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CONTRAPONTO: Discussões Científicas e Pedagógicas em Ciências, Matemática e Educação

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A interdisciplinaridade na formação de professores de matemática do ensino


médio sob a luz da BNCC

The interdisciplinarity in the training of high school mathematics teachers under the light of
the BNCC

Keila Sabadin Presotto


Silvia Fernanda Dalla Costa

Resumo: Este trabalho tem por objetivo conceituar a interdisciplinaridade na busca da formação
integral no percurso formativo dos estudantes do ensino médio, de acordo com a aplicabilidade da
Base Nacional Comum Curricular- BNCC e do Currículo Base do Ensino Médio do Território
Catarinense - CBEMTC, bem como investigar a concepção de interdisciplinaridade entre os
professores de Matemática que atuam nessa etapa de ensino. Buscou-se verificar e entender formas
de valorizar a diversidade de saberes e vivências que estão presentes na sala de aula, além dos
muros da escola para que se possa realmente ofertar uma formação que contemple as dez
competências da BNCC. A pesquisa foi qualitativa, constituindo-se em um estudo de caso com
professores de matemática que atuam no Ensino Médio da Rede Estadual de Ensino de Santa
Catarina, mediada por revisões bibliográficas e documentais da Base Nacional Comum Curricular, -
BNCC e do Currículo base do Território Catarinense, que dialogam sobre interdisciplinaridade e
formação de professores de Matemática. Percebe-se que há muito a ser feito para que professores
estejam preparados para atuar interdisciplinarmente. A formação inicial e continuada é uma das
principais armas para que se possa cumprir o que está posto na BNCC e CBEMTC, bem como uma
mudança de pensamento em relação à forma de fazer o planejamento que precisa de forma coletiva
e abrangendo as diversas áreas de conhecimentos.
Palavras-chave: Interdisciplinaridade. Novo Ensino Médio. Base Nacional Comum Curricular.
Currículo Base do Ensino Médio do Território Catarinense.

Abstract: This assignment has by its goal conceptualize the interdisciplinarity in the search of full
formation in the formative path of high school students, according to the applicability of the
National Common Curricular Base - BNCC and the Curricular Base of High School of the Territory
Catarinense - CBEMTC, as well as investigating the conception of interdisciplinarity among
Mathematics teachers who work in this teaching stage. It seeks to verify and understand ways of
value the diversity of knowledge and experiences that are present in the classroom and beyond the
walls of the school so that one can really offer training that includes the ten requirements of the
BNCC.The research will be qualitative, constituting a case study with mathematics teachers who
work in high school, mediated by bibliographic and document reviews of the National Common
Curricular Base, - BNCC and the Curricular Base of High School of the Territory Catarinense,
which dialogue on interdisciplinarity and Mathematics teacher training. It is noticed that there is
much to be done so that teachers are prepared to act in na interdisciplinary manner. Initial and
continued training is one of the main weapons so that you can fulfill what is set out in the BNCC
and CBEMTC, as well as a change of thought in relation to the way of doing the planning that
needs to be in a collective way and cover the various areas of knowledge.

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Keywords: Interdisciplinarity, New High School, Common National Curriculum Base, Curricular
Base of High School of the Territory Catarinense

INTRODUÇÃO
Ao consultarmos um dicionário da Língua Portuguesa encontramos a interdisciplinaridade
definida como “comum a dois ou mais campos disciplinares inter-relacionados” (FERREIRA, 2011,
p. 519). Ou seja, uma integração entre conhecimentos para fins comuns, o que, em nosso caso, seria
a aquisição de saberes integrais. A interdisciplinaridade é, em sua essência, uma mudança de
paradigmas e metodologias que integram conceitos, teorias e práticas para compreender objetos e
fenômenos das vivências dos existentes em sala de aula.
Essa metodologia voltada para o todo vivenciado e estudado considera o caráter integrado e
complexo dos saberes e, nos convida a superar a excessiva e tradicional fragmentação do
conhecimento nas escolas. A interdisciplinaridade permite o contexto aprofundado de cada área de
conhecimento, integrando-os às conexões e interações com os demais campos dos saberes
historicamente construídos e às vivências e experiências trazidas pelos indivíduos em sala de aula,
dando sentido e significado.
Esse novo olhar para a educação escolar brasileira é intensificado pela Base Nacional
Comum Curricular e, consequentemente, pela definição dos currículos comuns de cada território.
Nesse sentido, por meio deste trabalho de pesquisa busca-se entender como é apresentada a
interdisciplinaridade nos documentos oficiais (Base Nacional Comum Curricular e no Currículo
Base do Ensino Médio do Território Catarinense), bem como a percepção dos docentes sobre o
assunto, as principais dificuldades para se mediar o ensino da matemática com metodologias e
ferramentas capazes de ressignificar a formação integral dos estudantes, embasados no contexto
interdisciplinar presente nas competências e habilidades a serem atingidas no Novo Ensino Médio.
Os legados da educação atual têm raízes na Grécia Antiga, com Aristóteles, Sócrates e
Platão, quando tratam do desenvolvimento de conhecimentos pelo resultado dos diversos saberes. O
conceito de formação integral começou com os guerreiros gregos e se estendeu como uma
necessidade na formação de jovens, considerando os valores humanos e culturais como um trabalho
interdisciplinar.
O trabalho interdisciplinar nasce da ideia de envolver diversos atores para a construção de
saberes, com várias ciências contribuindo, na sua individualidade, para ampliar, potencializar e
modernizar atividades educativas significativas para a formação escolar integral.

