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DESENVOLVIMENTO REGIONAL

5. DESENVOLVIMENTO
ENDÓGENO E A PERSPETIVA
TERRITORIALISTA
1º Ciclo em Ciências Empresariais
Docente: Anderson Galvão (arg@estg.ipp.pt)
DESENVOLVIMENTO ENDÓGENO E A PERSPETIVA
TERRITORIALISTA

• A partir da década de 80 do século XX, os modelos de desenvolvimento regional de base exógena,


começam a ser postos em causa, fundamentalmente porque os resultados das políticas regionais
ficaram muito aquém do que era esperado.

• Por exemplo, os modelos causalidade circular cumulativa e centro-periferia desenvolvidos por Myrdal
e Friedman e a teoria dos pólos de crescimento de Perroux revelaram-se instrumentos pouco eficazes
para lidar com a nova realidade económica, principalmente o acréscimo de custo da energia e do fator
trabalho.

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TERRITORIALISTA

• No caso concreto da União Europeia verifica-se o acentuar das disparidades regionais, o que também
vem pôr em causa o modelo de desenvolvimento regional seguido até então. É neste contexto que
surgem as abordagens territorialistas que centram o desenvolvimento no potencial próprio de cada
território: de uma conceção exógena do desenvolvimento passa-se para uma conceção endógena.

• A questão chave para o desenvolvimento regional deixa de ser a capacidade da região para atrair
investimentos externos (novos projetos) para ser a da capacidade das regiões para gerar internamente
as condições de transformação das suas estruturas produtivas.

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TERRITORIALISTA

• A construção desta abordagem territorialista ou endógena ocorre na sequência das limitações


impostas pela corrente neoclássica.

• Pressupõe a valorização dos recursos naturais e da população de cada território → Assim, o


desenvolvimento poderá responder às necessidades da população.

• Inclui o conceito de capital social → que se traduz na valorização dos padrões culturais locais e dos
recursos naturais de cada território

• Coleman (1990), quando abordou o Capital Social, definiu-o como sendo um recurso baseado na
estrutura das relações entre atores, que constituindo um bem produtivo, permite atingir e realizar
objetivos que doutra forma eram impossíveis de alcançar.
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• As redes sociais possibilitam a emergência do compromisso cívico, um elemento essencial à


construção de capital social. Putman (1993) propôs um modelo de círculo virtuoso da cidadania,
traduzido na associação entre redes sociais, confiança e normas, e que pode ser construído com o
desenvolvimento de redes sociais, com o desenvolvimento da confiança dos cidadãos uns face aos
outros, da aceitação de normas e da observância de valores, com base em relações de reciprocidade.

• Segundo o autor o capital social refere-se a caraterísticas da organização social, como confiança,
normas e redes, que podem melhorar a eficiência da sociedade facilitando ações coordenadas e são
as redes que possibilitam a emergência do compromisso cívico (civic engagement), um elemento
essencial à construção do próprio capital social. Para possuir capital social, um indivíduo precisa de se
relacionar com outros, e são estes (não o próprio) a verdadeira fonte dos seus benefícios (Portes,
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2000).
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TERRITORIALISTA

Portanto,

• O paradigma territorialista ou endógeno chama a atenção para os recursos idiossincráticos,


nomeadamente o chamado capital social que se traduz na valorização da pertença social, ou seja, dos
padrões culturais locais. A tónica é também posta na valorização dos recursos naturais de cada
território e na sua exploração racional e sustentável.

• Outra perspetiva interessante desta corrente é o facto de situar o centro de decisão na própria região e
esta proximidade com os atores locais é encarada como um fator promotor de eficiência. O
aproveitamento de dinâmicas comunitárias pré-existentes e a sua evolução para redes económicas
integradas possibilita a adoção de estratégias locais de desenvolvimento, isto quer dizer, que o
espaço/região deixa de ser encarado como mero suporte das atividades produtivas e, passa a ser, um
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agente de desenvolvimento ativo.
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• De acordo com Amaral Filho (2001) no âmbito regional:

o conceito de desenvolvimento endógeno pode ser entendido como um processo de crescimento


económico que implica uma contínua ampliação da capacidade de agregação de valor sobre a produção,
bem como da capacidade de absorção da região, cujo desdobramento é a retenção do excedente
económico gerado pela economia local e/ou a atração de excedentes provenientes de outras regiões.
Esse processo tem como resultado a ampliação do emprego, do produto e da renda do local ou da região.

