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ATO I
GERALDINE - É claro que tive. Minha mãe era muito econômica, mas
sempre dentro de limites razoáveis.
PRENTICE - Se a senhorita teve pai, por que razão não é capaz de dar
conta dele?
GERALDINE - Ele abandonou minha mãe. Há muitos anos. Ela foi vítima
de uma agressão profundamente constrangedora.
PRENTICE (PERSPICAZ).- Ela era freira?
GERALDINE - Não. Era arrumadeira no Motel da Estação.
PRENTICE FRANZE A TESTA, TIRA OS ÓCULOS, E ACERTA
COM OS DEDOS O ALTO DO NARIZ.
PRENTICE - Dê-me esse volume grande, encadernado em couro, por
favor.
Preciso verificar sua história. Para salvaguardar meus interesses,
compreende?
GERALDINE PEGA O LIVRO NA ESTANTE E LEVA-O A
PRENTICE. ÊLE CONTESTA.
O Motel da Estação?
GERALDINE - É.
PRENTICE (ABRINDO O LIVRO, CORRENDO O DEDO PELA
PÁGINA) .Ah! Aqui estamos! Trata-se de um edifício de pouco interesse
arquitetônico construído para fins desconhecidos no final do século. Foi
convertido em hotel por subscrição pública. (ACENA SABIAMENTE A
CABEÇA). Eu mesmo fiquei hospedado lá uma vez, quando jovem. Tem
uma fama de luxo e conforto incompreensível até mesmo para o menos
exigente dos hóspedes. (FECHA O LIVRO COM ESTRONDO E O
EMPURRA PARA O LADO). Sua história parece ser correta, ao menos nos
pontos principais. Esta obra admirável, é claro, entre a maioria dos detalhes.
O que é de se esperar em publicações destinadas à mais ampla divulgação,
(PÕE OS ÓCULOS). Declare aí que seu pai desapareceu. Não diga nada a
respeito das circunstâncias. Poderia influenciar a minha decisão final.
GERALDINE ESCREVE. PRENTICE RECOLOCA O VOLUME NA
ESTANTE.
PRENTICE - Sua mãe está viva? Ou será que ela também desapareceu de
maneira inexplicável? Essa é uma pergunta marota. Muito cuidado - poderá
perder pontos no escore final.
ELE VOLTA À ESCRIVANINHA E SE SERVE DE WHISKY.
GERALDINE - Há muitos anos que não vejo minha mãe. Fui criada por
uma Sra. Barclay, recentemente falecida.
PRENTICE - Qual a causa mortis?
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SRA. PRENTICE - Como seu secretário. Ele voltará dentro de uma hora.
Você poderá verificar cuidadosamente as referências do rapaz. Onde está a
sta. Barclay?
PRENTICE - Lá em cima.
SRA. PRENTICE - Vou informa-la do que o pôsto não está mais vago.
PRENTICE ENGOLE WHISKY E POUSA O COPO.
PRENTICE - Você podia me emprestar um dos seus vestidos por uns
momentos, querida?
SRA. PRENTICE - Devo dizer que essa sua obsessão por roupas
femininas me parece um assunto desinteressante e, de modo geral, de
bastante mau gosto.
ELA POUSA SEU COPO E VAI PARA O HALL. PRENTICE PASSA
A MÃO NA TESTA.
PRENTICE - Ela não descansa enquanto não me ver na cova. ( VAI ATÉ
A CAMA, ABRE A CORTINA, OLHA PARA DENTRO). Sta. Barclay,
nossa situação é de maior perigo. Minha mulher está com a impressão de
que o seu vestido é dela.
GERALDINE OLHA POR CIMA DA CORTINA.
GERALDINE - Nós precisamos explicar, com o maior tato, naturalmente,
que ela cometeu um engano.
PRENTICE - Receio que seja impossível. A senhorita precisa ter um
pouquinho mais de paciência.
