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ROTEIRO DE AULA V
1) Os fundamentalismos
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• Os traços fundamentalistas – intolerância religiosa, violência étnica, fixação em
trauma histórico – que o Ocidente agora associa com “os Bálcãs” se originam no
próprio Ocidente.
• O que os europeus ocidentais observam e deploram nos Bálcãs é o que eles
mesmos introduziram ali e o que eles combatem é o seu próprio legado histórico
descontrolado.
• Mas, deveríamos examinar os modos pelos quais a essencialização
fundamentalista dos traços contingentes é, ela mesma, uma característica
da democracia liberal-capitalista.
• Está na moda queixar-se de que a vida privada está sob ameaça ou mesmo
desaparecendo em face da habilidade dos meios de comunicação de expor em
público os detalhes pessoais mais íntimos, mas o que ocorre é a vida pública
em si está desaparecendo, a esfera pública propriamente dita, na qual se
opera como um agente simbólico que não pode ser reduzido a um indivíduo
privado, a um feixe de atributos, desejos, traumas e idiossincrasias pessoais.
• O lugar-comum “sociedade de risco” – de acordo com o qual o indivíduo
contemporâneo experimenta a si mesmo como algo completamente
“desnaturalizado”, mesmo em relação às suas características mais naturais,
desde identidade étnica à preferência sexual, como sendo escolhidas,
historicamente contingentes, aprendidas – é, então, profundamente enganador. O
que testemunhamos hoje é o processo oposto: uma re-naturalização sem
precedentes. Todas as grandes “questões públicas” são agora traduzidas em
atitudes para uma regulação de idiossincrasias “naturais” ou “pessoais”.
• Isto explica por que, em um plano mais geral, conflitos etno-religiosos pseudo-
naturalizados são a forma de luta que mais se ajusta ao capitalismo global. Na
era da “pós-política”, quando a política propriamente dita é
progressivamente substituída por uma administração social de especialistas,
as únicas fontes de conflito restantes são as tensões culturais (religiosas) ou
naturais (étnicas). E a “avaliação” é precisamente a regulação da promoção
social que se encaixa com esta re-naturalização. (Sem política o que nos
resta é uma luta moral, um controle e regulação da vida social, no aspecto
cultural. Mudar o mundo, próprio da política, não é mais possível. Por isso
a re-naturalização das relações sociais, que agora se reduzem ao moral e ao
cultural, sem desafiar a política vista como técnica necessária.)
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• Centro nervoso da ideologia liberal: a liberdade de escolha, fundamentada na
noção de sujeito psicológico, com propensões para se concretizar.
• A ideologia dominante vende as mesmas inseguranças causadas pelo
desmantelamento do Welfare State como oportunidades para novas liberdades.
• O sujeito psicológico tende a ver as mudanças como resultados.
A política da jouissance
• Não são os direitos humanos uma defesa contra o excesso de poder, enquanto
oposição ao fundamentalismo e busca pela felicidade?
• Marx: o poder se dá por excesso por conta de sua própria natureza. Ele vai além
da crítica usual de que a representação política nunca reflete diretamente a
estrutura social – ele aponta para o que Lacan chamará depois de “lógica do
significante”.
• Quando lidamos com dois ou mais grupos socioeconômicos, seus interesses em
comum podem apenas ser representados sob o disfarce da negação de suas
premissas compartilhadas.
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• Da mesma forma que o único denominador comum de todas as classes é o
excremento em excesso, e refugo, e resíduo de todas as classes – os rejeitados de
todas as classes.
• Para que esse sistema funcione ele também tem que atuar como representante de
uma classe particular – as que não podem representar a si mesmas.
• Estrutura paradoxal da representação bonapartista: manter-se por cima de todas
as classes implica uma dependência direta sobre o resíduo de todas as classes,
como última referência dos que não são capazes de agir como a gente coletivo.
• De acordo com a lei, o Estado está a serviço dos súditos; de acordo com o
superego subjacente a mensagem pública da responsabilidade é complementada
pela mensagem do exercício incondicional do poder: eu faço com vocês o que eu
quiser. Este excesso obsceno é um componente necessário da ideia de soberania.