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A inclusão de novas e abrangentes aprendizagens na educação é um caminho de formação


de jovens com um olhar diferenciado para o seu cotidiano e suas vivências futuras. A
interdisciplinaridade possibilita um olhar diferenciado sobre o que já existe e sua transformação
futura e abordagem de um conhecimento sobre diferentes perspectivas. Percebe-se que a realidade
do estudante é ampla e complexa e o processo de ensino e aprendizagem é pouco eficaz quando os
saberes estão fragmentados e sem relação com as suas experiências e problemáticas diárias.
A Base Nacional Comum Curricular – BNCC começou a ser escrita em 2015 e foi debatida
no decorrer dos anos seguintes, com diversas contribuições da sociedade. Em 2017, foi homologada
pelo Ministério da Educação e passou a valer em todo o território brasileiro, definindo as
aprendizagens essenciais que os estudantes devem ter acesso durante a educação básica, como um
guia para a construção de currículos escolares. Chama a atenção para a construção de
conhecimentos que considerem as realidades locais e as vivências trazidas por professores e alunos.
A BNCC valoriza e intensifica a interdisciplinaridade na construção dos conhecimentos, buscando
fortalecer a relação entre os componentes curriculares em suas diversas áreas de conhecimento e
instigando a liberdade da escrita de currículos independentes em cada realidade de escola e ou rede
de ensino.
A aprendizagem se torna significativa quando cativa o estudante e permite que o mesmo
faça conexões entre o que está estudando e os seus conhecimentos particulares. Essa aprendizagem
significativa, com metodologias ativas, recursos tecnológicos e interação entre áreas de
conhecimento, aumenta o interesse do que é apresentado em sala de aula e complementa a prática
pedagógica.
Nesse contexto, é preciso refletir sobre a importância da interação dos conhecimentos
matemáticos, principalmente com o contexto de sua aplicabilidade nas vivências diárias dos
estudantes. A aprendizagem da Matemática passa por dificuldades históricas, pois a mesma é
considerada “difícil”, “complicada” e “chata”, ou mesmo “rígida” e “sem espaço para a
criatividade”, sendo uma crença que é passada de geração para geração. Antes mesmo de ter contato
com a Matemática a criança já aprende a não gostar dela e, consequentemente, do professor a
trabalhará. Para que a aprendizagem em Matemática seja eficaz é necessário que o professor tenha
esse entendimento e busque estimular o gosto pela disciplina, variando as metodologias para
atender às diferentes formas de aprender. Deve promover estratégias interdisciplinares de teoria e

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prática para que os alunos usem o que já sabem de maneira leve, estimulando as habilidades que já
possuem para alcançar outras diferentes.
As maiores dificuldades observadas atualmente quando se fala em trabalhar de forma
interdisciplinar, compartilhando vivências e entendimentos diferenciados na Matemática, estão no
campo de formação inicial e continuada de professores, construída dentro e pela própria profissão.
Há paradigmas que amedrontam e paralisam a atuação docente quando a compreensão da prática
interdisciplinar é tida como “saber de tudo o tempo todo” e que orientam o professor a sair do seu
isolamento conteudista. De acordo com Nóvoa (2002, p.35), “a ação pedagógica realiza-se a partir
de uma pluralidade de valores e de crenças, de ideias e de situações, que é ilusório tentar controlar a
priori”. Neste sentido, a escola precisa ser um local de aprendizagens, mas sempre partindo das
vivências já existentes de cada aluno, respeitando toda as suas experiência e cultura e
ressignificando os seus conceitos, transformando-os em conhecimento científico. O professor é o
mediador desse processo e não há, sob esta ótica, como trabalhar cada componente curricular
separadamente, sem dar a dimensão verdadeira do todo.
A BNCC traz um novo olhar para a busca de conhecimentos integrais e o desenvolvimento
de competências e habilidades dos estudantes, instigando uma nova formação inicial e continuada
de professores. Dessa forma, é necessário compreender o contexto em que o professor atualmente
está inserido, bem como toda a complexidade da transformação de sua prática educativa. A
formação dos professores, para atender às novas demandas e contexto da educação integral, precisa
ser repensada tanto nas disciplinas acadêmicas ofertadas na formação inicial, quanto no
aperfeiçoamento e formação profissional continuada. A formação deve repensar a autonomia
docente, preparando professores reflexivos e abertos para um novo olhar sobre os diversos saberes
das áreas, não no intuito de ter entendimento sobre tudo, mas sim, em ter domínio amplo dos
conhecimentos de sua área e conseguir estabelecer as possíveis contribuições nas demais.

O espaço pertinente da formação contínua já não é o professor individual, mas sim o


professor em todas as suas dimensões coletivas, profissionais e organizacionais. A
formação concebe-se como uma intervenção educativa, e é solidária dos desafios de
mudanças das escolas e dos professores. (NÓVOA, 2002, p. 56).

Considerando o novo olhar sobre a educação, trazido pela implementação da Base Nacional
Comum Curricular – BNCC e as novas demandas de aprendizagens do século XXI, buscou-se
entender quais os melhores encaminhamentos para munir os professores de Matemática com

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metodologias e ferramentas capazes de ressignificar a formação integral dos estudantes, embasados


no contexto interdisciplinar presente nas competências e habilidades a serem atingidas no Novo
Ensino Médio.
De acordo com os aprofundamentos da BNCC (2020) – Uma escola cidadã para as
juventudes brasileiras:

O que se tem visto é a demanda cada vez mais explícita por uma escola cidadã. De modo
geral, uma escola cidadã é aquela comprometida com uma sociedade justa, solidária e
democrática e que é capaz de, na sua proposta pedagógica, acolher os educandos e os
educadores num processo colaborativo, dialógico e emancipador de apropriação e
reconstrução dos saberes socialmente relevantes já sistematizados no mundo e de invenção
de outros saberes, que florescem na experiência histórica concreta cotidiana dos sujeitos
que ali se encontram. (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2020).

