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22409/1984-0292/2023/v35/5999 1 de 10
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Resumo
Esta pesquisa apresenta as estratégias de cuidado em Saúde Mental Infanto-Juvenil (SMIJ) no município de Guamiranga, localizado
na região centro sul do estado do Paraná. Buscamos compreender quais as estratégias utilizadas, a partir das experiências dos Agentes
Comunitários de Saúde (ACS), para identificar e acompanhar crianças que possuem demandas de cuidados em saúde mental. Dividiu-se
em três momentos: acompanhamento das visitas domiciliares, um grupo focal com as ACS e a análise e sistematização dos dados a partir
da Análise Institucional. Entendemos que para produzir o cuidado nesta rede complexa da SMIJ, é preciso superar a lógica da pessoali-
zação, do especialismo e o modelo da medicalização, tensionando este modelo de cuidados para que a SMIJ se faça presente na agenda
política do município. Um cuidado que precisa ser pautado na lógica da corresponsabilização e intersetorialidade, para que não fique
colado na educação como o lugar responsável por essas questões.
Palavras-chave: saúde mental infanto-juvenil; municípios de pequeno porte; agentes comunitários de saúde; atenção primária à saúde.
Children and adolescents mental health: the care in the small sized-cities
Abstract
This research presents the care strategies in Child and Adolescent Mental Health (SMIJ) in the municipality of Guamiranga, loca-
ted in the south-central region of the state of Paraná. We seek to understand which strategies are used, based on the experiences
of Community Health Agents (CHA), to identify and monitor children who have demands for mental health care. This research was
divided into three stages: accompanying home visits, a focal group with CHAs and an analysis and data systematization utilizing
Institucional Analysis. We understand that in order to produce this complex care network for CAMHC, it´s necessary to overcome
the logic of personification, especialization and medicalization in the hopes that this care model for the CAMHC becomes a part of
the political agenda of the city. The care needs to be based on the logic of co-responsibility and intersectoriality so that it´s not set
on education as the place responsible for these issues.
Keywords: children and adolescents mental health; small-sizes cities; community health agents; primary health care.
Esta investigación presenta las estrategias de atención en Salud Mental Infanto-Juvenil (SMIJ) en el municipio de Guamiranga,
situado en la región centro-sur del estado de Paraná. Se buscó conocer qué estrategias se utilizan, a partir de las experiencias
de los Agentes Comunitarios de Salud (ACS), para identificar y acompañar a los niños que tienen demandas de atención en salud
mental. Se dividió en tres momentos: el seguimiento de las visitas domiciliarias, un grupo focal con las ACS y el análisis y siste-
matización de los datos desde el Análisis Institucional. Entendemos que, para producir atención en esta red compleja del SMIJ, es
necesario superar la lógica de la personalización, la especialización y el modelo de medicalización, tensionando ese modelo de
atención para que el SMIJ esté presente en la agenda política del municipio. Una atención que debe guiarse por la lógica de la cor-
responsabilidad y la intersectorialidad, para no quedarse estancada en la educación como lugar responsable de estas cuestiones
Palabras clave: salud mental infanto-juvenil; municipios pequeños; agentes comunitarios de salud; atención primaria en salud.
A Constituição Federal de 1988 e a Lei 8.080 de 1990 Atualmente, o dispositivo responsável por organizar
são marcos legais para a criação do Sistema Único de Saú- a rede de atenção em saúde mental, tanto adulto quan-
de (SUS) e preveem que a saúde é um direito fundamen- to infanto-juvenil, é o Centro de Atenção Psicossocial
tal de todo ser humano, inclusive crianças e adolescentes. (CAPS), e uma de suas modalidades é o CAPSi (infan-
Neste momento, podemos dizer que a saúde da infância til), voltado para crianças e adolescentes com transtornos
e adolescência entram na agenda do Estado, ou seja, no mentais graves e persistentes, que fazem uso de crack,
final da década de 80 coloca-se essa questão como uma álcool e outras drogas, sendo um serviço aberto e de cará-
problemática de responsabilidade do Estado. Em 1990 é ter comunitário indicado para municípios ou regiões com
aprovado e instituído o Estatuto da Criança e do Adoles- população acima de 150 mil habitantes (BRASIL, 2011).2
cente (ECA), que dispõe sobre a proteção integral dessa É a implantação do CAPSi e o estabelecimento de diretri-
população, garantindo-lhes todos os direitos fundamentais zes para a articulação intersetorial da saúde mental com
inerentes à pessoa humana e, conforme o Art. 2º, conside- outros setores públicos que constituem, atualmente, os pi-
ra criança a pessoa até doze anos de idade incompletos, e lares da saúde mental pública para crianças e adolescentes
adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. (COUTO; DUARTE; DELGADO, 2008). De acordo com
Esses direitos, instituídos com o ECA, integram o Lauridsen-Ribeiro e Tanaka (2012, p. 159), “quando não
campo da saúde mental infanto-juvenil, pois trazem con- há CAPSi no município é importante identificar (ou cons-
sigo “uma nova doutrina, a da proteção integral, que vem truir) equipe especializada em saúde mental infantil para
para superar a ideia do assistencialismo do Estado volta- dar retaguarda às ações voltadas a esta faixa etária”.