GERALDINE - Doutor - eu estou nua! O senhor já percebeu, não
percebeu?
PRENTICE (UM TREMOR LHE PERCORRE O ROSTO). Muito mais
do que possa pensar. Tenho a certeza de que isso me causa um profundo
embaraço. Eu vou procurar roupas adequadas.
ELE SE VOLTA PARA A CESTA DE PAPÉIS E ESTÁ A PONTO DE
RETIRAR DELA A ROUPA DE BAIXO QUANDO RANCE ENTRE,
VINDO DO JARDIM. PRENTICE DEIXA AS ROUPAS CAIR DE
NOVO NA CESTA E POUSA ESTA NO CHÃO. GERALDINE
ABAIXA-SE PARA FICAR INVISÍVEL.
RANCE (SORRISO PEDIDO). Bom dia. (TIRA O CHAPÉU) - O
Senhor é o Dr. Prentice?
PRENTICE - O senhor tem hora marcada?
RANCE - Não. Eu nunca marco hora. ( POUSA O CHAPÉU E A
PASTA, APERTOU-SE AS MÃOS). Eu gostaria de obter detalhes
pormenorizados a respeito da sua clínica. Suponha que ela funciona com
pleno conhecimento e permissão das autoridades hospitalares locais?
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RANCE - Em manicômios.
PRENTICE - Como diretores?
RANCE - Em grande parte.
SRA. PRENTICE (ENTRANDO, DO HALL, A PRENTICE) Ele insiste
na pontualidade. Deu cinco minutos.
PRENTICE (A RANCE) - Um candidato a emprego, doutor. Não adiante
querermos nos iludir que o socialismo não tem tido repercusão.(A SRA.
PRENTICE) - Nada da secretária?
SRA. PRENTICE - Nada. Já falei com a Agência de Empregos. Seus
clientes têm ordens severas de telefonar imediatamente após cada entrevista.
A sta. Barclay não telefonou.
RANCE - É preciso organizar uma busca. (A PRENTICE). O que há por
aqui em matéria de cães?
PRENTICE - Um pequinês e um poodle miniatura.
RANCE - Pois que sejam soltos! Geraldine Barclay precisa ser encontrada
e as autoridades informadas.
SRA. PRENTICE - Vou falar com o chefe da guarda. Ele controla o portão
e há de saber se ela deixou a clínica. (VIRA-SE PARA SAIR).
PRENTICE - Não. não faça isso. A sta. Barclay está inteiramente a salvo.
Está lá em baixo. Acabo de me lembrar.
RANCE (PAUSA. SURPRESO) - Por que ocultou o fato por tanto tempo?
PRENTICE - Eu tinha esquecido.
RANCE - O senhor já teve esses lapsos de memória outras vezes?
PRENTICE - Não que eu me lembre.
RANCE - A sua memória o engana até mesmo a respeito de sua própria
insuficiência?
PRENTICE - Eu posso ter tido uma curta amnésia. Não me lembro de ter
tido amnésia em qualquer outra ocasião.
RANCE - O senhor pode ter esquecido. Acabou de confessar que sua
memória não merece confiança.
PRENTICE - Só posso afirmar o que sei, doutor. Ninguém pode esperar
que eu me lembre de coisas que esqueci.
SRA. PRENTICE - E o que é que sua secretária está fazendo lá em baixo?
PRENTICE - Bruxinhas de pano para piorar a imagem dos bonecos em
áreas de atrito por preconceito de cor.
RANCE E SRA. PRENTICE TROCAM OLHARES ASSUSTADOS.
RANCE - E o senhor tem coragem de nos dizer, Dr. Prentice, que havia
esquecido que sua secretária estava fabricando esses monstrinhos?
PRENTICE - Tenho.
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SRA. PRENTICE - Ah, sem dúvida, doutor. Ele não mostrou a menor
compreensão quando eu lhe contei que havia sido atacada por um boy do
Hotel da Estação.
