Você está na página 1de 12

NOTA TÉCNICA

Políticas ativas de emprego e renda*


Ricardo Paes de Barros e Mirela de Carvalho

1. Emprego e renda natureza, com vistas a elevar a disponibili-


dade de trabalho e o nível de renda dos tra-
O bem-estar de um trabalhador e de seus fa- balhadores. Essas políticas diferem do primei-
miliares depende da natureza de sua inserção ro grupo por atuarem diretamente sobre o
no mundo do trabalho. Embora uma varie- mundo do trabalho. Também diferem do
dade de aspectos dessa inserção, tais como sa- segundo grupo por transformarem os agen-
lubridade das condições de trabalho, risco de tes ou o ambiente em que operam, ao invés
acidentes e distância do trabalho à casa, en- de apenas influenciar o comportamento dos
tre outros, sejam de grande relevância, nesta agentes a partir da regulamentação de suas
nota concentramos nossa atenção no acesso formas de interação. A transformação dos
ao trabalho e no nível de remuneração. A agentes ou do ambiente se dá por meio da
escolha desses dois aspectos está relacionada provisão de alguns serviços básicos como trei-
ao fato de representarem, seguramente, as prin- namento profissional, microcrédito, e
cipais preocupações dos trabalhadores. intermediação de mão-de-obra.

Existem três tipos básicos de ações governa- Esse terceiro grupo de políticas é comumente
mentais que têm impacto sobre o nível de em- denominado políticas ativas de emprego e ren-
prego e remuneração. O primeiro deles inclui da ou políticas estruturais diretas de combate
as políticas macroeconômica, industrial e ao desemprego e à baixa produtividade e re-
tecnológica, bem como os investimentos em muneração. O objetivo desta nota é analisar
infra-estrutura. Essas ações, ao afetarem o ní- esse grupo de políticas. Mais especificamen-
vel e a composição setorial da produção, além te, esta nota trata dos seguintes aspectos: a)
da tecnologia e da intensidade de capital uti- como essas políticas modificam as condições
lizado, provocam, por sua vez, mudanças so- do mercado de trabalho, reduzindo o desem-
bre o nível de emprego e remuneração. prego e aumentando a produtividade da for-
ça de trabalho; b) porque devem ser subsidia-
O segundo tipo diz respeito à forma e à exten- das e que grupos devem atender; c) qual o seu
são com que as relações de trabalho são regu- impacto efetivo; e d) quais as dificuldades
lamentadas. Embora uma boa regulamenta- operacionais na sua implementação. Antes de
ção possa estimular o nível de emprego e a re- tratarmos de cada uma dessas questões em
muneração, em geral, tal regulamentação ser- seqüência, é necessário uma rápida descrição
ve ou para proteger os salários em detrimento do funcionamento do mercado de trabalho,
de uma queda no emprego ou para proteger o em particular, dos determinantes e motivos
emprego em detrimento de uma queda na pro- para o desemprego e para a baixa produtivi-
dutividade e na remuneração. dade e remuneração, uma vez que o objetivo
das políticas ativas de emprego e renda é,
Por fim, o terceiro tipo de ação governamen- precisamente, solucionar ou, ao menos, ame-
tal considerado inclui as políticas públicas nizar esses problemas.
que atuam diretamente sobre o mundo do
trabalho, transformando efetivamente a sua * Disoc/IPEA.

12_nota_3.pmd 61 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
62 conjuntura e análise

