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ARTIGO

,.., A

JAPAO MILAGRE ECONOMICO ",

E SACRIFIC/O SOCIAL
• Gláucia Maria Vasconcellos Vale * PALAVRAS·CHAVE: Japão, eficiência econômica, qualidade
Economista, pós-graduada em Economia Internacional de vida.
(DENUniversité Paris I, Sorbonne, Panthéon),
Professora da PUC/MG, Coordenadora de Pesquisa e
Desenvolvimento do SEBRAE.
*ABSTRACT: The author makes an evaluation of the Japanese
economic performance, by using some "sucess indicators":
* RESUMO: A autora analisa a performance da economia ja- static efficiency, dinamic efficiency, national income' s growth
ponesa, através de alguns "indicadores de sucesso" de uso rate, consumer satisfation and income distribution. A search
corrente: eficiência estática, eficiência dinâmica, taxa de was conducted covering the industrial organization and
crescimento da renda nacional, satisfação do consumidor e enterprise environment, showing some vulnerable aspects of
perfil de renda. Faz uma minuciosa incursão no terreno da the so called "Japanese miracle".
organização industrial e no ambiente empresarial do país,
demonstrando os pontos vulneráveis do chamado "milagre
japonês" * KEY WORDS: [apan, economic efficiency, quality of life.

44 Revista de Administração de Empresas São Paulo, 32(2): 44-57 Abr./Jun. 1992


JAPÃO· MILAGRE ECONÔMICo. ..

INTRODUÇÃO imperfeições de mercado, susceptíveis de


reduzir a eficiência de utilização de recur-
o Japão de hoje é fruto de uma longa sos e fatores.
evolução histórica e o chamado "milagre
japonês", resultante do surpreendente 2. Eficiência dinâmica
crescimento econômico do pós-guerra não
representa um corte abrupto em relação ao Relaciona-se com as possibilidades de
passado. A grande transformação ocorreu, crescimento de uma economia. Nesse con-
na verdade, há mais de 100 anos, com a texto, a natureza do progresso técnico, ali-
Restauração Meije, quando o país iniciou ada ao ambiente de expectativas que se
sua transição do' feudalismo para a formam em relação às possibilidades de
modernidade, criando um tipo de socie- crescimento da economia, são variáveis-
dade bastante peculiar. chave.
Já naquela época, Herbert Spencer afir-
mou, demonstrando uma grande capaci- 3. Taxa de crescimento da renda nacional
dade preditiva, que, no Japão, as obriga-
ções tradicionais para com os superiores e, Dado um determinado nível de eficiên-
acima de tudo, para com o imperador, cia dinâmica de uma economia, sua taxa de
constituiam a grande oportunidade do país crescimento pode ser aumentada se ocor-
e que este lograria progredir seguramente rerem mudanças na relação consumo/
sob os seus superiores e prevenir-se contra poupança e trabalho/lazer. Um sistema
as dificuldades inevitáveis em nações mais econômico pode, certamente, apesar de
individualistas. Nesse comentário, encon- suas ineficiências dinâmicas, obter taxas
tra-se o embrião do que viria a ser uma mais elevadas de crescimento, através do
característica distintiva da sociedade ja- aumento de sua taxa de poupança ou no
ponesa - a disciplina e o espírito de grupo, montante de trabalho.
que, seguramente, têm contribuido para
moldar as feições do Japão moderno e de 4. Satisfação do consumidor
suas organizações econômicas.
Mas o Japão moderno não pode ser Balassa 1 propõe o uso de certos fatores
considerado, exatamente, um paraíso, para a aferição da satisfação do consumi-
fruto de um milagre econômico. Uma dor, como:
análise mais minuciosa do desempenho da a) preferências entre objetivos de pro-
economia japonesa demonstra que, na dução e objetivos individuais,
verdade, não se pode falar de "milagre b) correspondência entre a taxa atual de
japonês". O modelo econômico japonês é poupança e a desejada pelos indivíduos,
não só peculiar à realidade japonesa e não c) preferências individuais entre traba-
pode, por conseqüência, ser transportado lho e lazer. A satisfação do consumidor,
para outras realidades como, também, não como definida nos dois últimos tópicos,
pode ser considerado um exemplo de su- não afeta a eficiência estática ou dinâmica
cesso absoluto, visto da perspectiva de de- mas, seguramente, afeta a taxa de cresci-
terminados indicadores de desempenho mento da renda nacional.
econômico.
O propósito deste trabalho é o de anali-
sar o desempenho da economia japonesa, 5. Distribuição de renda
utilizando-se, para isto, de alguns indica-
dores de sucesso de uso corrente, especi- A incorporação desta variável entre os
ficados a seguir: indicadores de sucesso de um sistema
econômico traz para a análise o problema
1. Eficiência estática na alocação de recursos de juízo de valor, pois pressupõe uma de-
Esta dimensão incorpora as questões de finição prévia de uma escala de preferên-
1. BALASSA, Bela A. "Sucess
eficiência alocativa de curto prazo, a nível cias entre uma distribuição mais igualitária
crileria for economic syslem". In
das unidades de produção, das indústrias de renda, como preconizada pelas doutri- BORNSTEN Morris (org.) Compa·
e setores. Repercutem aqui, naturalmente, nas socialistas, e distribuição com base na rative EconomicSystem, modelsand
as questões das externalidades de produ- produtividade, como impera nos modelos cases, lIIinois, Richard D. "win Inc.
ção e consumo, dos oligopólios e outras de economia de mercado. 1969,452 p.

Copyright ©1992, Revista de Administração de Empresas I EAESP I FGV, São Paulo, Brasil. 45
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EFICIÊNCIA ESTÁTICA NA ALOCAÇÃO DE do empregado progride associado ao seu


