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2, 2015 2

[-] Sumário # 11 vol. 2


EDITORIAL 4

PAULO ARANTES 9
Entrevista com Marcos Barreira e Maurílio Lima Botelho

ARTIGOS

SOBRE O LI MITE ABSOLUTO DO CAPITAL 48


Especulações acerca de uma hipótese teórica
Daniel Feldmann

A POTÊNCIA DO ABSTRATO 70
Resenha com questões para o livro de Moishe Postone
Cláudio R. Duarte

A DEMOCRACIA E O SONO DA HISTÓRIA 123


Fragmentos
Raphael F. Alvarenga

DIREITO E INTERCÂMBIO SOCIAL 142


Hipóteses sobre a forma e a função do direito
à luz do desenho histórico-estrutural de Kojin Karatani
Joelton Nascimento

ISAAK RUBIN E GYÖRGY LUKÁCS 169


As origens da “leitura crítica” de Marx na década de 1920
Marcos Barreira
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O RENASCIMENTO MILAGROSO DE ANTONIO GRAMSCI 214


Robert Bösch

FAVELIZAÇÃO MUNDIAL 248


O colapso urbano da sociedade capitalista
Maurilio Lima Botelho

CIBERATIVISMO, O PARADIGMA DO ANTIPODER E 271


AS FISSURAS DO CAPITALISMO
A revolução em tempos de internet
Sílvia Ramos Bezerra

PÓS-NATUREZA 286
Pilhagem ecológica e os monstros do capital
André Villar Gomez

O CAPITALISMO E A MALDIÇÃO DA 297


EFICIÊNCIA ENERGÉTICA
John Bellamy Foster, Brett Clark e Richard York

A TRANSIÇÃO SOLAR COMO POSSÍVEL-IMPOSSÍVEL 312


Daniel Cunha

O DINHEIRO COMO CORAÇÃO DAS TREVAS 328


Nota sobre o último livro de Robert Kurz
Daniel Cunha

O QUE FALTA? 332


Francisco C.
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O CAPITALISMO E A MALDIÇÃO DA
EFICIÊNCIA ENERGÉTICA
O retorno do paradoxo de Jevons

John Bellamy Foster, Brett Clark e Richard York

A maldição da eficiência energética, mais conhecida como Paradoxo de Jevons –


a ideia de que a maior eficiência energética (e de recursos materiais) resulta não em
conservação, mas em seu uso aumentado – foi primeiramente colocada em questão por
William Stanley Jevons, no século XIX. Apesar de esquecido durante a maior parte do
século XX, o Paradoxo de Jevons foi redescoberto nas últimas décadas, e está no centro
das disputais ambientais do presente.

O século XIX foi o século do carvão. Foi o carvão, acima de tudo, que moveu a
indústria britânica, e, portanto, o império britânico. Mas em 1863 o industrial Sir
William George Armstrong, em seu discurso anual para a Associação Britânica para o
Avanço da Ciência, questionou se a supremacia mundial britânica na produção
industrial poderia ser ameaçada no longo prazo pela exaustão das reservas disponíveis
de carvão.1 Naquele tempo, nenhum estudo econômico havia sido levado a cabo sobre o
consumo de carvão e o seu impacto no crescimento industrial.

Em resposta, William Stanley Jevons, que se tornaria um dos fundadores da


economia neoclássica, escreveu, em apenas três meses, um livro intitulado A questão do
carvão: uma investigação sobre o progresso da nação, e a provável exaustão de
nossas minas de carvão (1865). Jevons argumentou que o crescimento industrial
britânico se baseava no carvão barato, e que o seu custo ascendente, à medida que

1 Sir William George Armstrong, Presidential Address, Report of the 33rd Meeting of the British
Association for the Advancement of Science, Held at Newcastle-upon-Tyne (London: John Murray ,
1 864), li-lx iv. Ver também William Stanley Jevons, The Coal Question: An Inquiry Concerning the
Progress of the Nation, and the Probable Exhaustion of Our Coal -Mines, ed. A. W. Flux (London:
Macmillan, 1906 [1 865]), 32-36.
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minas mais profundas eram exploradas, acarretaria a perda da “supremacia comercial e


manufatureira”, possivelmente “no período de uma geração”, e um limite do
crescimento econômico, gerando um “estado estacionário” da indústria “em um
século”. 2 Nenhuma tecnologia ou substituição do carvão por outras fontes energéticas,
segundo ele, poderia alterar isso.

