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FACULDADE DE GOVERNANÇA, ENGENHARIA E EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO

– (FGE-SP)
INSTITUTO DE PESQUISA E MEMORIA PRETOS NOVOS – IPN

TAINÃ CRISTINA BANDEIRA SANTANA

A IMPORTÂNCIA DA ARTE AFRICANA PARA A PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA


AFRO-BRASILEIRA

RIO DE JANEIRO
2023

1
TAINÃ CRISTINA BANDEIRA SANTANA

A IMPORTÂNCIA DA ARTE AFRICANA PARA A PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA


AFRO-BRASILEIRA

Trabalho de Conclusão de Curso,


apresentado a Faculdade de Governança,
Engenharia Educação de São Paulo –
(FGE-SP) e ao Instituto de Pesquisa e
Memória Pretos Novos – IPN , como parte
das exigências do Curso de Pós-
graduação Lato Sensu para a obtenção
do título de Especialista História da África
e da Diáspora Atlântica.

Orientador: professor Dr. Júlio César M. da


S. Pereira
_______________________

RIO DE JANEIRO
2023

2
TAINÃ CRISTINA BANDEIRA SANTANA

A IMPORTÂNCIA DA ARTE AFRICANA PARA A PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA


AFRO-BRASILEIRA

Trabalho de Conclusão de Curso,


apresentado a Universidade Santa Úrsula
e ao Instituto de pesquisa e Memória
Pretos Novos, como parte das exigências
do Curso de Pós-graduação Lato Sensu
para a obtenção do título de Especialista
História da África e da Diáspora Atlântica.

Rio de Janeiro, 25 de abril de 2023.

BANCA EXAMINADORA

GRAU:( Pós-graduação Lato Sensu Especialista História da África e da Diáspora


Atlântica)

Dr. Júlio Cesar M. da S. Pereira


Prof. (Nome do orientador)
Afiliações

Paulo Vitor de Souza Pinto


Prof. (Nome do professor avaliador)
Afiliações

Simone Ribeiro da Conceição


Prof. (Nome do professor avaliador)
Afiliações

3
A IMPORTÂNCIA DA ARTE AFRICANA PARA A PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA
AFRO BRASILEIRA

Tainã Cristina Bandeira Santana1

RESUMO: Este artigo propõe analisar a arte africana como reconfiguração de


sistemas filosóficos e culturais na diáspora afro-brasileira, que permitiu a
preservação da sua memória. O artigo investiga as correntes visuais e
filosóficas da criatividade e imaginação que caminham conjuntamente às
especificidades artísticas que conectam as pessoas negras da diáspora e
continente. No que tange os aspectos da arte e filosofia dos diversos povos
africanos advindos de tradições ancestrais carregadas de nobreza, de valores
e de propósito, a pesquisa motivou-se a apresentar o legado africano
preservado no Brasil. O papel dos artistas e suas obras de arte compõe uma
importante preservação da memória africana em seus ascendentes no Brasil,
em contrapartida ao processo instituído pela colonização europeia de
apagamento de sua memória e cultura.

Palavras-chaves: arte africana; arte afro-brasileira; memória.

ABSTRACT: This article proposes to analyze the African art as a


reconfiguration of philosophical and cultural systems in the Afro-Brazilian
diaspora, which allowed the preservation of Afro-Brazilian memory. The article
investigates the visual and philosophical currents of creativity and imagination
that go hand in hand with the artistic specificities that connect black people from
the diaspora and the continent. With regard to aspects of the art and philosophy
of the various African peoples arising from ancestral traditions laden with
nobility, values and purpose, the research was motivated to present the African
legacy preserved in Brazil. The role of artists and their works of art make up an
important preservation of African memory in its ancestors in Brazil, in contrast
to the process instituted by European colonization of erasing its memory and
culture.

Keywords: african art; afro-brazilian art; memory.

1
IPN – Instituto Pretos Novos e FATEC PR. Pós-graduação em Ensino da História da África e da
Diáspora Atlântica

4
Introdução

Este artigo foi desenvolvido no âmbito do curso de pós-graduação


em História da África e da Diáspora Atlântica, do Instituto Pretos Novos (IPN),
e tem como objetivo geral analisar a Arte Africana como reconfiguração de
sistemas filosóficos e culturais na diáspora afro-brasileira, que permitiu a
preservação da sua memória.
Na pesquisa deste artigo adotou-se como metodologia um
levantamento bibliográfico qualitativo, com uma perspectiva exploratória, que
tem o intuito de aprimorar ideias, e de desenvolver e lançar luz em conceitos
como o de arte e estética na concepção tradicional africana, utilizou-se as
elaborações dos intelectuais africanos e afrodiaspóricos como Babatunde
Lawal, Kabengele Munanga, Abdias Nascimento e Naiara Paula Eugenio, em
confluência com a experiência da autora como pesquisadora das relações
étnico-raciais, arte negra africana, bem como na experiência de professora de
artes e artista. A pergunta principal para o desenvolvimento deste artigo é: De
que modo a arte africana pode contribuir para uma retomada da memória afro-
brasileira?
Para conhecer a arte africana é preciso que seja compreendida a
partir dos seus próprios paradigmas, seu eixo civilizatório e de suas categorias
artísticas e estéticas, na sua própria historiografia. Certamente que para
apreciá-la deve-se fazer necessário uma contextualização e ter conhecimento
sobre a cultura e povo que ela está inserida.
Por muito tempo a arte africana não foi reconhecida no Ocidente
como uma arte genuína, sofisticada e elaborada, pelo fato, do fundamentalismo
europeu ter lançado argumentos e teses sobre o Continente que o inferiorizou
e o deslegitimou. Assim, a ótica colonial classificou a humanidade e construiu
as relações no mundo a partir de uma hierarquização racial. Portanto, é
necessário destituir o eurocentrismo que tangencia a produção artística
africana ao conceito de arte primitiva, em um sentido negativo como se fosse
atrasada e não evoluída.
No âmbito da historiografia da arte, a arte africana começou a ser
estudada consideravelmente a partir do século XIX, muitos desses estudiosos
não eram historiadores de arte e sim antropólogos, baseados em um

