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CANDIERO

HISTÓRIA E CULTURA
AFRO-COLOMBENSE
ROMPENDO O
CONSENSO DA INVISIBILIDADE
E A VISIBILIDADE DO CONSENSO

FEV/2021
EDITAL
“MEMÓRIA
COLOMBENSE”
PREFEITURA DE COLOMBO
SECRETARIA DE ESPORTE,
CULTURA, LAZER E
JUVENTUDE
EDITAL Nº 009/2020
FOMENTO - LEI ALDIR BLANC
CANDIERO
Adegmar José da Silva - é compositor,
batuqueiro, capoeira, sambador, pai,
professor, ativista, fundador do Centro
Cultural Humaita - Centro de Estudo e
Pesquisa da Arte e Cultura Afrobrasileira;
foi Assessor Municipal de Politicas de
Promoção da Igualdade Racial de Curitiba;
Conselheiro Nacional de Cultura;
Conselheiro Nacional de Promoção da
Igualdade; membro da Comissão da
Verdade sobre a Escravidão Negra no
Paraná; membro do Centro de Letras e da
Feira do Poeta; membro do Fórum
Permanente de Educação e Relações
Etnicoraciais do Paraná, entre outros. Há
mais de 30 anos luta pela valorização e
visibilidade da presença negra e das
heranças culturais afro-brasileiras no
Paraná.
APRESENTAÇÃO
*Melissa Reinehr

Candiero é um griô contemporâneo narrando


histórias, compartilhando saberes e exemplos
aprendidos com os mais velhos. Há mais de vinte
anos, iniciou sua trajetória de pesquisa e ensino de
história e cultura afro no Paraná e de incidência
política em conselhos, fóruns e conferências. Sua
trajetória de vida tem sido dedicada à promoção da
cultura, da igualdade e do respeito.

Sua capacidade de se indignar perante as injustiças


nas narrativas oficiais o levaram a buscar um amplo
arcabouço legal e teórico de apoio à construção de
novas perspectivas para a narrativa histórica
paranaense. Candiero ministrou palestras em diversas
cidades do Paraná e do Brasil. Também realizou
palestras em Compiègne e Cabo Verde, nos
continentes europeu e africano. Desenvolveu intenso
trabalho de valorização e visibilidade da presença
negra e da cultura afro e tornou-se uma referência.

A frente do Centro Cultural Humaita – Centro de


Estudo e Pesquisa da Arte e Cultura Afro-brasileira,
realizou inúmeras ações que beneficiaram de forma
concreta a sociedade paranaense no âmbito da
educação e da cultura.
Em 2015, criou uma pequena editora especializada em
Literatura Negra e Oralidades Afro-paranaense. O
autor possui textos em diversas coletâneas e livros
publicados sobre história e cultura afro, narrando em
linguagem poética episódios e personagens negras
da História do Paraná.

Pela Editora Humaita publicou os seguintes livros:


Afrolapeanos; À Congada com carinho; Poemas para o
santo negro; Afrocuritibanos: crônicas, manifestos e
pensamentos azeviche; Oralidades afroparanaenses:
fragmentos da presença negra na História do Paraná.
Este último livro resultou na elaboração do Caderno
Pedagógico Oralidades Afroparanaenses, com artigos
de professores PDE e orientação da Prof. Edna
Coqueiro - presidente do Conselho Estadual de
Promoção da Igualdade Racial do Paraná, Mª Celia
Tokarski, Mª. Tania Pacífico e Dra. Edimara Soares - a
primeira doutora quilombola do Brasil.

O desafio de acabar com os mecanismos de exclusão


e discriminação da população afrodescendente é uma
realidade a ser enfrentada pela nossa geração: a
primeira geração a aprender e ensinar história e
cultura afro em sala de aula; a primeira após a
Constituição Cidadã determinar a “igualdade de
acesso aos direitos básicos de cidadania para todos,
sem distinção”; a primeira a vivenciar uma
democracia participativa no país e poder opinar na
elaboração das políticas públicas.

O texto História e Cultura Afro-colombense foi


produzido para o Edital “Memória Colombense”, da
Prefeitura de Colombo - Secretaria de Cultura,
Esporte, Lazer e Juventude, através da Lei Aldir Blanc.
Nele, o pesquisador compartilha algumas reflexões e
contribuições africanas e afrobrasileiras
invisibilizadas na História de Colombo, a partir de sua
vivência pessoal.

A proposta do trabalho é valorizar a presença negra


em Colombo e fornecer subsídios que ajudem a
“romper o consenso da invisibilidade” tão bem
descrito na tese da Dra Lena Garcia.

A invisibilidade da população negra no Paraná e,


especialmente em Colombo, é amplamente difundida
em narrativas eugênicas que negam a existência e
participação da população negra que seria, no
máximo, uma "contribuição diminuta”, caricaturizada,
pejorativa. A visibilidade deste “consenso da
invisibilidade” é recorrente. Cada órgão público -
executivo, legislativo e judiciário - dá a sua pequena
parcela de contribuição para “a visibilidade do
consenso”: educação, turismo, cultura, patrimônio,
urbanismo, historiografia, comunicação... A ideologia
racista, que já foi defendida como “racismo científico”
no século XIX foi superada no âmbito biológico,
porém permanece e se enraizou como “racismo
cultural” - explorando a ideia de uma suposta
“superioridade cultural branca”.
Vigora em nosso município uma narrativa que só
valoriza a contribuição dos imigrantes que chegaram
no final do século XIX e, portanto, são a segunda leva
de pessoas a chegar no território. Essa visão racista
da superioridade branca permanece forte e fica
evidenciada no tratamento dedicado à terceira leva
de imigrantes - os haitianos e venezuelanos -
atualmente, em Colombo.

Na primeira parte do texto, intitulada “Presença Negra


no Jardim Osasco”, Candiero descreve o rico
panorama de manifestações culturais negras
vivenciadas no bairro durante as décadas de 70, 80 e
90.

A partir da exclusão da população afrodescendente


do Guia Histórico Cultural de Colombo, lançado pela
Prefeitura em 2011, Candiero passa a questionar
sistematicamente as narrativas oficiais produzidas
sobre a população afrodescendente desde o pré e
pós-abolição, em busca de subsídios.

Quem somos?
De onde viemos?
Para onde vamos?
Com olhar aguçado de poeta, Candiero se volta aos
séculos anteriores à chegada dos imigrantes, em
busca de elementos de identificação positiva para os
afro-colombenses. Garimpando o “ouro” da
ancestralidade, ele chega aos ancestrais africanos e
originários neste solo sagrado que mais tarde viria a
tornar-se o Município de Colombo. Este “garimpo” de
informações consistentes que o ativista reuniu,
embora não exaustivos, inaugura uma perspectiva
inovadora sobre a história do Município, antes
associada exclusivamente à instalação da Colônia
Alfredo Chaves, no final do século XIX.

É nos séculos XVI e XVII que Candiero identifica a


primeira grande contribuição africana invisibilizada
pelas narrativas da história “eugênica” criada pelos
paranistas. Um dos mais antigos povoados que se tem
notícia no planalto curitibano foi justamente o arraial
de mineração às margens do Rio Atuba, antes da
Praça Tiradentes tornar-se a sede da Vila Nossa
Senhora da Luz e Bom Jesus dos Pinhais, hoje
Curitiba.

Recorrendo ao conhecimento sobre as “tecnologias


milenares africanas”, Candiero traz pistas que
permitem inferir a presença africana nas entrelinhas
da narrativa escravocrata.
Esperamos que novos pesquisadores aprofundem
esses temas tão ricos e necessários para a
reconstrução da identidade afro-colombense e afro-
paranaense. Afinal, a história da escravidão pertence
aos escravizadores, não aos africanos e seus
descendentes.

A prova de que existiu escravidão no Paraná é o fato


de que, para receber carta de sesmaria, uma condição
requerida pela Coroa Portuguesa era o solicitante
possuir escravaria para dar conta de explorar a terra.
E a Sesmaria que correspondia ao território
colombense foi a Sesmaria do Palmital, apresentada
na penúltima parte do texto. O Ciclo do Ouro, o
Tropeirismo e o Ciclo do Mate são pontos-chave da
cronologia histórica do Paraná. Mesmo depois de
abolido o sistema escravista, o Estado e os Municípios
insistem em manter na invisibilidade e discriminar as
populações negra e indígena. E essa política não se
limita às narrativas, mas vai ao cúmulo da chamada
“necropolítica”.

Para concluir, o griô nos convida a reconstruir a


História do Município e superar as narrativas racistas
em busca de uma Colombo com mais isonomia e
menos eugenia.

* Melissa Reinehr tem livros escritos em co-autoria com Candiero e publicados pela Editora Humaita; é

presidente do Centro Cultural Humaita - Centro de Estudo da Arte e Cultura Afrobrasileira, Conselheira

Estadual de Promoção da Igualdade Racial do Paraná, atriz e contadora de histórias.


CANDIERO

HISTÓRIA E CULTURA
AFRO-COLOMBENSE
ROMPENDO O
CONSENSO DA INVISIBILIDADE
E A VISIBILIDADE DO CONSENSO

1. PRESEÇA NEGRA NO JARDIM OSASCO


2. GUIA HISTÓRICO-CULTURAL DE COLOMBO
3. A ANTIGA POVOAÇÃO DO ATUBA
4. TECNOLOGIAS MILENARES AFRICANAS
5. SESMARIA DO PALMITAL
6. A INVISIBILIDADE COMO MECANISMO DE
DISCRIMINAÇÃO
7. CONCLUSÃO
1.
PRESENÇA NEGRA
NO JARDIM OSASCO
A geada negra obrigou muitos de nós a saírem do
interior. Chegando aqui, fomos morar à beira do rio Atuba,
às margens do palácio de Mamãe Oxum… Isso foi antes
de minha mãe comprar a terra onde mora até hoje, no
Jardim Osasco. Não tinha rua, os caminhos eram trilhas,
carreiros e picadas. Não tinha pontes, para atravessar os
rios se fazia uma pinguela. Nenhum prédio, poucas casas,
tudo ali era verde, com pomares de maçã, caqui, pera e
uma chácara com plantação de cedro e criação de bois.
No mais, mata fechada aberta a facão.

