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Capítulo I (Exórdio)

Ideia sumária da matéria que vai ser tratada; O Padre António Vieira apresenta o conceito
predicável, “Vós sois o sal da Terra” e explica as razões pelas quais a terra está tão corrupta.

• Figura elogiada ao longo do excerto: Santo António, o protótipo de pregador (usou a


palavra para converter os homens)
• Decisão tomada pelo orador/pregador: “Quero hoje, à imitação de Santo António,
voltar-me da terra ao mar, e já que os homens se não aproveitam, pregar aos peixes.”.

Propriedades do sal: conservar o bom e evitar a corrupção.

Propriedades dos pregadores: louvar o bem e impedir o mal.

Ele constata que a terra está corrupta, apesar da existência de muitos pregadores. E aponta
duas causas: “ou o sal não salga” (culpa dos pregadores) “ou a Terra não se deixa salgar”
(culpa dos ouvintes). Estabelece-se assim um paralelismo entre o sal e os pregadores, pois têm
as mesmas propriedades

Se o sal não salga é porque: “os Pregadores não pregam a verdadeira doutrina”; há incoerência
entre palavras e atos (“dizem uma coisa e fazem outra”) e “pregam-se a si, e não a Cristo”.

Se a Terra não se deixa salgar é porque: “os ouvintes não querem receber a verdadeira
doutrina”; preferem imitar comportamentos em vez de seguirem conselhos (“querem antes
imitar o que eles fazem a fazer o que dizem”) “em vez de servir Cristo servem a seus apetites”.

Seguidamente, tenta então apontar soluções para estes problemas, através de argumentos de
autoridade:

 Para o problema de o sal não salgar, quem dá a solução é Cristo, que diz para tratar
com desprezo os maus pregadores e com estima, admiração e respeito os bons
pregadores (“lançado fora como inútil e pisado por todos”).
 Para o problema da terra não se deixar salgar, quem deu a solução foi Santo António,
que mudou de auditório/púlpito, mas não de doutrina e foi pregar aos peixes, que são
tudo o contrário dos homens, são organizados e interessados.

O orador cita Cristo para conferir autoridade ao seu sermão, uma vez que as suas palavras
sempre serão sinónimo de verdade absoluta. Mas a palavra de Deus não está a fazer fruto, o
mal não está só do lado dos homens que não ouvem, tal como dos pregadores, que não
pregam a verdadeira doutrina.

Por fim, Padre António Vieira elogia Santo António, e diz que ele foi sal da Terra – pregou aos
homens – e sal do mar – pregou aos peixes. Apresenta-o como um modelo e um exemplo a
seguir e descreve-o como um homem puro, “a que se não pegou nada da Terra”, um pregador
virtuoso (“o zelo da glória divina que ardia naquele peito”), também mostra a sua semelhança
com Santo António, pois ambos pregaram aos homens sem efeito e seguidamente, Padre
António Vieira imita-o pregando aos peixes e pedindo inspiração a Virgem Maria, invocando-a
para expor o assunto do sermão, terminando assim o exórdio.
Recursos expressivos:

Paralelismo: (locução coordenativa disjuntiva “ou… ou… ou…”) este é utilizado para apresentar
as diferentes hipóteses que o pregador impõe para dar conta da corrupção do Brasil, marca um
ritmo discursivo que prende a atenção do auditório.

Interrogação retórica: (“Que faria logo? Retirar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia?”). Vieira


recorre a esta figura de estilo para, por um lado, tornar o discurso mais vivo e, por outro,
suscitar a curiosidade do auditório em relação ao assunto que vai expor.

Capítulo II (Exposição)
Exposição – referência às obrigações do sal; indicação das virtudes dos peixes; crítica aos
homens.

• Início da alegoria: “Suposto isto, pare que procedamos com clareza (…)”

A partir deste capítulo todo o sermão é uma alegoria porque os peixes são metáfora dos
Homens. As suas virtudes são, por contraste, metáforas dos defeitos dos Homens e os seus
vícios são diretamente metáfora dos defeitos dos homens. O pregador fala aos peixes, mas o
alvo é o Homem.