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pensamento científico evolucionista buscavam na arte o reflexo do progresso
cultural da humanidade (WILLET, 2017), em um momento que viam a Europa
como centro da evolução social, a arte africana foi relegada a uma definição de
primitiva.
Por conseguinte, aos poucos as investigações e estudos da arte
africana de qualidade estão sendo feitos, contudo, é recente e ainda está em
curso os novos conhecimentos acerca do tema, é uma produção que até então
não chegou efetivamente nas instituições de educação artística e nos livros
didáticos (SILVA, 1997), a negação ou obliteração do estudo da arte negro
africana faz com que esta produção artística permaneça em desconhecimento
e quando abordada, devido aos preconceitos e racismo gerados desde o
período escravocrata, que impulsionaram essa realidade enfrentada até a
atualidade no Brasil, ela é tratada com superficialidade.
Nesse sentido, o artigo apresenta um estudo da natureza2 da arte
africana, alicerçado nas cosmogonias africanas, mitos de origem de diferentes
povos e seus reflexos na criação artística, com base nos estudos do crítico de
arte Babatunde Lawal, o antropólogo Frank Willett, o historiador da arte Robert
Farris Thompson, Kabengele Munanga, a doutora em estética e filosofia da arte
Naiara Paula Eugenio, os artistas Abdias Nascimento e Emanoel Araújo
também nos ajudam a compor o quadro teórico.
Discorrendo sobre as múltiplas histórias mitológicas é possível
encontrar uma essência ontológica que atravessa muitas sociedades africanas,
uma unidade cultural africana (DIOP, 1957). Nesse âmbito, atribuída a uma
essência mitológica da origem da existência humana. Sendo o ser humano uma
porção da divindade criadora, essa força vital da totalidade divina é presente
nos seres humanos, nos animais, nas plantas e em toda a natureza. Portanto,
esse entendimento ontológico africano propõe uma ética ancorada no respeito
ao todo, uma interação harmoniosa com o cosmos, posto isto, o ser humano
representado com o encargo de continuidade da criação do mundo, existe uma
semelhança na incumbência do ser humano dar continuidade na criação do
mundo, com o importante papel dado ao artista e a habilidade de manipular as
forças criativas, transformando um objeto comum em algo de maior valor

2
Natureza – compreendida aqui com o significado de essência ou conjunto de princípios da arte
africana.

6
(LAWAL, 1983), simbolicamente, através da produção da obra de arte altera-
se a desordem em ordem e o caos em equilíbrio.
Este processo criativo envolve uma jornada mental, mas também
holística, onde o ser humano percebe que os elementos da linguagem artística
estão contidos em abundância na natureza, e assim como tudo na natureza
possui uma função, a obra de arte igualmente é atribuída a um papel de
universo em miniatura, no qual, desempenha a manutenção do equilíbrio
cósmico. Isso demonstra que, a arte tem como princípio uma responsabilidade
com o todo e evidência uma preocupação com a harmonia da comunidade e o
artista desempenha a função de preservar valores espirituais e filosóficos de
sua comunidade.
No campo dos estudos da história e memória, a pesquisa trouxe
como referência o autor Jacques Le Goff e FAGE, J. D, para a historiografia da
África, bem como para o estudo e reflexão da tradição oral como fonte de
transmissão de saberes e preservação da memória usou-se como fonte o
tradicionalista malinês Amadou Hampâté Bâ. Propondo uma conexão entre
ancestralidade africana e a memória, Amos Wilson (2021), fornece uma
abordagem revolucionária para dar conta do funcionamento da mente e da
experiência africana, utilizando pontos específicos da epigenética3, em função
das experiências vividas serem registradas no DNA, uma memória contida nos
genes, torna-se um fio condutor de comportamentos, sentimentos, traumas e
histórias geracionais.
Visto que, a história da diáspora africana tem como fenômeno a
escravidão, sua população herda como um trauma histórico. As experiências
da escravidão, a imposição de um sistema-mundo euro-ocidental que provoca
um descarrilamento no modelo de vida dos negros, é imprescindível examinar
“o impacto causado pelo sequestro de 20 milhões de africanos, se faz urgente,
já que a fratura não foi apenas física, mas, sobretudo, subjetiva e existencial, e
que vulnerabiliza a população negra diaspórica” (NJERI, 2020).

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Amos Wilson utiliza em sua análise o estudo das mudanças nas funções dos genes, em que o
ambiente social e hábitos de vida podem modificar o funcionamento dos genes, não há alteração na
sequência do DNA, a herança epigenética são herdadas pelas próximas gerações, características
que irão determinar a morfologia e fisiologia e, até certa medida, comportamentos do indivíduo.

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No contexto da arte africana, as elaborações de conhecimento
acerca da oralidade, memória do corpo e ancestralidade pavimentam uma
análise da funcionalidade criativa da arte, no papel de trazer aspectos culturais,
filosóficos, espirituais para o sujeito africano manter-se conectado à sua
história, seu passado, com sua própria origem, raízes e rica herança cultural,
como maneira de alcançar um despertar de consciência, saber trabalhar com a
memória e realizar criações e reflexões.
Por fim, o presente trabalho, tem o intuito de somar na produção de
conhecimento acerca da arte africana no Brasil, avistando a arte como agente
suleador4 na retomada de memória afro brasileira, diante esse processo do
embranquecimento da história, no apagamento de memórias e dominação
cultural.
Para iniciar tal desenvolvimento, analisaremos as definições que
compõem o conceito de arte africana, considerando aspectos culturais e
filosóficos de diferentes povos africanos para conhecer as suas práticas
artísticas.

A natureza da Arte Africana

Utiliza-se neste artigo as definições de arte tomadas pelos


pesquisadores Kariamu Welsh Asante e Babatunde Lawal que dizem a
princípio sobre a habilidade do homem em transformar materiais criando novas
formas valorosas, portanto para os quais, a arte africana é a ação
transformadora do caos em ordem desejável, em ação inteligente, configurando
uma nova realidade, dotada de movimento que transborda de suas linhas e
limitações. Outra definição para a arte africana pode-se entender sua
significação como produção artística realizada por africanos e
afrodescendentes (CONDURU, 2009).
A arte na cosmogonia africana traz a possibilidade dos seres
humanos trazerem ordem e o equilíbrio ao mundo, como discute a doutora
Kariamu Asante:

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Oposição simbólica ao mote Norte ou norteador, Sulear é uma ferramenta epistemológica contra o
pensamento hegemônico eurocêntrico.

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Onde quer que materiais recebam forma, onde quer que o movimento tenha
direção, onde quer que a vida tenha, por assim dizer, linha e composição, lá
temos inteligência e então temos essa transformação de um determinado
caos em uma ordem desejada e desejável. Novamente, se você usa essa
definição, a arte existirá na África tradicional (WELSH-ASANTE, 1994, Apud
EUGENIO, p. 115).

O historiador de arte de origem nigeriana Babatunde Lawal,


contribui para essa compreensão da natureza da arte ao elucidar que:

A Arte é muito mais que sua representação material. Ela é uma


personificação de uma "inteligência" especial pela qual o homem aprimora
seu ambiente imediato, transformando materiais de lugar-comum em alguma
coisa de maior valor (LAWAL, 1983, p.41).

Nessa perspectiva, o ofício do artista perpassa a ordem e a


desordem, e essa “inteligência aprimorada” do artista, devido à sua capacidade
de manipular forças vitais geradoras de transformação podem criar uma nova
realidade. Essa transformação a partir da sua criatividade e produção, como
afirma Babatunde, significa que:

Esta nova realidade é um resumo da Ordem, Unidade, Proporção, Harmonia,


Ritmo, Beleza e outros ideais que geram um sentimento de prazer no homem.
"Uma vez que as várias artes surgem de dois grandes aspectos de ser, o
tempo e o espaço, a unidade artística, se expressa em diferentes maneiras,
dependendo do tipo da arte na qual ela é procurada (LAWAL, 1983, p.41).