2. O funcionamento do mercado de traba- rio requalificar os trabalhadores desempre-


lho: desemprego e produtividade gados de acordo com as habilidades deman-
dadas pelas firmas com postos de trabalho
Atualmente se pode contar com uma diver- não preenchidos. Assim, para combater o
sidade de políticas públicas voltadas para a desemprego por descasamento, o treinamen-
redução do desemprego e para a elevação da to profissional é a política central.
produtividade. Essa diversidade advém, em
parte, do fato de que existem variadas for- Existem, porém, casos em que o desemprego
mas de atingir um dado fim e é, acima de não resulta da dificuldade de preenchimen-
tudo, uma conseqüência da existência de to de vagas existentes. Ao contrário, resulta
diferentes formas de desemprego e razões da escassez de vagas. Trata-se do desemprego
para a baixa produtividade. Assim, a estrutural. Esta escassez de vagas é sempre,
adequabilidade e eficácia de uma dada polí- em última instância, decorrente da falta ou
tica depende, sobremaneira, da natureza do insuficiência do crescimento econômico. De
desemprego e da razão básica para a baixa fato, se a população economicamente ativa
produtividade do trabalho em cada contex- cresce a uma taxa α e a produtividade do
to. Nesta seção, tratamos de descrever as prin- trabalho a uma taxa β, então, na presença
cipais formas de desemprego, as razões para de retornos constantes de escala, seria neces-
baixa produtividade e as políticas estruturais sário que a produção crescesse a uma taxa
mais recomendadas em cada caso. α+β para que a taxa de desemprego perma-
necesse inalterada e os salários crescessem à
mesma velocidade que a produtividade. Caso
2.1. Três tipos de desemprego
a taxa de crescimento do produto seja infe-
rior a este valor, seria necessário que os salá-
Existem, essencialmente, três tipos de desem-
rios crescessem a uma taxa inferior ao au-
prego: a) o desemprego friccional, b) o de-
mento na produtividade para que a taxa de
semprego por descasamento e c) o desempre-
desemprego não se elevasse. Caso a taxa de
go estrutural. O desemprego dos tipos
crescimento do produto seja inferior à taxa
friccional e por descasamento apresentam em
de crescimento da população economica-
comum o fato de que a razão para ambos
mente ativa, para que a taxa de desemprego
não é a escassez de postos de trabalho, mas
não aumentasse, seria necessário que os sa-
a dificuldade de preenchimento dos postos
lários declinassem.
existentes. No caso friccional, o preenchi-
mento não ocorre devido à existência de in-
formação assimétrica, isto é, os trabalhado- Esse resultado ilustra o fato de que um baixo
res têm informação limitada sobre a dispo- crescimento econômico não basta para ge-
nibilidade e natureza das vagas existentes, rar um aumento na taxa de desemprego. É
ao mesmo tempo em que as empresas têm necessário que também exista alguma forma
informação limitada sobre a disponibilida- de rigidez salarial. Em outras palavras, o de-
de, qualificação e características dos traba- semprego estrutural surge quando, numa si-
lhadores que estão buscando trabalho. Por- tuação em que o crescimento econômico é
tanto, em situações de desemprego friccional, insuficiente, o nível de salários não se ajusta
a política ativa mais importante seria a pro- adequadamente, levando a que a demanda
visão subsidiada de intermediação de mão- por trabalho seja insuficiente para atender
de-obra. toda a oferta. A correção, neste caso, pode
vir tanto de uma aceleração do crescimento,
Já em se tratando do desemprego por como de reduções no nível salarial. Eviden-
descasamento, a razão para a dificuldade de temente, a solução por meio do crescimento
preenchimento das vagas não é a informa- é sempre a mais desejável, uma vez que ga-
ção assimétrica, mas sim a diferença entre a rante o ajuste sem perda salarial. O proble-
qualificação dos desempregados e a qualifi- ma existe porque nem sempre é possível ace-
cação demandada pelas firmas que ofertam lerar o crescimento econômico, de modo que
postos de trabalho. Nesse caso, para que o o combate ao desemprego passa a requerer
preenchimento das vagas ocorra, é necessá- perdas salariais.

12_nota_3.pmd 62 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
conjuntura e análise 63

Do ponto de vista da desigualdade e da po- do à baixa qualificação do trabalhador; b)


breza, pode-se pensar que o combate ao de- devido à baixa qualidade do posto de traba-
semprego através de queda nos salários teria lho; e c) devido à baixa qualidade do casa-
pouco a acrescentar. Na realidade, essa ques- mento entre as características do trabalha-
tão depende de quem são os desempregados dor e do posto de trabalho.
e os trabalhadores que terão os seus salários
reduzidos, bem como de quanto será a que- No primeiro caso, a baixa produtividade
da nos salários para impedir o crescimento advém da baixa qualificação do trabalhador
na taxa de desemprego. Em geral, pode-se e, portanto, para ser corrigida requer que o
dizer que aumentos no desemprego têm trabalhador passe por um programa de qua-
maior impacto sobre o aumento da pobreza lificação ou retreinamento profissional,
e da desigualdade, do que a queda salarial como o Planfor, por exemplo.
necessária para evitá-lo. A principal razão
para isso advém do fato de que ao se permi- No segundo caso, a baixa qualificação requer
tir o aumento do desemprego para solucio- investimentos adicionais no posto de traba-
nar o problema da falta de crescimento, todo lho, seja atualizando a tecnologia utilizada
o custo de ajuste estará concentrado num ou expandindo e modernizando o capital
pequeno grupo: os desempregados. Já quan- físico disponível. Nessas circunstâncias, o
do a solução se dá através de queda nos salá- combate à baixa produtividade requer inves-
rios, distribuem-se as perdas por toda a for- timentos em capital físico e em moderniza-
ça de trabalho. Dessa forma, se em ambos os ção tecnológica. Programas de assistência
casos se tem o mesmo impacto negativo so- técnica e de crédito às micro e pequena em-
bre a renda total dos trabalhadores, a solu- presas podem ser de grande importância,
ção baseada na queda do nível salarial dis- embora a política macroeconômica, em par-
tribui melhor as perdas entre a força de tra- ticular no que se refere à definição do nível
balho e, portanto, acaba por ter menor im- da taxa de juros, a política industrial e a
pacto em aumentar a pobreza. tecnológica sejam, provavelmente, ainda
mais relevantes.
Em suma, o que se deseja ressaltar é que o
desemprego estrutural deve ser combatido, No terceiro caso, a baixa produtividade
primordialmente através do crescimento eco- advém do casamento deficiente entre as ca-
nômico e, na ausência dele, deve-se contar racterísticas dos trabalhadores e dos postos
com a flexibilidade salarial. O crescimento eco- de trabalho. De fato, numa economia onde
nômico é pouco influenciado pelos tipos de existe uma enorme heterogeneidade entre os
políticas tratadas nesta nota, denominadas trabalhadores e entre os postos de trabalho,
políticas ativas de emprego e renda, sendo a produtividade de cada trabalhador depen-
mais afetado pela política macroeconômica de de um casamento adequado entre suas
e pela legislação trabalhista. Entretanto, al- características e a do posto de trabalho em
gumas políticas ativas podem ter impactos im- que está alocado. Em outras palavras, o mer-
portantes sobre a geração de postos de traba- cado de trabalho não apenas determina a
lho. Um exemplo ilustrativo é a política de remuneração dos diferentes tipos de traba-
crédito para micro e pequenas empresas, como lhadores, define, também, a alocação de tra-
o Pronaf e o Proger. balhadores a postos de trabalho. Uma
alocação ineficiente pode levar a que o tra-
balhador A, que seria altamente produtivo
2.2. Três razões para a baixa produtividade no posto de trabalho X, seja alocado ao
posto de trabalho Y, no qual o trabalhador
Existem também variadas razões para a bai- B, que foi incorretamente alocado ao posto
xa produtividade dos trabalhadores e, por- de trabalho X, é mais produtivo. Nesse caso,
tanto, para seus baixos salários. Dentre as uma troca de posições entre os trabalhado-
alternativas de classificação existentes, op- res A e B aumentaria a produtividade total,
tou-se por trabalhar com aquela que agrupa revelando que a alocação vigente é
as razões para a baixa produtividade em três ineficiente, ou seja, dada a heterogeneidade
grupos de acordo com a sua origem: a) devi- dos trabalhadores e postos de trabalho, a