O livro de Jevons teve enorme impacto. John Herschel, uma das grandes figuras
da ciência britânica, escreveu em apoio à tese de Jevons que “estamos usando nossos
recursos e expandindo nossa vida nacional a uma taxa enorme e crescente, e assim é
iminente um acerto de contas, mais cedo ou mais tarde”.3 Em abril de 1866, John Stuart
Mill saudou A questão do carvão na Casa dos Comuns, discursando em favor da
proposta de Jevons de compensar a exaustão desse recurso natural crítico através do
corte da dívida nacional. Essa causa foi assumida por William Gladstone, chanceler de
Exchequer, que instou o Parlamento a agir para reduzir a dívida, baseado nas
expectativas incertas para o desenvolvimento nacional futuro, devido à prevista
exaustão rápida das reservas de carvão. Como resultado, o livro de Jevons rapidamente
se tornou um bestseller.4

Mas Jevons estava totalmente equivocado em seus cálculos. É verdade que a


produção britânica de carvão, em resposta à demanda crescente, mais do que dobrou
nos trinta anos seguintes à publicação do livro. Durante o mesmo período nos Estados
Unidos, a produção de carvão, a partir de um nível muito menor, cresceu dez vezes,
apesar de ainda permanecer abaixo do nível britânico. 5 Mas não ocorreu nenhum
“pânico do carvão” duradouro, devido à exaustão dos suprimentos de carvão
disponíveis, no final do século XIX e início do século XX. O maior erro de Jevons foi
igualar a energia para a indústria com o carvão em si, sem prever o posterior
desenvolvimento de energias substitutas do carvão, como o petróleo e a

2 Jevons, The Coal Question, xxxi, 27 4.


3 John Herschel, citado em Juan Martínez-Alier, Ecological Economics (Ox ford: Basil Blackwell, 1987 ),
161 -62.
4 Michael V . White, “Frightening the ‘Landed Fogies’ Parliamentary Politics and the Coal Question,”

Utilitas 3/2 (November 1 991 ): 289-302; Leonard H. Courtney, “Jevons’s Coal Question: Thirty Years
After,” Journal of the Royal Statistical Society 60/4 (December 1897 ): 7 89; John Maynard Key nes,
Essays and Sketches in Biography (New York: Meridan Books, 1956), 132. O enfoque de Gladstone em
relação à obra de Jevons foi inicialmente um estratagema tático, usado politicamente para justificar o
argumento a fav or da redução da dív ida, que nunca foi de fato implementada no orçamento
5 Courtney, “Jevons’s Coal Question,” 7 97 .
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hidroeletricidade. 6 Em 1936, setenta anos depois do furor parlamentar gerado pelo livro
de Jevons, John Maynard Keynes comentou sobre a projeção de um declínio da
disponibilidade de carvão feita por Jevons, observando que ela foi “distorcida e
exagerada”. Pode-se acrescentar que o seu escopo foi bastante estreito. 7

O Paradoxo de Jevons

Mas há um aspecto do argumento de Jevons – o próprio Paradoxo de Jevons –


que continua a ser considerado um dos insights pioneiros na economia ecológica. 8 No
capítulo 7 d’A questão do carvão, entitulado “Sobre a economia de combustível”, Jevons
respondeu à noção comum de que, uma vez que “o suprimento decrescente de carvão
será enfrentado com novos modos de usá-lo de maneira eficiente econômica”, não
haveria problema de suprimento, e que, de fato, “a quantidade de trabalho útil extraído
do carvão pode ser aumentada muitas vezes, enquanto a quantidade de carvão
consumido permanece estacionária ou diminui”. Em aguda oposição a isso, Jevons
contrapôs que a maior eficiência no uso do carvão como fonte energética apenas gerava
um aumento de demanda para esse recurso, e não diminuição de demanda, como se
poderia esperar. Isso porque a melhora na eficiência levava a uma expansão econômica
adicional. “É uma grande confusão”, escreveu ele, “supor que o uso econômico de
combustível equivale a uma diminuição de consumo. Na verdade ocorre exatamente o
contrário. Como regra, novos modos de economia levarão a um aumento de consumo,
de acordo com um princípio reconhecido em muitos casos semelhantes... Os mesmos
princípios se aplicam, com ainda mais força e distinção, para o uso de um agente geral
como o carvão. É a própria economia no seu uso que leva ao seu consumo extensivo”.9

6 Jevons não estava sozinho nesse erro. John Ty ndall, um dos maiores físicos da época, observou em 1 865:
“Não vejo nenhuma perspectiva para um substituto do carvão como fonte de potência motriz.” Citado
em Jevons, The Coal Question, x i. V ale mencionar que a perfuração do histórico poço de petróleo de
Edwin Drake no noroeste da Pensilvânia ocorrera apenas seis anos antes, em 1 859, e o seu significado
ainda não havia sido bem compreendido.
7 Key nes, Essays and Sketches in Biography, 128.
8 Mario Giampietro and Kozo Mayumi, “Another V iew of Dev elopment, Ecological Degradation, and

