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Revista GeoSertões
(Unageo-CFP-UFCG)
Vol. 5, nº 10, jun./dez. 2020
Revista GeoSertões – ISSN 2525-5703
EXPEDIENTE
EDITOR-GERENTE E EDITOR
Dr. Santiago Andrade Vasconcelos, Universidade Federal de Campina Grande (CFP-
UFCG), Brasil.
EDITORES DE SEÇÕES
Dr. Santiago Andrade Vasconcelos, Universidade Federal de Campina Grande (CFP-
UFCG), Brasil.
Dr. Paulo Sérgio Cunha Farias, Universidade Federal de Campina Grande (UAEd-CH-
UFCG), Brasil.
CONSELHO EDITORIAL
Dr. Aloysio Rodrigues de Sousa, Universidade Federal de Campina Grande (CFP-UFCG),
Brasil.
Dra. Ivanalda Dantas Nóbrega Di Lorenzo, Universidade Federal de Campina Grande
(CFP-UFCG), Brasil.
Dra. Cícera Cecília Esmeraldo Alves, Universidade Federal de Campina Grande (CFP-
UFCG), Brasil.
Dr. Marcelo Brandão, Universidade Federal de Campina Grande (CFP-UFCG), Brasil.
Dra. Jacqueline Pires Gonçalves Lustosa, Universidade Federal de Campina Grande (CFP-
UFCG), Brasil.
Dr. Santiago Andrade Vasconcelos, Universidade Federal de Campina Grande (CFP-
UFCG), Brasil.
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CONSELHO CIENTÍFICO
Dr. Caio Augusto Amorim Maciel, Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Brasil
Dr. Ivan Silva Queiroz, Universidade Regional do Cariri – (URCA), Brasil
Dr. Paulo Sérgio Cunha Farias, Universidade Federal de Campina Grande – (UAEd-CH-
UFCG), Brasil
Dr. Gleydson Pinheiro Albano, Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Dra. Firmiana Fonseca Siebra, Universidade Regional do Cariri – (URCA, Dep.de
Geociências), Brasil
Dra. Emília de Rodat Fernandes Moreira, Universidade Federal da Paraíba (UFPB),
Brasil
Dr. Marco Antônio Mitidiero Jr., Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Brasil
Dr. Wagner Costa Ribeiro, Universidade de São Paulo (USP), Brasil
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FICHA CATALOGRÁFICA
Revista GeoSertões – Unidade Acadêmica de Geografia do Centro de Formação de Professores da
Universidade Federal de Campina Grande. – v. 5, n. 10 (2020). Cajazeiras: Universidade Federal de
Campina Grande, 2016 -
Semestral: 2016 –
ISSN: 2525-5703
I Ensino superior – Periódicos. II. Universidade Federal de Campina Grande. III. Título
Licença
by-nc-nd/4.0
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SUMÁRIO
EDITORIAL/APRESENTAÇÃO
cidadania
Paulo Sérgio Cunha Farias
educadora
Elany Cristina Barros da Silva
Genylton Odilon Rêgo da Rocha
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educação geográfica
Sonia Maria de Lira
ARTIGO
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EDITORIAL/APRESENTAÇÃO
A
Revista GeoSertões tem a satisfação de colocar à disposição dos
leitores o dossiê “Por uma Geografia Escolar Crítica”. O referido
dossiê nasce das urgências históricas do tempo do presente, no qual
a perversidade sistêmica da globalização do capitalismo neoliberal se
impõe. Esse período da história humana vem se amparando nas tecnologias da
informação e em parâmetros normativos que reforçam o caráter ubíquo do
capital e solapam ou precarizam o trabalho. Isso tem aprofundado as
desigualdades sociais e espaciais e, portanto, as contradições inerentes às
formações socioespaciais regidas pela economia de mercado. Nasce, também,
da insatisfação dos autores com as políticas curriculares e educacionais em
geral, que, ao considerar a educação como serviço a ser buscado no mercado e
ao adotar modelos pedagógicos pragmáticos para os sistemas de ensino, que a
reduzem ao papel de formar visando a preparação para o trabalho e proclamar
as excelências do livre mercado e da livre iniciativa, têm se resumido a atender
às margens corretivas e interesseiras do capital. Isso tem interditado as
pedagogias histórico-críticas e extirpado a Geografia Crítica dos sistemas de
ensino, o que dificulta a leitura espacial dessas contradições por parte de
professores e alunos no processo ensino/aprendizagem da Geografia Escolar.
Essas questões foram observadas, pelos autores, a partir da realidade brasileira
contemporânea.
Para além da urgência do presente dossiê, ele representa também a
comemoração da Revista GeoSertões que chega ao seu número 10. Apesar das
dificuldades enfrentadas por este ser um periódico sediado no interior do país,
ou melhor, no(s) Sertão(ões) e a “margem” dos grandes e tradicionais centros
universitários, seguimos resistindo e persistindo para não sucumbir. O dossiê
ora disponibilizado ao nosso público leitor é a maior prova que estamos
conseguindo vencer as adversidades e nos fortalecer. Somos gratos a todos e
todas que colaboram e têm acreditado na Revista GeoSertões.
- *** -
Apresentação do dossiê
O dossiê traz estudos de releitura e a incorporação de novas abordagens e temas
para a Geografia Escolar Crítica, o que traduz a pluralidade de ideias, teorias e
temáticas dos seus autores. Assim, para uma melhor compreensão, passamos a
sintetizar o conteúdo de cada artigo.
Paulo Sérgio Cunha Farias, no ensaio intitulado A Geografia Escolar Crítica
e a formação para a cidadania, discute o papel da educação fundamentada na
filosofia da práxis e a educação geográfica na Geografia Escolar Crítica como
instrumentos necessários à superação do modelo de sociedade brasileira atual
e da sua cidadania atrofiada, mutilada e amputada, traduzida na figura do
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Apresentação do artigo
Na seção de artigos, no presente número contamos com a contribuição de
Rejane do Nascimento Silva e Sérgio Murilo Santos de Araújo. Esses
pesquisadores nos apresentam o estudo Riscos e vulnerabilidades
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DOSSIÊ
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(1)
Professor na Universidade Federal de Campina Grande - UAEd-CH, Graduação em Geografia pela
UEPB, mestre e doutor em Geografia pela UFPE
E-mail: pscfarias@bol.com.br
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Resumo
Este ensaio objetiva analisar o papel educativo da Geografia Escolar Crítica na formação para a cidadania no
Brasil. Para isso, amparou-se nos princípios da pesquisa bibliográfica e nos fundamentos da teoria crítica.
Procura revelar como a Educação e a Geografia Escolar, em suas diferentes perspectivas e em diferentes
contextos históricos do país, estiveram no centro dos conflitos inerentes à cidadania. Conclui que a educação
fundamentada na filosofia da práxis e a Geografia Escolar Crítica podem contribuir para a superação do modelo
de sociedade brasileira atual e da sua cidadania atrofiada, mutilada e amputada, que se traduz na figura do
cidadão produtivo e consumidor, que as propostas curriculares pragmáticas oficiais contemporâneas objetivam
formar. Considera que a Geografia Crítica Escolar, por possibilitar a leitura das contradições do espaço, pode
contribuir para a formação da consciência política necessária às lutas para a edificação da cidadania real,
integral, irrestrita e concreta.
Palavras-chave
Educação; Ensino de Geografia; Geografia Escolar Crítica; Cidadania.
Abstract
This essay aims to analyze the Critical School Geography educational role in the formation of citizenship in
Brazil. For this, it relied on the principles of bibliographic research and the foundations of critical theory. It
seeks to reveal how Education and the School Geography, in their different perspectives and in different
historical contexts of the country, are at the center of conflicts inherent to citizenship. It concludes that education
based on the philosophy of praxis and the Critical School Geography can contribute to overcoming the current
Brazilian society model and its stunted citizenship, mutilated, and amputated, which translates into the figure
of the productive and consumer citizen, that contemporary official pragmatic curriculum proposals aim to this
formation. It considers that the Critical School Geography, by enable the space contradictions readings, it can
contribute to the political awareness formation, necessary to the struggles for the construction of real, integral,
unrestricted, and concrete citizenship.
Keywords:
Education; Geography teaching; Critical School Geography; Citizenship.
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Introdução
C
allai (1998), ao levantar os porquês de se estudar Geografia, afirmou que há três
razões que devem ser consideradas, quais sejam: conhecer o mundo e obter
informações; analisar, conhecer e explicar o espaço produzido pela sociedade, as
causas que lhe deram origem; e, por último, algo que não se refere ao conteúdo em si, mas ao
objetivo maior que dá conta de todo o mais: a formação cidadã.
Para ela (op. cit., 57), “instrumentalizar o aluno, fornecer-lhe as condições para que seja
realmente construída a sua cidadania é o objetivo da escola, mas à geografia cabe um papel
significativo nesse processo, pelos temas, pelos assuntos que trata”.
Partindo desse pressuposto, essa reflexão se propõe a analisar os vínculos entre a
educação, a Geografia Escolar e a formação para a cidadania. No entanto, consideramos que
resgatar ou restituir a educação fundamentada nos princípios da filosofia da práxis e a educação
geográfica nos fundamentos da Geografia Escolar Crítica, tão negadas e esquecidas nas
propostas curriculares dos anos de 1990 em diante, é essencial para se alcançar uma educação
geral e geográfica capaz de contribuir para a construção de uma consciência socioespacial
transformadora, necessária à edificação da cidadania plena.
A Geografia Escolar Crítica, pela sua abordagem centrada na instância espacial em suas
contradições e pelos seus objetivos políticos de emancipação e libertação humanas, pode
colaborar para uma leitura geográfica consciente da realidade, condição para a ação política
capaz de superar o modelo social vigente, que atrofia, mutila ou amputa a cidadania no Brasil.
Por isso, a urgência em retomá-la nos nossos sistemas de ensino. Muito além disso, ela deve
contribuir para a resistência e a militância política de professores e alunos contra o status quo
de uma sociedade que se assenta na exploração do trabalho e inibe a concretização do cidadão.
Na Geografia, a questão da cidadania foi tratada por Milton Santos nos idos anos de
1990 do século passado, quando publicou o livro O Espaço do Cidadão, no qual analisa, entre
outros temas, a importância do território usado, o seu aparelhamento e a sua gestão, como
condição para o exercício da cidadania concreta. Nesse livro, levanta duas questões para uma
país onde a figura do cidadão é tão esquecida: quantos habitantes no Brasil são cidadãos?
quantos nem sabem que não são? O tema da cidadania também perpassa o seu livro O país
distorcido, publicado em 2002. Essas questões continuam atuais, o que reafirma as prioridades
esquecidas de uma educação e uma Geografia Escolar para a construção da cidadania.
Assim, em função da urgência e relevância do tema, nesse ensaio, abordamos as
concepções de cidadania e o papel da Geografia Escolar para construí-las. Focalizamos a
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importância da Geografia Escolar Crítica em uma educação geográfica voltada à formação para
a cidadania plena e, finalmente, tecemos algumas considerações finais acerca da temática desse
estudo.
Entretanto, desde então, a noção de cidadania também foi se definindo ao sabor dos
embates sociais que marcaram a sociedade capitalista. De acordo com Heguette (apud
SANTOS, op. cit., p. 9, nota 1), “no século XIX, com a emergência do Estado-nação em toda a
Europa, este conceito adquiriu um importante elemento: a qualidade de membro”. Assim, a
cidadania era exercida pelo fato do sujeito ser membro de um Estado-nação. Ainda no século
XIX, “o direito de associação - que representa importante direito político -foi incorporado ao
status da cidadania, proporcionando as bases para a classe trabalhadora adquirir direito político”
(HEGUETTE apud SANTOS, op. cit., p. 9, nota 2). A partir da segunda metade do século XX,
“um terceiro conjunto de direitos – os direitos sociais – garantia ao indivíduo um padrão de
vida decente, uma proteção mínima contra a pobreza e a doença, a participação na herança
social” (HEGUETTE apud SANTOS, op. cit., pp. 9-10, nota 3), foi incorporado à cidadania
nos Estados europeus do bem-estar social.
A conquista dos direitos políticos e sociais não foi obra do acaso, ela resultou das lutas
históricas dos trabalhadores, organizados em sindicatos, e dos movimentos sociais, denotando
a capacidade de organização da sociedade civil para alcançá-la.
Por outro lado, como o escopo da cidadania não é o mesmo nos países metrópoles e
satélites, como sugere Haguette (apud Santos, op. cit.), nos países periféricos, como o Brasil, a
garantia e extensão dos direitos políticos dependem da consolidação de regimes democráticos,
que são sempre instáveis, e sociais, que nunca foram garantidos e consolidados de fato. Por
isso, este autor (op. cit.) advoga que, no nosso país, existem diversas categorias de cidadãos,
desde os que têm todos os direitos (os da classe alta), os que querem privilégios e não direitos
para todos (os da classe média) e os que não têm direitos (os pobres).
Ao longo desse processo, cabe-nos atentar como a educação e a Geografia escolar se
inseriram. Podemos afirmar que, sem sombra de dúvidas, ambas estiveram/estão no epicentro
dos embates pela cidadania ao longo do tempo.
A constituição dos sistemas escolares nacionais foi parte do projeto burguês na criação
dos Estados nacionais. Primeiro, com a educação nacional e universal, essa classe, que passa a
exercer a hegemonia política, econômica, social e cultural, fez da escola o lugar de difusão da
sua da ideologia e de combate a do velho regime. Assim, segundo Vesentini (1998), procurou,
através da educação, deslegitimar as raízes pretensamente biológicas (o sangue) e criadas por
Deus da classe nobre e criar uma legitimidade nova, calcada no estudo, no mérito escolar, no
diploma. Segundo, buscou difundir uma ideologia patriótica e nacionalista, para inculcar,
através da escola, que o Estado-nação é natural e eterno, além de apagar da memória coletiva
as formas anteriores de territorialidade das sociedades, a exemplo da cidade-estado, do
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a ideia de pertencimento a esse espaço atemporal, para o que a Geografia Escolar foi matéria
relevante, justificando a sua inserção curricular em alguns países europeus, mesmo antes da sua
constituição como ciência nas Universidades, como foi exemplar o caso alemão.
No caso brasileiro, a produção do cidadão patriota, embora já estivesse na pauta do
governo imperial, ganha relevo nos anos de 1930, com a emergência do Estado Novo e do
Varguismo. Esse período foi marcado pelo prenúncio da industrialização, da modernização e
da integração do território nacional. Nessa conjuntura, a Geografia se apresentava como ciência
e disciplina escolar de muita relevância para o controle e gestão do território e para soldar a
unidade nacional em torno do projeto modernizador conservador e ditatorial pela via da
construção da identidade patriótica e nacional. Para isso, além da sua manutenção e renovação
nos sistemas de ensino, conforme Andrade (2006) e Santos (2002a), criou-se o Conselho
Nacional de Geografia (CNG) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), além
dos primeiros cursos de Geografia na UFRJ, então Universidade Nacional, e USP, com objetivo
de formar os professores para lecioná-la.
Os balbucios da industrialização e, consequentemente, dos primeiros esboços da
integração do território nacional, através da criação de sistemas de normas e da montagem dos
primeiros sistemas de fluxos articulados, revelaram a diversidade histórica e espacial de um
país de dimensões continentais. Tais diferenciações regionais pouco interagiam e se conheciam,
já que, historicamente, em função da lógica extrovertida das suas economias agroexportadoras,
teciam a vida de relações com os lugares distantes.
Assim, era preciso soldar a unidade dessa diversidade que espacialmente se introvertia.
Para isso, o apelo ao nacionalismo patriótico funcionou como elemento de amálgama social e
territorial. Nesse empreendimento, a educação e, em particular, a Geografia, assumiram um
importante papel, pois ajudaram a forjar o cidadão patriota brasileiro.
Entretanto, esse nacionalismo deveria ser do tipo ilustrado, ou seja, o bom brasileiro,
como delegava os fundamentos do positivismo clássico, que inspirava o projeto, deveria ser o
cidadão forjado nos princípios da ciência. As normatizações desse modelo de educação nacional
foram estabelecidas pelas Leis Orgânicas nos anos de 1930, que ficaram conhecidas como as
reformas de Capanema. Na base desse modelo de educação ilustrativa, voltado para a
transmissão da verdade científica ao aluno, através do discurso do professor, estavam os
fundamentos da pedagogia tradicional.
Os objetivos e fins da educação nacional, ao se centralizarem na formação do cidadão
patriota e, para isso, ampararem-se nos fundamentos da pedagogia tradicional, definiram quais
os componentes curriculares a serem estudados e o que deveriam abordar, através dos quais se
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operacionalizou essa formação. Nesse sentido, a ênfase recaiu no ensino da língua nacional e
da matemática, sem que a palavra e o cálculo se articulassem com o mundo da vida, com as
condições materiais de existência do sujeito aprendiz. Por outro lado, às ciências humanas,
como a História e a Geografia, couberam ensinar a história nacional e descrever as
características fisiográficas do território, respectivamente.
Para formar o cidadão patriota brasileiro, a Geografia Escolar, fortemente amparada no
possibilismo geográfico oriundo da França, assumiu “a ideologia do nacionalismo patriótico
em sua prática pedagógica” (VLACH, 1998; VESENTINI, 1998; PEREIRA, 1999 e GEBRAN,
2003). Para isso, segundo Vesentini (op. cit.), o estudo do Brasil deveria começar pela área e
forma do território, latitude e longitude, além de fusos horários, e destacar sua imensa riqueza
natural, nunca esquecendo de, ao esboçar o seu mapa, colocar sempre a sua capital em seu
“centro geográfico”, no coração do país.
Para o controle, a gestão e o estudo do território nacional se adotou, também, os recortes
regionais (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Leste e Sul) , elaborados por Fábio Guimarães,
engenheiro/geógrafo do IBGE, no começo da década de 1940. Estes se fundamentavam no
conceito de região natural. A eleição desse parâmetro de regionalização do país se justificava
porque, para o seu autor, as bases físicas apresentavam mais durabilidade. Portanto,
viabilizavam as descrições necessárias ao projeto de nação e de nacionalidade que se pretendia
construir.
Assim, nas escolas, a identificação e o pertencimento do educando com o território
nacional foram construídos tomando como base os estudos sobre as regiões brasileiras. Tais
estudos também revelariam o quadro diverso da sua natureza, capaz de acenar com o destino
glorioso que era resguardado à nação. No entanto, nesses estudos, seguindo a tradição da escola
geográfica de La Blache, somente o título era “regional”, pois a análise se segmentava nos
“famosos” aspectos físicos, humanos e econômicos, e pouca coisa se percebia ou aprendia a
respeito do arranjo socioespacial regional.
Além dessa compartimentação e fragmentação do e entre o físico e o humano, essa
perspectiva escolar da Geografia se pautou em uma abordagem descritiva, objetiva e
congeladora dos conceitos de que tratou (GEBRAN, 2003). Estes, abordados nos moldes da
pedagogia tradicional, com quem, segundo Straforini (2004), ela estabeleceu longo e exitoso
matrimônio, ambas fundamentadas no método positivista, eram distantes e alheias da realidade
dos alunos, a quem cabia memorizá-los e reproduzi-los nos exercícios e provas bimestrais.
Em suma, a Geografia Escolar, ao se colocar a serviço da construção do cidadão patriota
que, para isso, deveria conhecer o “corpo da nação” retalhado em recortes regionais, suporte
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material do civismo alienado que ajudou a construir, serviu para encobrir os conflitos, a
violência e a historicidade inerentes à formação territorial brasileira, às desigualdades e
contradições recorrentes e sempre recriadas na produção da sua formação socioespacial. Ela
descrevia o mundo para o estudante, sem explicá-lo e sem fornecer as ferramentas necessárias
para mudá-lo. Serviu e serve para mascarar a realidade, os problemas enfrentados pela
sociedade, como denunciou Lacoste (1997), ao que denominou de Geografia dos professores.
Assim, contribuiu para a manutenção da ordem vigente e necessária ao progresso exclusivo das
elites nacionais e estrangeiras.
A edificação da cidadania baseada na criação, garantia e ampliação de direitos políticos,
civis e sociais também não fez parte da pauta principal de outros projetos subsequentes de
modernização da sociedade e do território, a exemplo do Plano de Metas de JK (1956-1961).
Este ampliou o processo de industrialização/urbanização, consolidou a integração do território,
reorientou a ordem geopolítica interna, ao transferir a capital para a recém criada Brasília, mas,
ao fazer isso, revelou-se como um projeto conservador, elitista e excludente. Por outro lado, a
Geografia Escolar se manteve fiel à postura positivista, advinda da herança da escola geográfica
francesa e, em virtude disso, silenciou sobre as desigualdades e contradições características
dessa etapa de modernização da formação socioespacial brasileira.
As tentativas de concretizar um embrionário projeto de cidadania tomam relativa forma
com as reformas de base de Jango (1961-1964). Entretanto, o golpe civil/militar, orquestrado
pela burguesia e forças armadas nacionais, com forte apoio interno da classe média e externo
dos Estados Unidos, interditou tais reformas e mergulhou o país em 21 anos de ditadura militar
(1964-1985), que suprimiu direitos políticos, retroagiu os direitos civis e interditou a agenda
urgente dos direitos sociais dos trabalhadores brasileiros, deixando um legado de heranças para
a nossa cidadania atrofiada no presente.
Em função do projeto de modernização conservadora do regime militar que assaltou o
poder, baseado no modelo tripé de industrialização, como ressaltam Becker e Egler (2003), no
qual cabia ao Estado atuar no setor da indústria de base; ao capital nacional, na indústria de
bens de consumo não-duráveis; e ao capital internacional, na indústria de bens de consumo
duráveis, tomam forma os mecanismos de produção dos sujeitos sociais que Frigotto e Ciavata
(2003, p. 50) nomeiam de cidadão produtivo, que corresponde ao “trabalhador que faz, produz
mais rapidamente, tem qualidade e é mais competente”, ao mesmo tempo em que deve ser
desprovido de historicidade, da consciência de classe e do conhecimento de viver em uma
sociedade concreta baseada na exploração do seu trabalho. Para a formação desse tipo de
cidadão, a educação assumiu um papel de extrema relevância.
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Assim sendo, através dos acordos estabelecidos entre o MEC e a USAID, a educação
básica, para atender aos objetivos do regime que se instaurou com a ditadura militar, foi
reformulada pela Lei 5.692/71 e assumiu a tendência pedagógica tecnicista. Com isso, segundo
Gebran (2003), seu objetivo passou a ser a formação do trabalhador para o conhecimento de
formas de organização do trabalho e o manuseio de máquinas que a indústria em expansão
exigia.
Além disso, a educação, pelo papel que também pode exercer na reprodução e no
controle social, ocupou posição estratégica nesse projeto de hegemonia. Por isso, a estrutura do
currículo foi reformulada, os conteúdos curriculares controlados, os professores foram
“amordaçados”, vigiados e os que ousaram descumprir os ditames do regime, perseguidos e
torturados. Esperava-se, com isso, que a escola silenciasse ou não assumisse qualquer postura
crítica diante da violência física e simbólica do modelo imposto e que se alicerçava nas
desigualdades socioespaciais e no cerceamento de direitos essenciais à afirmação de uma
cidadania de fato.
Nesse modelo educacional, as Ciências Humanas foram secundarizadas, por não servir
ao projeto pedagógico tecnicista ou pelas suas possibilidades de abordagem crítica da
sociedade, constituírem-se em ameaças à hegemonia do regime ditatorial. Quando muito, na
academia, tiveram que se adequar aos interesses do planejamento estatal e empresarial, ou, na
escola, reproduzir o teor nacionalista do seu discurso pedagógico, em datas comemorativas
nacionais, como foi o caso da Geografia.
Nesse período, na estrutura universitária brasileira foi introduzido o paradigma
neopositivista da ciência geográfica, caracterizado pelo objetivismo, neutralidade e
cientificidade da linguagem da lógica, da matemática e da estatística. Assim sendo, a Geografia
se transformou em mero exercício de quantificação dos padrões espaciais, alheio à historicidade
da sociedade, tomando a forma do que se convencionou a chamar de Nova Geografia, Geografia
Quantitativa, Pragmática ou Teorética. Partindo de modelos dedutivos de análise, essa
perspectiva se constituiu em importante ferramenta para diagnósticos sobre regiões, territórios
e lugares, necessários às ações do planejamento estatal e empresarial. Por isso, seus
fundamentos inspiraram pesquisas em órgãos do Estado, como o IBGE e a SUDENE.
Por outro lado, nos sistemas escolares, esse paradigma não se traduziu diretamente em
uma variante pedagógica para a Geografia Escolar, apesar de ter-lhe legado temas, conceitos,
instrumentos de síntese e organização de dados (tabelas e gráficos), formas de regionalização
(regiões homogêneas e funcionais), exercícios indutores da construção do raciocínio espacial
instrumental pelo aluno.
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Marx refere-se ao termo como uma formação humana oposta à formação unilateral que, por sua vez, é provocada
pelo trabalho alienado, pela divisão do trabalho, pelas relações burguesas.
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omitir as suas tensões e contradições sociais, como fazia e faz a Geografia Tradicional. O
segundo, pelo seu caráter de não neutralidade e pelo seu compromisso com a justiça social, com
a correção das desigualdades socioeconômicas e regionais. (VESENTINI, op. cit.)
Diferente do que propõe Vesentini (op. cit.), é consenso entre os geógrafos que, das
Universidades, esses pressupostos da renovação da Geografia chegaram às escolas, através dos
professores formados nas suas licenciaturas, das propostas curriculares, do livro didático etc.,
que passaram a incorporar os seus fundamentos teórico-metodológicos.
Entre as propostas curriculares, pela influência que exerceu na elaboração e avaliação
de cursos de Licenciatura em Geografia e em outras documentos curriculares pelo Brasil afora,
destacou-se a da Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (CENP) do Estado de São
Paulo, na década de 1980. Elaborada sob a orientação de professores da USP, ela não se
restringiu em elencar conteúdos, mas efetuou uma revisão metodológica com base nos
fundamentos da Geografia Crítica. Assim, explicitou novas posições teóricas e metodologias
para a compreensão do espaço geográfico que, dialeticamente, buscavam integrar o espaço com
as relações sociais. (PONTUSCHKA, PAGANELLE e CACETE, 2007)
Com a redemocratização, foi elaborada e promulgada a chamada Constituição cidadã
de 1988. Ela acenou com a garantia e a ampliação de direitos à população. Essa conjuntura era
favorável ao forte potencial da Geografia Crítica Escolar para a formação da consciência
sociopolítica do educando, relevante às lutas sociais para transformar os direitos formais,
contidos na lei Magna do país, em direitos reais e concretos. No entanto, essa potencialidade
enfrentou diversos entraves para se concretizar nas práticas pedagógicas dos professores.
Com relação a esses entraves, Oliveira e Farias (2014) destacam que a resistência e a
rejeição de muitos professores aos seus novos conteúdos e as suas novas formas de abordá-los
retardaram a sua afirmação nas escolas. Além disso, esclarecem que, ao se priorizar os aspectos
socioeconômicos da produção/reprodução do espaço, negligenciou-se as bases físico-naturais
sobre as quais, pelo metabolismo do trabalho, dialeticamente, a sociedade atua. Defendem,
ainda, que, ao privilegiar uma visão generalista da totalidade, desconsiderando os espaços de
vivência concreta dos alunos, negou-se que a cidadania pressupõe o lugar. Atestam, também,
que houve dificuldades de se utilizar o método dialético para superar a dicotomia na abordagem
das relações sociedade/natureza, legada da perspectiva positivista da Geografia Escolar
Tradicional.
No tocante à organização do processo pedagógico e das práticas de ensino dos
professores de Geografia em sala de aula nessa perspectiva, outros entraves dificultaram a sua
assimilação nas escolas.
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o que vem solapando direitos estabelecidos e freando o avanço das parcas conquistas sociais,
reafirmando a atrofia dos espaços do cidadão no Brasil.
O receituário neoliberal foi estabelecido para o Brasil e demais países da América Latina
pelo Consenso de Washington, no final dos anos 1980, representando um conjunto de políticas
liberalizantes fixadas por instituições financeiras, com sede na capital dos EUA, como o FMI e
o Banco Mundial. Essas políticas pregavam a privatização, a redução do papel social do Estado
e a sua recaptura pelo capital, produzindo o aumento na concentração de riqueza, crises
econômicas e perda de direitos, portanto, a retração da cidadania em todo o mundo.
Com o neoliberalismo, segundo Chauí (2016), o núcleo da privatização também está em
outro lugar, está na transformação de um direito social em serviço que se compra e vende no
mercado. Por isso, a ideia é a de que um direito social e político é aquilo que pode ser
transformado em serviço e comprado no mercado. Nesse processo, a educação brasileira foi
modificada para contemplar os ditames do mercado, como delegaram o FMI e o Banco
Mundial, a partir do Consenso de Washington.
No campo das ideias, emergiram os paradigmas pós-modernos, pós-estruturalistas e
pós-críticos, que buscaram extirpar, interditar ou imobilizar as teorias críticas no campo do
pensamento. Com eles, passou-se a refutar a totalidade em processo de totalização empírica sob
a égide das contradições inerentes e mundializantes do mercado, com o argumento de que tal
perspectiva encobre o singular, o particular, o diverso e o subjetivo. Nesse processo, as Ciências
Humanas se enveredaram para análises mais finas e de pequenos recortes espaço-temporais,
deram ênfase as questões mais ligadas às subjetividades, identidades e diversidades humanas,
consequentemente, ficaram menos atentas às contradições sociais das sociedades capitalistas
concretas.
Tudo isso rebateu, sobremaneira, na educação em todo o mundo e, no Brasil, em
particular. É nessa perspectiva que podemos compreender a criação da nova LDB (Lei
9.396/1996), os sistemas nacionais de avaliação padronizadas, os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN) etc., instituídos a partir da década de 1990.
Silva (1994), ao analisar a estrutura da reforma da educação brasileira dos anos 90,
afirma que ela, com neoliberalismo, é direcionada à preparação para o trabalho (preparação dos
alunos para a competitividade nacional e internacional) e à transmissão dos ideais que
proclamam as excelências do livre mercado e da livre iniciativa. Por isso, deve estimular o
empreendedorismo, a competição, o mérito, a individualização etc.
Em outras palavras, os objetivos educacionais são redirecionados para a formação do
cidadão produtivo e individualizado. Para atender a esses objetivos, a escola, especialmente a
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pública, deve ser gerida como uma empresa e considerada como o lugar da formação do
trabalhador nas competências e habilidades exigidas pela produção, pelo mercado. Cabe à
escola, também, difundir a ideia da inexorabilidade da história triunfante da sociedade de
mercado e de que cada um é responsável por si, através da difusão do modo de vida inerente à
lógica capitalista. Para Frigotto & Ciavatta (2003, p. 51), essa reforma, “trata-se de uma
cuidadosa elaboração superestrutural e ideológica da forma de representar, falsear e cimentar a
visão unidimensional do capitalismo sobre a realidade econômica, psicossocial, política e
cultural”.
Conforme Tiburi (2016), a instituição escolar associada ao mercado rebaixa a educação
ao comércio de mercadorias. Rebaixa as pessoas a produtores e consumidores que devem
apenas se encaixar em um mercado.
Portanto, a formação desse cidadão produtivo é contrária a do cidadão capaz do
exercício político crítico (FARIAS, 2020), ou seja, de desenvolver uma consciência vigilante e
questionadora das instituições que devem assegurar e ampliar os seus direitos integrais.
Constitui-se, assim, um cidadão parcial, exercendo uma cidadania incompleta.
Por sua vez, os PCN estabeleceram as orientações da estrutura dos currículos que
deveria formar o cidadão produtivo nos Estados e municípios. Para fundamentá-los à luz das
teorias pedagógicas, os seus elaboradores, segundo Saviani (2013), lançaram mão de categorias
educacionais precedentes, às quais se anteciparam prefixos do tipo “pós” ou “neo” para revesti-
las de novidade ou de conceitos tributários de outros campos do saber.
Nesse sentido, o conceito de capital humano, forjado por Teodoro Schultz, da Escola
Neoliberal de Chicago, na década de 1950, foi tomado de empréstimo e se constituiu como a
base dessa reforma educacional. Segundo este conceito, a educação é o principal capital
humano enquanto produtora de capacidade de trabalho, potenciadora do fator trabalho. Assim
sendo, “a escola se encarregaria de preparar a força de trabalho educada em um mercado de
mão de obra em expansão”. Deveria “formar progressivamente o trabalhador para que este fosse
incorporado pelo mercado, tendo em vista assegurar a competitividade das empresas e o
incremento social e da renda individual”. (SAVIANI, op. cit., p. 427)
Por se enquadrarem na concepção de educação nos moldes neoliberais, foram retomadas
as perspectivas pedagógicas pragmáticas coincidentes com a ideia de educação como formadora
do capital humano e com a concepção social neoliberal: neotecnicismo, pedagogia das
competências, neoescolanovismo, neoconstrutivismo e pedagogia corporativa (SAVIANI, op.
cit.). Com esses modelos pedagógicos se buscou instaurar a lógica do cálculo custo/benefício
na educação, os modelos de gestão das escolas inspirados em empresas, as parcerias público-
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dos mais pobres, através das políticas de garantia e ampliação de direitos sociais (algumas
iniciativas de criação de renda, ampliação do acesso à saúde, à educação e à moradia, por
exemplo). Entretanto, o golpe de 2016, com Impeachment fraudulento da presidenta
democraticamente eleita, Dilma Rousseff, inviabilizou a continuidade da montagem do
incipiente espaço do cidadão, realinhando o Brasil ao neoliberalismo radical e aprofundando a
sua transformação em espaço nacional da economia internacional.
Com a ascensão de Michel Temer ao poder, ratifica-se a privatização, a oligopolização
e a financeirização do território nacional, aprofundando a inserção subalterna do Brasil às
correntes da globalização. Por outro lado, retira-se direitos dos trabalhadores (reforma
trabalhista), reduz-se os investimentos públicos em educação, saúde e moradia, promovendo o
desmonte de direitos sociais garantidos pelo Estado. Com isso, presenciamos o fortalecimento
da estrutura estatal para atender aos reclamos das finanças e de outros interesses das elites
econômicas nacional e internacional, em detrimento dos cuidados com as populações
trabalhadoras cuja vida tenderá a se tornar ainda mais difícil.
Foi sob esse governo que tomou forma e foi aprovada a reforma da LDB (Lei
9.396/1996), com a Lei 13.415/2017, que reforça o caráter da educação voltada para a formação
do cidadão produtivo e consumidor, o que ratifica os seus princípios pedagógicos pragmáticos.
De acordo com essa lei, a formação profissional passa a ser um dos itinerários do currículo a
partir do segundo ano do Ensino Médio. Por outro lado, a Geografia e a História, não aparecem
como matérias obrigatórias nos três anos dessa etapa da escolaridade, status reservado apenas
aos componentes curriculares Língua Portuguesa e Matemática. Isso prejudicará a formação
humanista dos filhos dos trabalhadores e, por isso, a construção da sua consciência política
crítica, tão importante para a organização e ação em defesa dos seus direitos civis, políticos e
sociais. Além disso, produzirá um fosso entre a educação ampla dos filhos das elites e a
restritiva dos filhos dos trabalhadores, a quem se destina a formação profissional, configurando
a educação nacional como minimalista, dual e desigual. (FARIAS, 2020)
No conjunto dessas reformas foi aprovada e homologada, em 2018, a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC). Em sua introdução, fica claro que ela objetiva enquadrar a
educação nacional às exigências das avaliações internacionais (PISA) e que seu esteio é o
desenvolvimento de habilidades e competências exigidas pelo mercado, portanto, fundamenta-
se na Pedagogia das Competências.
A BNCC dedicada a Geografia, sem muita clareza, deixa transparecer um certo
ecletismo da sua fundamentação teórica-metodológico, embora evidencie uma certeza, a
Geografia Crítica não aparece nela contemplada. Portanto, as contradições e lutas que
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Com efeito, como assevera Santos (2002b, p. 6), ao tratar da questão da cidadania no
Brasil, “é no território tal como ele atualmente é que a cidadania se dá tal como ela é hoje, isto
é, incompleta. Para ele, “mudanças no uso e na gestão do território se impõem, se quisermos
criar um tipo de cidadania, uma cidadania que se nos ofereça como respeito à cultura e como
busca da liberdade”.
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Esse uso do território no Brasil tem sido seletivo, atendendo aos reclamos do capital
monopolista/oligopolista e das finanças, tanto no campo quanto na cidade. Por trás dessa
seletividade do uso, está a lógica da separação entre os detentores dos meios de produção e da
força laboral, e a divisão social e territorial do trabalho, que produzem/reproduzem as
desigualdades socioespaciais entre os sujeitos, os lugares e as regiões, cujos processos atuais
de privatização, inclusive do território, e a retração dos direitos dos trabalhadores tendem a
torná-las mais profundas, acenado com a continuidade da nossa cidadania incompleta.
Por outro lado, a cidadania pressupõe o lugar, os seus equipamentos para o uso coletivo
ou individual. O tipo de uso pode transformar o direito formal em real ou não. Nesse sentido, o
lugar precisa ser considerado como especificidade da compartimentação espacial da produção
e dos homens, uma particularidade objetiva e concreta da universalidade, mais o lastro da
história das pessoas que nele vivem, o que inclui a identidade e o pertencimento geográficos.
Portanto, não se constitui apenas como produto da percepção individual do sujeito, a qual define
o seu comportamento geográfico, ou como campo exclusivo de significado e de identificação,
como propõem os PCN e a BNCC. A Geografia Escolar precisa retomar essa abordagem, se
pretende fazer o aluno compreender e superar o sentido de mundo imposto pelas engrenagens
da sociedade capitalista. Isso porque “[...] o sentido do mundo está no próprio mundo, ler o
espaço é aprender o seu sentido”. (PEREZ, 2001, p. 108)
Por outro lado, a leitura transformadora do mundo através da Geografia Escolar Crítica,
que pressupõe a leitura do espaço geográfico, dos usos dados ao território, das particularidades
objetivas e concretas dos lugares, dos movimentos históricos superficiais e de fundo que dão
conformação às paisagens, da diversidade regional, não pode ser operacionalizada sem o
domínio de determinados procedimentos metodológicos que são próprios à ciência geográfica,
tais como: observar, descrever, analisar, sintetizar, compreender, explicar e representar
cartograficamente os espaços.
Como na construção dos conceitos geográficos mediadores da leitura geográfica do
mundo pelo educando, tais procedimentos devem ser construídos pelo aluno, auxiliado pelo
professor, tomando os seus lugares como objeto de estudo, o que evidencia a importância da
metodologia do estudo do meio como propositora do próprio currículo.