RECURSOS tempo de permanência na empresa e não,
exatamente, de seu desempenho, da
A economia japonesa apresenta uma complexidade ou responsabilidade de seu
série de instituições e mecanismos que in- trabalho.
terferem no processo alocativo ótimo de De acordo com uma pesquisa realizada
mercado, tais como a natureza do objetivo pelo Ministério do Trabalho, apenas 4.833
empresarial que não parece perseguir a empresas, num total de 70.845, levavam
maximização do lucro, a rigidez existente em consideração a variável "eficiência" na
no mercado de fatores, a estrutura bastante determinação de seus salários básicos.
oligopolizada e fortemente associativista Embora um número crescente de empresas
de sua economia. A isto acrescentam-se as venha dando certa atenção a esse fator, seu
mudanças de natureza mais estrutural em impacto na composição de salários é ainda
curso no país, ligadas ao processo de re- marginal. O sistema de remuneração ba-
conversão industrial. seado no princípio de antigüidade de
No processo de alocação de recurso, um certa forma contraria os pressupostos de
aspecto que chama a atenção na economia determinação salarial com base na produ-
japonesa é a baixa fluidez relativa de certos tividade marginal. Isto ocorre mesmo
fatores, o que, inclusive, destoa de alguns considerando que a idade, necessaria-
pressupostos convencionais de eficiência, mente, incorpora um elemento de experi-
baseados em dogma da economia clássica ência, que faz aumentar a produtividade
e neoclássica. Na relativa imobilidade do individual. Num país onde a mão-de-obra
fator trabalho, situa-se uma das mais im- é de boa qualidade, por possuir ótimo ní-
portantes características da economia ja- vel de escolaridade, trabalhadores ini-
ponesa. ciantes podem apresentar taxas elevadas
de produtividade, não refletivas em seus
••••••••••••••••••••••• salários .
Para Druker 2, grande parte da sur-
A integração empresarial, além de preendente produtividade do Japão no
facilitar a difusão de tecnologia, pós-guerra pode ser explicada pela dife-
exerce um outro papel altamente rença de salários entre trabalhadores mais
jovens e trabalhadores mais antigos, apre-
funcional, concorrendo para a
sentando, ambos, taxas similares de pro-
diminuição das incertezas e riscos dutividade. A empresa japonesa foi, então,
associados ao ambiente de negócios. beneficiada com a grande oferta de novos
trabalhadores que chegavam anualmente
••••••••••••••••••••••• no mercado e eram rapidamente absorvi-
As empresas japonesas, regra geral, fa- dos.
zem o recrutamento de pessoal uma vez Para manter esse sistema de emprego
por ano, diretamente junto às escolas e vitalício e de remuneração baseada na an-
universidades. O fluxo de mão-de-obra tigüidade, onde a mão-de-obra é conside-
entre as empresas é muito limitado e as rada quase um capital fixo, a empresa ja-
grandes empresas praticamente não com- ponesa tem que ampliar rapidamente o
petem entre si por especialistas e pessoal seu quadro de pessoal, incorporando no-
mais treinado. Cada empresa cria, treina e vos empregados, e estimular a aposenta-
mantém o seu próprio pool de trabalhado- doria precoce dos mais antigos. A tendên-
res, com alto grau de mobilidade interna e cia recente de escassez de mão-de-obra
grande flexibilidade. Essa situação deriva poderá comprometer seriamente esse mo-
da prática do emprego vitalício, prevalente delo. Segundo dados de uma entidade de
na economia japonesa. pesquisa, Teikoku Data Bank, perto de 100
Com base nesse princípio, o jovem empresas japonesas encerraram suas ati-
2. DRUKER, Peler F. "Economic
realilies and enlerprise slralegy". In
recém-formado que ingressa na empresa, vidades durante o ano de 1990por falta de
VOGEL. E. V. (org.) Modem lá vai permanecer, até a idade da apo- pessoal.
Japanese organization and decision sentadoria. Acoplada a isto, existe a prática Na utilização do fator terra, pode-se
making, Tokio, Charles E. Tutlle Co., de ascensão profissional e salarial baseada observar, também, uma ineficiência
1983, 340 pp. no critério de antigüidade, onde o salário alocativa, estimulada pelas condições na-

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JAPÃO - MILAGRE ECONÓMICO ..

turais do país e reforçada por determina- americana de dissolução, no pós-guerra,


das políticas públicas. A população japo- dos zaibatsu, as corporações empresariais
nesa, que representa 2.5% da população originárias do Período Meiji,e que estavam
mundial, ocupa uma extensão territorial na origem do processo de industrialização
que equivale a pouco mais de 0.3% da su- e militarização do país, não comprometeu
perfície terrestre. Mais de 70% da área to- o caráter altamente gregário da economia.
tal do país é formada por montanhas e flo- No seu lugar, surgiram os keiretsu, gran-
restas, ficando a área habitável bastante des conglomerados empresariais apoiados
restrita. A população localiza-se, basica- em sólidos grupos financeiros, que atingi-
mente, nas áreas urbanas e nas três maio- ram o apogeu na década de 1960.Existem
res cidades - Tóquio, Osaka e Nagoya- atualmente seis grande grupos empresa-
concentra-se perto de 45% da população riais: Mitsui, Mitsubishi, Sumimoto, Fuyo,
total. A essa matriz de dificuldades asso- Sanwa, Dai-Ichi-Kangi.
ciadas ao uso do solo, sobrepõe-se a políti- No interior dessas corporações, agru-
ca de independência alimentar do país, pam-se empresas de diferentes ramos e
com o lobby formado pelos agricultores, tamanhos, que desenvolvem uma estraté-
que restringe o uso do solo urbano, com gia de especialização intra-ramo e alto es-
impacto perverso a nível de formação de pírito de solidariedade intragrupo. Nesse
preço, ocupação do solo e forma urbana. ambiente, a competição ocorre entre em-
Nesse ambiente de baixa fuidez relativa presas de diferentes grupos. No interior
de fatores de produção, tem lugar um tipo desses agrupamentos, desenvolvem-se
de competição empresarial bastante pecu- relações empresariais muito estáveis.
liar. O Japão distancia-se bastante do Dentro da estrutura industrial japonesa,
paradigma da livre concorrência. Sua eco- a grande empresa recorre, freqüentemente,
nomia caracteriza-se, por um lado, por a empresas menores, em regime de
uma cooperação harmoniosa e, ao mesmo subcontratação. Perto de 66% das peque-
tempo, por uma competição acirrada entre nas e médias empresas, que representam
as empresas. A propósito disso, VogeP 99% do número de empresas existentes no
afirma que a competição entre grupos país, operam como subcontratadas de
empresariais é intensa no Japão, existindo empresas maiores. O vínculo entre as em-
em todos os níveis, mas coexistindo, sem- presas tende a ser bastante estável pois
pre, com uma ética de negociação maior. aproximadamente 70% das empresas
Embora grandes empresas possam com- subcontratadas nunca mudaram de par-
petir intensamente para ampliar suas res- ceiro. Essa rede de interesse entre diferen-
pectivas fatias de mercado, elas não alme- tes empresas pode ser melhor visualizada
jam levar seus concorrentes à falência. no caso da indústria automobilística, onde
Para muitos analistas da economia ja- as empresas menores agrupam-se em tor-
ponesa, o motor propulsor da com- no de uma empresa de montagem e pas-
petitividade empresarial é o desejo das sam a ser reconhecidas como "Grupo
empresas em ampliar suas fatias de mer- Nissan", "Grupo Toyota" etc.
cado. Druker, analisando o comporta- No setor automobilístico americano, as
mento empresarial japonês, afirma que as montadoras obtêm cerca de 50% de suas
empresas procuram maximizar seu cresci- necessidades de peças e componentes de
mento e não o lucro. Também Reischauer' outras empresas; no Japão, 75%. Na
salienta esse fato, afirmando que o execu- Toyota, pode-se encontrar um caso típico
tivo japonês deriva satisfação não exata- de relação vertical de subcontratação. A
mente de altas taxas de lucro mas do ta- empresa possui 168 empresas subcon-
manho de sua empresa e de sua importân- tratadas primárias, sendo que 21 % desse
cia para a vida nacional. A economia japo- total são formados por empresas de menor
nesa é dominada pelos grandes grupos porte. Por sua vez, essas 168 empresas
empresariais. possuem 5.437 subcontratantes secundá-
Dentro das grandes corporações é que rios, sendo 89% representado por peque- 3. VOGEL, E. V. Op. cito
pode ser melhor compreendido e vi- nas e médias empresas. Essas 5.437 em-
sualizado o caráter, ao mesmo tempo, presas possuem 41.703 empresas subcon- 4. REISHAUER, Edwin O. The
competitivo e gregário da economia japo- tratadas terciárias, sendo 98% representa- japanese. Cambridge, Harvard
nesa. O esforço das tropas de ocupação do por pequenas e médias empresas. Universily Press, 1977,443 p.

