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EDITORES

Daniel Volquind
Pedro Thadeu Galvão Vianna
Marcos Antonio Costa de Albuquerque
José Mariano Soares de Moraes
Oscar César Pires

Volume II

SBA
Sociedade Brasileira de Anestesiologia
Rio de Janeiro
2012
Educação Continuada em Anestesiologia
Copyright© 2012, Sociedade Brasileira de Anestesiologia

Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer sistema, sem prévio consentimento da SBA.

Diretoria
José Mariano Soares de Moraes
Airton Bagatini
Ricardo Almeida de Azevedo
Sylvio Valença de Lemos Neto
Oscar César Pires
Antônio Fernando Carneiro
Fábio Maurício Topolski
Comissão de Educação Continuada
Daniel Volquind
Pedro Thadeu Galvão Vianna
Marcos Antonio Costa de Albuquerque
Capa e diagramação
Marcelo de Azevedo Marinho
Supervisão
Maria de Las Mercedes Gregoria Martin de Azevedo
Revisão Bibliográfica
Teresa Maria Maia Libório
Colaboradores
Maria de Las Mercedes Gregoria Martin de Azevedo
Teresa Maria Maia Libório
Rodrigo Ribeiro Matos
José Bredariol Junior
Simone Soares Nascimento da Gama

Ficha catalográfica
S678e Educação Continuada em Anestesiologia
Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Anestesiologia/SBA, 2012.
200 p.; 25cm.; ilust.

ISBN 978-85-98632-14-8
Vários colaboradores.

1. Anestesiologia – Estudo e ensino. I. Sociedade Brasileira de Anestesiologia. II. Moraes, José


Mariano Soares de. III. Pires, Oscar César. IV. Volquind, Daniel. V. Vianna, Pedro Thadeu
Galvão. VI. Albuquerque, Marcos Antonio Costa de.

CDD - 617-96

O conteúdo desta obra é de inteira responsabilidade de seu(s) autor(es).


Produzido pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia.
Material de distribuição exclusiva aos médicos anestesiologistas.
Produzido em outubro/2012

Sociedade Brasileira de Anestesiologia


Rua Professor Alfredo Gomes, 36 – Botafogo - Rio de Janeiro – RJ
CEP: 22251-080
Tel: (21) 3528-1050 – Fax: (21) 3528-1099
e-mail: sba@sba.com.br site: www.sba.com.br
EDITORES
Daniel Volquind
•• TSA/SBA - Presidente da Comissão de Educação Continuada da SBA.
•• Professor da Universidade de Caxias do Sul – UCS.
•• Anestesiologista da CAN – Clínica de Anestesiologia Ltda.
Pedro Thadeu Galvão Vianna
•• TSA/SBA - Membro da Comissão de Educação Continuada da SBA.
•• Responsável pelo CET do Depto. Anest.da Fac. Med. Botucatu.
•• Professor Titular do Departamento de Anestesiologia da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP.
Marcos Antonio Costa de Albuquerque
•• TSA/SBA - Membro da Comissão de Educação Continuada da SBA.
•• Responsável pelo CET Menino Jesus de Praga
José Mariano Soares de Moraes
•• TSA/SBA - Presidente da Sociedade Brasileira de Anestesiologia.
•• Responsável pelo CET Serv.Anest.do H.U.F. Juiz de Fora
•• Doutor em anestesiologia e Professor da U.F. Juiz de Fora e F.C.Médicas e da Saúde de Juiz de Fora Suprema.
Oscar César Pires
•• TSA/SBA - Diretor do Departamento Científico da Sociedade Brasileira de Anestesiologia.
•• Responsável pelo CET do Hospital Municipal de São José dos Campos.
•• Doutor em anestesiologia/mestre em Farmacologia. Professor-doutor da Universidade de Taubaté.

