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Com efeito, após a realização do Consílio dos Deuses no Olimpo, onde se formaram
duas correntes – uma de apoio à empresa do Gama – liderada por Vénus – e outra de oposição
– chefiada por Baco – e onde Júpiter toma a decisão de auxiliar os Portugueses a chegarem à
Índia, Baco prepara-lhes várias ciladas em Quíloa – Moçambique – e Mombaça – atual Quénia –,
cujo rei tinha sido convencido por ele a aniquilar a frota lusitana.
● Motivação da reflexão
Note-se que não é por acaso que esta reflexão está situada no final do canto I,
quando o herói tem de enfrentar o longo e penoso trajeto para atingir os seus objetivos,
tendo de superar, nomeadamente, inúmeros perigos e obstáculos que o querem impedir de
prosseguir. Contudo, o seu heroísmo leva-o a superar o seu estatuto de “bicho da terra tão
pequeno” e a sua coragem e ousadia vencem a fragilidade da sua condição, para atingir o
estatuto de herói.
● Estrutura interna
▪ Introdução (vv. 1-4, estância 105): narração da traição urdida aos Portugueses.
▪ Desenvolvimento (v. 5, est. 105 – v. 4, est. 106): enumeração dos perigos que espreitam o
ser humano em terra e no mar.
▪ Conclusão (vv. 5-8, est. 106): lamento do Poeta pela fragilidade do Homem.
● Análise do excerto
• Nos quatro versos iniciais da estância 105, o Poeta faz alusão à cilada preparada em Mombaça
aos Portugueses. De facto, o «recado» (a mensagem) que os marinheiros portugueses enviados
a terra trazem é, aparentemente, de amizade.
• Porém, na realidade, revela-se um grande perigo (metáfora “debaxo o veneno vem coberto” –
v. 2: o engano é comparado a um veneno escondido, para representar a traição dos
muçulmanos) e inimizade (v. 3). No entanto, a traição acaba por não se consumar, dado que
foi descoberta a tempo (“Segundo foi o engano descoberto.” – v. 4).
• Assim sendo, nestes versos o Poeta denuncia a falsidade, a mentira e a dissimulação dos
homens.
Perigos enfrentados
Local Agente Consequências
pelo ser humano
. tempestades
. enganos / traições
Terra
. Fragilidade
. falsidades . Homem
. aborrecimentos
• Os últimos quatro versos são apresentados sob a forma de interrogação, através da qual (e da
anáfora dos versos 5 e 6 dessa estância, que reflete a impossibilidade de o ser humano
encontrar um lugar seguro para se proteger), o Poeta questiona: poderá o Homem ultrapassar
a sua pequenez face ao universo, muito mais poderoso do que ele, representado pelo “Céu
sereno” (v. 7), que, representando os deuses ou o destino, constitui uma ameaça para o ser
humano? A resposta é negativa: dificilmente conseguirá encontrar um lugar onde possa
encontrar segurança e tranquilidade (“Onde pode acolher-se um fraco humano” – v. 5, est.
106), dada a sua pequenez e fragilidade (“Onde terá segura a curta vida” – v. 6, est. 106 –
tema da brevidade da vida humana).
• A metáfora do verso 8 da estância 106 (“um bicho da terra tão pequeno”) designa o Homem e
enfatiza a fragilidade humana e a pouca probabilidade de fazer frente ao universo. Além
disso, destaca a desproporção entre o ser humano e os obstáculos que enfrenta para alcançar
os seus propósitos.
• O tema das duas estâncias é, pois, a fragilidade e a efemeridade da vida humana face aos
grandes perigos enfrentados no mar e na terra e às circunstâncias da vida.
• O Poeta lamenta essa incerteza e insegurança a que o ser humano está exposto. O seu estado
de espírito é caracterizado pela desilusão, tristeza, desânimo, perplexidade e impotência.
Os motivos da tristeza e do lamento podem sintetizar-se desta forma:
- a pequenez humana face ao Universo e aos perigos;
- o Homem à mercê de um destino cruel;
- o sofrimento humano provocado por numerosos perigos.
● A mitificação do herói