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PUC- Pontifícia Universidade Católica

Nicolau Gayotto da Conceição. 04/11/2019


Resenha do texto: África: trinta anos do processo de independência

As perspectivas individuais africanas cerceiam uma índole colonial, pois se


pressupõe à África uma generalização, uma ideia fomentada pelas elites coloniais
européias, que antes de estimularem uma unidade, encobrem uma originalidade
própria. Esse entendimento se compõe por uma série de caricaturas, que diminuem
uma pluriculturalidade sob um retrato total. Dessa forma se torna comum
ressignificar o continente como uma grande massa de personagens submissos à
uma mesma forma de viver: junto a miséria, a fome, ao atraso e ao vazio primitivo
das formas de pensar.
As camadas que permeiam esse fenômeno vão para além do universo
exterior ao continente, se internalizando no próprio diagnóstico íntimo dos
panoramas de desenvolvimento. A ilusão de um atraso geral, pela população,
constitui um certo complexo de inferioridade que interfere no estabelecimento do
progresso geral. Se nega a apropriação de uma África própria em cima de um olhar
colonial; assim, se edifica perspectivas identitárias em cima de uma degradação
sistêmica européia. A visão universalista ocidental transpõe o seu berço europeu
para atingir o imaginário africano substanciando a experiência administrativa
políticocultural às amarras coloniais: Não se ressignifica, através dos elementos
terrenos e ancestrais, uma direção própria, mas se reduz a capacidade construtiva à
imitação; e o pensamento, pós independência, das nações ali presentes é incapaz
de contemplar as massas individuais africanas - essa ocorrência não é
simplesmente africana, tendo influenciado a constituição da maioria das nações
coloniais.
Essa desordem interna se evidencia nos trinta anos, e naqueles que seguem,
do processo de independência do continente. A emancipação africana levou em
conta desde Gana em 1957 até Namíbia em 1990, e tinha em seu âmago, antes
uma troca de posições, entre o colonizador e o colonizado - que soava como se
apossar de uma poderosa patente de luxo e qualidade de vida reservados à poucos
- do que um rememoramento de tempos anteriores à justaposição de algo novo.
Queria-se gozar dos privilégios dos brancos e para isso não podia-se regressar aos
tempos passados ou reinventar o modo de se viver, havia-se que estagnar o
pensamento administrativo em uma noção colonial, e por isso, unitária.
A ideologia consolidada de uma identidade rígida, pressuposta sob a razão
econômica do sistema colonial, se formou além das fronteiras de pensamento, mas,
principalmente, físicas. A ideia de nação se consolida por linhas européias. É a
partir da conferência de Berlim que ao mesmo tempo, paradoxalmente, se desdobra
os meios culturais vigentes para se unir e ressignificar os novos meios. E isso, não
foi negado pelo processo pós independência; pelo contrário, os movimentos de
insurgência das identidades abaladas pelo regime colonial, são logo abafadas pelos
sistemas africanos sob uma perspectiva unitária. A questão que se coloca para
essas nações emergentes é: de como se sobrepor as identidades ancestrais,
canalizando-as em favor de uma consciência nacional. Disso, se apaga um pensar
identitário para se sobrepor uma máscara colonial mórbida.
Expandindo a experiência do texto para uma análise para além do artigo;
trago comigo um exemplo cinematográfico do assunto. Ousmane Sembene, um dos
maiores diretores senegaleses de todos os tempos, faz em 1975, período de grande
êxtase do cinema senegalês, "Xala", uma grande sátira da condição política Africana
no pós independência. Nela El Hadji, um empresário e político em Dakar, é
amaldiçoado por uma disfunção erétil no dia do seu casamento com sua terceira
mulher, impossibilitado sua noite nupcial. Simplesmente com essa pequena sinopse
já somos transportados para um universo que se solidifica em uma tradição
folclórica em decadência por uma influência estrangeira junto ao momento do pós
independência. Ao mesmo tempo em que se preserva, em favor do interesse de
uma elite, algumas tradições, não se inova no modo de governar, e no íntimo da
regência se consolida a corrupção política e moral. A impotência seria esse
ressentimento da hostilidade do aterramento da tradição, e a consequente
camuflagem das condições ancestrais. Hadji tenta constantemente se curar da sua
maldição com efetivos folclóricos, por outro lado supre uma ideologia colonial,
independente do seu conteúdo, na administração do país. Nesse processo ele gasta
todo o dinheiro em vão, pois só consegue se render dessa condição, quando aceita
essa melindre oriunda do âmago europeu e que foi inserido a força ao espaço de
política senegalesa.

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