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Mesmo fora dos grandes grupos em- cesso de modernização com economias
presariais pode-se observar a forte ten- externas geradas pelas grandes organiza-
dência associativista das empresas. O Ja- ções, através da oferta conjunta de matéria-
pão possui aproximadamente 50.000 coo- prima, capital humano e mercado.
perativas empresariais, reunindo perto de Mas a cooperação empresarial convive
80.000 empresas associadas. Existe um com um ambiente de grande competição,in-
banco unicamente voltado para o financia- tensificada, atualmente, pelo processo de
mento desses empreendimentos coletivos reconversãoindustrial que atravessa o país.
- o "Shoko Chukin Bank", associado aos O começo da década de 1970 marca o
movimentos de relocalização industrial em final de um ciclo de taxas elevadas de
curso no país. Atualmente o banco tem di- crescimento econômico, que vinha se
rigido seus financiamentos para a cons- mantendo desde o início do século, so-
trução de distritos industriais - "Danchi" mente prejudicado pela Segunda Guerra
- para abrigar empresas cooperativas. Mundial e pelo período de reconstrução
que se seguiu. Três eventos externos vie-
ram afetar, significativamente, a economia
••••••••••••••••••••••• japonesa: os dois choques sucessivos do
A parcela de renda familiar alocada petróleo em, respectivamente, 1973e 1978,
em gastos com alimentação, embora e a grande valorização do yen em 1985.
Embora a economia tenha demonstrado
venha declinando nas últimas grande capacidade de adaptação à nova
décadas, é ainda bastante elevada, realidade, as conseqüências, a nível inter-
face a parâmetros dos demais países no, foram penosas. Ao lado desses eventos,
desenvolvidos. Em 1970, o coeficiente outros fatores externos vêm contribuindo
de Engels foi de 25%. para gerar mudanças, como as pressões
para uma maior liberalização da economia
••••••••••••••••••••••• para produtos estrangeiros e contra a pe-
netração de produtos japoneses no oci-
dente.
Uma outra característica bastante pecu- O Japão está entrando numa nova fase
liar do modelo industrial japonês, que de seu processo de desenvolvimento eco-
constitui, também, indicador do grau de nômico, que pode ser caracterizada pela
integração empresarial existente, é a or- redescoberta de seu mercado interno, pela
ganização por linhas de produção, for- ênfase em empresas intensivas em pro-
mada por empresas independentes, mas gresso técnico e pela tendência a uma
que funcionam como se fizessem, coleti- crescente diferenciação de produto, para
vamente, parte de uma linha de montagem atender a uma demanda mais personali-
de um mesmo empreendimento, a exem- zada e exigente.
plo dos produtores de talhares e faqueiros Se durante a fase de rápido crescimento
da cidade de Tsubame, que é, individual- econômico as empresas competiam entre
mente, a maior produtora desses artigos no si, basicamente, através de preços, a partir
mundo. Nesse local, existem mais de 200 de meados de 70a competição intensificou-
pequenas e médias empresas, possuindo, a se. A diferenciação de produtos, a especia-
maior parte delas, menos de 20 emprega- lização, a excelência empresarial passam a
dos. Cada empresa especializou-se numa ser variáveis cada vez mais importantes.
etapa específica do processo de produção Esse novo ambiente vai exigir das empre-
e trabalha de maneira integrada com as sas mudanças na maneira de encarar o
outras empresas. Essas empresas organi- mercado, explorar novas tecnologias e ad-
zam-se numa espécie de associação, que se quirir vantagens comparadas específicas.
encarrega da coordenação do processo de Muitas empresas, sobretudo de menor
produção e da promoção mercadológica porte, não estão conseguindo sobreviver.
5. ISHIKURA, Mitsuo. "Producing
district industry and pro motive
do produto. No período 1974/1984, a taxa de mortali-
measures".ln: EvolutionofPoliceand Como salientado por Mitsuo Ishíkura", dade das pequenas e médias empresas foi
Changing Condiction of Small and , os japoneses conseguiram modernizar a de 54%, o que indica que perto de 2.7 mi-
Medium Sizes Enterprise in Japan, produção técnica de seus pequenos esta- lhões de empresas encerraram suas ativi-
Osaka, OITC, 1989. belecimentos, além de reforçar esse pro- dades.

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JAPÃO· MILAGRE ECONÔMICO ...

Em momentos de crise econômica, prego de 3.6%, o nível mais alto atin-


pode-se observar o lado perverso do mo- gido desde 1953.
delo de integração empresarial que une
grandes e pequenas empresas. A pequena EFICIÊNCIA DINÂMICA, PROGRESSO TÉCNICO
empresa subcontratada funciona, muitas E REDUÇÃO DE INCERTEZAS
vezes, como uma espécie de amortecedor
dos efeitos mais nocivos da recessão sobre N essa dimensão de análise a per-
a grande empresa. Esta, através de meca- formance relativa do modelo japonês é al-
nismos de redução ou cancelamento de tamente positiva. O país, ao mesmo
encomendas, mantém sua flexibilidade e tempo que diminui as incertezas e incon-
enfrenta, mais facilmente, as oscilações do sistência de expectativa que são típicas de
ciclo econômico. regime de livre empresa, através de um
A Tenri Brothers Ltda", empresa situa- planejamento governamental ativo e de
da em Osaka, ilustra bem a dificuldade. A uma forte interação entre governo e setor
empresa iniciou suas atividades em 1974. privado, possui mecanismos peculiares de
Seu proprietário tinha sido empregado absorção, geração e difusão de progresso
senior de uma grande empresa e foi per- técnico. A estrutura oligopolizada da eco-
suadido a deixá-la para montar uma em- nomia japonesa, com a existência de uma
presa que atendesse, com exclusividade, às série de agrupamentos empresariais for-
necessidades de seu antigo empregador, mados por empresas de diferentes portes,
procedimento que é muito comum no país. setores e ramos de atividade, vai facilitar
A Tenri iniciou suas atividades com um bastante esse processo. Enquanto as gran-
capital próprio de 1 milhão de yen e dedi- des empresas possuem condições e recur-
cou-se à produção de caixas de papelão, sos para o financiamento das inovações, o
com 16 empregados, sendo dois deles de grau de integração empresarial existente
tempo parcial. No início, suas relações com no país vai facilitar tanto o processo de di-
a empresa subcontratante eram muito fusão tecnológica entre empresas de dife-
boas, e esta fornecia-lhe, inclusive, a ma- rentes portes, quanto o de desenvolvi-
téria-prima necessária. Os problemas sur- mento tecnológico entre empresas de di-
giram após 1978, quando seu único clien- ferentes ramos.
te, por razões associadas ao preço da terra, Por outro lado, um ponto importante a
teve que se mudar para uma localidade considerar no modelo japonês é a grande
distante, o que exigiu da Tenri um grande habilidade e produtividade de sua mão-de-
esforço de busca de novos parceiros. Em obra, somada à sua alta motivação e capa-
1984, seu contrato de subcontratação foi cidade de absorver inovações. O desem-
cancelado, o que levou a empresa quase à penho altamente positivo do Japão nessa
falência. Em 1987,ela foi obrigada a mudar variável destoa de outros países e coloca o
suas instalações e passou a ocupar um Japão numa posição singular.
precário escritório conjunto com mais duas No que diz respeito à variável incerteza
empresas, reduzindo suas despesas de e inconsitência de expectativa, pode-se
aluguel. Atualmente a empresa possui afirmar que o Japão se apresenta como um
doze empregados, sendo seis mulheres modelo econômico onde o grau de incer-
como prestadoras de serviço em regime de teza foi reduzido ao máximo, graças a uma
tempo parcial. O futuro é muito incerto simbiose que une o Estado aos grandes
para a empresa. grupos econômicos e a clareza das defini-
As mudanças estruturais que estão ções de política econômica. Durante todo o
ocorrendo no interior da economia, por processo de industrialização do país, o
mais benéficas que sejam da perspec- Estado exerceu um papel fundamental,
tiva de longo prazo, estão gerando inclusive estimulando a capacidade de
profundas crises. A evolução das taxas geração e absorção de tecnologia pelo setor
de desemprego retratam a situação privado.
atual. No período 1973/1978, o núme- As iniciativas das reformas políticas e
ro de desempregados chegou quase a econômicas do Período Meiji ficaram, so-
dobrar, passando de 680 mil para 1.249 bretudo, nas mãos dos samurais, especial-
mil, o que representou 2.2%. Em 1987, mente das categorias médias e inferiores. 6. O nome original foi alterado para
o país apresentou uma taxa de desem- Esses homens rapidamente reconheceram evitar a identificação da empresa.