São essas as habilidades e competências capazes de permitir ao aluno, filho da classe
trabalhadora, construir a sua consciência política, tomar decisões e posicionamentos acerca da
sua realidade social e exercitar a sua cidadania integral, permitindo-lhe, desse modo, agir no
mundo e com o mundo de maneira mais estruturada, elaborada e consciente. Enfim, construir
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o raciocínio geográfico “para saber pensar o espaço e nele saber agir” (LACOSTE, 1997),
condição essencial para o exercício da sua condição cidadã.
Isso é importante para se construir a “revanche dos/nos lugares”, ou seja, organizar as
resistências aos processos de construção da cidadania incompleta dos trabalhadores brasileiros,
pois são neles que se vivenciam as experiências de escassez ou as suas potencialidades. Em
função disso, a sua compreensão instrumentaliza os sujeitos às lutas diárias para participarem
nas decisões que afetam às suas vidas, manterem as suas estratégias produtivas de sobrevivência
e reproduzirem as suas manifestações culturais. Assim sendo, a educação geográfica crítica,
que possibilite a construção de raciocínios geográficos, tem muito a colaborar com o “educar
para que todos tenham condições de se tornar governantes” (GRAMSCI apud PEREZ, 2001,
p. 119), uma vez que pode contribuir para a formação de sujeitos críticos e participativos
das/nas decisões que afetam seus contextos territoriais.
Assim sendo, a cidadania plena implica a organização e a participação política, a
consciência do desempenho do trabalho alienado e da necessidade de superá-lo, a valorização
das diferenças culturais, a prática dos valores democráticos radicais que possibilite a conquista
e ampliação de direitos civis, sociais e políticos, o exercício da liberdade de expressão, entre
outros fatores.
Portanto, “a ideia de cidadania plena está ligada à ideia de indivíduo forte, que se
diferencia da ideia do sujeito [produtor]/consumidor fraco, débil, até mesmo debiloide”
(SANTOS apud PEREZ, 2001, pp. 111-112), que as propostas curriculares oficiais atuais se
propõem a continuar formando.
Nesses termos, o alcance da cidadania plena passa também pelo saber pensar e agir sobre
o espaço geográfico. Uma educação que forme para a conquista dessa condição deve ajudar a
criança e ao jovem a desenvolverem raciocínios geográficos que lhes permitam a atuar
ativamente para a superação da sua incompletude atual. Para isso, deve objetivar uma ampla
transformação social capaz de permitir que a cidadania seja exercida em toda a sua plenitude.
Afinal, como bem enfatizou Santos (2002b), o grande desafio do Brasil atualmente é o de
construí-la para a maioria da sua população.
No entanto, parafraseando Mészarós (2008), as propostas contemporâneas para a
educação no Brasil, implementadas pelo Estado, têm-se limitado a atender às margens
corretivas e interesseiras do capital, o que significa abandonar, de uma só vez, conscientemente
ou não, o objetivo de uma transformação social qualitativa. Desse modo, ainda segundo o
referido autor (op. cit., p, 27), “procurar margens de reforma sistêmica na própria estrutura do
capital é uma contradição em termos”. Por isso, para ele, “é necessário romper com a lógica do
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Considerações finais
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Para superar essa condição e contribuir com a transformação social que permita edificar
a cidadania plena, a educação precisa se fundamentar na filosofia da práxis, portanto, nas
tendências pedagógicas críticas. É com ela que se pode construir a consciência social e política
crítica dos jovens e crianças da classe trabalhadora brasileira, instrumentalizando-os para as
ações organizadas de defesa e ampliação dos seus direitos civis, sociais e políticos.
Na dialogicidade com essa educação geral, a educação geográfica deve se amparar na
Geografia Escolar Crítica. Essa perspectiva geográfica de ensino, pela sua criticidade e
engajamento social e político, possibilita a leitura das contradições do espaço geográfico
elaborado pelas sociedades capitalistas concretas. Por isso, constitui-se em importante
instrumento para a tomada de consciência dessas contradições a partir dos arranjos espaciais,
dos usos dados ao território, das formas desses usos nos lugares. Isso é essencial para a
superação do modelo social brasileiro atual, no qual a cidadania é incompleta e, assim,
organizar as lutas para a edificação da cidadania real, integral, irrestrita e concreta, que deve
incluir mudanças na gestão e no uso do espaço.
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Contexto, 1998 (Coleção Repensando o Ensino).
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(1)
Professor Adjunto do Departamento de Geografia/CERES/CAICÓ, Universidade Federal do Rio Grande
do Norte - UFRN
E-mail: vasconfilho@gmail.com
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Resumo
O trabalho objetiva discutir e refletir sobre o papel, a relevância e as contribuições da geografia de uma maneira
geral, e da geografia crítica de forma particular para a construção do ser social, mais ativo, participativo e
consciente de sua história e do cotidiano vivido nos diferentes espaços que mora e frequenta. Para este feito,
trouxemos à baila algumas breves discussões acerca das mudanças de caráter teórico metodológico que
ocorreram na geografia, evidenciando na contemporaneidade a necessidade de discutir temas e problemas que
façam parte do quadro da história de vida da sociedade, principalmente para os grupos em estado de
vulnerabilidade social. Nesse sentido, a leitura do espaço e da cidade, se torna condição ímpar para entendermos
a teia de relações construídas e impostas para esses grupos, por parte do Estado, do mercado e de suas
representações institucionais. Em um momento posterior, buscamos compreender as relações sociais
construídas pelos indivíduos nos espaços da moradia, da escola e da cidade. Assim, colocamos em pauta e
demos visibilidade, as limitações e até mesmo o impedimento para a construção do processo ensino
aprendizagem de crianças e adolescentes, veiculados por uma forma perversa e desigual da situação de pobreza
vivida por esses indivíduos, mostrando suas consequências na escola.
Palavras-chave
Geografia Crítica, Escola, Cidade
Abstract Resumen
The paper aims to discuss and reflect on the role, Este trabajo pretende discutir y reflexionar sobre el
relevance and contributions of geography in general, papel, la relevancia y las contribuciones de la
and critical geography in particular for the geografía en general, y de la geografía crítica en
construction of social beings, more active, particular a la construcción de seres sociales, más
participatory and aware of their history and daily lives activos, participativos y conscientes de su historia y de
in the different spaces they live and frequent. To this su vida cotidiana en los diferentes espacios que
end, we bring up some brief discussions about the habitan y frecuentan. Para ello, trajimos a colación
theoretical and methodological changes that have algunas breves discusiones sobre los cambios teóricos
occurred in geography, highlighting the contemporary y metodológicos ocurridos en la geografía, destacando
need to discuss issues and problems that are part of the la necesidad contemporánea de discutir temas y
life history of society, especially for groups in a state problemas que forman parte de la historia de vida de
of social vulnerability. In this sense, the reading of the la sociedad, especialmente para los grupos en estado
space and the city becomes a unique condition to de vulnerabilidad social. En este sentido, la lectura del
understand the web of relationships built and imposed espacio y de la ciudad se convierte en una condición
for these groups, by the State, the market and their única para comprender la red de relaciones construidas
institutional representations. At a later stage, we seek e impuestas para estos grupos, por el Estado, el
to understand the social relations built by individuals mercado y sus representaciones institucionales. En un
in the spaces of housing, school and city. Thus, we put momento posterior, buscamos comprender las
on the agenda and gave visibility to the limitations and relaciones sociales que construyen los individuos en
even the impediment to the construction of the los espacios de la vivienda, la escuela y la ciudad. Así,
teaching-learning process of children and adolescents, pusimos a la orden del día y dimos visibilidad, a las
conveyed by a perverse and unequal form of poverty limitaciones e incluso al impedimento de la
experienced by these individuals, showing its construcción del proceso de enseñanza-aprendizaje de
consequences at school. los niños y adolescentes, transmitido por una forma
perversa y desigual de la pobreza vivida por estos
individuos, mostrando sus consecuencias en la
escuela.
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Introdução
O
trabalho objetiva discutir e refletir sobre o papel, a relevância e as
contribuições da geografia de uma maneira geral, e da geografia crítica de
forma particular para a construção do ser social, mais ativo, participativo e
consciente de sua história e do cotidiano vivido nos diferentes espaços que mora e frequenta.
Acreditamos ser pertinente buscar compreender a importância e o papel exercidos pela
Geografia Crítica, tomando como ponto de partida os caminhos seguidos pela Geografia
brasileira, desde sua institucionalização neste país. De antemão, a escolha metodológica pelo
percurso espaço-temporal, não segue a obediência teleológica, pois entendemos que esta é
insuficiente para fundamentar a reflexão que pretendemos fazer acerca da temática em pauta.
A opção teórica metodológica é tomada por uma vertente de pluralidade científica permeada
pela fundamentação do materialismo histórico-dialético do qual a Geografia Crítica se sustenta.
A busca deste conhecimento está pautada em fundamentos teórico-metodológicos de
autores que versam sobre essas distintas temáticas. A exemplo de Cavalcanti (2008), Santos
(1999), Moreira (2009), Gomes (2019), Andrade (1991) e Corrêa (2010), usados
preferencialmente na primeira secção. Já na secção II, buscamos respaldo teórico metodológico
em Harvey (1998), Santos (1999), Soja (1993), Lefebvre (1991) e Vasconcelos Filho (2003).
Por fim, as reflexões que trazem à tona a compreensão das interações e conexões entre o espaço
da moradia e o indivíduo, bem como deste com a escola e a cidade, estão sustentadas em
Bachelar (1989), Cavalcanti (2008) e Kohara (2009).
Na secção I, trouxemos à baila algumas breves discussões acerca das mudanças de
caráter teórico metodológico que ocorreram na geografia, evidenciando na contemporaneidade
a necessidade de discutir temas e problemas que façam parte do quadro da história de vida da
sociedade, principalmente para os grupos em estado de vulnerabilidade social. Nesse sentido, a
leitura do espaço e da cidade, se torna condição ímpar para entendermos a teia de relações
construídas e impostas para esses grupos, por parte do Estado, do mercado e de suas
representações institucionais.
Em um momento posterior, buscamos compreender as relações sociais construídas pelos
indivíduos nos espaços da moradia, da escola e da cidade. Assim, colocamos em pauta e demos
visibilidade, as limitações e até mesmo o impedimento para a construção do processo ensino
aprendizagem de crianças e adolescentes, veiculados por uma forma perversa e desigual da
situação de pobreza vivida por esses indivíduos, mostrando suas consequências na escola. Estes,
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por sua vez, são constantemente submetidos a lógica da exclusão social que tem rebatimentos
e se materializam no ambiente escolar e na vida desses seres sociais. Trouxemos para este feito,
as experiências de professores(as) e todo o corpo pedagógico que lidam diariamente com
problemas gerados por essa castração intelectual dos mais pobres da cidade.
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instituições. E nesta dimensão constatamos relações assimétricas que se impõem sobre o espaço
nacional com reflexos nos espaços regionais e locais de cada parte do Brasil.
Os espaços da gênese da Geografia brasileira estão localizados no sudeste do país, e
estão representados por São Paulo – USP e pela Associação dos Geógrafos Brasileiros – AGB,
ambas criadas em 1934, e no Rio de Janeiro, a então Universidade do Distrito Federal, atual
UFRJ, em 1936. Completando este momento nós temos a fundação do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE, em 1939. Todas elas tiveram a participação de geógrafos
franceses, a exemplo de Francis Ruellan, Pierre Deffontaines e Pierre Monbeig, conforme
apontam Andrade (1991) e Corrêa (2010), afirmando que a geografia brasileira surgiu marcada
e caracterizada eminentemente por um viés Vidaliano, ou seja, permeada pelo
regionalismo/ambientalismo de Paul Vidal de la Blache.
A localização do nascimento da geografia brasileira na região sudestina do país, não
ocorre por acaso, pois é lá também que se forja as bases para a formação da região concentrada,
desde o final do século XIX e início do século XX. Estes espaços representam o poder
econômico – São Paulo e o poder político – Rio de Janeiro. Este último, enquanto representação
política, vigorou até antes da construção de Brasília, no início da década de 1960. Por sua vez,
São Paulo e Rio de Janeiro passam a ser considerados espaços metropolitanos, na década de
1970.
O movimento que culminou com a emergência da geografia crítica dá seus primeiros
sinais a partir da década de 1950, quando já se observava o esmaecimento da geografia
tradicional, e a impossibilidade desta de responder aos questionamentos que se apresentavam
pela sociedade e pela revolução técnica/científica que o mundo assistia. Outras mudanças,
também foram registradas no campo econômico, caracterizadas pela passagem do (capitalismo
concorrencial -capitalismo monopolista). Tudo isto colaborou para uma nova roupagem da
geografia e uma renovação do debate no campo metodológico e teórico.
Trazendo esta discussão de forma mais particularizada para o Estado brasileiro, cumpre
mencionar que a geografia brasileira, a partir da década de 1970, tendo como marco o
emblemático encontro de geógrafos, ocorrido em 1978, onde os autores que trabalham com a
história do pensamento geográfico afirmam, ser este momento crucial para entendermos os
novos papéis, uma nova forma de pensar e entender o espaço e o homem em seu contexto social
e histórico. Neste período, Santos lança em 1978 o livro: por uma geografia nova: da crítica da
geografia a uma geografia crítica. Onde novas percepções sobre o espaço geográfico são
lançadas no sentido de dar visibilidade a capacidade da geografia de questionar o status quo
vigente.
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Pensamos que esta época foi a mais representativa no sentido de percebermos que a
geografia passa a assimilar e abrigar de forma mais densa e coerente uma preocupação com a
sociedade, ao tempo, que traz à tona, sérias críticas ao modo de produção capitalista,
questionando a forma de agir dentro do espaço nacional e fora dele também. Esta virada do
pensamento geográfico na década de 1970, é um momento em que emerge a necessidade de
pensarmos criticamente o modelo capitalista de sociedade e de Estado que se impõe no e ao
Brasil.
Não havia condições, diante do cenário de mudanças, nos campos já mencionados, em
continuarmos com uma geografia tradicional/clássica, indiferente aos problemas sociais,
econômicos, políticos e culturais que se avolumavam e continuam a crescer cotidianamente no
território nacional. Era e é uma condição de sobrevivência e de permanência da ciência cumprir
este novo papel de dar respostas coerentes e plausíveis para uma gama de questionamentos e
de um corolário de problemas que passaram a ser registrados em diferentes regiões, estados e
cidades deste país.
Não cabia mais termos uma geografia inerte a um quadro de deterioração social e
econômica, concretizados, por exemplo, em nossas cidades, logo após um longo período de
apropriação/negação dos direitos civis, instituídos por uma perversa forma de governar,
representada e marcada por um caráter neoliberal e que no momento contemporâneo assumiu a
configuração ultra neoliberal.
Mas isto não começa agora, a ditadura militar deixara uma cicatriz profunda no seio da
sociedade brasileira. Era preciso então apresentar caminhos para a superação da crise. Estas
possibilidades de superação requisitavam teorias e métodos alicerçados e legitimados por um
caráter científico, que a um tempo desse visibilidade e questionasse a realidade social
pauperizada vivida por milhões de brasileiros.
Nesse sentido, a geografia apresentou-se mais que uma necessidade, ela se tornou uma
condição para pensarmos na construção de um modelo mais justo de desenvolvimento da nação.
Mas para contribuir com a sociedade brasileira, ela mesma – a geografia, tinha que superar seus
problemas internos, daí que o surgimento desta geografia comungada com os anseios da
sociedade, era mais que urgente. Sua proposta caminha para a desalienação do espaço e da
sociedade e dar luz a uma plena e necessária construção cidadã.
A necessidade de se construir uma sociedade e nela indivíduos que se perceba, que se
entenda no que diz respeito a está inserido numa dada classe social, entendendo os porquês da
contradição dialética pobreza/riqueza e nos caminhos necessários a esta superação, perpassa
pelo entendimento dos seus direitos e deveres, alicerçados na construção sociopolítica crítica
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de cada ator social. Não se constrói cidadania sem ter a percepção da garantia dos direitos aos
atores sociais, a exemplo do direito a educação pública e gratuita e direito à moradia, em um
ambiente adequado as necessidades destes indivíduos.
Há uma clara necessidade de afirmar que direitos não são negociáveis, eles são o que a
palavra etimologicamente os define. Portanto, não se deve associá-los a lógica capitalista que
o transforma em um bem, e sendo assim, gerador de lucro. Assim, a educação tem sido tratada
como um bem, e não como um direito, assim também a moradia, que é um direito à vida, e não
um bem forjado na filosofia capitalista.
Para dar visibilidade e fundamento a esta maneira de pensar era e é preciso desconstruir
as verdades postas e impostas, e para isto, se fazia necessário um pensamento crítico que
pudesse apresentar uma visão de espaço, sem nebulosidades. Neste interim, a geografia passa
também a perceber a necessidade de compreender o Estado, suas variantes e extensões.
Pois construir um pensamento crítico e consciente requer também fundamentos
científicos e filosóficos que deem respaldo para a transformação social que já se tornava urgente
dentro do território nacional. Foi aí que a geografia com a perspectiva e a proposta da geografia
crítica se fez presente como um dos caminhos de atenuação e superação das diversas crises
historicamente construídas e determinadas no Brasil.
Esta forma de fazer geografia fez com que esta ciência capacitasse os indivíduos para
que os mesmos pudessem externar suas inquietações e insatisfações com o modelo de Estado,
de governança e das políticas econômicas que se instalavam no país, apontando para a
possibilidade da formação de uma consciência cidadã. De certa forma, isto surtiu efeito, ainda
que não alcançou a magnitude desejada e necessária aos reclames sociais. Nesta perspectiva a
escola passou a ser o locus por excelência de aprendizagem, de construção de saberes que
viessem a contribuir com a construção de atores mais sensíveis a causas sociais.
Como desdobramento deste imperativo, percebeu-se a necessidade de mudar os
conteúdos dos livros didáticos de geografia, no sentido de inserir temas que versassem sobre a
problemática social. Ainda que isto tenha ocorrido muito tempo depois, é também reflexo desta
nova forma de construção do conhecimento geográfico. Saímos de uma geografia mnemônica
para uma geografia que despertava reflexões e questionamentos sobre as diferentes formas de
produzir, usar e morar na cidade e também no campo.
Todas estas mudanças estão permeadas pelo uso e entendimento do método dialético,
que se abre para questionamentos e nos ensina sair da situação de conformismo e aceitação
daquilo que nos apresenta enquanto verdade absoluta. Aprendemos que as verdades absolutas
são dogmas, travestidos de uma condição de submissão e de controle de um indivíduo sobre
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outro, de um grupo social sobre outro e de uma nação sobre outra. E nesta trajetória, passamos
a compreender dialeticamente o espaço, a cidade, o território, o lugar, a paisagem a região.
Por seu turno, a escola passou a ser também o espaço de discussões, reflexões e
questionamentos sobre a participação/inserção dos grupos em estágio de vulnerabilidade social
nos debates que versam sobre a produção e organização da cidade e da moradia, e como estes
espaços importam para a formação desses atores, uma vez que estes, são espaços de vivências
cotidianas.
Procuramos ler o espaço pelas lentes de uma geografia que segue um método que nos
faz rever nossa própria história, assim como nossas vidas cotidianas. Daí era e é necessário
procurarmos entender as contradições sociais no espaço. Mas ao lado disto buscamos refletir e
compreender como tais contradições surgem, como elas são forjadas e o porquê de sua
existência e permanência. Isto se traduz em uma outra prática que surge na geografia, saímos
do conhecimento amplo, generalista e enciclopédico, para nos determos a um aprofundamento,
uma verticalização da produção do conhecimento científico.
Pois esta nova forma de construir o conhecimento geográfico se traduziu como mais
seguro e mais coerente na perspectiva de entendermos a problemática social, e ao lado desta, a
política e a economia. Mais uma vez, o espaço escolar se tornou uma referência para construção
de saberes mais comprometidos com a sociedade e menos com o mercado. Este espaço também
se transformou em um ambiente de resistência a todas as formas de maquinações sinistras,
criadas por formas de governos e de representações sociais que trabalham insistentemente para
manter este quadro deteriorado da vida social.
Para tanto, diria que a Geografia Crítica não é apenas uma escolha, mas antes de tudo
uma necessidade, principalmente considerando uma nação em franco processo de deterioração
de suas instituições e representações sociais, constatados na contemporaneidade. Hoje, mais do
que em tempos pretéritos, comungar dos princípios dessa Geografia é condição si ne qua non,
para construirmos outro modelo de pensarmos a Escola, a moradia, a cidade, o Estado, a
Sociedade e o mercado. Este último, se impõe com tamanha força destruidora, em nome do
lucro. Este que transformou a casa, em um produto e mercadoria caros. Este que provocou a
mutação do sentido e do significado da cidade, de obra para produto do capital, como afirma
Lefebvre (1991).
Mas em contrapartida, em tempos de desprezo e negação à ciência, a Escola é a
instituição que mais sofre ataques, e por que não dizer a que foi mais vilipendiada, vandalizada,
extirpada em suas funções. A Escola enquanto instituição social, passou a ser vista como vilã e
não como aliada da sociedade. E para aumentar ainda mais esta contradição, o governo e o
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questionar sua construção social, uma vez que os conteúdos específicos dos componentes
curriculares como Geografia, História, Sociologia e Filosofia, deixam de existir no novo ensino
médio, pois que perderam a obrigatoriedade, como já apontado.
Na contemporaneidade do Estado brasileiro, as ciências humanas são alcunhadas de ser
criadoras de ideologias que afrontam a segurança nacional, pois é, temos que conviver com esta
aberração de um pensar completamente desprovido de legitimidade científica ou filosófica.
Diante do quadro de deterioração do Estado brasileiro, de suas instituições, das representações
sociais e dos programas que dão um certo alento aos mais vulneráveis, assistimos um certo
esmaecimento de se fazer uma Geografia Crítica e de se construir uma crítica ao esmaecimento
acadêmico, escolar e do conhecimento geográfico com esta perspectiva crítica.
Hoje há evidências cada vez maiores, mais nítidas de uma produção acadêmica
geográfica utilitarista, pragmática. Esta modalidade é sedenta em dar respostas ao mercado e
ao modelo de Estado, a um tempo. É uma geografia de caráter produtivista, numa espécie de
fordismo acadêmico, menos científico, menos social, menos filosófico. Muito mais
mercadológico, estatal-privatista, submisso e de uma forte tendência a subalternidade aos
grupos corporativos internacionais. É uma Geografia de caráter simplista, amedrontada, por
fantasmas do passado, do presente e do que está por vir. Ávida por obedecer e cumprir com
eficácia os designíos de um modelo de mercado, que não se furta em atentar contra a vida das
pessoas, mas também atenta e destrói o patrimônio natural, histórico e cultural.
As demandas do mercado e do Estado, ao que parecem, seguem uma lógica de
negligência e desprezo as demandas sociais. Esta discussão tem se tornado, nas vozes de alguns
que estão na geografia, enfadonho. Pois que, se perguntam “para que trabalhar com este tema
de pobreza urbana”, por exemplo, se isto já se tornou “batido”, repetitivo? Estes não se
percebem que há uma grande contradição no momento em que compreendemos que não se
cansa e não se torna enfadonho ou repetitivo trabalhar numa perspectiva conformista e alienante
do espaço geográfico que se constrói a cada dia, legitimando uma paisagem que se mostra
moribunda em nossas cidades.
Este fazer geográfico, cooptado por forças do mercado, está fundamentado, legitimado
e enraizado na premissa da supremacia do fazer sobre o pensar. Além desta premissa
mercadológica, como dito, o Estado brasileiro mudou o sistema de ensino e estabeleceu como
praticamente desnecessário a presença das ciências humanas nos currículos escolares. Desde
2018 que componentes curriculares a exemplo da História, Geografia e Sociologia não são mais
obrigatórios. Em outras palavras, áreas que contribuem para a formação cidadã, não tem mais
sentido nesta forma de governo e de Estado de caráter ultra neoliberal.
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das interações e conexões entre o espaço da moradia e o indivíduo, bem como deste com a
escola e a cidade, estão sustentadas em Bachelar (1989), Cavalcanti (2008) e Kohara (2009).
Para Harvey (1998), as ideias diferenciadas de tempo e espaço que os indivíduos são
submetidos, relacionam-se fundamentalmente ao modo de produção vivido, bem como à
sociedade ou ao grupo social em que estão inseridos. Para este autor, o espaço e o tempo se
constituem como categorias fundamentais para a existência humana, posto que, a maneira como
tratamos o espaço e o tempo na teoria é tão relevante pois influência nas concepções,
interpretações e atitudes que construímos em relação ao mundo.
Soja (1993), mostra a importância do espaço para vida social no momento em que critica
o historicismo exacerbado que negligenciou o espaço e deu prioridade ao tempo, como se este
último bastasse para compreendermos com mais lucidez a sociedade contemporânea.
Entretanto, este autor esclarece que não se pretende substituir o tempo pelo espaço, e sim
compreender a sociedade numa perspectiva mais profícua e aglutinada de espaço-tempo para
isto ele entende que: “A desconstrução espacial, por conseguinte, também deve ser
suficientemente flexível para aparar os golpes reacionários do historicismo e evitar a defesa
simplista da anti-história, ou pior ainda, de um espacialismo novo e obscurecedor [...]” (SOJA,
1993, apud VASCONCELOS FILHO, 2003, p.20)
Em Santos (1999), encontramos uma ideia de espaço que lembra aos indivíduos que esta
categoria é construída num ambiente de coletividade e como tal deve trazer em sua essência
esta prática coletiva, no momento que associamos a cidade, como um bem de uso coletivo. A
percepção de Santos (1999), fala ainda de solidariedade, interconexão, contradições e fluidez.
Estes parâmetros se fossem concretizados para o bem comum, o espaço não seria pensado e
apropriado numa lógica de classe social, como foi e continua a ser na contemporaneidade. Daí
este autor pensa o espaço como “um conjunto indissociável, solidário e contraditório de
sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como um quadro
único no qual a história se dá (SANTOS, 1999, p.51)
Ao falar da cidade como uma construção humana Lefebvre (1991) chama a atenção para
a necessidade da formação de um novo homem, de um novo indivíduo que tem a capacidade
de participar ativamente da construção de sua própria história e de questionar o status quo ao
qual foi submetido. Este novo homem, considerado por Lefebvre (1991), é um sujeito ativo,
pensante e conhecedor de sua própria realidade. É este que compõe a classe operária, é este
também que não se cala e que percebe que o sujeito e o objeto da reflexão social devem estar
sempre presentes.
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Para este intento, Vasconcelos Filho (2013) lembra que nessa conjunção de reflexão sob
a ação, as ideologias e seus comandos, torna-se imperativo a evidência do sujeito. É este quem
vai atribuir vida a dinâmica dos grupos sociais e de suas lutas que transformam ou almejam
transformar o espaço e o tempo da vida social e, por conseguinte, da cidade como um todo. É
por este viés que surgem os direitos, ou seja, pelas lutas, pelas conquistas. Habituou-se o
indivíduo a assistir essas práticas sociais. Desde as reivindicações trabalhistas, por melhores
condições no espaço laboral, as questões salariais, ou outros reclames que almejam na cidade e
na vida cotidiana, a conquista sempre veio pela luta, pela insatisfação, pelo questionamento,
pelo inconformismo coletivo.
Em outra vertente, mas não menos importante, pois se trata de refletir sobre a
importância do ambiente da moradia para o ser social, Gaston Bachelard (1989) em “a poética
do espaço”, nos recorda que a casa é o ambiente onde se forja os primeiros degraus de nossas
memórias. De antemão, quero deixar claro que estou recorrendo a Bachelar (1989), não por
uma visão romântica ou mesmo recheada de devaneios, mas sim para fundamentar que a casa
é este espaço da gênese de nossas memórias, onde construímos também aquilo que seremos ou
o que almejamos ser. Tais memórias, regra geral, são preconizadas por relações e situações
harmônicas ou não. Dessa forma a casa pode ser sinônimo de abrigo, proteção e aconchego ou
apenas um espaço para moradia.
Bachelard (1989), preocupa-se em demonstrar a importância da casa para a vida do ser
social, ele mostra o sentido original da moradia, seu papel, suas funções, suas atribuições, suas
representatividades para o indivíduo. As mutações no sentido da existência e do uso, as
transformações que a corrompem são efetivadas pelo homem, pelo mercado, pelo Estado, mas
ela em si, não é mercadoria, e sim um espaço que dá possibilidade a uma existência humana
com mais dignidade, era e é para isto que ela existe. A casa é também o espaço de formação do
caráter do indivíduo, é a representatividade do abrigo, do ambiente que protege, ao menos no
sentido e na concepção original da moradia.
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é nosso canto do mundo. Ela é, como se diz frequentemente, nosso primeiro universo”.
(BACHELARD, 1989, p.17)
A casa não é um espaço apenas relacionado a importância na participação da construção
do ser social, ela é acima de tudo necessário a esta construção, mas também necessário a
existência no sentido biológico do termo. O indivíduo em toda a sua trajetória através do espaço
e do tempo, sempre necessitou de um abrigo para se proteger, para se sentir mais seguro, para
de fato viver.
No momento contemporâneo esta condição dada à moradia, continua plena, embora seu
acesso, ou os meios para adquiri-la tenha se modificado e tornado mais difícil a realização deste
direito, o direito de morar e viver com dignidade para aqueles que se encontram em situação de
vulnerabilidade social. São os mais carentes, os mais pobres, os que se inserem a margem do
circuito produtivo, ou os que estão inseridos de forma debilitada neste circuito, que este direito
é negado.
Em uma outra vertente, trazemos a discussão sobre a relação entre o espaço da moradia
e a vida escolar dos alunos pobres que vivem em espaços socialmente e ambientalmente
vulneráveis. O espaço em que convivemos sempre exerceu influência no cotidiano das pessoas
e nas crianças, esta relação ganha uma outra dimensão. Na reflexão de Lima (1989, p.14) apud
Kohara (2009, p.102) “As casas, os caminhos, as cidades são espaços da criança que
transcendem as suas dimensões físicas e se transformam nos entes e locais de alegria, de medo,
de segurança, de curiosidade, de descoberta”
Esta afirmativa sobre a importância do espaço para a vida das crianças é encontrada em
Kohara (2009), quando este autor compara o nível de percepção das crianças de acordo com os
espaços de moradia. Esta pesquisa investigava a percepção que a criança tinha do seu próprio
corpo através do espelho, para isto fez-se uma marca de batom na face das crianças com intuito
de perceber se elas identificavam e reagiam a esta marca. A percepção desta mudança em seu
corpo apresentou variações de acordo com os três espaços distintos pesquisados: cortiços,
favelas e apartamentos. Das crianças moradoras de cortiços, apenas 18%, perceberam esta
marca e reagiram a ela, nas favelas este percentual aumentou para 55% e nos apartamentos, o
percentual de crianças que identificaram e regiram a esta marca chega 88%. A partir desta
informação, deduz-se que os espaços de moradia exercem influência sobre a possibilidade
cognitiva do indivíduo.
Fazendo uma reflexão sobre as condições da moradia, o espaço desta moradia e suas
repercussões para a vida escolar no sentido cognitivo de crianças e adolescentes, Kohara (2009),
em pesquisa realizada com crianças pobres da cidade de São Paulo, aponta que 48% das
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construção espacial como uma condição para uma vida cotidiana mais ativa e participativa, em
outras palavras, seria construir a sua própria história. “A tarefa da escola é justamente propiciar
elementos, por meio do ensino de diferentes conteúdos, especialmente os de geografia, para que
os alunos possam fazer um elo” entre o cotidiano vivido em seu lugar e o cotidiano observado
no mundo.
A autora fala da importância e da necessidade de aprender a ler o espaço pelas lentes da
Geografia. A leitura do espaço e da cidade conduz para uma reflexão, segundo Cavalcanti
(2008), no sentido de perceber que esta cidade pode vir a ser educadora. O reconhecimento por
parte do aluno, de entender que ele é excluído e por que se encontra em estado de exclusão, faz
parte do arcabouço intelectual que a geografia pode oferecer. A percepção de como
historicamente o espaço vem sendo reproduzido segundo as contradições inerentes ao modo de
produção capitalista e compreender como se dará a luta pela transformação social, de fato faz
da cidade um grande laboratório de aprendizagem e experiências sociais. Para que isto se realize
é fundamental o conhecimento oferecido pela geografia, principalmente pelo olhar da geografia
crítica, pois esta no ensina de antemão, ser uma ciência que se traduz numa prática social
libertadora.
Não por acaso a autora escreve que “a geografia coloca para o habitante da cidade
conhecimentos indispensáveis aos que querem agir sobre ela, com consciência de seus direitos
e deveres.” (CAVALCANTI, 2008, p. 152) Seguindo nesta perspectiva, ela faz uma crítica aos
currículos escolares que não incluem o estudo da cidade e de cidade. É preciso que desde o
cedo a criança e o adolescente aprendam sobre os espaços que vivem, moram, estudam, se
relacionam, brincam, passeiam e transitam. Aqui se incluem diversos espaços que estão
presentes no cotidiano do ser social.
Considerações finais
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um grupo político ou econômico. Ela é antes de tudo um espaço coletivo, pertencente a uma
coletividade. Um lugar que a solidariedade deve fazer morada e a individualidade,
competividade, nos moldes do capital monopolista deve ser banida, pois este criou a cidade
com um aspecto doentio, torpe, tacanho, perverso, violento e seletivo, onde a condição do
direito à terra e à moradia, está submetido a alma capitalista de poder pagar por elas.
Neste intento, a geografia e com ela a geografia crítica, vem cumprir relevante papel
formador do cidadão, no momento em que ela arranca as máscaras que ocultam e ensombrecem
a verdade, a realidade social de cada um e de todos, ao mesmo tempo. Não à toa, esta geografia
que conscientiza, muito mais que quantifica, vem para desmanchar consensos, desconstruir
verdades estabelecidas e que foram sedimentadas no consciente das pessoas mais pobres. Pois
a pobreza em tempos contemporâneos é tratada não como um problema social, gerado pela
sanha capitalista por lucros e pela própria estrutura fundante do modo de produção vigente, mas
como uma condição inerente a natureza humana.
A pobreza urbana, por sua vez, foi naturalizada pela Escola de Chicago. Esta
naturalização não acabou, ela é tratada agora com a nomenclatura de meritocracia. Há méritos,
para aqueles que moram em áreas nobres. Na verdade, o mérito só funciona com igualdade de
oportunidade, seja em qualquer situação ao qual o indivíduo é submetido. O status quo urbano,
de moradia e escolar aos quais as pessoas mais pobres são submetidas, desfaz e desmascara a
falácia do mérito. E nesta seara não podemos dissociar a qualidade do ensino, a construção
intelectual, a inserção cognitiva, o processo ensino aprendizagem que se constata nas escolas
públicas, deste país, essencialmente nas periferias urbanas, da situação de pobreza que o
mercado e o Estado brasileiro impõem a este segmento social.
Não é por acaso, que vimos a aprovação em ritmo galopante da Lei 13.415/2017, por
parte dos algozes da educação e do povo mais pobre no Brasil. A rapinagem a qual este país foi
e está sendo submetido é mais fácil ser executada quando o povo não consegue fazer uma leitura
crítica e consciente da sua realidade social e do seu próprio país. Suprimir, eliminar as áreas do
conhecimento que formam um cidadão, é um golpe que tem um alcance ainda mais profundo,
diria ainda mais perverso, ele corta na raiz a possibilidade da construção de indivíduos mais
conscientes e preconiza o surgimento de uma geração do “fazer”, sem pensar. Mas não apenas
isto, uma geração destituída de direitos, uma vez, que as reformas impostas pelo Estado
brasileiro, minou nas bases o que poderíamos chamar de o direito a ter direitos.
Portanto, fazer geografia, ou qualquer outra área das humanidades tornou-se uma
espécie de ameaça a segurança nacional, pois essas foram acusadas de formadoras de ideologias
que vão de encontro aos interesses da nação, daí se fez necessário tirá-las da obrigatoriedade
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dos currículos no chamado novo ensino médio. Ao final, não estamos produzindo apenas uma
geração de alienados de sua realidade social, mas uma legião de despossuídos, na mais ampla
acepção da palavra, que se soma a um outro fato bastante contemporâneo, que ao nosso ver,
está representada por uma espécie de auto destruição social, pela inversão de valores que
percebemos, onde os mais pobres se voltam e atentam contra eles mesmos.
Referências
SANTOS, M. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec,
1999.
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(1)
Professora da Secretaria Estadual de Educação do Estado do Pará, Mestranda em Currículo e Gestão
da Escola Básica pelo Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica da
Universidade Federal do Pará (UFPA), ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9140-2202.
E-mail: elanygeo@gmail.com
(2)
Professor Titular da Universidade Federal do Pará, exercendo atividades no Programa de Pós-
Graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica (Mestrado) e no Programa de Pós-Graduação em
Educação na Amazônia (Doutorado). Diretor Geral do Núcleo de Estudos Transdisciplinares em Educação
Básica da UFPA, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6264-5387.
E-mail: genylton@gmail.com
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Resumo
O objetivo desse trabalho é apresentar uma discussão teórica sobre o ensino da disciplina geografia na educação
básica, trazendo para a centralidade do debate as proposições postas pelos defensores da cidade educadora
enquanto perspectiva de seleção, organização e construção do conhecimento a ser trabalhado nas aulas. Partimos
da contextualização do conceito de cidade educadora, destacando seus princípios e levantando reflexões sobre
as potencialidades da adoção desta perspectiva para o ensino da geografia escolar. A pesquisa bibliográfica que
resultou na escrita deste artigo selecionou os textos de Cabezudo (2004), Gadotti (2006), Gatotti e Padilha
(2004), Brada e Rios (2004) e Freire (2018) que foram analisados e cujos resultados são aqui discutidos.
Conclui-se que a perspectiva da cidade educadora apresenta grande potencialidade para promover a oxigenação
do ensino de geografia na educação básica, pois os princípios educativos contidos na concepção de cidade
educadora possibilitam o redescobrimento da cidade e a ampliação da noção de espaço de aprendizado ao tomar
a cidade em sua totalidade como um espaço educativo.
Palavras-chave
Geografia Escolar; Ensino de Geografia; Educação Básica; Cidade Educadora.