12_nota_3.pmd 63 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
64 conjuntura e análise

baixa produtividade pode ser gerada se o postos de trabalho, na medida em que pode
mercado de trabalho, ao alocar trabalhado- aumentar o investimento em capital físico e
res a postos de trabalho, não o fizer de for- induzir à incorporação de novas tecnologias.
ma a garantir que não existe qualquer Dada a sua natureza é, dessa forma, pouco
realocação de trabalhadores a postos de tra- importante para aumentar a produtividade,
balho que aumentem o nível geral de pro- sempre que esta última se encontrar limita-
dução. Caso exista uma realocação melhor, da, quer pela qualificação dos trabalhado-
ao menos um grupo de trabalhadores estará res ou pela qualidade dos casamentos entre
produzindo abaixo de suas potencialidades. trabalhadores e postos de trabalho.
Se existisse informação completa no merca-
do de trabalho, não haveria grandes dificul-
dades para que o mesmo conseguisse gerar 3.2. Qualificação profissional
uma alocação eficiente de trabalhadores a
postos de trabalho. Na ausência de informa- O treinamento profissional é também uma
ção completa, entretanto, não há garantias política ativa que visa combater tanto o de-
de que uma alocação eficiente seja alcançada. semprego, como a baixa produtividade da
Uma forma de facilitar a busca de uma força de trabalho. Ele é vital para a redução
alocação eficiente é aumentar a disponibili- do desemprego por descasamento, na medi-
dade de informação sobre trabalhadores e da em que, ao expandir a qualificação de
postos de trabalho, uma tarefa que pode ser alguns trabalhadores, dá a eles acesso a uma
alcançada com base na intensificação dos série de postos de trabalho, aos quais não
serviços de intermediação de mão-de-obra. teriam acesso sem treinamento adicional.
Entretanto, o treinamento profissional não
é capaz de combater o desemprego friccional
3. Três tipos de políticas ativas de emprego e como não gera postos de trabalho de for-
e renda ma direta, seu impacto sobre o desemprego
estrutural, caso exista, é seguramente peque-
Uma vez explicitadas as formas de desempre- no e indireto. No entanto, podemos imagi-
go e as razões para a baixa produtividade e, nar que amplos programas de treinamento
portanto, para os baixos salários, podemos, profissional são capazes de gerar postos de
então, passar a descrever a racionalidade para trabalho, na medida em que as áreas onde
as principais políticas ativas de emprego e existe maior qualificação da força de traba-
renda: a) microcrédito, b) treinamento pro- lho atraiam maiores investimentos.
fissional e c) intermediação de mão-de-obra.
Em termos do seu impacto sobre a produtivi-
dade, o caminho é evidentemente através de
3.1. Microcrédito incrementos na qualificação dos trabalhado-
res. O impacto sobre a qualidade dos postos
O microcrédito é uma política ativa que visa de trabalho e dos casamentos é pequeno e
reduzir o desemprego e elevar a produtivida- indireto. Esses impactos indiretos podem ocor-
de do trabalho. Em termos do desemprego, rer, por um lado, porque uma força de traba-
ele é uma arma contra o seu componente lho mais bem qualificada induz as firmas a
estrutural, na medida em que leva à expan- investir em capital físico e a adotar novas
são da produção e, conseqüentemente, a um tecnologias e, por outro, porque a melhor
aumento na demanda por trabalho. Por não qualificação dos trabalhadores facilita o ca-
ter qualquer impacto sobre a qualificação dos samento no mercado de trabalho.
trabalhadores e sobre a informação dispo-
nível, o microcrédito não é capaz de enfren-
tar os desempregos do tipo friccional ou por 3.3. Intermediação de mão-de-obra
descasamento.
A intermediação de mão-de-obra visa com-
Em termos da busca por aumentos da pro- bater as imperfeições de informação no mer-
dutividade, o microcrédito é um instrumen- cado de trabalho. Assim, ela deve ter um
to útil para a melhoria na qualidade dos impacto importante sobre o desemprego,