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TERRITORIALISTA

• Este autor acrescenta que o caráter endógeno desse processo não tem um sentido autocentrado na
própria região. Os impulsionadores do seu desenvolvimento podem ser:

➢ Endogeneização da poupança ou do excedente

➢ Acumulação do conhecimento

➢ Inovações

➢ Competências tecnológicas

com repercussões sobre o crescimento da produtividade dos fatores


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TERRITORIALISTA

• Por outro lado, Henriques (1990) e Dinis (2004) argumentam que a proximidade dos atores é
conducente à eficiência e o centro da decisão está situado na própria região.

• O desenvolvimento pode ser explicado pela interação de 3 fatores:

➢ Alocação de recursos

➢ Política económica Estes fatores mantêm a interdependência recíproca


➢ Ativação social

• Partindo do paradigma básico do desenvolvimento endógeno, evoluíram, sequencialmente, dois


modelos – o modelo Agropolitano e o modelo de Iniciativa Local.
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MODELO DE AGROPOLOS

• As raízes do modelo Agropolitano estão no pensamento utópico do regionalismo cultural, defendido em


1938 por Odum e Moore.

• Esta corrente defendia:

✓ Que só através da preservação da cultura ancestral, as regiões sobreviveriam à massificação


causada pela industrialização.

✓ Como unidade de planeamento regional, “territórios orgânicos, autónomos, definidos em função


do clima, recursos naturais, elementos históricos, tradições culturais e estrutura social”.

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MODELO DE AGROPOLOS

• Para Vieira (1999), a globalização da economia é irreversível e constitui um processo de transição que,
entre outras mudanças, conduz:

➢ À constituição de novas identidades

➢ A novas formas de organização do trabalho

➢ À rutura de reservas de mercado

➢ Ao aumento da concorrência

➢ À reestruturação de blocos económicos

➢ À exclusão social de setores sem condições de competir no mercado.

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MODELO DE AGROPOLOS

• Uma das alternativas que determinada região tem para não entrar para o bloco dos excluídos do
mercado é desenvolver o modelo de agropolos (ou modelo agropolitano).

• Um agropolo deve ser visto como uma rede, envolvendo produtores rurais, instituições públicas e
privadas, para desenvolver ações integradas e sistemáticas que incrementem a produção, a qualidade
e a competitividade das cadeias produtivas de uma determinada região. Sendo assim, os agropolos
preconizam um modelo de gestão cooperativa.

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MODELO DE AGROPOLOS

• De acordo com Friedman e Weaver, a organização de um modelo de agropolos:

➢ Deve basear-se em territórios com caraterísticas culturais, políticas e económicas comuns;

➢ Resulta num aglomerado de empresas que se constituem em unidades autónomas,


autossuficientes, autofinanciadas, e autogovernadas;

➢ Advém da necessidade de canalizar os recursos para a produção de bens necessários à


população (tal como um processo de substituição de importações).

➢ Considera que as indústrias de base exportadora são encorajadas, desde que originem
externalidades positivas e sempre na perspetiva de utilização sustentável dos recursos
endógenos, que devem constituir uma base económica permanente.
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MODELO DE AGROPOLOS

• Contudo, os problemas relacionados à organização, ao funcionamento e à procura da melhor eficiência


dos sistemas agroindustriais sempre foram objeto de preocupação e de estudo de pesquisadores e de
gestores públicos e privados.

• No entanto, foi somente a partir da metade dos anos 50, com o trabalho de Davis & Goldberg, que esta
preocupação foi completamente explicitada em termos de análise sistémica.

• A seguir, no início dos anos 60, a escola de economia industrial francesa adotou como uma de suas
ferramentas analíticas a “análise de cadeias produtivas” (analyse de filière).

• Estas duas vertentes, embora desfasadas quanto ao tempo e quanto ao local de origem, guardam
entre si muitos pontos em comum e podem ser consideradas as precursoras da maior parte dos
estudos atuais de cadeias produtivas agroindustriais. (Batalha e Silva, 1999) 14
MODELO DE AGROPOLOS

Comunidades locais Papel importante, pois são responsáveis pela gestão dos recursos naturais

Permitem um melhor acesso a mercados


Valorização dos recursos naturais

+ (p. ex: a capacidade de atrair ou desenvolver tecnologias e

Adoção de políticas inovadoras investimento direto representa para uma região a possibilidade
de inserção em mercados altamente concorridos) 15
MODELO DE AGROPOLOS

• O envolvimento da população é indispensável para a criação de uma consciência social em que os


sacrifícios individuais são necessários para alcançar o bem comum.