North–South Trade,” Review of Social Economy 56/1 (1 998): 24-26; John M. Polimeni, Kozo Mayumi,
Mario Giampietro, and Blake Alcott, eds., The Jevons Paradox and the Myth o f Resource Efficiency
Improvements (London: Earthscan, 2008).
9 Jevons, The Coal Question, 1 37 -41.
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“Tampouco é difícil ver”, escreveu Jevons, “como surge esse paradoxo”. Toda
inovação tecnológica na produção de máquinas a vapor, destacou ele em uma detalhada
descrição da evolução da máquina a vapor, resultara numa máquina
termodinamicamente mais eficiente. E cada máquina nova, aperfeiçoada, resultara em
uso aumentado de carvão. A máquina de Savery, uma das primeiras máquinas a vapor,
destacou ele, era tão ineficiente que “praticamente, o custo do funcionamento impedia a
sua utilização; ela não consumia carvão, porque a sua taxa de consumo era muito
alta”. 1 0 Modelos posteriores que eram mais eficientes, como a famosa máqu ina de Watt,
levaram a cada vez maiores demandas por carvão, a cada aperfeiçoamento. “Cada um
desses aperfeiçoamentos da máquina a vapor, quando levado a cabo, não faz mais do
que acelerar novamente o consumo de carvão. Todo ramo da manufatura recebe um
novo impulso – o trabalho manual é substituído ainda mais por trabalho mecânico, e
obras muito prolongadas, que não eram comercialmente viáveis com o uso da energia
mais cara, podem ser executadas.1 1

Ainda que Jevons tenha pensado que esse paradoxo se aplicav a a numerosos
casos, o seu foco n’A questão do carvão foi inteiramente no carvão como “agente geral”
da industrialização e como estímulo para indústrias de bens de investimento. O poder
do carvão para estimular o avanço econômico, o seu uso acelerado, apesar dos avanços
na eficiência, e a severidade dos efeitos a ser esperados do declínio de sua
disponibilidade, eram todas devido ao seu papel duplo como o combustível necessário
para a moderna máquina a vapor e como a base para a tecnologia do alto-forno.

Em meados do século XIX, o carvão era material-chave para altos-fornos e na


fundição do ferro – o produto industrial crucial e base do domínio industrial. 1 2 Foi em
virtude de seu maior desenvolvimento nessa área, como “manufatura do mundo”, que a

10 Ibid., 141 -43.


11 Ibid., 152-53.
1 2 Ainda em 1 842 as fornalhas inglesas ainda consumiam dois terços do carvão do país, mas quando

Jevons escreveu o seu livro, mais de duas décadas mais tarde, isso havia diminuído para cerca de um
quinto do consumo nacional e dificilmente se aplicaria a esse argumento, que se focava na demanda
industrial de carv ão como a maior e indispensável origem da demanda. Como disse Jevo ns, “Não me
refiro aqui ao consumo doméstico de carvão . Esse pode sem dúv ida ser diminuído sem problemas
maiores além de diminuir nosso conforto domésticos e alterar de alguma forma nossos hábitos
nacionais arraigados”. V er Jevons, The Coal Question, 138-39; Eric J. Hobsbawm, Industry and Empire
(London: Penguin, 1969), 69.
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Grã-Bretanha foi responsável pela metade da produção mundial de ferro em 1870.1 3 A


maior eficiência no uso do carvão, portanto, traduziu-se em maior capacidade de
produzir ferro e expandir a indústria em geral, levando a uma crescente demanda por
carvão. Como coloca Jevons:

Se a quantidade de carvão usado em um alto -forno, por exemplo, diminui em


comparação com a produção, os lucros do comércio aumentarão, novos capitais
serão atraídos, e o preço do ferro -gusa cairá, mas a demanda por ele aumentará;
e, ao final, o maior número de fornos mais do que compensará a sua diminuição
de consumo. E se nem sempre é esse o resultado em um ramo específico da
manufatura, devemos lembrar que o progresso em qualquer de seus ramos
estimula uma nova ativ idade em muitos outros, e lev a ind iretamente, se não
diretamente, a mais incursões em nossos v eios de carv ão 1 4

O que tornou esse argumento tão poderoso à época é que pareceu


imediatamente óbvio para todos os contemporâneos de Jevons que o desenvolvimento
industrial dependia da capacidade de expandir a produção de ferro a baixo custo. Isso
implicava que uma redução na quantidade de carvão necessário para um alto-forno
seria imediatamente traduzida em uma expansão da produção industrial, da capacidade
industrial, e sua habilidade de capturar uma maior porção do mercado mundial – e vem
daí a maior demanda por carvão. A tonelagem de consumo de carvão pelas indústrias do
ferro e do aço da Grã-Bretanha, em 1869, de 32 milhões de toneladas, excedeu a
quantidade combinada usada nas manufaturas em geral (28 milhões de toneladas) e
estradas de ferro (2 milhões de toneladas). 1 5

Essa foi a era do capital e a era da indústria na qual o poder industrial era
medido em termos da produção de carvão e ferro-gusa. A produção de carvão e ferro na
Grã-Bretanha cresceu em estreita correlação nesse período, ambas triplicando entre
1830 e 1860.1 6 Como coloca o próprio Jevons: “Depois do carvão... o ferro é a base
material do nosso poder. Ele é osso e o tendão de nosso sistema de trabalho. Analistas
políticos trataram corretamente a invenção do alto-forno de carvão como aquela que

