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A questão da resistência bacteriana

A Resistência bacteriana é um fenômeno biológico que possibilita aos microorganismos


a capacidade de multiplicação e persistência na presença de níveis terapêuticos do
antimicrobiano usado. Algumas bactérias possuem resistência natural ou intrínseca para
alguns antimicrobianos, como a resistência de bacilos gram negativos à penicilina G.
Mas a preocupação é a resistência adquirida, onde a bactéria poderá se multiplicar na
presença do antimicrobiano usado e ocupar o nicho deixado pela população de bactérias
sensíveis torna se variante dominante da espécie.
Resíduos de antimicrobianos em alimentos e o possível aparecimento de resistência
bacteriana no TGI humano
Existem algumas bactérias no trato gastrointestinal, o número passa de 1 trilhão
bactérias por grama de conteúdo fecal, são representadas por mais de 400 espécies. As
bactérias que predominam no TGI humano são as anaeróbicas e dando exemplos ainda
temos em destaque as dos gêneros Bacteroides spp., Eubacterium spp., Bifidobacterium
spp., Clostridium spp., Fusobacterium spp., Ruminococcus spp., Peptococcus spp. e
Peptostreptococcus spp. Sabe ser está microbiota um componente essencial da fisiologia
humana pois representa uma barreira natural contra a colonização do TGI por bactérias
patogênicas, participa ativamente também de processos de digestão dos alimentos e do
metabolismo de medicamentos xenobióticos e nutrientes. Há evidências que a exposição
de um organismos a doses terapêuticas de antimicrobianos por tempo prolongando,
podem levar a uma pertubação da microbiota normal do TGI com suscetibilidade a
patógenos como Salmonella spp., Campylobacter e Escherichia coli. Esse efeito é mais
evidente com o uso de antimicrobianos via oral e pode também aumentar o potencial
para o desenvolvimento ou a aquisição de resistência a esses antimicrobianos ou outros
do mesmo grupo, isso nos leva a observação do possível impacto sobre a microbiota do
TGI humano dos resíduos de antimicrobianos usados em animais de produção.
Aquisição de bactérias resistentes a partir de alimentos de origem animal
Adquirimos normalmente um grande número de microorganismos ao ingerir alimentos
todos os dias, mas a imensa maioria são inofensivos para nós. A ocorrência de uma
infecção causada por microrganismo resistente de origem animal depende de vários
eventos, algumas carcaças de animais podem estar contaminadas após o abate. A
bactéria precisa sobreviver as condições do preparo do alimento e as barreiras do
sistema imunitário e do TGI humano, tendo características de patogenicidade para levar
infecção ao homem. O tratamento deverá ser com antibióticos do mesmo grupo
farmacológico usado no animal.