O presente estudo partiu da oitiva de professores já formados em Matemática e atuantes no


Ensino Médio das escolas da Rede Estadual de Ensino de abrangência da Coordenadoria Regional
de Educação de Concórdia, embasados em suas experiências e conhecimentos sobre a
interdisciplinaridade e sobre o que traz a BNCC. A análise dessas vivências foi complementada e
discutida a partir do entendimento trazido bibliográfica e documentalmente pela BNCC e Currículo
Base do Ensino Médio para o Território Catarinense - CBEMTC. O intuito foi investigar a
concepção de interdisciplinaridade, aprendida na formação e ou na prática de professores de
Matemática do Ensino Médio, contextualizando-a à luz da BNCC de forma documental e dos
entendimentos desses professores, bem como desmistificar a sua aplicabilidade como prática
pedagógica como meio de cooperação e superação da fragmentação do processo educativo.

2. A INTERDISCIPLINARIDADE NA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR -


BNCC
A Base Nacional Comum Curricular - BNCC é uma política anunciada pela Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB de 1996, pelas Diretrizes Curriculares Nacionais
Gerais da Educação Básica de 2013 e pelo Plano Nacional de Educação de 2014. É um documento
normativo para as redes de ensino que define os direitos de aprendizagens de todos os estudantes da
educação básica do Brasil, por meio de conhecimentos e habilidades essenciais, ou seja,
independente da região, raça ou classe econômica, todos os estudantes deverão ter uma formação
integral, estimulando a qualidade social, bem como a apropriação das mesmas habilidades e
competências ao longo de sua vida escolar básica.

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Requer o desenvolvimento de competências para aprender a aprender, saber lidar com a


informação cada vez mais disponível, atuar com discernimento e responsabilidade nos
contextos das culturas digitais, aplicar conhecimentos para resolver problemas, ter
autonomia para tomar decisões, ser proativo para identificar os dados de uma situação e
buscar soluções, conviver e aprender com as diferenças e as diversidades. (BNCC, 2017, p.
14).

Ao propor uma formação integral do estudante, a BNCC considera a formação e o


desenvolvimento global dos mesmos, assumindo uma visão ampla e completa do ser,
compreendendo a complexidade e a não linearidade do processo de ensino e de aprendizagem,
“rompendo com visões reducionistas que privilegiam ou a dimensão intelectual (cognitiva) ou a
dimensão afetiva” (BNCC, 2017, p.14). Idealiza a escola como um espaço plural, acolhedor, sem
discriminação, democrático e inclusivo, com respeito aos mais diversos tipos de saberes,
experiências e trajetórias de vida, respeitando as diferenças e diversidades.
Percebe-se que o conceito de educação integral proposto pela BNCC é complexo e refere-se
ao estudo, planejamento e implementação de processos educativos intencionais que olhem o
estudante na sua individualidade e promovam aprendizagens significativas para as suas
necessidades e interesses, sempre observando os desafios da sociedade contemporânea em constante
transformação. Nesse sentido, a escola passa a ter a necessidade da superação da fragmentação de
conteúdos e de disciplinas, passando a dar sentido ao que se aprende com uma visão sistêmica do
todo, dando sentido prático ao que cada aluno aprende, colocando-o como protagonista de seu
processo de aprendizagem e, principalmente, significando o seu projeto de vida.
A formação integral intensificada pela BNCC parte do princípio de que o estudante, ao
término de seu percurso formativo na educação básica, possa ter alcançado com sucesso as dez
competências gerais básicas, que abrange a formação integral nas diversas áreas de conhecimento,
conforme apresenta a figura 1.

Figura 1 - Competências Gerais

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Fonte: Currículo Base da Educação Infantil e do Ensino Fundamental do Território Catarinense, 2019, p. 22

A BNCC propõe uma aprendizagem por áreas de conhecimentos através de seus objtos de
conhecimentos e não mais por disciplinas separadas. Propõe uma integração interdisciplinar entre
os mais diversos conceitos científicos, sociais e pessoais, desconstruindo também a necessidade de
separação de conteúdos por séries/anos, respeitando as necessidades educativas individuais e o
processo de construção coletiva de cada grupo de estudantes. De acordo com as discussões da Base,

O princípio da aprendizagem colaborativa está ancorado no reconhecimento de que a


aprendizagem é, necessária e socialmente, mediada, e que são a qualidade e a recorrências
das interações entre os sujeitos que potencializam saltos significativos no desenvolvimento.
Assim, é imprescindível que a escola que se pretende cidadã fomente e promova situações
coletivas, compartilhadas e colaborativas de aprendizagem dos jovens entre si e dos jovens
com outros parceiros. (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2020).

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Nesse sentido, a interdisciplinaridade convida a considerar o caráter integrado e


complexo de todos os conhecimentos e conceitos adquiridos, reconhecendo que o mundo real
requer saberes complexos, conexões, interações e implicações entre os mais diversos conceitos,
para qualquer formação cidadã e para qualquer desenvolvimento que se queira.