13 Eric J. Hobsbawm, The Age of Capital, 1 848-1 873 (New York: V intage, 1 996), 39-40.
14 Jevons, The Coal Question, 1 40-42.
1 5 Os dados de 1869 foram fornecidos na edição anotada da obra de Jevons de A. W. Flux. Em 1903 as

relações mudaram, com as indústrias do ferro e do aço respondendo por 28 milhões de toneladas de
consumo de carv ão (menos do que no tempo de Jevons), enquanto o consumo das manufaturas em geral
cresceu para 53 milhões de toneladas e das ferrov ias para 13 milhões de toneladas. Ver Jevons, The Coal
Question, 138-39.
1 6 Hobsbawm, Industry and Empire, 7 0-7 1.
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mais contribuiu para a nossa riqueza material... A produção de ferro, o material de toda
a nossa maquinaria, é a melhor medida de nossa riqueza e poder”. 1 7

Assim, nenhum dos leitores de Jevons deixaria de perceber os efeitos


multiplicadores na indústria de uma melhora na eficiência no uso do carvão, ou as
“incursões aumentadas” às “minas de carvão” que isso geraria. “A economia”, ele
concluiu, “multiplica o valor e a eficiência de nosso material principal; ela aumenta
indefinidamente a nossa riqueza e de nossos meios de subsistência, e leva ao aumento
de nossa população, obras e comércio, o que é gratificante para o presente, mas deve
levar a um fim antecipado”. 1 8

Uma lei natural

Ao tratar o carvão como “o material chefe” da indústria britânica, Jevons


enfatizou o que ele via como uma mudança no desenvolvimento industrial, a partir do
que ele chamava de “produtos básicos do país”, para outro. A grande batalha sobre as
Corn Laws já haviam apontado para o fato – já apontado por seu pai, Thomas Jevons,
entre outros – de que um menor preço para um produto básico expandiria fortemente a
sua demanda, e em último caso, escassez (que, no caso do trigo, deveria ser satisfeita
com importações). 1 9 Mas ao final do século XIX, era o carvão, e não o trigo, que estava
no centro de um tipo de escassez malthusiana. 2 0

“A tese de Jevons nesse livro”, observou Keynes, “era que a manutenção da


prosperidade e liderança industrial da Grã-Bretanha requeria um crescimento contínuo
de sua indústria pesada numa escala que implicaria uma demanda de carvão em
progressão geométrica. Jevons propôs esse princípio como uma extensão da lei da
população de Malthus, e a designou como Lei Natural do Crescimento Social... A partir

17 Jevons, The Coal Question, 245.


1 8 Ibid., 156.
19 Ibid., 1 95, 234-41 ; Thomas Jevons, The Prosperity of the Landholders Not Dependent on the Corn
Laws (London: Longmans, 1840).
20 O próprio Malthus negou a possibilidade da escassez de minerais, argumentando que as matérias -

primas, em contraste com os alimentos, “ocorrem em grande abundância” e “a demanda... não deixará
de criá-las em quantidades tão grandes quanto forem desejadas”. Ver Thomas Robert Malthus, An
Essay on the Principle of Population and a Summary V iew of the Principle of Population (London:
Penguin, 1 97 0), 100.
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daí, basta um pequeno passo para colocar o carvão na posição ocupada pelo milho na
teoria de Malthus”.2 1

Estendendo a teoria de Malthus ao carvão, Jevons escreveu: “A nossa


subsistência não depende mais da nossa produção de trigo. A decisiva revogação das
Corn Laws nos impele do trigo para o carvão. Ela marca, de qualquer maneira, a época
na qual o carvão foi finalmente reconhecido como o produto básico do país; ela marca a
ascensão do interesse manufatureiro, que é apenas outro nome para o desenvolvimento
do uso do carvão”. Jevons argumentou que embora a população tenha “quadruplicado
desde o começo do século XIX”, o consumo de carvão cresceu “dezesseis vezes”, e que
esse crescimento da produção de carvão “per capita” era uma necessidade do
desenvolvimento industrial acelerado, que teria de acabar.2 2

Mas a maior contradição por detrás do paradoxo que Jevons levantou – a


dinâmica global de acumulação ou reprodução expandida intrínseca ao capitalismo –
não foi analisada n’A questão do carvão. Como um dos primeiros economistas
neoclássicos, Jevons abandonou a ênfase central na classe e na acumulação que
distinguiu o trabalho dos economistas clássicos. As suas análises econômicas tomaram a
forma de uma teoria do equilíbrio estático. Não há nada no seu argumento que lembre a
noção de Karl Marx do capital como valor que se autovaloriza, e a consequente
necessidade de contínua expansão.