RANCE - De que natureza foi o ataque?
SRA. PRENTICE - O jovem queria me violar.
RANCE - E foi bem sucedido?
SRA. PRENTICE - Não.
RANCE (SACUDINDO A CABEÇA)- O serviço nos hotéis está cada vez
pior.
SRA. PRENTICE - E pouco depois da minha volta meu marido começou
a ter umas idéias esquisitíssimas, que teria tido o maior prazer em satisfazer,
se não tivessem ultrapassado de muito os limites do bom gosto.
RANCE - Exemplifique.
SRA. PRENTICE - Começou a demonstrar um desejo incontrolável por
peças de vestiário feminino.
RANCE (TOMANDO O SAPATO DE GERALDINE) Isto confirma a
minha história.
SRA. PRENTICE - Eu me recusei a lhe emprestar minhas roupas, e saí à
procura da sta. Barclay. Um pouco mais tarde, na minha presença, meu
marido numa espécie de ataque pediu para buscar água. Quando voltei, ele
me ofereceu um buque de flores.
RANCE - Na certa para congratular-se pela senhora ter voltado sã e salva.
SRA. PRENTICE - Mas eu só tinha ido até a farmácia. E ele havia tirado
as flores daquele vaso. (PAUSA). Eu fiquei furiosa, e bastante amedrontada.
Nessa altura um espasmo de agonia cruzou seu rosto normalmente
tranquilo. Eu lhe ofereci a água, que ele recusou de forma violenta,
alegando que a forma do copo era desaconselhável.
RANCE - Que frase reveladora!
SRA. PRENTICE - Eu fui buscar outro. Quando voltei ele estava de
joelhos, rezando.
RANCE - Que coisa chocante! Sua anormalidade o levou a buscar consolo
na religião. Essa é sempre a última trincheira do homem no limiar da
catástrofe. (DÁ UNS TAPINHAS NO OMBRO DA SRA. PRENTICE).
Não há dúvida de que tudo o que me contou tem a maior significação. E
precisamos também levar em conta os lapsos de memória confessados, e a
tentativa de criação de formas estranhas de vida. ( PÕE O SAPATO EM
SUA PASTA). Nem uma palavra sobre nossas suspeitas. As fantasmagorias
crescem como mato no solo doentio de uma mente insana.
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SRA. PRENTICE - Mas você mandou ele entrar. Não vai dizer que
esqueceu?
PRENTICE - Esqueci. (PAUSA) - Minha memória já não é o que era.
Pode dizer a ele que eu o verei agora. (SRA. PRENTICE VAI PARA O
HALL. PRENTICE RECOLOCA AS FLORES, VAI À
ESCRIVANINHA, SERVE-SE DE UM WHISKY DUPLO.
GERALDINE ENTRA DA ENFERMARIA. SEU CABELO FOI
CORTADO RENTE À CABEÇA. USA UMA CAMISOLA DE
HOSPITAL. PRENTICE FICA CONSIDERAVELMENTE
ALARMADO POR SUA PRESENÇA NA SALA) - Sta. Barclay! o que é
que está fazendo aqui?
GERALDINE - Nada me faria permanecer mais um momento que fosse a
seu serviço, doutor. Vim pedir demissão.
MATCH ENTRA DO HALL. GERALDINE ESTÁ OCULTA PELA
CAMA.
MATCH - Desculpe o mal-entendido, doutor.
PRENTICE (VOLTA-SE ABRUPTO) - Por favor fique lá fora. Eu pensei
que tinha falado claro.
MATCH (PAUSA) - O senhor não deseja me ver?
PRENTICE - Não. (MATCH, UM TANTO PERPLEXO ANTE A
SITUAÇÃO, SAI PARA O HALL. PRENTICE TOMA GERALDINE
PELO BRAÇO) - As suas revelações me arruinariam. Dê-me a
oportunidade de nos tirar desta confusão.
GERALDINE - O senhor precisa esclarecer as coisas, contando a verdade.
