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Expondo Cristo a Partir de Cada Texto

Por Timothy Keller

Introdução
Uma maneira benéfica de pregar com um foco centralizado em Cristo é identificar os
pedaços do Evangelho que somente Cristo pode resolver (temas), somente Cristo pode receber
(lei), somente Cristo pode completar (histórias) e somente Cristo pode cumprir (símbolos). Cada uma
dessas abordagens é explicada nesta sessão. Além disso, você pode criar sua própria coleção de
maneiras de expor Cristo, investigando os seguintes recursos:

● Edmund P. Clowney, The Unfolding Mystery: Discovering Christ in the Old Testament [O
Mistério Revelado: Descobrindo Cristo no Antigo Testamento].

● Simon G. De Graaf, Promise and Deliverance [Promessa e Libertação]1

● Raymond B. Dillard e Tremper Longman III, Introdução ao Antigo Testamento. Veja a


última sessão de cada capítulo.

● Alec Motyer, Look to the Rock: An Old Testament Background to Our Understanding of
Christ. [Olhe para a Rocha: Um pano de fundo do Antigo Testamento para nossa
compreensão de Cristo.] Motyer escolhe sete desses temas redentores e mostra como
Cristo é o cumprimento de cada um.

● Christopher J. H. Wright, Knowing Jesus Through the Old Testament [Conhecendo Jesus
Através do Antigo Testamento].

Expondo Cristo Através da Resolução de Temas


Um grande número do que Donald Carson chama de temas "inter-canônicos"2 cortam todo o
corpus bíblico. Alec Motyer observa, além disso, que o Antigo Testamento afirma verdades em
tensão aparentemente irreconciliáveis entre si.3 Assim, esses temas têm tramas mais espessas à
medida que a história do Antigo Testamento se desenrola. Em outras palavras, como em todas as
boas histórias, tensões dramáticas dentro dos temas parecem quase insolúveis. Somente em Cristo
elas são resolvidas e cumpridas.

Para usar essa abordagem interpretativa, em vez de procurar apenas tipos, fique atento às
perguntas levantadas no texto e às maneiras pelas quais Jesus sozinho pode ser “a resposta no
final do livro”. Sempre que qualquer um dos seguintes temas passar por seu texto (e esta não é uma
lista exaustiva), basta seguir o tópico, olhando para onde começou e olhando para o cumprimento
em Cristo, agora e no futuro reino. Observe como esses temas não são apenas princípios morais

1
Quatro volumes disponiveis em http://www.reformationalpublishingproject.com/rpp/paideia_books.asp
2
D. A. Carson, Systematic Theology and Biblical Theology [Novo Dicionário de Teologia Bíblica] em New Dictionary of
Biblical Theology [Novo Dicionário de Teologia Bíblica], ed. T. Desmond Alexander e Brian S. Rosner (Downers Grove, Ill:
Intervarsity, 2000), 89-104.
3
Veja os escritos de Alec Motyer, como o Look to the Rock: An Old Testament Background to our Understanding of Christ
[Olhe para a Rocha: Um Transfundo do Velho Testamento para a nossa Compreensão de Cristo] (Grand Rapids, Mich:
Kregel Publicações, 2004).
Expondo Cristo a Partir de Cada Texto, por Timothy Keller 2

( justiça, honestidade, amor, generosidade, lealdade da família etc.), mas pedaços do Evangelho, os
atributos de Deus que suprem a salvação, a condição da humanidade que requer a salvação, os
padrões de provisão da salvação, os meios de recepção da salvação e assim por diante.