O quadro de referência econômico de Jevons estava, portanto, mal-equipado


para tratar concretamente questões como acumulação e crescimento econômico. A
explosão da população, da indústria e da demanda por carvão (como o “material
central” da vida industrial) era, em sua visão, simplesmente o produto de uma abstrata
Lei Natural do Crescimento Social, elaborada a partir de Malthus. Ao enfocar o
capitalismo mais como um fenômeno natural do que como uma realidade socialmente
construída, ele não podia encontrar uma explicação para a demanda econômica
continuamente crescente, que não fosse mencionar o comportamento individual, a

21 Key nes, Essays and Sketches in Biography, 128-29.


22 Jevons, The Coal Question, 1 95-96. A discussão de Jevons sobre o desenvolv imento industrial em
termos dos v ários produtos básicos antecipou a obra de Harold Innis e a teoria dos produtos básicos do
crescimento econômico. Ver Mel Watkins, Staples and Beyond (Montreal: McGill-Queens University
Press, 2006).
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demografia malthusiana e o mecanismo do preço. Ao invés de enfatizar o próprio


motivo do lucro, ele se baseou na lei abstrata da energia de Justus von Liebig: “A
civilização, diz o Barão Liebig, é a economia de energia, e a nossa energia é o carvão”.2 3
As forças que comandam a expansão econômica, alimentando a industrialização e
resultando na demanda crescente por carvão, eram assim estranhamente fracas e mal-
desenvolvidas n’A questão do carvão, refletindo o fato de que faltava a Jevons uma
concepção realista da economia capitalista e da sociedade.

Hegemonia industrial, não sustentabilidade ecológica

A hegemonia britânica, e não a ecologia, é o pano de fundo das considerações de


Jevons. Apesar da ênfase que ele coloca na escassez de recursos e da sua importância
para a economia ecológica, seria um erro considerar o caráter d’A questão do carvão
como predominantemente ecológica. Jevons não se concentrou nos problemas
ambientais associados à exaustão das reservas energéticas da Grã-Bretanha ou do resto
do mundo. Ele nem mesmo mencionou a poluição do ar, do solo e hídrica que
acompanhava a produção de carvão. Charles Dickens, décadas antes, descreveu as
cidades industriais, com a sua queima concentrada de carvão, como caracterizadas por
uma “praga de fumaça, que obscurece a luz, e suja o ar melancólico” em uma progressão
incessante de “vômito negro, manchando todas as coisas vivas ou inanimadas, apagando
a face do dia, e embrulhando todos esses horrores com uma densa nuvem negra”.2 4
Disso, não há nem sequer um traço em Jevons. Da mesma maneira, as doenças e riscos
ocupacionais enfrentados pelos trabalhadores nas minas de carvão e nas fábricas
alimentadas a carvão não constaram em sua análise, como testemunhado pelas
Condições da classe trabalhadora inglesa de Friedrich Engels. 2 5

De fato, não havia em Jevons nenhuma consideração pela natureza como tal.
Ele simplesmente assumiu que os distúrbios e degradações em massa da terra eram um

23 Jevons, The Coal Question, 1 42.


24 Charles Dickens, The Old Curiosity Shop (New York: E.P. Dutton and Co., 1 908), 327 .
25 Frederick Engels, The Condition of the Working Class in England (Chicago: Academy Publishers,

1984). Ver também John Bellamy Foster, The Vulnerable Planet (New York: Monthly Rev iew Press,
1994), 50-59; Brett Clark e John Bellamy Foster, “The Env ironmental Conditions of the Working Class:
An Introduction to Selections from Friedrich Enge ls’s The Condition of the Working Class in England in
1 844,” Organization & Environment 19/3 (2006): 37 5-88.
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processo natural. Ainda que a falta de carvão, como fonte energética, tenha originado
questionamentos em sua análise sobre a possibilidade do crescimento sustentado, a
questão da sustentabilidade ecológica em si nunca foi abordada. Já que a economia tem
de permanecer em contínuo movimento, Jevons desconsiderou fontes sustentáveis de
energia, como a água e o vento, como inconfiáveis, limitadas a um tempo e local
particular. 2 6 O carvão ofereceu ao capital uma fonte energética universal para operar a
produção, sem distúrbios dos padrões comerciais.

Jevons, portanto, não tinha resposta real para o paradoxo que levantou. A Grã-
Bretanha poderia ou rapidamente usar a sua fonte barata de combustível – o carvão
sobre o qual a sua industrialização repousava – ou poderia usá-lo mais lentamente. Ao
final, escolheu usá-lo rapidamente: “Se pródiga e corajosamente avançarmos na criação
de nossas riquezas, tanto materiais quanto intelectuais, é difícil estimar a grandeza da
influência positiva que podemos atingir no presente. Mas a manutenção de tal posição
é fisicamente impossível. Temos que fazer a escolha decisiva entre uma grandeza
breve, mas verdadeira, e uma longa e continuada mediocridade”. 2 7