12_nota_3.pmd 64 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
conjuntura e análise 65

sempre que este for friccional, e sobre a pro- vestimentos sociais, eles devem sempre estar
dutividade, sempre que a baixa qualidade dos focalizados nos segmentos pobres que pro-
casamentos entre trabalhadores e postos for porcionam maior efetividade à ação.
um fator importante para explicar a baixa
produtividade. De fato, na medida em que a Assim sendo, o microcrédito não deve obri-
intermediação aumenta a informação dispo- gatoriamente ser destinado aos mais pobres
nível a trabalhadores e firmas, ela reduz o dentre os pobres, mas sim àqueles com pro-
período de desemprego e melhora a qualida- jetos de maior retorno econômico. Da mes-
de dos casamentos realizados. ma forma, o treinamento profissional não
deve necessariamente priorizar os mais
A intermediação de mão-de-obra, entretan- desfavorecidos em termos de renda, mas sim
to, não tem impacto direto sobre a qualifi- àqueles cujo custo de treinamento seja mais
cação dos trabalhadores, nem sobre a quan- baixo e que, devido a certas características
tidade e a qualidade dos postos de trabalho pessoais ou à localização no mercado de tra-
disponíveis. Dessa forma, esse tipo de políti- balho, apresentem maiores chances de deri-
ca não é eficaz para combater os desempre- var um maior benefício desse treinamento.
gos do tipo estrutural e por descasamento. De forma similar, os serviços de
Da mesma forma, essa política não será efe- intermediação de mão-de-obra devem tam-
tiva para elevar a produtividade quando ela bém se dirigir àqueles que, em função de sua
estiver sendo limitada ou pela qualificação qualificação, apresentarem maiores chances
do trabalhador ou pela baixa qualidade do de encontrar emprego, dadas as condições
posto de trabalho. vigentes do mercado de trabalho.

4. O papel do estado
4.2. Contrato social

O fato de o microcrédito, a qualificação pro-


Dado que os serviços considerados são fun-
fissional e a intermediação de mão-de-obra
damentais para a reinserção dos trabalha-
serem importantes armas para a redução do
dores deslocados por mudanças na estrutu-
desemprego e para aumentos na produtivi-
ra produtiva, a provisão subsidiada dos mes-
dade não implica, necessariamente, que es-
mos pode ser entendida como um contrato
tes serviços devam ser providos de forma sub-
social que visa compensar perdas. A existên-
sidiada e, muito menos, que a produção des-
cia dessa rede de proteção social pode ser
ses serviços deva ficar a cargo do Estado. As-
fundamental para que mudanças — consi-
sim, dedicamos esta seção a uma reflexão
deradas como melhorias no plano agrega-
sobre: a) por que o Estado deveria intervir
do, mas que não beneficiam igualmente a
na provisão desses serviços, b) em que medi-
todos — tornem-se politicamente viáveis,
da deveria participar diretamente da sua pro-
garantindo alguma compensação aos
dução, e c) quem deveria ser os beneficiários
perdedores. Como no combate à pobreza,
desses serviços subsidiados.
também como um instrumento de compen-
sação, a provisão subsidiada não deve obri-
4.1. Combate à pobreza gatoriamente estar focalizada naqueles que
mais sofreram com uma dada mudança na
Em primeiro lugar, tem-se que alguma pro- estrutura da economia. Mais uma vez, trata-
visão subsidiada desses serviços para a popu- se, em última instância, de investimentos
lação pobre é certamente necessária, uma vez sociais, os quais devem sempre estar focali-
que se trata de três serviços de vital impor- zados naqueles segmentos deslocados cujo
tância para a geração de renda dessas famíli- impacto da intervenção for mais efetivo.
as. Vale ressaltar, entretanto, que mesmo
objetivando a redução da pobreza, a provi-
são subsidiada desses serviços não deveria 4.3. Externalidades
necessariamente estar focalizada nos mais
pobres dentre os pobres. Ao invés disso, como Existem razões para crer na existência de
esses serviços são, em última instância, in- externalidades positivas, associadas tanto ao

12_nota_3.pmd 65 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
66 conjuntura e análise

treinamento profissional, como à interme- quenas empresas formais beneficiárias do


diação de mão-de-obra. No caso do treina- Proger. Contrastando o nível de emprego nos
mento profissional, o trabalhador treinado seis meses antes do recebimento do crédito
desencadeia um processo de difusão de co- com o do período seguinte, o estudo mostra
nhecimento fora da sala de aula, repassan- que, dentre as 20 mil micro e pequenas em-
do, sem custos, ao menos parte de seu treina- presas beneficiárias do Proger, observa-se uma
mento para aqueles que com ele trabalham. geração líquida de 24 mil empregos.