A. Temas Amplos Resolvidos em Cristo


1. Rei e Reino. A liberdade e a glória do reino de Deus se perdem quando Adão e Eva pecam.
A busca por um verdadeiro juiz e rei absorve grande parte da história do povo de Deus. À
medida que se afastam continuamente da submissão ao governo de Deus, tornam-se
escravos de seus próprios desejos ou de outras nações, que também oprimem e
escravizam. Tanto os sucessos quanto os fracassos de todos os líderes de Israel apontam
para a necessidade de um verdadeiro rei. Eventualmente, a tensão entre a destruição do
pecado e o poder do rei libertador se torna esmagadora; por exemplo, Moisés lidera o
êxodo para fora da terra da escravidão, mas falha em obedecer a Deus na rocha no deserto
(Nm 20: 1–13, 1Cor 10: 4), e Davi mata Golias, mas pecou contra Bate-Seba e Urias (1Sm 11-12).
Nenhum líder humano é bom o bastante e as qualificações reais descritas em Isaías e nos
Salmos são tão incomparáveis que somente a vinda do próprio Senhor pode cumpri-las.
"Como qualquer rei pode ser poderoso o suficiente para nos libertar de uma escravidão e
de tão grande prisão?" A resposta: Somente um que seja o próprio Deus.
2. Graça e Lei na Aliança. Um segundo grande tema da Bíblia é como a santidade e o amor de
Deus se relacionam na aliança. Deus é absolutamente santo e também misericordioso, mas
como ele pode ser os dois? Raymond Dillard e Tremper Longman dizem que as histórias de
Juízes através de 2Crônicas parecem cair no dilema de saber se a aliança de Deus com seu
povo é condicional (condicionada à obediência) ou incondicional (por pura graça).4 Assim, as
narrativas são impulsionadas principalmente por uma tensão. "Como Deus pode ser santo e
ainda permanecer fiel ao seu povo?". A resposta: Somente na cruz, onde a lei de Deus e o
amor de Deus foram cumpridos. Não devemos tentar resolver essa tensão até chegarmos à
cruz. Embora Isaías aponte para uma resolução quando fala da necessidade de um rei
supremo e de um servo sofredor, ainda assim ele está essencialmente criando uma tensão
mais dramática que somente Cristo pode resolver.
3. Criação, Queda e Recriação (Ressurreição). Como o tema do reino revela nossa
necessidade de um libertador da escravidão e o tema da aliança, nossa necessidade de um
redentor da penalidade da lei, o tema da criação e consumação aponta para a nossa
necessidade de um curador que seja a própria vida. A morte traz decadência e
desintegração a toda a boa criação de Deus. A vida é cheia de tristeza e perda. A sociedade
é uma Babel. Até o povo de Deus está em um tipo de exílio indefinido que ainda é afligido
em certa medida pela alienação de nosso Deus, de nosso verdadeiro eu, um do outro e do
ambiente da criação. "Como a criação pode ser salva e curada? Como podemos ser libertos
da morte e decadência?" As respostas: Somente por quem nos criou, quando ele voltar para
nos renovar finalmente. Somente por quem derrota a morte através da ressurreição. Ele irá
“reconciliar consigo mesmo todas as coisas” (Col 1:20) e transformar o mundo no novo céu e
nova terra (Ap 21: 1–8).
4. O Verdadeiro Deus Versus os Ídolos. Os dois primeiros mandamentos do decálogo
abordam um dos temas predominantes da Bíblia: a diferença entre o único Deus verdadeiro

4
Raymond B. Dillard e Tremper Longman III, An Introduction to the Old Testament [Uma Introdução ao Antigo Testamento]
(Grand Rapids, Mich: Zondervan, 1994), 113 e em outros lugares.
Expondo Cristo a Partir de Cada Texto, por Timothy Keller 3

e os ídolos da época. Toda e qualquer coisa criada é boa em si mesma, mas pode ter
influência demoníaca e destrutiva se promovida a um lugar último e divino em qualquer
coração, sociedade ou cultura. A idolatria se torna a definição definitiva de pecado, porque
é possível cumprir quase completamente a lei comportamental e, no entanto, obedecê-la
por motivos idólatras, e não por Deus. Todas as patologias psicológicas e sociais podem ser
atribuídas a amores desordenados. “Como uma psique ou sociedade desordenada pode ser
renovada e se tornar saudável?” A resposta: Somente por um Salvador que é uma Beleza
Absoluta. Regras e doutrinas por si só não serão suficientes, uma vez que a raiz de todo
pecado e desordem é ter outros deuses antes de Deus. Precisamos de um Deus que não
seja apenas um rei/libertador, não apenas um cumpridor da Lei, não apenas um curador da
morte, mas uma Beleza que possa capturar nossos corações. “Agora para você que crê, ele
é precioso” (1Pedro 2:7).

