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O IFCH
UNI~
AUGUSTO OLIVEIRA
RANDOLFE RODRIGUES
Organizadores

Edinaldo Pinheiro Nunes Filho • Janaina Camilo


Maura Leal • Paulo Cambraia • Reginaldo Gomes da Silva
Sidney Lobato

AMAzÔNIA, AMArÁ
Escritos de História

o , A

~
~
Belém - 2009

UNICAMP
Biblioteca - IFCH
Sidney da Silva Lobato é graduado em História Sumário
pela Universidade Federal do Amapá (UNIFAP),onde também
fez especialização em História Social e Cultural da Amazônia.
É mestre em História da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (PUC-SP). Foi professor substituto na UNIFAP
(2002-2004), onde ministrou cursos de História do Brasil e A AMAZÔNIA
da Amazônia. Foi também professor de Teoria e Metodologia Duas margens de uma história do Além-mar: as origens
da História na Faculdade de Macapá (FAMA)- 2005-2006. históricas da apropriação da biodiversidade amazônica 29
Desde 1999, tem lecionado no ensino fundamental e médio Augusto Oliveira
das escolas do Amapá e, desde 2003, tem elaborado projetos
Lições de história da Amazônia: a obra de Arthur Cézar
socioeducativos na Fundação da Criança e do Adolescente
(FCRIA-AP). Ferreira Reis 77
Sidney da Silva Lobato

O AMAPÁ
A participação política dos estudantes amapaenses: da
Fundação da UECSA ao golpe de 64 105
1/1111

Randolfe Rodrigues
11II

Os governos territorias do Amapá e a substituição dos rios


por estradas: hidrografia, cultura e progresso 143
Paulo Cambraia
Homens e pedras no desenho das fronteiras amazônicas
(1764/1782) 173
Janaina Camilo
Formação histórica, econômica, social, política e cultural do
Amapá: descrição e análise do processo de formação histórica
do Amapá 211
Edinaldo Pinheiro Nunes Filho

24
Plantando o currículo Karipuna e Galibi-marworno: uma
história de autoria 235
1'1:
Regina/do Gomes da Silva
A mística do Amapá: a invenção do cidadão amapaense _
brasileiro 267
Maura Lea/

111,11

.A

A ONIA
Lições de história da Amazônia:
a obra de Arthur Cézar Ferreira Reis

Sidney da Silva Loboio'

Nas reflexões sobre a objetividade do conhecimento


histórico enfatiza-se que o estudo da historiografia não pode
negligenciar o dimensionamento de seu objeto (o que os
historiadores têm escrito) num contexto social. A análise das
relações possíveis entre o discurso historiográfico e o lugar
social de sua produção nos coloca num privilegiado núcleo
de discussões acerca da mudança da consciência da função
do historiador (CERTEAU, 1976). O desenvolvimento da
ciência histórica no Brasil apresenta, no entanto, várias
diferenças regionais, que tornam mais complexa a análise
do contexto nacional da produção historiográfica. Na década
de 1930, o recrutamento de professores para a disciplina
História do Brasil das nascentes faculdades de filosofia era
feito entre os membros dos Institutos Históricos e das
Academias de Letras, que não só eram despreparados, como
eram preconizadores de uma orientação então muito

* Mestrando em História na Plf C de São Paulo, sob a orientação da


Professora Dra Márcia Mansor D'aléssio (o e-mail para contato é:
lobato.sidney@yahoo.com.br).