Abstract Resumen
The objective of this work is to present a theoretical El objetivo de este trabajo es presentar una discusión
discussion on the teaching of the geography discipline teórica sobre la enseñanza de la disciplina de la
in basic education, bringing to the center of the debate geografía en la educación básica, llevando al centro
the propositions put forward by the defenders of the del debate las propuestas planteadas por los defensores
educating city as a perspective of selection, de la ciudad educadora como una perspectiva de
organization and construction of the knowledge to be selección, organización y construcción del
worked on in the classes. We start from the conocimiento a trabajar en las clases. Partimos de la
contextualization of the concept of an educating city, contextualización del concepto de ciudad educadora,
highlighting its principles and raising reflections on destacando sus principios y planteando reflexiones
the potential of adopting this perspective for the sobre el potencial de adoptar esta perspectiva para la
teaching of school geography. The bibliographic enseñanza de la geografía escolar. La investigación
research that resulted in the writing of this article bibliográfica que resultó en la redacción de este
selected the texts by Cabezudo (2004), Gadotti (2006), artículo seleccionó los textos de Cabezudo (2004),
Gatotti and Padilha (2004), Brada and Rios (2004) and Gadotti (2006), Gatotti y Padilha (2004), Brada y Rios
Freire (2018) that were analyzed and whose results are (2004) y Freire (2018) que fueron analizados y cuyos
discussed here . It is concluded that the perspective of resultados se discuten aquí. Se concluye que la
the educating city has great potential to promote the perspectiva de ciudad educadora tiene un gran
oxygenation of the teaching of geography in basic potencial para promover la oxigenación de la
education, since the educational principles contained enseñanza de la geografía en la educación básica, ya
in the concept of an educating city enable the que los principios educativos contenidos en el
rediscovery of the city and the expansion of the notion concepto de ciudad educadora posibilitan el
of learning space when taking the city in its entirety as redescubrimiento de la ciudad y la expansión de la
an educational space. noción de espacio de aprendizaje al tomar la ciudad en
su totalidad como espacio educativo.
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Introdução
E
ste artigo tem como objetivo apresentar uma discussão teórica sobre o ensino da
disciplina geografia na educação básica sob a perspectiva dos princípios educativos
da cidade educadora, enfatizando as potencialidades desses princípios como
possibilidade de mudanças qualitativas no ensino da geografia escolar. Para tanto, partimos da
contextualização do conceito de cidade educadora, destacando seus princípios e levantando
reflexões sobre as potencialidades da adoção desta perspectiva para o ensino da geografia
escolar. A revisão de literatura realizada selecionou para a fundamentação teórica desse estudo
textos de Cabezudo (2004), Gadotti (2006), Gatotti e Padilha (2004), Brada e Rios (2004) e
Freire (2018) que foram analisados e cujos resultados são aqui discutidos.
É neste contexto, que o presente trabalho busca repensar o ensino da geografia na
educação básica na perspectiva da cidade educadora, por compreender que essa concepção
possibilita uma maior apreensão dos conteúdos geográficos ao identificá-los e analisá-los na
apreensão do espaço da cidade.
Segundo Moraes (1999), a geografia tradicional teve seus fundamentos alicerçados nas
ideias positivistas de Augusto Comte, que influenciaram efetivamente essa ciência e
contribuíram para legitimar o conhecimento científico nessa área. Para tanto, a geografia
tradicional adotou o método científico desenvolvido através da observação, da descrição e da
classificação dos fatos, restringindo-se aos aspectos visíveis e mensuráveis do estudo. Dentre
as abordagens tradicionais destacam-se: o determinismo geográfico, fundamentado no
pensamento de Friedrich Ratzel e o possibilíssimo, teorizado por Vidal de La Blache.
Ainda, conforme Moraes (1999) a teoria evolucionista de Darwin serviu de inspiração
para Ratzel desenvolver as ideias da corrente determinista, baseada na concepção de que a
natureza determina a ação do homem. Assim, Ratzel criou o conceito de espaço vital,
argumentando que o as condições ambientais influenciavam no desenvolvimento do homem,
sendo necessária uma proporção de equilíbrio entre a população de um determinado local e os
recursos naturais para suprir as necessidades. Em caso contrário, se o território não fosse
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suficiente para suprir às necessidades dessa sociedade a solução seria apropriar-se de novos
territórios. Tal concepção foi fundamental aos projetos imperialistas do Estado Alemão.
A corrente possibilista teve como principal expoente Paul Vidal de La Blache, defendia
que o homem é quem modifica o meio, por meio da adaptação e transformação de natureza,
criando hábitos que lhes permitem utilizar os recursos disponíveis. “A este, conjunto de técnicas
e costumes, construído e passado socialmente denominou ‘gênero de vida’” (MORAES, 1999,
p.68), enfatizando a existência de uma relação de equilíbrio entre a população e os recursos.
Verifica-se que o positivismo presente nessas correntes vai repercutir no ensino da
geografia, consolidando um estudo meramente descritivo das paisagens naturais e
humanizadas, sem estabelecer relações entre elas. Assim, a concepção positivista de
conhecimento baseado na neutralidade científica, com o predomínio do empirismo como
procedimento de descrição da realidade, era materializada na geografia, que não se preocupava
com a análise das relações sociais, mas, sim, com o estudo dos aspectos visíveis e dos
fenômenos mensuráveis.
De acordo com Moraes (1999), também os procedimentos didáticos baseavam-se na
memorização e na descrição dos elementos e conceitos que compõem a disciplina. No ensino
de geografia os alunos eram orientados a descrever, relacionar os fatos naturais e sociais, fazer
analogias entre eles e elaborar suas generalizações ou sínteses. A explicação era baseada apenas
na leitura superficial dos fenômenos, no intuito de promover o ensino de uma geografia neutra,
evitava-se qualquer forma de compreensão ou subjetividade que confundisse o observador com
o objeto de análise.
A descrição, a enumeração e classificação dos fatos referentes ao espaço são
momentos de sua apreensão, mas a Geografia Tradicional se limitou a eles;
como se eles cumprissem toda a tarefa de um trabalho científico. E, desta
forma, comprometeu estes próprios procedimentos, ora fazendo relações entre
elementos de qualidade distinta, ora ignorando mediações e grandezas entre
processos, ora formulando juízos genéricos apressados. E sempre concluindo
com a elaboração de tipos formais, a-históricos, e, enquanto tais, abstratos
(sem correspondência com os fatos concretos). Assim, a unidade do
pensamento geográfico tradicional adviria do fundamento comum tomado ao
Positivismo, manifesto numa postura geral, profundamente empirista e
naturalista (MORAES, 1999, p. 22)
específico para a sociedade moderna, qual seja o de algo que não era mais pura contemplação
do universo, mas algo que, em primeiro lugar, vinha sendo instrumentalizado pelos homens.
Fundamenta-se, assim, o caráter descritivo da geografia que vai impactar negativamente no
ensino dessa disciplina.
Esse ensino positivista, por vezes enciclopedista, acabava por impor aos educandos um
ensino baseado na descrição e na memorização de determinados elementos referentes a
geografia, tais como clima, relevo, vegetação, população etc. Assim, o homem era
compreendido como meramente um elemento natural, sem que fosse analisada o seu papel
histórico-social, daí a dificuldade de associar o que se era apreendida nas aulas de geografia a
realidade do educando. Neste contexto, segundo Vlach (1991)
O conceito de educação bancária que Paulo Freire trabalhou está fortemente presente
nessa forma de ensinar, onde as relações entre professor/aluno se dão de forma vertical,
consequentemente somente o professor detém o conhecimento e o aluno está apto para receber
as informações sem dialogar, mantendo-se neutro na construção de ideias. Esses procedimentos
utilizados no ensino, onde o professor é um ser ativo e o aluno passivo, onde as relações
comunicativas horizontais se encontram ausentes, está fortemente presente nessa Geografia
Tradicional.
Dessa maneira, a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos
são os depositários e o educador o depositante. Em lugar de comunicar-se, o
educador faz comunicados e depósitos que os educandos, meras incidências,
recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a concepção bancária
da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é
a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los. (FREIRE, 2018, p. 80)
Pensamos que nos anos 70 ficavam cada vez mais nítidas, em todos os níveis
as mudanças tecnológicas iniciadas após a Segunda Guerra Mundial. O mundo
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Enquanto disciplina escolar, a geografia assume uma nova perspectiva, estando muito
mais comprometida com a compreensão das diferentes dinâmicas de produção do espaço. Como
bem argumenta Santos
Aos poucos, a geografia crítica foi inserida no contexto escolar, porém os discursos de
renovação não conseguiram ultrapassar o caráter ideológico, contribuindo para a manutenção
dos princípios da geografia tradicional nas práticas docentes e nos conteúdos dos livros
didáticos. Assim, nas escolas a renovação trazida pela geografia crítica não promoveu
mudanças amplamente significativas.
Mesmo diante de todo esse movimento de renovação da geografia que ocorreu nas
últimas décadas, ainda é muito presente na prática de ensino dos professores de geografia bem
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como nos aspectos pedagógicos, didáticos e teóricos das propostas de ensino dessa disciplina,
elementos do ensino de geografia na abordagem tradicional, uma vez que, a relação de ensino
aprendizagem, continua adotando práticas que reproduzem a reprodução do conhecimento
considerado o correto, sem contribuir para o desenvolvimento crítico do aluno.
O ensino exclusivamente verbalista, a mera transmissão de informação, a
aprendizagem entendida como acumulação de conhecimentos não subsistem
mais. É preciso que o professor medeia a relação ativa do aluno com a matéria,
levando em conta as experiências e os significados que os alunos trazem para
sala de aula, o potencial cognitivo, capacidades, interesses, modo de pensar e
de trabalhar. (LIBÂNEO, 2008, p.30)
Tal realidade justificava-se pelo fato da geografia crítica ter sido inserida nas escolas de
forma verticalizada, isto é, sem ser aprofundada teoricamente pelos professores que estavam no
ambiente escolar, Straforini (2008) argumenta que:
Segundo Paulo Freire (2018), o ensino escolar apresenta, muitas vezes, conteúdos
“artificiais” que não despertam o interesse dos alunos, pois estão distantes da realidade dos
mesmos, assim, por não perceberem a aplicabilidade do que aprendem na escola com a
realidade vivida, acabam interiorizando a desnecessidade de fazê-los. Isto posto, somos levados
a defender que o conteúdo a ser ensinado nas aulas de geografia tem que se aproximar da
realidade do aluno, ser contextualizado com sua vivência, para que haja maior compreensão do
que é estudado.
O papel da Educação, e dentro dessa, o do ensino de Geografia é trazer à tona
as condições necessárias para a evidenciação das contradições da sociedade a
partir do espaço, para que no seu entendimento e esclarecimento possa surgir
um inconformismo e, a partir daí, uma outra possibilidade para a condição da
existência humana. (STRAFORINI, 2008, p.56)
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Para além das reflexões sobre os limites e possibilidades das abordagens tradicionais e
das abordagens críticas no ensino de geografia, é necessário considerar as transformações que
ocorreram nos sistemas de ensino no contexto de ampliação das políticas neoliberais, para
pensarmos estratégias que promovam uma educação verdadeiramente emancipatória.
As políticas neoliberais e suas implicações no contexto escolar por meio de reformas no
sistema de ensino, têm sido analisadas criticamente por autores como Mészaros (2008), Sader
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(2008), Santomé (2013) e Freire (2018) buscam demostrar como a proposta neoliberal de
educação está intimamente atrelada aos interesses capitalistas.
Segundo Gadotti e Padilha (2004) quando a educação vira mercadoria, a escola perde o
seu sentido de humanização. Assim, na lógica neoliberal, a escola deixa de ser um espaço para
“aprender a ser gente” e passa a ser um lugar de aprendizado para competir no mercado de
trabalho.
Na contramão da lógica neoliberal de educação, Barbosa (2016) destaca o papel da
geografia escolar como na formação de sujeitos críticos e transformadores da sua realidade.
Segundo a autora,
Feita matéria escolar, a Geografia contribui para o educando situar-se no
mundo, compreender a organização desse espaço e identificar os tipos de
intervenção que a sociedade executa na natureza, com vistas a buscar
explicações sobre a localização e a relação entre os fenômenos geográficos. O
ensino dessa matéria permite ao estudante acompanhar e compreender o modo
contínuo de transformação do mundo no tempo e no espaço. Dessa maneira, a
Geografia nas escolas busca desenvolver o senso crítico dos educandos a fim
de que estes possam atuar de maneira reativa e propositiva perante as
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É aquela que converte o seu espaço urbano em uma escola. Imagine uma
escola sem paredes e sem teto. Neste espaço, todos os espaços são salas de
aula: rua, parque, praça, praia, rio, favela, Shopping, e também as escolas e as
universidades. Há espaços para a educação formal, em que aplicam
conhecimentos sistematizados, e a informal, em que cabe todo tipo de
conhecimento. Ela integra esses tipos de educação, ensinando todos cidadãos,
do bebê ao avô, por toda a vida. (CABEZUDO, 2004, p. 13)
Assim, a cidade educadora aparece como possibilidade de pensar uma educação para
além dos espaços escolares, uma educação que ultrapasse os muros da escola e adentre as
cidades, apropriando-se de todo o potencial educativo que a cidade oferece.
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Ser cidadão, perdoe-me os que cultuam o direito, é ser como o Estado, é ser
um indivíduo dotado de direitos que lhe permitam não só se defrontar com o
Estado, mas afrontar o Estado. O cidadão seria tão forte como o estado. O
indivíduo completo é aquele que tem a capacidade de entender o mundo, a sua
situação no mundo, e que se ainda não é cidadão, sabe o que poderiam ser os
seus direitos. (SANTOS, 2014, p. 157)
Neste sentido, de acordo com Santos (2014) ser cidadão pressupõe o exercício da
cidadania, que segundo ele corresponde às ações dos cidadãos que garantem os instrumentos
para o exercício da sua liberdade e garantia dos seus direitos.
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por toda a vida, sendo, portanto, “um ser finito, limitado, inconcluso, mas consciente de sua
inconclusão. Por isso, um ser ininterruptamente em busca, naturalmente em processo”
(FREIRE, 1991, p.3)
Assim, ampliando-se a discussão sobre elementos fundamentais na formação cidadã,
entendemos que a educação na cidade além se dar de forma coletiva e democrática, também
assume um caráter de constância.
Aplicando a premissa freiriana de que o “mundo não é, ele está sendo” ao contexto da
educação, é possível apreender o caráter emancipador presente na concepção de cidade
educadora. Assim, uma vez consciente da sua realidade compreende, o que na perspectiva
freiriana define-se como “inédito viável”, a materialização historicamente possível do sonho
almejado.
Brada e Ríos (2004) destacam que a concepção de cidade educadora nos traz um novo
olhar sobre os processos educativos a partir de três aspectos: aprender a cidade, aprender na
cidade e aprender da cidade. Aprender a cidade pressupõe considerar ela própria como
conteúdo educativo: em descobrir a cidade, identificar seus diferentes espaços educativos,
desvelar suas possibilidades de aprendizado. Aprender na cidade pressupõe o uso pedagógico
dos espaços educativos que a cidade oferece. Aprender da cidade pressupõe compreender que
a cidade é um agente de educação.
Essa leitura do mundo, que em Paulo Freire antecede a leitura da palavra, tem no ensino
de geografia, e no estudo da cidade, do lugar, do espaço vivido, o foco inicial para o sujeito se
vê no mundo, enquanto sujeito consciente e produtor, também, de parte de sua vida, de sua
história, como se houvesse um misto de objeto e sujeito.
Segundo Freire (2015) a cidade educadora é uma cidade dotada de qualidades. “É a
cidade para a educação e a educação para a cidade”. Por sua vez, Gadotti, (2006) argumenta
que
Precisamos de uma pedagogia da cidade para nos ensinar a olhar, a descobrir
a cidade, para poder aprender com ela, dela, aprender a conviver com ela. A
cidade é o espaço das diferenças. A diferença não é uma deficiência. É uma
riqueza. Existe uma prática da ocultação das diferenças, também decorrente
do medo de ser tocado por elas, sejam as diferenças sexuais, culturais etc.
(GADOTTI, 2006, p. 139)
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Seguindo esses princípios a Delegação para a América Latina conta com três redes
territoriais: REMCE (Rede Mexicana de Cidades Educadoras), REBRACE (Rede Brasileira de
Cidades Educadoras) e RACE (Rede Argentina de Cidades Educadoras), e com três Redes
Temáticas: A Rede de Políticas Ambientais e de Sustentabilidade, a Rede de Políticas para a
Promoção da Convivência e da Participação Cidadã, e a Rede de Políticas para a Promoção de
Direitos das Infâncias e Juventudes.
De acordo com a AICE as Redes Territoriais são as agrupações de cidades de uma
mesma zona territorial, que se propõem trabalhar os temas de interesse comum de maneira
conjunta. Cada rede estabelece sua organização e funcionamento de acordo com os estatutos da
AICE e está coordenada por uma de suas cidades. Uma Rede Temática é uma equipe de trabalho
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integrada por representantes dos governos locais de diversas cidades que pertencem à
Delegação, com o interesse coletivo posto em uma temática concreta de gestão municipal e o
desejo de realizar trocas de experiências relacionadas, aprofundando em sua análise e chegando
às conclusões práticas que otimizem seu trabalho concreto e que sejam oferecidas ao restante
das cidades membro.
No intuito de compartilhar e promover experiências positivas de práticas pedagógicas
desenvolvidas à luz dos princípios da Cidade Educadora, essas redes disponibilizam em seus
sites textos que relatam o desenvolvimento dessas práticas. Tal material pode ser utilizado como
referência para o desenvolvimento de novas práticas pedagógicas que adotem os princípios da
Cidade Educadora.
No Brasil vários estudos científicos consideram o conceito de Cidade Educadora como
possibilidade de desenvolvimento de uma nova concepção de políticas públicas, bem como, do
desenvolvimento de práticas pedagógicas que contribuam para a formação cidadã e o pleno
exercício da cidadania. No âmbito da educação, destacamos as seguintes pesquisas: A educação
popular para todos de uma cidade educadora (Natal, Rio Grande do Norte, 1957-1964); O novo
paradigma do saber e os dispositivos urbanos para uma cidade educadora; Cidades e processos
educativos: CIEPS e PEU Bairro-Escola no caminho das Cidades Educadoras; Educação e
cidadania na perspectiva da Cidade Educadora: uma proposta para Frederico Westphalen;
Escola que inclui, cidade que educa: apropriação do Programa Mais Educação em uma escola
na periferia de São Paulo.
A referência a essas pesquisas visa demonstrar que o desenvolvimento de práticas
pedagógicas a partir dos princípios da Cidade Educadora, é uma realidade que apresenta
inúmeras possibilidades para uma transformação qualitativa e verdadeiramente significativa
dos processos de ensino-aprendizagem.
Nesta perspectiva, Gadottie Padilha (2004) argumentam que
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Na cidade educadora a escola, por meio da apreensão da cidade pelos alunos, possibilita
a formação de cidadãos críticos que exerçam plenamente a sua cidadania, promovendo uma
educação para e pela cidadania. Assim, é no âmbito do Movimento das Cidades Educadoras
que surge uma nova concepção de escola, em oposição a concepção de escola neoliberal, a
Escola Cidadã, que objetiva a promoção de uma educação para a compreensão e respeito às
diferenças e as diversidades inerentes a sociedade na qual está inserida.
Paulo Freire ao longo de sua importante e extensa obra, defende que a educação deve
promover a consciência crítica do educando, por meio de uma relação dialética desse com o seu
espaço vivido, tornando-o cada vez mais consciente sobre a sua realidade de modo a poder
refletir sobre ela e transformá-la. Na concepção freiriana, a consciência crítica “é a
representação das coisas e dos fatos como se dão na existência empírica. Nas suas correlações
causais e circunstanciais. [...] é próprio da consciência crítica a sua interação com a realidade”.
(FREIRE, 2018, p. 138)
Brada e Ríos (2004), apresentam os princípios educativos inerentes a cidade educadora
da seguinte forma
Ao considerar que a cidade educadora tem como princípio o entendimento de que todos
os espaços da cidade podem ser espaços educativos, podemos pensar o espaço da cidade,
considerado em sua totalidade como um espaço de aprendizagem, abrindo assim, inúmeras
possibilidades para repensar o ensino da geografia. Desta forma,
Ainda hoje, apesar de todas as críticas sobre a forma tradicional de ensino de geografia,
fundamentada na repetição e memorização, e da maioria dos professores adotarem uma
abordagem crítica de ensino, visando uma maior interação do educando, as aulas de geografia,
em sua maioria continuam sendo maçantes e desinteressantes aos estudantes, que não veem nos
conteúdos dessa disciplina, associação com a sua realidade.
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É na leitura das dinâmicas sócio espaciais, das suas contradições, da sua diversidade que
a compreensão da realidade ocorre de forma mais profunda e qualitativa. Assim,
políticas que esses processos carregam em nossa história. Ainda didáticas que
incorporam como as novas relações de resistência redefinem os espaços, os
reconfiguram; novas geografias. (ARROYO, 2013, p. 342)
Considerações Finais
Referências
ARROYO, M.G. Currículo, território em disputa. 5ª Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.
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educadora: princípios e experiências. São Paulo: Cortez; Instituto Paulo Freire; Buenos
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SIMIELLI, Maria Elena Ramos. “Cartografia no ensino fundamental e médio”. In: CARLOS,
Ana Fani Alessandri (Org.). A Geografia na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1999. p. 92-
108.
Agradecimentos
Agradeço ao meu orientador o professor doutor Genylton Odilon Rêgo da Rocha pelas
orientações, indagações e esclarecimentos tão importantes na minha trajetória na pós-graduação.
Agradeço também ao corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola
Básica que, por meio das discussões e reflexões no período de realização do mestrado, possibilitou a
ampliação do meu arcabouço teórico e a ressignificação sobre a minha prática docente.
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(1)
Professor Adjunto do Departamento de Geografia/CERES/CAICÓ, Universidade Federal do Rio Grande
do Norte - UFRN
E-mail: gleydson_albano@hotmail.com
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Resumo
No contexo atual que se insere o Brasil e o campo brasileiro, diante de ataques contra as populações tradicionais,
do aumento da violência no campo, de narrativas televisivas mentirosas que pregam que o “agro é tudo”, tem-
se urgência na proposição de atividades e reflexões visando descortinar o Novo Rural brasileiro. Esse artigo é
uma proposta direcionada aos professores de Geografia, que visa a análise e reflexão de alguns tópicos
importantes e atuais da Geografia Agrária na sala de aula, buscando com isso, refletir sobre as novas dinâmicas
do espaço agrário, apresentando as mesmas de forma crítica. Metodologicamente, essa proposta está
encaminhada através de dois eixos: um eixo contendo textos relevantes sobre a Geografia Agrária (renda da
terra, Revolução Verde, agronegócio e campesinato), bem como atividades de interpretação desses textos; outro
eixo contendo atividades diversas sobre o Campo no Século XXI (agrotóxicos, agronegócio x agricultura
familiar no Censo Agropecuário 2017, novas atividades no campo, etc) visando o aprendizado através de
estratégias diversas, como a leitura de gráficos, tabelas e imagens de satélite.
Palavras-chave
Geografia Agrária. Novo Rural. Sala de Aula
Abstract Resumen
In the current context in which Brazil and the Brazilian En el contexto actual en el que se insertan Brasil y el
countryside are inserted, in the face of attacks against campo brasileño, frente a los ataques contra las
traditional populations, the increase in violence in the poblaciones tradicionales, el aumento de la violencia
countryside, lying television narratives that preach en el campo, narrativas televisivas mentirosas que
that “agro is everything”, there is urgency in proposing predican que “el agro lo es todo”, hay urgencia en
activities and reflections aiming to unveil the New proponer actividades. y reflexiones para dar a conocer
Rural Brazil. This article is a proposal aimed at el Nuevo Brasil Rural. Este artículo es una propuesta
Geography teachers, which aims to analyze and reflect dirigida a docentes de Geografía, que tiene como
on some important and current topics of Agrarian objetivo analizar y reflexionar sobre algunos temas
Geography in the classroom, seeking to reflect on the importantes y actuales de la Geografía Agraria en el
new dynamics of agrarian space, presenting them aula, buscando reflexionar sobre las nuevas dinámicas
critically. Methodologically, this proposal is guided by del espacio agrario, presentándolas críticamente.
two axes: an axis containing relevant texts on Agrarian Metodológicamente, esta propuesta se guía por dos
Geography (land income, Green Revolution, ejes: un eje que contiene textos relevantes sobre
agribusiness and peasantry), as well as activities of Geografía Agraria (renta de la tierra, Revolución
interpretation of these texts; another axis containing Verde, agroindustria y campesinado), así como
diverse activities on the Field in the 21st Century actividades de interpretación de estos textos; otro eje
(pesticides, agribusiness x family farming in the que contiene diversas actividades en el campo en el
Agricultural Census 2017, new activities in the field, siglo XXI (plaguicidas, agroindustria x agricultura
etc.) aiming at learning through different strategies, familiar en el Censo Agropecuario 2017, nuevas
such as reading graphs, tables and satellite images. actividades en el campo, etc.) orientadas al
aprendizaje a través de diferentes estrategias, como
lectura de gráficos, tablas e imágenes de satélite.
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Introdução
E
sse artigo é uma proposta direcionada aos professores de Geografia, que visa
a análise e reflexão de alguns tópicos importantes e atuais da Geografia
Agrária na sala de aula, buscando refletir sobre as novas dinâmicas do espaço
agrário, apresentando as mesmas de forma crítica.
Essa análise crítica se faz necessário pela insuficiência de estudos da geografia agrária
crítica voltados para ensino de Geografia. É patente a abordagem superficial dos referidos
conteúdos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL, 1998), que não mostram
as contradições nem os conflitos que acontecem no espaço rural, levando o professor a realizar
apenas uma descrição da paisagem, sem observar o processo histórico (VIEIRA, 2004).
Nesse sentido, os PCN falham também quando abordam as relações de trabalho no
campo de forma muito ingênua, insinuando que existe uma relação harmoniosa entre o processo
de modernização capitalista e os setores tradicionais do campo, omitindo os conflitos fundiários
e a violência, características do campo brasileiro (VIEIRA, 2004). Além do contexto de
ausência e omissão dos PCN nas abordagens relativas a Geografia Agrária, recente pesquisa
com professores da rede básica da cidade de Natal (RN), constatou que 60% dos professores
consideraram insuficiente a presença das temáticas agrárias nos PCN (QUEIROZ, 2019).
Desse modo, em 2017 foi homologada uma nova base curricular, a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2017), que passa a ser a partir de então, o mais novo
documento orientador das propostas curriculares para a educação básica no Brasil. Esse
documento vem em conjunto com uma reforma do Ensino Médio que diluiu o componente
curricular de Geografia, que agora aparece dentro do percurso formativo de Ciências Humanas
e Sociais Aplicadas, juntamente com História, Filosofia e Sociologia (MESQUITA,
ROSETTO, CANTÓIA, 2020).
A BNCC foi incentivada e formulada basicamente pelo Movimento Pela Base, iniciativa
de um grupo não governamental, que tem como organizações parceiras, o Instituto Ayrton
Senna, Fundação Roberto Marinho, Instituto Natura, Instituto Unibanco, dentre outras. Além
desses institutos, na maioria, representando o capital financeiro-empresarial-midiático, pouco
espaço foi dado para a construção democrática da BNCC pela base de professores e associações
de classe, como a Associação de Geógrafos Brasileiros (MESQUITA, ROSETTO, CANTÓIA,
2020). Na referida BNCC, apesar do viés conservador e da pobreza conceitual em relação a
ciência geográfica, tem-se algumas temáticas vinculadas a Geografia Agraria que ganham
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destaque nas proposições para o Ensino Fundamental, nos anos finais, que podem ser
trabalhados pelos professores de Geografia (MESQUITA, ROSETTO, CANTÓIA, 2020).
Mesquista, Rosetto e Cantóia (2020), relatam que a BNCC faz menções importantes a alguns
assuntos relevantes da Geografia Agrária, como o reconhecimento das territorialidades dos
povos tradicionais, dos conflitos e ações dos movimentos sociais, das transformações
tecnológicas e de seus impactos sobre o trabalho e a produção agropecuária, assim como
também a produção agropecuária e o problema da desigualdade na distribuição dos recursos
alimentares (MESQUITA, ROSETTO, CANTÓIA, 2020).
Apesar da contribuição da BNCC, tem-se ainda lacunas importantes nas temáticas
relativas a Geografia Agrária que, muitas vezes, não são bem tratadas ou sequer tratadas nos
livros didáticos. Visando preencher um pouco essas lacunas no âmbito da Geografia Agrária na
sala de aula, se encaminha essa proposta tendo dois eixos: um eixo contendo textos e atividades
de interpretação dos referidos textos; e outro contendo atividades diversas visando o
aprendizado através de estratégias diversas, como a leitura de gráficos, tabelas e imagens de
satélite.
No primeiro eixo, são apresentados três breves textos como sugestão para uma
fundamentação teórica preliminar, por parte do professor e para os alunos, visando uma reflexão
sobre temas importantes da Geografia Agrária. São eles: “Algumas reflexões sobre o espaço
agrário: A renda da terra ontem e hoje”; “A Revolução Verde” e por fim “O agronegócio e o
campesinato”.
Dessa forma, o primeiro texto escolhido, “Algumas reflexões sobre o espaço agrário: A
renda da terra ontem e hoje”, tem como foco o aprendizado sobre a renda da terra, tema
importante para se entender melhor questões relacionadas ao valor e o preço atribuído ao solo
rural, e como essa renda explica ao longo do tempo as relações de poder envolvidas na posse
da terra e na concentração da mesma por uma pequena parcela, como ocorre no Brasil.
O segundo texto escolhido, “A Revolução Verde”, tem como foco o aprendizado sobre
o processo de industrialização do campo, mostrando como o campo foi invadido por
tecnologias, máquinas, agrotóxicos, fertilizantes, que visaram aumentar a produtividade, mas
trouxeram desemprego, destruição do meio ambiente, erosão genética, aumento da dependência
do agricultor com empresas multinacionais produtoras de máquinas, agrotóxicos, além do
aumento da dependência dos bancos, pois essa agricultura moderna trazida pela Revolução
Verde é cara e precisa do crédito bancário para se viabilizar na maioria das vezes.
O terceiro texto, “O agronegócio e o campesinato” mostra as relações conflituosas que
existem no campo brasileiro, dando destaque a dois atores que polarizam as atenções e as
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políticas públicas no decorrer dos anos: o agronegócio, que tem ao seu lado a grande mídia e
boa parte do investimento e assistência governamental. Esse ator é um dos grandes responsáveis
pelas exportações brasileiras de produtos primários; o campesinato, que tem atenção marginal
da mídia e pouco reconhecimento e investimento estatal, mas é responsável pela maior geração
de emprego e renda no campo, além de prover a segurança alimentar da nação, sendo o grande
responsável pela alimentação que chega a mesa dos brasileiros.
No segundo eixo são apresentadas quatro atividades para análise dos alunos de questões
ligadas: ao novo Censo Agropecuário 2017 e a agricultura familiar; as desigualdades espaciais
no Nordeste/Centro-Oeste, resultantes da presença e ausência do agronegócio; ao Novo Rural
e as novas atividades não-agrícolas no campo; e por fim, atividade ligada ao consumo de
agrotóxico no Brasil.
Nesse primeiro eixo são apresentados três breves textos como sugestão para uma
fundamentação teórica preliminar por parte do professor e para os alunos, visando uma reflexão
sobre temas importantes da Geografia Agrária: “Algumas reflexões sobre o espaço agrário: A
renda da terra ontem e hoje”; “A Revolução Verde” e por fim “O agronegócio e o campesinato”.
Texto 1 : “Algumas reflexões sobre o espaço agrário: A renda da Terra ontem e hoje” –(Texto
inspirado e adaptado de OLIVEIRA. Ariovaldo Umbelino de. Modo Capitalista de produção e
agricultura).
A renda da terra é uma categoria da Economia Política de fundamental relevância para
o estudo da agricultura. Ela é paga pelo direito de uso da terra aos proprietários de terra e ocorre
tanto no campo como na cidade. A renda da terra vem sendo paga aos proprietários de terra,
pelos que precisam e não tem a propriedade da terra, desde os tempos antigos. Abaixo,
mostram-se os dois tipos de renda que eram pagas aos proprietários antes do sistema capitalista
se tornar imperativo no campo:
a) Renda pré-capitalista em trabalho – Inicialmente, a renda da terra era paga pelos que
não tinham acesso a terra, na forma de trabalho. Na Idade Média, dava-se o nome de corveia a
esse tipo de trabalho. Geralmente, um servo trabalhava nas suas terras cedidas pelo senhor
feudal, parte da semana, e tinham que pagar o acesso a essa terra através do seu trabalho na
terra senhorial que, geralmente, acontecia em outra parte da semana;
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de estradas, perto de lagos, lagoas, praias, barragens, áreas de circulação maior de vento (nesse
caso, para gerar energia eólica), tem uma maior renda associada; já a terceira causa é
proveniente do uso de tecnologia para melhorar a produtividade e/ou localização. Como o uso
de fertilizantes químicos e maquinários agrícolas para melhorar a PRODUTIVIDADE da
produção;
b) Renda Absoluta. A renda absoluta diz respeito a auferida pelo monopólio da
propriedade fundiária por uma classe ou fração de classe. A terra, por ser limitada e por não
está livre, à disposição do capital, estando nas mãos de poucos proprietários, configura essa
renda, advinda da sua limitação pela apropriação de uma classe ou fração dela. Portanto, da
escassez fabricada socialmente;
c) Renda de Monopólio. A renda de monopólio é um lucro suplementar derivado de um
preço de monopólio de uma dada mercadoria produzida em uma porção do globo dotada de
qualidades especiais, únicas, como o espumante especial que leva o nome de sua região de
nascimento, champagne, produzido exclusivamente na região da Champagne na França, com
preços diferenciados.
A formação do preço da terra tem a ver com as rendas que podem ser auferidas por ela.
Se a terra fica perto de um lago, uma estrada, é fértil, tem maquinário, tudo isso influencia no
seu preço, pelas rendas que são esperadas. Mas, além disso, outros fatores influenciam no seu
preço, como os impostos pagos para a sua manutenção. No Brasil, os impostos pagos para a
manutenção de terras agrícolas em situação de especulação imobiliária, sem produção, são
irrelevantes (como o Imposto Territorial Rural (ITR), fazendo com que valha a pena manter as
mesmas sem produção.
Essa característica facilitou (e ainda facilita) fraudes perante o fisco, sobretudo, quando
considera-se o desordenamento que caracteriza o modelo de ocupação de terras no Brasil.
Somando-se a falta de fiscalização no meio rural, a ausência de um sistema cadastral,
consistente de registros escriturais, e a impunidade decorrente da grande distância entre
contribuinte e fisco, o resultado é a sonegação irrestrita e declarações fraudulentas, o que
garantiu, historicamente, a arrecadação efetivamente irrisória desse tributo. Do ponto de vista
social, essas fragilidades esvaziam a função idealizada para o ITR, desguarnecendo a sociedade
de instrumentos, capazes de conter o ímpeto especulativo que motiva a formação de grandes
propriedades rurais improdutivas (LENTI, SILVA, 2016).
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Essa Revolução Verde também substituiu a energia orgânica que deixou de ser a base
dos sistemas agrícolas pela energia fóssil, derivada do petróleo, que está contida nos
fertilizantes químicos, nos agrotóxicos, para fazer mover todo o maquinário agrícola, como
tratores, colheitadeiras, caminhões, fazendo assim com que os custos agrícolas sejam
dependentes da cotação do petróleo.
Em decorrência da instalação desse novo modelo, vai haver mudanças significativas
principalmente na agricultura dos Países Subdesenvolvidos. Shiva (2003) retrata bem essa
mudança ocasionada pela ´Revolução Verde’ no mundo subdesenvolvido, quando ressalta que
“os sistemas agrícolas tradicionais baseiam-se em sistemas de rotação de culturas de cerais,
legumes, sementes oleaginosas com diversas variedades em cada safra, enquanto o pacote da
Revolução Verde baseia-se em monoculturas geneticamente uniformes” (SHIVA, 2003, p.57).
Além da substituição da tradicional rotação de culturas pelas monoculturas de base
genética uniforme, ocorreram também outras mudanças que alteraram o equilíbrio que antes
existia entre a Agricultura e a Natureza. Conforme destaca Shiva (2003, p. 56):
Na agricultura nativa, por exemplo, os sistemas de cultivo incluem uma
relação simbiótica entre solo, água, plantas e animais domésticos. A
agricultura da Revolução Verde substitui essa integração no nível da
propriedade rural pela integração de insumos como as sementes e produtos
químicos.
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- Sugestão de Atividade: Pode-se pensar numa atividade visando identificar no espaço local, as
paisagens vinculadas a Revolução Verde, como lojas de insumos, agrotóxicos, maquinário
agrícola, dentre outras, capturando as mesmas com a lente do celular ou cartografando as
mesmas no espaço geográfico com o uso do Google Maps. Também pode-se pensar numa
atividade visando a identificação das paisagens vinculadas a Revolução Verde na internet, com
a captura de fotos que estão associadas aos produtos desta revolução, como embalagem de
agrotóxicos, maquinário, fertilizantes, etc.
1
Unidade de medida expressa em hectares, fixada para cada município, que varia segundo a região do país. Na
região Norte, um módulo fiscal varia de 50 a 100 hectares; na região Nordeste, de 15 a 90 hectares; na região
Centro-Oeste, de 5 a 110 hectares; na região Sul, de 5 a 40 hectares; e na região Sudeste, de 5 a 70 hectares. Essas
variações levam em conta a qualidade do solo, o relevo, o acesso e a capacidade produtiva. (CÂMARA, 2020).
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foi extinto no Governo Temer) para atender a agricultura familiar. O Ministério da Agricultura
é o mais antigo, criado na época do Brasil Império, é o ministério do agronegócio e sempre
defendeu os interesses dos grandes proprietários. O Ministério do Desenvolvimento Agrário foi
criado após o massacre de Eldorado dos Carajás e tornou-se importante para o desenvolvimento
da agricultura camponesa. A pedido do antigo Ministério do Desenvolvimento Agrário, o IBGE
elaborou uma versão do Censo Agropecuário de 2006, com destaque para a produção da
agricultura familiar. Pela primeira vez na história do Brasil, o Censo Agropecuário separou os
resultados em duas partes: uma denominada agricultura familiar e outra de agricultura não
familiar, procurando evitar o termo agronegócio.
O Brasil dual entre a agricultura familiar e o agronegócio é extremamente desigual,
refletindo as desigualdades da sociedade brasileira. Os resultados do Censo Agropecuário 2006,
apontaram que a agricultura familiar ocupava 74% das pessoas no meio rural, que recebiam
apenas 15% do crédito agrícola, possuindo apenas 24% da área agricultável, mas produzindo
38% do valor bruto agrícola. É pouca terra e muita gente que recebe pouco crédito e divide o
resto da riqueza produzida. Do outro lado, o agronegócio ficava com 85% do crédito agrícola,
controlava 76% da área agricultável e produzia 62% do valor bruto agrícola, empregando cerca
de 26% das pessoas. É muita terra e pouca gente que fica com a maior parte dos recursos
empregados na agropecuária. O agronegócio fica com a maior parte da riqueza produzida,
inclusive, a parte da riqueza produzida pelo campesinato, através da renda capitalizada da terra,
pois é o agronegócio que comercializa a maior parte da produção camponesa.