B. Temas Menores Resolvidos em Cristo


1. Adoração e o Santuário: Como podemos nos conectar à presença de Deus? A presença
íntima de Deus foi perdida para os humanos através do pecado. Deus fez uma habitação
entre as pessoas no tabernáculo, mas em Cristo, a glória de Deus se torna algo que
contemplamos (João 1:14), e, agora, a presença de Deus está realmente dentro de nós (1
Pedro 2:4-5). Jesus é a beleza que devemos adorar para viver verdadeiramente e, um dia, a
luz e a presença de Deus encherão a terra. Traçar a história dos encontros face a face com a
presença de Deus na Bíblia - os encontros de Abraão em Gênesis 15 e 18, os encontros de
Jacó em Gênesis 28 e 32, os encontros de Moisés em Êxodo 3 e 33, o encontro de Josué
em Josué 5, os pais de Sansão em Juízes 13, o encontro de Elias em 1 Reis 19 e o encontro
de Isaías em Isaías 6.
2. Justiça e Nudez: Como podemos nos libertar da vergonha e da condenação? Éramos
originalmente justos e retos com Deus - nus e sem vergonha (Gênesis 2:25). Jesus, o Filho
perfeitamente obediente, nos veste com o manto de sua própria justiça e nos conduz com
ousadia e sem vergonha diante do trono. Siga o conceito de vergonha e culpa - Gênesis 3,
os Salmos, Isaías 6 e os profetas, e através do Novo Testamento.
3. Casamento e Fidelidade: Como podemos conhecer o amor e a intimidade? Deus descreve
seu relacionamento com seu povo como o de um marido para com uma esposa infiel. Jesus,
no entanto, é o verdadeiro noivo que ama sacrificialmente sua esposa, conquista seu amor e
apresenta-a a si mesmo como uma noiva radiante. Siga esse tema começando por Gênesis
2, siga através dos profetas (especialmente Ezequiel 16 e Oséias), até chegar em João 1 e
Efésios 5.
4. Imagem e Semelhança: como podemos nos tornar seres totalmente humanos? Deus nos
criou à sua própria imagem (Gn 1:27), mas essa semelhança, embora não perdida, foi
desfigurada em nós. Em Cristo e em sua encarnação, temos a imagem perfeita de quem
Deus é (em termos que podemos literalmente compreender), bem como quem devemos ser.
A imagem de Deus é restaurada em nós através de Cristo.
5. Descanso e o Sábado: Como podemos encontrar harmonia conosco e com aqueles que nos
rodeiam? Fomos originalmente chamados para o descanso, o Shalom de Deus, mas agora
estamos profundamente inquietos. O sábado indica o descanso que precisamos em nosso
trabalho físico. Mais profundamente, Cristo nos traz o descanso espiritual que precisamos de
nossos esforços para alcançar um registro de boas obras (Hb 4). E, finalmente,
desfrutaremos de descanso na cidade de Deus.
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6. Sabedoria e a Palavra: Como podemos conhecer a verdade, especialmente a razão de


nossa existência? Fomos criados para um propósito, mas neste momento experimentamos
falta de sentido. Não temos sabedoria para dirigir nossos passos, mas Cristo, o mestre da
Palavra bíblica, na verdade, é a Palavra - o próprio Logos. É por ele que devemos viver e ter
significado.
7. Justiça e Julgamento: se não há juízo final, que esperança existe para um mundo cheio de
tirania e injustiça? Por outro lado, se houver um juiz supremo, que esperança há para nós
que fizemos tanto mal? Como a Palavra de Deus pode ser uma bênção que dá vida e não
apenas uma maldição? Somente em Cristo há esperança, pois ele é o juiz que tomou nosso
julgamento. Por causa da expiação de Cristo, Deus pode ser ao mesmo tempo justo e
justificador daqueles que crêem.