Expresso nesses termos, o caminho a ser tomado era claro: buscar a glória no
presente e aceitar a perspectiva de uma posição drasticamente degradada para as
gerações futuras. Uma vez que Jevons não tinha resposta para o que ele viu como a
exaustão rápida e inevitável dos estoques de carvão da Grã-Bretanha – e a capital e o
governo britânicos não viram outro curso concebível a não ser “business as usual” – a
resposta ao livro de Jevons tomou a forma predominante, por estranho que pareça, de
uma justificação adicional para a redução da dívida nacional. Isso foi apresentado como
uma medida preventiva face à eventual desaceleração da indústria. Como escreveu
Keynes, “A proposição de que estávamos vivendo às custas de nosso capital natural”
levou à resposta irracional de que era necessário levar a cabo “uma rápida redução do
peso da dívida”. 2 8

De fato, a quase totalidade do impacto político do livro de Jevons ficou


confinado, ironicamente, ao seu penúltimo capítulo, “Taxas e dívida nacional”. Jevons e
outras figuras, como Mill e Gladstone, que assumiu o seu argumento, nunca defenderam
26 Jevons, The Coal Question, 1 64-7 1.
27 Ibid., 459-60.
28 Key nes, Essays and Sketches in Biography, 132.
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seriamente a ideia da conservação do carvão. Não há nenhuma menção na análise de


Jevons ao ponto levantado por Engels em uma carta a Marx, na qual o capitalismo
industrial era caracterizado como um “esbanjador de energia solar passada”, como
evidenciado pelo seu “esbanjamento [de] nossas reservas de energia, nosso carvão,
metais, florestas, etc.”.2 9 Para Jevons, a ideia de uma alternativa ao business as usual
nunca foi discutida, e sem dúvida nunca foi cogitada. Nada estava mais distante da sua
visão econômica do que a transformação das relações sociais de produção em direção a
uma sociedade governada não pela busca do lucro, mas pelas necessidades genuínas das
pessoas e pelos requisitos sócio-ecológicos da sustentabilidade. Ao final, os problemas
que ele previu foram adiados no curso real da história pela expansão do uso de outros
combustíveis fósseis – petróleo e gás natural –, assim como de energia hidrelétrica, e
pela corrente exploração de recursos no mundo inteiro. Tudo isso, porém, preparou o
terreno para o nosso dilema planetário atual e para o retorno do Paradoxo de Jevons.

A redescoberta do Paradoxo de Jevons

O Paradoxo de Jevons foi esquecido no auge da era do petróleo durante três


quartos do século XX, mas ressurgiu nos anos 70 devido à crescente preocupação sobre
a escassez de recursos associada com a análise dos Limites do crescimento feita pelo
Clube de Roma, exacerbada pela crise do petróleo e da energia de 1973-74. Enquanto
medidas de eficiência energética eram tomadas, economistas se debruçavam sobre a sua
efetividade. Isso levou à ressurreição, no fim dos anos 70 e início dos 80, da questão
geral posta pelo Paradoxo de Jevons, na forma do que foi chamado de “efeito rebote”.
Essa era a noção bastante simples de que ganhos de eficiência propiciados pela
engenharia normalmente levam a uma diminuição do preço efetivo de uma mercadoria,
com isso gerando aumento de demanda, de maneira que os ganhos de eficiência não
causavam um decréscimo no consumo de igual medida. O Paradoxo de Jevons foi
frequentemente relegado à versão mais extrema do efeito rebote, no qual há um

29Karl Marx and Frederick Engels, Collected Works (New York: International Publishers, 1 97 5), vol. 46,
411 .
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backfire, ou um rebote de mais de 100% da “economia de engenharia”, resultando em


aumento, e não em diminuição, do consumo de um dado recurso. 3 0

Os otimistas da tecnologia tentaram argumentar que o efeito rebote é pequeno,


e, portanto, os problemas ambientais podem ser resolvidos em grande medida tão
somente através da inovação tecnológica, com os ganhos de eficiência sendo traduzidos
em processamento reduzido de energia e materiais (desmaterialização). Porém, há
fortes evidências empíricas de um efeito rebote substancial. Por exemplo, avanços
tecnológicos nos veículos automotores, que aumentaram a quantidade média de milhas
percorridas por galão em 30% nos Estados Unidos a partir de 1980, não reduziram a
energia total utilizada pelos veículos. O consumo de combustível por veículo
permaneceu constante, enquanto os ganhos de eficiência levaram ao aumento não
apenas do número de automóveis e caminhões nas estradas (e das milhas viajadas), mas
também do seu tamanho e “performance” (taxa de aceleração, velocidade de cruzeiro,
etc.) – de maneira que hoje SUV’s e minivans povoam as autoestradas estadunidenses.
No nível macro, o Paradoxo de Jevons pode ser constatado no fato de que, ainda que os
Estados Unidos tenham dobrado a sua eficiência energética desde 1975, o seu consumo
de energia aumentou dramaticamente. Juliet Schor nota que nos últimos 35 anos:

a energia gasta por dólar do PIB foi cortada pela metade. Mas ao invés de cair, a
demanda energética aumentou em cerca de 40%. Além disso, a demanda cresce
mais rapidamente naqueles setores que têm os maiores gan hos de eficiência –
uso de energia no transporte e residencial. A eficiência de refrigeradores
aumentou 10%, mas o número de refrigeradores em uso aumentou em 20%. Na
av iação, o consumo de combustível por milha caiu mais de 40%, mas o uso total
de combustível cresceu 150%, porque a milhagem por passageiro aumentou.
Veículos têm história semelhante. E com a explosão da demanda, tivemos
ex plosão das emissões. O dióxido de carbono desses dois setores aumentou em
40%, o dobro da taxa da maior economia.

