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Entre homens e ratos

Paulo Ricardo da Silva Ramos*

Dyonélio Machado (1895-1985) foi um escritor, psiquiatra, jornalista e


político gaúcho. Formou-se em Medicina em 1929 em Porto Alegre, e se
especializou em Psiquiatria no Rio de Janeiro. Foi preso duas vezes em 1935,
devido sua orientação política, tendo ficado preso por dois anos. Seus principais
livros são Um Pobre Homem (1927), Os Ratos (1935), aclamado como sua obra-
prima, e O Louco do Cati (1942).
Na literatura brasileira da década de 30, uma característica bastante notável
é o regionalismo, pois tem como protagonista em muitos livros a figura do brasileiro
sofrido, em meio a temas sociais, como a diferença de classes, injustiças, miséria,
entre outros temas. Essa fase é considerada um divisor de águas na literatura do
Brasil, pois apresentava muitas denúncias sociais. As obras nesse período tinham
uma linguagem mais popular, que aproximavam os fatos narrados da realidade.
O livro Os Ratos surgiu de um pedido de Erico Verissimo (1905-1975) para
participar de um concurso literário. A obra narra um dia na vida de Naziazeno
Barbosa, um funcionário público que precisa de 53 mil réis, para pagar sua dívida
com o leiteiro, e caso não consiga terá o seu fornecimento de leite cortado.
Após receber o ultimato do leiteiro, através da conversa que Naziazeno tem
com sua esposa, percebemos as dificuldades que eles estão enfrentando. No
caminho para o trabalho, ele tem medo de encontrar algum conhecido que tenha
presenciado, ou que já saiba do ocorrido. Com as frases: “Não paga ninguém” e
“Lhe dou mais um dia!” que não saem da sua cabeça, temos uma noção da
vergonha, e do desespero que o personagem está sentindo.
Naziazeno tem ideia de pedir o dinheiro emprestado para o diretor, pois ele
já lhe ajudou em outra oportunidade, quando o seu filho estava doente. Enquanto
espera o diretor retornar, já se imagina retornando para casa com o dinheiro, e
pensa em como ocultar da sua esposa o modo como o conseguiu, e com isso me
deu a impressão de que para ele era mais importante conseguir o dinheiro, e
continuar com a imagem do marido que corre atrás e resolve os problemas da
família, do que conseguir o dinheiro para não ter o fornecimento de leite cortado.
Assim que encontra o diretor, e ouve um não, as esperanças de Naziazeno em
conseguir o dinheiro que já eram poucas, ficam ainda menores, e com as frases do

*Aluno de graduação no curso de Administração na Universidade de Caxias do Sul (UCS).


Resenha produzida para a disciplina Leitura e Escrita na Formação Universitária. Dezembro de 2015.
diretor que não saem do seu pensamento, passa por sua cabeça desistir, mas sabe
que não tem outras opções, deve pagar a dívida com o leiteiro.
Naziazeno abandona o trabalho, e parte então em busca da ajuda de seus
amigos. Após a tentativa fracassada de cobrar um divida do Alcides, acaba
conseguindo um dinheiro emprestado com um conhecido para almoçar, porém
decide tentar a sorte, em uma roleta. Já na primeira tentativa, o milagre de que tanto
precisava acontece, consegue mais do que o triplo do valor que ele precisa para
pagar a dívida, porém vai perdendo as fichas aos poucos, e sai de lá sem dinheiro
nenhum. Confesso que nessa parte da história perdi um pouco da pena que eu tinha
de Naziazeno, pois ele conseguiu o que precisava, mas deixou escapar por entre
seus dedos, e isso me pareceu explicar porque algumas vezes ele passa por essas
dificuldades. Naziazeno encontra seus amigos novamente, e está muito cansado e
com fome, e só vai acompanhando eles, praticamente entregando o seu problema
nas mãos deles, e após outras tentativas sem sucesso, surge a ideia de penhorar
um anel.
Naziazeno chega em casa, com o sapato da esposa, manteiga, um presente
para o filho, e o dinheiro para pagar o leiteiro, conversa com a esposa, e vai se
deitar. Porém ele não consegue dormir, fica pensando se escolheu a melhor forma
de entregar o dinheiro, recordando os fatos que ocorreram durante o dia, e ouvindo
todos os barulhos que vão surgindo ao longo da madrugada, inclusive o som dos
ratos, que aumentam o tormento na sua cabeça. A noite é retratada de forma muito
sufocante, pois parece não ter fim, e assim que o leiteiro chega acaba com a nossa
angústia, mas assim que Naziazeno acordar, ele continuara fugindo da ratoeira, pois
conseguiu resolver o seu problema imediato, mas a sua dívida que era de 53 mil,
aumentou para 65 mil réis.
A história central de Os Ratos por si só já é uma boa leitura, mas da maneira
que vamos conhecendo os seus dramas de Naziazeno, e sendo inseridos por
Dyonélio na cabeça do personagem, conhecendo os seus pensamentos, e seus
sentimentos, de uma forma tão minuciosa e tão próxima, fazem a recomendação do
livro ser quase obrigatória.

*Aluno de graduação no curso de Administração na Universidade de Caxias do Sul (UCS).


Resenha produzida para a disciplina Leitura e Escrita na Formação Universitária. Dezembro de 2015.

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