C. Progressão do Tema em Direção a Cristo


O pregador deve posicionar o texto no fluxo da história da salvação de Deus, porque todos
esses temas são resolvidos progressivamente. Deus estabelece seu mundo na criação, mas por
causa da queda, quase tudo está perdido. Deus, então, inicia seu plano de restabelecer seu reino,
santuário, Palavra, descanso e aliança, primeiro com os patriarcas, depois com Moisés e depois
durante o tempo dos profetas. Depois disso, todos esses temas brilham com um novo brilho no
próprio Cristo. Agora, Deus está trabalhando com eles na era da igreja, e ele os levará ao fim no
último dia.

O tema do progresso da história redentora, portanto, abrange todos os outros temas, por
isso é geralmente importante fazer alguma referência à história completa. Por exemplo, ao pregar
sobre o desejo do salmista de ir ao santuário, não devemos simplesmente exortar nosso povo a
desfrutar da adoração. Antes, devemos dizer: “Nós mesmos nos tornamos o templo, de acordo com
1 Pedro 2: 4-5, porque Jesus é o templo (João 2:19–21). Quão mais disponível deve estar o Senhor
para uma rica comunhão conosco agora?” Você sempre pode traçar cada um desses temas amplos
ou estreitos através de seu desdobramento progressivo.

Muitos dos temas inter-canônicos têm promessas explícitas do Antigo Testamento anexadas
a eles. Da “promessa mãe” de Gênesis 3:15 em diante, Jesus é o cumprimento de todas elas.
Avance da promessa implícita ou explícita no seu texto para o cumprimento em Jesus. Por outro
lado, se você estiver pregando no Novo Testamento, mostre a história dos anseios e promessas
que formam o pano de fundo do que é afirmado. Isso dá profundidade e "história" aos
pronunciamentos bastante abstratos das epístolas, especialmente.
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D. Três Temas: Resumo, Comparação e Contraste


A tabela a seguir fornece um resumo rápido dos temas inter-canônicos:

VOLTA PARA CASA/EXÍLIO YAHWEH/ALIANÇA REINO

A criação é feita para: Um relacionamento de amor O Reino de Deus e a falta de


Um lugar de descanso e fiel e aliança com Deus um Rei
Shalom
O pecado é: Infidelidade que causa Idolatria que causa a
Egocentrismo que destrói o maldição e a ira de Deus escravidão
Shalom
Israel é: Chamado à fidelidade, mas é À procura de um verdadeiro
Exilado no Egito, depois na infiel Juiz / Rei
Babilônia
Jesus é: Servo sofredor, mas o novo Retornando o verdadeiro rei
Senhor rejeitado, mas Senhor da aliança que leva a que nos liberta do mundo, da
ressuscitado, que quebra o maldição do pecado carne e do diabo
poder da morte
Restauração: A ceia das Bodas do Cordeiro A nova criação
A cidade-jardim de Deus

Expor Cristo através da Submissão à Lei


Uma segunda maneira importante de expor Cristo em cada texto é adotar a abordagem de
“ouvir a lei”. Essa abordagem baseia-se na ideia de Paulo de que a lei deve, em última análise, "nos
levar a Cristo" (Gl 3:24).

Neste método, pegamos um dos muitos princípios éticos e exemplos da Bíblia - da literatura
da sabedoria ou da lei do Antigo Testamento ou mesmo de uma epístola do Novo Testamento - e
realmente o ouvimos. Esses princípios éticos são extremamente minuciosos e profundos. Se os
escutarmos com honestidade e profundidade, descobrimos que é simplesmente impossível
mantê-los! Na pregação centrada em Cristo, argumentamos que não ouvimos verdadeiramente
todo o peso da regra até reconhecermos que Deus terá que fornecer algum tipo de perdão
extraordinariamente completo para nós, e/ou encontrar uma maneira poderosa de cumprir esse
princípio ético por nós e em nós, porque somos completamente incapazes de fazê-lo por conta
própria.

Bryan Chapell defende esse argumento afirmando que, mesmo que uma passagem não
esteja descrevendo diretamente a Cristo, ela frequentemente nos aponta para ele quando
perguntamos: "O que esse texto revela sobre seres humanos que requer a obra redentora de
Cristo?"5 Todo texto ético ou ilustrativo aponta para Cristo - e não principalmente como exemplo,

5
A Seminar for Communicating the Grace of All Scripture [Um Seminário Para Comunicar a Graça em Toda a
Escritura], por Bryan Chapell. Não publicado. Veja também Chapell’s Christ-Centered Preaching: Redeeming the
Expository Sermon [Pregação Centrada em Cristo: Redimindo o Sermão Expositivo] (Ada, Mich: Baker Academic, 2005).
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mas como Salvador. Todo texto ético nos mostra nossa necessidade de algum tipo de grande
salvação, juntamente com algo da forma que deve assumir.