Eu sempre quis saber quem tinha morado aqui antes de


nós e descobri que desde os primeiros povoados,
fazendas e sítios, havia, e há, presença africana. Desde
tempos imemoriais, a região de Colombo abrigou povos
caçadores-coletores da pré-história, e mais recetemente,
era território da nação Tinguí.

A região onde eu cresci já foi chamada de Sesmaria do


Palmital, na época em que a busca do ouro nos leitos dos
rios pelos “Campos de Curitiba” movia o início da
colonização portuguesa, com registro de povoação às
margens dos rios Atuba, Palmital, Capivari, Bacaetava.
Eu nasci na década de setenta, em Goioerê, norte do
Paraná, filho de pai baiano e mãe paulista. O padrinho
vô João Luis era carroceiro (de burro) e “carreiro”,
conduzindo carros de dez ou doze bois, no norte do
Paraná. A vó Sebastiana era cozinheira de mão cheia.
O bisavô Januário tinha como profissão ser "candiero",
como eram chamados os que iam na frente,
direcionando os bois do carroção.

Meu nome de batismo é Adegmar José da Silva. Sou o


caçula de nove filhos e a minha mãe ainda adotou
mais dois. Em casa, meu apelido era Dega e, na
capoeira, era Sombra. Muitos anos passaram até que
os mais velhos me rebatizassem como Candiero.
Zelador Cultural Candiero.

Embora meu pai seja um homem negro e minha mãe


uma mulher negra, eu misteriosamente fui registrado
como pardo. Hoje sei que essa categorização fazia
parte do processo de embranquecimento da nação.
Mas eu sou preto e com orgulho.

Cheguei em Colombo aos três anos e me considero


colombense. Cresci e me desenvolvi aqui, encontrei
meu norte e me tornei quem sou graças às
experiências que tive e, daqui, já fui bem longe. Eu
lembro nitidamente daquela efervescência de brincar
na beira do Rio Atuba - cacei preá e pesquei peixe
feito curumim e, no leito da mãe d'água, encontrei
minha ancestralidade.
Lembro da pré-escola, no Olaria. Eu não tinha bolsa e
sapato adequados e lembro do tratamento
diferenciado que recebia sem entender o porquê.
Entendi algum tempo depois, vendo como a
professora do primeiro ano, no Roça Grande, tratava a
mim e as minhas colegas negras.

Qual era o problema dela com a nossa cor? Por que


ela dizia que o nosso cabelo era “ruim”? Cheguei a ter
pesadelo achando que meu cabelo ia me atacar. Hoje
eu percebo que esse desdém, esse desprezo, esse
descaso do racismo não alivia ninguém da pele preta,
nem as crianças. Ali eu entendi que, se eu quisesse
desenvolver todas as minhas potencialidades como
ser humano, teria que aprender a me defender. Era
uma questão de sobrevivência. Como diz Mano
Brown, você tem que ser duas vezes melhor para ser
tratado como quase igual.

É na escola que a gente começa a perceber que tem


alguma coisa errada. Imagine você ainda criança ter
que enfrentar a maldade e aprender a dialogar com a
hostilidade na escola, vindo de quem deveria te
ensinar e te preparar para os desafios do mundo. Em
minha casa, não tinha como conversar sobre esse
assunto. Meu pai veio de uma cultura rural, minha
mãe também. A vida deles era trabalho e hora extra
até no final de semana. Educação para os filhos? A
orientação era:
- Seja honesto. Estude. Trabalhe.
Então apareceu o Gerson; ele tinha uns 14 anos e
trabalhava na Guarda Mirim, em Curitiba. Ele tinha
um aparelho de som 3 em 1, tinha discos, ensinava
uns passos de dança e sempre trazia uma novidade
pra gente. Ele se identificava demais com a cultura
norte-americana. Michael Jackson era um ícone pra
nós: um menino negro ganhando o mundo.

A gente se encontrava todos os dias na frente da


Escola Júlia Cavassin e ficava treinando aquele passo-
a-passo que vinha nas revistas. Tinha o Carlos; o
Santos, que hoje é mestre da Chute Boxe; o Danilo,
que hoje é mestre de capoeira; tinha o Siderley, que
hoje é capitão da Polícia Militar e além de dançar,
tinha muita habilidade no futebol; o Jairo, que é
bombeiro. A gente dançava, jogava futebol, handebol,
vôlei, corria. Assim começou o convívio dessa turma
de jovens negros e não-negros que se identificavam
uns com os outros e com a cultura. De forma fraterna,
intuitiva, a gente foi se desenvolvendo.

O pai dos Santos, o sr. Romualdo, era uma espécie de


griot e ensinava a gente a lutar boxe. Ele gostava de
samba de partido alto e de Bezerra da Silva. A gente
escutou muito samba junto com eles e se identificou
demais com aquela batucada cheia de ensinamentos,
de conselhos e de advertências.
O meu irmão mais velho trazia referências das
escolas de samba de Curitiba. Também começou a
ensinar cantigas e passar alguma coisa de
instrumentos. Minha família conta que meu pai era
jogador de faca e batia maculelê. Eu não aprendi, mas
meus irmãos mais velhos devem ter aprendido
alguma coisa. O tio João era da moda de viola, das
cantorias antigas, das cantigas de roda. Todas essas
referências culturais estão germinando em torno de
mim.

Um dia, o nêgo Gerson levou a gente para fazer uma


apresentação de break na Câmara de Vereadores de
Curitiba. Eu não sei se tinha outros grupos de break
na época, pelo menos não se via. A gente começou a
ser chamado para fazer apresentações em tudo que é
lugar. Quando eu converso com os grupos que estão
constituídos hoje, eles sempre dizem que começaram
depois de nós. Era o tempo dos passinhos que agora
voltaram à moda e o hit, em 1984, era “Mas que linda
estás”, do grupo Black Juniors.

Em 1985, a gente teve a oportunidade de ver vários


artistas negros talentosos reunidos, cantando “We are
de world”. Nós éramos crianças e não entendíamos o
que estava acontecendo nem o que eles estavam
cantando, mas a mensagem era muito forte.
Era um movimento bonito, de brancos e negros
juntos, que se destacavam pelo seu talento, pela sua
voz, e isso também nos uniu, mexeu com a gente, nos
tocou. Nós ficávamos tentando imitar, tentando cantar
em inglês.

As nossas primeiras referências de cultura negra


eram norte-americanas. Mas ao mesmo tempo havia
aquele movimento “ouça rap nacional” e de
valorização da cultura afro-brasileira. Um dos grupos
mais importantes de rap do Paraná é o Arquivo
Negro, de Colombo. Temos também a Associação
Paranaense da Cultura Hip-Hop.

A experiência com capoeira foi um rito de passagem,


um divisor de águas para mim. Eu via o meu irmão
Zeca e o Doca tentando dar rasteira um no outro, um
tentando pegar, derrubar e ver quem era mais ligeiro
que o outro. O Doca era menor que o meu irmão e,
um dia, eu vi ele dando uma rasteira violenta no meu
irmão, que levantou e também derrubou o Doca.
Dando risada! Eles estavam brincando, mas era uma
brincadeira séria. Era uma luta onde o fraco e o forte
podiam vencer, a vitória era dos dois. E eu falei:
- Nossa, eu quero aprender isso!
Por ser menor, eu chegava perto deles e eles não
queriam me ensinar. Tive que ser chato para eles me
ensinarem umas coisinhas. Perguntei onde eles
aprendiam e eles me falaram do professor Baiano,
que dava aula no final de semana, porque trabalhava
como pedreiro. A aula era em uma salinha na casa
dele, onde só cabiam quatro pessoas. Ele arrastava o
sofá e dava aula para o meu irmão Zeca, o Doca e
outras duas pessoas. Depois, o mestre vendo o
interesse das pessoas que paravam para assistir a
aula, procurou um lugar maior, onde dava para treinar
seis pessoas. Foi a primeira Escola de Capoeira de
Colombo que se tem notícia e existe até hoje, com o
nome de “Academia Ânsia de Liberdade”.

Não era uma capoeira com berimbau, com


instrumentos, era mais um tentando derrubar o outro.
A criançada ficava em volta, olhando pela janela. Eu
me encantei. Eu nunca tinha ouvido música de
capoeira e a aula era com uma fita cassete dos
mestres Dirceu e Suassuna. Aquela música mexeu
comigo, me tocou, tomou conta de mim. Eu me
lembro de todas as cantorias, eu decorei todas. Foi
uma coisa que me pegou, me arrebatou e me colocou
no meu lugar. A capoeira me chocou. É a minha
herança ancestral. E eu estava só olhando.
Tudo o que eu via nas aulas, tentava repetir em casa,
fazer os mesmos movimentos. Só que a capoeira é
coletiva e eu precisava de novas pessoas, porque
você aprende junto, treina junto, toca junto, corre
junto, alonga junto e faz tudo junto. Aí vieram meus
parceiros de break, o Carlão, que já tinha essa coisa
da luta e se identificou de imediato, o Danilo, o
Luizinho Vermelho, o Luiz Negão, o Severino, o
Joãozinho, o Nei e o Serginho para treinar capoeira
também.

Quando passamos para o quinto ano, fomos todos


estudar no Colégio Estadual Bento Munhoz da Rocha
Neto, no Moinho Velho, e nessa nova escola tinha
mais pessoas negras. A amizade foi aumentando e a
gente conversava, trocava muita ideia, aprendia muito
uns com os outros.

