veterinária, que toma proporções crescentes pelo uso excessivo de antibióticos
em todo o mundo; esse aumento de resistência determina surgimento de microrganismos
resistentes causando infecções graves, efeitos adversos e falhas terapêuticas, favorecendo
o aumento da mortalidade2.

PONTOS CHAVES NA ANTIBIOTICOTERAPIA


O tratamento bem-sucedido com antibiótico, com total recuperação do paciente e a
prevenção do aumento da resistência antimicrobiana, é baseado em 4 princípios:
1) Identificar o agente causador da doença e selecionar o medicamento apropriado
para o tratamento;
2) Atingir concentrações eficazes do medicamento no local da infecção por um
período suficiente;
3) Escolher uma taxa de dose, frequência e método de administração da dose que
maximize a probabilidade de cura, evite a recaída e minimize o risco de
desenvolver resistência sem causar danos ao animal;
4) Poporcionar tratamento de suporte específico e apropriado para melhorar a
capacidade do animal de superar a infecção e as condições associadas à doença.
Quadro 1 – Indicações para otimizar o tratamento com antimicrobianos. Fonte: Boothe, 2011.3

Características farmacológicas dos antibióticos


Farmacocinética é o estudo da absorção, distribuição, metabolismo e eliminação
de um dado fármaco no organismo do indivíduo. A farmacodinâmica, por sua vez, estuda
o mecanismo de ação dos fármacos e a sua relação com os efeitos esperados e adversos
da substância. São termos complementares e indissociáveis, estudados e abordados quase
sempre em conjunto4.

Ligação às proteínas plasmáticas


A ligação dos fármacos às proteínas pode envolver proteínas do tecido
extracelular, proteínas do tecido intracelular ou proteínas plasmáticas. Muitos
medicamentos em circulação estão ligados às proteínas plasmáticas e, como o
medicamento ligado é muito grande para passar através das membranas biológicas,
apenas o medicamento “livre” está disponível para penetrar nos tecidos e para produzir a
ação farmacológica desejada. Portanto, o grau de ligação às proteínas pode afetar
significativamente a farmacocinética dos medicamentos5 .
A ligação às proteínas é mais clinicamente significativa para a terapia
antimicrobiana, onde um alto grau de ligação às proteínas serve como “reservatório” da
droga, permitindo aumentar a duração do tempo em que a concentração do medicamento
permanece acima da concentração mínima inibitória bacteriana (CMI), aumentando assim
a eficácia antimicrobiana 5.

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Concentração mínima inibitória (CMI) e concentração mínima bactericida (CMB)
A concentração mínima inibitória é a concentração mínima necessária para
impedir o crescimento e não necessariamente matar os organismos in vitro, enquanto a
concentração mínima bactericida é a concentração mínima necessária para matar
organismos in vitro. As relações entre o CMB e o CMI são usadas para classificar os
antimicrobianos como bactericidas ou bacteriostáticos .Os compostos bactericidas têm
valores de CMI e CMB muito próximos, geralmente têm um CMB que é de 2 a 4 vezes a
CMI. A CMI é uma ferramenta de laboratório e quando utilizada adequadamente, fornece
informações para a seleção do tratamento antimicrobiano6.
Compostos bacteriostáticos têm valores de CMB e CMI distintos com uma
diferença de 8 a 10 vezes. Logicamente, compostos bacteriostáticos podem atingir
concentrações in vitro que os tornam bactericidas, no entanto, essas concentrações podem
não ser econômicas, práticas ou seguras in vivo. É necessário considerar os níveis de CMB
/ CMI em relação às concentrações que podem ser alcançadas no tecido, sabendo que
valores baixos de CMB garantem rápida destruição bacteriana6.

Farmacodinâmica
A partir dos estudos farmacodinâmicos, os antimicrobianos basicamente podem
ser classificados em tempo-dependentes e em concentração-dependentes.