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

questionada: o cientificismo (COELHO, 1994: 181-184). disparidades regionais no campo da pesquisa histórica era
Havia, ainda, enquanto limitação para uma melhor formação evidente, pois havia no Brasil 16 cursos de pós-graduação
intelectual dos historiadores: o pouco tempo da criação, nas em história, dos quais: 9 na região Sudeste, 4 na região Sul,
faculdades de filosofia, das disciplinas Introdução aos Estudos 2 no Nordeste, 2 no Centro-Oeste e nenhum no Norte. (Ibidem:
Históricos e Teoria da História; a influência dos historiadores 39-40) Deste modo, podemos observar o grave desequilíbrio
da literatura; e a colocação em segundo plano do estudo no processo de institucionalização da pesquisa acadêmica
teórico e historiográfico no ensino superior (LAPA, 1976). em História, sendo maior a desvantagem do Norte em relação
Contudo, mudanças significativas começaram a ocorrer nos ao Sudeste. Todavia, antes da década de 1980, alguns
anos 50 e 60 do século XX, quando, no Sudeste, viveu-se acontecimentos já indicavam uma nova tendência na
uma efervescência intelectual. Os debates e o aparecimento aparente situação estacionária da produção historiográfica
de novas teses ocorriam na Universidade de São Paulo, no da região amazônica.
ISEB e no Fórum "Roberto Simosen" (MOTA, 1994 e
Geraldo Mártires Coelho analisa como iniciou a
TREVISAN, 1988). Foram então produzidos estudos baseados
superação do ensaísmo e do modelo de produção do
teoricamente no materialismo histórico, o que dava a estas
conhecimento histórico oriundo do Instituto Histórico e
novas análises maior consistência.
Geográfico Brasileiro, (IHGB) na Amazônia. O marco
No entanto, tais transformações não influíram inicial desta superação teria sido, no início da década de
rapidamente nas áreas muito distantes destes polos mais 1970, a introdução das disciplinas antropológicas no curso
dinâmicos da pesquisa histórica. Isto porque instituições de de história da Universidade Federal do Pará. Antes disto, os
pesquisa, documentos e investimentos se concentravam no historiadores teriam seguido o modelo historiográfico do
Sudeste, especialmente no Rio de Janeiro e em São Paulo. IHGB, produzindo "uma crônica oficializada do poder e da
Por outro lado, a produção oriunda destes centros tendeu a conquista, de governadores e de generais, de portentados e
assumir o título de história nacional. Assim, por exemplo, a de bispos, extremamente regionalizada e localizada"
industrialização paulista pôde assumir o título de "história (COELHO, 1994: 182). Sob o influxo da economia e da
da industrialização brasileira" e o operariado paulista tornou- antropologia, passou-se, no início dos anos 70, "a visitar o
se o paradigma da história da classe operária no Brasil passado com instrumentos teóricos adequados à
(JANOTTI, 1998). Em outras regiões, a produção compreensão do sentido processual da cultura, vale dizer,
historiográfica era ainda bastante tímida no início da década da história", afirma Mártires Coelho. Tratar-se-ia, segundo
de 1960 - momento em que, segundo José Roberto do o autor, do abandono de uma fase predominantemente
Amaral Lapa, ocorria no Sudeste a "montagem de uma infra- ideológica e início da produção de discursos a partir da
estrutura organizatória" para a pesquisa em história (LAPA, "complexa representação da identidade cultural amazônica"
1985: 37). Mesmo em 1985, a situação de grandes (Ibidem: 183).

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

Dentre os nomes que marcaram a fase ensaísta da A percepção da temporalidade da obra de Arthur Cézar
historiografia amazônica, que se prolongou até o começo Ferreira Reis nos ajuda a identificar o ponto onde estamos (o
dos anos 70, o de Arthur Cézar Ferreira Reis merece destaque estado atual da historiografia), uma vez que nos impõe a
pelo volume de sua ambiciosa obra - mais de 30 livros, delimitação dos condicionantes históricos do trabalho de um
vários artigos de revista e capítulos de coletâneas publicados historiador que perseguia a verdade objetiva, mas que não
- que abrange a história da Amazônia, da conquista podia fugir às interferências da sua subjetividade socialmente
territorial ao período mais recente. Arthur Cézar Ferreira Reis construída. A politização do discurso historiográfico deste
participava da percepção autoritária de desenvolvimento historiador foi, como elucidaremos adiante, profundamente
nacional dos autores do chamado pensamento nacionalista determinada por sua finalidade pragmática.
autoritário. Este pensamento é a base intelectual da história A identificação das matrizes gerais da obra de Arthur
regional de Arthur Reis, bem como a base de suas Reis foi nossa principal preocupação na pesquisa. Neste
apropriações dos discursos historiográficos divergentes. O capítulo, destacaremos as ideias que constituem a estrutura
envolvimento profundo deste intelectual amazonense com axial do pensamento de Arthur Reis, analisando algumas de
os estudos históricos e com as questões politicosociais do suas principais obras e perseguindo os vínculos que elas
seu tempo indica a relevância que a análise de sua produção mantêm com a experiência vivida por este historiador.
possui para aprofundar a discussão da relação entre texto e Convém, no entanto, privilegiar, no amplíssimo quadro do
contexto. que chamamos experiência vivida, aquele processo de
formação de uma certa representação de intelectual.
A princípio, impressiona o volume e a amplitude da
obra de Arthur Reis, que se baseia numa pesquisa documental
de grande fôlego. Um trabalho que estabeleceu marcos A EXPERIÊNCIA DE VIDA
cronológicos, questões e interpretações sobre a história da Nascido em Manaus a 8 de janeiro de 1906, Arthur
Amazônia. Porém, esta ampla produção historiográfica não Cézar Ferreira Reis teve a oportunidade de obter uma boa
encontrou ainda tantos interlocutores dispostos a analisar e formação escolar, uma vez que era filho de um respeitado
revisar suas propostas. Os historiadores interessados em jornalista: Vicente Torres da Silva Reis. Estudou em escolas
pesquisar o passado do Norte do Brasil dificilmente poderão amazonenses e na Faculdade de Direito de Belém,
evitar a interlocução com a obra pioneira de Arthur Reis. Ao transferindo-se depois para o Rio de Janeiro, onde concluiu
discutir os pressupostos que norteiam o discurso histórico seus estudos superiores, bacharelando-se em ciências
deste historiador, objetivamos contribuir com a prática da jurídicas e sociais em 1927. Segundo o próprio Arthur Reis,
revisão historiográfica e com o amadurecimento teórico e sua ida para o Rio de Janeiro lhe ensejou contatos que
metodológico dos novos estudos sobre a história da Amazônia aprofundaram seu interesse pelos estudos históricos, que
e, quiçá, do Brasil. surgira já no curso secundário do Ginásio Amazonense:

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

vindo para o Rio de Janeiro, cursar a Faculdade de ao Arquivo do Pará" (REIS, 1993a: VII-VIII).O livro A política
Direitoda Universidade do Rio de Janeiro, única existente de portugal no vale amazônico, lançado em 1939, é a obra
no Brasil, encontrei ali novo ambiente, representado: ernblemática desta nova fase de suas pesquisas.
no Secretário da Faculdade, Max Fleiuss, secretário
perpétuo do Instituto Histórico e Geográfico Basileiro, A partir de 1946, Arthur Reis começou a exercer uma
e chefe dos serviços financeiros da Faculdade; no série de funções na burocracia estatal federal. De 1946 a 1953
historiador Rodolfo Garcia, também daquele Instituto chefiou a Divisão de Expansão Econômica. Em 1953, foi
Histórico e mais tarde diretor da Biblioteca Nacional. convocado pelo presidente da república - Getúlio Vargas -
Ambos me incentivaram, indicando-me inclusive, o que para dirigir a Superintendência do Plano de Valorização
deveria ler para ampliar meus conhecimentos (REIS,
Econômica da Amazônia (SPVEA). Este organismo tinha,
1987: 49).
de acordo com a legislação que o criou, como principal
De volta a Manaus, Arthur Reis assumiu o cargo de objetivo: "melhorar os padrões sociais de vida e bem estar
redator-chefe do Jornal do Correio, de seu pai. Em 1935, econômico das populações da região e da expansão da riqueza
tornou-se professor de Economia Política e Ciências das do país". Aquele historiador permaneceu nessa
Finanças da Faculdade de Direito do Amazonas. A crescente Superintendência até 1955 e, em 1956, assumiu a presidência
visibilidade que obteve no meio intelectual culminou na sua do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).Além
eleição para sócio correspondente do Instituto Histórico e destas, Reis, mais tarde, exerceu as funções de: Diretor do
Geográfico Brasileiro, em 4 de dezembro de 1935. Já havia Departamento de História e Divulgação do Estado da
escrito História do Amazonas (1931) e Manaus e outras vilas Guanabara (1961), Diretor do Departamento Nacional da
(1934), por sugestão de Capistrano de Abreu, que tinha sido Indústria, do Ministério da Indústria e Comércio.
seu preceptor no Rio de Janeiro (lbidem: 49). Vicente Tapajós
Após o golpe militar de 1964, Arthur Reis foi eleito
assevera que estes dois livros ''foram, sem dúvida, o principal
Governador do Estado do Amazonas pela Assembleia
título a trczê-lo ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro"
Legislativa. Quando terminou seu mandato de governador, foi
(TAPAJÓS, 1987: 38).
convidado a integrar, no Rio de Janeiro, o Conselho Federal
Em 1938, mudou-se para Belém, onde passou a de Cultura, do qual foi, por vários anos, presidente. Também
lecionar História do Brasil em vários educandários e atuou foi professor na Pontifícia Universidade Católica do Rio de
como colaborador dos jornais O Estado do Pará e Folha do Janeiro (PUC-RJ) e na Universidade Federal Fluminense (UFF).
Norte. Sua estadia em Belém possibilitou-lhe, também, realizar
Como já lembramos, as proposições de Arthur Reis
amplas pesquisas no Arquivo Público e Biblioteca do Pará.
foram geradas no interior de um dinâmico diálogo entre o
Enfatizando a importância destas pesquisas, Arthur Reis
autor e o seu tempo. Por outro lado, de 1930 até meados da
comentou: "posso dizer que o que eu sei sobre a Amazônia,
década de 1960, foi crescente o seu envolvimento político.
aprendi nos anos que vivi em Belém, entre 1938-1945, graças