• A captação das poupanças individuais e a sua aplicação em projetos na região, mesmo com
taxas de rentabilidade inferiores, é uma das vertentes dessa consciência social coletiva e,
simultaneamente, uma importante fonte de financiamento do desenvolvimento regional.

• O modelo agropolitano encerra em si uma forte componente comunitária na medida que preconiza a
participação da população no processo de tomada de decisão; os atores locais e as instituições
locais/regionais em conjunto, devem definir quais os objetivos estratégicos e quais os principais
instrumentos a utilizar para os alcançar; “a existência de laços comunitários e o espírito associativo são
fundamentais para alcançar os objetivos”. 16
MODELO DE AGROPOLOS

Do ponto de vista político, o modelo pressupõe uma organização político-administrativa descentralizada, o


que favorece a participação das forças locais no processo de desenvolvimento e permite ganhos de
eficiência.

A abordagem agropolitana apresenta algumas limitações, entre as quais se destaca a questão da posse e
utilização dos recursos naturais: o modelo pressupõe que sejam as comunidades locais a gerir esses
recursos, na prática isso nem sempre é possível uma vez que, nalguns casos, a intervenção estatal
(centralizada) se sobrepõe à intervenção local (descentralizada).

Em Portugal, a inexistência de um nível regional de decisão e as limitações que a lei impõe às instituições
locais (autarquias) dificulta seriamente a participação das populações em consultas públicas e processos
de tomada de decisão.

Este modelo pode ser objetivado nos chamados distritos industriais - marshallianos. 17
MODELO DA INICIATIVA LOCAL

Uma nova perspetiva de desenvolvimento endógeno surge a partir de meados da década de 80 (do século
XX), que foi designada por Iniciativa Local e difere do modelo Agropolitano fundamentalmente “no que
respeita ao apoio concedido à inovação tecnológica como instrumento primeiro de ação”.

O modelo de Iniciativa Local coloca a inovação como o ponto fulcral do desenvolvimento regional: é através
da inovação que as empresas regionais se vão afirmar num contexto económico global e participar
ativamente nos fluxos comerciais, o que permitirá gerar um maior valor acrescentado bruto regional. Assim,
torna-se importante gerar as condições que potenciem a inovação e o aparecimento de empresas
inovadoras.

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MODELO DA INICIATIVA LOCAL

• Considera a inovação como fator fundamental para o desenvolvimento regional.

• Deste modo, o desenvolvimento de uma região e a sua dinâmica territorial dependem da (in)capacidade
dos territórios em promoverem trajetórias qualificantes de desenvolvimento assentes no fomento do
respetivo potencial regional de inovação.
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MODELO DA INICIATIVA LOCAL

A articulação entre estabelecimentos de ensino superior, unidades de investigação, agências de


desenvolvimento, empresas de capital de risco e o meio empresarial, criando uma rede dinâmica de
parcerias, constitui um fator de extrema importância na constituição de um sistema regional de inovação.

De acordo com a definição proposta pela Comissão Europeia (1996), a inovação refere-se à renovação e/ou
ao alargamento do leque de produtos e serviços, bem como dos respetivos mercados, ao estabelecimento
de novos métodos de produção, fornecimento e distribuição e, ainda, à introdução de modificações na
gestão, na organização laboral, nas condições de trabalho e na formação dos recursos humanos.

Blakely (1994) salienta a importância das instituições de I&D referindo que em vez de atrair uma grande
fábrica que, a curto prazo, pode criar centenas de postos de trabalho, a região ficará melhor se conseguir
atrair pequenos laboratórios de investigação em áreas de ponta que, a médio prazo, criarão emprego,
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riqueza e estabilidade.
MODELO DA INICIATIVA LOCAL

Deste modo, a estratégia de desenvolvimento a seguir passa pelo estímulo da inovação que na prática se
consubstancia de diversas formas, como por exemplo: criação de centros/parques tenológicos, agências de
investimento e empresas de capital de risco, reforço das infra-estruturas de comunicação, e serviços de
consultoria para as novas empresas. No fundo, trata-se de criar uma envolvente institucional de apoio à
atividade empresarial.