Por fim, portanto, Jesus é a única maneira de realmente levar a lei a sério - ele é a única
maneira de realmente recebê-la. A lei exige que sejamos perfeitamente santos, por isso não
estamos realmente ouvindo a lei se pensarmos que podemos obedecê-la! De acordo com Gálatas 3
e 4, a lei diz, com efeito: “Você nunca pode me cumprir - você precisa de um salvador!” Nós
“recebemos a lei” de maneira correta através de Jesus, de duas maneiras:

1) Somente se soubermos que somos salvos pela fé, podemos ter a força de realmente
ouvir quão extensas, perscrutadoras e profundas são as exigências da lei. Se não
crermos no Evangelho da pura graça, teremos que encontrar uma maneira de reduzir
todos os requisitos de qualquer texto da lei. Por outro lado, se sabemos que já
somos salvos pela obra consumada de Jesus, podemos enfrentar diretamente as
altas exigências da lei.
2) Somente se soubermos que somos salvos pela perfeita justiça de Cristo imputada a
nós, podemos levar a lei a sério. Somente o Evangelho admite que Deus exige
perfeição - nada menos - e isso ele recebe em Cristo.

Jesus também é a única maneira de realmente obedecê-la! Não é apenas o exemplo de


Jesus que nos ajuda, mas a salvação de Jesus que nos mostra o significado de cada mandamento e
nos dá o desejo e o poder de fazê-lo.

A crença de que Jesus transforma o meu caráter à sua semelhança quando imito seu
exemplo é muito prevalente. A questão-chave nesse modelo de mudança é: “O que Jesus faria?”
Mas esse não é o modelo encontrado no Novo Testamento. Para Paulo, a questão principal não é o
que Jesus faria, mas “O que Jesus fez - por você?”. Não o exemplo de Jesus, principalmente, mas
sua salvação nos ajuda a entender e cumprir a lei. Paulo não diz às pessoas mesquinhas: "Aja como
Cristo - ele obedeceu à lei e deu o dízimo de sua renda" - embora provavelmente o tenha feito.
Como observamos anteriormente, Paulo os exorta a se lembrarem da graça de Cristo, que se tornou
pobre por eles (2 Cor 8:9). Paulo está dizendo que, a menos que você compreenda profundamente
o que Jesus fez por você, não terá o que é preciso para dar! Você não terá a segurança de saber
que pode ser generoso porque Deus cuidará de suas necessidades ou da alegre e grata motivação
para fazê-lo. Um motivo baseado no medo - “é melhor eu dar ou Deus me pegará” - nunca produz
generosidade duradoura ou profunda.

Não precisamos encontrar um “tipo” ou mesmo um tema inter-canônico para pregar Cristo a
partir de muitos textos bíblicos sobre como devemos viver. Como toda a história humana aconteceu
apenas por causa de Jesus (Gênesis 3:15), e como somos criados à sua imagem, instituições como
casamento, trabalho, família e comunidade foram projetadas para refleti-lo. Em outras palavras, não
apenas nosso relacionamento com Jesus é um bom casamento, mas o próprio casamento foi
inventado para revelar como deve ser nosso relacionamento com Jesus. Fidelidade conjugal,
amizade, generosidade e outras virtudes refletem Jesus, sua obra e seu relacionamento conosco.

Expor Cristo através da Conclusão da História


Uma terceira maneira importante de “chegar a Cristo” em cada texto é pegar o
micro-enredo da passagem e conectá-lo ao macro-enredo da Bíblia: Deus está intervindo na história
de uma raça humana rebelde, chamando e formando uma nova humanidade através de ações que
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culminaram na morte e ressurreição de Cristo, e que levaram ao julgamento e renovação de toda a


criação.