do para o controle e o asilamento de crianças e adoles- Segundo os dados do IBGE (2014), o Brasil possui
centes” (BRASIL, 2014, p. 11). um total 5.570 municípios, e estes são classificados de
A saúde mental infanto-juvenil como construção de acordo com o porte populacional da seguinte maneira:
uma política pública é posterior à intervenção do Esta- até 50 mil habitantes são considerados municípios de pe-
do junto a essa população, acontecendo de forma efetiva queno porte I, entre 50 e 100 mil habitantes são conside-
apenas no século XXI. A partir de então, foram sendo rados municípios de pequeno porte II, entre 100 e 500
instalados e construídos espaços para a luta e implemen- mil habitantes são considerados municípios de médio
tação de ações voltadas para esse público. Em 2001, com porte, e mais de 500 mil habitantes são considerados mu-
a implantação do Fórum Nacional de Saúde Mental In- nicípios de grande porte.
fanto-Juvenil (BRASIL, Tabela 1: Porte Populacional
2005) na III CNSM; em
2002, com a formaliza-
ção do CAPS i (BRASIL,
2014); em 2005, com o
documento Caminhos
para uma política de saú-
de mental infanto-juve-
nil (BRASIL, 2005) do
Ministério da Saúde; em
2012, com a importância Fonte: IBGE, Análise Estimativa de 2014.
da intersetorialidade trazi-
da pela IV CNSM (BRASIL, 2005) e em 2014, com o do- Segundo o informativo eletrônico Saúde Mental em
cumento Atenção psicossocial a crianças e adolescentes Dados (BRASIL, 2015), o número de CAPSi no Brasil
no SUS: tecendo redes para garantir direitos (BRASIL, equivale a 201, e no Paraná (Estado onde a pesquisa foi
2014) do Ministério da Saúde. Assim, o lugar da saúde realizada), são 11 serviços implantados. Como pode ser
mental infanto-juvenil foi sendo pautado na agenda polí- observado na tabela acima, mais de 94% dos municípios
tica do país, buscando transformar as antigas práticas de brasileiros são considerados de pequeno porte, e cerca
assistência filantrópica. de 4% dos municípios estão de acordo com a legislação
De acordo com a Organização Mundial da Saúde da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), podendo reali-
(OMS), apenas 7% dos países contam com políticas zar a implantação do CAPSi. Com isso, a grande maioria
explícitas para a atenção em saúde mental da infância desses municípios precisam contar com ações substituti-
(LAURIDSEN-RIBEIRO; TANAKA, 2012). É relevan- vas ao principal dispositivo de cuidado em saúde mental
te explicitar que “os problemas de saúde mental acome- infanto-juvenil, isto é, o CAPS.
tem uma em cada cinco crianças/adolescentes e que os Em consonância com Sinibaldi (2013) e Rizzini
problemas de saúde mental da infância sem tratamento (2005), entendemos que é necessário problematizar os
adequado perduram até a idade adulta” (LAURIDSEN- cuidados dispensados historicamente à população in-
-RIBEIRO; TANAKA, 2012). Evidenciamos a impor- fanto-juvenil, pois o Brasil possui uma longa tradição
tância da intervenção tão logo o sofrimento comece a de internação de crianças e adolescentes em instituições
aparecer, assim abrem-se espaços para intervenções que asilares, e essa cultura de institucionalização do cuidado
podem contribuir para o não agravamento do adoecimen- 2
O porte populacional de referência para a abertura de CAPSi tem sido flexibili-
zado pelo Ministério da Saúde, conforme avaliação e características loco-regio-
to em períodos posteriores da vida. nais, que justificam a implementação do equipamento.
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Saúde mental infanto-juvenil: o cuidado em municípios de pequeno porte
dispensado na área da saúde mental ainda está presente DATASUS,3 há 100% de cobertura das ESF e dos ACS.
nesse campo. As ações relacionadas à Saúde Mental In- Neste município há evidências de que são escassas as
fanto-Juvenil (SMIJ) foram, no país, delegadas aos se- ações voltadas para a saúde mental infanto-juvenil den-
tores educacional, de assistência social e às instituições tro do âmbito da saúde.4 Com isso, como são as ACS5
filantrópicas, pelo fato de o setor público não estar se res- um dos profissionais que compõem a ESF e aquelas que
ponsabilizando por esses cuidados (COUTO; DUARTE; mais têm contato com as famílias por meio das Visitas
DELGADO, 2008; FREITAS, 2006). Domiciliares (VD), entendemos que poderiam auxiliar
No âmbito do SUS, a Equipe de Estratégia de Saúde na compreensão de como tem sido abordado o cuidado
da Família (ESF) caracteriza-se como uma equipe res- em saúde mental de crianças e adolescentes na atenção
ponsável por organizar o cuidado na Atenção Primária à primária em saúde.
