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Por que o filme A Pequena Sereia 2023 incomoda?

Beatriz Rosado de Almeida

Resumo: Esse artigo irá abordar a o porquê do filme A Pequena Sereia 2023 ser tão
emblemático ao ganhar uma versão em live action, pois veio sucedido de comentários
racistas, e discursos de ódio à atriz Halle Bailey, que protagoniza a princesa Ariel.
O filme da Disney de 1989 que foi ganhando ao longo dos anos uma
continuação também em desenho: A Pequena Sereia II: O Retorno para o Mar (2000)
e A Pequena Sereia: A História de Ariel (2008), nos faz questionar até hoje
problemáticas presentes nas produções da Disney.
Fundamentam este trabalho MARTIN LUTHER KING (1963); FLORESTAN
FERNANDES (1989).

Palavras-chave: racismo; mitologia; princesa.

"A Pequena Sereia" é um filme de animação da Disney de 1989 sobre uma


sereia chamada Ariel que se apaixona por um príncipe humano e faz um pacto com
uma bruxa do mar para se tornar humana. Ela enfrenta desafios para conquistar o
amor verdadeiro antes que o pacto se torne permanente. O filme é conhecido por sua
trilha sonora cativante e personagens memoráveis.

O conceito em geral do filme não mudou muito, mas no live action fica mais
enfatizado que a sereia tem mais admiração pelo mundo dos humanos e não só pelo
príncipe. Diferente do desenho, que a Ariel, ao conhecer o príncipe, sente a
necessidade de focar somente em conquistá-lo, já no live action a protagonista busca
conhecer sobre o mundo, pois tomou uma porção que não a permite lembrar que ela
precisa beijar o príncipe para se tornar humana permanentemente.

Sereias são seres mitológicos, mas de onde veio essa lenda? Em épocas
passadas, as pessoas costumavam criar lendas para dar sentido a fenômenos
inexplicáveis, e as sereias não foram exceção. Os relatos supostos de avistamentos
de sereias, que ganharam popularidade nos séculos XV e XVI, durante a era das
grandes navegações, podem ser explicados pelos animais marinhos encontrados
nessas expedições, pois viam parte desses animais no mar e o restante ficava a cargo
de uma imaginação fértil.
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“A democracia só será uma realidade quando houver, de fato,


igualdade racial no Brasil e o negro não sofrer nenhuma espécie de
discriminação, de preconceito, de estigmatização e de segregação,
seja em termos de classe, seja em termos de raça.” (FLORESTAN
FERNANDES, 1989, p.290).

A citação do sociólogo Florestan Fernandes deixa claro que de fato o


preconceito racial é um imbróglio presente na nação brasileira, por isso é importante
discutir o que está interligado às críticas feitas ao filme em live action.
Em maio de 2016, os planos para um remake de A Pequena Sereia foram
oficialmente confirmados, mas agora em live action, entretanto surgiu algumas
problemáticas, pois a atriz que interpreta a Ariel é negra, diferente dos desenhos, nos
quais a sereia era branca.
Uma característica interessante do filme é que o Rei Tritão, pai de Ariel, tem
mais seis filhas além dela: Mala, Indira, Caspia, Tameka, Perla e Karina. Segundo a
mitologia, ele teve uma filha com 7 mulheres de diferentes etnias, representando os 7
mares. Isso gera ainda mais representatividade no filme, pois se distancia de uma
cultura eurocêntrica, onde só personagens brancos e loiros ocupam papéis de
destaque.
Há controvérsias no que diz respeito a representatividade da sereia como
personagem negra, pois a Disney substituiu a Ariel, que antes era branca, por Halle
Bailey, uma mulher negra. Isso nos faz questionar, porque a empresa decide abordar
essa questão muitos anos depois do lançamento original, quando, se a intenção é
trazer visibilidade, o destaque da personagem negra poderia ter vindo desde o
princípio, em 1989.
A Disney já apresentou dificuldades em trazer representatividade a mulheres
negras em outros filmes, como em A Princesa e o Sapo (2009) (primeiro filme com
uma princesa preta), deixando explicito no desenho a falta de cenas com a Tiana (a
protagonista negra), já que ela passa a maior parte do enredo em forma de sapo, e
não como humana.
Escalaram a Halle Bailey para fazer o papel de Ariel, pois o diretor do filme
Rob Marshall estava na apresentação do Grammy que ela cantou. Ele nem conhecia
ela, mas virou para o produtor do filme falou “Quem é ela? Essa garota parece um
anjo!”. Ela foi a primeira audição que ele viu para o papel de Ariel e contou que depois
centenas de meninas fizeram esse mesmo teste e nenhuma conseguiu superá-la. Ela
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deixou um homem prantos, que disse “A Halle tem uma sensibilidade sobrenatural e
isso foi muito importante pra personagem, que é uma sereia e uma adolescente, que
precisa ter essa combinação de força paixão e coragem”.
A atriz Halle Bailey sofreu e está sofrendo muito racismo somente por fazer o
papel da Pequena Sereia, vários hatters mandam mensagens em suas redes sociais
e disseminam ódio na internet por não aceitarem que ela tenha feito o papel de
protagonista do filme.
"Eu tenho um sonho que meus quatro pequenos filhos um dia viverão em uma
nação onde não serão julgados pela cor da pele, mas pelo conteúdo do seu caráter.
Eu tenho um sonho hoje."- Martin Luther King Jr., em seu famoso discurso em
Washington DC. Essa frase se encaixa perfeitamente no tema abordado, pois é uma
problemática presente nos dias atuais, até mesmo por conta de um filme infantil.
É importante ressaltar que a Ariel é uma sereia, um ser mitológico, portanto
pode variar de acordo com cada crença e cultura, mudar a etnia de uma princesa
como a Branca de Neve, por exemplo, não faria muito sentido, mas por se tratar de
uma criatura mitológica, não há motivo para os espectadores propagarem ódio,
comentários racistas e negativos tanto para a direção do filme, quanto para a atriz
protagonista.

Considerações finais
Apesar de todas as polêmicas é muito importante trazer essa visibilidade para
mulheres negras no papel de princesas da Disney, uma empresa que prega que
“Todos os seus sonhos podem se tornar realidade se você tiver a coragem de
persegui-los", já que milhões de meninas se inspiram nessas princesas não só para
seguir seus sonhos, mas também no modo de agir. A representatividade é valorosa,
pois crianças pretas podem enxergar aquilo como um espelho e ver que também são
capazes de alcançar os seus objetivos.

Referências

LUTHER KING, Martin. Em um discurso histórico. Washington, 1963.


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FERNANDES, Florestan. Significado do protesto negro. São Paulo: Cortez Editora.


Acesso em: 14 jun. 2023. 1989.
DARKSIDE, Curiosidades de seres mitológicos a personagens pop. Acesso em: 14
jun. 2023.

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