PRENTICE (FECHANDO AS CORTINAS DA CAMA) - Esconda-se ali
atrás. Nada de desagradável lhe acontecerá. Dou-lhe minha palavra de
cavalheiro.
GERALDINE - Nós precisamos contar a verdade!
PRENTICE - Isso é uma atitude inteiramente derrotista.
ELE A EMPURRA PARA TRÁS DAS CORTINAS.
GERALDINE (OLHANDO POR CIMA DA CORTINA) - Pelo menos
me dê de volta as minhas roupas. Eu me sinto nua sem elas.
PRENTICE TIRA AS ROSAS DO VASO, RETIRA AS ROUPAS DE
BAIXO E MEIAS DE GERALDINE, E ATIRA-AS PARA ELA. SRA.
PRENTICE E SARGENTO ENTRAM DO HALL. GERALDINE
AFUNDA ATRÁS DA CORTINA. PRENTICE ESTÁ COM AS
ROSAS NA MÃO. SRA. PRENTICE AGARRA O BRAÇO DE
PRENTICE.
SRA. PRENTICE - Ai, se ele me der de novo aquelas rosas eu tenho uma
coisa! (OBSERVA EM SILÊNCIO ENQUANTO PRENTICE REPÕE
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CORTINA
ATO II
mocinha, e entregue logo os tais pedaços que estão botando a polícia do país
inteiro em polvorosa. (TOMA GERALDINE PELO BRAÇO). Este aqui
vai para o isclamento. Não se pode deixar o hermafroditismo aguso andar à
solta.
GERALDINE - Que bom que meus pais estão mortos. Se não, iam morrer
com isso tudo. (RANCE LEVA-A PARA A ENFERMARIA).
PRENTICE (A NICK). Vou conseguir que o sargento se dispa. Se já estou
acusado de um crime, o melhor é comete-lo de uma vez.
NICK - Será que o senhor não pode dar uma injeção nele? Só para ele ficar
mais cordato.
PRENTICE - Um calmantezinho não faz mal a ninguém. Tem uns anti-
depressivos aí na escrivaninha. (NICK VAI À ESCRIVANINHA E
PEGA UMA CAIXA BRANCA DE PÍLULAS NA GAVETA.
PRENTICE ABRE A PORTA PARA O O HALL E CHAMA COM
VOZ AMÁVEL) - Quer dar um pulinho aqui, sargento?
NICK ENTREGA A CAIXA BRANCA A PRENTICE E ENTRA NA
FARMÁCIA.
MATCH (ENTRANDO VINDO DO HALL) - Deseja falar comigo,
doutor?
PRENTICE - Desejo. Eu queria que o senhor se despisse e se deitasse
naquela cama.
MATCH (PAUSA) - Mas ninguém me molestou.
PRENTICE - Não tem a menor importância. Fique só com a roupa de
baixo.
MATCH (SENTANDO NA CAMA E DESAMARRANDO AS BOTAS)
- Se o senhor fizer qualquer tentativa para me excitar, doutor, eu grito por
socorro.
PRENTICE - Vê-se logo que não foi molestado. Cria muita dificuldade.
O SARGENTO TIRA AS BOTAS. NICK APARECE NA PORTA DA
FARMÁCIA. PRENTICE DÁ-LHE AS BOTAS. NICK LEVA-AS
PARA A FARMÁCIA. SARGENTO TIRA A TÚNICA E ENTREGA-
A A PRENTICE. NICK, SEM SAPATOS, APARECE NA PORTA DA
FARMÁCIA. PRENTICE ENTREGA-LHE A TÚNICA, NICK VIRA
DE COSTAS. PRENTICE ABRE O FECHO DO VESTIDO. NICK
LEVA A TÚNICA PARA A FARMÁCIA. SARGENTO TIRA
GRAVATA E CAMISA. NICK, SÓ DE CUECAS, APARCE NA
PORTA DA FARMÁCIA. PRENTICE ENTREGA-LHE GRAVATA E
CAMISA. NICK ENTRA NA FARMÁCIA. O SARGENTO DEIXA
CAIR AS CALÇAS, SRA. PRENTICE ENTRA DO HALL E VENDO
O SARGENTO SEM CALÇAS, DÁ GRITO AGUDO. CHOCADO E
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NICK - Na farmácia.