Saúde (APS) e destina-se ao cuidado das famílias que fa- Assim sendo, este trabalho surge a partir de questio-
zem parte do território de abrangência da Unidade Básica namentos acerca da existência de demanda por cuidados
de Saúde (UBS), composto por um médico, um enfermei- de saúde mental para crianças e adolescentes, ou seja,
ro, um técnico de enfermagem e quatro agentes comuni- elas existem no município? Se existem, como estão sen-
tários de saúde (ACS). “A APS tem como um de seus do identificadas? Se estão sendo identificadas, estão sen-
princípios possibilitar o primeiro acesso das pessoas ao do acolhidas ou encaminhadas para os serviços de saúde?
sistema de saúde, inclusive daquelas que demandam um Se não estão sendo encaminhadas ou acolhidas pelas
cuidado em saúde mental” (BRASIL, 2013, p. 19). Logo, UBS, em qual estabelecimento são acolhidas?
é relevante entender a articulação entre os sujeitos que Para compreender esta realidade social é preciso re-
a compõem e suas estratégias de cuidado, pois também velar as forças que operam neste campo, fazer emergir
deve ser a porta de entrada para as questões em SMIJ. o novo, a capacidade de inovação, a contestação, rom-
Assim, por meio principalmente das visitas domicilia- pendo com a lógica de funcionamento enrijecida e, ao
res (VD), compreendemos que o ACS é o profissional mesmo tempo, os modos de pensar e funcionar, a ordem
da equipe que mais tem proximidade com a comunidade. estabelecida, os valores, modos de representação e de or-
Portanto, entendemos que é importante compreender ganizações consideradas normais (SEVERO; DIMENS-
quais ações estão sendo realizadas para manejar as de- TEIN, 2011; LOURAU, 2004).
mandas dos municípios onde não há dispositivos espe- Para isso, a pesquisa foi realizada em três momentos:
cíficos para a saúde mental infanto-juvenil, para assim “acompanhamento”, “grupo focal” e “sistematização dos
possibilitar a reflexão acerca dos cuidados e estratégias dados”. Nesse primeiro momento, foi possível perceber
que podem ser utilizados junto a esta população. Assim como ocorre o trabalho das ACS a partir do acompanha-
sendo, este trabalho teve o objetivo de compreender quais mento de quatro VD em dias diferentes. Cada agente de-
são as estratégias utilizadas pelos agentes comunitários monstrou uma forma de operar o cuidado para as questões
de saúde (ACS) de um município de pequeno porte para de SMIJ, as suas concepções em torno do que é a SMIJ,
identificar e acompanhar crianças que possuem deman- o quanto estão imersas no campo da infância e juventude.
das de cuidados em saúde mental a partir do referencial
O segundo momento caracterizou-se pela realização
teórico da Análise Institucional (AI).
de um encontro em grupo, constituído por oito ACS,
O percurso da pesquisa guiado por um roteiro semiestruturado, construído a
Esta pesquisa é caracterizada pela abordagem quali- partir das questões suscitadas nas VD, com duração de
tativa e “trabalha com o universo dos significados, dos 1 hora, tendo seu áudio gravado para transcrição e que,
motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das posteriormente, foi apagado, conforme consta no TCLE.
atitudes” (MINAYO, 2008). É guiada pelo referencial te- Essas etapas produziram diversos sentidos e conte-
órico da Análise Institucional (AI), que, de acordo com údos que foram utilizados como disparadores para que
L’Abbate (2012, p. 198), “tem por objetivo compreender pudessem emergir seus conhecimentos sobre o tema pes-
uma determinada realidade social e organizacional, a par- quisado, além de reunir sentimentos, atitudes, percepções
tir dos discursos e práticas dos sujeitos”. e opiniões com relação às questões de SMIJ.
Após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa A inserção na realidade desse contexto é vista de
(COMEP) da UNICENTRO, submetendo-se às normas e maneira processual, pois o tempo todo estamos em pro-
diretrizes estabelecidas pela resolução 466/2012 do Con- cesso, em obra, o sujeito e o objeto se fazem juntos, e
selho Nacional de Saúde (CNS, 2012), foi possível ini- o tema da pesquisa aparece com o pesquisar (PASSOS;
ciar o contato com a secretaria municipal de saúde e com KASTRUP; ESCÓSSIA, 2009). Assim, à medida que a
os ACS da Atenção Primária do município, todos do sexo pesquisa foi sendo desenvolvida, a partir dos relatos das
femino. Assim, com a permissão delas, materializada agentes por meio das VDs e do grupo focal, percebemos
através do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido que era necessário nos inserirmos no campo da educação
(TCLE), iniciamos o processo de pesquisa.
3
Departamento de Informática do SUS.