O historiador nigeriano, ainda afirma que todos esses elementos


da linguagem artística são encontrados em abundância na natureza,
efetivamente, compõe o âmago da vida. Ao observar a natureza podemos
perceber a rica variedade de texturas, de linhas, de cores e de formas nas
plantas, nos animais, nas pessoas, nos rios, no céu, assim como, a
interdependência de todas as partes com o todo, Babatunde explica que
"design" na natureza é funcional, assim como numa obra de arte” (1983). Desse
modo, a arte é compreendida como manifestação da Vida e um ato de
continuação da criação do mundo, é uma atividade do espírito, carregada de
responsabilidade e comprometimento ao bem viver.
Segundo o itan iorubano, Oxalá recebeu de Olodumaré a tarefa
de modelar os corpos das pessoas, para que o Deus Supremo pudesse
preenchê-los de vida (PRANDI, 2001) a doutora Naiara Eugenio, ao aprofundar
o tema, explica o papel de Oxalá como o “Deus artista: Obatalá, que esculpiu a
obra da argila. Representa também a inspiração para a criação da obra de arte.

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Obatalá molda cada ser com suas próprias mãos e concede a ele
características próprias.” (2020), depois Olodumaré soprou seu espírito (èmi)
na obra de arte e o colocou dentro do ventre de uma mulher para que
desenvolve-se.
Em síntese, Babatunde Lawal justifica que:

O ponto importante a se notar no mito da criação iorubá é que o homem é


feito de dois componentes - o corpo físico ou material (ara) que é obra de
Obatalá, e a força espiritual (èmi) com a qual Olodumaré dá vida ao corpo.
Em outras palavras, o homem é substancialmente uma peça de escultura
animada pelo èmi. O corpo humano permanece vivo enquanto o èmi
permanece nele. A retirada ou perda do Émi resulta na morte; o corpo se
torna estático e, quando enterrado, se decompõe no barro que ele era
originariamente (LAWAL, 1983, p. 53).

Logo, esse espírito (èmi) depois da morte se alinha em um fluxo


energético para a ancestralidade, visto que, para os iorubás, a vida tem um
grande movimento circular da existência terrena para a espiritual, onde nessa
passagem de vida-pós-morte as pessoas que se tornam ancestrais, continuam
a comunicar-se com os vivos e contribuem para o bem estar da família e
comunidade que pertenceram. Por essa compreensão, de que o processo de
voltar ao útero cósmico e reconectar-se com o ancestral é uma espiritualidade
que cultiva uma “manutenção do amanhã” e ajuda a recriar caminhos por
estradas já trilhadas.

É a crença que o corpo humano é uma obra de arte divina que levou os
lorubás a considerá-lo igual a uma escultura feita pelo homem, que é então
usada para localizar o èmi, ou as almas desmaterializadas dos mortos, mais
especialmente no momento da invocação. Desta maneira, a Arte ajuda os
iorubás a concretizar sua crença na vida depois-da-morte, permitindo-os
encarar o futuro com alguma esperança - uma esperança reforçada pela
crença na reencarnação (Atúnwá) (LAWAL, 1983, p. 53).

Vejamos agora a concepção da gênese bambara do Mali, que


conta a história de Maa Ngala, o Ser Supremo, esse Ser vivia em um vazio vivo,
até que um dia, Maa Ngala decidiu que queria um interlocutor, recolhendo
pedaços dos elementos primordiais do universo colocou-os dentro de um ovo
mágico e quando esse ovo chocou Maa Ngala notou que esse elemento ainda
não era o que ele queria pois ainda lhe faltava boca e não tinha amor. Então
Maa Ngala teve a ideia de soprar algumas gotas de seu hálito ardente e dali
nasceu o primeiro ser humano que foi chamado de Maa, o interlocutor
primordial, é uma fração do seu próprio nome, uma parcela de Deus. Maa

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recebeu a missão de equilibrar, zelar e cuidar de todas as forças do universo
(HAMPATÉ BÂ, 1982).
Dentro da tradição bambara, acredita-se que Deus não completou
a obra da criação, Ele deixou uma parcela inacabada justamente para que os
seres humanos dessem continuidade a esse movimento de criação.
Para a tradição iorubá há uma semelhança também nesse
processo contínuo de criação, como afirma Naiara Paula Eugenio “quando
Olodumaré enche a obra de vida dá para ela o movimento que será intrínseco
à sua completude.” (2020), portanto a obra de arte é viva, tem movimento e
assim como tudo na natureza, tem uma funcionalidade.
A civilização e a arte do povo Bakongo reverberam esse
movimento cíclico da vida em sua cosmogênese. Segundo ela, no princípio, o
mundo era um vazio, visualizado no pensamento Kongo como um círculo
atravessado no meio por uma linha reta, uma força atinada de fogo emergiu em
autossuficiência e como numa explosão criou uma massa em fusão, reunindo
vários elementos, se tornando o berço da vida na Terra, chamada Kalunga.
Quando essa matriz se resfriou criou a água, surgindo os rios e montanhas
(SANTOS, 2019a).

O mundo, [nza], tornou-se uma realidade física pairando em kalunga (água


interminável dentro do espaço cósmico), metade emergindo para a vida
terrestre e metade submergindo à vida submarina e ao mundo espiritual.
Kalunga, que também significa oceano, é um portal e uma parede entre esses
dois mundos. Kalunga tornou-se também a ideia de imensidão [sènse-
le/wayawa] que não se pode medir; uma saída e entrada, fonte e origem da
vida, potencialidades, [n’kîngu-nzâmbi] o princípio deus-da-mudança, a força
que continuamente gera. Porque kalunga era a vida completa, tudo em
contato com a Terra partilhou essa vida e tornou-se vida depois. Tal vida
surgiu na Terra sob todas as sortes de tamanho e forma: plantas, insetos,
animais, rochas, seres humanos, etc (SANTOS, T.S.N, 2019a, p. 22).

Nesse ponto, a metafísica do povo Bakongo consiste em colocar


a força vital dos seres semelhante a dinâmica que se constitui a Kalunga, isto
é, a vitalidade dos seres surge na Kalunga emergida na vida terrestre e no final
do ciclo de vida, esse sopro vital é devolvido na Kalunga submersa no mundo
espiritual.
Portanto, a complexa visão do cosmos no pensamento Kongo
traz a Palavra como princípio de força vital, a palavra é som e poder. Desse
modo, muitos usados vários nomes ao se referir à Deus, partindo de um sentido

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pluriontológico (SANTOS, 2019), a força da criação é chamada por Nzambi
(Aquele de cuja boca se materializa tudo), por Kalunga e Ntu “o princípio da
existência de tudo, a parte essencial de tudo que existe e tudo que nos é dado
a conhecer a existência” (NJERI, 2020) bem como, para se referir ao ser
humano é chamado por muntu, indicando o ser humano como uma porção de
Ntu.
O mundo Bakongo é organizado por um cosmograma regido
pelos quatro pontos da jornada diária do Sol, quando ele nasce e se põe, de
modo que, o percurso circular da vida não tem fim e “a morte é apenas uma
transição no processo de mudança” (THOMPSON, 2011, p. 112). Na força da
Kalunga tudo na Terra está em movimento, o muntu (ser humano) é posto a
trilhar nesta força espiral.
Há uma correspondência no significado das deidades nas
culturas africanas, que é o sistema espiritual apoiado na natureza, bem como,
o Vodu do Daomé atualmente a República do Benin. O reino daomeano de
acordo com a tradição conta sobre uma antiga migração iorubá, a filha do rei
Tado, explorava uma floresta, quando “encontrou e fez amor com um espírito
de leopardo; a união resultou no nascimento do príncipe Agasu, um ancestral
lendário de todo o povo Fon do Daomé (THOMPSON, 2011, p.164). Thompson,
aponta inter-relações das deidades do panteão ioruba com os deuses do
Daomé.
As deidades são chamadas Vodun (mistérios), a elas são deferidos
poderes das forças da natureza, assim como os orixás, Oxalá é chamado em
Fon de Lisa, Exu se chama Legba, Ogun deus do ferro é Gū (THOMPSON,
2011), com semelhanças e singularidades de culto, a tradição daomeana deve
ser considerada com o contexto de suas particularidades