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os tratados comerciais que haviam sido soube, de maneira eficiente, traduzir isto
negociados por Tokugawa e levaram a em políticas voltadas para o apoio às em-
cabo urna série de reformas de base. Foram presas. Através de urna atuação ativa, es-
criados os Ministérios de Finanças, da timulando e direcionando o setor privado,
Marinha, das Forças Armadas e da Edu- o governo tem definido claramente priori-
cação. Este último levou apenas três déca- dades de desenvolvimento e redirecionado
das para concluir um ambicioso programa as atividades de ramos industriais tradicio-
de educação universal. Foi também reali- nais para ramos mais modernos, intensivos
zada urna reforma fiscal, que instituiu um em progresso técnico. Para facilitar sua
imposto sobre a propriedade da terra, o missão, o governo parece contar com o re-
que permitiu ao governo construir ferro- conhecimento da nação da importância do
vias, linhas telegráficas e outros equipa- seu papel corno promotor e líder do pro-
mentos na área de infra-estrutura. Foram cesso de desenvolvimento, em conjunto
criadas indústrias em ramos considerados com as grandes lideranças empresariais,
estratégicos e enviados observadores para que se manifestam através de poderosas
os países ocidentais em busca de novos associações - Keidanren, Nikkeiren,
conhecimentos e tecnologias que pudes- Nissho, Keizai.
sem ser assimiladas pelas empresas japo- Essas organizações econômicas tiveram
nesas recém-criadas. A maior parte dessas um papel fundamental durante o processo
empresas foi, posteriormente, passada de desenvolvimento e de consolidação da .
para as mãos da iniciativa privada. Mas o economia japonesa, funcionando corno
governo continuou a dedicar-se à tarefa de mecanismos mobilizadores de consenso.
reforçar as empresas, através de subsídios Gerald L. Curtis", na sua análise da influ-
e privilégios especiais. ência que os grandes grupos empresariais
exercem sobre o meio político japonês, re-
••••••••••••••••••••••• conhece que o Japão possui mecanismos
únicos para facilitar o contato e a interação
No período 1901/1913 a produção entre suas elites.
industrial japonesa cresceu, em média Embora o governo exerça um papel re-
11 % a.a., contra 3.6% nos Estados levante, no que diz respeito ao desenvol-
Unidos, 2.4% no Reino Unido e vimento tecnológico do país, através de
4.7% na Alemanha. medidas de incentivo e estímulo ao setor
privado, é, na verdade, no segmento em-
••••••••••••••••••••••• presarial privado, que tem lugar a grande
corrida na área de pesquisa e desenvolvi-
No novo arranjo institucional do pós- mento, chave para o futuro do Japão. Os
guerra, o Ministério da Indústria e Co- gastos do país com pesquisa e desenvolvi-
mércio Internacional - MITI - encarre- mento ultrapassaram 9.000bilhões de yen
gou-se de definir objetivos e estratégias em 1986,o que representou 3.5% da renda
para segmentos industriais específicos. nacional, Desse total, 79% foi investido
Através desse Ministério passava todo pelo setor privado. Essa participação des-
processo de transferência de tecnologia toa, significativamente, da encontrada em
ocidental, tão importante no desenvolvi- qualquer outro país. Nos Estados Unidos,
mento industrial japonês. O MITI zelava por exemplo, as empresas participam com
para que a melhor tecnologia fosse adqui- 50% das fontes de recursos para Pesquisa
rida, sob as melhores condições e visando e Desenvolvimento, enquanto que o go-
à sua difusão no ambiente de negócios do verno entra com o restante. No Reino
país. Unido, a participação do setor privado é de
No entanto, enquanto o governo dita as 50.2%,na Alemanha, de 55.2%,na França,
7. CRAIG, A. L. "Functional and diretrizes que irão nortear o crescimento de 41.6%. No Brasil, a participação das
dyslunctional aspects 01government
das empresas, conserva-se urna ampla empresas privadas é inferior a 10%.
bureaucracy'. In: VOGEL, E. V. Op.
cil. margem de manobra para a iniciativa pri- A natureza das relações empresariais
vada. Segundo Albert M. Craíg", no seu também funciona corno urna fonte de es-
8. CURTIS, Gerald L. "Big business estudo sobre a burocracia japonesa, o ob- tímulo para a geração e a difusão de
and political inlluence'.ln: VOGEL, jetivo do Japão no pós-guerra tem sido inovação. Sobretudo no interior dos gran-
E. V.Op. cil. crescimento econômico, e a burocracia des grupos empresariais, existe um pro-

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cesso intenso de transferência de unir-se e convidar as novas empresas para