3. A INTERDISCIPLINARIDADE NO NOVO ENSINO MÉDIO


Concomitante à homologação e a nova estruturação da educação básica brasileira dada pela
Base Nacional Comum Curricular - BNCC, em 2017, a Lei nº 13.415 alterou a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação e trouxe mudanças na estrutura do Ensino Médio, que passamos a denominar
como Novo Ensino Médio. Houve a ampliação do tempo mínimo do curso de 800 horas para 1.000
horas anuais, bem como uma nova proposta de reestruturação curricular, mais flexível e integral,
respeitando a essência da BNCC. O ensino médio passou a ofertar diferentes possibilidades de
escolha dos estudantes com foco nas áreas do seu interesse pessoal e ou profissional. Isso garante a
oferta de educação que aproxima os conhecimentos historicamente construídos da realidade e
experiências vividas pelo estudante, atendendo às demandas e complexidades da vida em sociedade.
O Novo Ensino Médio se organiza de forma a desdobrar o currículo em uma parte de
formação geral básica, que compreende 1800 horas e outra parte flexível, com carga total mínima
de 1200 horas, através da oferta dos itinerários formativos, que são o conjunto de disciplinas,
projetos, oficinas, experimentos, entre outras possibilidades, que aprofundam os conhecimentos das
áreas de conhecimentos e entre as mesmas. Esses itinerários formativos poderão ser definidos por
cada rede de ensino, considerando sempre a escuta da comunidade e dos estudantes, principalmente.
A pretensão é atender as necessidades e expectativas dos estudantes, fortalecendo o protagonismo
juvenil e potencializando o engajamento na sua própria aprendizagem. O Novo Ensino Médio, de
acordo com o olhar dado pelo CBEMTC, não exclui nenhuma disciplina, apenas orienta que todos
devem ser olhados de forma integral, intensificando a exigência de uma organização do trabalho
pedagógico por área do conhecimento. A Língua Portuguesa e a Matemática são os únicos
componentes curriculares obrigatórios durante todo o Ensino Médio, as demais estarão presentes
nos itinerários formativos nas áreas de Língua Portuguesa e suas Tecnologias, Matemática e suas
Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias, Ciências Humanas e suas Tecnologias, além
da formação Técnica e Profissional.

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Prevê-se ainda, com este novo currículo, oportunizar a jovens, adultos e idosos a vivência
de percursos escolares conectados com seus contextos, tempos, espaços e identidades. (...)
em articulação com o contexto histórico, econômico, social, científico, ambiental, cultural e
com o mundo do trabalho(...). (RESOLUÇÃO nº 3 CNE/2018, p. 2).

A articulação dos conhecimentos a partir de suas áreas favorece o trabalho interdisciplinar,


fortalece a relação entre os componentes curriculares, sua contextualização real, contribui na
elaboração de conceitos integrais e que fazem sentido, não implicando, em momento algum, no
esvaziamento de conteúdos próprios de cada componente curricular, desde que observadas as
competências e habilidades trazidas pela BNCC.

4. A INTERDISCIPLINARIDADE NO CURRÍCULO BASE DO ENSINO MÉDIO DO


TERRITÓRIO CATARINENSE
O Currículo Base do Ensino Médio de Santa Catarina - CBEMTC começou a ser estudado e
escrito em abril de 2019, com base na Proposta Curricular de Santa Catarina, na Base Nacional
Comum Curricular – BNCC e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, bem
como outros documentos oficiais da Educação Brasileira escritos anteriormente. De 2019 até 2021,
muitos especialistas, professores e técnicos participaram da sua elaboração e estruturação, na
perspectiva de romper o desinteresse dos estudantes por concluir com êxito o Ensino Médio,
diminuindo os índices históricos de abandono e a baixa proficiência. O objetivo foi fortalecer o
sentimento de pertencimento dos estudantes e de professores para com a escola e o processo de
ensino e aprendizagem.
O Currículo veio para complementar o documento da Educação Infantil e do Ensino
Fundamental, compreendendo que o percurso estudantil deve ser contínuo e integral, privilegiando
práticas pedagógicas que permitem ao estudante do ensino médio reconhecer e explorar seu próprio
modo de pensar, elaborar estratégias e resolver problemas (simples e complexos) no seu cotidiano
social e de trabalho, bem como interagir em sociedade, mobilizando os diversos conhecimentos
adquiridos.
A flexibilização curricular proposta por esse documento amplia as possibilidades de
aprendizagens aos estudantes e respeita as vivências pessoais e diversidades existentes.

As atividades didático-pedagógicas propostas na Formação Geral Básica e nos Itinerários


Formativos compreendem a mobilização dos conhecimentos e das habilidades necessárias
para permitir a autorregulação das aprendizagens, consequentemente, a tomada de

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consciência de que seja possível aprender a aprender, generalizando e transferindo tais


ações para as diversas situações cotidianas. (SANTA CATARINA, 2021, p. 19, caderno 1).

A formação integral do estudante incentivada pelo CBEMSC perpassa por percursos


formativos significativos ao considerar o diálogo entre as áreas da formação geral básica e
itinerários formativos que sistematizam dados coletados nos conselhos de classes, nas avaliações de
larga escala, as dificuldades didáticas do ensino médio, bem como da escuta dos próprios
estudantes, que se tornam protagonistas na escolha do que querem aprender.

[...] permite que os objetos de conhecimento e os conceitos estruturantes de cada


componente curricular sejam trabalhados de forma integrada, inter-relacional e mais aberta,
a partir da diluição dos contornos disciplinares, contemplando o desenvolvimento das
competências e habilidades específicas de cada área, além das dez competências gerais da
BNCC. Esta abordagem favorece a atuação interdisciplinar e transdisciplinar, permitindo ao
estudante, na medida em que contextualiza os conhecimentos escolares, dispor de uma
visão integrada dos conceitos e do mundo, tornando-os significativos. (SANTA
CATARINA, 2020, p. 45, caderno 1).