A deidade mais elevada do Fon, Mawu-Lisa, combina valências femininas


(Mawu) e masculinas (Lisa). Mawu é serena e gentil – ela é a Lua. Lisa é
forte, valente, feroz – ele é o Sol. Sua união representa um ideal Fon. A boa
serpente do céu, Dã ou Dan, é uma metáfora para esse sinal primário e
combinatório da ordem. Como Mawu Lisa, Dan combina aspectos masculinos
e femininos, e algumas vezes é representado como um par de gêmeos.
Muitos são seus avatares, mas o principal entre eles é Da Ayido Hwedo, uma
serpente arco-íris. Ao enroscar um corpo bicromático resplandecente na
Terra, Dã modelou sua forma igual ao globo que sustenta, cujos equilíbrio e
existência mantém. O simbolismo da cor na tradição dessa serpente arco-íris
é potente e direta: “O macho é a porção vermelha, a fêmea é a porção azul”
(THOMPSON, 2011, p.172).

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É importante trazer os mitos de origem para pensar em como
configura-se a perspectiva ontológica africana, visto que, não existe uma
dicotomia entre o real e o não real, entre o sentimento e o racional. Essa ideia
de que precisa-se separar o mito do racional faz parte de outro eixo civilizatório
advindo do pensamento filosófico grego (Marimba Ani, 1994). A origem
mitológica explica a dinâmica invisível do mundo. Então, a noção de matéria e
espírito são componentes da mesma realidade e esta realidade é permeada do
sagrado, lidar com um sem o outro é ser incompleto.
Em função disso, nas culturas africanas o conceito de humanidade
não está reservado somente às pessoas, mas como foi dito acima, a arte conflui
com a natureza, consequentemente, todos os seres e elementos são vivos,
tem inteligência e se comunicam e agem um sobre o outro. Portanto, esse ideal
constrói a noção de totalidade, e a humanidade é uma característica atribuída
aos animais, as florestas, aos rios e por esse motivo, a vida social e as práticas
religiosas também vão refletir essas dinâmicas entendendo que o búzio fala, a
árvore fala, o tambor fala, o chão (terra) fala, logo, todos comem, porque são
todos vivos (FLOR DO NASCIMENTO, 2015). A humanidade vai integrar um
corpo humano, um corpo vivo, um corpo cósmico, um corpo natureza. É um
caminho de cuidar da natureza, um princípio ético que cria um vínculo
ecológico, porque se um individuo mata ou destrói, ele está fazendo isso
consigo mesmo. Essa associação propõe construir uma convivência com si
próprio, com a comunidade, com a natureza e cultivo de uma responsabilidade
com o todo.
Na tradição artística africana há de se considerar todos estes
valores atribuídos a sua criação. Simultaneamente, essas características dadas
à arte devem ser observadas de forma não hegemônica e nem estática. Mas
uma característica baseada em eixos culturais que dialogam pelo continente
africano, como no estudo de Cheik Anta Diop (2014), a África possui uma
unidade cultural, em um território tão vasto e diversificado, Diop buscou
encontrar traços culturais comuns e abordou “a noção de estado, de realeza, a
moral, a filosofia, a religião e a arte consequentemente, a literatura e a estética”
(DIOP, 2014, p. 9).

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Uma comparação das esculturas de Nok com as de Ifé, no entanto, deixa
poucas dúvidas sobre uma conexão cultural e artística entre elas, ainda que
a natureza precisa dessa conexão continue obscura. Essas são as duas
únicas tradições artística antigas que conhecemos em toda a África que
executaram esculturas de figuras humanas em terracota em escala próxima
à natural. Os fragmentos de troncos e membros são, de fato, muito parecidos
em sua simplificação, apesar do grande naturalismo dos rostos ifé, enquanto
as bainhas dos trajes são representadas com uma convenção idêntica, [...]
esta é, certamente, uma semelhança mais cultural do que artística, embora o
estilo de representação de contas seja frequentemente parecido (WILLET,
2017, p. 85).

Como vemos acima, Willet também acredita que exista uma conexão
cultural entre as culturas africanas, segundo ele, há elementos comuns no estilo
escultórico entre as culturas Nok e as de Ifé. Essas características também podem
refletir a movimentações de povos e tradições pelo território africano, com trocas
culturais e migrações ao longo do tempo.
A elaboração de Diop (2014), permite encontrar valores culturais
compartilhados pelas sociedades africana, em relação ao espaço da mulher, não de
uma forma homogênea, mas, acerca do valor da feminilidade, a mulher como
elemento estabilizador dentro da sociedade, a matrilinearidade como organização
política, uma unidade cultural encontrada por exemplo nas obras de arte africana, as
inúmeras esculturas africanas femininas simbolizando preces por abundância,
riqueza, fertilidade e saúde para a comunidade.
No tocante ao culto à ancestralidade, o respeito e hierarquias
estabelecidas pela senioridade, são um conjunto de princípios que na arte irão
produzir suas respectivas funções naquelas sociedades representadas, por técnicas
e estilos variados, as obras são geralmente elaboradas com o recurso natural que o
ambiente oferece, porém, a função correspondente é semelhante. Vejamos que, em
culturas que utiliza as miçangas em cerâmica como joias, em outras são criações em
ouro, latão e bronze, mas todas essas joias desempenham a função de adorno e
comunicação social dentro da sociedade.
Para aprender sobre a arte africana, Willet considera que, é preciso
atenção no contexto cultural em que as obras foram criadas, uma maneira coerente
de abordar as tradições artísticas em seus próprios termos, localizando-as em suas
regiões de origem. Ademais, o perigo da categorização da arte africana desconectada
de sua história fez com que ela fosse classificada como arte primitiva, essa definição
de origem eurocêntrica deslegitimou a criatividade artística, beleza e sofisticação de

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suas tradições artísticas. A seguir discutiremos sobre a inautenticidade dessa teoria,
como também é contemplado, o significado de beleza nas estéticas africanas.

Arte, estética e ética africanas

Na insipiência da categorização da arte africana fundamentada no


conceito evolucionista darwiniano, Leonardo da Vinci teorizou uma hierarquia das
artes, onde para ele, a pintura era a forma de arte mais elevada e que, as sociedades
que possuíam apenas esculturas eram inferiores e atrasadas, no sentido de que:

Considerada primitiva como os povos que a produziram, pensava-se, de


acordo com o esquema evolucionista do século XIX, que esta arte ainda se
encontrava na fase infantil representada pela forma figurativa e que podia
evoluir até chegar um dia à fase adulta representada por uma arte intelectual
geométrica e abstrata, fase em que se encontrava a Europa “civilizada”
(MUNANGA, 2006, s/p.).

