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Prosódia Musical:

a melodia da fala

Prof. Dr. Sérgio Anders


Background

v Primeiro uso do termo: “República de Platão”, na


expressão phthongous te kai prosodias (LIDDEL; SCOTT;
JONES, 1996, p. 399a);

v Na língua portuguesa: lugar de destaque desde as


primeiras gramáticas. Ex: “Gramática da Língua
Portuguesa” (João de Barros, 1540, p. 60): os latinos
“partem a sua Gramática em quatro partes: em
Ortografia, que trata da letra; em Prosódia, que trata da
sílaba; em Etmologia, que trata da dicção, e em Sintaxe,
a que responde a construção , à imitação dos quais, (por
termos as suas partes), dividimos nossa Gramática”.
Background
vNa linguística atual, associada a:
• Fatores linguísticos: acento, ênfase, entoação e rítmo:
• Fatores paralinguísticos: marcadores discursivos, atitudes
proposicionais, atitudes sociais;
• Fatores extralinguísticos: emoções

Todos esses fatores se combinam com aspectos sociais e


biológicos indiciais como gênero, faixa etária, classe social,
nível de escolaridade, dentre outros.
Fatores Linguísticos
òAcento: lexical (dúvida e duvida) e frasal (na
enunciação de uma frase, a parte em que a linha
melódica atinge o seu ápice);

òÊnfase: um foco específico na cadeia da fala, para


chamar atenção para uma informação crucial, entre
outras funções;

òEntoação: altura (pitch) e volume (loudness);


embarca o estudo da duração e seu correlato físico e
perceptivo ao longo do enunciado, o ritmo;

òRítmo: compreende as variações de duração


percebida de unidades do tamanho da sílaba ao
longo do enunciado.
Fatores
Paralinguísticos
v Parte da linguística que contém os aspectos não verbais
que acompanham a comunicação verbal;

v Incluem o tom de voz, o ritmo de fala, o volume de


voz, as pausas utilizadas da pronúncia verbal, e demais
características que transcendem a própria fala;

v Permite-nos perceber mais claramente as razões por


que extraímos o significado não apenas do conteúdo
literal das palavras, mas também da maneira como elas
são expressas;

v Pode ser utilizada para identificar as emoções que o


locutor sente ao vocalizar as palavras.
Fatores
Extralinguísticos

v tudo que não é de natureza gramatical;


v É a bagagem experiencial que representa o
conjunto de informações advindas do cotidiano,
fruto da condição de todos os humanos de “estarem
no mundo”.

Em suma: é a prosódia que molda nossa enunciação


imprimindo a “o que se fala” um “modo de falar”,
que é dirigido intencionalmente ou não, ao ouvinte.
Fala
vDo ponto de vista da produção, a fala fundamental (f0)
corresponde ao número de vezes que as pregas vocais
abrem-se e fecham-se a cada segundo, o que, no nível
fisiológico, é determinado pela tensão exercida pelos
músculos da laringe sobre as pregas vocais;

vAs demais frequências da série harmônica, múltiplas de


f0, correspondem aos formantes que imprimem uma
determinada forma à onda sonora, devido à filtragem ou
modelagem ocorrida nas cavidades supra-glóticas – oral,
nasal e faringal.
Valor da F0
òVaria em função da configuração anatômica da
laringe;

òvaria em função do comprimento das pregas


vocais;

òPor isso a diferença de valores para falantes


masculinos femininos e crianças, visto que
apresentam estruturas laríngeas distintas:

ò 80 a 220 Hz na fala masculina;


ò 200 a 300 Hz na fala feminina;
ò 400 a 500 Hz na infantil.
Parâmetros da
Entoação
òFrequência Fundamental: é o traço mais significativo na
determinação do padrão entonacional de um enunciado;
ò Percepção do ouvinte: como variações de altura melódica, com
sons graves e agudos.
òIntensidade: amplitude da onda sonora, determinada pela
amplitude de vibração das pregas vocais, que varia com a pressão
exercida sobre elas pelo ar na região supra glótica.
ò Percepção do ouvinte: fraco e forte.
Parâmetros da
Entoação
òDuração: tempo decorrido na execução de um determinado
evento sonoro (sílaba, segmento, pausa, enunciado inteiro, etc).
ò como “longura”, sendo mais longo ou mais breve não em
termos absolutos, mas em comparação a outro som/segmento
presente no eixo sintagmático.
O Que é prosódia?
v“Prosódia, geralmente explicado, vem a ser a medida do
Tom ou bem dos Acentos, ensinando sobre que sílabas
devemos pousar, levantar ou fixar a voz, atentando por ali
quais sílabas são longas e quais curtas ou breves” (Abraão
Meldola, 1735);