tecnologia e habilidades gerenciais. Muitas integrar uma associação de produtores,
empresas estão engajadas em atividades com o propósito de difundir tecnologia. A
conjuntas de desenvolvimento tecnológico. Associação de produtores de Komoro, lo-
Perto de 42%das empresas subcontratadas calizada em Nagano, é um exemplo desse
de pequeno e médio porte, classificadas tipo de esforço. Ela criou uma escola de
como possuindo excelentes habilidades treinamento, e uma central de inspeção de
gerenciais, estão realizando pesquisa e produtos, que libera um tipo de certificado
desenvolvimento com suas subcontra- de qualidade para produtos aprovados.
tantes, enquanto que 24% das subcontra- A integração empresarial, além de faci-
tadas com habilidades iguais ou inferiores litar a difusão de tecnologias, exerce um
a outras empresas do mesmo ramo fazem outro papel altamente funcional, concor-
o mesmo. rendo para a diminuição das incertezas e
A integração empresarial não só facilita riscos associados ao ambiente de negócios
a troca de informação e a difusão do pro- e tornando possível à empresa japonesa
gresso técnico como, também, é, muitas visualizar e perseguir, mais facilmente,
vezes, canalizada para essa dimensão es- objetivos de longo prazo. Essa situação
pecífica. Como salientado por Tsuji",a co- também parece permitir que os grandes
municação entre diferentes indústrias tor- grupos empresariais guardem parte de sua
na possível o nascimento de novos pro- energia para competir na arena internacio-
dutos, em novos ramos industriais, pelo nal. Nessa área, as empresas japonesas
agrupamento ou fusão de empresas. A in- apresentam-se como uma espécie de fren-
dústria da robótica é um caso típico, resul- te unida, reforçando e institucionalizando
tante da necessidade de união de empre- mecanismos de consulta, troca de infor-
sas com conhecimentos diferenciados e mação e ajuda mútua, na estratégia japo-
específicos, para a realização de pesquisa e nesa de penetração e conquista do merca-
o desenvolvimento de novos produtos. do externo para seus produtos e suas em-
Havia no Japão, em 1988, perto de 1.200 presas.
grupos empresariais envolvidos em pro- Um dos fatores determinantes de pro-
cessos de melhoria tecnológica comum, a dutividade é o investimento em capital. O
maior parte constituída por pequenas nível de investimento anual em fábricas e
empresas. equipamentos no Japão equivaleu a 25%
Uma outra importante fonte de inova- do produto real nas duas últimas décadas,
ção tecnológica entre empresas de portes o que representou o dobro do apresentado
diferentes é a associação de produtores, pelos Estados Unidos. Por outro lado, a
Dogyo Kumiai, formada por um grupo de relação entre FBKF(formação bruta de ca-
empresas engajadas na produção de um pital fixo - excluída residência) /PNB de
mesmo produto. Nesse caso a cooperação 1970/1978 foi de 25.4% no Japão e de 13%
ocorre entre empresas concorrentes. Esse nos Estados Unidos. No seu estudo sobre
tipo de associação de empresas é tradicio- produtividade no Japão, Arai'? salienta o
nal no Japão, remontando ao século pas- fato de as taxas de poupança nacional se-
sado, a exemplo da [apan Die Casting rem bastante elevadas, o que vem permi-
Association, [apan Mold & Manufactures tindo altos níveis de investimento, por sua
Association, [apan Small Toolmakers vez associados a um grande esforço de
Association e outras. Na origem desse pesquisa e desenvolvimento. Segundo ele,
processo de associação de empresas con- os investimentos empresariais vêm per-
correntes, o caso dos fabricantes de seda é mitindo que as empresas reduzam a idade
freqüentemente citado. No final de século de seus equipamentos para pouco mais de 9. TSUJI, M. Present condiction of
XIX,quando a seda constituía um impor- seis anos, contra mais de doze anos nos polícy for small and medium
tante item na pauta das exportações japo- Estados Unidos. Por outro lado, perto de enterprise in Japan. Seminário
50% de todo o investimento realizado em Measures for smaller industries,
nesas, os produtores começaram a sentir
Osaka, janeiro de 1989.
dificuldades em manter a qualidade de 1980 foi canalizado para o desenvolvi-
seus produtos, dado o grande número de mento de instalações e equipamentos 10. ARAI, Joji. 'Produtividade, a ex-
novas empresas que chegavam ao merca- poupadores de mão-de-obra e automáticos. periênciajaponesa".ln: Aumentosda
do, com um produto de qualidade inferi- Um indicador chave da competitividade Produtividade, Rio de Janeiro,
or. Os produtores tradicionais resolveram internacional de uma determinada econo- IntercuHural,1984.

51
RAE

mia é a relação produtividade da mão-de- or à média ocidental, que está hoje abaixo
obrai custo da mão-de-obra. Um estudo de 40 horas. Entre as grandes e as peque-
publicado pelo Dresdner Bank AF, na nas empresas existe uma diferença sema-
Alemanha, salienta que os baixos custos da nal de cinco horas e meia. Também o nú-
mão-de-obra, por um lado, ou, por outro, mero de dias de trabalho na semana não é
a sua elevada produtividade, não seriam, fixo. Aproximadamente 97% das empresas
por si SÓ, suficientes para dar ao país uma de grande porte oferecem regime de fim de
vantagem diferenciada na esfera interna- semana de dois dias, enquanto apenas 43%
cional. Apresenta uma comparação entre das empresas de pequeno porte fazem o
índices de produtividade e salário de dife- mesmo. Além do fato de a jornada de tra-
rentes países desenvolvidos, demonstran- balho no Japão ser muito longa, o traba-
do que o Japão possui as melhores condi- lhador não usufrui, plenamente, de suas
ções de competitividade, com o mais baixo férias. Enquanto pode tirar, em média, 14.8
"salário eficiência" ou seja, com um salário dias de férias remuneradas por ano, ele, na
médio relativamente mais baixo em rela- verdade, costuma tirar apenas 8.8 dias.
ção a outros países pesquisados e, ao mes- Seus gastos pessoais com lazer são ainda
mo tempo, apresentando uma produtivi- bastante limitados. Em 1987, a parcela da
dade relativamente mais alta. O valor da renda média familiar alocada neste item foi
produção, para cada unidade de custo de inferior a 6%.
produto, é, no Japão, 39% mais alto que na
Alemanha. • ••••••••••••••••••••••
TAXA DE CRESCIMENTO NA RENDA
Cerca de 42 % das empresas
NACIONAL, POUPANÇA E LAZER subcontratadas de pequeno e médio
porte, classificadas como possuindo
Os indicadores de sucesso do modelo excelentes habilidades gerenciais,
japonês, em relação a esta variável, são estão realizando pesquisa e desenvol-
muito bons. O país apresenta taxas eleva-
das de poupança. Durante os anos 60, essas
vimento com suas subcontratantes.
taxas foram duas a três vezes superiores às •••••••••••••••••••••••
existentes no Ocidente, chegando a 40% do
PNB. Em 1987, a propensão média para Com taxas elevadas de poupança,
poupar foi da ordem de 24%. Alguns fa- grande motivação e capacidade de traba-
tores vêm contribuindo para isto, como a lho do empregado, além de relações tra-
conhecida frugalidade do japonês, a ne- balhistas bastante estáveis, a performance
cessidade de as famílias economizarem do Japão, no que diz respeito às taxas de
para enfrentar o período de aposentadoria, crescimento da renda nacional, tem sido,
mal resguardado pelo Estado, a necessi- inquestionavelmente, a melhor do mundo.
dade de oferecerem boa educação para os Isto pode ser melhor visualizado pela
seus filhos, numa sociedade onde o acesso apresentação das taxas de crescimento de
às melhores escolas é fator determinante sua economia ao longo deste século. No
de mobilidade e sucesso profissional, a período 1901/1913, a produção industrial
necessidade de economizarem para a japonesa cresceu, em média, 11% aa., con-
aquisição da casa própria, num país onde tra 3.6% nos Estados Unidos, 2.4% no Rei-
os salários relativos não são elevados e o no Unido e 4.7% na Alemanha. Durante o
preço da terra é o maior do mundo. Soma- período 1913/1938, enquanto a taxa de
se a isto a tendência de as empresas inves- crescimento de produção industrial japo-
tirem grande parte de seus lucros, sendo nesa continuava alta - 8% aa. -, a dos
relativamente baixa a taxa de apropriação Estados Unidos foi de 1.4%, a do Reino
privada. Unido de 1.6%,a da Alemanha de 1.7%.O
Por outro lado, o tempo de trabalho no crescimento do país neste século somente
Japão é bastante elevado, face a parâmetros ficou realmente comprometido durante a
ocidentais. Embora o número de horas guerra e no pós-guerra, na fase de recons-
trabalhadas por semana varie bastante trução. Esse processo estendeu-se até 1955,
entre as unidades produtivas, a média é de quando, então, a economia atingiu nova-
41 horas e 40 minutos, o que é bem superí- mente os níveis anteriores à guerra, en-