Nesse âmbito, as pesquisas sobre a arte africana foram sistematizadas a


partir de um caráter evolucionista, portanto, problematizar esse termo negativo é
também denunciar definições que contribuíram para a estruturação de um racismo
antinegro, responsável pela desumanização do negro e de sua história.
A África possui valores e ética comuns na sua essência e tradições
particulares que irão caracterizar a identidade étnica de cada povo. Por essa razão,
ressalta os perigos da generalização. Ainda que as definições para Arte Africana não
são exatas e permanente, pelo fato da arte ter um caráter dinâmico, as considerações
acerca dessa rica diversidade africana pode ser contemplada também a partir dos
ideias de beleza, a estética africana as quais foram por muito tempo, no imaginário
social ocidental, representadas pela ideia de que a arte africana não possuía ou não
se preocupava com a beleza, daí, em consideração a obra de arte e sua elaboração
estética, tem-se que:

Da mesma forma, arte tradicional africana tem seus propósitos sociais, mas
existem alguns produtos cujo propósito é claramente definido. Os fons da
República do Benim (ex-Daomé), por exemplo, fazem esculturas em latão de
animais e de pessoas trabalhando ou em cortejos que não possuem qualquer
intuito religioso ou didático. São produzidas pelo latoeiro para serem objetos
belos e, nesse sentido, devem ser consideradas exemplos de ‘arte pela arte’.
Contudo, têm uma função social que independe totalmente do tema
representado: a de conferir prestígio, já que o latão é considerado um metal
semiprecioso e apenas os ricos têm condições de comprar tais peças, que
são exibidas na residência como objetos de beleza e símbolos de status.
Himmelheber descobriu “que os dans produzem objets d’art por mero prazer
estético, mas apenas em latão (WILLET, 2017, p. 176, 177).

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Por mais que, uma pequena quantidade de obra de arte do continente
africano fosse produzida apenas para ser apreciada por sua beleza e produzir prazer
estético, esse ideal de beleza, vai precisar ser deslocado da lógica ocidental
hedonista, muitas vezes atribuída a uma beleza egocêntrica esvaziada de significado
e atribuída fortemente a um padrão estético. Para se pensar o que significa a busca
da beleza ou produzir objetos belos, para o povo iorubá, por exemplo, está associado
a um comportamento, a uma estética-ética (EUGENIO, 2020).

Onde todo comportamento pessoal precisa necessariamente contribuir para


uma harmonia social, visando o bem viver de toda a comunidade. Beleza ou
a busca pelo belo está relacionada com ética, porque o Yorubá não separa a
performance para adquirir um corpo belo, ou elaborar um objeto belo, da que
o transformará numa pessoa honrada, caráter e beleza estão no mesmo ciclo
de características convenientes à formação do indivíduo (EUGENIO, 2020, p.
115).

Por esses aspectos, vê-se uma arte que possui critérios profundos para se
achar o belo. Em que, a estética do belo exige uma reflexão de sentimentos, de
sensações e de bom caráter, isto significa, que a beleza interior juntamente com a
serenidade do caráter forja a beleza no externo.
Na obra de arte iorubá também se busca a beleza com o bom caráter.
No momento em que uma escultura está sendo feita, serão analisados a forma do
rosto, o olhar e as expressões da peça, observa-se se a aparência demonstra
serenidade, se a posição do corpo, suas proporções demonstram ações benéficas
para a sua comunidade (EUGENIO, 2020). Visto que, o bem viver no contexto africano
perpassa por valores como o respeito aos mais velhos, culto aos ancestrais, a
coletividade, a figura feminina simboliza a fertilidade e a natureza provê a
prosperidade, então todos esses elementos, serão buscados pelo artista para serem
representados na sua composição, na intenção de agregar beleza à obra.
“Na perseguição destes ideais, a Pintura, Escultura, Música, Dança
estão rotuladas com grande habilidade, tanto como para comunicar um forte elemento
de Arte pela Arte, embora dentro de um contexto maior de Arte pela Vida.”
(BABATUNDE, 1983). Além da qualidade técnica também fazer parte das
considerações, Munanga (2000) expõe algumas caracterizações mínimas que podem
ser colocadas para esta vertente artística se qualificar com uma estética afro:

Podemos mencionar a forma ou o estilo; as cores e seu simbolismo; a


temática; a iconografia e as fontes de inspiração, todos harmoniosamente

16
articulados através do domínio de uma técnica capaz de dar corpo e
existência a uma obra de arte autêntica. Outros elementos, como a
monumentalidade, a repetição, a desproporção entre as partes do corpo e a
conceituação das ideias vem se somar para aprofundar a diferença entre a
arte africana no singular, à arte ocidental e outras (MUNANGA, 2000, p. 87).

Novamente, é preciso mencionar que o espirito africano é holístico e parte


da compreensão integral dos fenômenos da vida e do cotidiano, conforme Willet
descreve o processo criativo da escultura que:

Embora a escultura na África seja geralmente pintada, a tinta costuma ser


aplicada sem qualquer referência à forma escultórica. No caso das máscaras
feitas pelos calabares do delta do Níger, Horton descobriu que isso ocorre
porque a pintura não é apenas um enriquecimento da escultura, mas o meio
pelo qual o espírito é trazido para ocupar a máscara (WILLET, 2017, p. 172).

Então essa atividade artística é intrinsecamente um exercício de


comunicação com a emoção, o espiritual e o físico, de fato, a crença religiosa é um
ponto relevante para a produção artística e cultural negra-africana, assim como para
outras etnias, os cultos místicos são temas e fonte de inspiração dos artistas, pois:

Mesmo assim, é verdade que grande parte da arte africana tem propósito
religioso, ainda que exista uma boa variedade de práticas no campo da
escultura religiosa. É costume que o ato de entalhe seja rodeado de rituais,
uma vez que a árvore que fornece a madeira geralmente é vista como o lar
de um espírito que precisa ser aplacado (WILLET, 2017, p. 179).

Nesse sentido, ao considerar que a construção filosófica e cultural das


sociedades africanas são as bases que retroalimentam a expressão artística, ao
mesmo que, o labor estético da arte cultiva princípios éticos, de comportamentos, de
ideais de beleza, de caráter e espirituais que configuram o princípio ontológico
africano.
A obra de arte é viva, possui movimento que leva a conexão com o
coração, com a comunidade, com o ancestral. O valor está na afirmação da força vital
que há nessa circularidade, visto que a vida está interligada a tudo.

Para apreciar a escultura tal como foi concebida pelo artista, precisamos vê-
la em movimento, se possível na altura dos olhos e iluminada pelo fogo
intermitente das tochas. Além disso, isolar a máscara significa retirá-la de seu
contexto significativo, pois a máscara em si é vista apenas como parte de um
complexo – parte de um traje com o qual se dança ao som da música –, e é
apenas quando todos esses elementos estão presentes que a máscara
ganha vida, tornando-se habitada pelo espírito (WILLET, 2017, p. 184).