Em se tratando da intermediação de mão- No entanto, nem todo esse aumento no


de-obra, tem-se que quanto maior a intensi- emprego pode ser creditado ao Proger, basi-
dade da busca dos trabalhadores, menor será camente por dois motivos. Primeiro, essas
o custo de recrutamento das empresas. empresas já vinham gerando empregos no
ano anterior ao qual receberam o crédito,
Na presença dessas externalidades positivas, levando a que apenas 35% do emprego gera-
a demanda privada por esses serviços será do possa ser considerado uma conseqüência
inferior ao socialmente desejável. Dessa for- do programa. Segundo, mesmo as pequenas
ma, alguma forma de subsídio deve ser in- e médias empresas, que não se beneficiaram
corporada para que a demanda por esses ser- dessa intervenção, também experimentaram
viços alcance o nível socialmente desejável. crescimento no emprego, embora este tenha
sido bem inferior ao apresentado pelas em-
presas beneficiárias.
5. O impacto efetivo
Em suma, a evidência é de que, inequivoca-
Nas seções anteriores, vimos que o acesso ao mente, o Proger tem um impacto positivo
crédito, o treinamento profissional e a sobre a geração de emprego, na medida em
intermediação de mão-de-obra têm, cada um que as empresas beneficiárias foram capazes
a sua maneira, importantes impactos poten- de gerar muito mais empregos, no período
ciais sobre o desemprego e a produtividade recente, do que vinham gerando no passa-
da força de trabalho. Entretanto, a magni- do, além de terem gerado também mais em-
tude desses impactos depende da forma como pregos do que geraram as micro e pequenas
os programas são implementados. Esta seção, empresas, as quais não se beneficiaram do
sem ser exaustiva, apresenta estimativas, ex- programa.
traídas de alguns estudos selecionados, sobre
a magnitude do impacto desses programas. A magnitude efetiva do impacto do
microcrédito irá depender do grupo de com-
5.1. Microcrédito paração utilizado. Caso se considere como
grupo de comparação a experiência passada
Das experiências de microcrédito na área ur- das empresas beneficiadas pelo programa, o
bana, o Proger é seguramente a de maiores custo de geração de um posto de trabalho
proporções, tendo efetuado nos seus primei- pelo Proger pode chegar a R$ 50 mil, ao pas-
ros cinco anos de existência (1995 a 2000) so que se utilizarmos como comparação, a
quase 400 mil operações de crédito, num valor capacidade de geração de emprego global das
total próximo a R$ 4 bilhões. médias e pequenas empresas, chega-se a uma
estimativa de que o custo de geração de um
Existem duas conhecidas avaliações do im- posto de trabalho pelo Proger pode ser infe-
pacto do Proger sobre a geração de emprego. rior a R$ 25 mil. Vale ressaltar que este é o
Uma dessas avaliações foi feita pelo Ibase e impacto direto e, portanto, se levarmos em
cobre o desempenho do programa em sua consideração os empregos indiretamente cri-
fase inicial. A segunda dessas avaliações foi ados, o custo de geração de empregos pode
realizada por Passos e Costanzi e cobre um ser bem menor.
período mais recente.
Por fim, é importante frisar que esse estudo
Esse estudo mais recente concentra a aten- de Passos e Costanzi mostra que a geração
ção na geração de emprego das micro e pe- de empregos pelo Proger é sustentável, uma

12_nota_3.pmd 66 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
conjuntura e análise 67

vez que os empregos gerados permaneciam nal levou a que a proporção de pessoas em-
mesmo três anos após o crédito ter sido for- pregadas nos 6 a 12 meses após o treina-
necido. mento tenha crescido ou deixado de decli-
nar 3 a 4 pontos percentuais a mais que en-
tre os que não tiveram acesso. Nenhum im-
5.2. Qualificação profissional pacto foi percebido sobre o salário dos que
estavam originalmente ocupados.
Sobre a qualificação profissional, gostaría-
mos de destacar a existência de uma infini- Note-se, entretanto, que a falta de impacto
dade de avaliações do Planfor, incluindo sobre a renda dos ocupados não significa que
uma série que conta com acompanhamento o programa não tenha tido qualquer impac-
de egressos. Dentre essas avaliações, um pe- to sobre ela. Uma vez que o aumento na pro-
queno grupo incorpora, além do acompa- porção de ocupados implica que trabalha-
nhamento de egressos, informações sobre a dores originalmente sem qualquer renda do
evolução de um grupo de comparação. Os trabalho passem a ter alguma renda, existe
resultados de todas essas análises que utili- um impacto do programa sobre ela. De fato,
zam um grupo de comparação, com a exce- esta tabela revela que a renda mensal média
ção da avaliação realizada no Estado de de todos aqueles que tiveram acesso ao pro-
Pernambuco [Barros (1999)], mostram que os grama, incluindo aí os originalmente sem
impactos do programa sobre o desemprego trabalho, elevou-se em cerca de R$ 10 a mais
e sobre o nível de renda são bastante limita- do que entre os que não tiveram acesso. Dado
dos. Com vistas a ilustrar os resultados tipi- que o custo por trabalhador treinado pelo
camente encontrados nesses estudos, apre- Planfor está em torno de R$ 170, pode-se di-
sentamos e comentamos, a seguir, os resul- zer que para o programa ter um benefício
tados do estudo realizado conjuntamente líquido positivo, é necessário que os novos
pelo IPEA e Cedeplar, com base no acompa- empregos, a que tiveram acesso os partici-
nhamento de um grupo de egressos e de um pantes, tenham uma duração superior a 17
grupo de controle. meses. Infelizmente, não é possível avaliar a
duração desses novos empregos com base na
Este estudo foi desenvolvido apenas para as informação coletada, devido à limitação tem-
regiões metropolitanas do Rio de Janeiro e poral das informações longitudinais dispo-
Fortaleza. Os resultados obtidos encontram- níveis.
se na Tabela 1. Esta tabela revela que o pro-
grama teve impacto positivo e estatisticamen-
te significativo sobre o emprego, mas não 5.3. Intermediação de mão-de-obra
sobre a renda daqueles já ocupados. Quanti-
tativamente, os resultados da Tabela 1 mos- No caso da intermediação de mão-de-obra,
tram que o acesso ao treinamento profissio- a disponibilidade de avaliações é mais limi-