v“Melodia da fala, tom , acento e quantidade incidindo


sobre as sílabas, ou modo como estas devem ser
pronunciadas ...” (Jerônimo Soares Barbosa, 1822);
O Que é prosódia?
v “Ensino da boa pronúncia” ( Jerônimo Soares Barbosa, 1822);

v “A parte da gramática que trata dos diferentes sons com que se


pronunciam as palavras, e assim trata a pronúncia das vogais, das
consoantes e dos ditongos, da sílaba predominante e das regras
ortográficas” (Domingos de Azevedo, 1880);

v “A parte da Fonética que trata da correcta acentuação e


entoação dos fonemas, [sendo a sua] preocupação maior o
conhecimento da sílaba predominante, chamada tônica”.
(Bechara, 13ª ed., 1969).
Etimologia da palavra
Prosódia
ò“É uma parte da Gramática, que nos ensina o som com que
devemos pronunciar as palavras: esta palavra é composta das duas
palavras gregas Pros, e Odos; Pros vale o mesmo que a palavra
Latina, Ad, e Odos vale o mesmo que a palavra latina, Cantus ...
(João de Andrade, 1841);

ò“Tal etimologia atribui à prosódia a significação de melodia que


acompanha o discurso e, na língua grega, mais precisamente, o
acento melódico que a caracteriza” (Izabel Pereira, 1992).
Ortoépia ou ortoepia
vCaráter normativo nas regras de boa pronúncia;

vDo grego orthós (correto) + hepós (fala): ocupa-se da


pronunciação correta das palavras.

Prosódia dupla: ortoépia ou ortoepia; xerox ou xérox.


Prosódia e Ortoepia

vProsódia: trata da acentuação (tonicidade) e


da entonação adequadas dos fonemas, de
acordo com a variedade padrão da língua. A
maneira como a gente se expressa ao falar;

vOrtoépia: trata da pronúncia correta dos


fonemas e palavras, de acordo com a variedade
padrão da língua. Como pronunciar tudo
“bonitinho”: as vogais, as consoantes, o timbre,
etc.
Ortoépia ou ortoepia
Pronúncia Errada Pronúncia Correta
mulequi moleque
câmbiu câmbio
beneficiente beneficente
buginganga bugiganga
guspe cuspe
róba rouba
aterrisar aterrissar
barguilha braguilha
metereologia meteorologia
Prosódia
Pronúncia Errada Pronúncia Correta
rúbrica rubrica
gratuíto gratuito
fortuíto fortuito
récorde recorde
Lucifér Lúcifer
latéx látex
nóbel nobel
Prosódia
De acordo com a acentuação tônica: Exemplos

Oxítonas Ruim, sutil, mister.

Paroxítonas Ibero, gratuito, rubrica

Proparoxítonas Elétrodo, antídoto, protótipo.


Palavras Homógrafas
òa mesma escrita com acentuação tônica diferentes:

ò Sabiá;

ò Sabia;

ò Sábia

.Canção: A Majestade o Sabiá.


Ortoépia ou ortoepia:
licença poética

Olê, muié rendéra,


Olê, muié rendá
Tu me ensina a fazê renda
Qui eu t’ insinu a namorá
A escrita imitando a fala típica do matuto, do interiorano,
valorizando o falar próprio de um povo.
Prosódia musical
òFala da importância da inserção no contexto musical,
sincronizando o tempo forte da música com a sílaba tônica;

òEx: Saudosa Maloca de Adoniran Barbosa. Como é o tempo no


samba? Como foi pensada a prosódia musical?
Erros de Prosódia:

ò “A Majestade o sabiá” de Roberta Miranda;

ò “Menina Veneno” de Ritchie;

ò “Loka” de Anita;

ò “Bang” de Anita;

ò “Pesadão” de Iza;

ò “Make love” de Inês Brasil;


ò “Papagaio loiro do bico dourado” (cantiga
Prosódia correta e erro de
ortoépia ou ortoepia
ò “O Samba do Arnesto” de Adoniran Barbosa:

Arnesto nos convidô pru samba: ele mora no Brais.