Nesse entendimento, a arte africana como as máscaras, as esculturas e


outras peças possuem um conjunto de elementos para lhe dar vida e funcionalidade,

17
outro caso é os desenhos Bakongo, também chamados de pontos riscados podem
ser apreciados pela beleza visual que carregam, mas para cumprir sua função eles
precisam ser desenhados “cantando o ponto” para que a potência da voz cantada e o
traçado do desenho pudessem ser a abertura do portal de contato com o mundo
espiritual (THOMPSON, 2011). Assim para Willet, retirar as obras de arte africana de
seu contexto ou desconhecer as circunstâncias em que ela foi criada impossibilita uma
apreciação máxima das mesmas.
No capítulo posterior, discorreremos sobre a incumbência da memória dos
antepassados escravizados, para manter e preservar os saberes, a arte e a
espiritualidade na diáspora, portanto, a memória é compreendida aqui como um eixo
de resistência dos valores afro civilizatórios e da visualidade estética da arte africana.

Arte: O Fio da Memória

Sabe-se que na travessia transatlântica, os povos africanos


sequestrados, embarcaram nos tumbeiros, cruzaram o oceano e aportaram em terras
brasileiras, de muitas maneiras o sistema escravocrata operacionalizou a
desumanização dos povos africanos, apagamento das suas memórias e história, cujo
legado do cativeiro, ainda hoje, desfragmentam a identidade dos seus filhos
diaspóricos.
Todavia, esse sistema colonial de dominação não conseguiu por
completo, apagar no corpo africano suas constituições simbólicas de ser, de sua
cultura, suas histórias e as espiritualidades, de forma que, a memória do corpo resistiu
em meio a nova realidade inserida. Os povos que vieram, não vieram sós, com eles,
vieram suas linhagens ancestrais, seus modos de vida, suas divindades e um
profundo sentimento espiritual que foi capaz de preservar uma visualidade estética da
arte africana.
No campo dos estudos da epigenética, o psicólogo Dr. Amos Wilson
argumenta que a história dos povos africanos está nos genes, na qual, as experiências
vividas no passado e aquelas vividas por ancestrais são transmitidas de uma geração
para a outra, de tal modo que, mecanismos epigenéticos estão relacionados, até certa
medida, no comportamento dos indivíduos. É importante mencionar que, Amos Wilson
utiliza a teoria da epigenética e analisa outras demais teorias para formular a sua
própria teoria da complementaridade racial, no entanto, não cabe no escopo deste
18
trabalho discorrer com maior profundidade, por isso a análise incumbe alguns
aspectos do pensamento de Wilson que trata a “amnésia social” e contribuições da
percepção da autora.
Nessa perspectiva, o ambiente e o comportamento social têm a
capacidade de determinar modificações do genoma que são herdadas por gerações.
É relevante destacar estes apontamentos para compreender a experiência africana
no Brasil5 e os impactos causados pelo cativeiro, desumanização, colonização física
e cognitiva, evidenciando um trauma histórico na sua população, como explica Wilson
na acepção seguinte:

Simplesmente porque escolhemos esquecer um evento traumático,


simplesmente porque escolhemos não aprender uma história traumática e
uma história que pode nos fazer sentir vergonha, não significa que essa
história não esteja controlando nosso comportamento. Simplesmente porque
não conhecemos nossa história, e talvez não a tenhamos ouvido, não
significa que a história não controla nosso comportamento. Uma das coisas
mais profundas que aprendemos em psicologia é que as forças mais
poderosas que moldam o comportamento humano são aqueles fatores que
conscientemente não são lembrados pelos seres (WILSON, 2021, p. 3).

Tais relações conectam-se com as questões de ancestralidades e


memórias, que no contexto da História Africana essas memórias são armazenadas
nos genes da linhagem familiar, a memória individual conecta-se com a memória
coletiva da família, dos povos e das nações. Na aspiração de oferecer a comunidade
afro-brasileira reflexões que recupere a sua memória coletiva enquanto povo da
diáspora africana, pois que,

Nós somos história. Não podemos viver no futuro – o futuro está sempre à
nossa frente. E o presente é essencialmente a vanguarda do passado. Você
não deixa seu passado para trás. O passado vive em seu cérebro; no seu
comportamento; a maneira como você vê a vida e a maneira como se vê.
Tudo o que acontece com você no presente é filtrado pelas experiências
passadas presentes em sua mente. Isso significa que o passado está
presente operacionalmente a todo momento (WILSON, 2021, p. 282).

O Brasil, pelo contexto escravista, essa concepção indica que, é preciso


necessariamente, não esquecer a violência, sequestro e exploração do povo negro,
não de maneira a cultivar um foco na dor e sofrimento, mas evocar a memória afro-
brasileira a honrar os antepassados, transmitindo às novas gerações, o passado de
resistência, amor, lutas fundamentais travadas pelos africanos escravizados e suas

5
A experiência africana é imensa e possui uma grande pluralidade, neste estudo analisaremos
somente no que tange a população afro-brasileira.

19
contribuições na construção desse país. Contudo, a profusão de imagens criadas
nesse período e posteriormente explorada pela indústria cultural tem procurado
infiltrar um equivocado imaginário socialmente construído, que a memória afro-
brasileira se resumiria aos elementos da escravização.
Refletir sobre a ambiguidade desta história de que a vida negro-africana
está inserida numa dinâmica excludente e opressora, ao mesmo que, o seu passado
glorioso, seus conhecimentos, seu processo histórico que tem em África o início da
humanidade como ponto de partida, são histórias sistematicamente invisibilizados,
que precisam ser conhecidas para que a população no lugar de vergonha sinta orgulho
de sua história e identidade. Por esse motivo, Amos Wilson elucida sobre a
importância de acessar a história africana a partir da África e não da escravidão, como
maneira de alcançar um despertar de consciência africana.
Considerando a memória do corpo como uma experiência histórica, pode-
se abordar a permanência de modos de vida africanos na diáspora através da
memória e da tradição oral como fonte de transmissão de saberes ancestrais.
Em síntese, e segundo o tradicionalista malinês Hampaté Bá,

Quando falamos de tradição em relação à história africana, referimo-nos à


tradição oral, e nenhuma tentativa de penetrar a história e o espírito dos povos
africanos terá validade a menos que se apoie nessa herança de
conhecimentos de toda espécie, pacientemente transmitidos de boca a
ouvido, de mestre a discípulo, ao longo dos séculos (BÂ, 1982, p. 167).