52
JAPÃO· MILAGRE ECONÔMICO ...

trando na fase de rápido crescimento, que dia, 72.000 yen/ano e o japonês 369.000
vai durar até o início de 1970. yen. No que diz respeito ao item habitação,
embora as residências japonesas sejam, em
SATISFAÇÃO DO CONSUMIDOR E QUALIDADE geral, muito pequenas - média de 40m2
DE VIDA DA POPULAÇÃO - A REVERSÃO DE por família - e geralmente situadas longe
EXPECTATIVAS do local de trabalho, não são acessíveis
para todos os trabalhadores. O preço mé-
o Japão tem apresentado taxas elevadas dio de uma residência no país equivale, em
de crescimento econômico, em detrimento média, a 5.7 vezes o salário anual de um
de uma maior satisfação do consumidor. O trabalhador, enquanto nos Estados Unidos
processo de rápido crescimento não gerou e na França esta relação é de três vezes.
uma melhoria proporcional na qualidade Esses dados vêm demonstrar que apesar
de vida da população, que apenas agora de o Japão ter se transformado em uma
começa a vislumbrar outros objetivos as- grande potência econômica, o atual padrão
sociados ao desenvolvimento, tais como de vida de sua população ainda deixa
mais tempo e melhores condições para muito a desejar. Essa constatação pode ser
lazer, melhores condições ambientais, melhor observada através de um indicador
melhoria no sistema previdenciário. A mais geral, o Coeficiente de Engels. A
qualidade de vida da população é bem parcela de renda familiar alocada em gas-
inferior à encontrada em outros países de- tos com alimentação, embora venha decli-
senvolvidos. nando nas últimas décadas, é ainda bas-
Apesar do desempenho excepcional da tante elevada, face a parâmetros dos de-
economia em termos de crescimento da mais países desenvolvidos. Em 1970, esse
renda nacional, somada ao fato de a renda coeficiente foi de 25%. No período 1980/
per capita ser a maior do mundo, o país 1985, enquanto a porcentagem da renda
ainda não atingiu um nível de qualidade familiar gasta com alimentação foi de 19%
de vida compatível com o existente nos no Japão, nos Estados Unidos foi de 13%e
países mais desenvolvidos do Ocidente. na Bélgica, Nova Zelândia, Áustria, Reino
Um estudo realizado por três sindicatos, Unido, Alemanha Ocidental, França, Ca-
localizados no Japão, Alemanha e Estados nadá, Suíça, Suécia, Noruega esse coefici-
Unidos permite uma comparação do pa- ente foi inferior. No caso da Noruega, esse
drão de vida da população japonesa. Fo- coeficiente foi de 5%. No Brasil, ele foi de
ram pesquisadas oito famílias japonesas, 35%.
seis americanas e cinco alemãs, tomando- Apesar de o Japão ser dos maiores pro-
se como referência o mês de outubro de dutores de aparelhos eletrônicos, tendo
1987.11Embora o salário médio regular por produzido 17 milhões de aparelhos de te-
hora, excluindo-se as horas extras, fosse levisão em 1985, a relação aparelhos de
muito similar nos três países, a média de TV/ população é bastante inferior à
horas trabalhadas no Japão era bem supe- americana. Em 1985, o Japão apresentava
rior à dos demais: 2.387horas/ ano, contra uma média de, respectivamente, 787/580
2.027 nos Estados Unidos e 1.651 na Ale- aparelhos de rádio e TV para cada grupo
manha. Se considerado o poder aquisitivo de 1.000 habitantes, enquanto os Estados
dos salários, o Japão fica, também, em Unidos apresentavam 2.101/798.
desvantagem. Dado o elevado custo de O sistema de seguridade social, embora
vida do país o trabalhador japonês gasta venha sendo aperfeiçoado, é ainda muito
relativamente mais em bens de consumo, incipiente. A aposentadoria representa um
tais como alimentação e vestuário. Parcela sério problema social. Ocorre muito cedo,
significativa de seu salário é alocada nes- quando o empregado está ainda em plena
ses itens. O japonês gasta 7.4 vezes mais forma, nos seus 50/55 anos, gerando uma
que o trabalhador americano em roupas e queda abrupta de renda. O pai de família
2.1 vezes o que gasta o alemão. aposentado, que não possuir uma pou-
O japonês também gasta muito com a pança acumulada ao longo de seus anos de
educação dos filhos. A pesquisa indicou trabalho ou não conseguir um novo em-
que, enquanto o trabalhador americano é prego, em geral em empresas menores as- 11. Citado por OIT· Organisacion
beneficiado por um ensino publico básico sociadas ao seu antigo empregador, passa Inlernacionale dei Trabajo,
de boa qualidade, o alemão gasta, em mé- por muitas dificuldades. Actualidad Sociolaborial, nº 4/1988.

53
RAE

Algumas instituições de Welfare são outro lado, enquanto que a diferença de


ainda bastante atrofiadas, a exemplo das renda entre um executivo e um operário se
instituições para o bem-estar das mulheres situa entre quatro a seis vezes no Japão, nos
- em 1986havia apenas 55 delas, com uma Estados Unidos essa variação chega, no
capacidade de atendimento de menos de mínimo a dez vezes, enquanto que, no
2.000 pessoas, instituições para o bem-es- Brasil, freqüentemente ultrapassa vinte
tar de mães e dependente - apenas 88, vezes.
além de entidades para o cuidado de cri- Enquanto que, no Japão, a taxa de par-
anças, incluindo creches e maternais - ticipação na renda nacional dos 40% mais
33.297 no total e intituições para o bem-es- pobres é de 22% e a taxa de participação
tar dos idosos, em número de 4.787. dos 20% mais ricos é de 38%, nos Estados
Unidos essas taxas são de, respectivamen-
DISTRIBUiÇÃO DE RENDA - A DISTRIBUiÇÃO te, 17% e 49%, no Canadá e na França de
DOS SACRIFíCIOS NUMA SOCIEDADE MAIS 17% e 42%, no Reino Unido de 19% e 40%.
IGUALITÁRIA Na Hungria, é de, respectivamente, 21 % e
36% e na Iugoslávia de 19% e 39%. No
A estrutura de distribuição de renda do Brasil, esses coeficientes atingem 7% e 67%.
país não apresenta grande concentração, se O perfil de renda atual do país pode ser
comparada com outros países. Embora no melhor compreendido através da obser-
Japão haja um excessivo apego à hierar- vação dos mecanismos de fixação salarial
quia, o que molda profundamente as re- e da organização do mercado de trabalho,
lações pessoais, a sociedade japonesa não já que 94 % da renda pessoal é determinada
pode ser considerada muito estratificada. pelos salários
Para Chrístopher" os japoneses gostam de Atualmente a média salarial do país
se ver como uma sociedade sem classes ou, equivale a 16 vezes a prevalente 30 anos
mais exatamente, como uma sociedade atrás. O crescimento econômico do país no
composta por pessoas praticamente da pós-guerra trouxe melhoras significativas
mesma classe. A maioria das pesquisas para sua população. Esse desempenho foi
realizadas entre jovens indica que 90% possível graças ao excepcional desempe-
deles se consideram da classe média. nho do setor industrial. No entanto, en-
quanto que no período 1958/1987 o PNB
••••••••••••••••••••••• aumentou 23.4 vezes, os salários na in-
É na análise da variável "satisfação dústria aumentaram apenas 14.2 vezes.
A análise mais minuciosa da evolução
do consumidor" que reside o ponto dos salários na manufatura face à evolução
vulnerável do modelo econômico da produtividade no setor é bastante sig-
japonês. A atual qualidade de vida de nificativa: no período 1970/1987, os salá-
sua população não está consistente rios reais aumentaram 62%, enquanto a
com o patamar que o país atingiu na produtividade aumentou 156%. Uma das
explicações para isto, e que parece essencial
esfera econômica imemacional. para a compreensão do modelo japonês, é
••••••••••••••••••••••• que parte da produtividade não está se
revertendo em ganho salarial e sim em
De fato, não parece existir na sociedade massa de investimento. Isto caracteriza a
nenhum sentimento forte de classe e as economia japonesa como um economia de
diferentes categorias de renda, status e mobilização, onde a acumulação visando
função não estão fisicamente segregadas. ao crescimento econômico é, ainda hoje, a
Se é verdade que a sociedade japonesa variável-chave e legítima da sociedade. Em
possui grande apego à hierarquia, também prol desse objetivo, o trabalhador japonês
é verdade que ela é movida por variáveis está disposto a dar sua contribuição. E o
meritocráticas, associadas ao local de es- sacrifício parece estar sendo mais igual-
tudo e trabalho das pessoas. mente distribuído entre a população, em-
12. CHRISTOPHER, R. C. The A diferença de renda média entre a bora certos segmentos da sociedade sejam
Japanese mind, lhe Golialh quinta parte mais pobre da população e a mais sacrificados. Nessa categoria, situam-
explained.Tokyo, Charles E. Tutlle quinta parte mais rica equivale, no Japão, se a mão-de-obra móvel, especialmente a
Co., 1988, 352 p. a 60% da existente nos Estados Unidos. Por feminina, e os aposentados.