Os contrastes do Brasil são ainda mais fortes quando observamos que esses agricultores
familiares que ficam com a menor parte da riqueza produzida na agropecuária eram
responsáveis, segundo o Censo 2006, por 70% da produção de feijão, 87% da mandioca, 38%
do café, 46% do milho e 34% do arroz. Na pecuária, garantiram 59% dos suínos, 50% das aves,
30% da carne bovina e 58% do leite, sendo muitas vezes os garantidores da soberania alimentar
nacional.
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Além dessa discurssão, pode-se também explorar na Figura 01, a participação regional
na agricultura familiar, com o predominio do Nordeste e com a pouca ocupação do Centro-
Oeste, tradicional celeiro do agronegócio e que tem expulsado muitos trabalhadores do campo
com a produção de commodities agricolas mecanizadas voltadas para a exportação.
Em relação ao cartograma 01, é importante fazer com que o aluno interprete a legenda
e o mapa, observando e analisando onde existe mais e menos agricultura familiar e esperar que
o mesmo trace outro tipo de dinâmica regional, com manchas de agricultura familiar tendo
destaque não somente no Norte e no Nordeste, mas também no Sul e Sudeste, com áreas
significativas no interior do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Minas Gerais.
O território nordestino tem o espaço agrário divido em dois recortes espaciais que
podem ser observados do espaço. Um deles, com os impactos das atividades do agronegócio,
voltadas para exportação, feitas por grandes empresas, com grande aporte técnico e
informacional, são chamados de espaços luminosos; e espaços de economias tradicionais
agrícolas, com cultivos de sequeiro, para o mercado local, muitas vezes para as feiras livres,
são os chamados espaços opacos, tão falados pelo geógrafo Milton Santos (SANTOS,
SILVEIRA, 2001).
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Na foto 01, tem-se o canal principal do maior perímetro irrigado público do Rio Grande
do Norte. Todos os dias, milhões de litros de água são retirados do rio Açu-Piranhas para irrigar
lotes familiares e lotes empresariais desse distrito de irrigação, imbuídos de tecnologias de
irrigação, assistência técnica e acesso a água (pontos luminosos). O referido lote fica a competir
pelo acesso a água a jusante com o abastecimento de água das cidades e com as atividades de
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carcinicultura. É importante fazer o aluno ler essa imagem e refletir sobre a abundancia e a
escassez das águas no semiárido nordestino.
A foto 02 retrata o mesmo lugar da foto 01, só que em outra perspectiva, por se tratar
de uma foto de satélite. Pode-se observar os lotes, a desigualdade entre eles, com lotes pequenos
e lotes grandes, o canal de irrigação principal, as áreas que recebem as águas e as áreas que não
recebem, as áreas que fazem parte do perímetro e as áreas que não fazem parte do perímetro de
irrigação. Todos esses contrastes podem ser observados na foto de satélite. Cabe refletir com
os alunos sobre os incluídos e os excluídos desse perímetro através da leitura da foto de satélite.
Com relação a foto 03, tem-se na leitura imagética da foto de satélite, o contraste entre
os espaços luminosos e espaços opacos de forma bem nítida. No lado direito da foto, tem-se a
área relacionada aos cerrados baianos com a produção de grãos voltada para a exportação, no
município de Luís Eduardo Magalhães. Ao se observar bem a foto, nota-se os formatos
geométricos das terras agrícolas, o cultivo pelas tonalidades e ainda aparece o nome de uma
empresa multinacional que tem suas operações na região, a Bunge, com produção voltada para
vendas nacionais e internacionais de commodities agrícolas e produtos processados. Uma
atividade decorrente dessa análise, pode ser uma investigação sobre a Bunge, a partir da sua
página da internet. Pode-se também inferir os alunos sobre os impactos ambientais desse tipo
de atividade, uso de agrotóxico e o desmatamento.
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Do lado esquerdo da foto, tem-se a área do município de Ponte Alta do Bom Jesus, em
Tocantins, já fora da área dos cerrados e sem os impactos decorrentes do agronegócio de grãos.
Apesar de rarefeita, a vegetação ainda é nítida nessa área, ocorre com mais frequência do que
a área baiana, onde é praticamente inexistente. A vegetação característica é a de cerrados e
existe a ocorrência de campos limpos. A pastagem natural tem destaque, a pecuária é uma
atividade importante na área, além disso, existem vários produtos agrícolas cultivados, como o
arroz, milho, feijão, cana-de-açúcar e mandioca. Os alunos podem ser despertados sobre os
impactos ambientais nessa área, o nível de desmatamento e fazer uma análise comparativa
desses dois modelos postos.
Atividade 3 – Analise imagética do Novo Rural brasileiro, com a análise e reflexão sobre as
novas atividades não agrícolas e suas marcas na paisagem rural brasileira.
José Graziano da Silva vem observando já há alguns anos que o espaço rural vem
passando por profundas transformações, algumas ligadas a modernização da agricultura com a
difusão da Revolução Verde, outras com o avanço de novas atividades não agrícolas no seu
interior (SILVA, DEL GROSSI, 2001). Um setor que está a se embrenhar cada vez mais no
espaço rural é o setor industrial. Tanto as indústrias novas como as tradicionais tem procurado
transferir suas plantas para as áreas rurais, como forma de minimizar custos (com a proximidade
da matéria prima, mão-de-obra menos onerosa e não sindicalizada, redução de impostos, ajuda
dos municípios do interior, etc.) ou externalidades negativas (poluição, fuga dos
congestionamentos etc.) (SILVA, DEL GROSSI, 2001).
Além das indústrias, há também uma nova onda de valorização do espaço rural,
capitaneados por questões ecológicas, energias alternativas (como energia solar e energia
eólica), lazer, turismo ou moradia. Observa-se em todo o mundo uma preocupação crescente
com a preservação ambiental que tem estimulado novas atividades, como a expansão de parques
eólicos, parques solares, o turismo ecológico, expansão de resorts emulando a paisagem idílica,
dentre outras.
Em relação a foto 04, que trata de uma área de resorts no litoral da Bahia, podemos
fazer uma análise imagética desses novos elementos da paisagem e explorar questões como o
acesso ao mar da população ribeirinha de pescadores, acesso ao mar da população local para
atividades de lazer, preservação x destruição ambiental.
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Em relação a foto 05, pode-se fazer uma análise imagética do contraste entre uma
atividade econômica que gera energia alternativa e a ausência do uso do solo para as atividades
agropecuárias. Pensar sobre as rendas da terra auferidas com os pagamentos das empresas
eólicas, gerando com isso, mais renda diferencial e, consequentemente, mais valorização da
terra, aumento do preço da terra e valorização imobiliária. Além disso, pode-se pensar nos
impactos ambientais que tal atividade “ecológica” gera, como no choque das aves e no barulho
das turbinas para a população que reside perto.
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Foto 5: Parque eólico na zona rural de Lagoa Nova, Rio Grande do Norte
A autora também traz dados estatísticos importantes que vinculam a produção para exportação
(a produção mais envolvida com as tecnologias da Revolução Verde e mais associada ao
agronegócio), com a grande venda de agrotóxicos no país, como se nota no Gráfico 4.
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A partir desse gráfico, é possível trabalhar a interpretação dele com os alunos, para
buscar uma associação entre Revolução Verde – Agronegócio – Agrotóxicos. Paralelo a isso,
deve-se incentivar pesquisas na internet sobre a liberação dos agrotóxicos pelo governo, a
proibição dos mesmos agrotóxicos em outras partes do mundo, como na União Europeia e os
efeitos dos mesmos na saúde das pessoas. Pode-se também incentivar pesquisas na internet
sobre a isenção de ICMS sobre os agrotóxicos no Brasil, buscando entender o lobby envolvido
na defesa dos agrotóxicos.
Considerações Finais
Com os textos e atividades propostas nos dois eixos, se espera que os discentes tenham
uma reflexão sobre o “Novo Rural” que tem-se apresentado no século XXI no Brasil,
estabelecendo uma ligação entre o velho problema do acesso e da posse da terra com as novas
economias, as novas produções, e as novas tecnologias, que tem modernizado o campo, mas,
não tem resolvido os velhos problemas.
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Referências
GUIMARÃES, Alberto Passos. A crise Agrária. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
LENTI, Felipe Eduardo Brandão; SILVA, Ana Paula Moreira da. Repensando o Imposto
Territorial Rural para fins de adequação ambiental. In: SILVA, A. P.M.; MARQUES, H.R;
SAMBUICHI, R.H. (Orgs). Mudanças no código florestal brasileiro: desafios para a
implementação da nova lei. Rio de Janeiro: Ipea, 2016. p.261-282.
SHIVA, Vandana. The violence of the Green Revolution. London: Zed Books. 1991.
SILVA, José Graziano da; DEL GROSSI, Mario Eduardo. O novo rural brasileiro: uma
abordagem ilustrada. Londrina: Iapar, 2001.
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(1) Doutora em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco. Professora da Rede Municipal e
Estadual de Campina Grande, PB.
E-mail: marlene_macario@yahoo.com.br
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Resumo
Quando restrita ao uso dos dispositivos midiáticos, recursos e livros didáticos, a geografia escolar se afasta de
uma compreensão crítico-reflexiva dos conteúdos da cidade, praticando um ensino funcional, mecânico,
excludente, arquétipo de aulas de tipo reprodutivistas, e segregacionistas da vida contemporânea dos habitantes
da urbe. Nessa perspectiva, este trabalho discute a contribuição do estudo meio a partir do lócus da geografia
crítica contribuindo a complexidade que envolve o tema no processo de ensino-aprendizagem em geografia.
Construir um olhar crítico e investigativo sobre a cidade e o processo de urbanização contemporânea, incluindo
a crítica a exclusão, a pobreza, a violência e aos diferenciados tipos de segregação no currículo escolar, é urgente
e favorável ao reconhecimento das identidades socioespaciais, traz contribuições à emancipação dos sujeitos e
ao exercício da cidadania.
Palavras-chave
Prática de Ensino. Estudo do Meio. Geografia Crítica
Abstract Resumen
When restricted to the use of mediatic devices, Cuando se limita al uso de dispositivos multimedia,
resources and textbooks, geography in school is kept recursos y libros de texto, la geografía escolar se
away from a critical-reflexive comprehension of the aparta de una comprensión crítica-reflexiva de los
city contents, thus evincing a functional, mechanical contenidos de la ciudad, practicando una enseñanza
and exclusive teaching, which is an archetype of funcional, mecánica, excluyente, arquetípica de clases
reproductive classes and segregationist of reproductivas, y segregacionistas de la vida
contemporary life of the inhabitants of the city. In this contemporánea de los habitantes de la ciudad. Desde
perspective, this work discusses the contribution of the esta perspectiva, este artículo analiza la contribución
study of the environment from the locus of critical de la mitad del estudio desde el lugar de la geografía
geography, contributing to the complexity that crítica contribuyendo a la complejidad que involucra
surrounds the theme in the teaching-learning process el tema en el proceso de enseñanza-aprendizaje en la
in geography. It is urgent and favorable to the geografía. Construir una visión crítica e investigadora
recognition of socio-spatial identities to build an de la ciudad y el proceso de urbanización
investigative and critical view of the city and the contemporánea, incluyendo la crítica de la exclusión,
contemporary process of urbanization that takes into la pobreza, la violencia y los diferentes tipos de
account exclusion, poverty, violence, and the different segregación en el currículo escolar, es urgente y
types of segregation in the school curriculum. favorable al reconocimiento de identidades
Therefore, bringing in contributions to the socioespaciales, aporta contribuciones a la
emancipation of individuals and to the citizenship emancipación de temas y al ejercicio de la ciudadanía.
exercises.
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Introdução
O
presente artigo reflete sobre a cidade e o urbano a partir da metodologia do
estudo do meio na perspectiva crítica da geografia. Este propõe alternativas
didático-pedagógicas para o ensino-aprendizagem na geografia escolar, a
partir da pesquisa sobre o lugar, para contribuir a superação das distâncias, persistentemente,
presentes entre os conteúdos curriculares e o fenômeno da complexificação nos territórios,
resultantes dos processos de globalização e fragmentação, recentemente, envolvendo o período
de Pandemia e Pós-Pandemia de Coronavírus.
De fato, o currículo na Educação Básica pelo seu caráter normativo, insiste numa
perspectiva de conteúdos mecanicistas, tecnicistas, funcionalistas, arquétipo de modelos
engessados e excludentes quanto à produção do conhecimento, saberes e práticas no mundo e,
raras vezes favorece a compreensão das especificidades locais e regionais, experimentadas
pelos alunos, que lhes deveriam ser simultâneo. Assim, se busca uma relação mais aproximada
com o contexto da escola, enquanto instituição responsável pela formação da cidadania, e do
ensino de geografia, enquanto condição basilar para a compreensão da dinâmica contemporânea
presente no cotidiano dos sujeitos em aprendizagem nas cidades.
Subsidiar propostas de intervenção politizadas no âmbito da Geografia, considerando o
atual limite imposto pela emergência sanitária da Pandemia do Covid-19, nos diversos níveis
do ensino na Educação Básica, supõe romper outro ancestral, o de modelos predominantes que
priorizam os conteúdos curriculares: livros didáticos, dispositivos midiáticos e um conjunto de
leis, normas e programas em detrimento das experiências concretas dos habitantes na cidade.
Esses são desafios urgentes à formação de cidadãos críticos e atuantes nos contextos citadinos
de exclusão, pobreza, degradação ambiental, violência...
Pretende-se com as reflexões aqui apresentadas estimular a prática da pesquisa
considerando a complexificação dos desafios emergentes que envolve a escola e os seus
professores no âmbito da sociedade contemporânea para contribuir à construção do
conhecimento crítico e criativo pelo aluno, e futuros exercícios profissionais na cidade.
Considerar o espaço da escola como lugar de pesquisa, de formação de saberes e práticas
e não somente de aplicação de técnicas representa um caminho para a participação ativa, como
cidadão, na vida da cidade, não se deixando tutelar e infantilizar por políticos e técnicos a
serviço do aparelho do Estado e do mercado.
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A cidade, diante das novas e mais flexíveis formas de produção, marketing, distribuição
de bens e serviços interliga comunicações e trocas que movimenta pessoas, objetos e capitais
sobre os territórios. Esta dimensão vem suscitando mudanças na forma de apreensão das
relações que se estabelecem entre tempo-espaço, natureza-sociedade, natureza-cultura, lugar-
mundo, cidade-campo, homem-cidade e traz novas exigências à educação no esforço à
compreensão das identidades socioespaciais que se constituem nos lugares pela relação teoria-
prática, ensino-pesquisa, conhecimento-ação.
A cidade, um amalgama das redes simultâneas mais fluidas, mais espessa e densa,
concentra pertencimentos distintos e ressignificados num movimento em constante mudança.
Assim, vem entrelaçando a dominação objetiva e a apropriação simbólica, mais subjetiva
fomentando não somente o controle físico, mas laços de identidade social. A forma e os
conteúdos que se concretizam neste ecúmeno precisam ser apropriados na dinâmica escolar e
no trabalho do professor não somente na sua dimensão funcional, mas também simbólica e
afetiva, entrelaçando natureza, economia, cultura e política. (HAESBAERT, 2006; SANTOS,
2009).
Isso para que as práticas pedagógicas atuais, mesmo aquelas agregadas às políticas de
caráter assistencialista, clientelista e patrimonialista, não corroborem para a reprodução de
práticas espaciais, desfavoráveis às mudanças significativas no contexto da vida dos estudantes.
Ao legitimar práticas de tipo reprodutivistas se amplia a imensa fratura entre os direitos
educacionais e a cidadania efetiva, acenando para a ausência de parâmetros públicos de
reconhecimento dos direitos sociais, des (re)construindo identidades e jogando os seres
humanos numa aleatória, desigual e violenta luta pela sobrevivência. De acordo com Carlos
(1999)
Destaca-se que o fenômeno da urbanização manifesta estas contradições nos lugares por
está associada à rapidez do aumento da densidade que se impõe as cidades e da escala da sua
circulação, definindo as suas paisagens, constantemente, caracterizada pelos problemas
estruturais de ordem econômico-social e ambiental. “O espaço urbano, condição, meio e
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produto da ação humana pelo uso ao longo do tempo” (CARLOS, 2007, p. 11) se configura
pelos graves problemas de habitação consolidado pelo crescimento horizontal e vertical,
saneamento e infraestrutura de serviços: transportes, segurança, aeroportos, internet, rede de
televisão, saúde, lazer, educação, políticas sociais e urbanas, participação de setores
intelectuais, universidades e empresas (SOUZA, 2008). Entretanto, no processo didático-
pedagógico do ensino em geografia quando se deseja refletir sobre essa condição humana do
ecúmeno verifica-se que
Nesse contexto, a cidade e os seus respectivos problemas urbanos vão sendo tratados
com preconceitos, precarização e equívocos. E muitas vezes a mídia amplia essas visões
distorcidas resultando num quadro geral de reprodução, geração após geração, num quadro
geral de exclusão, pobreza e estigmatização, segregação e autossegregação. (SOUZA, 2008).
A fragmentação do tecido sociopolítico-espacial, inventado pelo modelo “central-
desenvolvimentista de gestão de cidades” (SOUZA, 2008), reforça esse status quo,
predominando uma gestão clientelista dominada pelos interesses privados e lucrativos por um
lado, e por outro, pela ignorância de maior parte da população. Situação que não favorece a
criação de melhores condições para os diversos problemas que ocorrem nas cidades e que vem
se acumulando nas últimas décadas.
A cidade é, antes de qualquer coisa, trabalho objetivado, materializado, fruto do
processo de produção realizado ao longo de uma série de gerações, que, com a acumulação dos
tempos, aparece por meio da relação entre o “construído” (casas, ruas, avenidas, estradas,
edificações, praças) e o “não construído” (o natural) articulando o novo e o velho de um lado;
e de outro, o movimento, a realização das marcas da vida que se realiza no lugar (CARLOS,
1999; 2007).
Souza (2008) diz que a cidade é um espaço de concentração de oportunidades de
satisfação de necessidades básicas materiais (moradia, saúde...) e imateriais (cultura,
educação...) mas, também, um local crescentemente poluído, onde se perde tempo e se gastam
nervos com engarrafamentos, onde as pessoas vivem estressadas e amedrontadas com a
violência e a criminalidade “presentes” nos subcentros estigmatizados pela segregação racial e
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Como pensar, assim, em cidade educadora na escola nos moldes de uma cidadania
efetiva sem partir para uma pesquisa cuidadosa das interações tempo/espaço entre a sociedade
e a natureza, tomando o lugar de vivência e as experiências intersubjetivas como ponto de
partida? Como proceder para uma transformação pedagógica na geografia escolar (TERRIEN;
MAMEDE; LOYOLA, 2007), aprendida pelos contornos bem desenhados do currículo
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normativo, e que, por extensão se materializa nas ações da cidade? Certamente é partindo das
experiências significativas e significantes dos sujeitos na sua relação com o lugar que se leva o
conhecimento cientifico para os alunos do Ensino Fundamental ao Ensino Médio. Estes ainda
necessitam de experiências concretas para a construção de ideias abstratas (PASSINI, 2007, p.
173). De acordo com Callai (2000)
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Figura 01
se, também, na luta por rede de água, luz, esgotos, transporte coletivo, internet, por
regularização de loteamentos, pela criação de infraestrutura de lazer e de escolas, pela luta por
creches, espaços de cultura, por leis de zoneamento etc. A luta emerge da consciência do
cidadão como manifestação pelo direito à cidade e à cidadania. Caminho favorável às rupturas
necessárias à visão dicotômica entre o processo de ensino-aprendizagem e o desenvolvimento
local. (ÀVILA, 2003; CARLOS, 1999; CAVALANTI, 2002).
Considerando esses pressupostos o estudo sobre o meio urbano-ambiental da cidade
poderá propiciar a abordagem interdisciplinar de vários conteúdos no ensino de geografia
proporcionando a articulação entre teoria e prática, motivando também o professor a buscar
novos conteúdos e a participar com seus alunos dos passos metodológicos para a efetivação de
uma prática de ensino em geografia criativa dotada de sentidos e significados para a cidade
(PASSINI, 2007).
Criar novas possibilidades do ensinar-aprender na geografia escolar por meio do estudo-
pesquisa sobre os fenômenos espaciais da cidade e do urbano se fazem necessários para a
compreensão da lógica contraditória, desigual e combinada do mundo capitalista. Essa, da
complementaridade urbano e rural, em seus “conjuntos segregacionistas”, se analisado do
particular a totalidade envolvendo combinações – econômicas, políticas, culturais, religiosas,
artísticas e científicas – fomentará práticas espaciais com mais justiça social. (OLIVEIRA,
2009).
Pontuschka; Paganelli e Cacete (2007) afirmam que a didática do estudo do meio pode
aguçar a reflexão do aluno para produzir conhecimentos que não estão nos livros didáticos,
posto o status quo que no ensino de geografia “deve” se seguir página por página ou assuntos
contidos no livro didático ou que esses manuais ensinam sozinhos a partir da sequência: a) ler
o texto; b) realizar as atividades e c) acompanhar as estratégias didáticas indicadas utilizando-
o com um fim, e não como um meio. Essa sequência limita a apropriação de outras
metodologias do ensino pelo professor na perspectiva da elaboração de um fazer-pensar
dinâmico, que constrói autonomia na geografia escolar (KIMURA, 2008; CASTELLAR;
VILHENA, 2010).
O uso frequente dos manuais na sala de aula reduz as possibilidades de relacioná-lo com
a vida cotidiana dos alunos e de sua compreensão como um material auxiliar de apoio ao
trabalho didático-pedagógico do professor, posto os dizeres de sua ineficácia, na medida em
que apenas memoriza o que está escrito e não se analisam os dados e as informações presentes
nos textos didáticos, não criando outras possibilidades de ampliar o conhecimento escolar,
especialmente, no caso das populações mais desfavorecidas que muitas vezes manifestam a
incapacidade em utilizar os saberes escolares numa situação apenas um pouco diferente das que
encontram na escola (CASTELLAR; VILHENA, 2010, p. 139).
Cavalcanti (2008) destaca a necessidade da reflexão sobre o conhecimento e saberes
docentes na relação teoria e prática para superação de tal perspectiva no ensino de geografia. A
autora ao abordar a realidade espacial a partir dos conceitos geográficos contribui para a
compreensão dos diferentes espaços, para a localização e a análise dos distintos significados
para a vida cotidiana dos alunos. Diz que
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Formação de conceitos
--------------------------
--------------------------
científicos
Redefinem/alteram os conceitos
espontâneos
Relações diretas
Nessa perspectiva, mister se faz repensar a didática de sala de aula, pois como afirma
Candau (2010) nessa consiste à busca de alternativas para os problemas da prática pedagógica,
pois o seu objeto de estudo é o processo de ensino-aprendizagem numa articulação entre as
dimensões humana, técnica e político-social (CANDAU, 2010).
De acordo com Rays (in CANDAU, 2010, p. 45)
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e aprender situado e aberto ao que acontece e se materializa no solo, fomentará no sujeito que
participa da escola e habita a cidade, capacidade crítica, criadora e transformadora, capaz de
exercer seu papel político enquanto agente da produção do espaço e da cidadania, começando
a partir do lar. É urgente que o sujeito, habitante da cidade, não seja mais confundido apenas
com o perfil de consumidor de bens e serviços, desse modo, apenas reforçará a produção de
simulacros da geografia na escola e o “caráter de celas” da geografia da cidade (SOJA, 1993).
Ao contrário da pretensão homogeneizadora da escola, a cidade se manifesta como
experiência do heterogêneo e do múltiplo. A cidade se impõe à escola: como uma pluralidade
de sujeitos, de culturas, de instituições, de estímulos, de sensibilidades, ou seja, como
experiência de aprendizagem muito diversificada e, descontrolada para os padrões escolares,
exigindo sempre a atualização dos mecanismos e das estratégias de inclusão e exclusão, e
controle, os quais, por outro lado, dão lugar a astúcias, a práticas, a táticas de subversão, a
apropriação e novos empregos das experiências, culturas e saberes compartilhados.
Nessa dimensão, o processo de descoberta dos conteúdos que se pretende abordar, sobre
a cidade e o urbano, se torna mais efetivo se envolver, concomitantemente, conteúdos escolares,
científicos (ou não), políticos, e sociais na direção de sua aproximação com a mobilidade
espacial; realidade social e seu complexo amalgamado material e imaterial de
tradições/novidades (OLIVEIRA, 2009). Sugere-se, para tanto, que a construção do
conhecimento em tela possa partir de um processo didático-pedagógico conforme o seguinte
esquema didático da figura 03.
Fonte: BERTOLUCCI OITT, Margot. In: CANDAU, Vera Maria (org.). A didática
em questão. 30 ed. Petrópolis, RJ, Vozes, 2010. p. 69.
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Aprender a pensar o espaço urbano supõe partir dos conteúdos objetivos e subjetivos
da cidade, de suas relações econômicas, políticas, sociais, jurídicas com o ecúmeno, incluindo
o domínio das técnicas e dos instrumentos historicamente herdados para analisa-lo. Ao
considerar tal perspectiva se encontra possibilidades interdisciplinares de se construir junto aos
alunos uma análise espacial favorável à construção da cidadania, ou seja, caminhos para a
pesquisa empírica, cientifico-reflexiva e de atuação a partir da escola quando da abordagem de
temas como:
Afirma a autora que, para um trabalho nesse sentido se faz pertinente à elaboração de
um roteiro: 1. Fazer o percurso do que pretende se estudar; 2. Anotar o que interessa; 3. Discutir
o que se observou; 4. Sistematizar o que se aprendeu, através da escrita de textos, da construção
de mapas e maquetes, do desenho de trajetos (CALLAI, 2000, p. 126).
Passini (2007), Pontuschka; Paganelli; Cacete (2007), Castellar; Vilhena (2010)
concordam que essa metodologia deverá compreender 1. O encontro com os alunos e a
definição da metodologia; 2. Visita preliminar e a opção pelo percurso; 3. Planejamento da
atividade atentando para a possibilidade de trabalho integrado com outras disciplinas numa
perspectiva interdisciplinar para amplitude do conhecimento a ser construído, de agendar a
visita e verificar os meios necessários de transporte e dividir as tarefas entre relatores,
fotógrafos, desenhistas, entrevistadores e outros; 4. Elaboração do caderno de campo com
seleção bibliográfica a ser consultada, antes da ida a campo, para melhor assimilação dos
conhecimentos; 5. Observações e entrevistas para a coleta de dados. 6. Transcrição e
categorização. 7. Retorno à sala de aula e avaliação.
O estudo do meio, além de ser interdisciplinar, permite que aluno e professor se
embrenhem num processo de pesquisa (PONTUSCHKA, PAGANELLI e CACETE, 2007)
utilizando um método que pressupõe o diálogo, a formação de um trabalho coletivo e incentivo
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Enfim, só a prática docente nas salas de aulas – e também fora delas, com
estudos dos meios participativos, por exemplo – é que irá engendrar uma
geografia crítica, voltada a contribuir para a formação de cidadãos plenos. E
tal tarefa é ininterrupta, o que vale dizer que não se deve encontrar uma receita,
um modelo acabado para ser constantemente reproduzido, mas sim que o
buscar deve ser uma meta sem fim, que o renovar e sempre experimentar
novas atividades e conteúdos é condição sine qua non para um ensino que não
sirva às relações de dominação. (VESENTINI, 1995, p. 179).
O autor nos remete que no ensino voltado para a liberdade e a construção da autonomia
não se ensina, mas ajuda o aluno a aprender, orienta-o no crescimento intelectual-cognitivo-
político. Diz que essa didática forma pessoas críticas e capazes de fazer coisas novas. Desejável
para quem lida com os problemas da habitação “crescimento horizontal e vertical”, saneamento
e infraestrutura de serviços, transportes, segurança, aeroportos, serviços de saúde, internet, rede
de televisão, lazer, educação, políticas sociais e “urbanas”, participação de setores intelectuais,
universidades e empresas. Espera-se contribuir para o estabelecimento de um diálogo
inteligente e criativo na sala de aula, para favorecer a sustentabilidade urbana, gestão
democrática e participação popular.
Considerações finais
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(1)
Professora associada do curso de licenciatura em geografia da Universidade Federal do Paraná/Setor
Litoral
E-mail: angela.katuta@gmail.com
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Resumo
O presente texto resultou dos trabalhos de extensão, pesquisas e reflexões que vim realizando com os
professores e professoras da educação básica, povos originários, do campo e comunidades tradicionais. Nele
evidencio os desafios inerentes à cartografia e geografia ensinadas em um movimento mais amplo de
democratização das relações sócio territoriais em âmbito planetário. Problematizei a produção da cartografia
escolar evidenciando seus limites e desafios, sobretudo no que se refere ao trabalho em sala de aula. Defendo
que geografia e cartografia são como duas faces da mesma moeda, a primeira não se constitui como recurso
analítico sem a linguagem que lhe é inerente, isso porque a segunda espacializa dados e informações que serão
correlacionados, lidos e compreendidos pelo conjunto de categorias e conceitos da área e ensinados aos
educandos e educandas. Demonstro que produzir e ter acesso às figurações imagéticas que atualmente
denominamos de mapas, historicamente foi prerrogativa dos grupos hegemônicos: das lideranças tribais, dos
reis, senhores feudais, da aristocracia, dos mercadores, de alguns segmentos conservadores do Estado Nação,
da burguesia, da classe rentista, latifundiária, entre outros, cuja principal função era defender e/ou ampliar
territórios e, na modernidade, fazer avançar as relações capitalistas e ampliar a reprodução do espaço do e para
o capital. Na sequência, evidenciei que no Brasil, com o fortalecimento do Estado democrático de direito, das
instituições e grupos que atuaram junto aos movimentos populares para pôr fim à ditadura, temos a ampliação
dos produtores e usuários de mapas que passam então a diversificar, ampliar e interrogar o repertório
cartográfico existente para a defesa de suas geografias (modos de estar e ser no mundo), voltadas à redistribuição
dos direitos histórica e geograficamente negados, sobretudo aqueles ligados ao reconhecimento dos seus
territórios e territorialidades. Finalizo a reflexão abordando a constituição do campo de conhecimento
denominado cartografia escolar no contexto da geografia crítica, apontando seus desafios, sobretudo no que se
refere ao âmbito do ensino de geografia voltado ao entendimento dos diferentes modos de estar no mundo,
fundados na solidariedade e na defesa de vida digna para todos os seres vivos.
Palavras-chave
Cartografia escolar; Geografia Crítica; Desafios..
Abstract Resumen
This text resulted from the extension work, research and reflections Este texto es el resultado del trabajo de extensión, investigación y
that I have been doing with teachers of basic education, native reflexiones que he venido haciendo con profesores de educación
peoples, from the countryside and traditional communities. It básica, pueblos originarios, del campo y comunidades tradicionales.
highlights the challenges inherent in cartography and geography Destaca los desafíos inherentes a la cartografía y la geografía
taught in a broader movement to democratize socio-territorial enseñadas en un movimiento más amplio para democratizar las
relations at the planetary level. I problematized the production of relaciones socio-territoriales a nivel planetario. Problematicé la
school cartography, showing its limits and challenges, especially producción de la cartografía escolar, mostrando sus límites y
with regard to work in the classroom. I argue that geography and desafíos, especialmente en lo que respecta al trabajo en el aula.
cartography are like two sides of the same coin, the first is not an Sostengo que la geografía y la cartografía son como dos caras de
analytical resource without the language that is inherent to it, una misma moneda, la primera no se puede hacer sin un recurso
because the second spatializes data and information that will be analítico, sin el lenguaje que le es inherente, porque la segunda
correlated, read and understood by the set of categories and concepts espacializa datos e información que serán correlacionados, leídos y
of the area and taught to students. I demonstrate that producing and entendidos por el conjunto de categorías y conceptos del área y
having access to the imagery figurations that we currently call maps enseñado a estudiantes y estudiantes. Demuestro que producir y
has historically been the prerogative of hegemonic groups: tribal tener acceso a las figuraciones imaginarias que actualmente
leaders, kings, feudal lords, aristocracy, merchants, some llamamos mapas ha sido históricamente prerrogativa de grupos
conservative segments of the Nation State, the bourgeoisie, the hegemónicos: líderes tribales, reyes, señores feudales, aristocracia,
rentier, landowning class, among others, whose main function was comerciantes, algunos segmentos conservadores del Estado Nación,
to defend and/or expand territories and, in modern times, to advance la burguesía, la classe rentista, terrateniente, entre otros, cuya
capitalist relations and expand the reproduction of space to and from función principal era defender y/o ampliar territorios y, en la
capital. Then, I showed that in Brazil, with the strengthening of the actualidad, impulsar las relaciones capitalistas y ampliar la
democratic rule of law, of the institutions and groups that worked reproducción del espacio hacia y desde el capital. Luego, mostré que
with popular movements to end the dictatorship, we have the en Brasil, con el fortalecimiento del estado de derecho democrático,
expansion of producers and users of maps, who then start to de las instituciones y grupos que trabajaron con los movimientos
diversify, expand and interrogate the existing cartographic populares para acabar con la dictadura, tenemos la expansión de
repertoire for the defense of its geographies (ways of being and productores y usuarios de mapas, que luego comienzan a
being in the world), aimed at the redistribution of rights historically diversificarse, expandirse y cuestionar el repertorio cartográfico
and geographically denied, especially those linked to the existente para la defensa de sus geografías (formas de ser y estar en
recognition of their territories and territorialities. I conclude the el mundo), encaminadas a la redistribución de derechos histórica y
reflection addressing the constitution of the field of knowledge geográficamente negados, especialmente aquellos vinculados al
called school cartography in the context of critical geography, reconocimiento de sus territorios y territorialidades. Concluyo la
pointing out its challenges, especially with regard to the scope of reflexión abordando la constitución del campo del conocimiento
teaching geography aimed at understanding the different ways of llamado cartografía escolar en el contexto de la geografía crítica,
being in the world, founded on solidarity and defense of dignified señalando sus desafíos, especialmente en lo que respecta al alcance
life for all living beings. de la enseñanza de la geografía orientada a comprender las
diferentes formas de ser en el mundo, fundamentadas en la
solidaridad y la defensa de la vida digna para todos los seres vivos.
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N
este artigo, abordei o mapa como expressão dos diversos modos de produção,
dado que cada um deles produzem geografias específicas - aqui entendidas
como modos de estar e ser no mundo, pois os espaços nos quais vivemos
determinam nosso ser -, portanto, também cartografias que expressam as geograficidades
produzidas que, segundo Moreira (2004, p. 33-35) significa:
A relação dos grupos humanos nos ecossistemas com os outros elementos da natureza,
através do trabalho, produziu e produz formas espaciais concretas de existência. É nesta relação
dos grupos humanos com e nos diferentes ecossistemas que as geograficidades - formas
espaciais concretas de existência -, são produzidas e que a sobrevivência dos humanos no
planeta demandou e ainda demanda habilidades de atribuir significado às existências espaciais
de qualquer ente. Para tanto, diferentes grupos humanos criaram modos distintos de cartografar
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porque diversas eram suas geografias e, consequentemente, suas relações com a Terra, elemento
fundamental no processo de apresentar em um suporte imagético as geograficidades dos entes
e fenômenos.
Produzir mapas é uma das mais antigas práticas da humanidade, antecede a escrita em
praticamente 3 mil anos. Uma das imagens indicadas na bibliografia da história da cartografia
como a mais antiga, o mapa de Çatalhöyük - um grande sítio arqueológico localizado na
Anatólia, atualmente Ankara, capital da Turquia -, possui aproximadamente 8 mil e duzentos
anos, enquanto que a escrita foi materializada pelos Sumérios há 5 mil anos atrás. Assim,
podemos afirmar que os primeiros mapas, abordados na história da cartografia como área de
pesquisa, surgem no Neolítico ou Período da Pedra Polida (10 a 4000 anos a.C), onde, no
mesmo período e região, surgiu a agricultura1. Estas evidências históricas e geográficas indicam
que a produção de excedentes, decorrente da domesticação de plantas e animais, foi
fundamental para a sedentarização dos grupos humanos e reuniu condições materiais e
demandou a produção de artefatos que localizassem fenômenos em um suporte imagético que,
atualmente, denominamos de mapas. Obviamente que desde esta época até hoje, em função das
transformações tecnológicas e políticas, os mapas passaram por grandes transformações,
contudo, a permanência e utilização dos mesmos em várias sociedades em diferentes espaços e
tempos, indicam que a necessidade humana de localizar fenômenos nos lugares em um suporte
imagético é bastante antiga.
O que se pode observar na maioria dos mapas ancestrais2, inclusive em um encontrado
em 1993 na caverna de Abauntz Lamizulo, região espanhola de Navarra, cuja datação indicou
que o mesmo tem 13660 anos3, foi a necessidade de localizar fenômenos em imagens
espacialmente estruturadas para os mais diferentes usos. Este mapa foi desenhado em um
pedaço de pedra de 17cm X 12cm e:
Os sinais gravados na pedra indicam montanhas, curvas dos rios e boas áreas
para a caça. “A paisagem descrita corresponde exatamente à região
geográfica”, disse a pesquisadora Pilar Utrilla. [...] Os arqueólogos ainda
tentam decifrar por que os habitantes daquela região fizeram o mapa. “Não
temos certeza qual foi a intenção da produção desse mapa, mas ficou claro que
1
Mazoyer e Roudart (2010) defendem a teoria da existência de centros de origem da revolução agrícola neolítica,
ou seja, afirmam que a agricultura teve origem concomitante em vários lugares, tese com a qual concordamos dado
que se trata de atividade fundamental à sobrevivência de qualquer ser humano.
2
Pré-históricos, segundo a classificação da história clássica com a qual não concordo por se fundamentar em uma
perspectiva linear e eurocêntrica de história.
3
Apesar de ser o mapa mais antigo que temos notícia, a literatura clássica da história da cartografia aponta como
os mais antigos o mapa de Çatalhöyük (6000 a.C.), de Ga-Sur (300 km ao norte da Babilônia, 3800 a 2500 a.C.) e
de Bedolina (norte da Itália, 2400 a.C.), por isso, no texto indicamos o mapa do sítio arqueológico de Anatólia
como o mais antigo na história da cartografia como área de pesquisa.