Economistas e ambientalistas que tentam medir os efeitos diretos da eficiência


na diminuição do preço e o efeito rebote imediato geralmente tendem a ver esse efeito
como relativamente pequeno, no intervalo de 10 a 30% em ramos de alto consumo
energético, como aquecimento e resfriamento doméstico e automóveis. Mas uma vez
que são incorporados os efeitos indiretos, aparentes no nível macro, o Paradoxo de

30Blake Alcott, “Historical Ov erv iew of the Jevons Paradox in the Literature,” in Polimeni, et al., The
Jevons Paradox, 8, 63. For the Club of Rome study, see Donella H. Meadows, Dennis L. Mea dows,
Jørgen Randers, William W. Behrens III, The Limits to Growth (New York: Universe Books, 197 2).
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Jevons permanece extremamente significativo. É no nível macro que os efeitos de escala


se tornam claros: aperfeiçoamentos na eficiência energética podem diminuir o custo
efetivo de vários produtos, impelindo a economia em geral e expandindo o consumo
energético em geral. 3 1 Economistas ecológicos como Mario Giampietro e Kozo Mayumi
argumentam que o Paradoxo de Jevons somente pode ser entendido em um modelo
macroevolucionário, onde aperfeiçoamentos na eficiência resultam em mudanças nas
matrizes da economia, de maneira que o efeito agregado é o aumento da escala e do
ritmo do sistema como um todo. 3 2

A maior parte das análises do Paradoxo de Jevons permanece abstrata,


baseadas em efeitos tecnológicos isolados, e apartados do processo histórico. Elas
deixam de examinar, tal como Jevons, o caráter da industrialização. Além disso, elas
estão ainda mais distantes de um entendimento realista do caráter orientado à
acumulação do desenvolvimento capitalista. Um sistema econômico devotado aos
lucros, à acumulação e à expansão econômica sem fim tenderá a usar todos os ganhos da
eficiência energética ou redução de custos para expandir a escala agregada da produção.
A inovação tecnológica será, portanto, claramente configurada para esses mesmos fins
expansivos. Não é mera coincidência que todas as grandes inovações que dominaram os
séculos XVIII, XIX e XX (ou seja, a máquina a vapor, a estrada de ferro e o automóvel)
se caracterizaram pela sua importância no direcionamento da acumulação do capital e
pela retroação positiva que geraram no que concerne ao crescimento econômico como
um todo – de maneira que os efeitos de escala na economia que resultaram de seu
desenvolvimento necessariamente suplantaram as melhoras na eficiência tecnológica. 3 3
A conservação no agregado é impossível para o capitalismo, por mais que a razão
entradas/saídas possa aumentar na engenharia de um dado produto. Isso porque todas
as economias tendem a estimular a formação de mais capital (caso canais de
investimento estejam disponíveis). Esse é especialmente o caso quando recursos

31 Juliet B. Schor, Plenitude (New York: Penguin Press, 2010), 88-90. Para uma discussão detalhada dos
dados empíricos sobre o Paradoxo de Jevons, ver John M. Polimeni, “Empirical Ev idence for the Jevons
Paradox,” in Polimeni, et al., The Jevons Paradox, 1 41 -7 1.
32 Mario Giampietro and Kozo May umi, “The Jevons Paradox,” in Polimeni, et al., The Jevons Paradox,

80-81.
33 Para uma discussão de inovações que marcam épocas, ver Paul A. Baran and Paul M. Sweezy , Monopoly

Capital (New York: Monthly Review Press, 1966), 219-22.


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industriais essenciais – o que Jevons chamou de “materiais centrais” ou “produtos


básicos” – estão em jogo.

A falácia da desmaterialização

O Paradoxo de Jevons é o produto de um sistema econômico capitalista que é


incapaz de conservar na macroescala, pois ele é configurado para maximizar o
processamento energético e material, desde a fonte de recursos até o depósito de final
de lixo. A economia de energia em tal sistema tende a ser usada como um meio para o
desenvolvimento adicional da ordem econômica, gerando o que Alfred Lotka chamou de
“máximo fluxo energético”, ao invés de uma mínima produção de energia.3 4 A
desconsideração da conservação absoluta de energia (em oposição à relativa) está
imbricada na natureza e na lógica do capitalismo, como um sistema integralmente
devotado aos deuses da produção e do lucro. Como colocou Marx: “Acumulai! Acumulai!
Esse é o mandamento!” 3 5