O CBEMTC propõe a construção de uma visão integrada, que, aplicada à realidade e em


diferentes contextos, mobiliza o modo próprio dos estudantes para raciocinar, representar,
comunicar e argumentar e, com base em discussões e validações conjuntas, apropriar-se de
conceitos, desenvolvendo representações e procedimentos cada vez mais sofisticados.

5. A INTERDISCIPLINARIDADE E A MATEMÁTICA
Dentro da BNCC e consequentemente do CBEMTC, a Matemática se configura
como área do conhecimento e ao mesmo tempo como um componente curricular. Então, para
atender as diretrizes estabelecidas nos dois documentos, reforça-se a obrigatoriedade do trato
interdisciplinar da matemática com as demais disciplinas, para que se evite a fragmentação e
compartimentalização dos conhecimentos e o estudante entenda a aplicabilidade de fórmulas e
conceitos na resolução de problemas práticos de seu cotidiano. O ensino da matemática deve
instigar a formulação de hipóteses, analisar e relacionar dados reais, por meio de uma representação
prática e adequada para que o estudante possa ser capaz de analisar, argumentar e tomar decisões
coesas e seguras, tanto no mundo do trabalho, quanto nas interações sociais.
A matemática é parte intrínseca da cultura e dos saberes historicamente construídos, pois
surgiu da necessidade de resolução de problemas de ordem prática e corriqueira, mesmo muito
antes do surgimento da própria escrita. Então, é fácil fazer a correlação de qualquer cálculo com

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quaisquer elementos das outras áreas. Se trabalhada de forma interdisciplinar, desmistifica o medo e
a complexidade com que os estudantes a conceituam e permite atribuir sentido e significação
conceitual. O estudante saberá como se faz e entenderá para que serve cada conceito, fórmula e
cálculo.
O currículo da matemática precisa estar voltado para a criatividade, para a curiosidade, para
responder os questionamentos dos estudantes, desestruturando o seu formalismo e a demasiada
abstração cognitiva, contribuindo para a formação cidadã integral e plena, como instrumento de
interesse e não como obrigação.
Por mais que a matemática continue presente na Formação Geral Básica, o Currículo Base
do Ensino Médio do Território Catarinense, em seus cadernos 3 e 4, apresenta a aplicabilidade
interdisciplinar deste componente, num vasto portfólio de percursos formativos e trilhas de
aprofundamento, que deverão ser trabalhados na parte flexível do Novo Ensino Médio, após a
escuta e escolha dos próprios estudantes.
De acordo com a Resolução nº 3, de 21 de novembro de 2018, do Ministério de Educação
(MEC), citada no Caderno 3, p. 21, do CBEMTC, a matemática deve enfatizar:

[...] aprofundamento de conhecimentos estruturantes para aplicação de diferentes conceitos


matemáticos em contextos sociais e de trabalho, estruturando arranjos curriculares que
permitam estudos em resolução de problema e análises complexas, funcionais e não-
lineares, análise e dados estatísticos e probabilidades, geometria e topologia, robótica,
automação, inteligência artificial, programação, jogos digitais, sistemas dinâmicos, dentre
outros, considerando o contexto local e as possibilidades de oferta pelos sistemas de ensino.

A matemática trabalhada através dos itinerários formativos, precisa estar baseada nas
competências e habilidades gerais da BNCC e nas específicas para o componente curricular, bem
como, estar estruturada nos eixos da investigação científica, processos criativos, mediação e
intervenção sociocultural e empreendedorismo, conforme quadros a seguir:

Quadro 1 - Habilidades gerais e específicas dos eixos estruturantes do itinerário de Matemática e Tecnologias

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Fonte: Currículo Base do Ensino Médio do Território Catarinense, 2021.

Quadro 2: Habilidades gerais e específicas dos eixos estruturantes do itinerário de Matemática e Tecnologias

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Fonte: Currículo Base do Ensino Médio do Território Catarinense, 2021.

A interdisciplinaridade na Matemática pressupõe a utilização de metodologias ativas,


fundamentadas em conhecimentos já construídos historicamente e a possibilidade de os estudantes
vivenciarem situações de aprendizagem que lhes permitam produzir seus próprios conceitos, criar,
intervir na realidade e empreender projetos de vida a curto, médio e longo prazo. Este processo
requer do (a) estudante a identificação de seus potenciais, desafios, interesses, aspirações e a análise

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do contexto externo, inclusive em relação ao mundo do trabalho (SANTA CATARINA, 2021, p.