Portanto, este modelo assume:

• Papel fundamental dos agentes locais: responsáveis por organizar e implantar ambientes inovadores.

• Externalidades de natureza tecnológica decorrem de vínculos de cooperação e interdependência


estabelecidos entre empresas (através de formação de redes de inovação).

• Apesar de descentralizado e dependente da responsabilidade dos atores locais, depende da conciliação


das políticas, que promovam o crescimento com os objetivos locais. 21
MODELO DA INICIATIVA LOCAL

Está claro, que as regiões devem procurar e aproveitar as suas vantagens decorrentes dos seus recursos
naturais. Contudo, estas devem ser acompanhadas por duas ações complementares associadas à procura
de vantagens dinâmicas:

• Procurar maximizar a transformação doméstica de produtos primários e a agregação de valor aos


mesmos de tal forma que, quando colocados em mercados externos, incorporem o maior grau de
industrialização possível;

• Diversificar a estrutura produtiva e de exportações com uma crescente participação de bens


oriundos da transformação de conhecimento, aliado a processos produtivos de maior
complexidade tecnológica.

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MODELO DA INICIATIVA LOCAL

• Este modelo deu origem a diversos conceitos e linhas de investigação no contexto da economia
regional, entre as quais se salienta o conceito de meio inovador – Milieux Innovaters.

• O meio inovador é definido como a organização territorial onde nasce o processo de inovação (Auray et
al., 1994).

• O território desempenha um papel fundamental no desenrolar do processo inovador. A empresa não é


um agente de inovação isolado, esta insere-se num determinado meio/território e é esse meio que a faz
agir.

• O passado do território, a sua organização e estrutura, o seu comportamento coletivo são considerados
como agentes de inovação.
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MODELO DE AGROPOLOS E MODELO DA INICIATIVA LOCAL

• A tabela seguinte sistematiza, comparativamente, os principais aspetos caraterizadores dos dois


modelos enquadrados pela teoria do desenvolvimento endógeno (Dinis, 2004, p.162)

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MODELO DE AGROPOLOS E MODELO DA INICIATIVA LOCAL

• Partindo da mesma base endógena, estes dois modelos diferem substancilamente no que se refere à
articulação inter-regional e à participação das empresas regionais no comércio.

• O modelo agropolitano, mais fechado, quase que considerava as regiões como autossuficientes,
enquanto o modelo de iniciativa local defende que as empresas regionais devem participar ativamente
nos fluxos comerciais e daí retirar as devidas vantagens.

• No entanto para que esta participação seja bem sucedida é necessário que, previamente, as empresas
tenham apostado na inovação (de produto e/ou processo) e na diferenciação dos produtos.

• A inovação aparece aqui como um dos vetores essenciais para o aparecimento de dinâmicas
territoriais.
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MODELO DE AGROPOLOS E MODELO DA INICIATIVA LOCAL

• Segundo a teoria do desenvolvimento endógeno, a competitividade do território vai depender da sua


inserção no contexto global, dos recursos endógenos que detém e da competitividade das empresas
que nele operam. O território e as suas caraterísticas (económicas, sociais, culturais e biofísicas) estão
no centro da explicação da competitividade regional; as regiões são, assim, o agente fundamental do
desenvolvimento.

• Estes modelos permitem, igualmente, explicar fenómenos recentes de desenvolvimento regional,


como, por exemplo, os distritos industriais e as regiões inteligentes.

➢ Distritos industriais ou clusters são aglomerações de pequenas e médias empresas


especializadas em setores específicos e fortemente articuladas entre si, localizadas em
determinados locais ou regiões, que lhes permite desenvolver uma diversidade de relações
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sociais, baseadas na complementaridade, na interdependência e na cooperação.
MODELO DE AGROPOLOS E MODELO DA INICIATIVA LOCAL

➢ As regiões inteligentes constituem territórios especialmente vocacionados e direcionados para


reproduzir um conjunto de condições favoráveis à recriação de uma cultura de relação e de uma
dinâmica coletiva de aprendizagem, tendo por referencial estratégico a produção de
conhecimento e inovação (Santos, 2002).

• Deste modo, parece-nos que a teoria do desenvolvimento endógeno é a mais adequada para estudar e
compreender a competitividade territorial (uma vez que é a única que considera a organização espacial
como um fator autónomo e diferenciado).

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