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ESTADO DA ARTE SOBRE

DESENVOLVIMENTO RURAL: REFLEXÃO


TEÓRICA E APONTAMENTOS FACE AS
ESPECIFICIDADES DO NORDESTE DO
BRASIL

Cynthia Xavier de Carvalho


cynthia.carvalho@pq.cnpq.br
Universidade Federal de Pernambuco/CAA
Objetivo:

• Contribuir com o debate teórico no Brasil a respeito do


tema do desenvolvimento, centrando-se nas abordagens
que fornecem subsídios para pensar o contexto rural,
inserindo um debate sobre o papel da tecnologia e da
inovação, bem como dos desafios que são postos face às
especificidades da região Nordeste do Brasil.

O que diferencia?
-Escopo e cenários
-Objetivos traçados
-Cenários heterogêneos
-Estratégias (técnicas e produtivas)
Contextualização teórica e
histórica
• Período-foco: Pós II Guerra

• “Teoria da Modernização” (Parsons & Smelser, 1965)

–Perspectiva evolucionária  progresso = réplica do processo de


industrialização das nações vistas como desenvolvidas  fundamento
para o desenvolvimento (Peet & Hartwick, 1999; Escobar, 1994)

–Tradicional x moderno

–Valorização da Ciência Ocidental e o desenvolvimento tecnológico


associado

–Uma das vias de aplicação  Campo Econômico, relacionado às


políticas públicas (Reyes, 2001).
OBJETIVO/BASE DO MODELO
DA ‘MODERNIZAÇÃO’...
DESENVOLVIMENTO
AGRÍCOLA
• OBJETIVO - Transformação da base técnica-produtiva   da
produtividade agrícola, da oferta de produtos agropecuários,
bem como das exportações.

• Incorporação dos novos padrões tecnológicos – Moderno


x
• Tradicional – Atrasado

Base do modelo:

- Intensificação produtiva
- Especialização
- Concentração espacial – Economias de escala
Desenvolvimento agrícola
Vertentes particulares sobre os processos de inovação que
relacionavam o cenário em face da interdependência com os
mecanismos de mercado (Dosi, 1982):

– “Demand-pull" - possibilidade de saber a priori (antes do


processo de invenção tomar lugar) a direção em que o mercado
está puxando a atividade inventiva do produtor
• Não insere a incerteza quanto aos sinais de mercado.

– “Tecnology-push“ – “autonomia” da tecnologia


• Ignora os aspectos interativos da economia em termos de
geração de tecnologia.

– Tecnologia – Variável de ajuste (Hayami e Ruttan)


O Desenvolvimento Agrícola (DA)
• Do “homo agricola” para o “homo faber” (Georgescu-Roegen, 1974)  As
fazendas e as empresas agrícolas passaram a utilizar tecnologia e modelos
de negócios similares aos usados em qualquer outro setor.

•De um lado: • De outro lado:


– Produção em altos volumes Em um modelo concorrencial:
– Intensificação da produção –Technological treadmill:
– Especialização produtiva output  tendência a redução
– Concentração espacial de preços
– (CAIs) –Transferência de renda entre
– Economias de escala setores na economia em
detrimento da agricultura
(Modelo Mill-Marshalliano)
(Owen, 1966)
O foco do DA e o cenário para o Brasil

As transformações na agricultura foram influenciadas por um


padrão de inovação, cuja trajetória tecnológica se deu com base em:

1. Pacotes Tecnológicos
2. Uso intensivo de energia fóssil e insumos externos
3. Caificação (CAIs)

Conhecimento:
Ciência  Agricultor

Agricultura Familiar no NE  “assimilação” parcial do pacote


tecnológico...
Limitações apontadas:
QUANTO AO USO DE INSUMOS EXTERNOS

Hipótese:
Maior uso de insumo externos, seguindo o
comportamento do VBP, implica aumento de
custo de produção com impactos nos ganhos do
produtor.

Questão: tendência ao “aperto” entre custo de


produção e preço de venda do produto, como
citado em Ploeg et al (2000)?

Necessidade de mais pesquisas para cenários


como o do Brasil.

Demanda-se redirecionamento de políticas


públicas e revisões conceituais na tentativa de
explicar os processos contemporâneos. Figura 1 – Relação entre VBP e uso dos insumos (Brasil)
Fonte: elaboração própria.
Dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento/Brasil (2012)
Desenvolvimento Rural (DA)
• Crises no Setor Agrícola e alimentar: crescimento dos riscos à saúde, perdas
ambientais, superprodução de alimentos de baixa qualidade, declínio em número de
produtores e trabalhadores rurais  Falhas no modelo de desenvolvimento agrícola?