NICK CORRE PARA O HALL. PRENTICE CORRE PARA A
FARMÁCIA. SRA. PRENTICE ENTRA DA ENFERMARIA, NICK
VOLTA DO HALL USANDO CUECAS E CAPACETE. AO VÊ-LO
SRA. PRENTICE GRITA E RECUA. NICK CORRE PARA O
JARDIM.
SRA. PRENTICE (FRACA, NA ESCRIVANINHA) - Meu Deus, isto
parece um hospício! (RANCE ENTRA DA ENFERMARIA. SRA.
PRENTICE ATIRA-SE SOBRE ELE, DESVAIRADA) - O senhor tem
de me ajudar, doutor. eu só vejo homem nu.
RANCE (PAUSA) - E quando começaram essas alucinações?
SRA. PRENTICE - Alucinação o que, é de verdade.
RANCE (RELINCHO DE RISO) - Todo mundo que sofre de alucinação
acha que elas são de verdades. Qual foi a última vez que a senhora viu um
homem nu?
SRA. PRENTICE - Agora mesmo. Nu, com um capacete de polícia.
RANCE (SECO) - Não é muito difícil deduzir o que é que a senhora tem
na cabeça, minha cara. A senhora está com problemas conjugais?
SRA. PRENTICE - Bom, eu tenho nofrite. Mas o meu marido se recusa a
receitar para mim.
RANCE - Narcotizar a mulher não é o melhor meio de um homem alcançar
uma união feliz.
SRA. PRENTICE - Eu não quero narcóticos. Quero que seja levada em
conta a minha natureza sexual. (VAI À ESCRIVANINHA E SE SERVE
WHISKY)
RANCE- Contribuindo para o colapso de seu marido, no menos em parte,
onde está o Dr. Prentice?
SRA. PRENTICE (PONDO GELO NO COPO) - Não sei. Quando voltei
depois de ter telefonado para o Hotel da Estação ele estava despindo o
sargento.
RANCE - Como a senhora descreveria as relações dele com o sargento?
SRA. PRENTICE - Como estranhas e, sob muitos aspectos, pertubadores.
Ele o havia chamado várias vezes a esta sala, mandando-o embora de modo
muito grosseiro logo depois.
RANCE - Se fazendo de regado, einh? Bom, isso sempre dá um sabor todo
especial a qualquer caso. Alguma novidade sobre a paciente?
SRA. PRENTICE - Nenhuma. A não ser pelo fato disto aqui parecer a
camisola que ela estava usado. (MOSTRA A CAMISOLA DE
GERALDINE) -
RANCE - Então ela deve está nua?
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RANCE - Eu sei. Mas nem por isso ela deixou de ser usada. Pode me
arranjar uma?
SRA. PRENTICE - Acho que o porteiro tem alguma.
RANCE - Não podemos nos arriscar com o seu estado em que está.
SRA. PRENTICE - Confesse que prefere o seu sexo ao meu. Eu não hesito
em dizer que eu prefiro.
RANCE - Ora, isso foi um mero ato físico sem qualquer significação
psicológica especial. Temos de confinar o Dr. Prentice imediatamente. E
precisamos de ajuda. A senhora não tem nenhum jovem musculoso para o
qual apelar em momentos de necessidade?
NICK - Não.
RANCE - Faça o favor de marcar hora. Eu não ouço confisões assim, sem
mais aquela.
NICK - Eu sou Nicholas Beckett. Não tenho o menor direito de usar este
uniforme. (TIRA O CAPACETE) - Eu vesti porque o doutor pediu, mas eu
não tinha a menor idéia de que estava auxiliando um psicopata.