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ele foi muito importante para as pessoas que habitaram aquela gruta, há 13.660
anos. Talvez eles quiseram registrar as áreas ricas em cogumelos, ovos ou
pedras para a confecção de ferramentas”, disse Pilar. Há ainda a hipótese de o
mapa ter sido usado para o planejamento de uma expedição de caça.4
4
Disponível em: <https://veja.abril.com.br/tecnologia/pesquisadores-decifram-o-mapa-mais-antigo-do-mundo/>.
5
Compreendo a alfabetização de forma ampla, como processo de aprendizagem da leitura e da escrita para ler o
mundo como defendia Paulo Freire (1989) em sua obra A importância do ato de ler: em três artigos que se
completam. A criança, ao entrar em contato com palavras e representações comumente utilizadas no ensino da
geografia, também se alfabetiza geográfica e cartograficamente pois aprende o significado de palavras que não
conhece, amplia o significado daquelas que já compõem seu repertório, aprende a produzir e a ler mapas para, a
partir da apropriação destes códigos, ler e compreender o mundo em que vive para nele possa atuar. Neste
entendimento, o processo de alfabetização encerra-se com a cessação da vida.
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A partilha da África feita pelos países europeus, de acordo com os projetos geopolíticos
dos blocos de poder é um exemplo didático deste processo, no qual as imposições e
ocultamentos das territorialidades tribais e/ou comunais compunham algumas das estratégias
de dominação dos países imperialistas.
6
Para download grátis dos volumes acessar: <https://press.uchicago.edu/books/HOC/index.html>.
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O mapa político do mundo é um bom exemplo dentre tantas outras representações que
adquiriram força de lei, pois poucos são os que questionam as fronteiras entre os países pois
trata-se de uma imagem lenta e progressivamente imposta e cultivada em quase todas as pessoas
que frequentaram as aulas de geografia nas escolas. Em outras palavras, esta imposição ainda
compõe o processo de escolarização na geografia ensinada. Via de regra, no Brasil, raramente
se aborda as configurações territoriais dos povos originários anteriores à invasão europeia e,
mesmo na atualidade, as unidades federadas e as regiões brasileiras são os recortes geográficos
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por excelência dos estudos da geografia do Brasil que se ensina. A dimensão local fica, quando
acontece, secundarizada, dificilmente se constituindo no ponto de partida do processo de ensino
e aprendizagem. Na geografia mundial ensinada, ainda permanece a abordagem descritiva dos
países por continentes na qual se apresentam mapas e descrições de suas fronteiras, clima,
vegetação, economia, características populacionais, blocos geopolíticos e econômicos,
conhecimentos estes fundamentais à exploração e expropriação dos territórios e à
mercantilização das vidas, estrategicamente pautados nas escolas pelas classes burguesas que
criaram a escola moderna, sua forma de funcionamento e conteúdos adequados aos seu projeto
civilizador: dominar o planeta e ampliar/adensar as relações capitalistas no planeta.
Dessa forma, verifica-se que a produção e acesso aos mapas no contexto do
desenvolvimento do modo de produção capitalista se caracteriza por posturas monopolizadoras
de produção e acesso a este constructo que impõe e, ao mesmo tempo, expressa uma forma de
ver e se relacionar com o mundo e com os elementos nele existentes. Neste processo, ocultam-
se fenômenos, grupos humanos a fim de facilitar e abrir caminho para as expropriações e
explorações de territórios tradicionalmente ocupados, apresentados como desabitados e/ou
inexistentes. Tais estratégias mercantilistas sobre os territórios, são fortalecidas ainda hoje, em
grande parte, pela cartografia e geografia ensinadas na educação básica. Isso não significa que
perspectivas críticas outras não estejam sendo pautadas na abordagem da geografia ensinada.
Com os processos de avaliação, pesquisas, críticas e debates das geografias e cartografias
trabalhadas no ensino, verificamos uma sensível mudança nas pautas dos livros didáticos e nas
aulas do componente curricular em questão. Verificamos também que, com os processos de
abertura política ocorridos mundialmente, há a emergência de cartografias e geografias outras
historicamente ocultadas, é o que abordei no item que segue.
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7
Colocamos no plural pois entendemos que, a despeito da formação sócio territorial ser a mesma, cidades e campos
são diversos porque as suas geograficidades (modos de estar e ser dos entes no mundo) os constituem em sua
pluralidade.
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de fiscalização para sua proteção, entre outros elementos que acabaram por demandar a
constituição de um repertório e de estratégias de lutas.
A necessidade de estudos para o planejamento, proposição e execução das ações e
estratégias é o contexto que produziu uma série de demandas por mapeamentos elaborados na
perspectiva das geografias daqueles que habitam as terras tradicionalmente ocupadas. Estas
cartografias são conhecidas pelos mais diferentes termos: levantamentos etnoecológicos,
mapeamentos etno-ambientais dos povos indígenas, mapeamento dos usos tradicionais dos
recursos naturais e formas de ocupação do território, mapeamento comunitário participativo,
mapeamento cultural, macrozoneamento participativo, etnozoneamento, etnomapeamento,
diagnóstico etnoambiental, cartografia social, entre outros (ACSELRAD e COLI, 2008, p. 24).
O que há de comum nessa diversidade de nomenclaturas e cartografias é o fato de as
metodologias utilizadas na produção dos mapas serem participativas, ou seja, quem define a
necessidade, o objetivo do mapeamento, os limites territoriais que serão mapeados, os símbolos
da legenda, os conflitos e/ou situações a serem plotadas na carta, as compreensões que embasam
o material, as imagens que nele irão constar, as legendas das mesmas, entre outros, são os
próprios grupos e/ou comunidades. Somado a isso, os encontros e/ou oficinas se dão em torno
das questões ligadas aos territórios usados8, amplamente debatidas e problematizadas pelos
mapeadores e equipe que dá suporte técnico ao processo que pode levar meses e até anos para
ser concluído. Tais ações, proporcionaram o conhecimento, questionamento, interrogação e
criação de formas coletivas e populares de produzir mapas e mapeamentos. Produziram também
oportunidades de encontros colaborativos que, via de regra, implicam em processos educativos
em que, equipes técnicas e comunidades, mutuamente, ensinam e aprendem umas com as
outras, podendo gerar convivências, diálogo de saberes, expertises, ações as mais
diversificadas, necessárias às resistências.
É importante destacar também que o desenvolvimento, a disseminação e a
popularização de ferramentas e tecnologias como as dos Sistemas de Informação Geográfica
(SIG), dos Global Positioning Systems (GPS) e do sensoriamento remoto foram indispensáveis
neste processo pois geraram “[...] um novo horizonte de produção e uso de tais instrumentos de
representação espacial [...].” (HERLIHY e KNAPP, 2003 apud ACSELRAD e Coli, 2008, p.
15). Tais acessos produziram também disputas políticas em torno do acesso às tecnologias
digitais, em função disso, muitos grupos que trabalham nas cartografias utilizam software livres
e tecnologias abertas.
8
Para Silveira (2011, p. 5), utilizando a perspectiva de Milton Santos: “O território usado é assim uma arena onde
fatores de todas as ordens, independentemente da sua força, apesar de sua força desigual, contribuem à geração de
situações.”
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É neste contexto de produção coletiva e popular que ficam evidentes as disputas entre
distintos modos de estar e ser no mundo (geografias) e as cartografias deles decorrentes que
tenho denominado de geografias e cartografias populares que deveriam estar presentes nas
escolas cujos trabalhos estão voltados à emancipação e autonomia dos sujeitos. Assim, como
afirmam vários autores que abordam a produção coletiva de mapas, estabelecem-se disputas
cartográficas emanadas dos tensionamentos e disputas territoriais, evidência didática do
imbricamento entre geografias e cartografias. Renato Emerson dos Santos (2012, p. 2, grifo
nosso) denomina estes processos de ativismos cartográficos:
Operamos com a ideia de que estes processos constituem um campo dialógico
complexo e múltiplo, que propomos chamar “ativismos cartográficos”,
formado pelo imbricamento de diferentes formas de intervenção. Estas
formas, mesmo que antagônicas, social e politicamente multilocalizadas (seja
em esferas do Estado, em movimentos sociais, organizações de base
comunitária, instituições de pesquisa, ONGs, empresas, etc.), devotadas a
intenções convergentes ou opostas, se influenciam, compartilham saberes,
acúmulos, experiências, e retroalimentam a crítica à cartografia. É neste
sentido que propomos a ideia de “ativismos cartográficos” para compreender
este campo de tensões produzido na relação entre novas formas de cartografar
e disputas sociais.
Essas novas formas de cartografar produzidas pelos grupos e/ou movimentos sociais
organizados evidenciam outros modos de leituras do território que “[...] são confrontadas às
leituras oficiais e/ou de atores hegemônicos, mas também como instrumentos de
(fortalecimento de) identidade social e de articulações políticas.” (SANTOS, 2012, p. 3). Este
fato fica evidente quando estes sujeitos expõem os objetivos de suas cartografias, pois indicam
que as mesmas constituem instrumento fundamental nas estratégias decisórias sobre o território,
efetivadas a partir do embasamento proporcionado pelos mapas produzidos. Assim, segundo os
mesmos produz-se cartografias para:
o pensar, as lutas, os acolhimentos e disputas nos e pelos territórios. Eis uma dimensão popular
da mais alta importância de se aprender a cartografar para saber pensar o espaço:
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conceitos ligados à compreensão dos inúmeros arranjos espaciais. O ponto de partida para a
compreensão dos mesmos deve ser a realidade concreta, a abstração, proporcionada pela
aprendizagem das teorias sobre o espaço é o ponto de chegada nos processos de ensino e
aprendizagem.
Finalizamos este item indicando que os ativismos cartográficos fizeram emergir
geografias e cartografias populares que têm auxiliado a interrogar a geografia e cartografia
historicamente produzidas e ensinadas, potencializando reflexões e debates de ordem
epistemológica e metodológica e subsidiando algumas transformações nas práticas educativas.
No item que segue abordamos os avanços e desafios da cartografia escolar com a emergência
do que se tem denominado de Geografia crítica nos anos 1980, aqui entendido como um
movimento diverso que, desde o referencial teórico metodológico marxista, produziu críticas,
debates e encaminhamentos teórico metodológicos passíveis de serem utilizados nos debates,
reflexões e estudos sobre a cartografia e geografia escolares.
9
Levantamento realizado pela profa. Rosely S. Archela (2000) em sua tese de doutoramento intitulada Análise da
cartografia brasileira: bibliografia da Cartografia na Geografia no período de 1935-1997.
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Até o final da década de 1980 havia apenas oito programas de Pós graduação em
geografia implantados: cinco na região sudeste, dois na nordeste e um na sul. De acordo com
Duarte (2016), uma significativa produção nacional no campo da pós graduação relacionada a
temáticas ligadas ao ensino da geografia e da cartografia , iniciada na década de 1970, será
ampliada de forma mais intensa na década de 1990, com o aumento do número de cursos de
Pós Graduação em Geografia no Brasil e também pelo fato de que muitos “[...] mestres e
doutores tornaram-se professores-pesquisadores em universidades brasileiras e passaram a
pesquisar e orientar pós-graduandos nessa área do conhecimento.” (DUARTE, 2016, p. 6).
Somado a esta conjuntura acadêmica da pós graduação, compunham o ambiente político
que marcou sobremaneira esta produção a partir do final dos anos 1970 em diante:
questionamentos, enfrentamentos e esboroamento da ditadura militar no Brasil; ampliação e
fortalecimento dos grupos e movimentos sociais organizados; amplos e intensos debates sobre
os papéis das escolas e dos professores no contexto das transformações sociais fundadas na
cidadania e democratização do país; escolanovismo piagetiano10 se colocando como resposta
possível à “escola nova” e se fortalecendo por meio das pesquisas realizadas nos programas de
pós graduação; a crítica à geografia acadêmica e escolar que se fazia e se faz, fundada nas mais
diversas compreensões e interpretações do marxismo; organização de vários segmentos da
sociedade civil na defesa e luta de direitos no contexto da elaboração da Carta Constitucional
de 1988 – sobretudo no tocante à reforma agrária, aos direitos dos povos indígenas e à
universalização da educação básica, entre outros.
Algumas produções acadêmico científicas e dos movimentos e grupos sociais
organizados vão dialogar, interrogar e constituir neste ambiente de tensionamentos e de criação,
debates, enfrentamentos e lutas sociais e políticas. O desdobramento destas práticas pode ser
visto na produção de mapas utilizados como instrumentos de explicitação dos modos de
existências, das diversas formas de organização sócio territorial, dos conflitos por terras e
territórios. Assim, grupos de mapeadores são constituídos para produzir mapas coletivos e
comunitários, cujo objetivo pode ser sintetizado na luta por dignidade das existências.
Muitos elementos passam a compor o repertório-ambiente de crítica à geografia e
cartografia ensinadas a partir dos anos 1980, sobretudo aqueles fundados na matriz teórico-
metodológica marxiana, ainda que com diferentes interpretações e desdobramentos didático
pedagógicos. O movimento de crítica à geografia, conhecido genericamente como geografia
10
Ghiraldelli (2006) indica em seu livro que Lauro de Oliveira Lima foi um dos primeiros educadores a “[...]
contribuir de forma mais decisiva para que o “escolanovismo piagetiano” fosse divulgado entre nós” tendo como
um dos seus livros mais importantes “A escola secundária moderna”, que teve sua primeira edição em 1962
chegando até a décima em 1976.”
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crítica11 foi um, dentre muitos outros elementos, que influenciou na produção dos trabalhos e
pesquisas voltados para o ensino da geografia e da cartografia, por meio dos quais se passa a
interrogar os mapas, sua produção e a forma como os mesmos são utilizados em sala de aula,
apresentados em livros didáticos e outros materiais. A cartografia para o ensino se vê, portanto,
neste contexto, questionada nas suas reflexões e fazeres.
Os debates acerca da compreensão da materialidade de vida dos educandos e educandas,
como ponto de partida no processo de ensino e aprendizagem; da dialética entre a realidade -
espaço vivido, percebido e concebido, em uma perspectiva lefebvriana (2006, 1991) e os
conhecimentos historicamente produzidos; dos conceitos cotidianos e científicos da geografia;
da vivência dos educandos fundados na compreensão da formação social da mente (Vygotsky,
1991a, 1991b); das relações interdeterminantes entre pensamento e linguagem, entre outros,
certamente influenciaram na produção de respostas aos referidos questionamentos.
É importante destacar também o impacto das obras que fizeram críticas ao ensino da
geografia e da cartografia, - a exemplo de Yves Lacoste (1988) – em seu livro intitulado A
geografia: isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra e de Ruy Moreira em obra
intitulada O discurso do avesso – Para a crítica da Geografia que se ensina (1987) e outras, no
adensamento do debate em foco. Fonseca (2004) vai apontar em seu trabalho a crise e
incongruências entre as matrizes teórico metodológicas da geografia crítica, as representações
cartográficas utilizadas no ensino da geografia, bem como dos encaminhamentos
metodológicos sugeridos na sua abordagem:
De nossa parte, como fica nítido nas análises até aqui empreendidas, nos
parece certo que essa crise na relação Cartografia e Geografia tem, antes de
tudo uma fundamentação teórica que resiste a vir à luz do dia. Em termos
gerais, ela se localiza na rigidez da Cartografia em vista de uma Geografia que
se transforma. Para se ir além dessa afirmação, todo um esforço teórico de
grande fôlego precisa ser desenvolvido. [...] (FONSECA, 2004, p. 221, grifo
nosso)
11
Esta questão é bastante complexa pois o movimento de crítica à geografia que se produziu no Brasil não era
homogêneo, tampouco composto pelos mesmos entendimentos e encaminhamentos teórico-metodológicos. Este
tema merece tratamento aprofundado, impossível de ser feito neste texto, contudo, é importante deixar registrado
que, a despeito de ser denominado no singular como geografia crítica, este movimento era bastante heterogêneo,
tanto no tocante às compreensões, interpretações e usos da teoria marxiana, quanto no que se refere ao
entendimento das relações entre os pesquisadores e os movimentos populares, sobre o ensino de geografia e
cartografia, entre ciência e política, entre outros temas.
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Afinal, tradicionalmente, o ensino de geografia tem colaborado para formar estrangeiros nos
territórios em que vivem, na medida em que não produz chaves de entendimento dos mesmos
(Autor, 2004). Poucos educandos e educandas se identificam com os conteúdos abordados nas
aulas e com as espacialidades apresentadas nos mapas... Por mais que se tenha produzido uma
série de estudos e pesquisas sobre o ensino de geografia e cartografia muitos desafios ligados
aos mesmos ainda permanecem.
Como afirmei em minha tese de doutoramento (Autor, 2004), uma parte significativa
dos desafios do processo de ensino e aprendizagem ligados à geografia e cartografia ensinadas
tem fundamento ontológico e epistemológico e não APENAS metodológico, como defendem e
fazem crer perspectivas fundadas no escolanovismo piagetiano, no tecnicismo e outras.
Acreditar que as aprendizagens dependem apenas de metodologias ativas implica em uma
postura de negação da dimensão política da instituição escolar e, sobretudo, dos conteúdos de
estudos, fundamentais à leitura crítica e emancipadora do mundo, como dizia o mestre Paulo
Freire (1989) e os pesquisadores do campo da pedagogia e psicologia histórico crítica.
A realidade vivenciada pelos sujeitos é a mesma, contudo, não é a mesma do ponto de
vista dos lugares e territorialidades que ocupam. Por exemplo, a industrialização no Brasil é um
fenômeno vivenciado e apreendido na diferencialidade da produção espacial promovida pelos
donos das indústrias, pelos sujeitos que nelas trabalham para sobreviver, pelos circuitos de
distribuição, comercialização e consumo. A questão agrária é a mesma, mas vivenciada,
percebida e representada de modo diferenciado pelos que defendem as cercas do latifúndio e/ou
da produção monocultora e, pelos do lado de cá, cujas interdições sobre seus territórios de vida,
aliados às débeis políticas públicas voltadas à dignidade das existências os obrigam a migrar
dos campos para as cidades ou mesmo para outras regiões. Como nos lembra Lefebvre em seu
livro Lógica Formal e Lógica dialética, o espaço é o mesmo, mas, ao mesmo tempo, não é o
mesmo dependendo das relações sócio territoriais que os sujeitos produzem e nas quais estão
imiscuídos. A terra tem valor de uso para indígenas, quilombolas e outros PCTs e tem valor de
troca no circuito mercantil do capital. Apreender unilateralmente a realidade (metafísica para
Lefebvre, 1991), implica em restringir o ato do conhecimento, o que significa “Propor um saber
absoluto, ou uma substância inicial (do sujeito ou objeto erigidos em verdades metafísicas), é o
que define uma ideologia [...]”. (LEFEBVRE, 1991, p. 28). Os efeitos da unilateralidade de um
discurso geográfico único e de uma cartografia única sobre os territórios, ocupados por
diferentes povos, evidencia o caráter de classe dos mesmos pois: “[...] Ela nega o resto do mundo,
esquece-o ou finge esquecê-lo. Fixando-se no pouco que atinge, o pensamento nega o movimento
e nega seu próprio movimento. Assim, elimina (aparentemente) a contradição dialética.”
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(LEFEBVRE, 1991, p. 266). Eis a questão ontológica e epistemológica cujo debate e adensamento
de reflexões se faz necessário nos estudos da cartografia e geografia ensinadas. É neste contexto
que a produção do que se conhece como “geografia crítica” e os estudos das cartografias produzidas
pelos e com os movimentos e grupos sociais organizados podem auxiliar a adensar os debates que
não foram realizados pelo “paradigma pedagógico” no qual se funda uma parte significativa dos
trabalhos da cartografia escolar. Este, ao meu ver, é o maior desafio da cartografia escolar pensada
na perspectiva da crítica à geografia.
A caminhada com os movimentos sociais, sobretudo os do campo (indígenas,
quilombolas e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra/MST) nos ensinou que as
escolas devem ser pensadas e materializadas a partir das demandas do campo popular... Este
processo de convivência e de trabalho conjunto nos ensinou também a compreender que tais
movimentos pensam escolas e processos educativos para a compreensão das espaço
temporalidades do tempo presente, a fim de que possam agir na defesa de seus territórios e
modos de existir e resistir. Não por acaso, pensam a escola e os processos educativos como
totalidades, por isso disputam: políticas e programas públicos; leis em âmbito federal, estadual
e municipal; prédio de escolas; conteúdos relevantes para compreender sua materialidade de
vida; editais de contratação docente, entre tantos outros elementos que, juntos, têm auxiliado a
materializar, fortalecer e defender escolas que atendam às suas demandas e lutas e que auxiliem
a elaborar instrumento de leitura crítica da realidade excludente que vivenciam.
Afinal, que escolas, pais, mães, familiares e/ou responsáveis, lideranças políticas dos
referidos grupos querem para seus filhos e filhas? Não há uma única resposta, pois plurais são
os povos e suas demandas por escolas e educação – fenômeno mais amplo que a escolarização.
Assim, compilei algumas manifestações destes povos quanto às escolas que querem e que estão
construindo, que nos auxiliam a construir debates, reflexões e trabalhos em torno da geografia
e cartografia ensinadas. A letra da canção de Gilvan Santos, intitulada Construtores do futuro
constitui uma boa síntese das demandas populares:
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À guisa de conclusão
Nesta reflexão, mostrei que a produção e o acesso aos mapas, principalmente aqueles
de pequena escala, desde há muito tempo, foram marcados por disputas políticas e econômicas,
sobretudo no contexto do modo capitalista de produção pois constituam e ainda constituem
instrumentos fundamentais para o avanço e adensamentos das relações capitalistas nos
territórios. Evidenciei também que os mapas antigos nos mostram a necessidade ancestral dos
grupos humanos de saberem a localização de fenômenos no espaço para nele sobreviver,
indicando a relevância de se usar nas aulas de geografia mapas em grande escala, juntamente
12
Gersem José dos Santos Luciano é indígena do povo Baniwa, mora em São Gabriel da Cachoeira (AM),
município no qual foi Secretário Municipal de Educação, é mestre em antropologia social e uma grande liderança
militante no campo da educação escolar indígena.
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com aqueles produzidos em pequena escala, via de regra, utilizados com exclusividade no
ensino deste componente curricular, o que, em grande parte, ocultava e oculta os processos e
fenômenos vivenciados por muitos povos, dificultando o entendimento dos mesmos, bem como
suas ações nos territórios de vida.
Evidenciei também que os ativismos cartográficos constituem expressões sócio
territoriais das lutas populares nos conflitos por terras, territórios, reconhecimento e
redistribuição de direitos nas lutas por dignidade de existência. É neste contexto de produção
de mapas em grande escala que emerge, o que tenho denominado de geografias e cartografias
populares. Estas, constituem ações profícuas que auxiliam a interrogar a cartografia e geografia
ensinadas, seus objetivos pedagógicos e papéis em uma sociedade marcadamente excludente.
Tendo como base o exposto, problematizei os desafios da cartografia escolar no
contexto da crítica à geografia, defendendo que um deles é o necessário adensamento de
debates, reflexões e estudos de ordem ontológica e epistemológica que podem e devem ser
subsidiados pelos estudos vinculados ao movimento de crítica à geografia produzida e ensinada,
pelos ativismos cartográficos que interrogam as pesquisas da cartografia e geografia ensinadas
e as práticas pedagógicas delas desdobradas, pelas teorias da comunicação cartográfica entre
outros elementos que auxiliem a adensar este campo de reflexão e produção. Entendemos que
enfrentar este desafio é fundamental para que a cartografia e geografia ensinadas constituam
elementos chave de leitura para a compreensão do mundo em que vivem nossos educandos e
educandas a fim de que possam co-criar e fortalecer espacialidades em um mundo onde caibam
vários mundos.
Referências
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FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo:
Autores Associados; Cortez, 1989.
HARLEY, J. B. Mapas, saber e poder. Confins, n. 5, p. 1-24, abr. 2009. Disponível em:
<http://confins.revues.org/index5724.html>. Acesso em: 31 ago. 2020.
LEFEBVRE, H. A produção do espaço. Trad. Doralice Barros Pereira e Sérgio Martins (Do
original: La production de l’espace. 4 ed. Paris: Éditions Anthropos, 2000). Primeira versão:
início - fev. 2006.
______. Lógica Formal Lógica Dialética. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1991.
______. O círculo e a espiral: para a crítica da geografia que se ensina – 1. Niterói: Edições
AGB Niterói, 2004.
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(1)
Doutora em Ensino de Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS e Pós
Doutora pela Universidade de Valência/Espanha. Professora do Programa de Pós Graduação em
Geografia - PPGG/UFAL e Professora Colaboradora do Programa de Pós Graduação em Geografia -
PPGGEO/UFPI. Professora Adjunta do Curso de Geografia Licenciatura da UFAL. Líder do Grupo de
Pesquisa em Educação Geográfica - GPEG/UFAL. Coordenadora do Laboratório de Educação
Geográfica do Estado de Alagoas - LEGAL/UFAL.
E-mail: francineilalap@gmail.com
(2)
Doutora em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo e Professora de Metodologia de Ensino
da Geografia no Centro de Educação da UFAL. Membro do Grupo de Pesquisa em Educação Geográfica –
GPEG. Coordenadora do Núcleo de Educação Ambiental/UFAL.
E-mail: mariana.raggi@cedu.ufal.br
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Resumo
Estabelecer reflexões acerca da Geografia Crítica no estágio supervisionado é o objetivo central desse texto.
Diante disso, o caminho a percorrer neste estudo vai na seguinte direção: investigar como os discentes do curso
de Geografia Licenciatura da Universidade Federal de Alagoas discutem-na e/ou percebem-na ao longo do
estágio no ambiente escolar. Sabe-se que o estágio supervisionado objetiva possibilitar um aprendizado
imperativo para que os licenciandos possam refletir acerca da docência, teorizando sobre o seu objeto de estudo
e experenciando o ensino na perspectiva da realidade que vivenciará na condição de docente. Mas, efetivamente,
isto não vem ocorrendo de modo satisfatório, tendo em vista os inúmeros problemas e/ou desafios vivenciados,
nos cursos de licenciatura em todo o país, os quais, por vezes, tem inviabilizado a concretização de ações que
coadunam com a formação docente de qualidade. Sendo assim, reflexionar sobre como vem sendo discutida
e/ou não a Geografia Crítica no âmbito do estágio supervisionado, oportuniza o entendimento de demais
questões, que podem estar, diretamente e/ou indiretamente, associadas aos percalços encontrados no ambiente
escolar.
Palavras-chave
Estágio Supervisionado; Geografia Crítica; Licenciatura.
Abstract
Establishing reflections on Critical Geography in the supervised internship is the central goal of this paper.
Therefore, the followed path in this study goes in the following direction: to investigate how the students of
Degree in Geography course at the Federal University of Alagoas perceive and/or discuss it during the internship
in the school environment. It is known that the supervised internship aims to enable an imperative learning so
that the undergraduate students can reflect on teaching, theorizing about their object of study and experiencing
teaching in the perspective of the reality they will experience as a teacher. But, indeed, this has not been
happening satisfactorily, in view of the numerous problems and/or challenges experienced in the course of it,
in degree courses all over the country, which at times has prevented the implementation of consistent actions
of qualified teacher training. Therefore, reflecting on how Critical Geography has been discussed or not within
the scope of supervised internship provides an opportunity to understand other issues, which may be directly
and/or indirectly associated with problems found in the school environment.
Keywords:
Supervised internship; Critical Geography; Degree Course.
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Iniciando o Diálogo
A
importância de se pensar a centralidade do estágio supervisionado dentre outras
questões, perpassa pela premissa de que este representa uma parte essencial e
substancial do currículo na formação inicial docente, tendo em vista a carga
horária total de 400 horas conforme a Resolução CNE/CP 001/2002.
Este estudo problematiza a presença da concepção teórica metodológica da Geografia
Crítica ao longo da experiência vivenciada no estágio supervisionado, analisando as
potencialidades de uma formação cidadã entre os futuros docentes do curso de Geografia
Licenciatura da UFAL.
Para isso, é preciso compreender o papel do estágio supervisionado nos cursos de
licenciatura, o modo como os licenciandos atuam nele, e qual o entendimento destes sujeitos
quanto a importância e/ou não da Geografia Crítica na prática docente?
Este texto está consubstanciado na pesquisa qualitativa exploratória, o qual conta com
aportes teóricos de estudiosos no assunto, a saber: Cavalcanti (2008), Lacoste (2006), Martins
(2014), Pimenta (2010), e Santos (2012, 2018). Como procedimentos metodológicos foram
realizados leituras bibliográficas, aplicação de questionários com questões abertas com um total
de 23 estagiários do curso de Geografia Licenciatura da Universidade Federal de Alagoas -
UFAL, elaboração de quadros e análises dos achados da pesquisa.
A pesquisa empírica foi realizada com dois grupos de discentes: o primeiro com 13
licenciandos do estágio 1 e 2, que dentre outras atividades, observam as aulas de Geografia
ministradas pelos professores da escola no Ensino Fundamental 2, e no Ensino Médio,
respectivamente. O segundo contendo 10 licenciandos do estágio 3 e 4, os quais ministram as
aulas de Geografia (regência) em turmas do Ensino Fundamental 2 e do Ensino Médio,
respectivamente.
Assim, foram apontadas várias indagações direcionadas aos licenciandos do estágio 1 e
2, que compreendem: nas aulas observadas durante o estágio supervisionado 1 e 2, com qual
frequência a abordagem da Geografia Crítica encontra-se presente? No decorrer das aulas
ministradas pelos professores das escolas, vocês consideram que as atividades desenvolvidas
promovem a reflexão crítica dos estudantes? Os professores das escolas utilizam referências do
cotidiano para exemplificar os conteúdos de Geografia trabalhadas em sala de aula? Vocês
consideram que isso promove a criticidade dos estudantes? Em sua opinião, as aulas observadas
nas escolas durante o estágio supervisionado 1 e 2, tem contribuído para a compreensão crítica
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Para a realização dos estágios supervisionados nas escolas, conforme o Parecer CNE/CP
009/2001: “é preciso que exista um projeto de estágio planejado e avaliado pela universidade e
escolas, com objetivos e tarefas claras, na qual as duas instituições assumam responsabilidades
e se auxiliem mutuamente” (BRASIL, 2001, p.58). Neste âmbito, o estágio deve se constituir
em um momento de preparação para o estudante, no qual é imprescindível a integração entre
professores orientadores e tutores no intuito de promover a qualificação profissional dos futuros
docentes.
No caso específico do curso de Geografia Licenciatura da UFAL, o estágio
supervisionado é dividido em quatro etapas, a saber: estágio 1, 2, 3 e 4, cada um com duração de
100 horas, sendo de responsabilidade do professor orientador o encaminhamento e
acompanhamento efetivo das atividades desenvolvidas pelos estagiários.
No que se refere ao encaminhamento, este deve fazer o levantamento das escolas e
horários referentes as aulas de Geografia existentes nas instituições de ensino selecionadas,
manter contato com a escola que irá receber o estagiário, e encaminhá-lo através de documentação
padrão elaborada pela Coordenação de Estágio. Em relação ao acompanhamento, o professor
orientador deverá realizar visitas periódicas ao ambiente escolar; organizar as fichas de frequência
preenchidas pelo professor supervisor da escola; receber os relatos de vivência dos licenciandos
(estágio 1 e 2); receber os planejamentos de aula dos estagiários (estágio 3 e 4), os quais devem
ser entregues uma semana antes de cada aula ministrada; e, por fim, receber os relatórios de
conclusão de estágio a serem entregues ao final de cada semestre letivo.
No que diz respeito ao professor supervisor da escola, este deve acompanhar os estagiários
na escola, tanto nas observações das aulas (estágios 1 e 2) quanto no período de regência (estágios
3 e 4) assistindo as aulas dos estagiários, auxiliando-os na melhoria delas, e na busca de soluções
para eventuais dificuldades. Devem também, preencher as frequências e as fichas de avaliação a
serem entregues no final do período do estágio.
A avaliação final dos estagiários consiste na parceria entre os professores das duas
instituições envolvidas, nela deve ser considerada a ficha de avaliação preenchida pelo professor
supervisor da escola, na nota final do licenciando computada pelo professor orientador da
universidade.
Diante desta breve discussão acerca da formação inicial docente, do estágio
supervisionado, e especificamente da estrutura do mesmo no curso de Geografia Licenciatura da
UFAL, partiremos a seguir para os achados da pesquisa, por meio dos diálogos com os
licenciandos dos estágios 1, 2, 3 e 4 do supracitado curso.
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discutida em sala de aula. As justificativas trazidas pelos estagiários podem ser destacadas no
quadro 01.
Quadro 01: Nas aulas observadas durante o estágio supervisionado 1 e 2, com qual frequência
a abordagem da Geografia Crítica encontra-se presente?
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Quadro 02: No decorrer das aulas ministradas pelos professores das escolas, você considera
que as atividades desenvolvidas promovem a reflexão crítica dos alunos?
Os alunos no estágio 1 sempre eram estimulados com exemplos do cotidiano, e atividades que
despertava o interesse dos mesmos a participar efetivamente das aulas.
Os professores sempre abordavam exemplos do cotidiano, o que despertava o interesse e o poder de
criticidade dos alunos.
No Estágio 2, o professor trabalhou o conteúdo globalização, e incentivou os alunos a discutirem
problemas da atualidade.
Os professores realizam muitos questionamentos em suas aulas e atividades com questões que
instigam os alunos a refletir sobre o tema/assunto estudado.
Fonte: Pesquisa Direta, 2019
Elaboração: SANTOS, 2020
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A Geografia Crítica iluminou, como já foi revelado, entre várias questões, a importância
de se trabalhar a partir das experiências vivenciadas a fim de promover o desenvolvimento de
um novo raciocínio espacial capaz de conectar as escalas do local, do regional e do global. O
lugar como dimensão espacial do vivido deve ser conectado com outras escalas espaciais a fim
de desenvolver a interpretação de que o que vivemos no local muitas vezes é produzido em
outras espacialidades, outros lugares.
Quanto as aulas observadas durante o estágio supervisionado 1 e 2, e a contribuição
destas para a compreensão crítica da sociedade pelos alunos, os estagiários explicitaram suas
opiniões no quadro 04.
Quadro 04: Em sua opinião, as aulas observadas nas escolas durante o Estágio Supervisionado
1 e 2, tem contribuído para a compreensão crítica da sociedade?
Apenas no Estágio 2, as aulas sobre globalização, o professor abordou situações econômicas e sociais
que levam a criticidade.
Devido ao professor não diversificar a aula trazendo reportagens ou questões problemas para os
alunos eles não tem tido uma compreensão crítica.
Sim, principalmente através dos problemas políticos, visando uma compreensão critica por parte dos
alunos.
Os alunos a partir de suas aulas reflexivas a que presenciei, realizaram questionamentos de problemas
socioeconômicos. As perguntas dos alunos revelam o despertar do senso crítico que inegavelmente
auxilia a compreensão crítica da sociedade.
Os professores abordaram situações sociais e ambientais com os alunos pedindo as opiniões deles e a
partir das suas vivências.
Fonte: Pesquisa Direta, 2019
Elaboração: SANTOS, 2020
A ocorrência de professores com uma visão crítica revela que a trajetória ainda não está
concluída. Ou seja, relacionar questões naturais com problemáticas socioespaciais é, como
vimos nas respostas dos estagiários, uma das dificuldades a ser enfrentada. Neste contexto, faz-
se necessário o entendimento e a discussão em sala de aula sobre as raízes da realidade desigual
da sociedade brasileira, e dos problemas vivenciados na atualidade.
Em relação as dificuldades que impossibilitam os professores da escola de desenvolver
a Geografia Crítica nas aulas, os estagiários destacaram algumas no quadro 05.
As práticas tradicionais ainda fazem parte da realidade das escolas, e essa é uma
dificuldade relevante que os professores devem assumir como desafio pedagógico a ser
realizado. Ademais, a Geografia que se ensina, muitas vezes reproduz concepções de mundo e
de sociedade nas quais estão imersas as escolas e alguns destes profissionais, os quais, por
diversas razões, estão atrelados as lacunas da formação inicial ocorrida há bastante tempo e/ou
a falta de formação continuada conectada com os aportes teóricos metodológicos voltados para
a produção de conhecimento geográfico a serviço de práticas transformadoras.
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Quadro 05: Na sua opinião, existem dificuldades que impossibilitam os professores da escola
de desenvolver a Geografia Crítica nas aulas no ambiente escolar?
Dificuldade em trabalhar a Geografia Crítica está na falta de formação do professor para elaborar uma
boa aula para desenvolver a Geografia Crítica na escola.
Ao que parece, muitos professores por desmotivação, por baixos salários ou até mesmo por falta de
interesse, não desenvolvem a Geografia Crítica. Buscam apenas construir um ensino de maneira
pragmática, mecânica que tem como objetivo seguir um cronograma escolar.
As vezes os recursos que as escolas possuem, e o tempo do professor não são suficientes para a
realização de aulas baseadas na Geografia Crítica.
Alguns professores não sabem trabalhar a Geografia Crítica.
Muitos professores estão ligados a Geografia Tradicional, o que impõe barreiras para mudar sua
metodologia rumo a Geografia Crítica, que envolve a participação do aluno, estando, portanto,
resistentes a essa mudança.
Fonte: Pesquisa Direta, 2019
Elaboração: SANTOS, 2020
Utilizo mapa, músicas e filmes que possibilitam aproximar os conteúdos a realidade dos alunos, e
desenvolver o senso crítico deles.
Levo imagens e vídeos nas aulas para despertar a curiosidade dos alunos, assim como abordo os
problemas atuais e levanto questionamentos para eles.
Procuro fazer uma relação do conteúdo com a vivência do aluno, usando recursos como imagens e
notícias da mídia para os alunos entenderem que eles são agentes ativos no espaço geográfico.
No estudo da paisagem, exemplifiquei sobre as ações do homem, sobre a natureza através de diversas
imagens, levando-os a refletir sobre seu papel na construção de mundo, tanto no aspecto individual e
coletivo, como sobre os seus direitos e deveres.
Fonte: Pesquisa Direta, 2019
Elaboração: SANTOS, 2020
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Quadro 07: Você utiliza referências do cotidiano para exemplificar os conteúdos de Geografia
trabalhadas em sala de aula? Você considera que isso promove a criticidade dos alunos?
Eu correlaciono o conteúdo com o cotidiano do aluno. Acredito ser indispensável para torná-los
críticos, pois faz com que eles sejam capazes de refletir e opinar sobre a realidade em que vivem.
É fundamental aproximar os conteúdos discutidos em sala de aula com a realidade social dos alunos.
Isso faz os alunos entenderem sobre o mundo em que vivem.