O campo de intervenção foi o município de Guami- 4
Informações coletadas do banco de dados do PPSUS (Programa Pesquisa para
ranga, situado na região centro sul do Paraná, com apro- o SUS).
ximadamente 9 mil habitantes. Segundo os dados do 5
BRASIL, Decreto n° 3.189, de 4 de outubro de 1999. Fixa diretrizes para o exercí-
cio da atividade de Agente Comunitário de Saúde (ACS), e dá outras providências.
Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3189.htm
para compreender algumas questões. Foi possível per- Regional de Saúde do estado do Paraná, e a partir da pro-
ceber que a escola e a APAE possuem um papel impor- dução dessa pesquisa (Programa Pesquisa para o SUS
tante no cuidado em SMIJ no município, demonstrando – PPSUS), podemos dizer que os municípios de peque-
que o território em questão carrega uma história, possui no porte possuem algumas características semelhantes,
práticas de cuidado que operam conforme organizações como: apresentam uma rede informal e uma “lógica
próprias deste contexto. Com isso, entramos em contato pessoalizada” de cuidado; as estratégias de cuidado de-
com a pedagoga da prefeitura, responsável por todas as pendem dos dispositivos implantados; predominam os
escolas do município e que também realiza a coordena- encaminhamentos como estratégias de cuidado; e o papel
ção da APAE, e realizamos uma entrevista. do vínculo existente nas relações sociais é determinante.
Esses momentos foram registrados em um diário de A lógica da pessoalização significa eleger um profis-
campo e utilizados como material de análise, pois esse sional como o responsável por dar os encaminhamentos
instrumento, como enfatiza Lourau (1993), permite o co- necessários às demandas; é aquele que, estando ou não em
nhecimento da vivência cotidiana de campo, não o “como uma equipe específica, por ter contato com todo o territó-
fazer” das normas, mas o “como foi feito” da prática, rio, é a referência para a maioria das questões que envol-
além de reconstituir a história subjetiva do pesquisador. vem resolutividade das demandas. Lógica esta que pode
O terceiro momento caracterizou-se pela sistematiza- ser observada na pesquisa, pois todos os profissionais par-
ção dos dados produzidos em todo o percurso da pesqui- ticipantes indicam ter como referência para as questões de
sa, isto é, pela organização e reflexão destes e do diário saúde mental a mesma pessoa. Esta estratégia pode, em
de campo, analisando o processo vivenciado, perpassado alguns casos, dar resolutividade ao cuidado; no entanto, é
pela análise de implicação. preciso estar atento para que este profissional não acabe
sobrecarregado, e as informações sobre os usuários não
A análise institucional, como explica Lourau (2004),
sejam omitidas dos outros profissionais, para que o cuida-
se propõe a descobrir o “não dito”, a face escondida das
do possa ser realizado em rede, de maneira intersetorial e
instituições, pois estas não são somente os objetos ou as
corresponsabilizada. É importante não confundir esta ló-
regras visíveis na superfície das relações sociais. Não se
gica com o conceito de “Técnico de Referência”, que se
trata de interpretar ou construir um discurso explicativo,
caracteriza como uma tecnologia de trabalho, tratando-se
mas de decompor, de trazer à luz os elementos que com-
de uma “posição assumida pelo trabalhador que estabele-
põem (LOURAU, 2004) a instituição, como, por exem-
ce maior vínculo com a pessoa em sofrimento” e realiza a
plo, por meio de linhas de análise.
gestão do cuidado (BRASIL, 2013, p. 57).
Desse modo, foi possível encontrar quatro linhas de
O viver em pequenos municípios implica relações so-
análise para discorrer acerca da pergunta de pesquisa, são
ciais muito próximas, pois, como constatado, a maioria
elas: 1- O território em municípios de pequeno porte; 2-
das pessoas se conhecem, sabem o que se passa na vida
Onde está o cuidado?; 3- Intersetorialidade: a escola é a
uma das outras, frequentam os mesmos lugares e os mes-
escola e a saúde é a saúde; e 4- O lugar da educação.
mos serviços disponíveis na rede. Esta proximidade pode
“O território e os municípios de pequeno porte” resultar na construção de vínculos que potencializam o
O conceito de território possui diferentes definições cuidado, produzindo experiências no território, vivencias
conforme a área de conhecimento. Na saúde coletiva, ele culturais, sociais e familiares que podem empoderar a
pode ser compreendido como um princípio organizativo produção de subjetividades, proporcionando uma corres-
que prevê que os serviços devem organizar o cuidado no ponsabilização no cuidado do outro, conectando as rela-
território em que aquele usuário reside (LIMA; YASUI, ções sociais em rede.