TABELA 1
AVALIAÇÃO DO IMPACTO DA QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL SOBRE A
INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO E A RENDA
(Diferença das médias 6 meses antes, e entre 6 a 12 meses depois)
VARIÁVEIS DEPENDENTES
TAXA DE TAXA DE TAXA DE RENDIMENTO RENDIMENTO LOGARITMO DO
PARTICIPAÇÃO DESEMPREGO OCUPAÇÃO DA PEA MÉDIO DA PIA MÉDIO DOS RENDIMENTO
MOMENTO DA OCUPADOS MÉDIO DOS
AVALIAÇÃO OCUPADOS
COEFI- P-VALOR COEFI- P-VALOR COEFI- P-VALOR COEFI- P-VALOR COEFI- P-VALOR COEFI- P-VALOR
CIENTE (%) CIENTE (%) CIENTE (%) CIENTE (%) CIENTE (%) CIENTE (%)
RIO DE JANEIRO 0,11 96 -3,48 37 3,60 36 10,17 16 -2,38 92 0,03 72
FORTALEZA 3,32 13 -3,06 43 3,20 41 12,54 6 -11 66 -0,01 91
Fonte: Planos Estaduais de Qualificação (PEQ) da Secretaria de Formação e Desenvolvimento (Sefor/TEM) 1996 a 1998.

12_nota_3.pmd 67 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
68 conjuntura e análise

tada. Os resultados aqui apresentados deri- acaba sendo mais importante para definir a
vam-se de uma avaliação recente, realizada qualidade do emprego obtido. Em particu-
pelo IPEA e pela Fipe, com base em informa- lar, esse serviço se mostrou mais eficaz em
ções longitudinais da PME. Os resultados garantir um maior acesso ao setor formal,
dessa avaliação aparecem na Tabela 2 e se do que em retirar o trabalhador da condi-
baseiam em um acompanhamento de dois ção de desempregado.
meses do desempenho, no mercado de tra-
balho, de trabalhadores originalmente de-
sempregados. Para efeito de análise, estes tra- 6. Dificuldades operacionais
balhadores foram divididos em dois grupos:
a) desempregados que procuraram Em conjunto, as avaliações disponíveis do
intermediação de mão-de-obra na semana da impacto efetivo das políticas apresentadas aci-
entrevista e b) desempregados que não pro- ma sobre o desemprego e a produtividade da
curaram intermediação de mão-de-obra na mão-de-obra revelam resultados que podem
semana da entrevista. estar bem aquém do potencial. Em grande
medida, o desempenho deficiente resulta de
A Tabela 2 revela que, em apenas duas das limitações e imperfeições na implementação
seis regiões metropolitanas investigadas (Belo desses programas. Assim sendo, dedicamos as
Horizonte e Salvador), aqueles trabalhado- próximas subseções à descrição de alguns fa-
res que procuraram intermediação de mão- tores operacionais que podem estar limitando
de-obra tiveram um desempenho melhor do o impacto de tais intervenções.
que os que não procuraram. Mesmo nessas
regiões metropolitanas, o impacto não foi
muito elevado. De fato, os trabalhadores que 6.1. Microcrédito
procuraram trabalho terminaram por apre-
sentar uma proporção de ocupados entre 2 e O Proger e o Pronaf, bem como qualquer
3 pontos percentuais maior, além de uma outro programa de microcrédito, enfrentam
proporção de ocupados no setor formal de 3 uma dificuldade fundamental. Numa econo-
a 6 pontos percentuais maior do que aque- mia em desenvolvimento com escassez de
les trabalhadores que não procuraram a crédito e uma taxa de juros elevada, é difícil
intermediação. Uma vez que o impacto so- identificar e atingir com crédito a taxas de
bre a proporção de ocupados não é estatisti- juros razoáveis os segmentos que são pobres,
camente significativo, esses resultados mos- fundamentalmente devido a suas restrições
tram que a intermediação de mão-de-obra no acesso ao crédito. Ou seja, trata-se de

TABELA 2
ESTIMATIVAS DO IMPACTO DA INTERMEDIAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA
SOBRE A OCUPAÇÃO E A RENDA
(1 mês após a intervenção)
VARIÁVEIS DEPENDENTES
REGIÃO METROPOLITANA OCUPAÇÃO NO MÊS RENDA DO TRABALHO EMPREGO FORMAL NO MÊS
POSITIVA NO MÊS
COEFICIENTE P-VALOR (%) COEFICIENTE P-VALOR (%) COEFICIENTE P-VALOR (%)
BELO HORIZONTE 2.079 14 0.967 42 2.798 0
PORTO ALEGRE -1.211 30 -0.843 40 -0.795 33
RECIFE -1.033 46 -0.820 49 0.415 53
RIO DE JANEIRO -1.597 38 0.117 94 1.364 21
SALVADOR 2.559 27 -0.307 89 5.475 0
SÃO PAULO 0.204 84 0.347 69 0.522 39
Fonte: Pesquisa Mensal do Emprego (PME) de 1990 a 1998.
Nota: 1. Utilizou-se regressão linear.
2. Os dados da tabela foram obtidos a partir de uma concatenação onde se acompanha um mesmo indivíduo ou grupo de indivíduos por um
período de dois meses, com o intuito de captar a evolução de sua situação.
3. Essa regressão inclui controles para as variáveis que estão na tabela.