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

Por isso, como veremos a seguir, seus postulados se referem neutralizar os poderes locais que impediam uma orientação
às questões que eram mais inquietantes para a unificada na condução do país" (D'ALÉSSIO, 2002: 161). A
intelectualidade brasileira de então, ou seja, as relacionadas elite política do governo varguista promoveu uma gradual
aos rumos da política nacional. ampliação do aparelho estatal a fim de se sobrepor aos
localismos e regionalismos oligárquicos. A vasta obra do
A maior parte da atividade política e não pequena
historiador amazonense Arthur Reis, inserida neste
parte da atividade de pesquisa de Arthur Reis se
movimento conjuntural, realiza um diagnóstico do desnível
desenvolveram na Amazônia - região que, pouco integrada
socioeconômico da região amazônica em relação às demais
ao restante do Brasil, guardava certas especificidades. No
regiões do Brasil, uma situação que, segundo o mesmo
entanto, Arthur Cézar Ferreira Reis tinha livre trânsito nos
historiador, não deveria persistir, pois constituía um sinal de
centros intelectuais do Sudeste, onde, a partir da década de
imaturidade do país, uma vez que "um Brasil potencialmente
1930, se processava uma modernização social e intelectual
forte, não podia ser considerado na base de regiões fortes e
que se expressava nas inovadoras abordagens da história de
regiões fracas, regiões desenvolvidas e regiões
Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado
subdesenvolvidas" (REIS, 1994: 112). Para o autor, tal
Júnior, e na fundação das faculdades de filosofia em São
situação constituía também uma ameaça à manutenção da
Paulo e Rio de Janeiro (COELHO, 1994: 180-181). Foi
soberania nacional sobre a Amazônia, porque "a unidade
também neste momento que Arthur Cézar Ferreira Reis teve
[só]teria uma estrutura definitiva com o nivelamento de todos"
suas primeiras obras publicadas (Em 1931 se publicou seu
(lbidem: 112). A integração econômica das regiões que
primeiro livro: História do Amazonas, em Manaus).
compunham o país como imperativo da ação estatal, se
Enfraquecidas pela crise engendrada pela "Grande realizaria pela colocação das forças econômicas ativas sob a
Depressão" de 1929, as oligarquias paulista e mineira hegemonia do Estado. Nestes termos, Arthur Cézar Ferreira
recuavam de sua posição hegemônica frente à organização Reis pretende que sua obra tenha como sentido maior a
de forças políticas de oposição, ao desenvolvimento da realização de uma conscientização deste preceito de que só
industrialização e urbanização no Sudeste e à centralização o Estado poderia consolidar a nação, pela evocação das lições
administrativa do Estado. °projeto político varguista que a história teria a dar às elites e ao próprio povo. Para
tornar mais claro o processo de constituição de um sentido
caminhava no sentido contrário ao da Constituição de 1891
(que fortalecia o poder dos estados), ou seja, operava uma maior na narrativa histórica escrita por Reis, passamos a
centralização política e administrativa. Como afirma Márcia analisar algumas de suas mais representativas obras,
Mansor D' Aléssio, o projeto político dos que fizeram a selecionadas dentre aquelas escritas após suas pesquisas no
chamada Revolução de 1930 "visava, acima de tudo, Arquivo Público do Pará.

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

A AÇÃO DESENVOLVIMENTISTA DO ESTADO NA Livro lançado pouco depois da instituição do Estado


AMAZÔNIA Novo, A política de Portugal no vale amazônico define as
questões mais amplas das pesquisas de Arthur Reis relativas
Na década de 1930, vários projetos de direcionamento
à Amazônia, de forma que cada um dos seus capítulos se
das energias sociais se insinuavam. A obra de Arthur Reis,
desdobrará depois no tema de outros livros. Este livro foi
como já dissemos, não escapava às implicações das tensões
dedicado a Getúlio Vargas e a Salazar, bem como à
em torno da crise do liberalismo no Brasil e no mundo.
aproximação entre Brasil e Portugal. A política de Portugal
Insatisfeito com o Estado mínimo liberal, Arthur Reis destaca
constitui um esforço de interpretação da expansão,
o papel civilizador do Estado. A ação estatal teria como
estruturação e manutenção do domínio do Estado Português
diretriz a constituição de uma ordem socioeconômica
capitalista na Amazônia por meio de uma obra técnica. E sobre a Amazônia, enfatizando que havia um esforço diligente
de Portugal em relação à garantia do domínio do vale
"técnica porque não pode ser promovida mantendo-se os
amazônico (Ibidem: 1).
sistemas de rotina até então em uso na região" (Ibidem: 113).
A denúncia do atraso da região amazônica justificaria a Quase dez anos depois do lançamento de A política
intervenção técnica do Estado. Intervenção que objetivava a de Portugal, ou seja, no ano de 1948, Arthur Reis lança uma
consolidação do capitalismo nacional (Ibidem: 115). outra obra que consideramos fundamental para a análise das
matrizes de suas formulações acerca da Região Amazônica.
Já em A política de Portugal no vale amazônico, o autor
Trata-se de Limites e demarcações na Amazônia brasileira,
destacava a importância da intervenção estatal para o
apresentado em dois volumes: A fronteira colonial com a
progresso da Região Amazônica. Reis argumenta que Portugal
Guiana Francesa, o primeiro volume, e A fronteira com as
mantinha, no período colonial, uma política bem definida em
colônias espanholas, o segundo. No primeiro volume, Reis
relação ao extremo norte: "[. ..] não política liberal, de
objetiva analisar o processo de "criação da nação brasileira",
produção desorientada", mas de uma "política econômica
reivindicando atenção para a contribuição da Amazônia para
em que se pode sentir a existência de um plano", mais
este processo - contribuição que consistiria na própria
especificamente de um "plano de valorização, como é da
experiência histórica de conquista territorial desta região e
técnica atual" (REIS, 1993a: 110). Arthur Reis afirma nesta
de manutenção da posse luso-brasileira sobre ela (REIS,
obra que a conquista da Amazônia contou com os cuidados
1993b: XXIII), no movimento de avanço da fronteira dos
oficiais, que lhe havia trazido a aparelhagem governativa a
domínios luso-brasileiros que parte do Nordeste e no heroico
fim de regular a sociedade nascente (Ibidem: 23-26); e que
empenho de manutenção deste domínio por índios (aliados)
este especial interesse da metrópole fazia frente aos olhares
e portugueses, que se unem, se amalgamam, originando a
cobiçosos dos estrangeiros (Ibidem: 29). O direcionamento
mamelucada - afirmação da unidade social e primeira
da economia seria a garantia de que as energias regionais
fluiriam rumo à escala das civilizações europeias. geração de brasileiros (Ibidem: 23, 45, 58).