Eu sempre me interessei pelos nomes dos lugares. O


Bento, por exemplo, foi um Governador do Estado e
uma das pessoas que propagaram esse discurso
eugenista de branqueamento do Paraná. Ele escreve,
em 1969, que “a contribuição do negro foi diminuta na
formação étnica do Paranaense”. Ele fazia parte do
Movimento Paranista, liderado por Romário Martins,
que, em 1955, escreveu “Assim é o Paraná (...)
acrescentou ao Brasil uma nova dimensão, a de uma
civilização original construída com pedaços de todas
as outras. Sem escravidão, sem negro, sem português
e sem índio, dir-se-ia que sua formação humana não
é brasileira”.

Mas, até o momento, o comentário eugenista que


mais chamou minha atenção foi aquele de David
Carneiro, referindo-se aos traços negróides da
escultura do Homem Nu, um monumento à
emancipação política do Paraná, na inauguração da
Praça 19 de dezembro. Ele disse: “a obra não
representa coisa nenhuma e muito menos o homem
do Paraná, dolicocéfalo, louro e belo”.

Dolicocéfalo? Esse jargão eugenista eu nunca tinha


ouvido. Foi ele que me levou a descobrir os horrores
que eu não gostei de saber que existem e inspiram
tantos intelectuais em nosso Estado.

Nessa escola tinha uma professora negra, linda, maravilhosa, a


professora Heloísa, que foi uma mãe pra nós e fez toda a
diferença. A gente se destacava no esporte e na dança e ela via
aquela molecada do gueto, da periferia, se dedicando,
dançando na hora do recreio, dançando antes da aula, nos
encontros de cultura da escola e começou a nos incentivar a
desenvolver os nossos dons e mostrar os nossos talentos.
E depois teve a professora Elisabete, de matemática, que
comprou um disco do Modern Talking e nos deu de presente.
Era um disco duplo, que a gente não teria dinheiro para
comprar, a gente nem saberia onde comprar aquilo.

Os meus irmãos Zinho e Zeca - o Zeca já faleceu,


eram muito respeitados na comunidade. E por que
eles eram respeitados? Eles eram bons lutadores e
todo mundo temia eles. E, claro, eles trabalhavam,
podiam se vestir melhor, se informar melhor, eles
tinham esse diferencial. Eu queria isso para mim
também. Todos nós queríamos.

No final de ano, a tradição era passar na casa da D.


Rita, comer na casa do seu Zé da Base e celebrar em
frente ao bar do Tetê, filho da dona Alice. Nós
dançávamos break, aprendíamos boxe, treinávamos
capoeira, jogávamos futebol, nos encontrávamos na
escola de samba. Era muita batucada e cantoria…

Há muitas famílias negras no Jardim Osasco: a nossa,


a do Dolfo, do Edno, do Laercio, do Sr Caetano, da D.
Rita, do Juarez , o Zinho, do Sr. Romualdo, pai do
Carlos, da D. Alice, mãe do Alta, do Donias, do Gerson,
do Jairzão, do Danilo, do Matias do mercado, do Chico
e da D. Mercedes, do Sr Otacílio da Cruz, do Nilson e
do Sebastião Oliveira, do Sidval, do Nivaldo Farias,
o nêgo Mussa, do B.A., do Gilson Inácio, do Natanael
Ribas, do Marielson Almeida, do Cristiano “Geleia”, do
Adilson, do Marcão, do Nego Pita, do Serginho, do
Airton, filho do seu João doceiro, dos Turora Dias, do
Valmor, do Vanderlei Souza, o “Pelé”, do Leco e da
Maninha, do Severino, do Luiz Negão, do Joãozinho e
da Cenira… é muita gente e não estão todos citados,
apenas alguns contemporâneos mais próximos. Em
2011, organizei uma premiação na Câmara de
Colombo, para celebrar o Ano Internacional dos
Povos Afrodescendentes proposto pela ONU. Cem
famílias tradicionais afro-colombenses foram
homenageadas. Esse trabalho de pesquisa sobre as
famílias negras tradicionais de Colombo merece ser
aprofundado.

Hoje, eu me dou conta do quanto eu cresci me


sentindo protegido no Jardim Osasco, com muitos
pares em meu entorno. Ao mesmo tempo, havia
famílias caboclas, descendentes de indígenas, de
portugueses, de poloneses e eu não via o
preconceito. A violência explícita do racismo só
apareceu quando eu namorei uma menina branca.

Andar em grupo era uma questão de sobrevivência.


Um negro andando sozinho que encontrava uma
turma poderia ser linchado, naquela época.
Eu era pequeno e não podia entrar no baile, mas ia
junto e ficava na frente, olhando. Era uma diversão. O
pau cantava e as peixeiras São Gabriel eram famosas
e reluzentes não só para abrir picadas na mata.
Quando eu digo que tem que saber lutar, saber se
defender e saber correr, é coisa séria. Myke Tyson era
um ícone. Os filmes de luta eram um sucesso. Todo
mundo tinha que saber lutar bem se quisesse
sobreviver.

Eu me lembro do negro Alta, o Altair, que era faixa


preta de karatê. Você entende o que representa ter
uma escola de karatê no bairro, com um mestre
preto? A identificação imediata que as pessoas
tiveram? A gente aprendia a lutar e esse cara estava
ali para ensinar. Num tempo em que a gente ainda
vivia aquela perseguição de “cabelo ruim”, de ter que
alisar, raspar ou só andar de boné, esse mestre usava
um Black Power.

Havia uma energia de liberdade no ar (um grito que


até hoje ainda está meio engasgado) pois estava
chegando o centenário da abolição e as pessoas
estavam se mobilizando em torno daquilo. O Estado
teria que dizer alguma coisa sobre aqueles 388 anos
de escravização.
Ser aceito no grupo dos mais velhos, encontrar
pessoas de outros bairros, estudar a noite na escola
nova, um espaço mais sociável, se apresentar com o
grupo de dança e trabalhar como servente de
pedreiro, tudo isso acelerou o meu crescimento.

A gente treinava capoeira com o seu Baiano no final


de semana e começamos a fazer parte dessa
turminha de sábado. Durante a semana a gente dava
um jeito de se encontrar e treinar e eu comecei a me
dedicar cada vez mais à capoeira. Foi uma coisa que
me apaixonou, que me tocou, que mexeu com a
minha alma e me virou do avesso, que me deu um
chão, me deu identificação.

O Ivair treinava na Muzenza e tinha um professor


chamado Gamaliel. O Gamaliel ensinava para ele uma
capoeira mais de chão, uma capoeira “barravento”,
com outro balanço, outro molejo. Eu não conheço a
história do Gamaliel, ele veio de fora com essa
capoeira diferente e isso foi nos complementando,
porque o Baiano era aluno do Mestre Sergipe, que
tinha um movimento alto, mais focado na luta. Na
Academia Ânsia de Liberdade não tinha tambor,
berimbau, pandeiro, era só um gravadorzinho e uma
fita que tocava todo dia, virava e tocava de novo, era
isso. Só tinha uma fita. Eu sou deste tempo da fita
cassete e do vinil, em que se ouvia os dois lados da
“história”...
Foi o Ivair que me trouxe essa informação de que na
capoeira tinha berimbau, atabaque e pandeiro. E eu
ficava pensando: - Por que o Ivair está tendo essa
capoeira tão musicalizada e nós uma capoeira bélica,
marcial? Eu comecei a questionar e fui atrás. Mas
naquela época não se encontrava berimbau para
comprar em qualquer lugar, muito menos pandeiro.
Atabaque, sim, tinha nas lojas de artigos de religião.
Aliás, era lá que eu encontrava fitas e disco de
capoeira para comprar, justamente nesses espaços
que só agora estão chegando aqui em Colombo, há
uns 4 ou 5 anos. Antes não tinha, era tudo muito
escondido.

A gente ia trabalhar lá no Sítio Cercado e no Santa


Quitéria, em uma Kombi lotada, duas ou três pessoas
na frente, mais nove ou dez atrás. Trabalhava o dia
inteiro carregando pedra e, na volta, só pensava em ir
para a capoeira, descansar. Imagine o que era sair às
5:30 da manhã escutando hinos evangélicos, com
aquelas pessoas olhando para nossa cara e cantando
“drogas matam, aceite Jesus”, nos torturando. Porque
ninguém ali era drogado, mas o fato de ser preto
induzia eles a pensar que a gente era drogado e eles
precisavam salvar a nossa alma. Aquilo não fazia o
mínimo sentido para mim.
Eu tinha feito catequese, jogava capoeira no terreiro,
no domingo ia pra Missa e muitas vezes ficava na
porta entregando as leituras para as pessoas. Eu tinha
uns 13 ou 14 anos de idade.

Quando saiu o salário, eu pedi para o motorista da


kombi parar na André de Barros, que eu ia comprar
um instrumento musical e voltei com o atabaque de
1,5m, o maior de todos, quase maior do que eu.
Imagine a cara que eles fizeram.

Eu tive esse impacto negativo com a minha mãe e o


meu pai também. Eles não gostavam da capoeira,
diziam era coisa de marginal, que não queriam a
gente nisto. Mas quando perceberam que não tinha
como, que eu e meus irmãos estávamos totalmente
embriagados e envolvidos pela capoeira, a minha mãe
abriu um espacinho e permitiu a gente treinar aqui
em casa, para não ficar treinando na rua, dançando na
rua. Ela permitiu que a gente colocasse até um saco
de pancada.

Todo sábado, lá ia eu para a aula de capoeira com


aquele atabaque nas costas, da minha casa até a casa
do seu Baiano. Dava um trabalhão, mas era um
orgulho tão grande atravessar várias quadras do
bairro com aquele tambor enorme.
Era motivo de orgulho, de alegria, de identificação e
satisfação. Na minha ingenuidade, eu não fazia ideia
do quanto as pessoas olhavam aquilo com desprezo.
Algumas delas diziam que era um símbolo do mal, um
instrumento diabolizado, uma coisa satânica. Para
muitos, um preto carregando um atabaque é Magia
Negra… E caso você não saiba o que é Magia Negra,
sugiro que leia o texto do poeta Sérgio Vaz.