A - Fármacos tempo-dependentes
São aqueles que têm sua ação regida pelo tempo de exposição das bactérias às
suas concentrações séricas e teciduais. A ação destes antimicrobianos independe dos
níveis séricos que atingem, mas dependem do tempo que permanecem acima da
concentração mínima inibitória (CMI) para conseguir combater o microrganismo.
Comportam-se de acordo com esta classificação as penicilinas, cefalosporinas e outros β-
lactâmicos6,7.
Na prática, quando se utiliza um antimicrobiano tempo-dependente, deve-se
procurar maximizar a duração da exposição do patógeno ao fármaco. Dependendo da
farmacocinética, principalmente da velocidade de metabolização da droga, serão
necessárias várias aplicações ou infusão contínua para manter os níveis séricos acima da
CMI. Não importa que a concentração esteja muito ou pouco acima da CMI, basta estar
acima e manter-se assim o máximo de tempo possível6.
Para o correto uso de antimicrobianos tempo-dependentes é recomendado o
aumento no número de aplicações ou do tempo de infusão, associados ou não a doses
mais elevadas, particularmente em infecções causadas por bactérias que apresentam CMI
mais elevadas.
Acredita-se que o tempo que a concentração sérica do antibiótico deva se mantem
acima da Concentração Mínima Inibitória (CMI) em pelo menos 40% do dia para o grupo
dos carbapenêmicos, 50% para penicilinas e 60-70% para cefalosporinas (Fig. 1)6. Sendo
assim, o modo ideal de administração de fármacos destes grupos seria a infusão
endovenosa contínua, o que é praticamente impossível se tratando de animais silvestres e
exóticos.

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Figura 1 – Modo de ação de uma antimicrobiano tempo-dependente. A ação do antibiótico é dada pelo
tempo em que ela se mantém acima da concentração mínima inibitória (CMI) não importando qual
concentração sérica atinge após a aplicação.

B – Fármacos concentração ou dose dependentes


Dentro desta classificação se enquadram o grupo dos aminoglicosídeos. As drogas
concentração ou dose-dependentes são aquelas que exibem propriedades de ação em
função da concentração, sendo assim, quanto maior a concentração da droga, mais rápida
a erradicação do patógeno. Para que um antibiótico funcione como concentração ou dose-
dependentes é necessário que ele apresente um efeito pós-antibiótico (EPA), como
descrito no Quadro 2. O efeito pós-antibiótico reflete a manutenção da supressão de
crescimento bacteriano mesmo quando as concentrações séricas do fármaco já são
inferiores à CMI 6,7.
O efeito depende da concentração sérica inicial da droga, da duração da exposição,
da espécie bacteriana a que é direcionado e, finalmente, da concentração e da fase de
crescimento em que as bactérias foram expostas.

PONTOS CHAVES DO EFEITO PÓS ANTIBIÓTICO


O EPA pode ser visualizado como uma deterioração contínua da população bacteriana
permitindo aos mecanismos de autodefesa do animal eliminar as bactérias, interferindo
em aspectos como:
• As bactérias são menos capazes de ligarem-se a superfícies de tecido.
• As bactérias são destruídas mais facilmente.
• As bactérias aumentam os níveis de enzimas autolíticas.
• O crescimento e a multiplicação das bactérias.
• As bactérias se tornam mais suscetíveis ao mecanismo de destruição
intracelular.
• A expressão dos fatores de virulência é suprimida de certas bactérias.
Quadro 2 – Mecanismo de ação do efeito pós antibiótico (EPA) sobre as bactérias. Fonte: Brenner e
Stevens, 20186

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Figura 2 – A) Modo de ação de um antimicrobiano dose-dependente. A ação do antibiótico é otimizada
quanto maior concentração sérica que atinge após a aplicação. B) Demonstração gráfica do efeito pós-
antibiótico onde há uma supressão do crescimento bacteriano mesmo após a concentração do antibiótico
fica abaixo da CMI.

C – Fármacos concentração e tempo-dependentes


Este grupo apresenta uma mescla nos efeitos farmacodinâmicos citados, inclui
algumas fluoroquinolonas, glicopeptídeos, macrolídeos, tetraciclinas, polimixinas,
metronidazol e a clindamicina. Para este grupo de drogas, tanto a concentração como o
tempo são importantes8.
Por esse motivo, o uso otimizado de fármacos com estas características requer o
emprego de doses elevadas e a manutenção de níveis séricos acima da CMI, o que é
proporcionado por administrações repetitivas ou infusão prolongada em cada dose.
No caso dos fármacos concentração e tempo dependentes, o melhor parâmetro
indicador é o pico de concentração da droga em relação à CMI e o tempo que se mantem
na área abaixo da curva (AAC) (Figura 3).

AAC- área abaixo da curva Cmax-concentração máxima

Figura 3 - Exemplo gráfico da farmacodinâmica dos antibióticos em relação a concentração mínima


inibitória (CMI).