46, Caderno 3).
Para consolidar a interdisciplinaridade da Matemática com as demais áreas podemos
observar as seguintes trilhas, presentes no Caderno 3 do CBEMTC:
Trilha 1 - A matemática, o ser humano e a natureza;
Trilha 2 - A matemática e o mundo do trabalho;
Trilha 3 - Matemática e música: sistematização e analogias;
Trilha 4 - Edificando o sonho da moradia própria em um contexto socioambiental.
Essas trilhas partem da Matemática para as demais áreas, porém ainda temos as trilhas de
aprofundamento em que todas as áreas estão integradas, incluindo a matemática, conforme segue:
- Saúde, juventude e cuidados de si e dos outros;
- Foto (cidade)grafias em movimento;
- Modelagem de fenômenos naturais, sociais e seus impactos;
- Desenvolvimento e sustentabilidade no mundo contemporâneo;
- Identidades e territórios catarinenses: concepções, avanços e desafios;
- O campo como lugar de “vidas”, de relações humanas, de direitos humanos, de culturas e de
produção de alimentos saudáveis;
- Linguagens tecnológicas para as sociedades em rede;
- Eu, jovem; nós, juventudes.
Como a matemática ocupa lugar privilegiado no Novo Ensino Médio, como área e como
transversal às demais, no sentido de ser ferramenta e trazer recursos práticos para representar e
modelar as mais diversas situações do cotidiano escolar, o CBEMTC também oferece propostas
pedagógicas orientadoras para a composição de componentes curriculares eletivos, sempre de forma
integrada. O Caderno 4 apresenta as seguintes possibilidades:
- Educação financeira;
- Educação fiscal;
- Jogos de raciocínio lógico-matemático;
- Matemática aplicada.

6. A INTERDISCIPLINARIDADE E SEUS DESAFIOS NO ENTENDIMENTO DOS


PROFESSORES MATEMÁTICA DO ENSINO MÉDIO

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Buscando entender a percepção dos docentes habilitados em Matemática e atuantes nas


escolas da rede estadual de educação da Coordenadoria Regional de Educação de Concórdia, fez-se
uma pesquisa para entender a percepção dos mesmos sobre a interdisciplinaridade de acordo com os
encaminhamentos dados pela BNCC e o CBEMTC, bem como verificar as principais dificuldades
encontradas para o uso dessa metodologia em sala de aula.
Primeiramente, foi realizada uma pesquisa bibliográfica sobre o tema, bem como realizada
consulta à BNCC, ao CBEMTC e à Lei nº 13.415/2017. Posteriormente, foi feita a coleta de dados
junto aos professores, através da aplicação de um questionário aberto e semiestruturado. Em função
da pandemia SARS- COVID-2019, o questionário foi disponibilizado aos professores de forma
remota, por meio de um formulário do Google. A análise considerou as respostas dos professores,
relacionando-as com a contextualização bibliográfica e documental.
Como sujeitos da pesquisa, participaram 12 (doze) professores atuantes nas escolas da
região, que compreende os municípios de Alto Bela Vista, Concórdia, Ipira, Irani, Peritiba, Piratuba
e Presidente Castello Branco. Para fins de registro e de manter o sigilo dos nomes, ao fazermos a
citação das respostas neste artigo, os participantes serão identificados apenas com o Professor e um
número correspondente. Observou-se que, destes, 08 (oito) possuem mais de vinte anos de tempo
de atuação na docência e apenas 03 (três) abaixo de dez anos, o que nos demonstra que temos um
universo que compreende professores com diversas cronologias em relação à formação inicial e
continuada.
Destacamos ainda que é preciso lembrar que o diálogo sobre interdisciplinaridade se iniciou
no Brasil no final da década de 1960, logo após a França e a Itália. A ideia de formação integral já
permeou muitos documentos oficiais desde então, mas finalmente se fortaleceu a partir da BNCC,
do Novo Ensino Médio e do Currículo Base do Ensino Médio do Território Catarinense, que
começaram a ser construídos a partir de 2015, ou seja, recentemente.
Ao serem questionados sobre o entendimento acerca do conceito de interdisciplinaridade,
observou-se que há diferentes interpretações baseadas em visões culturais e epistemológicas, bem
como resultado da formação e da prática didática. Devemos considerar, nesta questão, que há
diferentes professores, com diferentes formações e diferentes interpretações da didática e da prática
em sala de aula.

[...] aspectos contidos na diversidade cultural que envolvem definições múltiplas, conceitos
variados e resultados aferidos a partir das configurações assumidas quando tratamos da

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questão formação de professores, seja na didática e/ ou na prática de ensino. (FAZENDA,


2013, p. 21).

O professor 2, ao conceituar interdisciplinaridade, entende como “um trabalho que envolve


a interação entre duas ou mais disciplinas, sem que as fronteiras entre essas disciplinas
apareçam”, traz um conceito que vem ao encontro do entendimento de Fazenda (2013, p. 22):

[...] cada disciplina precisa ser analisada não apenas no lugar que ocupa ou ocuparia na
grade, mas nos saberes que contemplam, nos conceitos enunciados e no movimento que
esses saberes engendram, próprios de seu lócus de cientificidade. Essa cientificidade, então
originada das disciplinas, ganha status de interdisciplina no momento que obriga o
professor a rever suas práticas e a redescobrir seus talentos, no momento em que ao
movimento da disciplina seu próprio movimento for incorporado.

Tal conceituação também foi apontada pelo Professor 5, que cita a interdisciplinaridade
“como algo que engloba mais que uma disciplina e ou conceitos de áreas diferentes em uma
mesma aula ou atividade proposta”. E, de acordo com o Professor 1, fazendo uma relação paralela
com o mesmo objetivo.
Diferentemente da resposta dada pelo Professor 4, que cita apenas “o trabalho de conceitos
matemáticos com outras disciplinas”. Entendemos que, com a proposta de formação integral trazida
pela BNCC e CBEMTC, a Matemática não pode ser mais observada como única, empoderada e
inalcançável, mas sim como parte de uma construção coletiva e como composição de uma educação
voltada para a cidadania e ao alcance de um aprendizado uníssono e com sentido de totalidade para
o estudante. O conhecimento matemático é resultado de produção histórica, construído na medida
em que a humanidade se desenvolve. (SANTA CATARINA, 2021, Caderno 2).
O Professor 4 entende que “é necessário relacionar o conteúdo da Matemática com o
cotidiano do estudante”, o que condiz com a necessidade de considerar todas as vivências,
transformando a escola em um espaço aberto que o vê como sujeito de aprendizagem e como
participante ativo do mundo que ultrapassa os muros da escola. Ainda, de acordo com SANTA
CATARINA, 2021, Caderno 1.