Todo esse movimento de capoeira me aproximou de


um rapaz que é ogan do terreiro da Dona Gigi. O
Tibes era um pouco mais velho e tocava muito
atabaque. Eu via a habilidade dele em tirar som e
fazer batucada percutindo em balde, batucando na
mesa e isso me inspirou a ter meu próprio atabaque.
Quando saiu o primeiro salário, eu tirei uma parte
para a minha mãe. Foi quando comprei o atabaque e
o Tibes foi me explicando os toques, como tirar som
do instrumento. Ele falou com a mãe dele e ela abriu
o espaço do terreiro para que a gente pudesse treinar
lá também. Era muito gostoso. O terreiro da mãe Gigi
é um candomblé dedicado à mamãe Oxum. Tinha
uma roda desenhada no chão, o clima era muito bom.
E lá tinha três atabaques.

Nesse meio tempo, o meu irmão que trabalhava com


madeira, fez um berimbau. Conversando com a galera
do samba, logo apareceu um pandeiro.
Quando foi criado o Centro Social do Jardim Osasco,
a gente já treinava com atabaque, berimbau e
pandeiro. O lugar tinha uma quadra de esporte, vôlei,
basquete, futebol de areia e um espaço de grama
muito grande, ideal para a gente treinar. A gente
ficava horas e horas lá. Treinava mil pontapés, saltos,
tocava os instrumentos. O Santos foi o primeiro a
conseguir dar um salto mortal na grama. O Ivair era
um acrobata nato, um capoeira refinado, com
movimentos limpos, inspirando todo mundo a treinar
floreios. O Vipieski não era capoeira e nem era preto,
mas era bom em todo o resto: break, samba, futebol,
etc.

Uma outra galera se mobilizou e criou o Negritude


Futebol Clube. E tinha uma negrada bonita de outros
bairros que vinha sempre nos campeonatos. O boxe
foi bem útil nessa época, afinal, o futebol pode ser um
esporte bem violento.

A criançada adorava ver a gente treinar e eu adorava


ensinar para as crianças o que eu aprendia. Quando
começamos a assistir outros professores dando aula,
percebemos que nós também poderíamos ensinar.
Foi quando eu e o Ivair tivemos a ideia de criar o
Liceu da Ginga. Montamos uma turma de adultos no
São Gabriel e uma turma de crianças no gramado do
Jardim Osasco.
Quando chegou a época das chuvas, a escola
ofereceu o pátio coberto pra gente continuar o
trabalho com as crianças no final de semana e, depois,
no contraturno. Foi um sucesso. O batizado teve mais
de cem alunos e participaram mestres importantes,
como o Mestre Kunta Kintê da Bahia e o Mestre Jim
Kelly. Até a prefeita veio prestigiar.

Eu me firmei como professor de uma forma muito


natural. Desde sempre a gente aprendia e ensinava
constantemente uns aos outros. Depois disso,
trabalhei na comunidade Girassol e em vários outros
espaços, em Curitiba, antes de começar um trabalho
permanente na Casa do Estudante Universitário - CEU
e depois no Diretório Central dos Estudantes -
DCE/UFPR. Eu queria melhorar a minha técnica e fui
em busca de novos conhecimentos. Participar de um
grupo de abrangência internacional me permitiu
viajar muito, conhecer novos mestres de capoeira e
de cultura popular e fazer o meu "mestrado". Mas esta
é uma outra história.

Com a vinda do Centro Social para o Jardim Osasco,


chega uma outra turma: o Dolfo, o Edson, o Dico, o
Edevaldo, o Jairzão, o Vico. Eles traziam uns sons
potentes, aqueles rádios grandes que eles usavam
para jogar basquetebol ouvindo rap.
A gente participava da Escola de Samba Unidos de
Colombo, onde uma outra negrada estava fazendo um
movimento muito bacana de samba, misturando essas
outras vertentes da dança que a gente teve que
aprender também. Eu não sabia sambar. Embora meu
irmão tivesse essa ligação com as escolas de samba
de Curitiba e a minha irmã fosse rainha da bateria e
porta-bandeira de Colombo, eu era mais novo e vivia
em outro universo.

O samba estava longe de mim. Isso mudou quando


eu comecei a escutar o enredo da Mangueira
gritando: “o negro samba, o negro joga capoeira, ele é
o rei da verde rosa da mangueira” e outras coisas,
como “será que já raiou a liberdade ou foi tudo
ilusão”. Estamos em 1987 e a nossa história e filosofia
estavam sendo ensinadas em sambas, no rap e em
músicas de capoeira e candomblé.

Só que o Ivair e eu, tínhamos outro diferencial, a


gente gostava de ler, estudar e pesquisar. As poucas
informações que encontrávamos, a gente xerocava, lia
e passava pro outro ler. Os poucos materiais que
tínhamos - fitas, discos, revistas - a gente trocava e até
hoje estão guardados como relíquias, porque, para
nós, são preciosidades. Não tinha internet, não tinha
livro circulando, era muita oralidade e pouco material.
O meu gosto pela literatura começou justamente na
construção civil, no horário do almoço. Havia um
senhor cearense que sentava todos os dias com sua
marmita e, depois de comer, ele abria um livro para
ler. Foi ele quem me mostrou a importância do livro.
Ele dizia que era importante trabalhar, mas tinha que
ler também e me deu dois livros que eu não entendia,
mas continuava lendo mesmo assim. O livro de
meditação do Munif Sadou e a Crítica da Razão Pura,
de Kant. Quem mora na periferia tem muito tempo
para ler dentro do ônibus, nesse trajeto Curitiba e
Colombo, Colombo e Curitiba.

Nessa mesma época existe uma comoção mundial:


pela libertação de Mandela; o grito contra o apartheid;
o Ilê Aiyê lá na Bahia com a Beleza Negra; as escolas
do Rio de Janeiro dando um espetáculo de negritude
na avenida. A escola de samba também nos dava
autoestima, porque na escola se materializa a questão
da dança, da beleza, da mulher negra, do corpo negro.
Sabe essa coisa de se requebrar inteiro, tanto no
samba quanto no break e na capoeira, isso é algo que
você precisa manifestar no corpo, na ginga, no
sapateado, no salto; é algo que pulsa no seu coração,
no seu sangue, nas suas veias, que te preenche e traz
uma satisfação imensa. Só que a cidade, a escola, a
igreja não compreendem essa Cultura e não sabem
lidar com isso. Por isso, nos marginalizam.
Eu me lembro que a Unidos de Colombo fez um
enredo lindo homenageando Curitiba:

“Nossa Senhora da Luz dos Pinhais


Nos protegei por muitos carnavais
Somos irmãos dessa feliz cidade
Capital dos nossos pinheirais.

Caprichosa, teu lixo é luxo


Respeitando a natureza
Compositores, escritores e pintores
Se inspiram em sua beleza

Mas eu vou…
Eu vou à Rua 24 horas,
Alto São Francisco ou universidade
Boca maldita de sorriso largo
Você tem Santa Felicidade

ARIANA,
Hoje a Colombo te abraça comovida
Maravilhosa, fulgurante, preciosa
300 anos, parabéns irmã querida”

(Autora: Thaysa Rocha)


Aquilo mexeu muito comigo, foi bonito, foi bacana. Na
época, ninguém se perguntou o que significava
“ariana”... Provavelmente, a gente achou que era o
signo do zodíaco.

O termo “ariana” faz referência à noção de


superioridade racial ariana pregada pela ideologia
racista nazi-fascista. Embora possa ser confortável
para alguns ser chamado de “superior”, esta ideologia
nefasta levou a Alemanha de Hitler ao holocausto - e
o espírito da época era o racismo científico (os
cientistas buscavam a comprovação científica da
superioridade biológica ariana) e as teorias
eugenistas justificavam o extermínio de judeus,
negros, LGBTQs, minorias religiosas, deficientes e
outros alegando que seria uma “limpeza” étnica
necessária, sanitária, desejável. Esse era o
pensamento vigente na Europa e ele foi trazido para
o Brasil desde o final do século XIX e início do Século
XX. Embora as teorias racistas tenham sido superadas
no universo científico, as ideias racistas infelizmente
permanecem em vigor, inclusive com defensores em
todo o país e, em especial, na Região Sul. Depois que
o racismo científico foi superado, o “racismo cultural”
se firmou. As ideias de superioridade civilizatória
eurocêntrica continuam fortalecendo os processos de
exclusão e discriminação das populações negra e
indígena.
Na escola de samba eu encontrei referenciais
importantes com quem eu comecei a me identificar.
Pessoas que me ajudaram a entender o racismo, esse
racismo silencioso que queima, mata, machuca. O
racismo velado da cidade de Colombo não é diferente
de Curitiba e outras cidades do Paraná.

Outra coisa importante que eu me lembro foi o dia


em que, no meio de uma festa, todo mundo parou
para assistir a televisão. Havia um movimento na
Câmara Federal, com um monte de gente ouvindo a
fala de Ulisses Guimarães. Tancredo foi eleito
presidente. Eu via a minha mãe assistindo aquele
negócio e eu não sabia o que era aquilo. As “Diretas
já”, o nosso país saindo da Ditadura e começando a
construir um Estado Democrático. A gente nem sabia
que havia ditadura, até hoje não se fala muito sobre
esse assunto. Isso nunca foi conversado, não foi
explicado o que estava acontecendo - nem pelos
professores nem em casa.