2014). Além disso, nas palavras de Lima e Yasui (2014, No entanto, no caso de crianças e adolescentes, as
p. 603), “ir ao encontro do território é estar atento para os ACS apontam que é raro quando algum cuidador con-
modos de organização, de articulação, de resistência e de ta que o seu filho tem algum sofrimento psíquico. Logo,
sobrevivência que as pessoas que ocupam esses espaços levantamos algumas hipóteses para esta omissão de in-
vão inventando no seu cotidiano”. formações, como: há um estigma frente a este tipo de
Entendemos o território segundo o conceito de espa- sofrimento; falta compreensão sobre a importância de
ço empregado por Massey e Keynes (2004), como sendo falar sobre esse assunto com as ACS, entendendo que os
o produto das interações, das dificuldades e complexida- responsáveis por esse cuidado são a escola e/ou a APAE,
des, dos entrelaçamentos e dos não-entrelaçamentos de lugares nos quais as demandas têm chegado no referido
relações; é a esfera do encontro, ou não, das trajetórias município; relações sociais de proximidade constituem
que coexistem, afetam uma a outra, é o produto de inter- uma barreira, de modo que as pessoas podem não se sen-
-relações. Com isso, “o espaço encontra-se sempre em tir confortáveis em pedir auxílio para aquele que é, ao
processo, num fazer-se, nunca está acabado” (MASSEY; mesmo tempo, profissional e vizinho.
KEYNES, 2004, p. 17). Portanto, na intenção de encontrar resolução para o
Pensar o território como um espaço de relações au- sofrimento, há o movimento de busca de outras formas de
xilia no entendimento dos processos organizativos e vi- cuidados e acolhimento, fazendo com que as pessoas pro-
venciados por trabalhadores de municípios de pequeno curem novos vínculos, como, por exemplo, construindo
porte. Baseando-nos em um estudo desenvolvido na 4ª um novo fluxo de cuidados que muitas vezes ultrapassa
os limites geográficos municipais, ou buscando aqueles
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Saúde mental infanto-juvenil: o cuidado em municípios de pequeno porte
dispositivos que ofertam o cuidado para o sofrimento dispositivo do grupo focal, afirmam que não há serviços
infanto-juvenil. Com isso, o vínculo pode ser entendido de saúde mental para crianças e adolescentes no municí-
como uma das forças presentes no processo de cuidado. pio, mas sim adolescentes atendidos pela APAE.
A maioria das diretrizes prevê o cuidado em territó- Com esta afirmação surge outro questionamento: a
rio; por isso, podemos dizer que é preciso tensionar este saúde mental infanto-juvenil se faz questão para esses
conceito quando se trata de municípios de pequeno porte. profissionais? Para isso, procuramos saber se as ACS
É preciso refletir sobre como reinventar esta noção, am- identificam que, em sua área de abrangência de trabalho,
pliando os modos de compreendê-la a favor dos sujeitos há crianças e adolescentes que demandam cuidados em
em sofrimento, que vão construindo seus próprios terri- saúde mental. Como resposta, unânime, obtivemos: “na
tórios subjetivos na experiência de um cuidado em saúde minha área não tem essa população, só os que vão na
delimitado geograficamente. APAE, e alguns nem adolescentes são mais”.
Assim, compreendemos que o território é definido Outra questão levantada com as ACS referia-se à
por relações sociais, serviços, processos de vida, cultura, identificação desta população que frequenta a APAE,
economia, etc., com fluxos e forças que compõem os su- prática presente nas estratégias de cuidado. Assim, per-
jeitos; cada território é singular, não é algo que pode ser guntamos como ocorreu a identificação da demanda, se
generalizado. Portanto, as estratégias de cuidado devem através dos profissionais de saúde, se por elas, ou por
levar em conta a singularidade do seu território na expe- outro serviço. Encontramos a afirmação de que nunca
riência do sujeito em sofrimento psíquico. identificaram adolescentes ou crianças que necessitam
“Onde está o cuidado?” de cuidado em saúde mental. Então, de que forma foram
diagnosticadas como necessitando de cuidados? De acor-
No âmbito da saúde, o cuidado pode ser entendido do com elas, sempre pelas escolas: “Eles entram muito
como um campo de práticas, individuais ou coletivas, pequeninho na escola e daí ali elas já vão pegando o jeito
que está em constante movimento e possui muitos desa- se eles são bem, ou são ‘mentalzinho’, mas nós mesmo,
fios. O ato de cuidar é um processo de relações, no qual eu no meu caso eu não identifiquei nenhum, é através da
há um encontro entre duas “pessoas” que atuam uma so- escola, fono e psicóloga” (ACS 04).
bre a outra, operando-se um jogo de expectativas e pro-
Através deste estudo, percebemos que algumas prá-
duções (MERHY, 2004).