Dois tipos básicos de histórias devem estar ligados à história de Cristo - individual e
corporativa. Muito do que se segue aqui é tradicionalmente chamado de "tipologia", mas a tipologia
clássica será examinada de maneira mais detalhada em um outro momento.

A. Histórias Individuais
Todas as histórias individuais da Bíblia nos apontam para Jesus, conforme as localizamos na
história da redenção (às vezes com a ajuda direta dos escritores do Novo Testamento, às vezes
não).

● Jesus é o verdadeiro e melhor Adão, que passou pela prova no jardim e cuja obediência nos
é imputada (1 Cor 15: 22–58).
● Jesus é o verdadeiro e melhor Abel, que, embora inocentemente morto, derramou sangue
que clama por nossa absolvição, não por nossa condenação (Hb 12:24).
● Jesus é o Abraão verdadeiro e melhor, que respondeu ao chamado de Deus para deixar o
que lhe era confortável e familiar, e sair no vazio para criar um novo povo de Deus (Gênesis
12–25).
● Jesus é o verdadeiro e melhor Isaque, que não foi simplesmente oferecido por seu pai no
monte, mas foi sacrificado por todos nós. Deus disse a Abraão que ele sabia que Abraão o
amava porque ele não negava a Deus seu filho, seu único filho a quem ele amava (Gn 22: 2,
12). Por causa de Jesus, podemos dizer a Deus: "Agora eu sei que você me ama, porque você
não reteve de mim seu Filho, seu único Filho, a quem você ama".
● Jesus é o verdadeiro e melhor Jacó, que lutou com Deus e recebeu o golpe de justiça que
merecíamos, para que, como Jacó, recebamos apenas as feridas da graça para nos acordar e
nos disciplinar (Gên 32: 22–32).
● Jesus é o verdadeiro e melhor José, que à direita do rei perdoa aqueles que o traíram e usa
seu poder para salvá-los (Gênesis 50).
● Jesus é o verdadeiro e melhor Moisés, que se coloca na brecha entre o povo e o Senhor e
que medeia uma nova aliança (Hb 3).
● Jesus é a verdadeira e melhor rocha de Moisés, que, golpeada com a vara da justiça de
Deus, agora nos dá água no deserto (Nm 20: 1–13, 1 Cor 10: 4).
● Jesus é o verdadeiro e melhor Jó, o sofredor verdadeiramente inocente, que então intercede
e salva seus amigos estúpidos (Jó 42: 7–10).
● Jesus é um melhor Sansão, cuja morte realiza tanto bem (Juízes 16: 30–31).
● Jesus é o verdadeiro e melhor Davi, cuja vitória se torna a vitória de seu povo, embora eles
nunca tenham levantado uma pedra para realizá-la (1 Sm 17).
● Jesus é a Ester verdadeira e melhor, que não apenas arriscou perder um palácio terrestre,
mas perdeu o palácio celestial, e que não somente arriscou sua vida, mas deu sua vida para
salvar seu povo (Ester 4–8).
● Jesus é o verdadeiro e melhor Jonas, que foi lançado para fora na tempestade para que
pudéssemos ser trazidos em segurança (Jonas 1).
● Jesus é o verdadeiro "Mestre", que pode nos levar ao desespero para nos ajudar a encontrar
Deus. Ele assumiu nossa falta de sentido quando "perdeu" Deus na cruz (Eclesiastes 1).
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B. Histórias Corporativas
As histórias de indivíduos não são as únicas que nos apontam para Cristo. O propósito
redentor de Deus é resgatar um povo e renovar a criação. Por esse motivo, os principais eventos da
história da formação do povo de Deus também nos apontam para Cristo.