O valor que a oralidade evoca nas culturas africanas é um modo de


produzir conhecimentos, são estratégias epistemológicas de manutenção de tradições
e saberes, sendo assim, as tradições são mantidas pela palavra e a memória, de
forma dinâmica e não estática pelo que se compreende que a tradição não é aquilo
que não muda, ela se modifica e se transforma, mas se mantem em torno daquilo que
é fundamental.
Desse modo, tais eixos preservaram para o povo africano na diáspora,
uma relação viva com a própria origem, identidade e a cultura. Ao mesmo tempo em
que, o processo de colonização forjava um apagamento histórico e simbólico,
desde o ritual em Ouidah, na costa do Benin no qual, antes do embarque para a
travessia do Atlântico, os africanos escravizados homens davam nove voltas e as
mulheres sete voltas em torno de um antigo baobá, a “árvore do esquecimento”. O
ritual que tinha a finalidade de apagar seus laços afetivos e sua memória. Como
também o forçado batismo católico, em que os africanos eram submetidos antes
20
mesmo da travessia, no ato, seus nomes eram substituídos por nomes portugueses,
suas espiritualidades demonizadas, foram obrigados a se converterem ao
cristianismo, tamanha violência cometida contra o povo africano a fim de executar uma
colonização física e cognitiva.
Na intenção de deslegitimar o povo africano foi produzido um processo
de desmemória de forma intencional, como afirma Abdias Nascimento sobre o
apagamento da memória do africano no Brasil:

No sentido de apagar da lembrança do afro-brasileiro a horripilante etapa


histórica brasileira do escravagismo [...] Ao desaparecimento do seu passado,
o negro brasileiro assistiria também à obnubilação de sua identidade original,
de sua religião de berço e de sua cultura, o que resultaria na erradicação da
personalidade africana e do orgulho que lhe é inerente (NASCIMENTO, 2019,
p. 110).

Portanto, a desfragmentação da memória ou a amnésia pode prejudicar


a identidade coletiva, conforme cita Amos Wilson, “a amnésia social é a repressão da
lembrança da sociedade” (WILSON, 2022, p. 3). Essa é uma questão importante para
se pensar nas lutas dos povos africanos e para a compreensão do funcionamento da
sociedade e cultura que estão inseridos. Consequentemente, a colonização europeia
no que concerne dominar ou manipular essa memória coletiva como mecanismo de
dominação, a ação predatória desse processo, provocou violência, invisibilidade e
silenciamento da história, cultura e arte negra africana.
Outro fato importante que o Dr. Amos Wilson propõe é o esforço que a
população negra precisa fazer para progressivamente se despir da lógica e
subjetividade ocidental, pontuando a necessidade de localização afrocêntrica, ou seja,
uma localização onde o africano esteja no centro do fenômeno há ser analisado com
auto definição de humanidade, espiritualidade, poder, educação, economia e arte.
Para a análise desse recorte sobre a arte africana como manutenção
da memória afro brasileira, a presente pesquisa, buscou estudar a estética da arte
africana como reconfiguração de sistemas filosóficos, culturais na diáspora afro
brasileira. Como afirma o historiador de arte Mário Barata, no Brasil “se conservaram,
de maneira evidente, as técnicas e concepções plásticas africanas” (BARATA, 2019,
Apud NASCIMENTO, p.166). E que:

Ao longo desse processo de reterritorialização do africano no Brasil, suas


representações foram recriadas e transformadas, numa complexidade de
definições de questões, como sua condição social, sua cosmopercepção e
suas crenças no novo ambiente (SANTANA, T.C.B, 2016, p. 33).

21
Diante desta conexão transatlântica entre África e Brasil, Abdias
Nascimento expõem;

A complexidade e profunda riqueza da cultura africana. Estaria esgotada a


vigência dos valores daquela cultura? Porventura seus estilos artísticos
perderam a vitalidade na curva do tempo? Uma verificação imediata responde
que não. Ocorre justamente o contrário: tanto a significação estética, os
estilos formais, substância transcendente e atributos outros implicados no
acontecer cultural negro-africano, continuam tão válidos hoje como ontem
(NASCIMENTO, 2019, p. 164).

Nessas condições, africanos e descendentes de africanos escravizados


no Novo Mundo, recriaram a arte, de maneira que, se mantivesse a sua funcionalidade
fundamental e a sua continuidade para que, pudessem resistir à ação predatória do
colonizador europeu.

Para que os elementos culturais ou artísticos possam ser retidos na memória


de um indivíduo cortado de suas raízes é preciso que eles pertençam
ao núcleo de sua existência, pois é este último que sobrevive à ruptura. É ele
que alimenta a cristalização de elementos na memória individual e se torna
mais eficaz quando combinado com o conjunto de fatores sociais cujo efeito
é também de suma importância na preservação e especialmente na
continuidade de elementos culturais na nova sociedade (MUNANGA, 2019,
p. 7).

Sofisticados objetos de obra de arte, profusamente esculpidos,


destinados a cultuar a espiritualidade foram preservados nos terreiros de candomblé
no Brasil, (MUNANGA 2019) cita uma análise feita pelo crítico de arte Marianno
Carneiro da Cunha, sobre algumas peças afro-brasileiras utilizadas nos cultos de
candomblé,

As peças de Oxê Xangó executadas no Brasil foram esculpidas a partir de


uma seção cilíndrica de monobloco de madeira; organizadas formalmente,
como na África, a partir de um eixo, as esculturas se mantêm o mais possível
dentro das convenções plásticas nagô-yorubá; (MUNANGA, 2019, p. 12).

Sendo importante mencionar novamente que, o próprio corpo performa


como obra de arte (EUGENIO, 2020), canta, dança em louvação aos seus deuses,
esses corpos apresentam-se artisticamente e filosoficamente ancorados no
paradigma africano circular, são performances organizadas, por exemplo, nas rodas
de samba, de jongo, da capoeira, no xirê no candomblé, na umbanda e também na
roda de contação de histórias (NOGUEIRA, 2014), quando o Dr. Amos Wilson expõe
que a memória está nos genes, logo, com um olhar cuidadoso pode-se examinar os

22
princípios fundamentais que reverberam na diáspora brasileira através da memória e
oralidade.

A roda [...] é uma atividade em que a dimensão intelectual e o aspecto


artístico ficam indissociados: reflexão, criatividade, inflexão, racionalidade,
imaginação e juízo ocupam o mesmo plano (NOGUEIRA, 2014, p. 51).

Desse modo, a história contida no corpo e na imaginação negra


conduziu as produções artísticas visuais no Brasil, um verdadeiro tesouro obliterado
da historiografia oficial das artes no país, “criada em meio ao anonimato, produção
essa que foi marcada por seu cunho coletivo, assim impossibilitou a identificação de
seus autores” (SANTANA, 2016, p. 33).
Desde o período colonial, a Coroa Portuguesa proibia que negros
exercessem a profissão da ourivesaria, da música e produções de esculturas de culto
africano, com as constantes repressões da polícia, os candomblés eram invadidos e
bancas de trabalho com ouro e prata eram quebradas (ARAÚJO, 1988). Entretanto,
apesar de tantas proibições que impedia o desenvolvimento da arte negra, as
mesmas, atravessaram por vias marginais da historiografia, através de raros
pesquisadores do passado como Raimundo Nina Rodrigues (apesar de adotar uma
perspectiva racista) foi um dos pioneiros no estudo da arte negra no Brasil, Clarival do
Prado Valladares, o baiano Manoel Querino, Marianno Carneiro da Cunha, entre
outros (ARAÚJO, 1988), que permitiu o reaparecimento das marcas deixadas por
grandiosos artistas e artesões negros.
A partir das décadas de 30 e 40, a arte afro-brasileira, resguardada nos
terreiros de espiritualidades de matriz africana, começa a sair do anonimato
(MUNANGA, 2019). “Os artistas começam a trabalhar dentro do conceito das
chamadas artes "popular" e "primitiva", encorajados pelo movimento modernista e
pela busca do nacionalismo” (MUNANGA, 2019, p. 14), com destaque para Heitor dos
Prazeres, Rubem Valentim, Emanoel Araújo e Abdias do Nascimento.
Então, a partir dessa época, saindo do anonimato, artistas negros
começam a produzir uma arte com projeção na linguagem plástica universal
(MUNANGA, 2019), embora conservando suas heranças afetivas e seu passado
ancestral para desenvolver sua produção artística nutrindo os vínculos com suas
raízes. Abdias do Nascimento oferta uma valorosa contribuição ao legado artístico
africano da diáspora, com a criação do Museu de Arte Negra em 1950, confrontando
a alienante estética da brancura como ele mesmo cita, ao promover espaço para