ticas estão instituídas, ao se materializarem em um fluxo
Com a RPB se propõe uma mudança nos modos de de atendimento fragmentado, com o não reconhecimen-
operar o cuidado em saúde mental. Este novo paradigma, to por parte dos profissionais da existência de deman-
o da atenção psicossocial, propõe que o cuidado seja cen- das para atendimento e da prática de encaminhamento
trado no sujeito que vive a experiência da doença, preco- não implicado, ou seja, consta a inexistência de ações
nizando uma rede de relações na qual as pessoas precisam em conjunto com outros serviços, como, por exemplo,
ser orientadas e envolvidas nas soluções, encaminhamen- a APAE. Percebemos também, entre os profissionais, a
tos e tratamentos (AMARANTE, 2007). No modelo de lógica de encaminhamento das crianças e adolescentes a
cuidado dominante, o biomédico, o tratamento é centrado especialistas dentro e fora do município. Entre os servi-
na doença, em seus efeitos, e muitas vezes acaba por se- ços e profissionais estão incluídos médicos especialistas
gregar os sujeitos do seu ambiente social. Assim sendo, (neurologistas, pediatras e psiquiatras), sala de recursos
os atos de cuidado em saúde mental são capturados pelos nas escolas, APAE e outros profissionais especialistas
modelos de cuidado instituídos, e é este processo de cui- (psicólogos, psicopedagogos). As questões observadas
dado que dá forma para a rede de cuidados. indagam sobre a utilização das tecnologias de cuidado
Para o cuidado se efetivar é preciso levar em conside- nessa relação profissionais-rede-usuários, por vezes com
ração as singularidades de cada território; não existe então transferência de responsabilidade a outras instâncias e
um único fluxo e modelo de cuidado, mas formas singu- profissionais especializados.
lares de cuidar e articular a rede, tomando o sujeito como A lógica do encaminhamento não corresponsabiliza-
centralidade e referência dessa ação. Partindo dessa com- do e a priorização de especialistas, operam para que as
preensão, questionamos: como se configura o cuidado para estratégias de cuidado mantenham a lógica biomédica,
crianças e adolescentes no município de Guamiranga? que afirma o lugar do especialista como capaz de dar
Inicialmente os dados de outra pesquisa6 mostraram resolutividade às demandas das crianças e adolescentes
que há demanda para cuidados em saúde mental de crian- com algum sofrimento psíquico. Amarante (2007) cor-
ças e adolescentes por uso de álcool, drogas e por trans- robora esta questão afirmando que este modelo, centrado
tornos mentais, utilizando-se, em alguns casos, da lógica na doença, ocasiona a característica do hiperespecialis-
do internamento. No entanto, quando nos inserimos no mo, ou seja, cada especialista trata apenas de um tipo de
território destas profissionais, por meio do acompanha- doença. “Assim as equipes, de modo geral, não acolhem
mento do cotidiano de trabalho nas VD, há indicativos e não se responsabilizam pela demanda e encaminham
dessas demandas por parte de algumas delas. E, poste- para quem foi delegado o poder de cura” (CAMURI; DI-
riormente, quando é feita a coleta de dados por meio do MENSTEIN, 2010, p. 810).
6
Dados coletados em uma pesquisa de Iniciação Científica (IC) realizada no mes-
mo município.
Podemos dizer que, para os profissionais que partici- “Intersetorialidade: a escola é a escola e a saúde é a saúde”
param da pesquisa, o cuidado direcionado para a popu- A intersetorialidade é um dos princípios para a assis-
lação infanto-juvenil ainda não se faz questão. Por mais tência em saúde mental infanto-juvenil orientado pelo
que executem o cuidado por meio das visitas domiciliares, documento Caminhos para uma política de saúde mental
do preenchimento dos formulários e da conferência das infanto-juvenil (BRASIL, 2005). Este princípio “indica
vacinações, por exemplo, que são ações de cuidado pre- a ampliação das ações para além do campo clínico, in-
estabelecidas protocolarmente, estas questões são sempre cluindo serviços de qualquer natureza que atravessem a
encaminhadas para um profissional específico, externo aos vida do sujeito”, proporcionando uma rede ampliada de
cuidados da atenção primária, que se torna responsável por atenção à saúde mental (GOMES, 2009, p. 39).
dar a resolutividade. Tal prática expressa não a correspon-
A intersetorialidade é balizadora da rede como um
sabilização do cuidado, mas a pessoalização do mesmo.
todo, é um princípio que prevê que as estratégias de cui-
Esta estratégia de cuidado, a da pessoalização, ao mes- dado podem perpassar os vários setores sociais, onde os
mo tempo em que contribui para que as demandas sejam serviços de atenção psicossocial devem sair da estrutura
resolvidas, também mantêm presente a não articulação física do serviço e buscar vínculos na sociedade para que
da rede de forma integral e intersetorial, pois todas as in- formem uma série de pontos de encontro, de trajetórias de
formações ficam concentradas em um único profissional, cooperação, de simultaneidade de iniciativas, e também
fazendo com que seja perpetuada a não corresponsabili- quando os pacientes deixaram de ser exclusivos “do médi-
zação do cuidado, restringindo o fluxo de atendimentos, co” para se tornarem “da equipe” (AMARANTE, 2007).
assim como a não articulação da rede e a resolutividade
Quando a intersetorialidade não se encontra vigente
das demandas podem ficar comprometidas.
como composição das práticas de cuidado entre profis-
Nessa rede, o fluxo de atendimentos para a popula- sionais e os serviços, eles acabam realizando ações indi-
ção infanto-juvenil perpassa o campo da saúde, por meio viduais que poderiam ser complementares, ou ainda, um
dos encaminhamentos a especialistas, pela dispensação determinado serviço pode constituir-se como o responsá-
de medicamentos controlados e pela lógica do interna- vel pelo cuidado àquela população, como, por exemplo,
mento. Perpassa ainda o campo da educação, por meio o que encontramos neste estudo, deixando a escola como
da institucionalização na APAE e pela utilização da sala único ponto da rede responsável pela identificação e en-
de recurso nas escolas. caminhamento.