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

Ainda no primeiro volume de Limites e demarcações segundo Arthur Reis, atesta a superioridade do esforço luso-
na Amazônia brasileira, seu autor argumenta que, como os brasileiro pela integração da Amazônia ao domínio de
monarcas franceses (no início do século XVII) combatiam os portugal. Os missionários jesuítas espanhóis teriam
interesses do rei da Espanha (que então também governava assegurado o Napo à Espanha, contudo, a ocupação por eles
o reino português), era premente expulsar o invasor francês empreendida não teria sido nem serena, nem ininterrupta
do domínio ibérico. Neste sentido, ter-se-ia feito uma (lbidem: 17-19).
irradiação na costa leste-oeste, objetivando alcançar o Em 1949, Arthur Cézar Ferreira Reis lançou o livro
Amazonas. Reis igualmente afirma que a esta incorporação
Território do Amapá: perfil histórico, que pode ser considerado
territorial segue-se o "ciclo das guerras contra os hereges", o
como uma continuidade dos estudos empreendidos no
que enseja o heroísmo militar de uma etapa gloriosa da
primeiro volume de Limites e demarcações. Porém, neste,
formação brasileira e da defesa da unidade territorial (Ibidem:
conforme o que já afirmamos, a preocupação principal era
23-45). A constituição da unidade nacional seria sempre a
com o processo de formação da nação brasileira -
luta do espírito de nacionalidade (de portugueses e índios
focalizando-se a experiência específica da união dos
aliados) contra a cobiça (ambição econômica dos "invasores"
elementos da sociedade colonial (sobretudo portugueses e
franceses, ingleses e holandeses). Não há dúvida, porém, de
índios) na Amazônia, pela defesa de seu território. Já em
que os heróis nacionais que representam aquele espírito são
Território do Amapá, o processo em análise é o da
os membros da elite política. A nação brasileira se forja na
consolidação da unidade nacional através da empresa de
identificação dos indígenas com os objetivos dos agentes do
integração nacional, que significa mesmo a valorização
Estado Português.
econômica do espaço amazônico, especialmente do Amapá,
No segundo volume de Limites e demarcações, Arthur que deveria ter sua "barbaria regional" combatida, a fim de
Reis assevera que da parte portuguesa verificava-se uma que fosse integrado ao "organismo brasileiro". Este discurso
decisão pela ocupação e ampliação da fronteira na Amazônia, evidencia uma forte influência da retórica desenvolvimentista
decisão que se teria concretizado numa série de iniciativas. que predominou na intelectualidade brasileira nas décadas
Este autor afirma que a Espanha não via atrativos econômicos de 1940 e 1950. O Amapá, segundo Arthur Reis, integrado
na Amazônia e que seus agentes, limitados pela "muralha ao espaço político brasileiro, só recentemente teria começado
andina", concentraram seus esforços na defesa da bacia a participar do ritmo de trabalho que nos distingue como
platina. Enquanto isso, Portugal pôde dispor de vários civilização (REIS, 1949: 6).
elementos, "todos solidarizados no objetivo de levar a frontera
Em Território do Amapá: perfil histórico é enfatizado
(sic.) à alta hinterlândia" (REIS, 1993c: 24). A consolidação
que o presidente Getúlio Vargas criou os territórios do Amapá,
da soberania do Estado Lusitano sobre os sertões amazônicos
teria se dado com a assinatura do Tratado de Madri, que, Rio Branco, Guaporé, Ponta Porã e Iguaçu, amparado

