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CAP - UFRJ

Licencianda: Amanda de Oliveira Pereira

A experiência estética como caminho para semeadura do entusiasmo pelo conhecimento –


Entrevista com Lisie de Lucca

• "Por que o entusiasmo é importante na sala de aula?"

- "O objetivo do processo de aprendizagem é revelar o currículo". "O objetivo é gerar um


interesse no aluno para que ele possa continuar se aprofundando no assunto mesmo sem a
obrigação, para isso é preciso entusiasma-lo"

• O que é estética?

- É o ramo da filosofia que estuda a beleza e o sentimento que essa beleza sucinta no ser
humano, a ciência do belo. Estudar a estética faz com que a gente entenda melhor como a
gente se desperte pra beleza, e pensamos como isso pode ser interessante dentro de sala de
aula.

• De que forma os conhecimentos sobre arte e estética podem ser trazidos pra sala de aula?

- Paulo Freire disse: “Todo professor é um artista.”

O artista é aquele que vê beleza em coisas que nem todo mundo consegue enxergar, e através
da ação artística ele consegue fazer com que outras pessoas vejam também (...) o professor
precisa fazer exatamente isso, ele precisa transformar sua disciplina em algo belo pro
estudante, pois a beleza é algo que nos traz uma sensação prazerosa que nos faz continuar
pelo mesmo caminho.

• Então a beleza vai além do objeto?

- Sim. Platão acreditava que que os objetos continham beleza, a ideia do belo universal. Mas
posteriormente Kant afirmava que somos nós que atribuímos beleza a um objeto. Hegel
afirmava que a cultura que estamos inseridos, o tempo e espaço, influenciam o julgamento do
sujeito. A teoria mais aceita hoje em dia é de Merleau Ponty, que dizia que a beleza não estava
no objeto e nem no sujeito, a beleza surge na relação do objeto de contemplação e do sujeito
contemplador, na experiência estética.

• O que é a experiência estética?

- É uma experiência de profunda percepção que nos devolve a consciência de que somos seres
humanos. Quando temos todas as nossas faculdades sensoriais, emocionais e intelectuais
estimuladas. Produz uma recompensa prazerosa que faz o aluno queira seguir esse caminho. A
experiência estética demonstra beleza mesmo quando o objeto não é bonito, como, por
exemplo, quando assistimos um filme de drama trágico que nos faz chorar, mas mesmo assim
dizemos que ele é bonito.

• Qual a impressão que você tem da disseminação desses conceitos, que efeitos são
produzidos nos alunos?

- Ao longo da atuação como professora, percebeu que muitas pessoas fazem cursos livres de
artes, pelo prazer, e começou a investigar porque as pessoas têm um entusiasmo tão grande
em relação à artes. Então, a arte pode ensinar que a gente enriquece muito a vida quando
olhamos pras coisas a partir de um ponto de vista estético, quando vemos além das funções
pragmáticas das coisas. Cada vez que a gente faz o aluno passar pela experiência estética a
gente está sensibilizando esse aparato de percepção. A partir do momento que o aluno tem o
aparato sensível aberto ele pode ter autonomia, e essa é o maior objetivo da educação.

Existem 3 motivos pelo qual a gente se engaja numa atividade, o primeiro é por prazer, como
brincar comer e fazer amor. O segundo é pela necessidade de alcançar o resultado direto
daquela ação, por exemplo: não gostar de lavar a louça mas gostar de comer em pratos limpos,
então apesar de não gostar do processo, gostar do resultado. E o terceiro por uma recompensa
extrínseca dessa ação, por exemplo uma pessoa que não gosta do trabalho, não se importa
com o resultado da ação do trabalho dela, mas trabalha porque tem uma recompensa externa
dessa ação: o salário. E a escola, que muitas vezes reproduz isso, então o aluno muitas vezes se
engaja na atividade por conta da nota, que é uma recompensa extrínseca da ação. Portanto,
ele não está interessado pelo processo e nem pelo resultado. Quando o aluno faz a atividade
só pela recompensa da nota ele está fazendo pelos motivos errados. O ideal é conseguir que os
alunos façam a atividade pelo prazer, por enxergar a beleza nela. Então quanto mais criarmos
incentivos artificiais (a nota) na escola, pior é.

• Então qual é o segredo pra tudo isso?

- Que o professor atue como um artista, criando momentos de encontro entre o aluno e a
disciplina. Ele precisa fazer que neste encontro o aluno seja estimulado em todos os seus
âmbitos humanos, sensoriais, emocionais e intelectuais, para que ele passe por uma
experiente estética, assim ele verá a expressão de beleza neste objeto de conhecimento. Isso
faz com que o aluno se engaje no processo de aprendizagem pela satisfação intrínseca, pelo
prazer de saber.

• O que você diria pro professor que ainda não atingiu essa maestria, aquele professor que só
se preocupa com o desenvolvimento do conteúdo citado no currículo explícito?

- Ele tem que repensar a posição dele, pois um professor que só deposita informações já foi
substituído pelo Google. Isso é a educação bancária, que é alienante pois ela se desvincula dos
interesses mais profundos do aluno. Então o professor que insiste nesta postura não consegue
o seu objetivo maior, ele pode até conseguir uma sala em silêncio, mas não que o aluno
aprenda melhor, que é nosso objetivo.

...
Assistindo a entrevista de Lisie de Lucca fiz uma associação direta com o documentário “Pro
dia nascer feliz”, onde conseguimos ver, na prática, como a arte pode ser eficiente em provocar
o engajamento espontâneo no aluno.

O filme mostra a realidade de várias escolas espalhadas pelo Brasil, na maioria públicas.
Dentre os diversos desafios que elas enfrentam (infraestrutura, falta de professores,
segurança...), está a dificuldade de manter os alunos interessados, com vontade de aprender, e
cada um desses alunos têm problemas que vão além da escola. Porém mesmo com todas essas
adversidades alguns alunos se mostram entusiasmados com alguns projetos extra-curriculares
e, não curiosamente, são projetos que envolvem arte.

Certamente, eles estavam passando pela experiência estética da arte. Além disso,
encontravam nesses projetos um lugar para se expressarem e liberar sua criatividade.

Infelizmente, como falei acima, eram apenas projetos extra-curriculares, a disciplina de artes
sequer foi mencionada no filme. Nas demais disciplinas os professores seguiam a linha de
ensino mais tradicional e a maioria estava desmotivada com as condições das escolas. Isso nos
faz pensar como a situação seria diferente se a arte e o entusiasmo também fossem
trabalhados em conjunto com as outras aulas.

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