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Com base nestas informações técnicas, nos propomos a discutir a possibilidade de
uso baseados na efetividade, eficácia e eficiência da enrofloxacina utilizada como
antibiótico de longa ação e da cefovecina sódica na rotina clínica de animais silvestres e
exóticos.
Os termos relativos à efetividade, eficácia e eficiência devem ser explicados para
facilitar a compreensão das futuras avaliações dos fármacos. Dizemos que um
medicamento se mostra efetivo quando seu objetivo terapêutico é atingido (efetividade)
e se, além de ter a ação esperada, ele atinge um largo espectro de ação ele se mostra mais
eficaz (representa a qualidade da ação); o termo eficiência sempre estará relacionado ao
custo x benefício obtido16.Exemplo: Dois medicamentos (A e B) agem no microrganismo
(são efetivos) mas um deles (B) tem melhor ação terapêutica, consideramos então que o
medicamento B é mais eficaz; mas, se o medicamento A e B custam a mesma coisa, na
hora de se escolher o medicamento, a melhor indicação de relação custo x benefício será
a opção B ou seja o medicamento que apesar de ter o mesmo preço de A, apresentou um
melhor espectro de ação.

Enrofloxacina de longa ação


A enrofloxacina é um agente antimicrobiano pertencente ao grupo das
fluoroquinolonas de terceira geração, historicamente utilizada na medicina veterinária
para o tratamento de infecções gastrointestinais e respiratórias em várias espécies
animais, incluindo doenças causadas por bactérias gram-positivas e negativas9 . Estudos
da década de 90 já colocavam as fluoroquinolonas como sendo um antibiótico tempo e
dose dependente, em que o pico de concentração e o tempo que a concentração se mantém
acima da CMI são importantes para o sucesso do tratamento8.
Uma das características farmacocinéticas mais atraentes das fluoroquinolonas é o
seu grande volume de distribuição. A distribuição de fluoroquinolonas para os tecidos é
muito boa, devido às suas propriedades físico-químicas. Em animais, a meia-vida
biológica da maioria das fluoroquinolonas varia de 3 a 6 horas 9. A excreção de
fluoroquinolonas ocorre principalmente pelo rim e secundariamente pelo fígado. Altas
concentrações urinárias são alcançadas devido à filtração glomerular e à secreção
tubular4.
A indústria farmacêutica indica o uso da enrofloxacina como sendo um antibiótico
de longa ação em seu efeito pós-antibiótico e na alta biodisponibilidade após sua
administração. É sugerido que a fórmula exclusiva atinge concentrações séricas elevadas
em relação aos valores de CMI ou CMB para vários patógenos importantes, colocando
que as concentrações do medicamento que atingem o local da infecção sejam bactericidas.
Segundo o laboratório que comercializa o fármaco na apresentação de longa ação, as
propriedades lipofílicas da nova fórmula facilitam a passagem pelas membranas celulares
resultando em altas concentrações teciduais e um alto volume de distribuição. O volume
de distribuição é o cálculo matemático de quão extensivamente um medicamento deixa a
circulação sistêmica e penetra nos tecidos do corpo10.
Com base nos conceitos e nas informações encontradas em literatura se confirma
os benefícios da enrofloxacina como um antibiótico de amplo espectro e boa
penetração/distribuição tecidual. Porém, a utilização da fórmula modificada como um
antibiótico de longa ação com uma única aplicação na rotina clínica de animais silvestres
e exóticos é controversa e, a princípio, contraindicada, pois o uso da enrofloxacina,
mesmo com sua fórmula modificada, como um antibiótico de longa duração de dose única
implica em conhecer a fundo a farmacodinâmica e farmacocinética da droga na espécie

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alvo bem como ter a devida identificação da bactéria envolvida, incluindo antibiograma
e determinação da CMI15. Sem isso, o uso nesses moldes é inviável e irresponsável.
Fica evidente que, considerando a combinação das características dose e tempo-
dependente da enrofloxacina, o melhor esquema de uso, independentemente de sua
formulação, seria a utilização de múltiplas administrações e em suas doses mais elevadas
possíveis recomendadas para cada espécie8 .