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

legalmente pela Constituição de 1937, portadora do preceito Afirma-seque a irradiação [portuguesa na Amazônia]
do "campo territorial" - áreas que o governo federal poderia foiobra de missionáriosou de sertanistas,preocupados
unicamente com a coleta da especiaria, a 'droga do
tirar do poder dos estados. No entanto, a razão do livro parece
sertão', da terminologiada época, e com a catequese
ser a de argumentar aos leitores que havia raízes mais remotas
da multidão indígena [...]. Em toda essa emprêsa de
"[...] que é momento de recordar". Raízes que autorizavam expansão, no entanto, não é possíveldeixarde atender
"a execução de uma política de valorização do vale amazônico a que ela se processou em obediênciaa um objetivode
e de outros trechos do espaço brasileiro, pela criação de áreas naturezapolíticade que o religiosoe o econômicoeram
territoriais dirigidas diretamente pelo Poder Federal" (lbidem: partes integrantes,aspectos particulares(Ibidem:27).
114). Trata-se de uma alusão à ação colonizadora portuguesa, Em sua explicação sobre a conquista da Amazônia,
especialmente a do período do consulado pombalino, quando Reis afirma que seu processo de ocupação pode ser dividido
o Estado Metropolitano empreendeu várias ações no sentido em duas fases: a colonização portuguesa, na qual os portugueses
de assegurar seus domínios territoriais e de valorizar teriam plasmado os mamelucos "com aquela plasticidade
economicamente o Estado do Grão-Pará e Maranhão. maravilhosa"; e a exploração das héveas, de 1850 em diante
Como já afirmamos, a partir de 1946, Arthur Reis (Ibidem: p. 21). Em O seringal e o seringueiro, ele se ocupa,
passou a ocupar uma série de funções públicas. No ano sobremodo, desta segunda fase. Arthur Reis, tomando as
da publicação de O seringal e o seringueiro (1953), este análises de Gilberto Freyre como referencial, afirma que na
intelectual foi convocado para a presidência do SPVA. Amazônia também vigiam (até meados do século XIX) os
Este livro foi escrito por Arthur Reis sob encomenda do sistemas da Casa Grande e Senzala e pastoril. Contudo, com
Serviço de Informação Agrícola do governo federal, que a exploração da borracha, o extremo norte teria sido integrado
lhe pedia para "reconstituir, ao lado do panorama à civilização brasileira e teria sido dotado de personalidade
geográfico e da evolução histórica da região, o ambiente própria, abandonando os sistemas nordestinos para se tornar
do homem, êste em seus trabalhos quotidianos, em suas a região dos gomais (lbidem: p. 46-47).
manifestações espirituais e materiais, em suas relações Em que pese a coerência argumentativa de Arthur Reis
sociais" (REIS, 1953: 8). Seguindo este indicativo, Reis no decorrer dos anos, podemos perceber certas modificações
apresenta as estruturas e a dinâmica da vida nos seringais em sua obra. Principalmente a partir da década de 1950,
amazônicos e da economia da exploração da borracha. quando a densa fundamentação empírica é substituída por
(Ibidem: 82-84). Neste livro Arthur Reis destaca as numerosas referências aos textos anteriormente publicados.
peculiaridades da configuração social e da experiência Os livros e conferências se tornam repetitivos. Não por
histórica da Amazônia e enfatiza também a importância coincidência, este é o período em que este historiador passou
da atuação estatal no processo da colonização portuguesa a se envolver em diversas funções públicas. Podemos supor
nesta região. que as novas preocupações e exigências da vida política