Peixes Homens

“quietos e devotos” “furiosos e obstinados”

“atentos e suspensos”

LOUVOR AFRONTA

Peixes: o uso sem a razão

Homens: a razão sem o uso

O Sermão aos peixes (e, obviamente, aos homens) será, pois, dividido em dois pontos:

1. Louvar as qualidades;
2. Repreender os vícios.

As qualidades e as virtudes dos peixes:

• Auditório ideal pois ouvem e não falam (os homens falam muito e ouvem pouco);

• Foram os primeiros seres que Deus criou (“vós fostes os primeiros que Deus criou”);

• São melhores que os homens (“e nas provisões (...) os primeiros nomeados foram os peixes”)

• Existem em maior número (“entre todos os animais do mundo, os peixes são os mais e os
maiores”);

• Revelam obediência (“aquela obediência, com que chamados acudistes todos pela honra de
vosso Criador e Senhor”);
• Revelam respeito e devoção ao ouvirem a palavra de Deus, (“aquela ordem, quietação e
atenção com que ouvistes a palavra de Deus da boca do Seu servo António. (...) Os homens
perseguindo a António (...) e no mesmo tempo os peixes (...) acudindo a sua voz, atentos e
suspensos às suas palavras, escutando com silêncio (...) o que não entendiam.”);

• Não se deixam domesticar (“só eles entre todos os animais se não domam nem
domesticam”)

Estas qualidades são, portanto, os defeitos dos homens.

No contraste estabelecido entre os peixes e os outros animais, a estrutura paralelística salienta


a ideia de que os animais referidos, embora aparentem ter uma vida feliz com os homens,
estão, na realidade, sobre o seu domínio e privados da sua liberdade.

Capítulo III (Louvores em particular)


1. PEIXE DE TOBIAS: simboliza a bondade, o poder purificador da palavra de Deus – o seu fel
era bom para sarar a cegueira e o coração para lançar fora os demónios. Comparação a Santo
António: “Santo António abria a boca contra os que se não queriam lavar” - Os homens, ao
contrário de Tobias, não quiseram aproveitar o fel de Santo António para curar a cegueira (falta
de fé), nem o seu coração para se livrarem dos demónios (limpeza das almas).

2. RÉMORA: simboliza a força e o poder que a palavra do pregador tem para ser guia das almas
– pequeno no corpo, mas grande na força, pelo poder orientador e controlador. Prende e
amarra as naus, impedindo-as de avançar. Comparação a Santo António: “Se alguma rémora
houve na terra, foi a língua de Santo António (…)” - Os homens não souberam dar valor ao
poder e à força da palavra (língua) de Santo António que domou a fúria das paixões humanas
(Vingança, Cobiça, Sensualidade), impedindo as pessoas de caírem nas mais variadas desgraças
(naufrágios).

3. TORPEDO: simboliza o poder que a palavra de Deus tem de fazer tremer os pescadores que
pescam na terra tudo quanto apanham – a sua energia tem a capacidade de fazer tremer a
mão do pescador, impedindo-o de pescar. Comparação a Santo António: “ Se eu pregara aos
homens e tivera a língua de Santo António, eu os fizera temer” - Os homens, “pescadores em
terra”, não temem a Deus porque são ambiciosos e não se deixam converter.

4. QUATRO-OLHOS: simboliza a prudência que os cristãos devem ter, afastando os olhos da


vaidade terrena – dois olhos olham para cima (vigiam os predadores do ar) e os outros dois
para baixo (vigiam os predadores do mar), defendendo-se assim de diversos tipos de mal. Os
homens esquecem-se que há Céu (em cima) e Inferno (em baixo).

Capítulo IV (Repreensões em geral)


• Os peixes comem-se uns aos outros;

• Os peixes grandes comem os pequenos;

• São ignorantes e cegos, deixando-se enganar facilmente por qualquer isco.


Nos dez primeiros parágrafos, que constituem o ponto alto deste sermão, aponta-se o
terrível defeito que os peixes/homens têm de se comerem (explorarem) uns aos outros devido
à sua cobiça desmedida, o que prova a sua crueldade, a sua maldade, a sua injustiça.
Também se deixam enganar facilmente, movidos pela vaidade.

Neste capítulo, Padre António Vieira, fala dos vícios gerais dos peixes. Fala, mais precisamente
de dois vícios:

-O primeiro é o facto dos peixes se comerem uns aos outros

• Os grandes comem os pequenos (“Se os pequenos comeram os grandes, bastara um grande


para muitos pequenos; mas como os grandes comem os pequenos, não bastam cem pequenos,
nem mil, para um só grande”)

• Comem-se os mortos (comem-no, entre outros, os herdeiros, os testamenteiros, os


credores, a mulher, o coveiro, o padre)

• Comem-se os vivos (a um réu comem-no o carcereiro, o inquiridor, a testemunha, o juiz)

• Comem-se como um pedaço de pão, ou seja, comem-se todos os dias

No último parágrafo, o orador tenta persuadir o auditório a mudar a seu vício de se comerem
uns aos outros, mostrando que é uma loucura os homens deixarem-se ir atrás de dois pedaços
de pano, por vaidade, gastando nisso toda a sua vida. Aponta o exemplo de Santo António, o
jovem nobre que deixou “as galas do mundo”, trocando-as pela “sarja e pelo burel e a correia
pela corda”

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