Vale chamar a atenção para a necessidade de se compreender que a organização escolar


deve ser pensada com vistas a proporcionar a melhor produção/apropriação possível dos
conhecimentos aos diferentes públicos. Logo, importa sobremaneira a compreensão dos
sujeitos dentro de seus espaços e condições de vida (SANTA CATARINA, 2021,Caderno
1).

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A resposta do Professor 8 indica um conhecimento mais específico sobre a BNCC, pois


considera que a interdisciplinaridade perpassa por vários componentes curriculares, desenvolvendo
habilidades e competências num contexto do mesmo tema. A formação de um sujeito integral passa
pelo desenvolvimento das dez competências gerais, acrescidas das competências e habilidades
específicas de cada uma das quatro áreas de conhecimento (SANTA CATARINA, 2021, Caderno
1). Isso, considerando que a BNCC conceitua competência como “a capacidade de mobilizar
conhecimentos, habilidades, atitudes e valores, para a resolução das demandas complexas da vida
cotidiana e dos mundos do trabalho para pleno exercício da cidadania. (SANTA CATARINA, 2021,
Caderno 1).
Considerando Marchelli (2017, p. 56), “a fragmentação dos conhecimentos que alicerça o
trabalho docente tradicionalmente praticado na educação básica brasileira é o principal alvo contra
o qual os componentes curriculares das áreas de conhecimento estão voltados”. Percebe-se essa
concepção na resposta do Professor 7, que coloca o professor como ator principal no trabalho
interdisciplinar e considera “a desfragmentação dos conhecimentos individuais de cada um e a
busca de conhecimentos mais abrangentes em outras áreas como primordial num processo de
ensino e aprendizagem mais eficiente e eficaz”. Para o Professor 10, “deve ser estabelecido
conexões bem sustentadas entre as disciplinas e áreas”. O ato profissional de diferentes saberes
construídos pelos professores não se reduze apenas a saberes disciplinares (FAZENDA, 2013).
Ao consultarmos os professores sobre a facilidade de trabalhar interdisciplinarmente na sua
prática educativa, apenas o Professor 8 respondeu “não se sentir capaz de trabalhar neste
contexto”. Todos os demais se sentem capazes e motivados para o desafio trazido pela BNCC e
CBEMTC.
As principais dificuldades elencadas são a falta de tempo para o planejamento coletivo. O
professor 5 relata que “o trabalho interdisciplinar requer um diálogo constante entre os
professores da turma/série, com afinidade e organização/execução mútua dos professores e equipe
pedagógica”. O Professor 2 também coloca “o tempo disponível para o planejamento com outros
professores” como principal empecilho para o encaminhamento do trabalho interdisciplinar. A este
pensamento se juntam também os Professores 3, 7, 8 e 9.
O Professor 1 elenca “a falta de estrutura física das escolas como motivador para que não
se pensa em um trabalho integrado e interdisciplinar”, considerando que o Novo Ensino Médio e a

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ampliação da carga horária anual requerem muitos mais espaços para salas de aula, laboratórios,
bibliotecas e para convivências.
O Professor 4 menciona que “é necessária uma formação mais ampla, bem como formação
contínua dos professores, além de ampla pesquisa de cada um sobre o tema e sobre as
possibilidades que podem ser instigadas em sala de aula”. Tal perspectiva é corroborada por
Marchelli, quando afirma que,

[...] precisa de formação inicial absolutamente diferente daquela atualmente praticada pelos
cursos de licenciatura que estão em funcionamento no Brasil. A integração do currículo em
áreas de conhecimento e o trabalho interdisciplinar pressupõe uma formação pautada em
conceitos que por força da Base condicionarão as políticas voltadas para a preparação de
professores e a elaboração dos projetos pedagógicos dos cursos (MARCHELLI, 2017, p.
56).

O Professor 5 também aponta que o trabalho interdisciplinar se torna dificultoso em função


da grande quantidade de conteúdos que precisam ser trabalhados e o pouco tempo disponível nos
duzentos dias letivos. Com o advento do Novo Ensino Médio e as orientações presentes no
CBEMTC essa situação pode ser diluída ao considerarmos que Matemática está presente na
Formação Geral Básica e também no Itinerários Formativos, o que amplia as possibilidades de
mediação dos mais diversos conteúdos. Também precisamos considerar que a partir da BNCC o
processo de elaboração conceitual com o qual se passa trabalhar não é definido pelo ano letivo, mas,
sim, pelos processos didático-pedagógicos construídos em sala de aula. A formação integral é viva e
dinâmica num movimento contínuo de aprendizagens, em que, de modo espiral, os conhecimentos
vão se tornando complexos de modo orgânico e progressivo, como pode-se observar na figura 2.

Figura 2 - Processo de elaboração conceitual em espiral

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Fonte: Currículo Base da Educação Infantil e do Ensino Fundamental do Território Catarinense, 2019.