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

tenham dificultado a manutenção do seu ritmo anterior de amazomca, além de conquista espiritual e cultural, foi
produção de pesquisas. Nota-se também uma maior operação de reconhecimento ou indagação pormenorizada
preocupação com o período recente da história da Amazônia, (lbidem: 47). O autor assevera que na Amazônia é que
na qual determinadas práticas podem ser desaprovadas pelo Portugal teria vivido a sua mais viva e curiosa experiência
autor, que para isso evoca as lições das experiências históricas tropical, e nela teria instituído uma "política de convivência
mais remotas, numa atualização da história como magistra harmônica" (Ibidem: 247), "um equilíbrio magnífico de grupos
vitae. étnicos" (lbidem: 312). A tese do equilíbrio entre
antagonismos - de que o processo de miscigenação ampliava
Exemplos desta produção recente são os livros:
Aspectos da experiência portuguesa na Amazônia e A os espaços em que os conflitos sociais eram dissolvidos - de
Gilberto Freire, ganha novo sentido: a miscigenação passa a
Amazônia e a integridade do Brasil. Ambos são coletâneas
ser considerada como parte de um amplo projeto político e
de artigos e conferências lançadas em 1966, quando Arthur
não mais como decorrência da plasticidade do povo português.
Reis ocupava o cargo de Governador do Estado do
Em processo de formação, a nação teria sido até então
Amazonas. Em A Amazônia e a integridade do Brasil, Arthur
dirigida pelo Estado ao amadurecimento e aos patamares da
Reis retoma a temática da valorização da região amazônica
civilização. Mas este processo civilizador ainda estaria
(REIS, 1966a). E em Aspectos da experiência portuguesa na
inacabado.
Amazônia encontramos a tese de que mais do que o povo, o
sujeito da domesticação do espaço amazônico foi o governo Esta concepção de história enquanto registro da ação
português. Reis afirma: "tentamos a proposição de aspectos civilizadora do Estado foi introduzida no Brasil pelo Instituto
dessa presença política [de Portugal] que envolveu a ação Histórico e Geográfico Brasileiro (GUIMARÃES, 1988 e
econômica, social e cultural, representada na série intensa de SCHAPOCHNIK, 1993), no qual, conforme o que já
ações de governo, dentro de um planejamento concebido" afirmamos, Arthur Reis ingressou em 1935. No entanto, na
111111
(REIS, 1966b: 10). Nestes dois livros, Arthur Reis repete a década de 1930, este enaltecimento da ação civilizadora do
proposição desenvolvida no primeiro volume de Limites e Estado ganhou novo significado: a dimensão de crítica ao
demarcações de que, enquanto os estrangeiros (franceses, modelo liberal de Estado. Ainda no decorrer da chamada
ingleses e holandeses) eram cobiçosos, mercantis e República Velha, as teses do pensamento autoritário
imperialistas, o português se movia por uma "vontade condenavam explicitamente o liberalismo político e
disciplinada", desenvolvendo uma ação mansa e segura propunham um projeto alternativo de organização social. A
(Ibidem: 44). contestação do status quo se fundamentava na constatação
de que os princípios liberais tinham sua efetivação estorvada
É em Aspectos da experiência portuguesa na Amazônia
pela força das práticas oligárquicas. Os intelectuais do
que Arthur Reis afirma que a lusotropicalização da terra
pensamento autoritário também acreditavam que eles

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

poderiam orientar as elites e a nação no contexto da crise do tendiam a rejeitar aquelas obras, ou, na medida do possível,
liberalismo, que se desencadeou em 1929. A nova ordem a "ajustar ao menos" Gilberto Freyre aos seus desígnios. Estes
interna que apregoavam seria firmada sob o signo de um moÇos de direita, ainda segundo Candido, tomavam como
Estado forte (BEIRED, 1999: 532). Os intelectuais de direita leituras preferenciais "autores mais antigos, com orientação
(de alguns setores da Igreja Católica, da Ação Integralista metodológica do tipo naturalista ou (no sentido amplo)
Brasileira e do polo cientificista, enquadrado "na tradição positivista, como Oliveira Viana e Alberto Torres, dos quais
positivista da intelectualidade brasileira"), segundo José tiravam argumentos para uma visão hierárquica e autoritária
Beired, tinham como projeto para a sociedade brasileira: da sociedade [...]" (Ibidem: 11).
"instituição de. um Estado autoritário-corporativo; É clara a influência, na obra de Arthur Reis, das leituras
industrialização, nacionalismo econômico e intervencionismo de obras de autores do chamado pensamento nacionalista
estatal na economia; reespiritualização da sociedade e do autoritário. Percebe-se o compromisso de Arthur Reis com as
Estado; e imperialismo militar" (Ibidem: 533). ideias desta corrente, por exemplo, quando afirma que a
valorização da Amazônia é uma obra política "porque
PALAVRAS FINAIS
empreendimento do Estado e não a cargo da iniciativaprivada,
Os enfrentamentos políticos da década de 1930 e do o que não significa que a contribuição desta seja desprezada ou
início da década de 1940 forçavam os jovens intelectuais, ignoradapelo poder público [...]" (REIS, 1994: 113). O Estado
como Arthur Reis, a se posicionarem diante dos diferentes era para aquele historiador o sujeito da valorização da região
projetos de reorganização da sociedade brasileira. As leituras amazônica, o único que poderia libertá-Iado "sistema de rotina"
escolhidas acabavam por identificar os posicionamentos, na nela dominante, das formas indígenas e rústicas de cultivo da
medida em que a produção intelectual - em especial a terra e de extrativismo, signos de seu atraso. A sua identificação
concernente às ciências sociais - estava voltada para com os grupos políticos de direita ganhou visibilidade já nos
preocupações de ordem política. Neste sentido, Antonio seus primeiros estudos e escritos históricos.
Candido afirma que para os moços da esquerda Casa Grande
A apologética do Estado forte, interventor e subjugador
& Senzala, Raízes do Brasil e Formação do Brasil
de uma nação imatura e/ou defeituosa foi esboçada por
contemporâneo foram trazendo elementos de uma visão do
Alberto Torres em textos muito celebrados nas décadas de
Brasil que "parecia adequar-se" aos seus pontos de vista.
1930 e 1940. Este escritor afirmava "que aos intelectuais
Traziam para eles: "a denúncia do nosso preconceito de raça,
caberia forjar tanto uma 'consciência nacional' quanto os
a valorização do elemento de cor, a crítica dos elementos
'rumos' da política brasileira" (TORRES apud BEIRED, 1999:
'patriarcais' e agrários, o discernimento das condições
534). Torres preconizava que os intelectuais possuíam uma
econômicas e a desmistificação da retórica liberal"
missão de salvação nacional, que implicava na sua
(CANDIDO, 1995: 11). Por outro lado, os jovens de direita