As relações com o cotidiano facilitam a aprendizagem, e possibilita que a partir desses exemplos, os
alunos comecem a fazer questionamentos, formando a autonomia crítica. Assim, eles percebem que
todos estão envolvidos e são responsáveis pela preservação do Planeta.
Trabalhar com exemplos próximos, faz os alunos se reconhecerem enquanto agentes transformadores
do espaço geográfico, e faz com que pensem e reflitam suas práticas, formando alunos críticos.
Procuro contextualizar o assunto com a realidade dos alunos. Assim, eles perceberam que a
responsabilidade não se restringe as pessoas de outras cidades, estados ou países.
Fonte: Pesquisa Direta, 2019
Elaboração: SANTOS, 2020
Considerar o cotidiano dos alunos é uma opção adotada pelos estagiários em suas aulas,
os quais salientam a importância desta relação teoria (conteúdo geográfico) e prática (a
realidade do aluno) no processo de ensino aprendizagem no intuito de estabelecer o diálogo
com os alunos, tornar o aprendizado dos conceitos e conteúdos de Geografia mais atraentes, e
por fim, dá início a construção de uma consciência crítica cidadã com os seus alunos.
Os licenciandos do estágio 3 e 4 salientam no quadro 08, se acreditam e/ou não que suas
aulas têm contribuído para a compreensão crítica da sociedade.
As aulas sempre são trazidas para a realidade dos alunos, o que permite fazer compreensões sobre os
problemas sociais existentes, e se posicionarem criticamente.
A relação do conteúdo com a realidade do aluno da escola favorece esta crítica, principalmente sobre
os problemas sociais e ambientais.
Os alunos demonstram interesse quando se trabalha o cotidiano deles, daí discutimos muitas questões
políticas e sociais, que os levam a refletir, e isso facilita o processo de ensino-aprendizagem.
A questão política e econômica já tive a chance de tratar, e despertou o interesse dos alunos,
desenvolvendo o senso crítico deles.
Fonte: Pesquisa Direta, 2019
Elaboração: SANTOS, 2019
Os estagiários demonstraram que suas aulas tem possibilitado diálogos com os alunos
baseados na criticidade, notadamente quando discutem os problemas sociais, políticos,
econômicos e ambientais, relacionando-os com a realidade dos estudantes. Esta alternativa
utilizada, denota um saber fazer docente partindo dos problemas espaciais, enquanto proposta
metodológica para a construção da criticidade dos alunos nas aulas de Geografia.
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Algumas vezes tem-se a recusa da própria turma em participar das discussões, não havendo abertura
para um posicionamento mais crítico sobre o assunto.
As vezes o próprio sistema direciona uma forma ou modelo sequencial que impede a autonomia do
professor, de trabalhar de modo mais fortemente a Geografia Crítica.
Existem situações que dificultam por conta de algumas limitações do próprio conteúdo, porém não
chega a impossibilitar.
As vezes, estamos em uma escola, na qual a linha ideológica da mesma, impede de nós
desenvolvermos um pensamento crítico a respeito de tal assunto com os alunos, notadamente quando
envolve responsabilidade governamental (ocorre muito isso na rede estadual).
Há casos em que nos encontramos em uma situação, na qual não podemos instigar os alunos a lutarem
por seus direitos intrínsecos à escola na qual estão inseridos.
Fonte: Pesquisa Direta, 2019
Elaboração: SANTOS, 2020
Opinião dos licenciandos dos Estágios 1 e 2 Opinião dos licenciandos dos Estágios 3 e 4
O ensino da Geografia Crítica possibilita formar Contribui, pois possibilita o aluno opinar
pessoas conscientes para que possam refletir e sobre os problemas e a conjuntura social, e a
analisar o mundo ao seu redor. política da sociedade.
A Geografia Crítica permite a construção do A Geografia Critica instiga o aluno a ser um
conhecimento que torna possível ao aluno entender agente ativo. Faz com que o aluno perceba o
a sociedade em que vive, perceber os problemas seu papel na sociedade, conscientizando-o
sociais e se posicionar como um cidadão crítico, sobre as questões social, política e econômica.
produzindo uma ação e intervenção que possa
culminar em mudanças reais deste mundo
globalizado e capitalista.
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Possibilita a construção do aluno questionador, o que A Geografia Crítica faz com que o aluno
busca entender e compreender a realidade que ele se reflita no que ele está fazendo para contribuir
encontra e buscar soluções para mudá-la. ou modificar a sociedade em que vive e/ou o
espaço geográfico como um todo.
A Geografia Crítica auxilia o sujeito a exercer seu A Geografia Crítica mostra uma nova
papel social a partir do momento que reflete sobre perspectiva de visão de mundo, de análise da
sua vivencia e suas ações sobre o meio, e no realidade, levando o aluno a pensar, e com isso
desenvolvimento do senso crítico do aluno enquanto constrói um cidadão mais participativo.
cidadão do mundo.
Fonte: Pesquisa Direta, 2019
Elaboração: SANTOS, 2020
Considerações Finais
Referências
LACOSTE, Yves. A geografia – Isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra.
Campinas, SP: Papirus, 2006.
MARTINS, Rosa Elisabete Militz W. A trajetória da geografia e o seu ensino no século XXI.
In: CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos; TONINI, Ivaine Maria. O ensino de geografia e
suas composições curriculares. Porto Alegre: Mediação, 2014.
PIMENTA, Selma G.; LIMA, Maria. S. L. Estágio e docência. 5. ed. São Paulo: Cortez,
2010.
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(1)
Professor da Unidade Acadêmica de Geografia, Universidade Federal de Campina Grande
E-mail: maltaslma@gmail.com
(2)
Professora do Departamento de Geografia, Universidade Estadual da Paraíba, Campus I
E-mail: ajosandra@yahoo.com.br
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Resumo
Esta pesquisa teve como objetivo principal apresentar algumas práticas desenvolvidas no período considerado
para esse estudo, (2012 a 2020) com o Programa de iniciação à docência PIBID na Universidade Estadual da
Paraíba – UEPB e Universidade Federal de Campina Grande - UFCG no que concerne a formação inicial
embasada nas tendências críticas de ensino de Geografia, com destaque para método dialético que, pelo menos
no nível das intenções, a nosso ver, deveria se materializar e difundir-se no currículo da escola básica, através
da dimensão crítica na Geografia escolar. Foram desenvolvidos diversos projetos de intervenção e/ou
colaboração, a partir da articulação entre as temáticas do currículo escolar e o lugar social dos discentes e
docente, objetivando articular as diversas escalas geográficas à escala local, possibilitando a construção de
conhecimentos significativos e uma maior compreensão da realidade, visando estimular a transformação social
e a participação cidadã. Para elaboração deste artigo foram analisados os relatórios dos subprojetos Geografia
para o período já assinalado e os relatos de experiência dos autores na coordenação das atividades dos referidos
subprojetos. As bases teóricas da pesquisa se ligam a espacialidade geográfica, esta concebido numa visão
crítica, a exemplo da totalidade e do lugar social, debatidos por vários geógrafos representantes da Geografia
Crítica, como Milton Santos, Armando Correia da Silva e Lana de Souza Cavalcanti por exemplo, cujas obras
fundamentaram as pesquisas em ensino de Geografia. A pesar disso, nota-se que o programa vem sofrendo,
nos últimos anos, um desmonte em suas concepções e ações o que tem acarretado em enorme retrocesso
político-educacional e operacional.
Palavras-chave
PIBID, Tendências críticas de ensino Geografia, Currículo, Lugar social do estudante.
Resumen
La investigación tuvo como su principal objetivo presentar algunas prácticas desarrolladas para el período de
tiempo llevado a cabo para este estudio, (2012 a 2020), a través del Programa de iniciação à docência PIBID de
la Universidade Estadual da Paraíba – UEPB y la Universidade Federal de Campina Grande – UFCG, con
respecto a la formación inicial basada en las tendencias críticas de la enseñanza de la Geografía, con énfasis en
el método dialéctico que, por lo menos al nivel de las intenciones, en nuestra opinión, debería materializarse y
propagarse en el programa de estudios de la educación primaria y secundaria, a través del aparato crítico en el
sector de la Geografía escolar. Han sido desarrollados diversos proyectos de intervención y/o colaboración, a
partir de la articulación entre las temáticas del plan de estudios escolar y la posición social de los estudiantes y
profesores, cuya finalidad es articular las diversas escalas geográficas a la escala local, pirmitiendo la
construcción de conocimientos significativos y un entendimiento aún más amplio de la realidad, y cuyo fin es
estimular la transformación social y la participación del ciudadano. Para la elaboración de este artículo han sido
analizados los informes de los subproyectos de Geografía para el período de tiempo que ya hemos señalado y
los relatos de las experiencias de los autores en la coordinación de las actividades de los subproyectos de los
que anteriormente hemos hablado. Los fundamentos teóricos de la investigación están relacionados a los
espacios geográficos, éstos concebidos bajo un presupuesto crítico, por ejemplo, la totalidad y el lugar social,
que ya han sido debatidos por muchos geógrafos que representan la Geografía Crítica, como Milton Santos,
Armando Correia da Silva y Lana de Souza Cavalcanti, cuyas obras han fudamentado las investigaciones de la
enseñanza de la Geografía. Sin embargo, observamos que el programa ha sufrido, en los últimos años, un
desmantelamiento en sus concepciones y acciones, lo que ha provocado un inmenso retraso político y
educacional, además de operacional.
Palabras clave:
PIBID, Tendencias críticas de la enseñanza de Geografía, Plan de estudios, Lugar social del estudiante.
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Introdução
E
ssa reflexão é fruto de um convite efetuado pela organização da presente obra
para que, conjuntamente e enquanto coordenações da área de Geografia,
efetuemos uma análise acerca das ações do Programa Institucional de Bolsas
de Iniciação à Docência – PIBID, através do desenvolvimento dos Subprojetos Geografia nas
instituições Universidade Estadual da Paraíba e Universidade Federal de Campina Grande -
UFCG, no período de agosto de 2012 a Fevereiro de 2020.
Como recorte temático, nos foi solicitado refletir sobre as estratégias do
desenvolvimento capitalista desenvolvidas tomando como referência o método dialético,
materializado na Geografia pela concepção crítica, que concebe o espaço enquanto lócus da
relação natureza-sociedade, mediada pelas contradições das relações de trabalho humano.
Assim, o desenvolvimento capitalista, pela qual o espaço é recriado reproduz um processo
contraditório e desigual, fruto das relações sociais, que se estabelecem no âmbito do modo de
produção capitalista.
No caso da UFCG, nos detemos no edital nº 007/2018 e na portaria nº 158/2017, ambos
publicado pela CAPES, além de outros instrumentos regimentais emanados da própria UFCG.
Assim, o aludido programa teve início em 09/2018 e término em 01/2020. Assim, o PIBID foi
estruturado partir de um projeto que foi submetido e aprovado pela CAPES, contando com uma
estrutura organizacional, a saber: Condenação geral do programa, Coordenadores de área,
Supervisores de instituições escolares e estudantes (bolsistas (ID) e voluntários). Note-se que,
o número de estudantes envolvidos no aludido programa foi de 13, sendo doze bolsistas e um
voluntário, além de quatro docentes, sendo dois coordenadores de área, (UFCG) e dois
supervisores escolares da rede de ensino pública estadual de Campina Grande-PB. Nesse
contexto, é interessante notar a drástica redução do número de bolsas disponibilizadas para os
estudantes, ficando mais evidente, tal redução, se compararmos a versão do mesmo programa
em contexto pretérito (2014), quando o número de bolsistas, aptos a ingressar no programa foi
de 32 alunos, o que representa uma redução de 19 bolsas a menos em número absoluto ou 146
% em relação ao número ofertado, em comparação com o período de 2018 a 2020. Essa redução
é emblemática e se insere num processo maior de precarização das IES públicas do país, em
particular, para a formação docentes.
Quanto ao Subprojeto Geografia UEPB/Campus I a sua formatação, durante todo o
período das atividades, contou com coordenação de área, três professores supervisores e quinze
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discentes da graduação, que atuaram como bolsistas. Estes sempre eram substituídos quando da
conclusão do curso ou por motivos de força maior, a exemplo da entrada antecipada no mercado
de trabalho. No período de 2012 até 2014, as escolas parceiras, todas da rede Estadual de Ensino
do Estado da Paraíba, foram: a Escola Normal Estadual Padre Emídio Viana Correia, a Escola
Estadual Senador Argemiro de Figueiredo (POLIVALENTE) e a Escola Estadual Hortênsio de
Souza Ribeiro (PREMEN). Do período de 2014 a 2018, o Subprojeto foi desenvolvido nas
Escolas Estaduais São Sebastião, Severino Cabral e Assis Chateaubriand.
Todo esse tempo dedicado ao planejamento e execução da prática pedagógica na área
de Geografia, lançam bases para serem discutidas determinadas questões relativas à educação
básica, sobretudo no que concerne ao papel da Geografia crítica no ensino. Durante esse
período, foram desenvolvidos diversos projetos de intervenção e/ou colaboração, a partir da
articulação entre as temáticas do currículo escolar e o lugar social dos discentes, objetivando
articular as diversas escalas geográficas à escala local, possibilitando a construção de
conhecimentos significativos e uma maior compreensão da realidade, visando estimular a
transformação social e a participação cidadã.
Mediante o exposto, o presente artigo objetivo apresentar algumas práticas
desenvolvidas durante o período de vigência do PIBID nas duas instituições, já que foi, em
parte, substituído em 2018 pelo Programa Institucional Residência Pedagógica, no que
concerne a formação inicial embasada nas tendências progressistas do ensino, com destaque
para método dialético, que pelo menos no nível das intenções, ao nosso ver, deveria se
materializa no currículo da escola básica, através da dimensão crítica na Geografia escolar.
Fonte:https://capes.gov.br/images/stories/download/bolsas/1892014-relatorio-PIBID.pdf
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seja, aprimorar a formação inicial e continuada dos professores brasileiros, além de contribuir
com a melhoria dos processos de ensino-aprendizagem na educação básica, uma das metas do
Plano Nacional da Educação.
Como fio condutor das suas ações, o Subprojeto Geografia PIBID UFCG e UEPB
guardam convergências, visto que ambos foram estruturados a partir de alguns conceitos que
se relacionam com o espaço geográfico, este concebido numa visão crítica, a exemplo da
totalidade e do lugar social, debatidos por vários geógrafos representantes da Geografia Crítica,
como Milton Santos, (2005; 2006; 2014) Armando Correia da Silva1, (1991) Lana de Souza
Cavalcanti (1998; 2008) por exemplo, cujas obras fundamentaram dezenas de trabalhos de
Geografia.
No que concerne à totalidade, este conceito vem se aprimorando a partir da década de
1970 e, na Geografia, Milton Santos considera que o espaço precisa ser assim considerado:
conjunto de relações realizadas através de funções e formas apresentadas historicamente por
processos, tanto do passado como do presente. Tal conceito, portanto, permite a articulação
entre os diversos componentes do espaço geográfico (homens, grupos, Estado, capital,
instituições, etc.), ganham concretude, relacionam-se e espacializam-se. Permite também
entender interações/conexões entre espaços e tempos diferentes, desiguais, em suas
1
O Professor Armando Correia da Silva, influenciou, em termos de suas concepções o subprojeto de Geografia da
UFPB, tendo tido pouca influência no subprojeto do PIBID de Geografia da UFCG.
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contribuindo para a continuidade de uma Geografia descritiva e que pouco ou em nada contribui
para as transformações sociais.
Por outro lado, se o professor adotar como orientação basilar para suas aulas o ensino a
partir das contradições inerentes ao espaço geográfico, buscando propiciar aos alunos uma
melhor compreensão desse espaço em que estão inseridos, influenciará, num contexto de
mudança social a formação para a cidadania, já que propicia a compreensão da realidade e a
consequente atuação sobre ela. Essa educação para a cidadania só acontece quando o discente
é, de fato, integrado ao ensino, ou seja, o estudante não pode ser um ser deslocado do mundo
em que vive, como se fosse um ser neutro e abstrato (CALLAI, 2001).
Ao confrontar várias situações entre si e com as condições concretas do seu próprio
mundo próximo, o discente vai construindo um conhecimento próprio e, mais do que isto, a
compreensão de regras e leis que regem este mundo atual; pode inclusive buscar o que as funda
e fazê-las compreensíveis como processo historicamente construídos.
A partir desses pressupostos, a atuação da equipe integrante do Subprojeto
Geografia/PIBID/UEPB e UFCG buscou trabalhar o espaço geográfico como uns lócus da
relação sociedade-natureza, mediada pelo trabalho, num processo de mudanças constantes,
determinadas por uma lógica maior, a do capital. Para atingir esse objetivo, lançou mão de
diversas estratégias, de forma a buscar promoção e a integração da realidade discente na
construção de um ensino de Geografia significativo, a partir da utilização de diversas linguagens
e estratégias metodológicas que proporcionasse protagonismo aos discentes, de forma a
promover a flexibilização do currículo oficial, promover mudanças favoráveis ao processo de
ensino-aprendizagem de Geografia, na educação básica e renovar o ensino, adequando-o ao
contexto dos discentes e em consonância com as mudanças em curso no espaço.
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carta topográfica de Campina Grande. Assim, a partir da construção maquete, foram urdidos
conceitos como o de divisores de águas, vertentes, vales fluviais e planícies de inundação.
Posteriormente, com a maquete, slides e vídeos, discutiu-se como as formas de relevo
presentes naquele espaço foram apropriadas no processo de urbanização, bem como as
problemáticas socioambientais decorrentes de todo esse processo desigual de apropriação do
referido espaço urbano.
Na sequência, foram formadas equipes para a realização de estudo de campo, para que
os alunos pudessem estudar as paisagens do Alto Branco, Lauritzen e Rosa Mística, inclusive
indo até o fundo do vale, representado pelo leito do Riacho das Piabas. Nesse trajeto, foram
trabalhados vários aspectos da paisagem, sem se descuidar da compreensão da atuação do
capital sobre a desigual apropriação dos espaços dos trechos percorridos.
Como culminância desse projeto, a equipe convidou o representante da Defesa Civil da
Cidade de Campina Grande para proferir palestra na escola, visando analisar como as classes
menos favorecidas, habitantes das encostas e fundos de vale são afetadas nos períodos de
chuvas mais críticas na cidade de Campina Grande-PB, inclusive sendo motivo de matéria na
mídia local.
Tratou-se de um projeto que teve a adesão e participação intensa da turma participante
e que foi desenvolvido tomando como referência o fato de que o relevo não é algo estanque,
desvinculado das relações entre sociedade e natureza e da realidade dos alunos. Para dar
consistência a abordagem, tomou-se como referência os trabalhos de Ascensão (2009),
Bertolini e Carvalho (2010) e Morais (2013).
Tais autores partem do questionamento da escala em que o relevo é trabalhado no ensino
básico, procurando chamar atenção para a necessidade de uma aproximação com o espaço em
que o aluno está inserido, propiciando relações acerca do seu papel na produção do espaço
geográfico, fornecendo subsídios para a compreensão de problemáticas advindas das
apropriações inadequadas do relevo vivenciadas pelos alunos (BRITO, 2017).
Assim como o trabalho de Brito (op. cit.), todos os bolsistas que integraram o Subprojeto
nos seus cinco anos de existência desenvolveram os seus planos de trabalho tomando como
referência a aprendizagem a partir de projetos, fazendo uso dos diferentes métodos que
embasam o desenvolvimento das pesquisas geográficas, com destaque para a análise das
contradições oriundas da apropriação do espaço movida pelo capital, articulando o
conhecimento do livro didático com a realidade do seu entorno.
No caso da UFCG, exemplificamos com uma atividade desenvolvida no ano de 2019
na escola EEEF Monte Santo, situado no bairro de mesmo nome na cidade de Campina Grande-
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PB. A ideia partiu da docente colaboradora do PIBID, Profa. Sonia Maria de Lira. Anote-se que
a referida propositura, logo recebeu adesão do Supervisor da escola e dos estudantes envolvidos
com a proposta.
Observe-se também, que a atividade proposta foi desenvolvida concomitantemente a
oferta da disciplina prática de ensino de Geografia no segundo semestre de 2019. Assim, a
atividade teve como mote o tema: Geografando no Entorno da Escola. O referido tema teve
como objetivo principal realizar um estudo do meio, (ARCHELA; CALVENTE, 2008) que a
priori pode ser desenvolvido em qualquer nível de ensino. Dado esse contexto, optamos pelas
séries finais do ensino fundamental. No caso em apreço, partiu-se da compreensão dos
conceitos geográficos de Paisagem (SANTOS, 2014), espaço (Santos, 2006) e Lugar (TUAN,
1983). O desafio que enfrentamos conjuntamente foi o de demonstrar a possibilidade de um
estudo do meio a partir da dimensão crítica do ensino, articulada a perspectiva acessória do
conceito de lugar e espaço de vivido em Tuan.
No caso em apreço, os estudantes foram organizados em grupos que se
intercomplementavam, atuando, consoante as seguintes etapas: Estudo bibliográfico,
planejamento das atividades de campo, saída de campo para coleta de dados, sistematização
dos dados de campo, apresentação e integração dos dados coletados, debate, avaliação e
compartilhamento dos dados sistematizados e culminância da atividade.
Como a área do entorno da escola EEEF de Monte Santo, (figura 02), se encontra
próximo a Universidade Federal de Campina Grande, os estudantes percorreram o trajeto a pé,
saindo da UFCG até a referida escola (figura 03). No percurso os grupos foram fotografando as
paisagens, entrevistando moradores das cercanias da aludida escola. Com essa ação os grupos
objetivarão compreende o funcionamento dos sistemas de objetos e ações, as contradições socio
espaciais, desveladas no entorno da mencionada instituição (figura 04).
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Considerações finais
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Referências
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SP: Papirus, 1998,
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(1)
Professora da Unidade Acadêmica de Geografia (UAG), da Universidade Federal de Campina Grande
- UFCG
E-mail: sonia.lira@professor.ufcg.edu.br
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Resumo
A Geografia tem contribuído com análises que vão do local ao global, investigando as inter-relações nos micro
e macroespaços perpassando por reflexões mais objetivas ou subjetivas, conforme suas diversas concepções
geográficas. Nessa perspectiva, a Geografia Crítica traz contribuições importantes aos referidos estudos, mas
ainda precisa avançar nas discussões sobre as relações de poder nos microespaços. Como também, a Geografia
Escolar continua usando processos pedagógicos mnemônicos, desvinculados da realidade dos estudantes, a
partir de análises de espaços distantes. Dessa forma, o presente trabalho, tem o objetivo de verificar como
algumas normatizações e documentos curriculares ressaltam sobre as diversidades, através das relações nos
microespaços, envolvendo especificamente indígenas, negros e mulheres, e como a Geografia Crítica pode
contribuir com essas reflexões através da disciplina escolar. Utilizamos no percurso metodológico a análise de
conteúdo a partir de estudos sobre algumas legislações que enfocam fatos educacionais e tratam de aspectos da
diversidade, além de duas propostas curriculares: os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e a Base
Nacional Comum Curricular (BNCC) de Geografia. As normatizações e documentos curriculares que tratam
sobre estes temas trouxeram avanços e retrocessos conforme as políticas educacionais implementadas no Brasil
nas últimas décadas. Assim a Geografia Crítica, como fortalecedora da geografia militante, precisa ampliar suas
análises sobre tais temáticas, influenciando os espaços educacionais e contribuindo para a formação cidadã
comprometida com as mudanças socioespaciais.
Palavras-chave
Ensino Geográfico; Geografia Crítica; Diversidade.
Abstract
Geography has contributed with analysis ranging from local to global scale, assessing the interrelationships in
micro and macro spaces, running through subjective and objective reflections, due to its myriad Geographic
conceptions. In this perspective, Critical Geography has greatly enriched the debate, but still there is some
advance to be made on power relationships matters in micro spaces. In the other hand, School Geography still
uses mnemonic pedagogical processes, disconnected from the students’ reality, and through analysis of distant
spaces. Thus, this work goals to assess how some standardizations and curriculum documents approach
diversities, through micro spaces relationships, involving specifically indigenous, black and women, and how
Critical Geography may contribute to this matter in the school. The content analysis was used to research some
laws that focus educational issues and treat diversity aspects, and beyond that, two others curriculum proposals:
the National Curriculum Parameters (PCN) and the Common National Curriculum Base (BNCC) of Geography.
The standardizations and curriculum documents that regulate this subject have brought advances and setbacks
over the last few decades, according to the various educational policies implemented in Brazil. Thereby, the
Critical Geography, since it strengthens the militant Geography, needs to expand its analysis about this theme,
influencing the educational spaces and contributing to form citizens committed to social-spatial changes.
Keywords
Geographic teaching; Critical geography; Diversity.
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Introdução
O
s aspectos culturais e socioespaciais do mundo contemporâneo têm se
modificado de forma ampliada, principalmente através do avanço do sistema
capitalista, trazendo inter-relações híbridas entre os mais diversos
segmentos, nas diferentes escalas. Ademais, as desigualdades e a exclusão aumentaram,
persistindo posturas autoritárias e de violências com injustiças a muitos setores minoritários,
entre eles: indígenas, mulheres, negros, etc.
A Geografia tem contribuído com análises que vão do local ao global, perpassando
reflexões mais objetivas ou subjetivas, conforme suas diversas abordagens geográficas para
analisar as inter-relações nos micro e macroespaços. Nesse contexto, a Geografia Crítica traz
contribuições importantes às referidas análises, mas ainda precisa avançar nas reflexões sobre
as relações de poder nos microespaços. Como também, a Geografia Escolar usa procedimentos
pedagógicos que se utilizam de processos mnemônicos, desvinculados da realidade vivenciada
pelos estudantes, refletindo muito mais espaços distantes do que os cotidianos.
As inter-relações que ocorrem no espaço escolar, nos territórios domiciliares, nos
bairros ou aldeias em que os estudantes residem são pouco trabalhadas na disciplina geográfica.
Nos espaços mencionados, continuam a existir ações discriminatórias que levam às violências
domésticas, escolares e comunitárias, necessitando de reflexões e proposições de mudanças, e
verificando como tais práticas se construíram através do patriarcado e do patrimonialismo, e de
que forma devem ser combatidas.
Dessa forma, os grupos minoritários começaram a ser focados nas análises geográficas,
envolvendo discussões sobre suas territorialidades, identidades, ações do Estado, normatização,
entre outros aspectos. No entanto, a Geografia Escolar precisa se debruçar sobre essas questões,
inclusive questionando os currículos da área de forma crítica.
Sendo assim, o objetivo deste trabalho é verificar como algumas normatizações e
documentos curriculares ressaltam questões sobre as diversidades, a partir das relações nos
microespaços, especificamente envolvendo indígenas, negros e mulheres, e como a Geografia
Crítica pode contribuir com essas reflexões a partir da disciplina escolar.
Neste caminho metodológico, utilizamos a análise de conteúdo através de estudos sobre
algumas legislações que enfocam fatos educacionais e tratam de aspectos da diversidade, além
de duas propostas curriculares: os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) de Geografia.
A análise de conteúdo é “uma técnica de investigação que, através de uma descrição
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[...] Nenhum dos objetos sociais tem domínio sobre o homem, nem está
presente de tal forma no cotidiano dos indivíduos [quanto o espaço]. A casa,
o lugar de trabalho, os pontos de encontro, os caminhos que unem entre si
esses pontos são elementos passivos que condicionam a atividade dos homens
e comandam sua prática social [...]. (SANTOS, 2004, p. 172).
Esses espaços precisam ser analisados através das práticas sociais que neles ocorrem,
verificando-se as contradições que ali acontecem e as relações de poder existentes. Dessa forma,
indivíduos e grupos que convivem nos espaços cotidianos também precisam ser investigados
pela Geografia Crítica, e a disciplina escolar necessita trabalhar esses aspectos com os cidadãos.
A seguir, serão feitas breves considerações sobre o conceito de espaço a partir de dois geógrafos
críticos: Milton Santos e David Harvey.
Desse modo, o cotidiano acontece através dessas três ordens de ação, sendo necessárias
análises espaciais que deem conta das questões simbólicas construídas pelo patriarcado e pelo
patrimonialismo; dos formalismos jurídicos, que tentam manter ou transformar a ordem
existente; e das ações técnicas no campo educacional, as quais também contribuem com
transformações nas relações espaciais.
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Através dos lugares, as formas de agir podem ter a predominância de uma ou outra
condição de atuação, através das ações racionais. Por isso, “a importância do lugar na formação
da consciência vem do fato que essas formas do agir são inseparáveis, ainda que, em cada
circunstância, sua importância relativa não seja a mesma” (SANTOS, 1999, p. 67).
Harvey (2008) também trabalha com o conceito de espaço relacionando-o ao de tempo,
que é muito importante em nossas análises, porque elementos pertencentes às relações do
espaço vivido foram produzidos ao longo do tempo. O autor, reiterando Bourdieu, coloca que
as práticas comuns são determinadas pela relação dialética entre o corpo e a organização
estruturada do espaço e do tempo. “E é exatamente a partir dessas experiências (na casa em
particular) que se impõem esquemas duradouros de percepção, de pensamento e de ação”
(HARVEY, 2008, p. 198).
Além disso ele analisa as práticas socioespaciais através de aspectos objetivos e
subjetivos, caracterizando grupos que constroem diferentemente o tempo e o espaço social. Por
exemplo, o autor citado anteriormente, destaca que:
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Para Faoro, parece que o contraste entre a família como instituição privada e
o poder estatal exercido pelo soberano apenas se coloca a partir da
transformação do feudalismo em capitalismo. Porém, se o patriarcado é o
princípio sob o qual o patrimonialismo se forma, é necessário incluir na
análise a relação do patrimonialismo com a família, a não ser que a
centralização governamental seja de tal forma idealizada que nada existe fora
do domínio público [...].
Consequentemente, a opressão que atua sobre os corpos das pessoas negras e das
mulheres faz parte da lógica capitalista de exploração, a qual se amplia para outras esferas de
domínio: sexual, da violência, da subordinação dos interesses e desejos do seu senhor. Neste
caso, as escravas negras, além de vítimas sexuais de seus donos, também deveriam procriar
para produzir novos escravos, aumentando os lucros deles.
É necessário destacar que a repressão existente sobre os corpos das pessoas negras e
das mulheres persiste até os dias atuais, através dos estupros, dos feminicídios, das mortes dos
jovens negros nas favelas, do desrespeito policial e dos assassinatos dos negros nos Estados
Unidos e em outras partes do mundo, etc.
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Nesse sentido, ainda persistem dicotomias quanto às áreas de enfoque desses estudos,
como também a Geografia Cultural tem predominâncias nas referidas pesquisas. Dessa forma,
a Geografia Crítica ainda precisa fortalecer esse campo de investigação espacial.
A educação também vem ampliando os debates sobre o combate a tais discriminações e
violências. Isso é necessário porque as referidas posturas autoritárias e violentas continuam
ocorrendo nos territórios domiciliares, escolares, nas empresas e nos demais espaços de
vivências coletivas.
Entretanto, vivemos num momento histórico em que setores conservadores da sociedade
tentam manter as relações de dominação através de práticas antidemocráticas, ampliando a
submissão de segmentos socialmente marginalizados. Percebemos isso por meio dos embates
nas casas legislativas que colocam propostas de normatizações em âmbito federal, estadual ou
municipal, refletindo o patriarcado e o patrimonialismo existentes. Além de tudo, documentos
educacionais que implementam propostas curriculares também esboçam essas posturas. Mas
existem resistências e reações que se contrapõem, demonstrando as contradições presentes
nessas normatizações e nas práticas sociais. Por isso, a seguir, serão feitas reflexões sobre
algumas dessas legislações e dois documentos curriculares.
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Lei nº 10.639/2003
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Esse tipo de debate é necessário ocorrer também por parte dos profissionais de
Geografia, pois tais inter-relações são verificadas através das ações espaciais, mas como bem
ressalta Munanga, muitos dos docentes ainda necessitam de formação e superação de seus
preconceitos introjetados pela cultura racista.
Contudo, isso acontece não somente com as pessoas negras, mas também com os povos
autóctones, por isso houve, na época da promulgação da referida lei, mobilizações para que
fossem acrescidas as discussões sobre os indígenas. Em 2008, foi sancionada a Lei 11.645,
alterando novamente a LDB 9.394/1996 e a Lei 10.639/2003, passando assim a ter nova redação
o Art. 26-A, como destacamos a seguir:
Dessa maneira, foram acrescidos ao currículo escolar também os estudos sobre a história
e a cultura indígena. No entanto, da mesma forma que esta implementação teve dificuldades no
tocante à história e à cultura afro-brasileira, quanto à formação docente, isso se repete com a
história dos povos indígenas, inclusive na disciplina geográfica.
Em oposição, setores conservadores brasileiros que se colocam contra políticas
afirmativas e emancipação de segmentos historicamente marginalizados também se
mobilizaram e apresentaram outro projeto de lei, que propõe mudanças às diretrizes da
educação nacional. O PL 867/2015 propõe o “Programa Escola sem Partido”, que tramita na
Câmara Federal há cinco anos.
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O Projeto de Lei nº 867, de 2015, proposto pelo então deputado federal Izalci Lucas, do
PSDB/DF, defende a inclusão entre as Diretrizes e Bases da Educação Nacional do “Programa
Escola sem Partido”, o qual, no seu artigo 4º, enfatiza que o professor no exercício das suas
funções:
I - Não se aproveitará da audiência cativa dos alunos, com o objetivo de
cooptá-los para esta ou aquela corrente política, ideológica ou partidária;
II - Não favorecerá nem prejudicará os alunos em razão de suas convicções
políticas, ideológicas, morais ou religiosas, ou da falta delas;
III - Não fará propaganda político-partidária em sala de aula nem incitará seus
alunos a participar de manifestações, atos públicos e passeatas;
IV - Ao tratar de questões políticas, socioculturais e econômicas, apresentará
aos alunos, de forma justa, as principais versões, teorias, opiniões e
perspectivas concorrentes a respeito;
V - Respeitará o direito dos pais a que seus filhos recebam a educação moral
que esteja de acordo com suas próprias convicções;
VI - Não permitirá que os direitos assegurados nos itens anteriores sejam
violados pela ação de terceiros, dentro da sala de aula.
Tal projeto coloca a “neutralidade” para o processo educativo e delega aos pais a
“educação moral”, de acordo com suas “convicções”; além disso ressalta que o docente, ao
tratar de questões políticas, socioculturais e econômicas, deverá apresentar aos alunos, de forma
“justa”, estes dados, etc. Questiona-se se é possível haver neutralidade na prática educativa, se
a convicção a ser respeitada for a liberal e se a justiça no trato das questões políticas,
socioculturais e econômicas seja a “justiça” do capital. Além disso, o projeto, em seu artigo 7º,
incentiva pais e estudantes a delatarem os professores à Secretaria de Educação e ao Ministério
Público.
Nas suas justificativas, o projeto de lei afirma que:
Quais seriam os padrões de conduta moral incompatíveis com o que os pais ensinam?
Seriam os questionamentos voltados para as ações patriarcais, as violências e os preconceitos
existentes, que minam o status quo existente? Tais proibições desejam o esvaziamento da
prática educativa, impedindo a autonomia de questionamentos à realidade existente e,
consequentemente, a possibilidade de sua transformação.
Frigotto (2017, p. 31), discutindo as consequências da implementação do referido
projeto de lei, reitera que:
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O que propugna o Escola sem Partido não liquida somente a função docente,
no que a define substantivamente e que não se reduz a ensinar o que está em
manuais ou apostilas, cujo propósito é de formar consumidores. A função
docente, no ato de ensinar tem implícito o ato de educar. [...] A pedagogia da
confiança e do diálogo crítico é substituída pelo estabelecimento de uma nova
função: estimular os alunos e seus pais a se tornarem delatores.
Os princípios da escola “sem” partido passaram também a ser disseminados pelas redes
sociais e têm ampliado as posturas racistas, machistas, homofóbicas, entre outras. E, mesmo
que o referido projeto seja inconstitucional e ainda tramite em nível federal, tem conseguido
adeptos em outras esferas federativas e passou a ser aprovado em instâncias municipais e
estaduais pelo Brasil.
No Estado da Paraíba, ele conseguiu aprovação no município de Campina Grande,
através do PL nº 582/ 2017, proposto pelo vereador Antônio Alves Pimentel Filho, trazendo a
discussão da “ideologia de gênero”, referendada pelos seguidores do Movimento Escola sem
Partido (MESP). Este grupo contribuiu significativamente para o apoio de parlamentares do
campo conservador, divulgando fake news durante os últimos processos eleitorais, além de
fazer propagandas de seus candidatos. Dessa forma, fica clara a sua proposição de ser “braço
parlamentar” de setores conservadores da política brasileira.
Contudo, também houve reação no nível da esfera estadual da Paraíba, que promulgou
a Lei nº 11230, de 10/12/2018, a qual “dispõe sobre a liberdade de expressar pensamentos e
opiniões no ambiente escolar das redes pública e privada de ensino da Paraíba”, também
chamada Lei da “Escola sem censura”, em contraposição ao Projeto de Lei “Ideologia de
gênero”, aprovado em Campina Grande.
Desse modo, também existe resistência a essa lógica de dominação, que propaga o ódio,
ampliando as violências e os desrespeitos diversos. Por isso, mais do que nunca, a educação
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torna-se fundamental para contribuir com as mudanças necessárias. Sendo assim, a seguir, serão
analisados dois documentos curriculares de Geografia, propostos em momentos históricos
diferentes, mas com predominância das políticas voltadas para a lógica neoliberal no Brasil, a
partir da década de 1990 e no contexto atual, principalmente após as eleições de 2018.
Os PCNs foram aprovados em 1998 e receberam críticas por não terem sido debatidos
com os profissionais em educação na sua elaboração. Além disso, os Parâmetros Curriculares
de Geografia foram fundamentados principalmente na corrente de pensamento geográfico
humanista. Neste documento, a diversidade cultural é tratada através da:
Dessa forma, a ênfase dos símbolos e códigos é colocada a partir do imaginário social
construído, desmerecendo as condições históricas e os fenômenos de exploração e subordinação
cultural. Como dizia Milton Santos, considera-se a ação humana como absoluta e não como
condicionada. Nesse sentido, os PCNs destacam que o ensino de Geografia:
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Mas, como no restante do texto, a temática é colocada de forma ampla, sem aprofundar
sobre tais aspectos na esfera local, a partir do lugar vivido. Da mesma forma que os PCNs, a
BNCC também coloca a relação com o lugar sem apontar os seus condicionantes históricos.
A BNCC passou por alterações desde o documento inicial proposto pelo Ministério da
Educação (MEC), através de consulta popular. Contudo, em sua versão final, ainda houve a
supressão da palavra “gênero” em várias partes do documento, demonstrando o caráter
conservador do Ministério no contexto atual.