● Jesus é aquele através do qual todas as pessoas são criadas (João 1). Assim, a própria
história da criação aponta para a nova criação em Cristo. Jesus é quem passou pela tentação
e provação no deserto. Assim, a história da queda aponta para a provação bem-sucedida e a
obediência ativa de Cristo.
● A história do êxodo aponta para o verdadeiro êxodo que Jesus conduziu para seu povo
através da sua morte (Lucas 9:31. Ele não apenas os tirou da escravidão econômica e política,
mas também da escravidão do pecado e da própria morte. Assim, a peregrinação dos
israelitas no deserto e o exílio na Babilônia apontam para a “falta de moradia” e peregrinação
de Jesus, sua tentação no deserto e seu sofrimento como bode expiatório do lado de fora
dos portões da cidade. Ele foi submetido ao último exílio, que cumpriu plenamente os
requisitos da justiça de Deus.
● Jesus é literalmente o verdadeiro Israel, a semente (Gl 3:16–17). Ele é o único fiel à aliança – o
remanescente de um. Ele cumpre todas as obrigações da aliança e recebe suas bênçãos
para todos os que crêem. Quando Oséias se refere ao êxodo de Israel do Egito, ele diz: "Do
Egito chamei meu filho" (Oséias 11:1). Oséias chama todo o Israel de "meu filho", mas Mateus
cita este versículo referindo-se a Jesus (Mt 2:15), porque Jesus é o verdadeiro Israel. Assim
como Israel estava em cativeiro no Egito, mas foi salvo pelas poderosas ações redentoras de
Deus na história, Jesus também leva o novo povo de Deus da escravidão do pecado através
das poderosas ações redentoras de Deus na história, a saber, sua morte e ressurreição.

C. Histórias de Eventos de Graça


Outra tipologia que geralmente é negligenciada é o padrão narrativo "vida através da morte"
ou "triunfo através da fraqueza", que é com tanta frequência como Deus trabalha na história e em
nossas vidas. Esses não são “fragmentos do Evangelho”, mas, sim, “padrões do Evangelho”.

● Na história de Naamã (2 Reis 5: 1–19), por exemplo, observe como todos os que têm poder e
status mundano são alheios às questões relacionadas à salvação, enquanto os servos e
subordinados demonstram sabedoria a respeito. Essa reversão é um padrão importante na
Bíblia. O padrão do Evangelho de eventos de graça formam uma história da graça. Ao
pregar sobre esse episódio, passe do evento de graça para a obra de Cristo. Da mesma
forma, considere como Ester e Rute são um "tipo" de Cristo, porque redimir as pessoas que
se ama exige que arrisquem-se a perder e ajam de maneiras sacrificiais que refletem como
Cristo trouxe a salvação para nós.
● A concessão da lei após o êxodo indica outra tipologia importante de evento de graça. Deus
não deu primeiro a lei e depois libertou o povo - primeiro ele libertou o seu povo e depois
deu a lei. Assim, não somos salvos pela lei, mas salvos para a lei. A lei é a maneira pela qual
regulamos nosso relacionamento amoroso com Deus, e não a maneira como nos tornamos
merecedores deste relacionamento. Somos salvos pela fé em Cristo.

É especialmente importante vincular até as ações narrativas de Cristo à sua própria obra.
Por que Jesus pode acolher tanto os rejeitados quanto os pecadores? É por ele ser simplesmente
uma pessoa tolerante? Não, é apenas porque ele pagaria a penalidade por eles na cruz. Se
pregamos seus exemplos de aceitação amorosa sem amarrá-los ao padrão da cruz, estamos
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simplesmente moralizando. Estamos simplesmente dizendo às pessoas para aceitarem e tolerarem


os outros.

Expondo Cristo através do Cumprimento dos Símbolos


Geralmente, se uma característica de um texto tem um significado simbólico para o escritor
das Escrituras, ao representar de alguma maneira a atividade salvadora de Deus, pode ser
considerado um tipo de Cristo, mesmo que o autor evidentemente não tenha Cristo em mente de
maneira consciente. Esta é uma área em que o abuso é bem possível. Por exemplo, a criação de
Eva do lado de Adão simboliza nossa redenção através do ferimento de Cristo em seu lado no
momento de sua execução?6 Isso é improvável. No entanto, a tipologia simbolista é bastante
importante na Bíblia, como veremos.