12_nota_3.pmd 68 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
conjuntura e análise 69

como identificar e atingir aqueles indivídu- dendo poder sobre a operacionalização do


os que, ao obter acesso a crédito, têm condi- Proger, na medida em que cabe às institui-
ções efetivas de sair da pobreza. ções financeiras a seleção dos beneficiários,
tanto em termos de seu perfil como também
Vale refletir sobre três aspectos dessa ques- em termos quantitativos.
tão, os quais influenciam o desenho e a ges-
tão do Proger. O primeiro deles diz respeito
ao fato de que, no Brasil atual, dada a situa- 6.2. Qualificação profissional
ção macroeconômica que faz com que a taxa
de juros seja muito elevada, a política de Embora exista uma variedade de fatores que
microcrédito não pode se limitar a oferecer possam estar levando a que o Planfor tenha
crédito à taxa de mercado. Afinal, a rentabi- impactos sobre o desemprego e a produtivi-
lidade atual dos pequenos empreendimen- dade inferiores ao esperado, o de maior im-
tos não tem se mostrado alta o suficiente portância parece estar relacionado à seleção
para que os tomadores de empréstimo pos- dos cursos e da clientela. De acordo com a
sam pagar os juros de mercado. Dessa for- concepção atual do programa, a seleção dos
ma, não há como escapar de um microcrédito cursos se dá através de avaliações da deman-
da presente nos mercados de trabalho locais,
a taxas de juros subsidiadas, o que por sua
as quais são realizadas pelas Comissões Mu-
vez, pode trazer uma série de outros incon-
nicipais e Estaduais de Emprego. Estas avali-
venientes.
ações são consolidadas pela Comissão Esta-
dual de Emprego e pela Secretaria Estadual
O segundo aspecto na operacionalização do
de Trabalho num Plano Estadual de Qualifi-
microcrédito merecedor de reflexão é que,
cação (PEQ). Os cursos selecionados são,
para se garantir um amplo acesso da popu-
então, confiados a um conjunto de entida-
lação pobre a esse serviço, é necessário que
des executoras. Em geral, somente após a
tal população tenha, de fato, acesso a insti-
oferta ter sido definida, pode-se, finalmen-
tuições de crédito. Quer dizer, é imprescindí-
te, buscar os treinandos para preencher as
vel a existência de capilaridade nas institui-
vagas disponíveis. Na medida em que rara-
ções de crédito e que, além disso, as institui-
mente ocorre uma divulgação ampla dos
ções operadoras sejam agressivas em buscar
cursos que serão oferecidos, bem como dos
sua clientela. No caso específico do Proger,
requerimentos necessários, o preenchimen-
uma vez que apenas três instituições (Banco
to das turmas acaba, ao menos em parte,
do Nordeste, Caixa Econômica Federal e Ban- delegado para a entidade executora. Esta pre-
co do Brasil) operam o microcrédito, o aces- enche as vagas disponíveis com base na sua
so da população a esse serviço encontra-se própria clientela.
limitado. Assim, uma alternativa se contor-
nar essa restrição estaria em permitir que O procedimento que acabamos de descrever
bancos privados também pudessem operar pode vir a padecer de dois problemas funda-
o microcrédito oferecido pelo Proger. Com mentais. Pelo lado da oferta, ao não tomar
isso, se aumentaria a concorrência e a diretamente as preferências por treinamen-
capilaridade na provisão, o que, por sua vez, to profissional dos próprios trabalhadores,
poderia trazer ganhos adicionais de eficiên- como um insumo básico central ao processo
cia em todo o processo. de seleção dos cursos, o processo vigente pode
levar a sérios desvios, uma vez que as condi-
Por fim, o terceiro aspecto relaciona-se ao ções do mercado de trabalho são muito vo-
processo de seleção dos beneficiários. Dado láteis e difíceis de prever. Pelo lado da de-
que a população beneficiária tem dificulda- manda, no que se refere à seleção da cliente-
des em apresentar colaterais e como os riscos la, o sistema atual não garante igualdade de
de inadimplência são plenamente assumidos oportunidades no acesso ao programa. Dada
pelos operadores de crédito, a escolha dos a divulgação limitada dos cursos oferecidos,
beneficiários está obviamente nas mãos das pode ocorrer que trabalhadores com as mes-
instituições operadoras do programa. Com mas necessidades e capacidades tenham aces-
isso, os gestores do programa acabam per- so diferenciado ao programa.