As concepções de que a atenção em SMIJ é responsa- No município pesquisado, as UBS têm contato com
bilidade da APAE ou da escola e de que, se a população in- as escolas para que as questões de cunho orgânico e bio-
fanto-juvenil não está inserida em um destes dispositivos, lógico sejam resolvidas, como, por exemplo, uma lesão
é porque não existe demanda em saúde mental, nos mostra ou quando uma criança apresenta sintomas de mal-estar,
como o movimento da RPB ressoa nesse lugar e que preci- vômitos, diarreia, febre. Observamos que a troca de in-
samos tensionar estas relações para que sejam instituídos formações sobre a produção de vida desses sujeitos não
novos modos de cuidado, novas relações sociais e novos acontece, pois esta questão vem sendo compreendida
pontos de interseção na rede de atenção psicossocial. como de responsabilidade da escola: “Os setores quase
Como citado anteriormente, o modelo biomédico di- não se misturam muito, escola é escola e saúde é saúde”
reciona a forma como os profissionais olham para os usu- (ACS 07). Com isso, a escola tem ocupado um lugar de
ários, as tecnologias utilizadas, a implicação no cuidado, referência na integralidade do cuidado para a infância,
a forma como irão construir a rede de cuidados; isto é, pois é a partir da escola que surge um espaço e um olhar
“o saber médico e biologizante ‘impede’ outra produção voltados para essa população.
de cuidado em saúde por parte de outros trabalhadores” Em consonância com Severo e Dimenstein (2011),
(CAMURI; DIMENSTEIN, 2010, p. 809). Com isso, entendemos que o que tem prevalecido é que os pro-
podemos dizer que é preciso criar linhas de fuga desse blemas em saúde mental são atendidos por um serviço
modelo instituído para que as ACS possam ver a SMIJ especializado. Assim, é pela via dos encaminhamentos,
como responsabilidade do seu território, para que haja como citado anteriormente, que a saúde se faz presente
a percepção de que naquele sujeito há uma produção de no campo da infância, fragilizando o fazer intersetorial,
sofrimento que precisa ser acolhida, orientada e, quan- pois este preconiza a corresponsabilização conjunta entre
do necessário, encaminhada. Pois assim, como afirmam os diferentes setores, políticas públicas e os usuários.
Luzio e L’Abbate (2009), é comum os municípios de pe-
A prática de cuidados se mostra como médico-cen-
queno porte dar conta de sua responsabilidade de cuidar
trada; assim, abre-se espaço para que o especialismo
reproduzindo apenas o modelo psiquiátrico hegemônico.
se faça presente, tensionando a lógica da prática inter-
Desse modo, a partir dos dados coletados, entendemos disciplinar e da complexidade do cuidado. As crianças
que o cuidado para esta população encontra-se centrado têm passado pela avaliação do médico clínico geral do
no campo da educação, seja pela escola regular ou pela município, onde são diagnosticadas, e este profissional,
APAE, pois esta, por sua vez, contata a saúde, pela lógica predominantemente, tem apresentado duas opções: ou
pessoalizada, quando necessita de encaminhamentos. medicar ou encaminhar para um médico especialista. De
acordo com os dados, é preciso a confirmação de um es-
pecialista de que aquela criança ou adolescente possui
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um transtorno, ou de que precisa de cuidados especiali- Este estudo não pretende dar conta da discussão sobre
zados, para que assim os outros profissionais, do campo medicalização, apenas apontar que é necessário analisar
da educação, desencadeiem ações de cuidado referentes essas práticas e avaliar seus impactos na construção de
a essa população. estratégias de gestão e cuidado em saúde mental para
Desse modo, após a identificação, é necessário o crianças e adolescentes. De acordo com Moysés e Colla-
diagnóstico, que resulta dos encaminhamentos, que têm res (2013, p. 15), “especificamente em relação à medi-
ocorrido da seguinte maneira: a pedagoga, assim como a calização da vida de crianças e adolescentes, ocorre a
fonoaudióloga e os professores, fazem observações acer- articulação com a medicalização da educação na inven-
ca do comportamento do aluno em diversos ambientes da ção das doenças do não-aprender e com a medicalização
escola e realiza avaliações que remetem a classificações do comportamento”. Cria-se, assim, a demanda por ser-
diagnósticas. A partir destas avaliações, a pedagoga, res- viços que ampliam a medicalização.