RANCE - O senhor não tem irmão? E o sargento Match não está sob
custódia?
NICK - Não. Eu sou um boy que trabalha no Hotel da Estação. Conheci o
Dr. Prentice inteiramente por acaso. Gostei dele de estalo. Após uma breve
conversa durante a qual discutimos questões sexuais de modo aberto e
desabrido, ele me perguntou se eu me importava de me vestir de mulher. Eu
concordei em servi-lo porque já fui informado de que ser travesti não é mais
considerado como um vício debilitante. O doutor me apresentou a seus
colegas como “senhorita Barclay”. Eu deveria receber determinada soma
em dinheiro. (À SRA. PRENTICE) - É por isso que fiz objeções a ser
despido. Teria sido muito embaraçoso.
NICK - Não.
NICK - Quando ele foi transferido para o estrangeiro ele me deu um livro
chamado “A chave da Masculinidade Saudável”.
RANCE - Você verá que as exigências da medicina são bem mais suaves
que as de algumas outras armas. (PEGA UMA CAMISA DE FORÇA) -
Isto é uma camisa de força. Vou pedir-lhe que me ajude a persuadir o Dr.
Prentice a vesti-la. Talvez haja violência. O corpo dele tem personalidade
própria. (À SRA. PRENTICE) - A senhora tem um revolver?
SRA. PRENTICE (A NICK) - Não se arrisque. Peça socorro assim que vir
o Dr. Prentice. (SAI PARA O HALL, BRANDINDO O REVOLVER) -
Procure não quebrar nem os braços nem as pernas dele. Fica muito difícil
vestir a camisa de força.
RANCE - Ainda bem que você está tomando uma atitude mais responsável.
É muito encorajador. Onde está o corpo?
RANCE - E daí? Isso só prova que a senhora me contagiou com sua deonça
desgraçada. (TOMA-LHE A SERINGA)
RANCE - E a senhora está pensando que eu vou desperdiçar isto aqui com
ela? (ENTREGA SUA PRÓPRIA MANGA) - Com a grama a mais de
cinco libras, seria um crime. (INJETA-SE A SI MESMO) - Vá chamar a
polícia.
RANCE - Não.
RANCE - Estou.
NICK - Ele é psiquiatra. Deve saber. Ele não ia te meter numa camisa de
força se não estivesse louca. Só se fosse louco.
GERALDINE - Ela acha que sim. Ela acha que você é produto da
imaginação.
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PRENTICE - Minha mulher atirou em mim. Ela pensa que eu estou louco.
NICK - O senhor está louco. Tive ordens de metê-lo numa camisa de força.
NICK - Não.
RANCE - Já que nenhum de nós pode fugir, sua arma é inútil. Largue-a
PRENTICE POUSA O REVOLVER. RANCE PUXA O SEU E O
APONTA PARA O ATÔNITO PRENTICE.
RANCE - Receio que não. Acontece que era a minha própria família. Eu
tenho um retrato da cena lá em casa. Com meu pé bem em cima da cabeça
do meu pai. Mandei uma cópia para Sigmund Freud e ele me mandou um
cartãozinho muito amável.
RANCE - Parece.
minha reputação no fato desta moça ter sido vítima de uma agressão
incestuosa. Não abro mão desse diagnóstico. Meus editores me
processariam por cessação de lucros nos direitos autorais.
RANCE - E como é que essas crianças ficaram na posse das duas metades?
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NICK - Que espécie de mãe você devia ser, para se hospedar sozinha no
Hotel da Estação.
MATCH - Será que alguém poderá apresentar, ou fazer com que sejam
apresentadas, as partes desaparecidas de Sir Winston Churchill?
MATCH - E ele não teve uma palavra de conforto para com a senhorita,
como única descendente da mulher violada pelo heroi de 1940?
FIM