Hoje eu percebo que a nossa geração sofreu de


analfabetismo político e, se nós compreendêssemos o
que estava acontecendo, com certeza teríamos
posicionamentos políticos diferentes e isso teria
influenciado todo o nosso movimento cultural. Toda a
nossa geração. Nós seguimos o fluxo.
Seguimos os passos dos mais velhos. A maioria dos
pretos velhos que eu conheci eram pedreiros,
trabalhavam na construção civil. O meu primeiro
trabalho, qual foi? Ajudante de pedreiro. Não só eu,
como vários amigos. Outra profissão muito comum
entre os descendentes dos escravizados era ser
camelô. Foi o pai do Santos que nos ensinou essa
arte de, no carnaval, pegar o nariz de palhaço, vender
purpurina, vender água, essas coisas. O meu pai
também foi camelô. A minha irmã até hoje trabalha
com isso. Eu tive banca. De certa forma, a gente
reproduz as mesmas profissões de antigamente;
minhas irmãs vendiam sorvete e minha mãe era
lavadeira. A questão da culinária sempre foi muito
forte entre as mulheres, a maioria das pretas velhas
que a gente conhecia, as mulheres negras mais
velhas, eram cozinheiras de mão cheia. Mas qual é o
valor disso em uma cidade onde tem Festa da Uva e
só a polenta é exaltada?

Entre 1983, quando eu comecei a ter contato com a


cultura, e 2003, quando foi criada a Lei 10.639 que
determina a inserção da história e cultura africana e
afro-brasileira em sala de aula, foram 20 anos de
vivência e pesquisa da nossa história. Mesmo sendo
novo, sendo menino, eu me vi obrigado a contribuir e
compartilhar um pouco de tudo o que aprendi.
Esse trabalho de ensinar não começou porque eu
escolhi ensinar, mas porque a minha vida me
legitimou a falar das coisas que eu aprendi de uma
forma empírica.

Hoje, como membro da Comissão da Verdade sobre a


Escravidão Negra no Paraná, eu compreendo que a
ausência de registro da memória negra recorrente é
uma estratégia consistente e permanente de
discriminação.

Se queremos propor uma nova narrativa, uma nova


perspectiva da história colombense, contrapondo a
versão dos historiadores paranistas, onde os
conhecimentos e personalidades de africanos e
afrobrasileiros sejam relevante na formulação da
identidade regional “de todas as gentes”, quais
pressupostos podemos utilizar, na perspectiva da
promoção da igualdade, do reconhecimento, da
valorização da memória afro-colombense?
2.
GUIA HISTÓRICO-
CULTURAL DE COLOMBO
Em 2011, Colombo lançou o Guia Histórico-Cultural
ressaltando o “momento onde o mundo repensa os
seus conceitos sobre Cultura e a reconhece como um
direito do ser humano.” A Lei 12.288/10 acabava de ser
promulgada, instituindo o Estatuto de Promoção da
Igualdade Racial, e a ONU proclamava o Ano
Internacional dos Povos Afrodescendentes. Em seu
artigo 73, a Lei 12.288\10 prescreve que a produção
veiculada pelos órgãos de comunicação valorizará a
herança cultural e a participação dos afro-brasileiros
na história do País. Fiquei animado e fui ler o material,
ávido em busca das histórias dos nossos ancestrais
negros…

O que eu encontrei? O número de africanos


escravizados no Atuba, Palmital, Boixininga e Ribeirão
das Onças. O leilão de uma senhora e uma criança
“pertencentes” à família Ribeiro.
Fiquei indignado, pois o nosso Guia Histórico-Cultural
evidenciou a cultura afro e a presença da população
negra com ausências, esquecimentos, negações e
referências escravocratas e pejorativas - na
contramão do que diz a Lei 12.288/10.

Na ocasião, solicitamos formalmente ao Ministério


Público de Colombo a retirada e adequação do
material à luz dos novos conceitos de
reconhecimento e valorização da população
afrodescendente na nossa história. Apesar do
arcabouço legal e bibliográfico apontado, o pedido foi
negado pelo Promotor Público, Sr Cássio Honorato.
Ele argumentou que o Wikipédia nada mencionava
sobre o tema (sic!) e solicitou um “parecer técnico”
embasando a nossa argumentação.

Solicitamos o apoio da UFPR e, na época, ficamos o


vácuo. Em 2018, o Departamento de História da UFPR
lançou sua primeira publicação com artigos voltados
à temática afro-paranaense. Quem quiser saber mais
sobre a desigualdade criada pelos agentes da lei para
a população negra e não-negra, recomendo a leitura
do livro do professor Magnus Pereira sobre os 300
anos da Câmara de Curitiba, lançado em 1993.
Além da UFPR, quais outras instituições poderiam
fornecer tal parecer? As mesmas que alimentam a
narrativa oficial de um “Paraná branco” que surge
apenas no século XIX com a chegada dos imigrantes
europeus, invisibilizando trezentos anos de história
anterior em um processo descrito pela Dra Lena
Garcia como "o consenso da invisibilidade e a
visibilidade do consenso”, em seu doutorado sobre
“Ações afirmativas e inclusão de negros por cotas
raciais nos serviços públicos do Paraná”.

Passados dez anos da criação do Guia Histórico-


Cultural de Colombo, eis que o Edital “Memória
Colombense” nos proporciona uma nova
oportunidade de compartilhar considerações e
memórias da História e Cultura Afro-colombense.
Esperamos com este artigo contribuir para a
construção de uma Colombo mais plural, verdadeira e
igualitária.
3.
A ANTIGA POVOAÇÃO
DO ATUBA

Um dos mais antigos povoados que se tem notícia no


planalto curitibano foi justamente o arraial de
mineração às margens do Rio Atuba, antes da Praça
Tiradentes tornar-se a sede da Vila Nossa Senhora da
Luz e Bom Jesus dos Pinhais, hoje Curitiba.

Para reconhecer e valorizar a presença negra na


História e Cultura de Colombo, precisamos jogar luz
sobre o período anterior à fundação oficial dos
Municípios.

A origem dos primeiros povoados do Paraná está


ligada à exploração aurífera, nos primeiros séculos da
colonização (XVI-XVII). As duas principais vilas do
território - Paranaguá e Curitiba - foram fundadas
durante o chamado Ciclo do Ouro.
Neste primeiro período da nossa história, quem
detinha a tecnologia para extração do ouro eram os
chamados “faiscadores”, negros africanos da Costa da
Mina (onde havia muito ouro) trazidos para ajudar os
sertanistas povoadores, como ensina Gilberto Freyre.

Vale ressaltar que Gilberto Freyre é doutorado na


Sorbonne e no Rio de Janeiro, professor em várias
Universidades, dentre elas Harvard, Columbia,
Princeton, Coimbra e Salamanca. Na obra “Ferro e
Civilização no Brasil”, 1998. Ed. Record, ele afirma:

“esta parte tecnologicamente criativa do negro na


mineração brasileira de ouro e diamante não vem
sendo tão destacada como merecia, por
historiadores convencionais. Foi considerável.
Talvez se possa ir além e dizer que foi decisiva."

A busca pelo ouro foi o motor de desenvolvimento


das primeiras vilas do Paraná no litoral e nos Campos
Gerais - ouro que já era retirado em abundância pela
coroa espanhola em sua parte do Novo Mundo e
atiçava a cobiça portuguesa. É no contexto de
povoamento das capitanias hereditárias e de
exploração da Costa da Mina africana que os
portugueses fundaram as primeiras vilas do Paraná.
Este período inicial da História do Brasil guarda pistas
importantes para compreendermos as memórias afro-
colombenses invisibilizadas nas narrativas históricas,
bem como, nas narrativas das demais cidades
centenárias do Paraná.

No território hoje chamado de Colombo, houve


registro de faísca de ouro no Atuba, mas também há
registros de extração de ouro nos rios Palmital,
Capivari e Bacaetava.

Quando a Coroa portuguesa instala Capela (1650),


Pelourinho (1663) e Câmara (1693) na vila de Nossa
Senhora da Luz e Bom Jesus dos Pinhais, já havia
registros anteriores se referindo aos arraiais de
mineração, dentre eles o povoado na beira do rio
Atuba (Colombo).

O fato de não haver registro dos nomes, sobrenomes


e procedências desses “faiscadores” permite inferir
que não eram portugueses. Aliás, a antiga Capela do
Atuba – hoje fechada – permanece um marco
histórico importante da memória dos primeiros
povoadores da região e, ao meu ver, mereceria uma
atenção maior por seu significado histórico. Afinal, o
Atuba é o local onde se estabeleceu uma das
primeiras povoações do planalto, anterior à fundação
da Vila de Curitiba.
4.
TECNOLOGIAS
MILENARES AFRICANAS
Antes de mais nada, pensar a identidade
afrodescendente é romper com os preconceitos
arraigados na narrativa eurocêntrica, colonial, racista,
que descreveu a África como um continente atrasado,
primitivo e pobre. Ao contrário. Conforme ensina
Elisa Larkins no Suplemento Didático Tempo Africano,

“os povos de pele negra oriundos da África têm


sido agentes ativos do desenvolvimento humano
em todo o mundo. Durante a Alta Antiguidade
eles povoaram o mundo e alcançaram os
primeiros avanços tecnológicos. Mais tarde,
durante a Antiguidade, continuavam presentes
em todo o mundo e também viajaram novamente,
levando sua influência da África para a Ásia, a
Europa e as Américas. Viveram apenas uma
ínfima parte de seu tempo histórico amarrados
aos grilhões da escravidão no sistema mercantil
europeu e, nas épocas de cativeiro e colonização,
sempre criaram cultura e conhecimento.”
A perspectiva positiva da contribuição africana na
História de Curitiba e do Paraná – e
consequentemente de Colombo – se fundamenta em
fragmentos desconsiderados pelos historiadores
paranistas e que trazem possibilidades interessantes
para que a “terra de todas as gentes” possa honrar a
memória afrodescendente de forma positiva.

Existem registros de navegantes negros islamizados


contribuindo com conhecimentos marítimos
avançados no período das grandes navegações.

Existem registros de diplomatas africanos auxiliando


Vasco da Gama em suas relações diplomáticas e
comerciais com as Índias orientais.

Supomos que houvesse africanos na frota de Martim


Afonso de Souza, o donatário da capitania de São
Vicente, que chegou com “400 homens” em seus
navios para povoar a Capitania e procurar riquezas
minerais. A falta de detalhamento sobre a tripulação
permite a inferência.