O Professor 11 considerou a Modelagem matemática como a melhor maneira da


Matemática interagir e estar presente no contexto interdisciplinar com as demais áreas de
conhecimento. A modelagem aborda um problema real e utiliza modelos matemáticos para
interpretar e propor soluções para esse problema (TOMAZ; DAVID, 2018).
Ainda, segundo Tomaz e David (2018, p. 24):

Dentro de algumas abordagens da modelagem matemática, a interdisciplinaridade pode se


configurar ainda por meio de outras estratégias, por exemplo quando se parte de uma
situação-problema que não estava inserida nem na discussão de um tema amplo, nem no
desenvolvimento de um projeto. Nessas situações, o aluno também não dispõe de um
método de solução definido previamente e para construir esse método, ele precisa fazer
uma investigação, usando mais do que meios matemáticos. Ao desenvolver a investigação
para resolver o problema proposto, o aluno pode ter necessidade de fazer reflexões que o
conduzam a um crescimento social e político.

A Modelagem matemática, entre outras estratégias, pode ser um caminho consolidado para
a formação integral do estudante dentro do que é proposto nas dez competências básicas da BNCC,
colocando a Matemática como peça que se encaixa perfeitamente na solução de qualquer situação-
problema proposto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após muitas leituras e análise de documentos oficiais e legislação vigente, esse artigo
procura apresentar os elementos para instigar professores de Matemática, que atuarão no Novo
Ensino Médio a repensar e reelaborar a sua prática educativa, buscando a sua formação integral e
consequentemente de seus educandos.
Fica evidente, em toda a trajetória, a indissociabilidade entre teoria e prática no processo de
ensino e aprendizagem, pois as novas demandas exigem um olhar diversificado que considere a
realidade dos estudantes, de suas formas de aprender e apreender, bem como de suas vivências e
culturas. Com isso, é necessário a oferta de múltiplas trajetórias com articulação ativa aos diversos
saberes historicamente construídos. Compreende-se que a formação integral permeia entre diversos
saberes olhando o estudante como parte de um todo, com todas as suas vivências e como parte de
um sistema que vai além dos limites da escola. A mediação interdisciplinar dos componentes
curriculares se apresenta como a melhor opção para o alcance dos objetivos propostos pelas dez

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competências gerais da BNCC, bem como para as competências e habilidades propostas para o
ensino da Matemática.
No processo de escuta dos professores, fica evidente que não há uma compreensão sobre o
que é, onde e como introduzir a interdisciplinaridade em suas metodologias de ensino, bem como
efetivar o diálogo com as demais áreas de conhecimento. Percebe-se o medo da desfragmentação e
a insegurança de quais caminhos seguir, inclusive quando se parte da própria concepção da palavra
interdisciplinaridade. Então, entende-se que o planejamento coletivo entre os professores da turma e
ou da própria escola é o ponto chave para que se cumpra o que está escrito tanto na Base Nacional
Comum Curricular quanto no Currículo Base do Ensino Médio do Território Catarinense e,
consequentemente, se obtenha êxito no que institui a Lei Federal nº 13.415/2017 do Novo Ensino
Médio. Para as escolas da Rede Estadual de Ensino há a orientação de que esses diálogos sejam
feitos durante as aulas de planejamento instituídas pela Lei de Diretrizes e Base da Educação –
LDB/1996 e suas alterações. Para isso acontecer, é primordial um novo olhar sobre o trabalho
pedagógico e uma reestruturação dos tempos de planejamento que devem passar do individual para
o coletivo. Há a real necessidade de se desmistificar o conceito de interdisciplinaridade no contexto
da prática pedagógica, fortalecendo a cooperação entre os pares e qualificar o processo educativo.
Há a necessidade, também, de se despojar da possessão do conhecimento fragmentado de
cada componente curricular e se abrir para um leque de possibilidades didático-pedagógicas. Com a
não seriação dos conteúdos e a possibilidade de termos estudantes de várias turmas interessando-se
em um único componente eletivo ou uma trilha formativa, por exemplo, nos demonstra que
realmente precisamos estar preparados para uma perspectiva que perpassa para além do que
tradicionalmente costuma-se mediar em sala de aula.
Ao se evidenciar que os professores não estão totalmente preparados para as mudanças,
percebe-se que a formação inicial e continuada é indispensável para que haja uma construção
coletiva e um novo olhar sobre o processo de ensino e aprendizagem. A formação precisa ser
repensada de forma a tornar os professores capazes de entender, ampliar e dominar estratégias
pedagógicas que ampliem os processos cognitivos dos estudantes, numa articulação dos
componentes das áreas do conhecimento. O estudante precisa ser o protagonista de seu percurso
formativo e isso exige que o professor esteja preparado para novos entendimentos. Isso é uma
situação que assusta inicialmente, mas necessária de ser organizada por todos os envolvidos no

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processo, com estudo, troca de experiências, protagonismo, proficiência, proatividade, muita


paciência e resiliência.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei N 13.415. Atualiza a Lei N 9394/1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, 2017.

BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9.394/96 de 220/12/1996.

FAZENDA, Ivani Catarina Arantes (Org.). O que é interdisciplinaridade? 2.ed. São Paulo:
Cortez, 2013.

FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. FERREIRA, Nali Rosa Silva. (Org.). Formação de docentes
interdisciplinares. 1.ed. Curitiba: CRV, 2013.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Aurélio Júnior: dicionário escolar da língua


portuguesa. 2.ed. Curitiba: Positivo, 2011.

FUNDAÇÃO Lemann. O que é BNCC. 2020. Disponível em: <


https://fundacaolemann.org.br/noticias/o-que-e-a-bncc?
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Mb0bXoXZLfdshoC4yAQAvD_BwE>. Acesso em: 18 de janeiro de 2022.

MARCHELLI, Paulo Sergio. Base Nacional Comum Curricular e formação de professores: o foco
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2017.

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