A. Principais Figuras Tipológicas e Símbolos


Todas as principais figuras e líderes das Escrituras nos apontam para Cristo, o líder supremo
que chama e forma um povo para Deus. Cada líder ungido - todo profeta, sacerdote, rei ou juiz que
produz salvação, libertação ou redenção de qualquer espécie ou nível - é alguém que aponta para
Cristo. Até suas falhas mostram que Deus trabalha pela graça e usa o que o mundo vê como
marginal e fraco. Os “forasteiros” que Deus usa, especialmente aqueles na linha genealógica da
semente prometida, apontam para ele (Mt 1: 1–11). Jesus é o cumprimento da história dos juízes, que
mostram que Deus pode salvar não apenas por muitos ou poucos, mas por um. Jesus é o juiz que
todos os juízes apontam ( já que ele realmente administra a justiça), o profeta que todos os profetas
apontam ( já que ele realmente nos mostra a verdade), o sacerdote que todos os sacerdotes
apontam ( já que ele realmente nos leva a Deus) e o Rei dos reis.

B. Tipologia e Símbolos Não-Pessoais da Salvação


Em sua pregação, trace os símbolos da salvação pela graça até o cumprimento em Cristo. A
serpente de bronze (Nm 21:4-9; João 3:14-15) e a água da vida da rocha ferida (Nm 20:1-13; 1Co 10:4)
apontam para Cristo, é claro, já que João e Paulo nos dizem que sim! Além disso, todo o sistema de
sacrifícios e templos está realmente apontando para ele. Absolutamente tudo sobre o sistema
cerimonial - das leis de limpeza do altar, sacrifícios e templo em si - aponta para ele. Jesus é o
sacrifício que todos os sacrifícios apontam (Hebreus 10). Jesus é o pão sobre o altar no templo
(João 6), a luz que permanece no Lugar Santo (João 8:12) e até o próprio templo (João 2:20–21),
pois ele é a presença de Deus conosco. Jesus cumpre todas as leis cerimoniais sobre alimentos e
purificação ritual (Atos 10–11). Jesus cumpre a circuncisão, pois representa como ele foi separado de
Deus e como ele nos purificou nele (Cl 2:10-11). Jesus é o cordeiro pascal (1 Cor 5:7). O sábado e o
jubileu apontam para ele. Ele é o cumprimento deles e os torna todos obsoletos.

Expondo Cristo através do Contraste


Essa quinta abordagem não é uma maneira tão distinta de pregar Cristo como outro aspecto
dos métodos de conclusão das histórias e de realização dos símbolos. Sidney Greidanus observa
prestativamente que não precisamos de um bom exemplo em nosso texto para nos ajudar a
"chegar a Cristo". Quando dizemos que Cristo é a conclusão ou o cumprimento de todo texto,
significa que ele não é apenas uma comparação, mas um contraste com todos os outros textos.

6
Um exemplo de tipologia prevalente na Idade Média. Veja Sidney Greidanus, Preaching Christ from the Old
Testament: A Contemporary Hermeneutical Method (Grand Rapids, Mich: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1999), 97.
Expondo Cristo a Partir de Cada Texto, por Timothy Keller 10

Cristo é um melhor Davi, Sansão e Moisés - então não precisamos nos desculpar pelas falhas deles.
Suas falhas nos mostram Cristo por meio de contraste.7

Considere os clamores por justiça nos Salmos. Em certo sentido, Cristo valida esses gritos -
a injustiça humana é grave! Tem que ser paga. Ela não pode simplesmente ser descartada ou
encoberta. O ponto, no entanto, é que é preciso que a cruz de Cristo revele exatamente o quão
justificáveis esses pedidos de retribuição são realmente! Mais do que isso, é preciso a expiação de
Jesus na cruz para nos levar a pensar em nós mesmos de forma diferente do que Davi ou os outros
salmistas. A morte de Cristo por nós dramatiza vividamente que todos nós merecemos condenação,
enquanto também nos mostra que o preço final pelo pecado de nossos inimigos foi pago. Portanto,
não buscamos justiça simples ou vingança e retribuição severas. Como Jesus, devemos lamentar,
simpatizar e orar por nossos inimigos. Jesus é, portanto, o melhor salmista, e os salmistas bíblicos
nos apontam para ele por suas limitações em seu estágio na história da redenção.

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Sidney Greidanus, Preaching Christ From the Old Testament: A Contemporary Hermeneutical Method (Grand
Rapids, Mich: Wm. B. Eerdmans Publishing Co.,1999).

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