Existem registros de que os bois e carros de boi


vieram da África desde os primeiros navios (e se
vieram os carros, também vieram os especialistas em
sua construção).
Os portugueses já estavam em contato com a Costa
do Ouro, também chamada de Costa da Mina, na
África, comprando ouro e escravizados, desde 1440.

Inicialmente, estes africanos da Costa da Mina


estavam sendo vendidos aos espanhóis para
exploração do Potossi, na América espanhola. Esta
relação direta entre os portugueses e os africanos da
Costa da Mina é um indício de que os povoadores em
busca de ouro nas Minas de Paranaguá e nos Campos
de Curitiba contaram com contribuição africana
(embora não oficialmente registrada).

Sobre a realidade dos escravizados, Pedro Taques de


Almeida Pais Leme em sua História da Capitania de
São Vicente, descreve:

“Os almocafres e carumbés, as enxadas e bateias


continuamente trabalhavam, nos veios, nos
tabuleiros e nas grupiaras, revolvendo o cascalho
até a piçarra, abrindo poços e galerias.
Continuamente, também, silvavam as longas tiras
de couro dos azorragues nos magros e
cicatrizados dorsos dos míseros africanos.
Porque, se no Brasil jamais houve inexoráveis
senhores e desalmados traficantes foram os
mineradores, os implacáveis aventureiros
escavadores do solo aurífero e réus de hediondas
barbaridades.”
Quando os portugueses encontraram ouro em
quantidades expressivas nas Minas Gerais, no século
XVIII, eles abandonaram as pequenas faíscas de
aluvião, de Paranaguá e dos Campos Curitiba. O
cronista Antonil registrou que um africano que havia
estado antes nas minas de Paranaguá e Curitiba foi
quem primeiro encontrou o ouro nas Minas Gerais.
Esta foi a única menção que conseguimos localizar
até o presente momento explicitando a existência de
africanos na prospecção, extração e fundição do ouro
no Paraná, embora as narrativas “oficiais” não
mencionem seus nomes nem origens. As descobertas
são registradas na História como sendo dos
portugueses. Afinal, na lógica escravagista, tanto os
frutos do trabalho quanto os conhecimentos e os
méritos pelas descobertas dos africanos “pertencem”
aos seus proprietários e assim ficaram registrados na
História.

Uma breve pesquisa sobre os povos Ashanti, de Gana,


na Costa da Mina, detentores dos conhecimentos
milenares de prospecção, extração e fundição do
ouro, revela que eram as mulheres ashantis quem
detinham tais conhecimentos. As ilustrações das
antigas minas e arraiais de fato colocam mulheres em
cena na cata de ouro, mas em segundo plano.

Seria a negra Mina, batizada com o nome de Suzana


em 1707, na Paróquia de Curitiba, uma africana
conhecedora de mineração, como tantas que são
citadas nas histórias de Minas Gerais?
A primeira grande contribuição africana na História
do território hoje chamado Colombo - esta é a
hipótese que apresentamos - remonta aos séculos XVI
e XVII, momento em que os conhecimentos dos
africanos da Costa da Mina – detentores de
tecnologias milenares de prospecção, extração e
fundição do ouro – foram fundamentais para guiar os
portugueses em sua busca pelas riquezas minerais do
Novo Mundo e que eram abundantes em África.

A presença de africanos no território hoje


chamado de Colombo remonta à época dos
primeiros povoadores que buscavam ouro no
leito dos nossos rios e dependiam dos
conhecimentos e tecnologias milenares que os
africanos (e africanas) da Costa da Mina detinham
para prospecção, extração e fundição do metal.

Além da mineração, destacam-se outras contribuições


africanas invisibilizadas, tais como a metalurgia,
navegação, construção de carros de boi, taipas de
mão e de pilão, agricultura, barbearia, medicina,
ferraria, olaria, pecuária, aguadeiros, carteiros,
transportadores, arte, gastronomia, moda, comércio,
parteiras e a importância das mulheres, entre outras.
5.
A SESMARIA
DO PALMITAL
Sabe-se que havia africanos aqui antes da chegada
dos imigrantes porque uma das condições exigidas
pela coroa para conceder a doação de sesmarias era
o requerente ser proprietário de escravos. As Cartas
de Sesmarias trazem, portanto, algumas pistas sobre
onde estava esta população invisibilizada, sem
mencionar maiores detalhes sobre quem eram ou
como viviam. São citadas apenas com termos
genéricos, como escravaria, gentio da Mina, da Guiné,
de nação, pretos, faiscadores... Onde havia sesmarias,
havia indígenas ou africanos “livres e escravizados”.

No site da Associação italiana, lemos que havia


povoados nas terras das sesmarias do Palmital,
Capivari e Timbu e nos quarteirões do Ribeirão das
Onças, dos Veados e do Butiatumirim. O quarteirão
do Butiatumirim teria sido o primeiro que serviu para
a instalação de imigrantes estrangeiros, em setembro
de 1878, e recebeu a Colônia Alfredo Chaves, que se
tornou a sede do município.
A localidade mais antiga registrada em terras hoje
denominadas Colombo foi a Sesmaria do Palmital,
entre os rios Atuba e Palmital. Foi doada a Antônio
Martins Leme e era servida pela Estrada da Graciosa.
Seu pai, o chamado “Capitão Povoador” Mateus
Martins Leme, recebeu sesmaria na região do Barigui.
Antônio se casou com Margarida Fernandes, filha do
capitão Balthasar Carrasco dos Reis, que por sua vez
também recebeu sesmaria na região do Barigui.

As duas famílias - Leme e Carrasco dos Reis - e seus


descendentes foram grandes proprietários de
sesmarias e, portanto, de “escravarias” no Paraná. Na
genealogia, Antonio Martins Leme aparece como
morador de Curitiba.

“O capitão de ordenanças Antonio Martins Leme,


exerceu durante vários anos a função de tabelião
e escrivão de sesmaria, e em outubro de 1674
recebeu do Capitão Gabriel de Lara uma sesmaria
entre os rios Palmital e Atuba. Não ocupou cargo
na Câmara Municipal pois faleceu em 1694, no
ano seguinte à sua instalação. Porém dois de seus
três filhos homens ocuparam por vários anos os
principais cargos camarários: José Martins Leme e
Balthazar Fernandes Leme”.
Os filhos aparecem na Genealogia Tropeira: Paraná
nos séculos XVII, XVIII e XIX Vol I, organizado por
Claudio Nunes Pereira. José Martins Leme também
recebeu sesmaria, na região de Campo Largo (então
Curitiba), em 1681. Em 1716 ele solicita mais uma
sesmaria, na região de Furnas (Campos de Curitiba),
deixada de herança em 1733 ao seu genro. Seu irmão,
Baltasar Fernandes Leme recebeu sesmaria na região
da Lapa, em 1706, também pela Câmara de Curitiba.

Em todas estas sesmarias há pistas de presença


africana invisibilizada e heranças a serem
reconstituídas para fazer justiça à memória dos
descendentes de africanos em solo paranaense. Mas
as pistas deixadas pelos escravagistas são parcas,
apenas alguns nomes, quantidades e valores.

No testamento de Mateus Leme ele conta que quando


casou o filho Antônio Martins com a filha de Baltazar
Carrasco, este levou cinquenta rezes entre pequenas
e grandes e um rapagão de 15 ou 20 anos e três
espingardas. No testamento ele cita o nome de alguns
escravizados seus, Vicente, Maria, Melaton, Manoel.
Um casal de “peças”: Manoel e Marcela, o filho Gaspar,
o neto Inocêncio, e outros.
A Fazenda do Palmital, que fazia comércio no centro
da vila de Curitiba, em 1770, possuía mais de 60
escravizados, alguns especializados na arte de
minerar… Assim como muitas outras fazendas, era
administrada pelo fazendeiro agregado conhecido
pela alcunha de Manoel Escravo e possuía centenas
de bois, vacas, éguas, potros...
6.
A INVISIBILIDADE
COMO MECANISMO
DE DISCRIMINAÇÃO

Os nomes e a procedência dos africanos não foram


registrados nas narrativas históricas escravistas e os
seus “feitos” e descobertas ficaram registrados em
nome dos escravagistas.

Uma exceção é a menção feita por Antonil, sobre a


descoberta de ouro nas Minas Gerais ter sido feita
especificamente por um africano que havia estado
antes nas minas de Curitiba e Paranaguá.

O professor Ricardo Costa, no texto Bandeirantes,


Ameríndios e Africanos na fundação de Curitiba, cita
alguns nomes de africanos Mina e da Guiné
encontrados no livro de batismos da Paróquia de
Curitiba:
Balthazar, “gentio da Guiné”, batizado em
6/6/1697; Suzana “gentio da Mina”, batizada em
20/7/1707; Pedro e Domingos “moleques Minas”
em 13/6/1709; Thomas, em 18/9/1720, filho de
Antonio e Maria, ambos “gentios da Guiné”
pertencentes ao Padre Gregório Mendes Barbuda.

A maioria destas pessoas está oculta por detrás das


expressões genéricas como escravos, forros,
faiscadores, mineradores, tropeiros, trabalhadores,
voluntários da pátria, ferreiros, sapateiros, amas de
leite, cozinheiras, domésticas, etc.

Diferente dos colonizadores e imigrantes, que tem


seu nome, sobrenome e procedência registrados na
entrada e na saída do navio, os africanos e seus
descendentes precisam “garimpar” suas memórias
invisibilizadas nas entrelinhas da História.