• Partindo do modelo pós-produtivista, mas abarcando novas ideias e adaptação aos


princípios ecológicos (Marsden & Schneider, 2008), surge releituras sobre o
Desenvolvimento Rural (DR):
• Comenta-se sobre: ações que visam dar visibilidade às práticas, capacidades e
saberes localizados (farmers knowledge) e as inovações contextualizadas (Amin e
Cohendet (2004); Ploeg et al (2000)).
• Reconhecimento: da heterogeneidade presente no campo (Zander, 2011), dos
atores como portadores de valores e de conhecimento, da interação e interface no
contexto macro.

• Trajetórias tecnológicas: diferenciadas (numa conotação de adaptação à realidade


local, ações coletivas, produção e reprodução de conhecimentos particulares e o
resgate de mercados e de canais de comercialização específicos).
Desenvolvimento Rural (DA)

Com ênfase na autonomia do agricultor, na reafirmação do papel


socioambiental da agricultura, nas “tecnologias” sociais, no caráter
local do processo de inovação, bem como na conexão entre setores e
entre campo e cidade, como Marsden (2009) afirma, são processos
que demandam novas plataformas políticas e arranjos institucionais
e sociais e trajetórias tecnológicas diferenciadas (ideia já trabalhada
por Dosi, 1998).

Alguns autores como Long (1992), sinalizam que, com uma abordagem
orientada ao ator, requerem-se análises das maneiras em que os
distintos atores sociais gerenciam e interpretam elementos e
estratégias em suas vidas diárias.
O enfoque do DR em face da agricultura
familiar no Nordeste do Brasil
O enfoque do DR em face da agricultura
familiar no Nordeste do Brasil
Cenários possíveis:

Créditos: Arquivo projeto Ciclos. Marcio Júlio.


Créditos: Arquivo projeto Ciclos.
Considerações finais
• O modelo de desenvolvimento agrícola se reconfigura. O padrão tecnológico “convencional” se
renova. Atualmente este modelo tem tido a oportunidade de sinalizar para minimização do
squeeze através do uso de novas tecnologias, com especial participação da biotecnologia, se
redefinindo um novo conjunto de “trajetórias tecnológicas”, conforme pensando por Dosi (1988).
É um foco que domina, mas que não alcança a todos.

• Levanto 3 possibilidades que constituirão um cenário de coexistência possível:

– Não se tem, a curto prazo, possibilidade de total reversão do processo em pauta do sistema
convencional;

– Não se vê espaço para determinados segmentos de produtores no contexto da “agricultura


convencional”, e;

– Diante da manutenção, em países como o Brasil, de grande parcela da agricultura familiar


no campo, criando e renovando estratégias, há espaço para a coexistência, não sem conflitos,
do modelo agroindustrial, com as ideias trazidas pelo foco no Desenvolvimento Rural.
Considerações finais

• O que não se exclui, é a possibilidade de se vivenciar dois movimentos em termos de


padrão tecnológico:

1. Um padrão tecnológico que ainda domina, presente no modelo agroindustrial,


com paradigma tecnológico influente, e;

2. Um paradigma tecnológico em construção, que se diferencia do padrão presente


na “agricultura moderna”, embora também inovador (Envolvendo cenários,
propósitos, atores, cultivos e mercados diferentes).
Considerações finais

• Nesse cenário de coexistência é possível que a biodiversidade e a natureza sejam


vistas sob distintos ângulos:

1. Família agricultora  a biodiversidade prestadora de serviço ambiental em lócus;

2. Modelo agroindustrial  é imaginável que seja suficiente uma Amazônia, mesmo


que distante.

Para um padrão prevalecer em detrimento do outro, teria de se ter uma mudança em


termos de compreensão do que se chama de “desenvolvimento” propriamente dito,
e não apenas de desenvolvimento agrícola ou de desenvolvimento rural.
BIBLIOGRAFIA
AMIN, A. & COHENDET, P., 2004. Architectures of knowledge: firms, capabilities and communities. New York: Oxford.
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OLIVEIRA, D., GAZOLLA, M., CARVALHO, C. X. de. & SCHNEIDER, S., 2011. A produção de novidades: como os agricultores fazem
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PEET, R. & HARTWICK, E., 1999. Theories of Development. New York: The Guilford Press.
PLOEG, J. D. v. d. et al., 2000. Rural Development: from practices and policies towards theory. Sociologia Ruralis, October, Volume 40, pp.
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REYES, G. E., 2001. Four main theories of development: modernization, dependency, world-system and globalization.
VEIGA, J. E. da., 2007. O desenvolvimento agrícola: uma visão histórica. 2 ed. São Paulo: Edusp.
OBRIGADA

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