Segundo Tokarnia (2017):
Esta supressão pode ser percebida também na parte específica de Geografia, inclusive
nas unidades temáticas que tratam sobre o sujeito e seu lugar no mundo. Milton Santos dizia
que, para ser cidadão do mundo, antes teria que ser cidadão de algum lugar. Entretanto, como
refletir sobre o lugar e sobre a cidadania se tantos cidadãos e cidadãs continuam sendo
desrespeitados nos seus lugares cotidianos?
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Tal ausência pode ser exemplificada quando, nas partes introdutórias da área geográfica,
é feita a seguinte afirmação: “[...] a aprendizagem da Geografia favorece o reconhecimento da
diversidade étnico-racial e das diferenças dos grupos sociais, com base em princípios éticos
(respeito à diversidade e combate ao preconceito e à violência de qualquer natureza)” (BRASIL,
2017, p. 359). Nesse contexto, cita-se a violência de forma ampla, mas não se especifica,
ignorando-se as violências que ocorrem envolvendo o gênero e a racialidade, as quais também
fazem parte da realidade brasileira. Por isso, Gomes (2003, p. 70-71) reitera que:
1
Portador de necessidades especiais é uma nomenclatura contestada pela Declaração de Salamanca e por outros
órgãos internacionais. Atualmente, o termo oficial que foi definido pela Convenção das Nações Unidas sobre o
Direito das Pessoas com Deficiência é pessoa com deficiência.
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Dessa forma, fica claro que o currículo está impregnado pelos interesses de mercado, os
quais, a partir da lógica liberal definem o tipo de qualificação profissional que lhes interessa.
Ademais, setores do fundamentalismo religioso também estão influenciando o que deve e o que
não deve estar presente nas propostas curriculares.
Sendo assim, as especificidades no tempo e espaço escolar vão conter inter-relações que
se diferenciam nas diversas áreas do conhecimento, entre elas na Geografia Escolar. Desse
modo, as normatizações e as propostas curriculares terão influências distintas conforme os
agentes locais que atuam nas escolas.
Os PCNs, produzidos na década de 1990 com seu caráter mais subjetivista, com ampla
influência da Geografia Humanista, recebeu críticas e não conseguiu se colocar como um
documento padrão. Além disso, a diversidade nos espaços locais foi tratada sem se averiguar
as contradições e as relações de poder ali presentes.
Do mesmo modo, a BNCC, que traz em seu bojo discussões sobre o raciocínio
geográfico consoante a Geografia Tradicional e uma postura tecnicista, baseada em habilidades
e competências, também tem sofrido severas críticas. Porém, o contexto autoritário da política
brasileira atual tem imposto aos estados e municípios e às Diretrizes de Formação Docente a
utilização da BNCC como documento base em cada área, inclusive negando questões relativas
à diversidade regional e às desigualdades sociais presentes na população brasileira.
Nesse contexto, a Geografia Crítica pode contribuir de forma significativa para ampliar
discussões necessárias no espaço escolar que proporcionem mudanças nas posturas das pessoas
e numa convivência mais respeitosa, invertendo as relações de poder ali existentes.
Os educadores geográficos críticos precisam ampliar seus horizontes neste caminho
necessário da disciplina escolar, pois o próprio Milton Santos foi criticado em seus últimos
trabalhos, por ter agregado questões subjetivas às análises espaciais. Mas ele conseguiu
entender que o capital, mais do que nunca, tem influenciado a subjetividade humana e, por isso,
nós enquanto geógrafos críticos também temos de analisar de que forma esta influência tem
possibilitado maior exclusão e violência às diversidades nos diferentes espaços.
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Referências
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Maria Cecília França. Campinas, SP: Papirus, 1988.
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Revista GeoSertões – ISSN 2525-5703
(1)
Doutor em Ciências do Desenvolvimento Socioambiental (NAEA-UFPA) e professor Assistente IV da
Universidade do Estado do Pará.
E-mail: aialacouto@uepa.br
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https://cfp.revistas.ufcg.edu.br/cfp/index.php/geosertoes/index 207
Revista GeoSertões – ISSN 2525-5703
Resumo
O presente ensaio tem como objetivo apresentar reflexões provocativas acerca das práticas pedagógicas do
ensino de Geografia crítica nas escolas. Durante o movimento da chamada Geografia crítica, as questões
étnicorraciais foram negligenciadas ou invisibilizadas nos vários debates que trouxeram temas pertinentes que
tratavam das contradições históricas da relação capital e trabalho. Todavia, destaca-se que o racismo se
constituiu como uma ferramenta importante na estruturação do capitalismo e, por isso, vários problemas de
ordem política, econômica, social e cultural têm suas bases na ideia de raça. Portanto, o ensino de Geografia
escolar deve partir de pedagogias antirracistas na sala de aula e nas escolas, contribuindo para o enfretamento
ao racismo.
Palavras-chave
Geografia. Ensino. Antirracista
Resumen
Este ensayo tiene como objetivo presentar reflexiones provocativas sobre las prácticaspedagógicas de la
enseñanza de la geografía crítica en las escuelas. Durante el llamadomovimiento de Geografía Crítica, las
cuestiones étnico-raciales fueron descuidadas oinvisibilizadas en los diversos debates que plantearon temas
pertinentes que abordaronlas contradicciones históricas de la relación entre capital y trabajo. Sin embargo, es
dedestacar que el racismo se ha constituido como una herramienta importante en laestructuración
del capitalismo y, por tanto, varios problemas políticos, económicos,sociales y culturales se basan en la
idea de raza. Por tanto, la enseñanza de la geografíaescolar debe partir de pedagogías antirracistas en
el aula y en las escuelas,contribuyendo a la lucha contra el racismo.
Palabras clave:
Geografía. Enseñanza. Antirracista.
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D
e início, destaca-se que a Geografia crítica se apresenta como uma nova
corrente do pensamento que surge na segunda metade do século XX em
países como: EUA, Inglaterra, Suécia, Itália, França e Brasil. Na escola
americana a chamada Geografia radical teve grande destaque nas publicações da revista
Antipode durante os anos de 1960 e 1970. Mas, a celebre obra de Yves Lacoste intitulada “A
geografia antes de mais nada serve para fazer a guerra” (1976) cria o termo Geografia crítica
com grande repercussão na Europa, principalmente na Escola francesa, que tinha geógrafos
fortemente influenciados pela escola americana de Geografia. Somado a isso, cabe aqui destacar
a importância das publicações de textos e artigos da revista francesa Herodote.
Diante disso, a Geografia crítica é uma corrente contrária à geografia quantitativa, pois
considera as contradições sociais resultantes do modo de produção capitalista e da divisão
internacional de trabalho, os quais afetam negativamente principalmente os países
subdesenvolvidos. Portanto, ela se soma aos vários movimentos que buscam romper com esse
modelo contraditório que invisibiliza questões centrais que fazem entender a lógica de
organização e expansão do capital.
Para Corrêa (2001, p. 23), a Geografia crítica coloca-se como “uma revolução que
procura romper, de um lado, com a geografia tradicional e, de outro, com a geografia teorético-
quantitativa”. Moreira (2008) faz uma importante observação acerca da ciência geográfica, isso
porque, para este autor, somente é possível entender a Geografia se a analisarmos como uma
ciência social que tem o espaço como seu objeto de estudo, mas não um espaço que é
receptáculo das ações, apenas a base física, mas um espaço que é produzido socialmente, a
partir do trabalho. Em sua necessidade de sobrevivência, o homem intervém na natureza
transformando-a, via processo de produção de bens necessários à sua existência; ao mesmo
tempo em que nessa relação produz o espaço geográfico transforma a si mesmo de um ser
animal em um ser social.
Para Moraes (1999), no nível acadêmico, os geógrafos críticos opõem-se ao empirismo
exacerbado da Geografia tradicional, além de refutarem sua análise pautada no mundo das
“aparências”, decorrente da fundamentação positivista, a qual visa a busca de um objeto
automatizado, a ideia absoluta de lei, não se preocupando com a diferenciação das qualidades
distintas dos fenômenos humanos, entre outros. A geografia pragmática, também com
fundamentação neopositivista, é fortemente criticada pelo conteúdo acrítico, “alienante”,
vinculado à legitimação do poder do Estado burguês. A seguir, destaca-se a tabela 01
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simplificada que tenta apresentar de forma didática a evolução das correntes do pensamento
geográfico.
Tabela 01: Correntes do pensamento geográfico
ESCOLA CORRENTE CONTEXTO CONCEITOS
- Tradicional alemã Determinismo Final do séc. Espaço vital e território
XIX
- Tradicional francesa Possibilismo Primeira Região e paisagem
metade do
séc. XX
- Lógico-positivista Teorética- Década de Espaço relativo
quantitativa 1950
- Materialista dialética; Geografia Década de Espaço, região, território, lugar,
- Fenomenológica; crítica 1970 natureza, redes, paisagem,
- Existencialista sociedade etc.
Fonte: adaptado de Moraes (1999).
1
Necropolítica significa a gestão da morte como bem ressalta Mbembe (2006), é deixar morrer e fazer viver, é a
expressão máxima da soberania em decidir quem morre e quem vive.
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Para ser de fato crítica essa aprendizagem deve demostrar que no Brasil o racismo
estrutural é uma prática cotidiana que vitimiza mulheres e homens, negras e negros, crianças,
jovens e idosos e que a população afrodescendente convive com situações constrangedoras
difundidas por narrativas e iniciativas de pessoas que promovem o racismo. Portanto, o racismo
é um tipo de violência simbólica, psicológica e até mesmo física, a qual está presente nas
relações sociais e na construção do espaço geográfico.
O professor pode, inclusive, utilizar dados estatísticos que tratam da distribuição
espacial da população negra no Brasil, dados sobre violência, ocupação, subemprego, dentre
outros. É necessário compreender que o racismo estrutural reproduz as formas mais perversas
de desigualdades sociorraciais presentes na sociedade brasileira. Diante disso, há uma dívida
histórica do Estado em relação aos afrodescendentes, logo, são necessárias medidas de inclusão
– como as políticas socioafirmativas, a exemplo do sistema de cotas raciais e reservas de vagas
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para o ingresso ao ensino superior público. Apesar de importantes, essas medidas tornaram-se
polêmicas e sofrem severas críticas daqueles que negam e naturalizam tal prática por
acreditarem na existência de uma “democracia racial”.
Não se pode negar as transformações que o mundo vem sofrendo nas últimas décadas
em relação ao conteúdo social. Hoje, pautas importantes são levantadas por militantes que
tentam desconstruir um padrão hegemônico de sociedade, o qual se fundamenta em um modelo
Ocidental-hétero-normativo-branco-cristão. Nesse cenário, surgem pautas como o respeito às
diversidades de gênero; pautas feministas das mulheres que lutam por igualdade de direitos e
pelo fim do patriarcado que reproduz o machismo e a violência contra a mulher; pautas como
o direito dos povos originários das Américas e o direito à vida da população negra que luta
contra o racismo que mata, daí o slogan “vidas negras importam”. É em meio a esse debate que
a Geografia crítica deve ganhar destaque em sala de aula como a disciplina capaz de integrar
os diversos conhecimentos para explicar o mundo e sua complexidade.
O desafio da Geografia escolar nos ensinos fundamentais e médios é contribuir para a
sistematização do conhecimento, passando por um processo de descolonização do saber2. Os
movimentos de resistências das populações exigem um esforço intelectual e um posicionamento
da Geografia em avaliar as formas mais significativas de aprendizagem e o método de ensino
utilizado como intermediador de um conhecimento que pode ser preconcebido a partir da
vivência do aluno. Logo, cabe à escola um ensino verdadeiramente crítico de Geografia, a fim
de torná-la mais apropriada para explicar o mundo atual e sua metamorfose.
Para Moares (1999), vários geógrafos críticos passaram a ter um posicionamento em
defesa de uma transformação da realidade social, tendo o saber como importante arma para esta
transformação. Assim, o conhecimento científico assume um conteúdo fortemente político e,
portanto, a Geografia deve ser militante, isto é, lutar por uma sociedade mais justa e servir como
um instrumento de libertação dos homens, pois ela tem condições de fazer uma análise do
conjunto de relações que atuam no processo de construção do Espaço Geográfico.
O ensino de Geografia hodiernamente requer dos professores a formulação de questões
centrais, de forma que despertem o interesse dos alunos para que a partir daí eles possam
entender o significado de se ensinar e aprender Geografia. Alguns autores afirmam que o ensino
de Geografia é fundamental para que as novas gerações acompanhem e entendam as
transformações do mundo o que dá um status que a disciplina não possuía. Oliveira (1998) apud
2
A colonialidade do saber diz respeito às formas coloniais que foram impostas pelos colonizadores e que
permanecem enquanto um colonialismo interno do ser, saber e do poder. Esse tema é encontrando no texto de
Anibal Quijano (2005).
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Straforini (2004, p. 51) acredita que existe um renovado interesse pelo estudo da Geografia em
virtude do processo de aceleração da Globalização. Nesse sentido, a Geografia se destaca como
a única disciplina que possibilita o acompanhamento das transformações recentes de forma
integrada. É nesse contexto que questões centrais sobre a luta antirracista no Brasil e no mundo
deve aparecer como um conteúdo interdisciplinar e transversal.
Porém, ao analisar o contexto de ensino de Geografia observa-se que as questões raciais
são excluídas ou pouco exploradas em temas de urbanização e população, por exemplo, e, não
raro, o continente africano é tratado como uma região de conflitos, pobreza, miséria, guerras e
endemias, como se na África não houvesse aspectos positivos em relação à sua história e
cultura. Assim, história da África aparece nos livros de Geografia limitada por um olhar
moderno-colonial civilizatório, cuja análise nega o lugar de fala dos sujeitos e reproduz
processos de violências epistêmicas, as quais passam despercebidas nos debates em sala de
aula.
Mesmo diante das contradições que faziam parte da vida dos escravos, estes trouxeram
para a colônia seus hábitos, suas crenças, formas e expressões religiosas e artísticas, ou seja,
manifestações socioculturais que precisam ser apresentadas como elementos identitários
presentes nas várias formas de produção do espaço geográfico, considerando o espaço
geográfico como “um conjunto indissociável, solidários e contraditórios, de sistemas de objetos
e sistemas de ações” (SANTOS, 1996, p. 63).
A formação de professores de Geografia no contexto brasileiro, de acordo com Brasil
(2008), deve ter uma
Somos o último país do mundo a declarar o fim da escravidão. Foram sustentados cerca
de 300 anos de escravidão e mesmo após o fim desse sistema o próprio Estado – alinhado ao
discurso da elite branca – criou todas as formas de invisibilidade, exploração e exclusão dessa
população. Os dados estatísticos sobre as questões sociais no Brasil se encarregam de conformar
a necessidade de políticas públicas inclusivas para as negras e os negros que se encontra nas
áreas periféricas das grandes cidades, nas áreas de conflitos fundiários no campo, nas zonas de
tensão social, no subemprego e no trabalho precário. Esse grupo sociorracial está nas evasões
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escolares da rede pública de ensino, nos baixos índices educacionais com altas taxas de
analfabetismo e na exploração do trabalho infantil.
Por isso, “a Geografia, necessariamente, deve proporcionar a construção de conceitos
que possibilitem ao aluno compreender o seu presente e pensar o futuro através do
inconformismo com o presente. Mas esse presente não pode ser visto como algo parado,
estático, mas sim em constante movimento” (STRAFORINI, 2005, p. 50). O professor
enquanto sujeito mediador do saber que transmite ao aluno deve também avaliar sua própria
formação e rever suas práticas pedagógicas, mas, com o objetivo de criar um desenvolvimento
autônomo do aluno, analisando teoria e praticidade.
Vesentini (1999) é categórico ao afirmar que, com a Globalização, a escola não tem
somente a função de desenvolver a inteligência, o senso crítico, a criatividade a iniciativa
pessoal, mas também discutir os grandes problemas do mundo. Nesse ínterim, é fato que um
dos grandes problemas do mundo é não compreensão de que a primeira mercadoria global do
capitalismo foi o Negro sequestrado da África pelo tráfico de escravos do Atlântico, que
construiu as bases para o capitalismo comercial, ou seja: as mesmas que ajudaram a construir o
racismo no mundo.
Por fim, deve-se atentar para o fato de que não é tarefa única e exclusiva da Geografia
o papel de transformação da sociedade. Um debate interdisciplinar envolvendo o diálogo com
as outras disciplinas é o mais coerente. Assim, a interação entre os diversos campos do
conhecimento seria alternativa mais eficaz para a construção de cidadãos mais críticos e
conscientes de seus deveres e direitos. Uma sociedade justa e solidária com a luta antirracista é
mister dentro e fora dos ambientes escolares; portanto, professor, aluno, escola e sociedade
devem estar alinhados em uma interação constante com os saberes construídos a partir de
verdades escondidas ou nunca ditas antes e que hoje devem aparecer no currículo escolar,
sobretudo, no ensino de Geografia crítica.
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a) Lei n° 10.639/03, que foi alterada pela Lei n° 11.645/08, o que representa um marco
histórico na política educacional brasileira, onde orienta-se os sistemas de ensino e as
suas instituições a incorporarem o tema da diversidade étnicorracial e indígena no Brasil
aos seus projetos políticos pedagógicos e, por conseguinte, em suas práticas
educacionais;
b) Lei n° 12.288/10, que institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à
população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos
étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas
de intolerância étnica;
c) Lei n° 12.711/12, que destina a reserva de 50% das vagas matriculadas por curso nas
Universidades e Institutos Federais para alunos oriundos integralmente do ensino
público. As demais 50% vagas continuam destinadas para ampla concorrência.
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compensatórias é que elas têm uma duração definida, isto é, elas podem deixar de ter vigência
desde que inexistam os mecanismos de exclusão social que lhes deram.
O ensino de geografia no Brasil assume a responsabilidade de acompanhar as
transformações do mundo e promover a interação com a sala de aula, facilitando o papel do
aluno enquanto sujeito social e transformador do espaço geográfico. Assim, deve-se “provocar
o educando para conhecer e conquistar o seu lugar no mundo em uma teia de justiça social.
Parece ser simples, mas não é, no mínimo, desafiador, como toda prática pedagógica”
(CASTROGIOVANNI, 2007, p. 44).
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componente espacial é dever do ensino de Geografia, mas ela deve explicar o contexto
considerando as questões raciais.
Os resultados da pesquisa desenvolvida pelo Instituto de Pesquisas Econômicas
Aplicadas (IPEA) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) apresentaram o Atlas
da Violência 2019 e os números divulgados só reforçam as colocações acima. De acordo com
o estudo, a diferença da morte de negros em relação a dos brancos é significativa. Por exemplo,
em 2016 o percentual de negros assassinados no Brasil era de 71,6% e em 2017 houve um
incremento desses números, passando para 75% das vítimas de homicídio. Ou seja, a taxa de
homicídios de negros (pretos e pardos) por grupo de 100.000 habitantes em 2017 foi de 43,1 e
a de não negros (brancos, amarelos e índios) foi de 16,0. Nestes termos, para cada indivíduo
não negro assassinado a de negros tem uma taxa de 2,7.
De acordo com os dados do Atlas da Violência (2019), em um período de 10 anos,
correspondendo de 2007 a 2017, a taxa de letalidade de negros no Brasil cresceu 33% e a de
não negros de 3,3%. Uma avaliação apenas do ano de 2017 apresenta um índice com redução
de 0,3% das mortes de não negros e um aumento de 7,2% de negros. O Brasil registrou 65.602
homicídios em 2017, o que equivale a uma taxa de aproximadamente 31,6 mortes para cada
cem mil habitantes. É o maior nível histórico de letalidade violenta intencional no país.
Nesse mesmo ano 35.783 jovens foram assassinados no Brasil, um dado preocupante
que representa um índice de 69,9 homicídios para cada 100 mil jovens. Ainda segundo esse
estudo, entre 2016 e 2017 houve no Brasil um aumento de 6,7% na média de homicídios de
jovens. Na última década esse número passou de 50,8 pessoas entre 15 e 29 anos executadas
por grupo de 100 mil jovens em 2007, para 69,9 em 2017 – aumento de 37,5% sendo este
crescimento um recorde histórico em relação à morte de jovens. Esses dados demostram que há
uma desigualdade sociorracial histórica no Brasil e que só pode ser resolvida com políticas de
inclusão.
No Brasil, o Estado sustenta-se em políticas e ações que mantêm uma estrutura
escravocrata em sua essência, tendo uma sociedade racista que reproduz discursos de morte.
Esses discursos soam como narrativas que justificam uma política de extermínio direcionada,
sobretudo, para a população negra dispersa nas favelas e periferias das grandes cidades
brasileiras. Então, o racismo é um regulador da maneira como a morte é administrada, ele define
quem morre, onde morre e até mesmo como se deve morrer, é o dever-morrer. É uma política
sobre formas de vida que são transformadas em vidas sem forma.
A responsabilidade do ensino de Geografia a partir de uma proposta educativa
antirracista caminha por ensinar o educando a:
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(i) conhecer sua posição no mundo, e para isto o indivíduo precisa conhecer o
mundo; (ii) tomar posição neste mundo, que significa se colocar politicamente
no processo de construção e reconstrução desse mundo. Se posicionar no
mundo é, portanto, conhecer a sua posição no mundo e tomar posição neste
mundo, agir. Saber Geografia é saber onde você está, conhecer o mundo, mas
isto serve fundamentalmente para você agir sobre esse mundo no processo de
reconstrução da sociedade: se apresentar para participar (SANTOS, 2007, p.
27).
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É importante, pois, salientar que tais políticas têm como meta garantir o direito dos
negros a se reconhecerem na cultura nacional, expressarem visões de mundo próprias,
manifestarem com autonomia, individual e coletiva, seus pensamentos. Desse modo, destaca-
se que por essas políticas busca-se como meta o direito dos negros, assim como de todos os
cidadãos brasileiros, a cursarem cada um dos níveis de ensino, em escolas devidamente
instaladas e equipadas, orientados por professores qualificados para o ensino das diferentes
áreas de Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnicorraciais e para
o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (BRASIL, 2003).
Por fim, estudar Geografia verdadeiramente crítica na sala de aula torna-se um
instrumento de formação/libertação contra processos hegemônicos de dominação dos saberes.
É pela Geografia que se consegue ter a compreensão do espaço geográfico e sua totalidade, por
ela compreende-se também a relação sociedade e natureza e as contradições socioespaciais das
heranças da formação econômica e territorial do Brasil. A Geografia deve assumir esse
compromisso na luta antirracista e não se resumir aos conteúdos que invisibilizaram processos
raciais. Cabe, então, aos professores de Geografia escolar buscarem leituras e alternativas
pedagógicas cabíveis com a realidade do povo brasileiro e, a partir disso, engajar-se na luta por
justiça social e pelo fim das desigualdades sociorraciais.
Considerações finais
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aplicação dos conteúdos destas disciplinas no âmbito da Educação Básica, em especial, nos
níveis fundamental e médio de ensino (Projeto Político Pedagógico, 2009).
É necessária essa reflexão acerca da raça, pois embora algumas poucas conquistas
tenham acontecido para as comunidades negras no Brasil – como a política de reserva de vagas
no ensino superior público que legitima e legaliza as ações afirmativas de combate às
desigualdades raciais (políticas de cotas) e a criação da Lei n° 10.639/03 que representa um
marco histórico na política educacional brasileira e que orienta os sistemas de ensino e as suas
instituições a incorporarem o tema da diversidade étnicorracial no Brasil aos seus projetos
políticos pedagógicos e às suas práticas pedagógicas – ainda prevalece um número bastante
desigual em relação às desigualdades socioeconômicas. Cabe então ao ensino de uma Geografia
verdadeiramente crítica construir metodologias ativas e inovadoras a partir de práticas
pedagógicas libertadoras de fato e de direitos, ou seja, tornando-se uma das referências na busca
por justiça social.
Referências
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federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências.
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(1)
Professora Associada da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA) e docente do Mestrado
Acadêmico em Geografia da mesma Instituição.
E-mail: virginiaholand@hotmail.com
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Resumo
Esse artigo foi construído depois de anos trabalhando como professora da disciplina de “Ensino de Geografia
nos Anos Iniciais,” no Curso de Graduação em Pedagogia da Universidade Estadual Vale do Acaráu (UVA). A
experiência vivida com os acadêmicos de pedagogia em formação demostrou a importância da Geografia para
os anos iniciais, sendo possível constatar as especificidades didáticas, pedagógicas e desafios nos quais os
docentes em formação se encontravam. Os textos explorados foram revelando como era necessário situações
que aproximassem os conteúdos formais ao cotidiano, visando explorar os diferentes aspectos de um mesmo
fenômeno em distintos momentos da escolaridade, de modo a construir compreensões novas e mais complexas.
Nessa perspectiva o trabalho com o lugar foi sendo apontado como ponte para os alunos dos anos iniciais
desenvolverem a capacidade de identificar e refletir sobre os diferentes aspectos da relação sociedade-natureza,
base necessária a efetivação de uma Geografia Critica no processo de leitura do espaço nos anos subsequentes.
Nossas reflexões ocorrem em diálogos com diversos autores, mas ancoradas sobretudo nas contribuições do
Professor Milton Santos para compreensão do conceito do lugar, pensando-o dentro da totalidade mundo.
Palavras-chave
Ensino de Geografia; Lugar; Anos Iniciais.
Abstract Resumen
This article was built after years of working as a Este artículo se construyó luego de años de trabajo
teacher in the subject of “Teaching Geography in the como docente en la asignatura de “Enseñanza de la
Early Years,” in the Pedagogy Graduation Course at Geografía en la Primera Infancia”, en el Curso de
Vale do Acaráu State University (UVA). The Graduación de Pedagogía de la Universidad Estatal
experience lived with students of pedagogy in training Vale do Acaráu (UVA). La experiencia vivida con
showed the importance of Geography for the initial estudiantes de pedagogía en formación mostró la
years, being possible to verify the didactic, importancia de la Geografía para los años iniciales,
pedagogical specificities and challenges in which the siendo posible constatar las especificidades y desafíos
teachers in formation were. The explored texts didácticos, pedagógicos en los que se encontraban los
revealed how it was necessary to bring situations that docentes en formación. Los textos explorados
brought formal content closer to daily life, aiming to revelaron cómo era necesario acercar situaciones que
explore the different aspects of the same phenomenon acercaran los contenidos formales a la vida cotidiana,
in different moments of schooling, in order to build con el objetivo de explorar los diferentes aspectos de
new and more complex understandings. In this un mismo fenómeno en diferentes momentos de la
perspective, the work with the place was pointed out escolarización, para construir entendimientos nuevos
as a bridge for students in the early years to develop y más complejos. En esta perspectiva, el trabajo con el
the ability to identify and reflect on the different lugar se señaló como un puente para que los
aspects of the society-nature relationship, a necessary estudiantes en los primeros años desarrollen la
basis for the realization of a Critical Geography in the capacidad de identificar y reflexionar sobre los
process of reading space in subsequent years. Our diferentes aspectos de la relación sociedad-naturaleza,
reflections occur in dialogues with different authors base necesaria para la realización de una Geografía
but anchored above all in the contributions of Crítica. en el proceso de lectura del espacio en los años
Professor Milton Santos for understanding the concept siguientes. Nuestras reflexiones se dan en diálogos con
of place, thinking it within the whole world. diferentes autores, pero anclados sobre todo en las
aportaciones del profesor Milton Santos para entender
el concepto de lugar, pensándolo en el mundo entero.
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Introdução
D
entre os objetivos da Geografia nos primeiros anos de escolarização
estão: (1) Reconhecer algumas das manifestações da relação entre
sociedade e natureza presentes na sua vida cotidiana e na paisagem
local; (2) Reconhecer e localizar as características da paisagem local e compará-las
com as de outras paisagens; (3) Ler, interpretar e representar o espaço por meio de
mapas simples.
Em relação aos conteúdos valorizados destacam-se o estudo das manifestações
da natureza em suas múltiplas formas presentes na paisagem. A ênfase recai nas
diferentes manifestações da paisagem local que propiciem aos alunos a compreensão
mais ampla das relações entre sociedade e natureza. Requer a definição de meios de
apreensão das transformações que a paisagem local sofre, resultantes de atividades
econômicas, políticas, sociais ou hábitos culturais que, de diferentes maneiras, afetam
os espaços em que se inserem os alunos. Ressaltam, contudo, que mesmo sendo a
paisagem local, o objeto de estudo da geografia ensinada nos primeiros anos do ensino
fundamental deve-se procurar romper com a hierarquização dos métodos de
transmissão do conhecimento que fragmentou a dimensão da paisagem local daquela
construída em espaços sociais mais amplos. Com as palavras do PCN:
[...] o espaço vivido pode não ser o real imediato, pois são muitos e
variados os lugares com os quais os alunos têm contato e, sobretudo,
que são capazes de pensar sobre. A compreensão de como a realidade
local relaciona-se com o contexto global é um trabalho que deve ser
desenvolvido durante toda a escolaridade, de modo cada vez mais
abrangente (1997, p. 7).
A Reforma Capanema foi, então, a responsável pela inclusão da Geografia nas classes
do Ensino Fundamental elementar e complementar, de acordo com as propostas da Escola Nova
o Ensino Primário tem a função de promover o desenvolvimento geral do aluno e não apenas a
leitura e a escrita. Desse modo, a reestruturação curricular da educação, de forma geral, e
também o ensino de Geografia foram ao encontro das necessidades de assimilação de
conhecimentos úteis para a vida em sociedade. Mesmo assim o ensino de Geografia foi
embasado no referencial tradicional que, enraizada no positivismo clássico, analisa a realidade
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1
Jânio da Silva Quadros sucedeu ao Presidente Juscelino Kubitschek. Foi eleito em outubro de 1960 com uma
expressiva vitória. Mas seu governo durou poucos meses, provocando uma crise política, que culminaria mais
tarde no Golpe Militar.
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ensino de Geografia e História sofreu um duro declínio, quando o governo autorizou a criação
do Curso Superior de Estudos Sociais, agregando nesta formação duas ciências.
Configurando-se por meio da implantação da área de Estudos Sociais para o ensino do
1º Grau (atual ensino fundamental), estabelecido pela Lei nº 5.692/71. A regra geral para a
formação do professor, ditada pelo artigo 30 da Lei 5.692/71 evidencia a existência de dois
esquemas: o primeiro, correspondente à formação dada por cursos regulares e, o segundo,
correspondendo à formação regular acrescida de estudos adicionais, pressupondo a existência
de 5 níveis de formação de professores, a saber: 1) formação de nível de 2º grau, destinada a
formar o professor polivalente das quatro primeiras séries do 1º grau; 2) formação de nível de
2º grau com 1 ano de estudos adicionais, para formar o professor apto a lecionar até a 6ª série
do 1º grau; 3) formação superior em licenciatura curta, destinada a preparar o professor para
uma área de estudos e a torná-lo apto a lecionar em todo o 1º grau; 4) formação em licenciatura
curta mais estudos adicionais, preparando o professor de uma área de estudos com alguma
especialização em uma disciplina dessa área, apto a lecionar até a 2ª série do 2º grau; 5)
formação em nível superior em licenciatura plena, destinada a preparar o professor de
disciplina, apto a lecionar até a última série do 2º grau. Formações que não garantiram a
interrelação das disciplinas História e Geografia.
O saber geográfico até 1990 foi usurpado da população pelo fato da Lei autorizar
professores leigos, que em nome da premência de docentes, concedia iguais direitos de
exercício docente no curso primário tanto aos portadores do nível ginasial normal quanto
àqueles com o diploma secundário de magistério, cujo disposto na lei era regulamentado pelo
Distrito Federal e respectivos estados da federação.
Assim, perante critérios variados de formação de professores, para o exercício docente
no ensino fundamental, pois cada estado tinha a liberdade de agir de acordo com a realidade
específica. que a atuarem nas Series Iniciais do antigo 1º Grau, o que reflete diretamente na
forma e no conteúdo desse nível de ensino e, em especial, no ensino de geografia, pois esses
professores também são órfãos dos conteúdos geográficos durante sua formação.
Conforme Fonseca (1993), o declínio da Geografia e da História nas escolas brasileiras
acentuou-se com a introdução dos Estudos Sociais no currículo das escolas primarias que
procuravam acompanhar o modelo pedagógico dos Estados Unidos da América. O primeiro
estado a adotar tal mudança foi Minas Gerais e posteriormente São Paulo.
Após esta institucionalização dos Estudos Sociais nos anos inicias e nos anos posteriores
do Ensino Fundamental (antigo 1º grau), nota-se que foi uma disciplina que pouco contribuiu
para a formação do indivíduo, pelo fato de ocorrer uma excessiva fragmentação do
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conhecimento que se colocava a partir das reformas, quando esta disciplina se configurou
meramente informativa, superficial e reducionista.
A fim de mesclar em apenas uma disciplina temas oriundos da Geografia, História e
Ciências Sociais, houve uma descaracterização e descontextualização dos temas geográficos
que, muitas vezes, eram ensinados de maneira tradicional, exigindo cópia e memorização dos
conhecimentos, aumentando a sua desvalorização no meio educacional.
Após algumas leituras, constata-se que uma grande parcela da população brasileira de
diversos Municípios ficou aproximadamente três décadas, sem estudar Geografia de 1ª a 4ª
série, sendo lecionados para esses, a disciplina de Estudos Sociais, sendo que uma grande leva
de estudantes até meados dos anos 90, nunca tiveram contatos com os saberes geográficos na
escola.
Com o intuído de mudar este quadro da educação brasileira nas últimas décadas foi
homologada em 20 de dezembro de 1996, a nova LDB2, em substituição as Leis n.4.024/61, n.
5.540/68 e n. 5.692/71, já mencionadas anteriormente. Porém, o dualismo existente entre a
educação do povo e a da elite permaneceu. Os governos continuaram com projetos de caráter
educacional ligados ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional (FMI), vinculado a
um projeto global neoliberal, que se preocupa somente com o retorno quantitativo, esquecendo
de analisar o retorno qualitativo das propostas do ensino.
A LDB/1996 estabelece como regra para a formação dos profissionais da educação o
nível superior admitindo, como formação mínima para o magistério no âmbito da educação
infantil e das quatro primeiras séries do ensino fundamental a de nível médio na modalidade
Normal. Também se intensifica o debate em torno dos riscos de que os institutos apesar de
definidos como de nível superior, foram considerados de segunda categoria.
Neste período vivenciava-se a institucionalização ao direito exclusivo do Pedagogo em
atuarem no que chamamos de ensino fundamental I, respectivamente desde a Educação Infantil
a 4ª serie (hoje, 5º ano).
Ocorreu um aumento significativo do acesso da população brasileira ao Ensino
Fundamental. Nesse contexto a geografia passa a ser ensinada nos anos inicias de forma mais
ampla com aspectos mais definidos após a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais -
(PCN) em 1997 e o seu conhecimento nas escolas brasileiras no ano de 1998, Pode-se notar que
2
A LDB/1996 introduz uma inovação, a criação dos “institutos superiores de educação” (art. 62) como uma
alternativa às universidades (art. 63): I – cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o
curso normal superior, destinado à formação de docentes para a educação infantil e para as primeiras séries do
ensino fundamental; II – programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de educação superior
que queiram se dedicar à educação básica.
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mais uma vez realizou-se uma agregação errônea dos conceitos e conteúdos geográficos e
históricos num único volume, dividindo este em duas partes em um só documento. Mas são
inegáveis os avanços nas sugestões dos conteúdos a serem ministrados, contidos nos
parâmetros. Com rebatimento também na formação do licenciado e na formação continuada
dos que atuam no sistema educacional, abrindo portas para uma inserção de conteúdos
realmente geográficos nos anos iniciais.
A falta de prioridade para uma formação mais adequada dos professores trouxe
severos prejuízos ao alunado, assim, o Ensino de Geografia acumulou fragilidades
tanto ao que tange as questões metodológicas, quanto às indefinições da seleção de
conhecimentos para cada nível de ensino. Situação que passa vivenciar outro cenário
a partir do século XXI.
Nos anos iniciais do ensino fundamental, no entanto, vem sendo consensual que
as situações concretas ajudam no processo de aquisição de alguns conteúdos que serão
fundamentais para as situações de aprendizagens de conceitos mais abstratos nos anos
seguintes.
Tal concepção se junta aos desafios postos pela invasão das novas tecnologias
no cotidiano que impõem também formas de interpretação da realidade em curso,
através das relações inter escalares baseadas em um modelo explicativo que supera a
ideia linear dos círculos concêntricos, tão presentes nas escolas até anos recentes.
Nessa toada o lugar é o conceito fundamental a ser trabalhado nos anos iniciais
do ensino fundamental, não ainda como conceito abstrato, mas com situações que
possam contribuir para o aluno entender seu lugar de vida e de fala. Ressaltamos,
porém, que as situações de ensino aprendizagem não podem perder de vista que o
lugar é dinâmico, requerendo métodos de aprendizagem que proporcionem ao
educando a compreensão da realidade em curso de forma relacional, as diferentes
escalas com suas singularidades.
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o aluno poderá aprender a pensar o espaço, e posteriormente, a ler esse espaço, “o que
significa criar condições para que a criança leia o espaço vivido” (CASTELAR, 2000,
p. 30).
Por ser uma ciência “que estuda a construção do espaço pelos homens, a partir
da forma como estão organizadas em sociedade e das condições naturais do espaço”
(CALLAI, 1988. p. 16), o professor deve ter como base uma bagagem de conhecimento
acerca das questões locais referentes àquele município e/ou lugar do qual o aluno faz
parte, para esclarecer eventuais dúvidas e questionamentos que ocorrerem durante a
discussão do tema. Dessa constatação advém o imperativo de termos professores
pesquisadores.
Da leitura do lugar-mundo vai se configurando a apropriação da leitura de mundo
de forma mais consciente e totalizadora, pois nos anos posteriores, o conceito de lugar
não desaparece, torna-se mais complexo e mais aprofundada sua discussão, com
incorporação de outros conceitos geográficos, mas com o uso dos mesmos recursos, tais
como; mapas, gráficos, fotos etc.
Fazer essa leitura demanda uma série de condições, que podem ser
resumidas na necessidade de se realizar uma alfabetização
cartográfica, [...] é um processo que se inicia quando a criança
reconhece os lugares, conseguindo identificar as paisagens, para tanto,
ela precisa saber olhar, observar, descrever, registrar e analisar. Fazer
a leitura do mundo não é fazer uma leitura apenas do mapa, ou pelo
mapa, embora ele seja muito importante. É fazer a leitura do mundo da
vida, construído cotidianamente e que expressa tanto as nossas utopias,
como os limites que nos são postos, sejam eles do âmbito da natureza,
sejam do âmbito da sociedade: (culturais, políticos, econômicos)
(CALLAI, 2001; p. 228).