23
muitos artistas, é significativo sua citação ao trabalho de José Heitor, artista auto
didata, Nascimento o chama de criador mágico

Cada peça que esculpe tem o compromisso de ato litúrgico e de função


comunitária. E geralmente realizadas em proporções monumentais, sobre um
caminhão, o carnaval, suas esculturas passeiam processionalmente pelas
ruas da cidadezinha, como parte integrante das escolas de samba. E no
desfile, ao suor do artista, se somam à peça o pó, a luz, o calor, o cheiro e a
alegria de seu grupo. “Os sonhos” de José Heitor se apoiam em rigoroso
sentido de volume e mantêm o ritmo cruzado – polimetria e polirritmia – de
que nos falam os estudiosos da arte africana (NASCIMENTO, 2019, p. 165).

Nessa perspectiva, desde um passado secular até a


contemporaneidade, muitos nomes de homens e mulheres se estabeleceram como
contribuição histórica e artística nesse país, honrosamente menciona-se o autodidata
Agnaldo Manoel dos Santos, Bispo do Rosário, Mestre Didi, Abdias Nascimento,
Rubem Valentim, Madalena dos Santos Reinbolt, contemporâneos como Rosana
Paulino, Josafá Neves, Jorge dos Anjos, Maria Auxiliadora da Silva, Antônio Obá, em
meio a tantos outros nomes, com excelência e dedicação, o artista Emanoel Araújo,
nos presenteia com uma vasta pesquisa reunindo vários pesquisadores em diversos
âmbitos da criação artística, ao publicar a coletânea A mão Afro-brasileira (1988).
Essa conjugação de arte, memória e história propõe fomentar um
diálogo acerca do peso da discriminação racial e aniquilação cultural em que os afro-
brasileiros estão inseridos, e como a arte é um eixo de resistência de continuidades
de suas raízes, tornando possível a preservação, adaptação e reinvenção entre África
e o Brasil.

Considerações Finais

Este artigo buscou contribuir para os estudos de arte africana, como a


produção criativa das artes plásticas negro-africana contribuiu para reconfiguração de
sistemas filosóficos e culturais na diáspora afro-brasileira, de forma que, permitiu a
preservação da sua memória.
Vimos que na perspectiva africana, a arte é compreendida como uma
prática pela qual um povo se cria, se desenvolve, se conecta ao ancestral, manifesta
seu culto espiritual e se celebra. Na prática artística, o artista faz um movimento
semelhante ao de Deus e a criação do mundo, o artista é abalizado pela sua alta
habilidade de imaginação e criatividade que permite a ele chegar na essência da
natureza afim de criar uma nova realidade.
24
Também observamos que a visualidade estética da arte africana,
perpassa uma observação de sensações, de sentimentos e de bom caráter, isso diz
respeito, a uma beleza forjada a partir do interior com um bom caráter agrega na
composição de beleza no externo. A percepção de estética no paradigma africano
propõe uma beleza reflexiva e filosófica com a capacidade de apreciar o que criamos
e movimenta o imaginário coletivo do povo negro para apreciar a beleza através do
seu corpo estético.
Observamos que a arte como um fio da memória, permitiu a
preservação de uma visualidade estética africana no Brasil. Pela memória, as técnicas
e concepções plásticas se mantiveram e essas tradições artísticas atuaram na
permanência da presença africana entre os afro-brasileiros. As realizações dos
artistas negros que se voltam para suas heranças afetivas do passado ancestral
propulsionam a retomada da memória coletiva através de suas obras, entendendo que
a arte é um ponto agenciador de despertar de consciência e valorização cultural.
Logo, ao ampliar o conhecimento sobre África por meio de sua
produção artística, possibilita-se um caminho de imersão para os afro-brasileiros, um
mergulhar no território africano e na sua rica diversidade de povos, de cultura, de
riquezas e natureza. É percorrer pela sua imensidão cultural e refazer o caminho de
volta, parafraseando o provérbio ganense do sankofa que diz, “nunca é tarde para
voltar e apanhar o que ficou para trás”.
Portanto, a arte é um meio de fortalecimento da memória afro
brasileira, não somente para recuperar um passado de um povo, mas também, refletir
a acerca da realidade presente e o futuro que se almeja, é inclusive sobre propósito.
Ao desenvolver um labor estético pela arte manifesta-se um sentimento de autonomia
da própria história, auto compreensão e auto realização. Babatunde Lawal afirma
sobre o importante papel que a arte desempenha na criatividade humana,
promovendo princípios de ordem, unidade e harmonia. Visto que, o universo artístico
africano tem na essência de sua funcionalidade o diálogo com o coração e espírito,
preparando esse individuo para viver em harmonia com sua comunidade.
A vista disso, com aspirações pan-africana, Abdias Nascimento
invoca a importância dada a arte, a imaginação e criatividade para se desenvolver um
interesse na comunidade negra em geral, não somente aos estudiosos da arte, mas
no âmbito geral, para cultivar um espírito de criatividade “encorajando essa
comunidade nos campos do empenho, seja ele social, político, científico, tecnológico

25
ou espiritual” (LAWAL, 1983, p. 57) a fim de que, os aspectos culturais preservados
na arte possa possibilitar caminhos de libertação intelectual e restauração enquanto
povo africano, no continente e na diáspora.
Com um caráter dinâmico e holístico o fazer artístico ancorado nos
paradigmas africano provoca reflexões ontológica sobre a maneira de estabelecer o
próprio modelo de humanidade, do que é belo e desejável, de uma afroperspectivação
(NOGUEIRA, 2014).
A respeito dessas questões levantadas, o pensamento de Dr. Amos
Wilson (2022) endossa a elaboração ao explicar que a representação simbólica do
que almejamos solucionar, procede também do poder do impacto semiótico no
imaginário social do povo, e o dialogo com o coração e alma reimprimi modelos de
humanidade e realidade que pode ser vivida.
Em conclusão, o presente estudo valoriza os múltiplos lugares que a arte,
o artista e a obra de arte ocupam nas sociedades africanas em Casa e na diáspora.
A arte enriquecesse as suas experiências, contribui com o fortalecimento de uma
memória coletiva africana brasileira, que sofre tentativas de apagamento e
esquecimento de suas origens, a arte torna-se instrumento de auto conhecimento,
consciência histórica, reconquista de valores civilizatórios, filosóficos e estéticos
africanos.
Uma vez que a arte negro africana evoca a memória afro-brasileira a
honrar os antepassados, abarca uma perspectiva cultural crítica que valoriza a sua
própria história e humanidade, como também inspira a realização de ações
transformadoras no presente rumo ao futuro.

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