54
JAPÃO - MILAGRE ECONÔMICO ...

A estrutura dual do mercado de traba- nefícios indiretos oferecidos, freqüen-


lho, com a existência, por um lado, de um temente, por uma grande empresa. Esses
contingente de mão-de-obra melhor re- benefícios indiretos são muitos importan-
munerado, formado por profissionais, ba- tes, pois o país ainda não desenvolveu um
sicamente do sexo masculino, relativa- sistema público eficiente de serviços e be-
mente jovem e vinculado a empresas nefícios previdenciários. Por ocasião da
maiores e, por outro, um contingente de aposentadoria, que se dá quando o traba-
mão-de-obra móvel, formado sobretudo lhador atinge os seus 50/55 anos, a dife-
por mulheres, mal remunerado e pratica- rença entre os salários pagos por uma pe-
mente sem garantias de emprego, além de quena empresa e por uma grande empre-
aposentados, permite grande flexibilidade sa é muito grande. Empresas que empre-
à empresa para enfrentar períodos de os- gam até 29 empregados pagarão, em
cilação no ciclo econômico. média, perto de 57% dos salários pagos por
uma grande empresa, enquanto que em-
••••••••••••••••••••••• presas com 30 a 99 empregados pagarão o
equivalente a 66% dos salários de uma
Países como a França e mesmo a grande empresa e empresas entre 100 a 499
Inglaterra, de poder econômico pagarão perto de 79%.
declinante, possuem maior prestígio e
influência na esfera da diplomacia CONCLUSÃO
política que o Japão.
As análises precedentes permitem si-
••••••••••••••••••••••• tuar o Japão numa esfera distinta, seja do
modelo capitalista convencional, seja do
o número de mulheres trabalhadoras modelo socialista. Na sociedade japonesa,
tem crescido, passando de 18 milhões em vamos encontrar a presença de uma com-
1960 para 23 milhões em 1986, represen- petição empresarial acirrada que termina,
tando hoje 48% da força de trabalho total. muitas vezes, em cooperação harmoniosa.
Mas a participação da mulher no mercado Esta última é, também, a maneira de as
de trabalho, por grupo de idade, é bastante empresas japonesas apresentarem-se na
variável, o que demonstra a dificuldade de arena internacional. Os grandes grupos
a mulher fazer carreira na empresa. Nos empresariais parecem colocar no mesmo
períodos que vão, respectivamente, dos patamar o interesse nacional e a busca do
seus 20/24 anos e 50/59 anos, a participa- lucro privado. Nesse ambiente, uma rigo-
ção feminina amplia-se significativamente, rosa racionalidade organizacional convive
apresentando uma queda acentuada no com uma hierarquia vigorosa e o mérito,
período intermediário. Isto indica que, por com a antigüidade. A intensidade e a na-
ocasião do casamento ou do nascimento tureza do processo de acumulação até ho-
dos filhos, a mulher afasta-se do mercado je perseguido indicam um Estado em fase
de trabalho, para voltar novamente na contínua de mobilização nacional, com um
meia idade. Esse fato apresenta sérias des- grau de coesão nunca visto por nenhuma
vantagens, visto que a carreira e o salário nação moderna e um perfil de distribuição
de um trabalhador progridem em função de renda muito melhor do que o existente
de seu tempo de permanência na empresa. em países que fizeram a opção ideológica
O diferencial de salário entre a mão-de- pela igualdade. A curiosa simbiose entre o
obra feminina e a masculina acentua-se governo e o setor privado tem sustentado
significativamente com a idade. e legitimado esse processo, e a população,
Também existe uma grande diferença apenas agora, começa a visualizar outros
entre as condições de trabalho numa objetivos ligados ao processo de desen-
grande empresa e numa pequena. Embora volvimento econômico.
o salário inicial seja praticamente o mesmo As grandes vantagens do modelo japo-
nas pequenas e nas grandes empresas, a nês residem na sua excepcional eficiência
defasagem fica cada vez maior, à medida dinâmica, com a existência de um clima
que o trabalhador progride na empresa. altamente favorável ao investimento, além
Além disto, o trabalhador, numa pequena de um ambiente empresarial muito propí-
empresa, não goza, muitas vezes, dos be- cio à geração e difusão do progresso técni-