ponsável por todos os alunos, realiza encaminhamentos: Não se está afirmando aqui que a educação não deve
“A gente encaminha eles pra psiquiatra, pra neurologis- responsabilizar-se pela SMIJ, mas sim que essa responsa-
ta, quando a gente percebe como este aluno está na sala, bilidade deve ser compartilhada com a rede, composta de
então a gente percebe que acabou o remédio, aí a gente serviços e ações intersetoriais, e dessa forma acolher essas
encaminha, e tudo através da saúde esses encaminhamen- crianças e adolescentes. Mas, segundo os relatos, a direção
tos” (Pedagoga). Este mesmo fluxo de encaminhamentos do cuidado tem se dado pela via da medicalização da vida,
é constatado no estudo de Kamers (2013, p. 154), que pois os encaminhamentos têm sido sempre para especia-
mostra que a “lógica circunscrita em torno dos encami- listas, com retirada de medicamentos, e o diagnóstico gira
nhamentos [...] consiste em um ciclo repetitivo: a escola, em torno do indivíduo, desconsiderando o processo social
confrontada com as dificuldades de aprendizagem ou in- e a complexidade do sofrimento, que coloca diversos ato-
disciplina da criança, solicita à família uma intervenção”. res em ação para garantir um cuidado singular, integral e
Assim sendo, o fluxo de encaminhamentos inicia-se em consonância com os processos de produção da vida.
pela avaliação médica para a confirmação de que há um Nesse território, podemos dizer que há um desafio
déficit na aprendizagem (queixa mais trazida pelos parti- a ser enfrentado, entre a lógica da intersetorialidade e
cipantes desta pesquisa), para serem, então, encaminhados a lógica do cuidado pessoalizado, pois a primeira pre-
para a APAE ou para a sala de recursos; no entanto, no vê a relação entre as várias instâncias para a efetivação
encaminhamento para a APAE não há exatidão se é neces- do cuidado, e a segunda prevê um profissional como o
sária a confirmação de um médico especialista. Do mesmo balizador do cuidado. Como tensionadora destas lógicas
modo, podemos constatar que a “escola nem chega a en- encontra-se, como relatam Couto e Delgado (2010), a
caminhar ao psicólogo, mas diretamente ao neuropediatra colaboração entre os profissionais para a elaboração de
ou psiquiatra infantil, que identifica na criança um quadro estratégias de articulação da saúde mental com a atenção
de TDAH ou de transtorno opositivo, prescrevendo o trata- primária, educação, assistência social e outros setores
mento farmacológico” (KAMERS, 2013, p.154). frequentados pela população infanto-juvenil.
Logo, os gestores do cuidado da saúde mental infan- É a corresponsabilização que precisa se fazer presen-
to-juvenil têm sido a escola e a APAE, o que faz com te mediante a troca de informações, a mudança no modo
que esse cuidado seja predominantemente direcionado de olhar, tanto dos profissionais quanto dos usuários, so-
para as dificuldades de aprendizagem e as diversas de- bre o que é estar em sofrimento psíquico e o que cada um
ficiências. Faz, ainda, com que estes encaminhamentos pode fazer neste processo social complexo.
não cheguem ao conhecimento das ACS, pela cristaliza- Compreendemos, assim, que o trabalho intersetorial
ção dessas práticas de cuidado, influenciando o fato de a é imprescindível para o cuidado em SMIJ, “há o reco-
saúde mental infanto-juvenil não se fazer questão para os nhecimento de que crianças com necessidades em saúde
equipamentos ligados à saúde. mental acessam e frequentam instituições que não as de
Esses encaminhamentos têm se desdobrado na utili- saúde mental” (COUTO; DELGADO, 2010, p. 272). A
zação de medicamentos como uma estratégia para a reso- constituição de uma rede ampliada de atenção deve ser
lução das demandas. No entanto, os relatos nos mostram articulada por todos os setores do território, pois a pro-
dois movimentos daí resultantes; o primeiro refere-se ao ximidade das equipes de atenção básica à saúde com as
fato de não serem muitos os alunos que tomam medica- famílias, as escolas e outros espaços de convivência de
mento controlado, como, por exemplo, metilfenidato; o crianças e adolescentes é um fator positivo para a for-
segundo é a constatação de que a quantidade de usuários mação de vínculos e da efetividade dos trabalhos que
de medicação está crescendo. No entanto, não há um le- elas podem desenvolver para esta população no território
vantamento ou fluxograma dessa dispensação e nem do (BRASIL, 2005; BRASIL, 2014).
diagnóstico das crianças e adolescentes, para que possa- Neste cenário intersetorial, o setor da educação passa
mos fazer uma análise do impacto da avaliação diagnós- a ser considerado chave para implantação de projetos de
tica e uso de medicamentos. Esta falta de informações identificação e prevenção de saúde mental de crianças e
aponta para a importância de identificarmos as questões adolescentes, pois é na escola que essa população perma-
relacionadas à SMIJ nos municípios. nece a maior parte do tempo.
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