Segundo os PCN’s (1997), a Geografia nos anos iniciais deve ser a área do
conhecimento com competência para oferecer os instrumentos essenciais para a
compreensão e intervenção na realidade social do educando. Por meio dela, podemos
compreender como diferentes sociedades interagem com a natureza na construção de
seu espaço; as singularidades do lugar em que vivemos; o que o diferencia e o
aproxima de outros lugares e, assim, adquire-se uma consciência maior dos vínculos
afetivos e da identidade que o aluno estabelece com ele.
Considerações Finais
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Referências
______, Lei n.4.024 de 20 de dez. de 1961. Fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Disponível em: www.senado.gov.br. Acesso em 01 de junho 2009.
______, Lei n.5.692 de 11 de agosto de 1971. Fixa as Diretrizes e Bases para o ensino de 1 e
2 graus. Disponível em: www.senado.gov.br. Acesso em 02 de junho 2019.
CARLOS, Ana Fani Alessandri. (org.). A Geografia na sala de aula. São Paulo: Contexto,
1999.
____. Um Lugar no/do Mundo. São Paulo: FFLCH. 2007. Disponível em:
http://www.gesp.fflch.usp.br/sites/gesp.fflch.usp.br/files/O_ lugar_no_do_mundo.pdf
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(1)
Professor do departamento de Ciências Geográficas e do Programa de Pós-Graduação em Geografia
da Universidade Federal de Pernambuco - UFPE.
E-mail: alcindo-sa@uol.com.br
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Resumo
Como sugere o título do presente ensaio, procura-se abordar os percursos pedagógicos do período histórico
contemporâneo, buscando compreender seu papel de destaque na estruturação de uma sociedade brasileira e
global baseada em padrões civilizados (civitas) de cidadania e pertencimento territorial. Com base na geografia,
na filosofia e em várias áreas correlatas, visualizamos que o ser humano nasceu predestinado a viver em
liberdade, sem atavios, prenhe de razão e emoção. No entanto, no alvorecer do renascimento, iluminismo e
ascensão do estado moderno, isto é, do capital mercantil e depois industrial, como adverte Ortega y Gasset, os
iluminados filósofos, juristas e demagogos, na esteira da disciplina, exigem que o mundo do dinheiro e da razão
delineasse e erigisse regras, comportamentos morais e éticos, moldados em leis, solidificando um “novo ser
humano”, não mais regido por emoções instintivas, racionais e sobretudo livres. Para tanto, o novo status quo
sedimentou a nova base disciplinar pedagógica, matematicamente fria e calculada, alienante e alienada,
destinada a pensadores e fazedores maquínicos e burocráticos, bem como a trabalhadores dotados apenas de
sua força de trabalho como mercadoria vil. Assim, seguindo esse quadro histórico, este ensaio busca explicitar
as novas e velhas nuances a respeito da influência do papel educacional na chamada sociedade em rede
globalista, cada vez mais manipulada pela tecnociência informacional; dentro de uma sociedade, onde o info-
capital se retroalimenta por meio de um trabalho científico crescente e de uma pedagogia orientada pela
racionalidade instrumental. Essa contínua revolução tecnológica relega ou aprisiona o ser humano como mera
peça dentro da megamática entrelaçada entre Estado e mercado, agora com um condicionamento global baseado
em um motor único, moeda única, padrão de consumo padronizado e mimético, assim como supostos valores
morais e ideológicos de competição e competitividade, apontados por Santos (2007). Esse conjunto de
circunstâncias dá forma ao que Fukuiama (1992) chamou de fim da história. No entanto, diante da fragmentação
e da precariedade atual do trabalho e do mundo, Bauman (2005) afirma que a história ainda sequer começou.
Nesse contexto, C. Castoriadis (1987-1992) nos alerta que para uma sobrevivência humana civilizada é preciso
criar / resgatar uma paideia em que a economia não seja mais o fulcro, a base de todos os valores da sociedade,
mas antes, um simples apêndice, promovendo o resgate de uma sociedade baseada na verdadeira política. Nesse
sentido, Morin (2011) defende que neste novo momento histórico e, em última instância, no processo de ensino
/ aprendizagem, o cálculo não deverá ir ao encontro do coração e da carne viva. No entanto, é pertinente saber
navegar neste contexto e, mais ainda, no conjunto de circunstâncias a que se refere. Portanto, o ensino de
conhecimentos relevantes deve ser, em primeiro lugar, uma iniciação no âmbito da contextualização, no nosso
caso, da precariedade ambiental e social, ou melhor, como diz Santos (1996) “o mundo tal como se apresenta
verdadeiramente”.
Palavras-chave
Filosofia Política; Precariedade do trabalho; Paideia.
Abstract
As the title of the present essay suggests, it seeks to address the pedagogical pathways in the contemporary historical period, aiming
to understand its prominent role in structuring a Brazilian and global society based in civilized (civitas) patterns of citizenship and
territorial belonging. Based on geography, philosophy and several correlated areas, we envisage that the human being was born
predestined to live in freedom, without attachments, pregnant with reason and emotion. Nonetheless, in the dawn of renascence,
illuminism and rise of the modern state, that is, of the mercantile and later industrial capital, as Ortega y Gasset warns, the
illuminated philosophers, jurists and demagogues, in the wake of the discipline demand that the world of money and reason
required, outlined and erected rules, moral and ethical behaviors, shaped into laws, solidifying a “new human being”, no longer
governed by instinctive, rational and moreover free emotions. For this purpose, the new status quo sedimented the new pedagogical
disciplinary basis, mathematically cold and calculated, alienating and alienated destined to machinic and bureaucratic thinkers and
makers, as well as workers endowed solely with their workforce as a vile commodity. Thus, following this historical framework,
this essay seeks to explicit the new and old nuances regarding the influence of the educational role in the so-called globalist network
society, increasingly manipulated by the informational techno-science; within a society, where the info-capital feeds back by means
of a growing scientific labor and an instrumental rationality driven pedagogy. This continuous technological revolution relegates
or imprisons the human being as a mere pawn within the interwoven mega-mathics between state and market, now with a global
conditioning based on a single engine, single currency, a standardized and mimetic consumption pattern, as well as alleged moral
and ideological values of competition and competitiveness, as pointed out by Santos (2007). This set of circumstances shapes what
Fukuiama (1992) called the end of history. However, given the fragmentation and current precariousness of the work and the world,
Bauman (2005) asserts that history has yet not begun. In this context, C. Castoriadis (1987-1992) warns us that in order to achieve
a civilized human survival, it is necessary to create/rescue a paideia in which economy is no longer the fulcrum, the basis for all
society values, but rather a simple appendage, promoting the rescue of a society based on true politics. In this regard, Morin (2011)
advocates that in this new historical moment, and ultimately the teaching/learning process, the calculation shall not meet the heart
and the living flesh. It is though pertinent to know how to navigate this context, and moreover, the set of circumstances to which it
is related. Therefore, the teaching of relevant knowledge must be, in first place, an initiation in the realm of contextualization, in
our case, of the environmental and social precariousness, or rather as Santos (1996) puts it “the world as it truly presents itself”.
Keywords:
Political Philosophy; Work Precariousness; Paideia.
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Ser e Liberdade
E
m uma das obras de Sartre (2015), o mesmo ressalta que o homem, ao ser
jogado no mundo, possui naturalmente o potencial de ser livre. Todavia, por
que tanta dificuldade para alcançar esse nobre patamar? Lançando mão de um
texto de Ailton Siqueira de Sousa Fonseca (2010), sobre a obra de Clarice Lispector, intitulado
“A reconstrução do homem em Clarice Lispector”, a questão do humano e, portanto, de ser
livre, não é apenas conhecimento do seu entorno em busca de liberdade, mas de
autoconhecimento, enraizamento e destino, origem e humanidade, unindo razão e sensibilidade,
intuição e inteligência, racionalidade e paixão, já que o desejo da autora, era tocar a essência da
vida e religá-la à essência do universo, em suma, como posteriormente ressaltou Santos (1996),
nunca dissociar o ser de sua razão e emoção.
Nesta perspectiva vislumbra-se a possibilidade da formação de um sujeito total, de
essência e aparência, de razão e emoção, no contexto da natureza do seu espaço
(SANTOS,1996), espaço do cidadão, de civitas, de civilidade, de tolerância entre os estranhos,
visto que todos os sujeitos da pólis, ou não, conseguem, ou deveriam conseguir, tolerar o peso
da diferença do outro. Mas, por que, historicamente, é tão difícil uma paidéia construtiva de
um ser total? Resgatando Lavinas (apud BAUMAN, 1997), o mesmo frisa que não basta estar
no mundo, mas temos que estar para o mundo, já que o estar, digamos, no mundo do dinheiro
e da razão, despreza a sensibilidade com o outro, a paixão e compaixão, a piedade, a
solidariedade; já estar para o mundo é, como vislumbra Lispector, tocar a essência da vida em
sua totalidade e do universo (uno e diverso), ápice de um espaço cidadão.
Mas, como sugere o próprio título deste pequeno ensaio, e a realidade reinante, em todos
os quadrantes do mundo, em maior ou menor intensidade, o mesmo está em uma profunda crise
e, consequentemente, a formação educacional do sujeito, não somente para o seu estar no
mundo, mas, principalmente, quando jogado para uma educação formal nos parâmetros
curriculares do status quo do Estado Moderno estabelecidos, racional, individualista e
calculista. Isto se contrapondo, objetivamente, ao sentido pedagógico de estar para o mundo,
ou seja, uma educação humanista para enxergar o outro, repetimos, com paixão e compaixão,
piedade e solidariedade, ou seja, com cidadania e humanidade. Sem dúvida, esse estágio
envolve a dialética/dialógica ensino/aprendizagem.
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Bauman (2013, pp. 24-25), ressalta que o inglês Gregory Bateson, segundo ele, um dos
antropólogos mais perspicazes do Século XX, com uma capacidade incomensurável de
vislumbrar tendências culturais ainda incipientes, embrionárias, pelos idos dos anos 50, teve a
percepção do surgimento de “uma revolução educacional”. Nesse contexto via três níveis “no
processo de ensinamento e aprendizagem”. No primeiro degrau, mais baixo, situava, o que
comumente falamos, o ensino “decoreba”, o ensino mimético, no qual o aluno é obrigado a
repetir o que o professor diz; “aprendizagem rotineira” com lastro na memorização, tendo como
objetivo findo impedir qualquer formação crítica “transgressora”, ou seja, superficial, sendo,
segundo Batson, a produção pedagógica parecida a “mísseis balísticos”. No segundo nível, um
pouco mais elevado, situava-se uma pedagogia que releva uma estrutura de ensino que dá vazão
a bases e “predisposições cognitivas”, dando possibilidade a que os alunos se orientem em
contextos pouco conhecidos, mas observando, assimilando e incorporando conhecimentos
novos. Ironizando, e se embasando em Bateson, Bauman diz que é um “tipo de
ensino/aprendizagem destinado à produção de `mísseis espertos` [hoje cada vez mais
`inteligentes`]”. Mas, ainda embasado em Bateson, Bauman revela que o mesmo insinua uma
terceira via, em nível mais elevado: nesta etapa o ensino/aprendizagem busca, dado o número
cada vez mais crescente da ciência e da informação [grifo nosso], ou seja, um grau de “dados
anômalos” demasiadamente abundantes, a necessidade de sistematizá-los, fazendo-se
necessária uma mudança na “estrutura cognitiva”. Desse arcabouço pedagógico, segundo
Bauman, Thomas Kuhn denomina de “revolução científica”, tendo essa revolução um processo
contínuo de retroalimentação; um tropeço constante de uma revolução para outra.
Neste momento histórico, então, Bauman (2013, p.25) alega que estamos numa situação
de perpétuo contexto “revolucionário”. Em tais condições “o modelo de Mastrocola [educação
repetitiva, de memorização] é uma receita para incapacitar, e não para habilitar os jovens a se
juntar a companhia dos mais velhos. O único propósito da educação era, é e continuará a ser a
preparação desses jovens para a vida segundo as realidades que tenderão a enfrentar. Para estar
preparados, eles precisam da instrução: ´conhecimento prático, contrato e imediatamente
aplicável´, para usar a expressão de Túlio De Mauro. E, para ser `prático`, o ensino de qualidade
precisa provocar e propagar a abertura, não a oclusão mental”.
Mas eis o grande dilema do período histórico atual: como estruturar uma pedagogia, um
ensino/aprendizagem, com vistas à formação do eu como sujeito a partir da dialogia com o
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Assim, resgatando Lavinas, nunca precisamos tanto de seres para a feitura de um novo
mundo no e para ele!
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encontrar o código ético que por sua vez devia legitimar o papel dos iluministas legisladores
éticos e guardiães morais”. (BAUMAN, 1997, p.34)
Nessa perspectiva, as pessoas carentes de padrões morais e incapazes de os encontrar
sem ajuda, precisavam (precisam) de um “ambiente cuidadosamente planejado para favorecer
e recompensar verdadeiramente a conduta moral”, ou favorecer a escolha racional para “a
pessoa que deseja vida boa” em virtude das recompensas que traz. Isto demanda primeiramente
mestres e legisladores capazes de difundir e praticar o conhecimento e o conhecível ao posto
de “suprema autoridade”, pois se faz necessário “dizer”, instruir, “educar” as pessoas sobre o
que verdadeiramente lhes interessa. Nesta perspectiva, “o destino de refazer a realidade humana
em harmonia com a natureza humana dependia de suas mentes e de seus atos” (idem. p.35),
patenteando-se que a tão propalada natureza humana, não é a humana natureza na sua
realização, mas um enquadramento ideológico de visão normativa e classista de mundo; de um
mundo como nos alerta Sábato (1993), pautado no casamento indissociável do dinheiro e da
razão privados; de uma razão cada vez mais instrumental e descartada de emoções. Neste
contexto, talvez encontremos o verdadeiro ensino/aprendizado não somente racional,
matemático/instrumental, mas o seu conteúdo ideológico e os seus ideologizadores.
Mas essa ordem normativa falhou, como bem demonstra a crise econômica, moral e
ética, ou seja, política, em que nos encontramos. Para termos ideia, segundo dados estatísticos
recentes, em 2015, foram assassinadas no Brasil mais de 295.000 mil pessoas, 30% a mais do
que na Síria, país imerso numa guerra civil bárbara há anos. E bem sabemos os motivos: sem
uma mínima formação cidadã dos sujeitos, as cortesias se esfumaçam e a indiferença ou mesmo
a agressão, tornam-se normas; crimes amenos ou graves restam impunes, pois as organizações
são desprovidas de condições humanas e materiais para subsidiar as instâncias punitivas. Por
isso Z. Bauman (2015) destaca: “é o projeto humano que evoca a desordem, juntamente com a
visão da ordem, a sujeira juntamente com o plano da pureza...a modernidade é uma condição
compulsiva de projetos...onde há projetos há refugos...quando se trata de projetar as formas do
convívio humano, o refugo são seres humanos” (BAUMAN, 2005), em especial no projeto
globalista. Nesse contexto tão radical e com base nas atrocidades que cotidianamente
vivenciamos no Brasil, menciono ainda Bauman (idem, 2015) quando faz alusão a escória
humana excluída no império romano, chamada de Homo Sacer. Para ele, “o modelo ideal –
típico de pessoa excluída é oferecido pelo Homo Sacer, categoria do antigo império romano
estabelecida fora da jurisdição humana sem ser trazida para o domínio da lei divina. A vida de
um homo sacer é desprovida de valor, seja na perspectiva humana ou na divina. Matar um homo
sacer não é um delito passível de punição”. Assim, o Homo sacer é a principal categoria de
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[...] seres humanos em lugar de novos objetos de consumo. Para isso tem de
haver uma outra organização do trabalho, que faça com que ele deixe de ser
uma obrigação penosa e se torne um campo onde as capacidades humanas
possam se manifestar; tem de haver outros sistemas políticos, uma verdadeira
democracia comportando a participação de todos na tomada de decisões, uma
outra organização da paidéia para formar cidadãos capazes de governar e de
serem governados, como disse admiravelmente Aristóteles – e assim por
diante”. Enfim, uma boa cidade, uma boa sociedade, somente aflorarão através
de “uma radical transformação da sociedade como sociedade política”.
isso e para findar, retomo C. Castoriadis (1987-1992), quando alerta: “deveríamos desejar uma
sociedade na qual os valores econômicos deixassem de ser centrais (ou únicos); em que a
economia fosse recolocada em seu lugar de simples meio de vida humana e não de fim último;
onde, portanto, se renunciasse a essa corrida louca para um consumo cada vez maior. Isso não
apenas é apenas necessário para evitar a destruição definitiva do meio ambiente terrestre, mas
também, e sobretudo para salvar da miséria psíquica e moral dos homens contemporâneos”.
Todavia, enxergando o mundo como ele é e se apresenta, vislumbramos, pelo menos no
território brasileiro atual, uma maior miséria psíquica da sociedade que os usa, bem como uma
degradação moral nunca vistas. Isto porque os valores de uma “vida para consumo”, ou seja, os
valores econômicos nunca foram tão desmedidos e a economia globalizada nunca teve tanta
proeminência. Como lastro, temos um grau de devastação da natureza, uma exploração dos seus
recursos e a destruição das culturas nativas em níveis críticos, como reflexos não somente no
Brasil, mas também o seu replique no mundo. E em se tratando da cultura educacional,
comparativamente a outros países, inclusive países latino americanos, também vivemos tempos
nebulosos: cortes de recursos para todos os níveis educacionais, estagnação e degradação das
infraestruturas, defasagem salarial, carência de qualificação dos docentes, violência entre
alunos e entre estes e professores, quebra quase total de “hierarquia”, enfim, a escola tem
cambiado de território pedagógico civilizacional para campo de barbárie, já que a “fronteira”
entre o oikos, a casa, com famílias desestruturadas pela nova ordem econômica, e a escola se
esmaece, tornando-a também território e territorialidades da violência e do medo e não campo
de aprender a saber e fazer saber.
Por isso vejo pertinente as assertivas de Morin (2011, p. 147-152), quando o mesmo
contesta Jean Jacques Rousseau, ao afirmar para seus alunos: “quero ensinar-lhes a viver”. Ao
invés, Morin vê tal afirmação excessiva e, para ele, o mais adequado seria “pode-se ajudar a
aprender a viver”. E essa noção de vida se aprende através das próprias experiências [algo bem
afinado com as proposições de Paulo Freire], com a ajuda dos outros, através dos pais e
educadores [preferencialmente equilibrados, em um mundo aterrorizado pelo precariado e o
desalento total], mas também dos livros e da poesia. Viver é viver como indivíduo que enfrenta
os problemas da vida pessoal, é viver tanto quanto um cidadão de uma nação, é viver também
na própria permanência do gênero humano. O ensinamento atual proporciona conhecimento
sem ensinar o que é o conhecimento. Não se preocupa em conhecer o que é o conhecer, ou o
conhecimento, ou seja, não estuda os dispositivos cognitivos, suas dificuldades, suas
debilidades nem suas propensões ao erro e a ilusão.
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Hoje sabemos que muitas crenças do passado são, efetivamente, erros e ilusões.
Sabemos que as certezas dos comunistas sobre a União Soviética ou sobre a China de Mao eram
grossas ilusões. Começamos a saber que as verdades sobre o neoliberalismo econômico são
ilusórias. Quem poderá dizer que os conhecimentos de hoje considerados verdadeiros não são
errôneos? Como indicava Descartes, é próprio do erro não se reconhecer como tal. São muitos
os questionamentos e uma visão propositiva quanto à educação e o mundo vindouro.
Outro ponto que o autor menciona para questionarmos sobre as incertezas da estrutura
da paidéia reinante, é que a humanidade nunca deixa de estar possuída por mitos, Deuses, ideias
que, mesmo produzidas e alimentadas pela mente, se impõem a esta como realidades
transcendentes. Mesmo que lá onde impera um Deus, pode-se morrer por ele e o mesmo pode
ocorrer com uma ideia, ou seja, morrer e matar por ela (nada mais real no mundo hoje como ele
é e se apresenta, com tantas guerras, guerrilhas, atos terroristas em nome de um Deus, de uma
ideia e ideal transcendentes). Lenin, segundo Morin, dizia: “os fatos são teimosos”. As ideias
ainda são muito mais e sabem esconder os fatos.
É fundamental, portanto, que o conhecimento comporte consideráveis riscos de erros e
ilusões e mostrar quais são suas causas e quais podem ser suas consequências. Portanto, ainda
para o referido autor, deve-se ensinar o que é um conhecimento pertinente. Esse não é mais
pertinente pelo fato de se dotar de mais informações, ou quanto mais rigorosamente organizado
está matematicamente; é pertinente, sim, se sabe situar-se no seu contexto e, mais que isso, no
conjunto com o qual está relacionado. Finalmente, o cálculo não pode conhecer o coração e a
carne da vida. Por isso, o ensinamento dos conhecimentos pertinentes deve ser, em primeiro
lugar, uma iniciação à contextualização. Deve, também, relacionar o conhecimento abstrato
com seu referente concreto. O conhecimento abstrato é necessário, mas está mutilado se não
vai acompanhado de conhecimentos concretos.
Referências
______. Sobre Educação e Juventude: conversas com Riccardo Mazzeo. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Ed., 2013.
______. A cultura no mundo Líquido Moderno. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2013
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FUKUIAMA, Francis. O Fim da História e o Último Homem. São Paulo: Paz e Terra, 1992
GEORGE, Pierre. O Homem na Terra. A Geografia em Ação. Lisboa: Edições 70, 1993.
KURZ, Robert. O Colapso da Modernização. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1992.
ORTEGA y GASSET, José. A Rebelião das Massas. São Paulo: Martins fontes, 2002.
RAFFESTIN, Claude. Por uma Geografia do Poder. São Paulo: Ed. Ática, 1993.
SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço. Técnica e Tempo. Razão e Emoção. São Paulo:
Hucitec, 1996.
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ARTIGO
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Artigo
(1)
Graduada em Geografica (UFCG), Mestre em Geografia (UFPB).
E-mail: rejanengeo@gmail.com
(2)
Professor da Unidade Acadêmica de Geografia; Ciências Ambientais (Programa de Pós-Graduação em
Recursos Naturais); História (Programa de Pós-Graduação em História) da Universidade Federal de
Campina Grande.
E-mail: sergiomurilosa.ufcg@gmail.com
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Artigo
Resumo
acelerado e intenso processo de urbanização mundial ocasionou inúmeros problemas para a dinâmica das
cidades, entre eles a ocorrência de desastres naturais. O aumento do número de desastres suscita a necessidade
de compreensão do fenômeno e na identificação dos territórios mais vulneráveis. O objetivo desta pesquisa foi
analisar os riscos naturais e as vulnerabilidades sociais decorrentes de eventos climáticos e geomorfológicos na
área urbana de Campina Grande-PB. A metodologia foi composta de: a) Estudo exploratório, a partir de artigos,
relatórios da Defesa Civil e reportagens de jornais, nos quais foi feito o levantamento dos riscos e
vulnerabilidades existentes nos bairros ou setores censitários; b) Mapeamento e avaliação dos níveis de
vulnerabilidade social, baseada na proposta de Rezende (2015) com alguns ajustes, como a utilização do método
estatístico bootstrap. Os resultados mostraram que a cidade possui onze áreas de risco segundo dados da Defesa
Civil, e os setores que possuem nível elevado de vulnerabilidade estão dispostas principalmente nas margens
do perímetro urbano, enquanto o nível mais baixo de vulnerabilidade social se encontra na área central da
cidade. Destaca-se que os mecanismos de defesa civil ainda são insuficientes, principalmente na educação para
a redução de riscos de desastres (ERRD) das áreas sujeitas aos riscos.
Palavras-chave
Desastres; Geomorfologia; Planejamento Urbano, Paraíba.
Abstract Resumen
The accelerated and intense process of world El acelerado e intenso proceso de urbanización global
urbanization has caused numerous issues for the ha causado numerosos problemas para la dinámica de
dynamics of cities, including the occurrence of natural la ciudad, entre ellos la ocurrencia de desastres
disasters. The increase in the number of disasters naturales. El aumento del número de desastres suscita
raises the need to understand this phenomenon mainly la necesidad de entender el fenómeno y la
with regard to the identification of more vulnerable identificación de territorios más vulnerables. El
territories. The objective of this research was to objetivo de esta investigación fue analizar los riesgos
analyze the natural risks and social vulnerabilities naturales y vulnerabilidades sociales resultantes de
arising from climatic and geomorphological events in eventos climáticos y geomorfológicos en el área
the urban area of Campina Grande-PB. The urbana de Campina Grande-PB. La metodología se
methodology was composed of: a) Exploratory study, compuso de: a) Estudio exploratorio, basado en
based on articles, civil defense reports and newspaper artículos, informes de defensa civil e informes
reports, in which the risks and vulnerabilities existing periodísticos, en el que se examinaron los riesgos y
in the neighborhoods or census tracts were surveyed; vulnerabilidades existentes en los barrios o distritos;
b) Mapping and evaluation of levels of social b) Mapeo y evaluación de los niveles de
vulnerability, based on the proposal of Rezende (2015) vulnerabilidad social, basado en la propuesta de
with some adjustments, such as the use of the Rezende (2015) con algunos ajustes, como el uso del
bootstrap statistical method. The results showed that método estadístico de bootstrap. Los resultados
the city has eleven risk areas according to civil defense mostraron que la ciudad tiene once áreas de riesgo
data, and the sectors that have a high level of según datos de defensa civil, y los sectores que tienen
vulnerability are arranged mainly on the margins of un alto nivel de vulnerabilidad están dispuestos
the urban perimeter, while the lowest level of social principalmente en los márgenes del perímetro urbano,
vulnerability is in the central area of the city. It is mientras que el nivel más bajo de vulnerabilidad social
noteworthy that civil defense mechanisms are still se encuentra en la zona central de la ciudad. Cabe
insufficient, especially in disaster risk reduction destacar que los mecanismos de defensa civil siguen
education (ERRD) of risk-prone areas. siendo insuficientes, especialmente en la educación
para la reducción del riesgo de desastres (ERRD) de
las zonas propensas al riesgo.
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Artigo
Introdução
O
acelerado e intenso processo de urbanização ocasionou inúmeros
problemas para a dinâmica da cidade entre eles a ocorrência de desastres, e
sua potencialidade tem relação direta com fatores ambientais e
socioeconômicos. O aumento do número de desastres suscitou a necessidade de compreensão
deste fenômeno principalmente no que diz respeito à identificação de territórios mais
vulneráveis.
O século XX foi marcado por grandes mudanças tecnológicas e transformações na
relação campo-cidade e na migração para as áreas urbanas. O processo de urbanização é um
fenômeno de escala mundial, ocorrendo de forma mais rápida ou mais lenta em cada região
habitável do planeta. Entre 2007 e 2008 a população urbana ultrapassou a rural na Terra e
embora na Europa esse fato já tenha ocorrido ainda no século passado, somente no século XXI
ocorre no nível mundial. Com a rapidez com que se processa a urbanização em alguns países
ou regiões, como no caso do Brasil, observa-se que muitas cidades não conseguem atender às
demandas básicas das populações menos favorecidas econômica e socialmente; e, assim, vão
sendo criados bolsões de pobreza, segregando e aumentando os riscos (e a vulnerabilidade) para
essa população.
O aumento da segregação espacial é consequência do processo de supervalorização do
espaço urbano, a população de baixa renda não tem o seu direito de acesso à moradia garantido
e passam a ocupar terrenos que são constantemente sujeitos às contingências ambientais, as
chamadas áreas de risco (SANTOS; SOUZA, 2014). O risco é um “constructo eminentemente
social, ou seja, é a percepção de um indivíduo ou grupos de indivíduos da probabilidade de
ocorrência de um evento potencialmente perigoso e causador de danos” (ALMEIDA, 2011, p.
87).
Argumentam Marandola Júnior e Hogan (2004) que os riscos e vulnerabilidades devem
ser trabalhados simultaneamente, e isto se deve ao fato de que em estudos sobre risco o conceito
de vulnerabilidade esteve bastante presente, inicialmente em riscos de dimensão ambiental e
socioeconômica. Cepal (2002) elencou três etapas que constituem e auxiliam no entendimento
da vulnerabilidade. A primeira, diz respeito a existência de um evento potencialmente adverso,
de origem endógena ou exógena; a segunda, a incapacidade de responder à situação, por causa
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Artigo
da ineficiência de suas defesas, ou pela ausência de recursos que lhe deem suporte; e, por último,
a inabilidade de adaptação à situação gerada pela materialização do risco (CEPAL, 2002, p. 1).
Segundo Marandola Júnior e Hogan (op. cit.) a ciência geográfica iniciou os estudos de
risco e vulnerabilidade na dimensão ambiental. Os cientistas desta área desenvolveram
metodologias de análise do risco diferenciada, contemplando tanto variáveis ambientais quanto
as respostas coletivas e individuais das populações em risco.
A pesquisa teve como objetivo analisar os riscos naturais e as vulnerabilidades sociais
decorrentes de eventos climáticos e geomorfológicos (inundações e movimentos de massa) na
área urbana de Campina Grande-PB. Esta temática vem sendo tratada sistematicamente no
campo científico, haja vista sua grande importância para a geração de novos conhecimentos da
ciência geográfica e continua a apresentar um campo fértil para a pesquisa. Deve-se chamar
atenção também que as comunidades mais vulneráveis devem ser alvo de ações educativas para
a redução dos riscos de desastres e estar preparadas para eventos, extremos ou não, que possam
causar impactos sociais e econômicos, incluindo óbitos.
Metodologia
a) Área Estudada
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Artigo
b) Caracterização da Pesquisa
Para alcançar os objetivos da primeira etapa da pesquisa optou-se por uma pesquisa de
natureza exploratória. A pesquisa exploratória possui um planejamento flexível, uma vez que
possibilita a consideração dos mais variados aspectos relativos ao fato estudado. Quanto às
fontes, a pesquisa é bibliográfica, sendo este procedimento o mais adequado para este trabalho,
haja vista a necessidade de um aprofundamento conceitual do problema investigado, além da
disponibilidade de material bibliográfico que trata do assunto. Este tipo de delineamento
permite estudar o problema da pesquisa de forma mais ampla do que seria possível pesquisar
diretamente, constituindo um excelente ponto de partida para um estudo preliminar (GIL,
2002). As fontes bibliográficas utilizadas aqui foram exclusivamente obras de divulgação
reconhecidas no meio acadêmico, foram também utilizados relatórios disponibilizados pela
Defesa Civil de Campina Grande – PB e o acervo online do Jornal da Paraíba.
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sociedade por implicarem em fragilidades econômicas e sociais que contribuem para a condição
de vulnerabilidade.
Para a elaboração deste índice foram utilizados 21 indicadores socioeconômicos do
censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE disponíveis para os setores
censitários de Campina Grande – PB, descritos no Quadro 01.
Artigo
da distribuição de probabilidade do valor médio desta variável aleatória. Isto pode ser verificado
através da seguinte fórmula.
e) Mapeamento
Resultados e discussão
A cidade de Campina Grande não difere das diversas cidades do Brasil, mostrando que
tem crescido de forma desordenada, como consequência tem-se a formação das chamadas áreas
de risco, constituídas por habitações e infraestrutura precárias e escassez de serviços (ARAÚJO;
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NASCIMENTO, 2014).O Ministério da Integração Nacional (MIN, 2014) tendo como objetivo
analisar os riscos a escorregamentos e inundações em municípios mais recorrentemente
atingidos por esses desastres contratou a empresa a PANGEA - Geologia e Estudos Ambientais
para a realização de levantamento de dados e análise a desastres naturais, elaboração de mapas
de vulnerabilidade e de risco e apresentação de propostas de intervenções e prevenção de
desastres para sessenta e dois municípios do Brasil, entre eles, Campina Grande. Desta forma,
segundo o relatório foram identificados onze setores de risco correspondendo a um total de 540
edificações (MIN, 2014). Estas áreas correspondem a três tipos de eventos (Quadro 02).
As áreas de risco em Campina Grande existem principalmente devido aos dois riachos
urbanos existentes na cidade, o riacho de Bodocongó e o riacho das Piabas; e nos períodos de
chuvas extremas as pessoas que moram próximo acabam sofrendo com as consequências. A
Figura 02 mostra a área de risco localizada na Travessa Cecília Nunes de Oliveira, no bairro
Dinamérica 3, esta área está sujeita a episódios de inundação e escoamento com potencial
destrutivo e alta energia de escoamento em períodos de intensa pluviosidade quando ocorre a
enchente do riacho de Bodocongó.
Outra área de risco é conhecida como “Vila dos Teimosos” e está sujeita a inundação
com alta energia de escoamento e potencial destrutivo, além disto nesta área há várias casas de
estrutura vulnerável construídas na planície de extravasamento do açude de Bodocongó,
estando sujeitas a inundações temporárias constantes (Figura 03).
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Devido a sua localização geográfica, Campina Grande usufrui de um clima menos árido,
a sua altitude influencia na ocorrência de temperaturas menores proporcionando um clima
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ameno e mais agradável (MEDEIROS et al., 2014). A precipitação média anual é de 750mm
anuais, estando as chuvas mais concentradas nos meses de março a julho, com abril e julho
sendo os meses mais chuvosos (Figura 05).
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notícia relata um evento pluviométrico com total de 93,3 mm no período de três horas e meia
(Figura 06).
Figura 06 – Reportagem sobre perdas das chuvas registrada em Campina Grande, 14 fevereiro
de 1985
Fonte: Acervo do Jornal da Paraíba, 2000. Fonte: Acervo do Jornal da Paraíba, 2000.
Figura 09 - Reportagem sobre os riscos nas comunidades mais pobres de Campina Grande-PB
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Fonte: Acervo do Jornal da Paraíba, 2011. Fonte: Acervo do Jornal da Paraíba, 2011.
Figura 12 - Campina Grande entre as cidades com estragos das chuvas em 2011
Artigo
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Ações educativas que a Defesa Civil de Campina Grande realiza nas escolas não bastam,
se faz necessário que no conteúdo escolar em seus temas transversais estejam contemplados a
realidade dos fatos e eventos como desastres, sejam eles esporádicos, muito frequentes ou não.
Pois, como se nota nas informações coletadas em jornais, os desastres acontecem e com perdas
de vidas humanas como no caso de uma criança de 10 anos ocorrida no ano de 2011.
Os sistemas de monitoramento, alerta e comunicação do município foram considerados
suficientes em Campina Grande; porém, ainda se faz necessário a instalação do sistema de
monitoramento de alerta prévio para risco de escorregamentos e inundações ampliando o
número de pluviômetro existentes, priorizando áreas de risco para a instalação. Para
acompanhamento de previsões meteorológicas faz-se necessária também a coleta de
informações de outras instituições federais, como o Centro de Previsão de Tempo e Estudos
Climáticos/Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/INPE) e o Instituto Nacional de
Meteorologia (INMET).
Se faz extremamente necessária a criação de um cadastro de lideranças comunitárias do
município, de membros do NUPDEC, de voluntários, agentes comunitários de saúde,
principalmente das áreas de risco alto e muito alto. O cadastro deverá constar dados que
permitam contatar de imediato todas as pessoas relacionadas para comunicação de alerta de
previsões meteorológicas adversas e iminência de desastres.
Com relação a capacidade de planejamento e preparação para emergências, no quesito
planos de contingência, programas de mitigação e respostas a desastres o município mostrou-
se insuficiente. Para suprir essa demanda é necessária a criação de fundos para emergência,
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Assim como Campina Grande, diversos municípios não estão preparados para o
gerenciamento das áreas de risco. Almeida (2015) analisou dados dos municípios de todo país
objetivando verificar o grau de atuação da PNPDEC no âmbito municipal; a análise foi feita a
partir de dados que dizem respeito a existência de Coordenadorias Municipais de Proteção e
Defesa Civil (COMPEDEC); legislação específica relacionada à prevenção de riscos de
desastres; articulação entre os sistemas de planejamento e gerenciamento de riscos de desastres
com outras leis municipais.
Almeida (op. cit.) em sua análise constatou que 51% dos municípios brasileiros possuem
algum tipo de planejamento de medidas preventivas de desastres; estas medidas estão
relacionadas principalmente com os Planos de Saneamento Básico, mas apenas 9% dos
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Artigo
municípios possuem Plano Municipal de Redução de Riscos; 2% possuem lei específica que
contemplem a prevenção de enchentes ou enxurradas e 1% com leis específicas que
contemplem a prevenção de escorregamentos ou deslizamentos de encostas.
Ainda segundo Almeida (2015), a grande maioria dos municípios não possuem Carta
Geotécnica de aptidão à urbanização, apenas 3% possuem. Entre os municípios apenas 17%
possuem medidas preventivas contra enchentes ou enxurradas em seus planos diretores e 14%
possuem medidas preventivas a tais desastres em Leis de Uso e Ocupação do Solo. De todos os
municípios 19% possuem o mapeamento das áreas de risco como gerenciamento, porém quando
se trata da fiscalização destas áreas de risco, apenas 11% dos municípios realizam. Apenas 14%
apresentam plano de contingência e 4% apresentam sistema de alerta antecipado de desastres.
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Deve-se considerar que eventos como os desastres, assim como a existência das
ameaças, tem seu componente natural que pode se concretizar com a vulnerabilidade de um
indivíduo ou uma comunidade. Em Campina Grande, os setores ou bairros com vulnerabilidade
alta ou muito alta, tem sua componente ambiental que são os riachos, ou seus canais produzidos
para receber as águas de chuvas. A ameaça é maior para as populações que vivem nas margens
e área baixas que podem sofrer inundações, enchentes, alagamentos ou movimentos de solo,
provocando também o risco de desabamento entre outras consequências.
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Revista GeoSertões (Unageo-CFP-UFCG). Vol. 5, nº 10, jun./dez. 2020
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Revista GeoSertões – ISSN 2525-5703
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Considerações finais
Referências
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Fortaleza, v.10, n.23, p.83-99, set/dez. 2011.
ALMEIDA, P.E.G. de. A política nacional de proteção e defesa civil: os desastres como
problema político. 1° Seminário Internacional de Ciência Política: Estado democracia em
mudança no século XXI. UFRGS, Porto Alegre, 2015.
Artigo
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GIL, Antônio. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. 4º ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 175.
SCHMIDT-THOMÉ, P.; JARVA, J. The spatial effects and management of natural and
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Report, 2004. 15 p.
SILVEIRA, R.D; SARTORI, M. das G.B; Relação entre tipos de tempo, eventos de
precipitação extrema e inundações no espaço urbano de São Sepé- RS. Revista Brasileira de
Climatologia, ano 6, vol. 7, setembro, 2010.
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