12_nota_3.pmd 69 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
70 conjuntura e análise

Uma forma de evitar estes dois problemas periodicamente à entidade provedora do ser-
consistiria em criar um procedimento viço de intermediação. Em ambos os casos,
seqüencial com quatro passos: a) construir os custos são elevados e não há garantias de
um cadastro dos cursos que poderiam po- que a velocidade seja adequada.
tencialmente estar disponíveis e avaliar a
qualidade dos cursos e das entidades execu- Uma alternativa para a provisão de inter-
toras, b) selecionar a clientela do programa, mediação de mão-de-obra, com um baixo
c) solicitar que cada beneficiário do progra- grau de intervenção pública, seria limitar a
ma, à luz do cadastro existente e do ação do Estado ao cadastramento dos traba-
aconselhamento recebido, selecione o curso lhadores desempregados e ao desenvolvimen-
e entidade onde desejaria obter o treinamen- to de um programa computacional que per-
to, bem como o momento em que desejaria mitisse fazer o casamento entre trabalhado-
que o curso ocorresse, e d) encaminhar as res e postos de trabalho. Segundo esse
entidades executoras à demanda por quali- enfoque, tal cadastro se tornaria disponível
ficação existente, de tal forma que estas pos- gratuitamente para todas as empresas cadas-
sam programar a oferta. Com base nesse sis- tradas, as quais poderiam utilizar, para a
tema seria possível garantir a igualdade de busca de trabalhadores, tanto o programa
oportunidade ao programa e, simultanea- computacional oferecido pelo Estado, quanto
mente, incorporar as preferências dos traba- um critério próprio de seleção. Nesse último
lhadores ao processo seletivo dos cursos. caso, a convocação dos trabalhadores seria
realizada pela própria empresa, embora par-
te dos custos possa estar sendo subsidiada
6.3. Intermediação de mão-de-obra pelo Estado. Ao se permitir que as empresas
financiem parte dos custos, há maiores ga-
No caso da intermediação de mão-de-obra, rantias da existência de eficiência no proces-
a principal limitação operacional parece ser so de seleção e de uma maior proporção de
uma intervenção excessiva do Estado em to- convocados efetivamente contratados.
das as etapas da produção do serviço. Se, por
um lado, a intervenção direta do Estado
pode estar garantindo a igualdade de opor- 7. Considerações finais
tunidades ao serviço, por outro, esta inter-
venção pode estar gerando uma provisão Nesta nota, nossa preocupação foi analisar
ineficiente. as políticas estruturais diretas de combate ao
desemprego e aos baixos níveis de produtivi-
Para verificar como um menor engajamento dade e remuneração. De uma maneira geral,
do poder público na produção desse serviço tais políticas modificam o mercado de tra-
pode levar a ganhos de eficiência, é necessá- balho através da realização de um ou mais
rio analisar o que se passa em cada fase de objetivos dentre os listados adiante: a) gera-
seu processo produtivo: a) captação das va- ção de novos postos de trabalho, b) melhoria
gas, b) cadastramento dos desempregados, da qualidade dos postos já existentes, c)
c) casamento entre vagas e desempregados, e melhoria da qualificação dos trabalhadores,
d) encaminhamento dos trabalhadores aos ou d) melhoria do casamento entre traba-
postos de trabalho selecionados. lhadores e postos de trabalho.

A dificuldade central da provisão pública está Conforme vimos, três tipos de políticas ati-
na fase de encaminhamento dos trabalhado- vas de emprego e renda foram investigados:
res. Dado que uma vaga encontrada é um bem a) microcrédito, b) qualificação do trabalha-
altamente perecível, torna-se fundamental que dor e c) intermediação de mão-de-obra. Nos-
ao se encontrar uma vaga potencial para um sa preocupação foi a tentar descrever breve-
trabalhador, este possa ser encaminhado o mente a eficácia de cada uma, levando tam-
mais rápido possível. No caso de a vaga ter bém em consideração os problemas opera-
sido captada após o cadastramento do traba- cionais mais freqüentes. Os resultados obti-
lhador, a necessidade de convocação torna- dos indicam que se, por um lado, há evidên-
se urgente, além de requerer que ele retorne cia de que essas políticas têm impacto positi-

12_nota_3.pmd 70 19/11/02, 18:55


MERCADO DE TRABALHO
conjuntura e análise 71

vo, por outro, a evidência é de que este im-


pacto é substantivamente pequeno. Uma
análise da forma como esses programas ope-
ram revela que os impactos podem estar sen-
do limitados pela forma de implantação dos
mesmos. No caso do microcrédito, a existên-
cia de poucas instituições operadoras e tal-
vez o fato de a capilaridade dessas institui-
ções estar aquém do necessário, têm contri-
buído para restringir o acesso da população
pobre a esse serviço. Além disso, acreditamos
existir dificuldades relacionadas à escolha dos
beneficiários. Em se tratando da qualifica-
ção profissional, identificamos dificuldades
com o processo utilizado para selecionar os
cursos e a clientela. Por fim, no caso da
intermediação de mão-de-obra, acreditamos
que um excessivo envolvimento do Estado
no processo de produção desse serviço pode
explicar, ao menos, parte da ineficácia do
programa.

Em conjunto, a análise realizada das políti-


cas estruturais diretas de proteção do empre-
go e da renda indica que apesar de elas esta-
rem teoricamente desenhadas de forma ade-
quada, sofrem deficiências em função da
forma de implementação.

12_nota_3.pmd 71 19/11/02, 18:55


12_nota_3.pmd 72 19/11/02, 18:55

Você também pode gostar