Visto no contexto da sociedade capitalista, portanto, o Paradoxo de Jevons


demonstra a falácia das noções correntes de que os problemas ambientais com que a
sociedade se depara podem ser resolvidos com meios puramente tecnológicos.
Economistas ecológicos hegemônicos frequentemente se referem à “desmaterialização”
ou “desacoplamento” do crescimento econômico em relação ao consumo de energia e
recursos. O aumento da eficiência energética é com frequência tomado como uma
indicação concreta de que o problema ambiental está sendo resolvido. Mas a economia
de materiais e energia, no contexto de um dado processo de produção, como vimos, não
é nada novo; ela é parte da história cotidiana do desenvolvimento capitalista. 3 6 Cada
nova máquina a vapor, como enfatizava Jevons, era mais eficiente do que a anterior.
“Processos de economia de matérias-primas”, como notou o sociólogo ambiental
Stephen Bunker, “são mais velhos do que a Revolução Industrial, e foram dinâmicos ao
longo da história do capitalismo”. Toda noção de que a redução do processamento

34 Alfred J. Lotka, “Contributions to the Energetics of Evolution” Proceedings of National Academy of


Sciences 8 (1922): 1 47 -51 ; Giampietro and Mayumi, “The Jevons Paradox,” 111-15.
35 Karl Marx , Capital, vol. 1 (New York: V intage, 197 6), 7 42.
36 John Bellamy Foster, Ecology Against Capitalism (New York: Monthly Rev iew Press, 2002), 22 -24.
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material por unidade de renda nacional é um fenômeno novo é, portanto,


“profundamente a-histórica”. 3 7

O que se negligencia, então, em noções simplistas de que a uma maior eficiência


energética normalmente leva a um aumento da economia agregada, é a realidade da
relação do Paradoxo de Jevons – através da qual a economia de energia é usada para
promover novas formações de capital e a proliferação de mercadorias, demandando
recursos cada vez maiores. Ao invés de uma anomalia, a regra de que a eficiência
aumenta o consumo energético e material é integral ao próprio “regime do capital”. 3 8
Como colocado em O peso das nações, um estudo empírico importante das saídas
materiais nas últimas décadas em cinco nações industrializadas (Áustria, Alemanha,
Holanda, Estados Unidos e Japão): “Ganhos de eficiência propiciados pela tecnologia e
novas práticas gerenciais tem sido compensadas por [aumentos da] escala do
crescimento econômico”. 3 9

O resultado é a produção de montanhas sobre montanhas de mercadorias e


custos unitários decrescentes que levam a um maior gasto de recursos materiais. Além
disso, no capitalismo monopolista tais mercadorias tomam cada vez mais a forma de
valores de uso artificiais, promovidos por um v asto sistema de propaganda e projetados
para instigar uma demanda cada vez maior por mercadorias e pelo valor de troca que
elas representam – como um substituto para a satisfação de necessidades genuinamente
humanas. Bens desnecessários e desperdício são produzidos com labuta inútil para
incrementar valores puramente econômicos, em detrimento do ambiente. Qualquer
desaceleração desse processo de destruição ecológica, sob o sistema atual, implica o
desastre econômico.

Aos olhos de Jevons, a “escolha decisiva” levantada pela continuação do


business as usual era simplesmente “entre uma breve mas verdadeira grandeza
[nacional] e uma longa e continuada mediocridade”. Ele optou pela primeira – o

37 Stephen G. Bunker, “Raw Materials and the Global Economy,” Society and Natural Resources 9/4
(July -August 1 996): 421 .
38 Robert L. Heilbroner, The Nature and Logic of Capitalism (New York: W.W. Norton, 1 985).
39 Emily Matthews, Christof Amann, Stefan Bringezu, Marina Fischer -Kowalski, Walter Hüttler, René

Kleijn, Yuichi Moriguchi, Christian Ottke, Eric Rodenburg, Don Rogich, Heinz Schandl, Helmut Schütz,
Ester van der Voet, and Helga Weisz, The Weight of Nations (Washington, D.C.: World Resources
Institute, 2000), 35.
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máximo fluxo energético. Um século e meio mais tarde, em nossa econom ia muito
maior e mais global – mas não menos cara – não é mais apenas a supremacia nacional
que está em jogo, mas o destino do próprio planeta. Certamente, há aqueles que
defendem que deveríamos “viver bem agora e deixar que o futuro cuide de si mesmo”.
Escolher esse caminho, porém, é flertar com o desastre planetário. A única resposta real
para a humanidade (incluindo as futuras gerações) e para a Terra como um todo é
alterar as relações sociais de produção, para criar um sistema no qual a eficiência não
seja mais uma maldição – um sistema mais elevado, no qual igualdade,
desenvolvimento humano, comunidade e sustentabilidade sejam objetivos explícitos.

(Traduzido por Daniel Cunha

Originalmente publicado em Monthly Review:

http://monthlyreview.org/2010/11/01/capitalism-and-the-curse-of-energy-efficiency/

Também publicado em Foster, JB; Clark, B; York, R (2010) The Ecological Rift:
Capitalism’s War On The Earth, New York: Monthly Review Press, p. 169-181.)

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