De qual fazenda seria o famoso escravizado Zacarias,


do milagre das correntes arrebentadas por Nossa
Senhora de Aparecida? Sabe-se apenas que ele fugia
de uma das fazendas de Curitiba, poderia ser tanto da
Vila Nossa Senhora da Luz dos Pinhais, quanto do
Tamanduá, Campo Largo, Colombo, Piraquara, Quatro
Barras, Castro, Tibagi, Jaguariaíva ou qualquer outro
povoado dos antigos campos largos do sertão de
Curitiba.
A história da Região Metropolitana e das cidades
centenárias do Paraná está indissociavelmente ligada
à história de Curitiba. Em 1721, nas delimitações
registradas pelo Ouvidor Pardinho, Curitiba se
estendia desde o topo da Serra do Mar até as terras
do interior a serem ainda conquistadas; e de
Sorocaba até Curitibanos, em Santa Catarina. Toda
essa região denominava-se Campos ou Sertões de
Curitiba, Campos Largos de Curitiba, Borda do Campo
de Curitiba, terras que foram distribuídas através das
sesmarias que, posteriormente, se tornaram vilas e
distritos de Curitiba antes de serem bairros e
Municípios independentes.

O apagamento ou invisibilidade é um mecanismo


discriminatório que atravessa os séculos e perdura
até hoje. As sesmarias eram desmembradas em sítios
por compra, arrendamento, herança… Segundo os
estudos do professor Ricardo Costa, são estas
mesmas famílias que há trezentos anos dominam os
postos de poder e decisão no Paraná.

O apagamento das contribuições africanas no Ciclo


do Ouro é apenas uma das manifestações deste
fenômeno em nossa história.
A invisibilidade será um fio condutor pelos labirintos
da narrativa escravocrata, em nossa busca por pistas,
documentos e fragmentos que ajudem a descobrir
quem eram os africanos, o que faziam e como viviam
em solo colombense.

De um lado deste labirinto estamos nós, na Colombo


de hoje, tentando descolonizar o olhar, pensamento e
memória, tentando jogar luz sobre novos detalhes até
então desconsiderados. Do outro lado está a África do
século XVI, XVII, XVIII e XIX, de onde foram
sequestrados ancestrais africanos. No centro do
labirinto, sinistras narrativas disputam a nossa
atenção, como a dos bandeirantes em sua busca de
populações indígenas para escravizar - o “ouro da
terra”; as eurocêntricas narrativas da nobreza colonial,
hierarquizada com seus homens bons, escravos,
libertos, livres, administrados; as abundantes
narrativas racistas, repletas de estereótipos negativos
sobre os povos indígenas e africanos - exóticos,
bárbaros, primitivos…

Os documentos do sistema escravagista nos


fornecem algumas poucas pistas sobre a presença
africana em Colombo no período compreendido entre
o fim do Ciclo do Ouro e a instalação da Colônia
Alfredo Chaves (quando a “História oficial” de
Colombo começa).
A presença africana neste período é mencionada em
listas de batismo e censos, diretamente vinculada à
história da riqueza das famílias mais poderosas da
região, que deixavam suas “peças” (escravizados) e
demais “pertences” como herança em seus
inventários, em anúncios de compra e venda e de
fugas de escravizados. Porém, sua memória não é
registrada, sua humanidade é negada e até seus
nomes substituídos e rebatizados arbitrariamente
com os nomes dos proprietários ou do santo do dia.
Aos que se rebelassem, a forca, a justiça portuguesa e
a santa inquisição eram “pedagógicas”.

Havia na época grande temor de que os africanos e


seus descendentes se rebelassem contra a “justiça” da
época e resolvessem seguir o exemplo de outras
comunidades livres, como a de Palmares, em Alagoas,
e da Fazenda Capão Alto, em Castro. Durante mais de
um século, estes territórios mantiveram-se livres em
pleno período escravagista. A maior revolta negra do
Brasil Império aconteceu em “terras de Curitiba”... Isso
não pode continuar na invisibilidade.

Uma carta do General Dom Luiz de Mascarenhas no


Livro de Registros de Resoluções, Ordens e Provisões
da Câmara de Curitiba de 1746 dá instruções claras:
“Os negros “calhambolas” deveriam ser marcados
a ferro com um carimbo com a letra F a ser
guardado na Arca da Câmara. Deveria ser
nomeado um ou mais Capitães do mato para que
este com a companhia de alguns negros, carijós
ou bastardos pudessem prender os quilombolas.
Os Capitães do Mato “ou outras quaisquer
pessoas a quem cometer a diligência declarando
lhe neles que se os ditos calhambolas trouxerem
armas e se não quiserem entregar a prisão
resistindo aos Capitães do mato ou a outra
qualquer pessoa que para as prender levar
mandado de Vm.ce em tal caso lhe – atirem e os
matem – o que sem o mínimo receio e podem
fazer os executores não só pela premissa da Lei
do Reino da Ordenação livro 5 tt 49 & 10 mas
também por serem esses negros públicos
salteadores de estradas a quem lhe pode matar
impunemente havendo notoriedade dos seus
malefícios (…) Advirto mais a Vm.ce que os
senhores dos escravos que assim forem mortos
em caso de resistência não tem alçada para
pedirem o seu valor aos oficiais de Justiça ou
outra qualquer pessoa que com mandato dela o
matar porque é justa e leal a dita morte assim
como é a força mandada dar pelos Ministros da
Justiça”.
Teria havido alguma eventual tentativa de fuga ou
outro crime cometido por afro-colombenses punidos
no Pelourinho de Curitiba? Quando foram proibidos
os batuques, ou passaram a multar quem abrigasse os
jongos e fandangos, tais leis afetaram os nossos
ancestrais afro-colombenses? Quantas africanas
teriam formado família na região, como a mãe do
mulato Mariano Torres, dos Campos Largos de
Curitiba? Não sabemos.

A historiadora Maria Cecília Westphalen argumenta


que a invisibilidade histórica no Paraná vai além da
conveniência, beirando a negligência e a ignorância.

“Pode parecer intransigente sustentar que, em


relação à preservação de suas fontes históricas, o
Paraná se constitui um exemplo desolador pois,
apesar de constituir terra nova, muito pouco
conservou de sua documentação histórica. Nada,
quase nada, possui em matéria de fontes relativas
ao século XVII. Muito pouco do século XVIII.
Alguma coisa ainda apenas, ainda que
fragmentária, do século XIX. Mas esse é o Paraná
tradicional, do ouro de lavagem, da sociedade
campineira, do caminhar das tropas, da erva-mate.
O que dizer do Paraná moderno? Do Paraná do
norte, com os pioneiros do café?
Do Paraná do sudoeste, com os excedentes
populacionais vindos do Rio Grande do Sul e de
Santa Catarina? Com raras exceções, também
tudo que diz respeito à ocupação do Paraná
moderno, por conveniência, negligência ou
ignorância está se perdendo".

Mas a invisibilidade, por outro lado, também foi uma


estratégia de sobrevivência em algumas situações,
como no sincretismo, por exemplo.

Na Costa da Mina, o segredo era uma regra. Ao


esconder a localização das suas minas, os africanos
mantinham os portugueses na condição de
compradores. Nas minas do Paraná, percebe-se esta
tradição de segredo sobre a localização e a
quantidade de ouro disponível nas minas, pois existe
uma longa lacuna de tempo entre as primeiras
narrativas oficiais de ouro encontrado, por volta de
1570, e a instalação da coroa portuguesa e da Casa de
Fundição para extração dos quintos.

Além disso, conta-se que o motivo para a instalação


da justiça portuguesa em nossa região seria
justamente a sonegação de ouro na região, que cada
vez mais preocupava o rei. Narrativas são repletas de
segredos e interesses em jogo...
7.
CONCLUSÃO

Concordo com a Dra Dora Lúcia Bertúlio, quando diz


que “a invisibilidade é o ponto nevrálgico do racismo
no Paraná.” A população colombense merece
conhecer as importantes contribuições de seus
antepassados africanos para o desenvolvimento de
nossa cidade.

É uma grande responsabilidade reconstruir as


memórias africanas e afrodescendentes e
“descolonizar” a nossa história, contrariando o que
dizem as narrativas paranistas e sua omissão sobre as
contribuições africanas no período colonial, racista e
escravista. Silenciar é ser conivente.

É nas tecnologias e nos conhecimentos milenares


africanos que estão as referências para construir uma
narrativa afro-colombense positiva, com a qual nossas
crianças possam se identificar.
Os africanos e seus descendentes tiveram um papel
fundamental no surgimento das primeiras vilas do
Paraná, contribuindo decisivamente como etnias
fundantes das cidades centenárias do Estado do
Paraná - não só com força física, mas com
conhecimentos e tecnologias milenares africanas.
Tiveram destaque também nos processos
abolicionistas, construindo estratégias de
sobrevivência, resistência e libertação.

Embora o Município de Colombo tenha sido fundado


em 1890, período imediatamente após a abolição da
escravatura, diversos registros anteriores de presença
africana e indígena trazem pistas importantes para
nos ajudar a (re)construir a memória afro-colombense.
Mas seria uma armadilha apenas repetir o que dizem
as narrativas oficiais, que vinculam a presença
africana e indigena em Colombo à condição de
escravizados, sem revelar detalhes que nos ajudem a
reconstituir sua memória, humanidade e a trajetória
desses personagens - seus conhecimentos,
tecnologias e suas contribuições positivas.

A mineração, a metalurgia, a arquitetura de taipas, a


pecuária e os carros de boi, afinal, os primeiros bois
foram trazidos de África desde os primeiros navios.
Nas narrativas escravocratas, os afrodescendentes se
resumem a “escravos” - personagens sem nome, sem
procedência, desumanizados, coisificados, em
consonância com o “espírito da época”. Repetir este
discurso não é uma alternativa. As referências
escravistas são mais pertinentes à história dos
escravocratas do que à história dos afrodescendentes
e fornecem poucas pistas em nossa busca de
valorização do pertencimento étnico
afrodescendente.

Mas, em 1960, a UNESCO concluiu o colossal projeto


História Geral da África. São mais de oito mil páginas
escritas por importantes historiadores e eruditos
africanos, apresentando a História africana em toda a
sua riqueza e complexidade, contribuindo para
desmistificar a visão estereotipada e racista das
narrativas eurocêntricas.