Nóis fumo num incontrêmo ninguém.

Nóis vortêmos com uma baita duma reiva!

Da outra veiz nóis num vai mais.

Nóis num semu tatu!


Licença Poética
ò Ortoépia ou Ortoepia: pode existir, a partir das escolhas
do letrista;

ò Prosódia: não pode existir nem licença poética nem


liberdade de expressão.
ò Reescrever as frases com erro de prosódia;
ò Não pode haver tempo forte da música em sílabas átonas
do texto;
ò Evitar musicar palavras que não possuem sentido algum,
fora do contexto da frase, em tempos fortes: no, com, que,
te, em, por, etc.
Apresentação e Discussão sobre o
trabalho de análise de “Saudosa
Maloca” com Elis Regina.
ò A bola está com vocês agora!!!!!!!!!!
“Malandragens”
ò Reacentuação:
ò Para driblar problemas com a prosódia musical:
ò “Lá vem o Brasil descendo a ladeira” de Moraes Moreira;
ò “Divina Comédia Humana” de Belchior.

ò Para manter o caráter estético da sua obra:


ò “Ideologia” do Cazuza (pra não quebrar a “pegada” rock).

ò Para não ficar formal demais, “incabível” no verso, além


de roubar o efeito de ritmo e rima:
ò “Chega de Saudade” de Tom Jobim e Vinícius de Moraes.
“Lá vem o Brasil descendo a ladeira” de
Moraes Moreira;
“Divina Comédia Humana” de
Belchior.
“Ideologia” do Cazuza
“Chega de Saudade” de Tom Jobim e
Vinícius de Moraes.
Madonna: Music
Madonna
Music makes the bourgeoisie and
the rebel
(Never gonna stop)

“Music”
Hey Mr. DJ Hey Mr. DJ
Put a record on (Never gonna stop)
I wanna dance with my baby
Do you like to boogie woogie
Hey Mr. DJ Do you like to boogie woogie
Put a record on Do you like to boogie woogie
I wanna dance with my baby Do you like my acid rock

And when the music starts Hey Mr. DJ


I never wanna stop Put a record on
It's gonna drive me crazy I wanna dance with my baby

Music, music, music And when the music starts


Music makes the people come I never wanna stop
together It's gonna drive me crazy
(Never gonna stop) Uh uh uh
Music makes the bourgeoisie and
the rebel Music makes the people come
(Never gonna stop) together
(Never gonna stop)
Don't think of yesterday Music makes the bourgeoisie and
And I don't look at the clock the rebel
I like to boogie woogie (Never gonna stop)
Uh uh
Do you like to boogie woogie
It's like riding on the wind Do you like to boogie woogie
And it never goes away Do you like to boogie woogie
Touches everything I'm in Do you like my acid rock
Got to have it everyday
Do you like to boogie woogie
Music makes the people come Do you like to boogie woogie
together Do you like to boogie woogie
(Never gonna stop) Do you like my acid rock
A prosódia e a Canção de Câmara
Brasileira
ò O procedimento de relacionar música e texto existe
desde a Antiguidade;

ò O gregos antigos já utilizavam de recursos retóricos;

ò Mais tarde: associação texto e música com os trovadores


medievais no período renascentista;

ò No barroco: a relação texto-música toma proporções


maiores – a arte era transformada em instrumento de
persuasão com o intuito de mover os afetos do público.
A prosódia e a Canção de Câmara
Brasileira
ò A Semana de Arte Moderna:
A prosódia e a Canção de Câmara
Brasileira
A prosódia e a Canção de Câmara
Brasileira
• Evento chocou a sociedade da época;

• Houve rompimento com a arte acadêmica, inaugurando


assim, uma revolução estética e o Movimento Modernista
no Brasil;

• Trouxe à tona uma nova visão sobre os processos artísticos,


bem como a apresentação de uma arte “mais brasileira”.
A prosódia e a Canção de Câmara
Brasileira
ò Nasce a canção de câmara brasileira;

ò Formato: canto e piano;

ò Gênero musical: canção de câmara;

ò Necessidade de formação de uma identidade nacional na música de


concerto;

ò Primeiro compositor a escrever em vernáculo: Alberto


Nepomuceno, a partir do “Lieder’ alemão e da “Mélodie” francesa
– “o pai da canção de câmara no Brasil”.