Bactérias resistentes veiculadas por alimentos de origem animal


A maior preocupação das bactérias resistentes de origem animal que poderiam atingir o
ser humano por meio de contaminação dos alimentos de origem animal, são:
Escherichia coli, Salmonella spp., Campylobacter spp. e Enterococcus spp.
No caso da Salmonella spp., a ingestão de alimentos (carne bovina, suína, de frango ou
ovos), ou de água contaminada por fezes de origem humana ou animal e a forma mais
comum de infecção, a gravidade varia de acordo com o sorotipo da salmonela.
A ingestão de carne moída contaminada, alimentos ácidos, frutas, vegetais, iogurte e a
água contaminada estão relacionadas com a veiculação da cepa de Escherichia coli.
Campylobacter são bacilos gram negativos que podem colonizar o sistema digestório de
várias espécies como frangos e suínos e até animais de estimação. Tem sido discutido a
possível relação entre o uso de fluoroquinolonas em animais reprodutores de alimentos
e o aumento da resistência destas bactérias a antimicrobianos de uso humano do mesmo
grupo farmacológico. Concluiu se que o uso veterinário de enrofloxacino e
sarafloxacino deveria ser suspenso nos animais de produção.
Análise de risco
Necessário avaliar o uso de qual antimicrobiano representaria riscos à saúde humana.
Por meio de ações de avaliação, gerenciamento e comunicação de risco onde são feitas
as considerações. Risco é a probabilidade da ocorrência de um efeito ou ação e que não
existe o risco zero (risco zero é certeza e não existe no campo da ciência, pois trabalha
com probabilidade de uma ocorrência). Deve se entender que o uso de antimicrobianos
como aditivos ou de forma profilática oferece algum tipo de benefício aos animais de
produção e aos produtores rurais, justificando a realização de análise de risco para este
uso.
Na primeira etapa é avaliado o risco a saúde humana, depois o gerenciamento do risco
com propostas para sua redução e instruções para o uso com prudência do
antimicrobiano. A terceira etapa é para transmitir informações relativas ao próprio
processo de análise de risco, promovendo assim um intercâmbio de conhecimentos que
busquem conscientizar os indivíduos quanto ao risco em questão.
Para um sucesso de análise de risco é necessário que a execução organizada das etapas
de avaliação e gerenciamento e comunicação de risco, cada uma delas vai trazer
informações necessárias para a execução das demais. É importante também manter
permanente as investigações sobre o volume de uso dos antibióticos e sobre a
prevalência da resistência microbiana, para identificar o foco de ação do processo de
análise de risco em termos de espécie animal, microorganismo e antibiótico.
A análise de risco é sempre feita com dados científicos.
Atitudes e posições adotadas em relação à resistência bacteriana
Diferentes posicionamentos ou formas de gerenciamentos tem sido tomados quanto ao
uso veterinário de antimicrobianos, sendo observados em países da União Europeia que
por exemplo decidiu suspender o uso de avoparcina, virginamicina, espiramicina,
tilosina e bacitracina de zinco como aditivos em animais de produção para minimiza a
seleção de bactérias resistentes de importância médica. Nos EUA as fluoroquinolonas
tem seu uso limitados, provavelmente porque esses medicamentos não eram
empregados como aditivos zootécnicos na Europa. As autoridades de regulamentação
europeias optaram por suspender o uso dos antimicrobianos como aditivos zootécnicos
por meio de uma chamada de precaução. Mas os medicamentos antimicrobianos
continuam a ter seu uso terapêutico e metafilático autorizado na Europa, mesmo com
seu princípio ativo suspenso como aditivo.
Mesmo com impacto positivo como medida de contenção da resistência microbiana,
alguns países identificaram aumento de doenças infecciosas em alguns rebanhos de
criação intensiva após remoção destes aditivos.
Propostas consensuais da FAO, da OIE e da OMS para a concentração da
resistência microbianas em animais
O tema é multidisciplinar e de interesse para as áreas da saúde humana e animal. Foi
publicado em 2004 um documento como conclusão do segundo workshop onde reuniu
FAO, OMS e OIE, sobre a concentração da resistência microbiana no âmbito da
Medicina Veterinária que ainda é usado atualmente. Foram estabelecidas 8 ações
prioritárias: 1 - estabelecer programas de vigilância nacionais sobre o uso não humano
de agentes antimicrobianos; 2 - estabelecer também programas de vigilância sobre
resistência microbiana em bactérias presentes nos animais e alimentos; 3 - implementar
estratégias para prevenir a transmissão de bactérias resistentes de animais para seres
humanos via cadeia alimentar; 4 - implementar princípios globais para a contenção da
resistência microbiana em animais produtores de alimento para consumo humano,
propostos pela OMS, bem como seguir as recomendações da OIE sobre o uso prudente
e responsável de antimicrobianos; 5 - implementar estratégias específicas para prevenir
a emergência e a disseminação de bactérias resistentes a antibióticos de importância
crítica para o ser humano; 6 - implementar procedimentos de análise de risco
necessários para a seleção opções de gerenciamento do risco; 7 - aumentar a capacidade
dos países, principalmente aqueles em desenvolvimento, de conduzir programas de
monitoramento de uso de antimicrobianos e de vigilância de resistência, implementar
estratégias de contenção da resistência microbiana e processos de avaliação de risco
para apoiar as alternativas de gerenciamento de risco; 8 - conduzir o gerenciamento de
risco da resistência microbiana em âmbito internacional.
Um novo encontro foi realizado em 2007, o objetivo foi apreciar as listas de
antimicrobianos de relevância visando identificar sobreposições entre antimicrobianos
usados para a saúde humana e os usados na saúde animal. Seria para eventuais riscos a
saúde pública e sobre as prioridades de gerenciamento de risco em termos de
combinações de patógenos humanos, antimicrobianos e espécies de animais.
Foram divididos os antimicrobianos de uso veterinário de acordo com o nível de
importância de cada molécula em 3 categorias (criticamente importantes, altamente
importantes e importantes). Já na área médica foram usados 2 critérios, ser o antibiótico
a única terapia ou uma das poucas para tratar as doenças humanas graves e ser o
antimicrobiano útil para o tratamento de infecções microbianas adquiridas de não fonte
não humanas ou doenças causadas por microorganismos que possam adquirir genes de
resistência a partir de fontes humanas.
Na medicina veterinária os dois critérios de classificação foram a taxa de respostas
situando o antimicrobiano como criticamente importante e a relevância do fármaco para
o tratamento de doenças graves e a falta de alternativas terapêuticas. Alguns dos
antimicrobianos criticamentes importantes são da classe farmacológica de
amiglicosidios, cefalosporinas, macrolidios, penicilinas, quinolonas e tetraciclina entra a
área médica e a médica veterinária.
Conceito “Uma única saúde” aplicado ao tema da resistência microbiana
Cunhado no ano de 2005 quando houve uma clara percepção de que os veterinários e
profissionais da área médica deveriam colaborar entre para a obtenção de benefícios
mútuos para saúde humana e animal. Alguns desafios foram impostos e e citaram
doenças como a raiva, infecções alimentares por salmonela, influenza aviária H5N1 e a
síndrome respiratória aguda grave.
"Uma única saúde", une a colaboração de profissionais das ciências da saúde junto com
suas disciplinas e instituições para se obter uma ótima saúde tanto para as pessoas como
para os animais domésticos, plantas, vida selvagem e nosso meio ambiente em geral.
Medicina veterinária e resistência bacteriana - pontos a considerar
Alguns pontos devemos considerar com o uso de antimicrobianos na veterinária como a
implementação de programas para vigilância da existência de resistência microbiana em
animais e em produtos de origem animal, a criação de normas técnicas de forma que
garanta o uso prudente e a instituição de um programa de apoio as pesquisas ligadas ao
estudo dos mecanismo de resistência, da transmissão da resistência dos animais para o
ser humano e do impacto causado pelo uso de antimicrobianos na veterinária.

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