55
RAE

co. Nesse aspecto, muitas das restrições ta taxas elevadas de poupança, seu padrão
que vêm comprometer a sua eficiência es- de consumo é de grande austeridade. Parte
tática, ou seja, sua capacidade de alocação significativa de sua renda é, ainda hoje,
ótima de recursos num determinado perío- alocada para gastos com alimentação. Suas
do de tempo, acabam funcionando como condiçõesde habitação são bem inferioresàs
estímulos para uma melhor eficiência di- encontradas em outros países desenvolvi-
nâmica. Este é o caso, por exemplo, da es- dos. A moradia padrão é relativamente mais
trutura associa tivista e oligopolizada de cara, em geral de pequeno porte e localiza-
sua economia, que vai facilitar a difusão do da longe do local de trabalho. Muitos dos
progresso técnico e a negociação de inte- serviçose benefíciossociaise previdenciários
resses entre o setor privado e o governo. gerados pelo Estado são ainda incipientes e
Também na baixa mobilidade de sua mão- suas falhas atingem particularmente alguns
de-obra, com sua relativa rigidez, em vir- segmentos mais vulneráveis da população,
tude dos princípios de emprego vitalício e tais como os aposentados, os trabalhadores
de antigüidade, pode-se encontrar parte da de tempo parcial, as mulheres, os trabalha-
explicação da grande identidade de inte- dores estrangeiros.
resses entre trabalhadores e sindicatos com Esses segmentos também têm sido os
as empresas. mais sacrificados pela atual lógica de acu-
mulação. Através de mecanismos de re-
••••••••••••••••••••••• dução e ampliação de seu contingente de
" Dizem que nós, os japoneses, trabalhadores móveis e de suas relações
com a pequena empresa subcontratada, a
copiamos todo mundo e é
grande empresa japonesa preserva sua
verdade. Primeiramente copiamos flexibilidade em momentos de mudança
os coreanos, depois os chineses, no ambiente de negócios. Estimulando a
depois os ingleses e depois os aposentadoria precoce de seu pessoal, ad-
americanos. Sempre o que nos parecia ministra a massa salarial e preserva o sis-
tema de emprego vitalício sem compro-
o melhor no mundo para ser
meter a sua competitividade.
copiado. Agora não sabemos mais Por outro lado, é inquestionável que os
quem copiar. Talvez copiemos sacrifícios gerados por esse processo de
nós mesmos." crescimento econômico estejam sendo mais
igualmente distribuídos pela população,
••••••••••••••••••••••• embora alguns segmentos sofram mais do
A capacidade de trabalho e de sacrifício que outros. Isto pode ser constatado pela
de sua população, que vem mantendo ta- análise do fator "perfil de renda", onde fica
xas elevadas de poupança e um patamar patente que o país atingiu um patamar de
muito reduzido de lazer, tem tido reflexos distribuição de renda dos menos concen-
significativos a nível das taxas de cresci- trados do mundo.
mento da renda nacional. Esse fator cons- Avaliando-se as perspectivas de evolu-
titui um ponto-chave para compreensão do ção da economia japonesa, é importante
chamado "milagre japonês" do pós-guerra. considerar hoje que determinadas variá-
Indica que a acumulação, visando ao veis, eventualmente, poderão vir a funcio-
crescimento econômico, constitui, ainda nar como restrição à atual lógica de acu-
hoje, o motor propulsor e legítimo da so- mulação que rege a sociedade, e que não
ciedade. faziam parte do contexto econômico do
No entanto, é na análise da variável pós-guerra:
"satisfação do consumidor" que reside o
ponto vulnerável do modelo econômico 1. Crescente reconhecimento de que
japonês. A atual qualidade de vida de sua existem outros objetivos ligados ao pro-
população não está consistente com o pa- cesso de crescimento econômico:
tamar que o país atingiu na esfera econô- Até o momento não foram contempla-
mica internacional. Ao mesmo tempo em dos objetivos de crescimento econômico
que a jornada de trabalho é mais longa do associados à melhoria na qualidade de
que a existente em outros países desen- vida da população. Surgem, no entanto,
volvidos e o trabalhador japonês apresen- evidências de que essa situação está em

56
JAPÃO· MILAGRE ECONÕMICO...

fase de questionamento. O próprio japonês mente os Estados Unidos e os países da


começa a reivindicar diminuição no tempo Comunidade Européia. O aprofundamen-
de trabalho, melhoria salarial, maior in- to dessas diferenças pode levar o país a
vestimento em habitação, implantação de uma situação de impasse, à medida que o
um sistema eficiente de previdência social, mundo for levado a rever os princípios do
maior tempo e melhores condições de lazer. livre comércio, que vêm regulando o rela-
cionamento entre as nações desde o pós-
2. Mudança no perfil ocupacional e es- guerra.
cassez de mão-de-obra: Por outro lado, o grau de influência e
No pós-guerra o Japão foi beneficiado prestígio político de que goza o Japão jun-
com grandes excedentes de mão-de-obra, to à comunidade internacional não está,
provenientes, em parte, do deslocamento nem de longe, de acordo com seu recente
de contingentes de trabalhadores do cam- poderio econômico. Países como a França
po para a cidade e, também, do curto mas e mesmo a Inglaterra, de poder econômico
proeminente baby boom no início dos anos declinante, possuem maior prestígio e in-
50. No entanto, a partir dos anos 70, a eco- fluência na esfera da diplomacia política
nomia japonesa começou a enfrentar pro- que o Japão. Provavelmente, nos próximos
blemas de escassez de mão-de-obra. Se anos, essa situação deverá se inverter e,
considerada a estrutura do mercado de nesta hora, o país deverá estar consciente
trabalho, somada à atual tendência de- de seu papel na comunidade das nações.
mográfica do país, o Japão deverá sofrer as Talvez hoje ele mesmo não saiba o que virá
conseqüências geradas por um peso ex- a ser. O fato, no entanto, que merece ser
cessivo da mão-de-obra mais velha e, con- salientado e que constitui sua característi-
seqüentemente, melhor remunerada, na ca única e um fator chave para a compre-
composição de sua força de trabalho, o que ensão da sociedade japonesa é a sua gran-
poderá afetar suas condições de com- de habilidade para adaptar-se a circunstân-
petitividade no mercado internacional. cias e necessidades radicalmente diferentes
Soma-se a isto o papel crescente desempe- das anteriores, sem perder ou sacrificar seu
nhado pela mão-de-obra feminina. Até senso distinto de identidade. Como sali-
quando as mulheres concordarão em fazer entado por um professor da Universidade
parte de um contingente discriminado e de Tóquio: "dizem que nós, os japoneses, co-
marginalizado, embora essencial do mer- piamos todo mundo e é verdade. Primeira-
cado de trabalho? mente copiamos os coreanos, depois os
chineses, depois os ingleses e depois os
3. Surgimento de novas necessidades americanos. Sempre o que nos parecia o
ligadas a problemas de proteção ambiental melhor no mundo para ser copiado. Agora
e de proteção ao consumidor: não sabemos mais quem copiar. Talvez co-
A gestão dessas necessidades emergen- piemos nós mesmos."
tes vai exigir um grande esforço do Go- Países e empresas procuram copiar ou
verno e da DIETA, o parlamento japonês, buscar inspiração no "modelo japonês",
no sentido de se desenvolver uma legisla- que se tornou sinônimo de eficiência eco-
ção adequada, que, ao mesmo tempo que nômica. No entanto, por trás do "milagre
preserve os direitos do consumidor e di- japonês", existe uma capacidade de sacri-
minua a poluição, não seja um sério entra- fício e de cooperação que as sociedades
ve à atividade empresarial. ocidentais, com sua grande afluência e
Por outro lado, é na esfera internacional, senso de individualismo, não possuem e,
com muitas das variáveis fora de seu con- mais importante, não almejam possuir. O
trole, que o Japão deverá jogar a cartada modelo japonês não pode ser replicado.
definitiva nos próximos anos. A sua gran- Está assentado em variáveis culturais e
de dependência de fontes externas supri- históricas muito peculiares. Pode e deve ser
doras de matéria-prima e energia torna-o compreendido pois traz contribuições
particularmente vulnerável a mudanças essenciais para o debate sobre o futuro da
nesse ambiente. Outros problemas mani- sociedade pós-industrial e as propostas
festam-se nessa área, como os conflitos de sobre as condições materiais da existência
interesse comercial entre o Japão e seus humana: liberdade, individualismo,
principais parceiros comerciais, especial- igualdade e progresso. O

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