• A assimetria é estrutural: a lei pode apenas sustentar sua autoridade se os súditos
escutarem nela o eco da obscena e incondicional autoafirmação do poder.
• Este excesso de poder nos leva ao argumento fundamental contra as grandes
intervenções políticas que têm por objetivo uma transformação global - elas
provocam violentos desastres em escala sem precedentes.
• Três teorizações sobre essas catástrofes: a) abertas – o Esclarecimento é um
processo emancipatório sem potencial totalitário inerente; as catástrofes apenas
indicam um projeto inacabado (Habermas); 2) a dialética do esclarecimento de
Adorno, Horkheimer e, hoje, Agambem – a propensão totalitária do
Esclarecimento é inerente e definitiva, tendo como consequência o mundo
administrado, junto com campos de concentração e genocídios; 3) Etienne
Balibar – a modernidade inaugura novas liberdades e novos perigos, e não há
garantia teleológica suprema do resultado.
• Ponto de partida de Balibar: a insuficiência da noção hegeliano-marxista de
converter a violência em um instrumento da Razão histórica, uma força que gera
uma nova formação social. Sua instrumentalização é eticamente inaceitável, mas
também teoricamente equivocada, ideológica no sentido forte.
• Balibar vê em Marx uma oscilação entre essa “teoria da conversão” teleológica
da violência e a noção muito mais interessante da história como um processo em
aberto de lutas antagônicas, cujo resultado final positivo não está garantido por
qualquer necessidade histórica que o englobe.
• Balibar: o marxismo é incapaz de gerar uma teoria adequada do fascismo e do
stalinismo e seus resultados extremos.
• Nossa tarefa é dupla: implantar uma teoria da violência histórica como algo que
não pode ser instrumentalizado por nenhum agente político, o que ameaça tragar
o próprio agente político em um ciclo vicioso de autodestruição; e também
propor a questão de como converter o processo revolucionário em si em uma
força civilizadora.
• Arendt: distingue o poder político e o mero exercício da violência. A autoridade
apolítica direta (exército, igreja, escolar) são exemplos de violência e não de
poder político no sentido estrito do termo.
• Temos que distinguir entre a lei pública simbólica e os seus complementos
obscenos, que implica que não há poder sem violência.
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• “O espaço político nunca é “puro”, mas sempre implica algum tipo de confiança
na violência pré-política. Por certo, a relação entre poder político e violência
pré-política é de implicação mútua. A violência não é apenas o complemento
necessário do poder, mas o próprio poder já está sempre na raiz de toda relação
aparentemente “apolítica” de violência.”
• A tarefa das análises críticas é perceber o processo político oculto que sustenta
todas essas relações “a” ou “pré” políticas.
A pureza humanitária
O retorno da universalidade
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• A aparência da égaliberté possui também uma eficácia própria, não é só
aparência. O que era originalmente um edifício ideológico imposto por
colonizadores é tomado pelos súditos como uma maneira autêntica de articular
suas queixas autênticas.
• Rancière: embora os DHs não possam ser postulados como um além a-histórico
e essencialista, eles também não devem ser descartados como um fetiche
reificado.
• Rancière: longe de serem pré-políticos, os DHs universais designam o espaço
preciso da politização propriamente dita – o direito de um agente político em
declarar sua não coincidência radical consigo mesmo (sua identidade particular)
para postular a si mesmo como o supranumerário, aquele sem lugar adequado no
edifício social, e, portanto, como um agente da universalidade do social em si.
• Paradoxo. No exato momento em que tentamos conceber os direitos políticos
dos cidadãos sem fazer referência aos DHs universais meta-políticos, perdemos
a própria política, reduzimo-la a um jogo pós-político de negociação de
interesses particulares.
A - O fundamentalismo
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10) Tanto os liberais ocidentais quanto os fundamentalistas islâmicos mistificam
moral e ideologicamente suas posições quanto o direito da mulher à livre
sexualidade, segundo o autor. Explique esse argumento. (4)
11) Como Zizek faz equivaler essas posições antagônicas? (4)
12) Qual o ciclo vicioso do imperativo da jouissance? Por que é patológico? (5)