Cefovecina sódica
A cefovecina sódica é um antibiótico de terceira geração que pertence ao grupo
das cefalosporinas. É um fármaco semissintético, bactericida e com um largo espectro de
ação contra as bactérias Gram-positivas e Gram-negativas11.
As cefalosporinas são antibióticos que apresentam meia vida curta e são
principalmente excretados pelo rim (com algumas exceções). Alcançam nível terapêutico
na maioria dos tecidos, mas não conseguem penetrar nas células, confinadas a fluidos
extracelulares e mal passam através das membranas biológicas. São agentes
antimicrobianos relativamente seguros. Os efeitos adversos geralmente não são graves e
ocorrem com frequência relativamente baixa 12. Mais importante ainda, o uso da maioria
das cefalosporinas, incluindo a cefovecina, é contraindicado em pequenos herbívoros,
incluindo coelhos e porquinhos da índia, devido à destruição de sua microbiota intestinal
natural13.
Possuem uma ação tempo-dependente sem efeito pós-antibiótico, ou seja, via de
regra necessitam manter um nível sérico acima do CMI por um período de tempo para
que funcione corretamente6.
A cefovecina, mesmo pertencendo ao grupo das cefalosporinas, consegue ter uma
meia vida longa e atuar como um antibiótico de longa ação baseado em uma única
aplicação devido a sua capacidade de se ligar às proteínas plasmáticas, o que impede sua
rápida excreção renal. A cefovecina é 100% excretada de forma inalterada pelos rins, sem
metabolização hepática14.
O uso da cefovecina na medicina veterinária de cães e gatos vem se ampliando,
uma vez que este antibiótico possibilita maior adesão ao tratamento pelo proprietário,
reduz a incidência de resistência antimicrobiana e ainda minimiza o estresse causado por
uma terapia prolongada. Porém, seu uso em outras espécies em geral pode não apresentar
os mesmos benefícios e a droga é rapidamente excretada11 .
Outros animais que conseguem aproveitar dos benefícios da droga (longa duração
com uma única aplicação) aparentemente são os que pertencem aos grupos dos canídeos
e felídeos, justamente por apresentarem proteínas plasmáticas que conseguem se ligar a
droga e consequentemente impedem sua rápida excreção12.
Apesar de ter o potencial de oferecer alguma vantagem no tratamento de animais
exóticos e silvestres, antimicrobianos como a cefovecina só devem ser utilizados quando
houver dados especificamente disponíveis para as espécies alvo, principalmente em
relação à farmacocinética, não desconsiderando os princípios básicos da
antibioticoterapia. Portanto, espera-se que estudos e relatos de casos mais específicos
gerem o conhecimento necessário que possibilite o uso desta droga no futuro. Até o
presente momento, os estudos apresentados que correlacionam a farmacodinâmica de
cefovecina em outros grupos de animais além de canídeos e felídeos contraindicam seu
uso1.

Conclusão
A escolha do tratamento, para obter os melhores resultados com o uso de um
antimicrobiano, deve ser o correto diagnóstico. Há um grande problema ao se pensar em

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utilizar medicamentos antimicrobianos, aprovados para outros animais, sem que existam
dados que forneçam base para o uso em animais silvestres e exóticos. À medida em se
observa o incremento de informações sobre a utilização de antimicrobianos em exóticos
(principalmente aves e répteis), para a maioria das drogas usadas no ambiente clínico nas
diferentes espécies, não existe dados publicados.
Além de oferecer terapia de suporte (nutrição, fluidos, aquecimento etc.), fazer
uso de cultura microbiana e de testes de sensibilidade confiáveis ajudará a evitar a
administração de medicamentos ineficazes, perdendo, assim, um tempo valioso de
tratamento. Também é importante lembrar que estresse e consequente supressão
imunológica são resultados de problemas de manejo, sendo de extrema importância não
apenas tratar a infecção, mas também identificar o problema subjacente que causou a
mesma.
Para utilizar com eficácia as drogas antimicrobianas de longa ação e de única
aplicação em pacientes exóticos, é preciso entender a farmacocinética básica dessas
drogas, bem como certas características fisiológicas e metabólicas essenciais da espécie
alvo. Até o presente momento, o uso empírico da enrofloxacina e da cefovecina sódica,
como antimicrobianos de longa ação na rotina clínica de animais silvestres e exóticos,
sem as devidas bases científicas que sustentem esta conduta, é controverso e incoerente.
Essa prática pode oferecer riscos aos animais e à saúde pública e gerar resistência
bacteriana não sendo, portanto, recomendada.

*As opiniões expressas no texto não representam, obrigatoriamente, a posição da ABRAVAS sobre o
assunto.

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