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Amazônia, Amapá - escritos de história Sidney da Silva Lobato

participação direta na política do Estado, junto às classes imperialismo econômico estrangeiro. Ela precisaria, portanto,
dirigentes. É neste sentido que assevera: do direcionamento firme do governo e da intelectualidade.
A representação de intelectual que se pode perceber
tenho procurado, em meus estudos, chamar a atenção
na obra de Arthur Reis também muito deve à pregação de
de meus patricios e, particularmente, dos que nos
governam, para este facto, commum às nacionalidades Alberto Torres. A integração da Amazônia ao processo de
modernas de origem colonial, mas, no Brasil, modernização draconiana, conduzida "por um ato de
excepcionalmente notavel: a ausencia do espirito coragem de homens e de autoridades" (REIS, 1966a: 12),
nacional 'pratico', da solidariedade patriotica fundada fazia parte, para aquele pesquisador amazonense, de um
na consciencia dos interesses communs a todos processo de consolidação da nação brasileira, como podemos
agrupamentos politicos, religiosos, economicos,
perceber na sua "Apresentação" ao livro A Amazônia e a
geographicos, commerciais e industriaes. Esta
solidariedade, quasi instintiva nas velhas nações, onde integração do Brasil.
é obra secular de relações, de trocas e de apoio mutuo,
só póde surgir, em novas e extensas nacionalidades, Visamos, parece claro, mostrar qual a nossa contribuição
com a fórma de um movel consciente e como à unidade brasileira, unidade que se consubstancia na
conhecimento objectivo das necessidades permanentes pluralidade de aspectos físicos, na diversificação quase
do paiz, superiores às divergencias e divisões do presente imensurável da produção, mas se concretiza nos anseias
e à sucessão das gerações. No Brasil, com mais forte espirituais, nos vínculos de sangue, nos sentimentos'
razão, o estudo da synthese nacional, e o trabalho de objetivando sempre a uma mais intensa e mais decisiva
educação da opinião e de arregimentação dos espiritos solidariedade de tipos, de classes, de ordem social
em torno de um programma e de um ideal, é, por força (lbidem: 12-13).

. 111.
da nossa conformação geográphica, mais difficile mais A representação de "Amazônia" como um espaço de
necessario (TORRES, 1914: 84).
experiência histórica forjadora da unidade nacional contribui
Alberto Torres atribui à elite política - da qual fariam com a corroboração do ideal de uma "solidariedade
parte os intelectuais - a missão de consolidar a "solidariedade patriótica", na qual estejam dissolvidas as diversidades de
patriótica" ou, em outras palavras, de levar a nação ao estado tipo e de classe social. Numa extensa nacionalidade, corno o
de maturidade. Tal empresa consistiria na conscientização Brasil, a integração de domínios físicos diversos
dos brasileiros de que possuíam um passado comum, testemunharia a existência de uma comunhão de anseios e
representado numa "síntese nacional", e um programa que de vínculos profundos: "os êxitos que alcançamos sobre a
Ilil;lllllll visava assistir as necessidades e interesses em comum. A paisagem física já constituem uma evidenciação muito positiva
I

nação brasileira, neste caso, desprovida de uma de que somos, realmente, uma Pátria indivisível". (Ibidem:
autoconsciência, não tinha condições de engendrar o próprio 13). O caráter pragmático do conhecimento histórico
desenvolvimento, ou a sua emancipação em relação ao elaborado a partir desta representação de "região" reside na
I
.
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Amazônia, Amapá - escritos de histór\ Sidney da Silva Lobato

lição edificante da vitória de um espírito ou=sentimento REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


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II111
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de conquista territorial e de manutenção das fronteiras do
Illi A., BRESCIANI, Maria Stella e BREPOHL, Marion (orgs.).
governo português no Brasil Colonial (isto para apresentar
I Razão e paixão na política. Brasília: UNB, 2002.
tais fronteiras como um patrimônio nacional que teríamos
herdado do heroísmo de nossos ancestrais comuns). Já no GUIMARÃES,Manuel Luís Salgado. Nação e civilização nos
pós-64, interessou-se pelas iniciativas do governo federal trópicos: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o
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