ò Antes de Nepomuceno: influência da ópera italiana e da modinha.


A prosódia e a Canção de Câmara
Brasileira
ò A canção é um gênero híbrido, uma junção da linguagem verbal
com a linguagem musical;

ò Essas linguagens não devem ser estudadas separadamente e exige,


portanto, três competências: a verbal, a musical e a lítero-musical;

ò É importante que haja um conhecimento dos aspectos formais e do


contexto do texto poético, assim como a compreensão musical da
canção;

ò O intérprete da canção necessita compreender a transposição do


estudo da forma poética para a forma musical, sendo necessários
que estes dois meios sejam trabalhados em conjunto na preparação
de uma dada performance.
A prosódia e a Canção de Câmara
Brasileira
ò Retrato: poema de Cecília Meireles (1901 – 1964)
Eu não tinha este rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios.
Nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,


Tão paradas e frias e mortas:
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,


Tão simples, tão certa, tão fácil:
- em que espelho ficou perdida a minha face?
A prosódia e a Canção de Câmara
Brasileira
. A música de Ronaldo Miranda (1948 - ):

ò Há indicação de moderato = 72;

ò Possui tempo de performance de aproximadamente 2


minutos e 40 segundos;

ò Extensão vocal de Dó#3 a Fá#4;

ò Harmonia modal/ tonal, onde a armadura é de Lá


menor, mas a obra está em Lá eólio, embora transite
também para Dó# menor. A nota inicial e final, nota
pedal, é Lá (finalis) e o compasso é quaternário.
O Lied Alemão
ò Lied/Lieder: canção;

ò Apareceu no Séc. XVI;

ò Recebeu novo impulso no Séc. XIX, graças a poetas


como Goethe e Schiller;

ò Canção para voz solista com acompanhamento de piano,


cuja música é composta baseando-se em um poema;

ò Objetivo: conseguir íntima união entre texto e música;

ò Tipos: Lied estrófico e Lied livre (Séc. XIX).


O Lied Alemão
ò Lied livre: a música se adapta à expressão e aos
sentimentos presentes em cada parte do texto;

ò Principais compositores: Franz Schubert (1797-1828),


Robert Schumann (1810-1856), Johannes Brahms
(1833-1897), Hugo Wolf (1860-1903), Gustav Mahler
(1860-1911);

ò Schubert: o verdadeiro criador do lied romântico. (+ de


600);

ò Principais poetas usados por Schubert: Schiller e Goethe.


Der Erlkönig
ò Rei dos Elfos é uma balada de Joahnn Wolfgang von
Goethe, escrita no ano de 1782;

ò O texto foi musicalizado por Schubert, Carl Loewe e


Beethoven (incompleta);

ò Movimento Sturm und Drang (Tempestade e Ímpeto):


temas como o amor, majoritariamente;

ò Goethe: pela primeira vez, uma balada que trás um tema


mágico e da natureza.
Resumo:
Erlkönig: tradução literal
A Mélodia Francesa
ò Canção de arte francesa: a mélodie do século 19 era,
geralmente, um cenário de um poema lírico sério para
voz e piano que, reconhecidamente, combinava e
unificava as formas poética e musical;

ò Primeiro uso da palavra: década de 1820, com as


traduções dos Lieder de Schubert;

ò Berlioz: o primeiro a compor nesse “novo estilo”;

ò Outros compositores: Meyerbeer, Liszt, Gounod, Bizet,


Massenet, Sain-Saëns, Lalo e Franck (mais como
professor)
ò Principais poetas: Verlaine e Baudelaire.
A Mélodia Francesa
ò Henri Duparc: um dos alunos do Franck – 16 canções
que se tornaram a pedra angular desse estimado gênero
da música francesa;

ò Fauré: muitos ciclos de canções, com ideais inerentes à


arte e cultura francesas – influenciou gerações e afastou a
forma francesa do “jeito” alemão de compor;

ò Com Ravel: anteciparam o estilo impressionista francês,


que apareceria no Chanson de Bilitis de Debussy: o
primeiro a compor nesse “novo estilo”;

ò Les Six: grupo de compositores parisienses que surgiu


depois da Primera Guerra Mundial (Poulenc e Milhaud).

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