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1} Fala-se em crise de valores e logo a receita é “voltar à ética”. Marilena Chauí critica,
acusando um entendimento errôneo do que é ética.
4} Chauí volta a pensar o “retorno à ética”, entendendo que ética, nessa palavra de ordem,
é tida como algo que, periodicamente, se perde e se acha e não como ação intersubjetiva
entre agentes. Os motivos dessa ideia de retorno à ética estão no refluxo da sociedade
civil organizada e de políticas de emancipação social; no vácuo ocupado pelo
neoliberalismo; na dispersão dos grupos e classes sociais devido ao modo contemporâneo
de acumulacao capitalismo (flexibilidade), que destrói o campo da ação intersubjetiva e
sociopolítica, destruindo o espaço de construção da ética; a transformação tecnológica,
que atinge a tudo e todos, se dá unicamente sob os desígnios da lógica do mercado; a
sociedade midiática e do consumo não somente cria nova subjetividade como promete
alimentá-la: o sujeito narcisista que cultura sua própria imagem como ‘única realidade
que lhe é acessível. As promessas feitas pela sociedade do consumo, no entanto, não
podem se cumprir, gerando frustração e niilismo.
5-8} A seguir, analisa qual seria a ética a que se deveria retornar. Definida em três pontos:
uma ética de reforma dos costumes (ou seja, refere-se a moralidade e não a ética); ética
como dispersão de variadas éticas, espelhando a fragmentação econômica, de forma que
seja necessário especialistas responsáveis, então, por definir o que é ética (que entrará em
contradição com outras éticas); ética como defesa humanitária dos direitos humanos
contra violência, de forma a aplacar a consciência culpada dos privilegiados.
9-11} “Pensada dessa maneira, a ética se torna ideologia e, como tal, propícia ao exercício
da violência”, por três motivos:
1. divide-se o sujeito ético entre sujeito ético vítima e sujeito ético piedoso e
compassivo. A vitimização, porém, é a morte do sujeito ético, pois o coloca como passivo,
objeto da compaixão alheia, ao passo que, para o sujeito não sofredor se tornar ético, deve
haver duas violências: a factual, da qual a vítima é resultado e a violência ao tratar essa
vítima como passiva, sofredora, inerte. A autora exemplifica usando o caso do MST que,
ao se negar o papel de vítima, agindo e se reafirmando como sujeito ético, ataca
diretamente o cerne da ideologia ética a qual, contrariamente, o considera como agente
da violência justamente por essa reafirmação.
13} Chauí analisa agora o “mito da não violência” da sociedade brasileira. Mito, pois:
- é narrativa de uma origem perdida, que lida com tensões que nào podem ser resolvidas
sem profunda transformação da sociedade. Dessa maneira, essas tensoes são transferidas
para uma solução imaginária que justifica a realidade;
- é uma crença tão interiorizada que não é percebida como crença, mas como a própria
realidade, resultado de ações sociais e que, por sua vez, produz ações sociais que a
confirmam;
- tem função apaziguadora e repetidora: o mito é o suporte de ideologias que, por sua vez,
mantêm a matriz mítica, num processo auto referenciado. Ou seja, a ideologia impõe um
filtro por meio do qual a realidade é interpretada, de forma que é possível admitir
existência empírica da violência sem que a raiz mítica da não violência seja atingida.
14} Ou seja, há uma divisão na sociedade brasileira, entre os que praticam a violência,
que não são “nós”, por um lado, e aqueles que não praticam, mas estão impotentes para
combatê-la, por outro. É a divisão da ideologia da ética que trata a autora.
- A lei funciona de acordo com a classe social: privilégio para a elite e repressão para
camadas populares.
24 -25} Chauí compara o Movimento sem Terra com o Movimento dos Desempregados
na França. Ambos são considerados agentes éticos propriamente ditos. Analisa, em
seguida, sua ação ética frente ao capitalismo contemporâneo.
- não reivindicam nova jornada de trabalho, o que permitiria nova divisão do trabalho,
mas a distribuição social da riqueza, através de política fiscal e das políticas sociais.
29} Conclui a autora que, ao agir dessa maneira, promovem ações éticas, mudando os
termos da discussão e se recusando a ocuparem a posição destinada pela ideologia do
“retorno à ética”.
Estrutura da argumentação:
Tese: essa palavra de ordem propõe não uma ética, mas uma ideologia ética.
Argumentação:
3) ideologia ética cria cisão entre sujeito ético vítima e sujeito ético piedoso.
A autora lida com as questões mais prementes da política brasileira naquela época:
o avanço neoliberal e a desorganização da sociedade civil. Seu artigo conversa com
- cita Viviane Foster: O horror econômico; Chauí não se alonga em seu uso, mas
conversa com seu conteúdo ao lidar com o movimento dos desempregados franceses