A (re)construção da narrativa a partir de novos


pressupostos se faz necessária, considerando que
precisamos superar a visão racista propagada no
contexto eugênico de “branqueamento” da população
com as políticas migratórias, no final do século XIX.

Em 1988, a legislação passa a garantir para TODOS a


igualdade de acesso aos direitos perante a lei.
Promover essa igualdade na prática vem sendo, desde
então, uma tarefa desafiante em muitos aspectos.A
promulgação da Lei 10.639/03, que determina a
inserção no currículo escolar da História e Cultura
Africana e Afrobrasileira, bem como a reflexão sobre
as relações etnico-raciais, aponta novas perspectivas
e informações relevantes para a construção da nossa
identidade.

A Lei 10.639/03 é resultado deste movimento de


combate ao racismo, em toda a diáspora, e reflete
diretamente os compromissos assumidos pelo Brasil
na Conferência de Durban, em 2001, na África do Sul.

Em 2011, o Ano Internacional dos Afrodescendentes


não foi suficiente para dar conta de resolver os
graves problemas de desigualdade a serem
enfrentados. Assim, entre 2015 e 2024, a ONU
proclamou a Década Internacional dos
Afrodescendentes, cujos temas são justiça,
reconhecimento, desenvolvimento e enfrentamento
às discriminações múltiplas e agravadas.

Valorizar as contribuições positivas dos africanos


para o desenvolvimento da nossa sociedade é
fundamental para ajudar a reverter os estigmas
impostos à população negra.
Há um esforço coordenado para pensar e propor
estratégias para promover mudanças estruturais
profundas e reverter os séculos de exclusão e
discriminação em todo o Brasil. Afinal, a população
afrodescendente no Brasil é de 56% e, no Paraná e em
Colombo, chega a 31%.

Valorizar a história e a cultura afro e dar visibilidade à


presença negra é uma forma de ajudar a reverter as
disparidades e promover isonomia para o povo
afrodescendente no Paraná.

O tratamento desigual imposto à população não-


branca na forma de leis e de dificuldade de acesso
aos direitos básicos de cidadania desde o período
colonial e do pós-abolição, resultou em
consequências graves que podem ser observadas, por
exemplo, no IDH – Índice de Desenvolvimento
Humano Médio.

Ao analisar os dados educacionais, de renda e de


longevidade da população branca e negra, de homens
e mulheres em separado, foi observada a
desigualdade ainda mais aguda que atinge as
mulheres negras. Há uma defasagem de cerca de dez
anos entre o IDH médio de homens e mulheres
brancas e de homens e mulheres negras do Paraná.
Na Grande Curitiba, segundo dados do IBGE 2010,
somos cerca de 1 milhão de afrodescendentes.
Precisamos de uma perspectiva identitária que
valorize o pertencimento étnico de afrodescendentes
e ajude a romper os mecanismos seculares que
dificultam o acesso da população negra às
oportunidades de desenvolvimento e acesso aos seus
direitos básicos de cidadania.

Não será tarefa fácil, pois a documentação oficial


relativa aos africanos traficados para o Brasil foi
queimada por ordem de Rui Barbosa, então Ministro
da Fazenda, em 1890. Além disso, os nomes dos
africanos e africanas foram substituídos, suas
religiões e tradições de origem proibidas por lei e
perseguidas pela polícia.

A tentativa de apagamento chegou a ponto de as


famílias e etnias africanas serem divididas entre
diferentes escravizadores para impedir sua
comunicação. Até as crianças que nasceram no
regime escravocrata eram propriedades a serem
negociadas ou deixadas de herança nos inventários
dos escravizadores.

Estamos vivendo um momento em que o racismo


vem sendo cada vez mais amplamente debatido e
compreendido no Brasil e no mundo.
Este fenômeno tão negado e minimizado é
(re)conhecido de diversas formas, como racismo
estrutural, institucional, velado, explícito, cultural,
recreativo. Neste momento em que as situações
criminosas de discriminação e violência racial são
filmados em tempo real, é fundamental o Município
de Colombo dar a sua contribuição e começar a
promover isonomia.

A riqueza de núcleos culturais afro-brasileiros


existentes em Colombo hoje é notável. Temos escola
de samba, grupos de capoeira, hip-hop, terreiros de
candomblé e umbanda, poetas, escultores,
historiadores e uma população negra que ultrapassa
os 30% do total, com mais de 71 mil pessoas
(IBGE/2010) autodeclaradas pretas ou pardas.

Esta importante parcela da população de Colombo é


excluída dos símbolos, das narrativas oficiais e do
planejamento municipal. Sua história não é divulgada
no turismo e na educação e ela carece de espaços
oficiais que promovam o seu desenvolvimento.

Os servidores e a população em geral precisam


receber formação adequada para não incorrerem em
crimes de racismo e injúria por falta de informação.
Romper com o manto da invisibilidade da população
negra na “história oficial” é um processo que está em
consonância com iniciativas amplas de
enfrentamento às desigualdades. Este debate vem
sendo amadurecido ao longo das últimas décadas em
conferências, fóruns e debates, em âmbito ncional e
internacional, que resultaram na adoção de
programas, políticas e projetos de promoção da
igualdade racial e enfrentamento às diversas formas
de discriminação.

Minha trajetória em busca de valorização da história e


cultura afro me levou ao Conselho Municipal e
Conselho Nacional de Cultura. Fui Conselheiro
Nacional de Promoção da Igualdade Racial e me
tornei assessor de Promoção da Igualdade Racial da
Prefeitura de Curitiba.

Durante dez anos, os Encontros de Cultura de Rua


pela Paz – RapPaz, um projeto surgido no Jardim
Osasco em resposta ao vazio cultural e artístico
existente na região e realizado para (e com) a
juventude periférica, entre 2004 e 2015, reuniu artistas
e agentes culturais em torno da Cultura Afro e Hip-
Hop. Além do Jardim Osasco, o RapPaz aconteceu em
Curitiba e em diversos outros municípios da Região
Metropolitana.
O projeto chegou a receber uma premiação por seu
rico potencial de impacto no âmbito da prevenção e
articulação em rede, do Ministério da Justiça e SENAD
- Secretaria Nacional sobre Drogas.

Propus a criação, no Estado do Paraná, do Dia da


Capoeira e dos Saberes dos Mestres, o Dia do Hip-
hop, através da então Deputada de Colombo, Beti
Pavin. O mesmo fiz em Colombo, através do mandato
do então Vereador Waldirlei Bueno. Mas infelizmente,
não houve investimento público para o
fortalecimento da capoeira ou do hip-hop, ficou só na
celebração das datas.

Em 2019, ajudei a organizar o Caderno Pedagógico


Oralidades Afroparanaenses, escrito para auxiliar
educadores a valorizar e dar visibilidade à história e
cultura afro, de um ponto de vista regional, nas
escolas do Paraná. Falar da presença negra em nosso
Estado é fundamental para romper com o discurso
racista que nos invisibiliza.

Me pergunto quando as políticas de branqueamento


da população serão abolidas em Colombo e nas
demais cidades centenárias do Paraná… Neste artigo,
pretendemos compartilhar algumas das contribuições
de africanos e seus descendentes na história do
território hoje denominado Colombo.
Colombo pode escrever uma história mais justa e
verdadeira, mas para isso é preciso romper o manto
da invisibilidade e admitir que temos um problema.

“Temos todos,
por ação ou omissão,
estímulo ou incompreensão,
a responsabilidade dos fatos da História”.
T. Vilela.
Referências:
Para saber mais sobre a literatura de Candiero,
sugerimos a leitura do ensaio "Candiero: a
poesia como forma de resistência", da professora
Romilda Oliveira Santos.

Saiba mais sobre o Centro Cultural Humaita no


informativocentroculturalhumaita.wordpress.com

Saiba as obras da Editora Humaita.

Conheça o Caderno Pedagógico Oralidades


Afroparanaenses.

Leia o texto "Magia Negra", do poeta Sergio Vaz.

Leia a Revista RapPaz.

Ouça o disco do Mestre Suassuna e Dirceu.

Guia Histórico-Cultural de Colombo.

História Geral da África.UNESCO.

Desenvolvimento Humano para Além das Médias.

Suplemento Didático Tempo Africano, de Elisa


Larkins.
Bibliografia citada:
BERTULIO, Dora Lucia. Direito e relações
raciais: uma introdução crítica ao racismo.
Florianópolis: UFSC, 1989.

COSTA, Ricardo. Bandeirantes, Ameríndios e


Africanos na fundação de Curitiba.

FREIRE, Gilberto. Ferro e Civilização no Brasil,


1998. Ed. Record.

JORGE, Valesca Xavier Moura. Família e poder: um


estudo sobre a sociabilidade na Curitiba
setecentista.

PEREIRA, Magnus. Livro dos 300 anos da Câmara


Municipal de Curitiba.

SOUZA, Marcilene Garcia. Ações afirmativas e


inclusão de negros por “cotas raciais” nos
serviços púbicos do Paraná. UNESP, 2010.
Agradecimentos

Agradeço à Olorum e aos ancestrais por darem força


para continuarmos na luta.

Agradeço ao professor doutor Fernando Schinimann,


professora Andresa Serpejante, professora Isabela
Silva, professora Romilda Oliveira Santos, escritora
Stela Reinehr e à Melissa S. Reinehr.

Agradeço à D. Alice da Silva e meus familiares, que


ajudaram a buscar o baú da memória.

Agradeço às famílias negras de Colombo e ao Mestre


Miguel , da Congada da família Ferreira, que fez sua
passagem no último dia 02 de fevereiro, Dia de
Yemanjá.

Dedicatória
Dedico à ancestralidade africana que fez morada em
terras colombenses e começa a se revelar.

Xeuêpa, Babá!
Saiba mais:
https://linktr.ee/candiero

Contato
41.99161-7961 / 98440-7961

candieroctba@gmail.com /
humaitacentrocultural@gmail.com/
editorahumaita@gmail.com

Capa
Festa do Rosário, 2015.
Foto: Daniel Rebello.

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