AUTORES
Alexandre Teruya
•• Anestesiologista. Depto.de anestesia e terapia intensiva da Assoc. Bras. de Transplante de Órgãos.
•• Equipe de transplantes do Hospital de Transplantes do Estado de São Paulo Euryclides de Jesus Zerbini.
•• Equipe de cirurgia minimamente invasiva cardíaca e torácica do Hospital Israelita Albert Einstein.
Ana Luft
•• Anestesiologista.
•• Mestre em Ciências Médicas UFCSPA.
Andrea Tiemi Kondo
•• Médica hematologista e hemoterapeuta do Departamento de Hemoterapia e Terapia Celular do Hospital Israelita
Albert Einstein
Bruno Salomé de Morais
•• TSA/SBA - Membro do Comitê de Anestesia em Transplantes de Órgãos
•• Instrutor Corresponsável pelo CET Serv.Anest. do Hospital Felício Rocho
•• Mestre e Doutorando em Ciências da Saúde pela UFMG. Anestesiologista do Grupo de Transplantes do HC/
UFMG e Hospital Lifecenter
Cláudia Regina Fernandes
•• TSA/SBA – Presidente do Comitê de Medicina Perioperatória
•• Responsável pelo CET Hosp. Univ. Walter Cantídio – UFCE
•• Doutora em Medicina pela Univ. de São Paulo – Área de Anestesiologia. Profa. Assistente do Curso de Med.da Univ.
de Fortaleza-UNIFOR.
Daniela Bianchi Garcia Gomes
•• TSA/SBA - Membro do Comitê de Anestesia em Pediatria
•• Medica Anestesista e Preceptora dos residentes de anestesia do Hosp. Pequeno Príncipe - Curitiba-PR
•• Membro da Comissão Cientifica da SPA
Débora de Oliveira Cumino
•• TSA/SBA - Membro do Comitê de Anestesia em Pediatria
•• Instrutora Corresponsável pelo CET Santa Casa de Misericórdia de São Paulo
•• Médica coordenadora do serviço de Anestesiologia do Hospital Infantil Sabará, São Paulo-SP. Médica
Anestesiologista da Irmandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo-SP
Diná Mie Hatanaka
•• TSA/SBA.
•• Equipe de transplantes do Hospital de Transplantes do Estado de São Paulo Euryclides de Jesus Zerbini.
•• Equipe de cirurgia minimamente invasiva cardíaca e torácica do Hospital Israelita Albert Einstein.
Emilio Carlos Del Massa
•• TSA/SBA - Membro do Comitê de Reanimação e Atendimento ao Politraumatizado da SBA
•• Instrutor Corresponsável pelo CET Casa de Saúde Santa Marcelina
Fábio Scalet Soeiro
•• TSA/SBA - Presidente do Comitê de Anestesia em Transplantes de Órgãos
•• Doutor em Anestesiologia pela Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP.
•• Responsável pelo serviço de anestesia para transplante hepático do Hospital Unimed de Sorocaba.
Fernando Antônio Nogueira Cruz Martins
•• TSA/SBA – Presidente do Comitê de Anestesia Cardiovascular e Torácica
•• Instrutor Corresponsável pelo CET S.A. Hosp. Benef. Portuguesa – SP
Florentino Fernandes Mendes
•• TSA/SBA. Membro do Comitê de Medicina Perioperatória
•• Responsável pelo CET Univ.Fed.Ciências da Saúde de Porto Alegre
•• Mestre Farmacologia pela UFCSPA. Doutor em Medicina pela FMSCSP. Prof Adj Anestesiologia da UFCSPA.
Gabriel Franzin Rusca
•• Anestesiologista.
•• Equipe de transplantes do Hospital de Transplantes do Estado de São Paulo Euryclides de Jesus Zerbini.
•• Equipe de cirurgia minimamente invasiva cardíaca e torácica do Hospital Israelita Albert Einstein..
Ivani Rodrigues Glass
•• TSA/SBA – Membro do Comitê de Anestesia Ambulatorial
•• Instrutora Corresponsável pelo CET Menino Jesus de Praga
•• Presidente da Sociedade de Anestesiologia do Estado de Sergipe - SAESE
José Eduardo Bagnara Orosz
•• TSA/SBA – Presidente do Comitê de Anestesia Ambulatorial
•• Instrutor Corresponsável pelo CET do HMCP da Pontifícia Univ. Católica de Campinas
•• Mestre em Anestesiologia pela Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP. Anestesiologista da ANDROFERT
- Centro de Referência em Reprodução Humana.
Jose Mauro Kutner
•• Gerente médico do Departamento de Hemoterapia e Terapia Celular do Hospital Israelita Albert Einstein
•• Doutor pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Kleber Machareth de Souza
•• TSA/SBA – Membro do Comitê de Anestesia Cardiovascular e Torácica
•• Coordenador do Curso ETI/SBA
•• Fellowship em Cirurgia Cardiovascular e Transesofágico no Toronto General Hospital - Canadá
Leandro Mamede Braun
•• TSA/SBA – Membro da Comissão de Treinamento e Terapêutica da Dor
•• Instrutor Corresponsável pelo CET do Hosp.das Clínicas da UFPE
•• Fellow World institute of Pain (FIPP)
Magda Lourenço Fernandes
•• TSA/SBA - Presidente do Comitê de Anestesia em Pediatria
•• Responsável pelo CET da Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte
•• Mestre em Ciências Aplicadas à Cirurgia pela UFMG
Márcio de Pinho Martins
•• TSA/SBA – Presidente do Comitê de Reanimação e Atendimento ao Politraumatizado
•• Responsável pelo CET do Serv.Anest.Hospital da Polícia Militar
•• Coordenador do Núcleo SBA Vida
Míriam Seligman de Menezes
•• TSA/SBA – Membro da Comissão de Treinamento e Terapêutica da Dor
•• Instrutora Corresponsável pelo CET Prof Manoel Alvarez – UFSM
•• Doutora em Medicina pela UNIFESP
Nádia Maria da Conceição Duarte
•• TSA/SBA – Presidente do Conselho Superior em Anestesiologia
•• Instrutora corresponsável pelo CET Serv. Anest. H. Restauração e H. G. Vargas
Octavio Henrique Mendes Hypolito
•• Anestesiologista. Coordenador do serviço de anestesiologia e corresponsável do programa de residência médica do
Hospital Municipal “Dr Jose de Carvalho Florence” de São José dos Campos.
•• Coordenador do serviço de anestesiologia do Hospital de Transplantes do Estado de São Paulo Euryclides de Jesus
Zerbini.
•• Doutor em Ciências pela UNIFESP
Paulo Adilson Herrera
•• TSA/SBA – Presidente da Comissão de Treinamento e Terapêutica da Dor
•• Responsável pelo CET Serv. Anest. Hospital Evangélico de Londrina
•• Mestre em Medicina Interna da Universidade Estadual de Londrina
Regina P. El dib
•• PhD. Pesquisador Colaborador.
•• McMaster Institute of Urology, McMaster University, St. Joseph’s Healthcare, Hamilton.
•• Pós-Graduação Bases Gerais da Cirurgia. Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB). Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP)
Ricardo Lopes da Silva
•• TSA/SBA – Responsável pelo CET S.A. Santa Casa de Miser.Curitiba
•• Presidente da Sociedade Paranaense de Anestesiologia
•• Doutor em Medicina Cirúrgica pela FMRP/USP
Rodrigo Pereira Diaz André
•• TSA/SBA - Presidente do Comitê de Anestesia em Transplantes de Órgãos
•• Instrutor Corresponsável pelo CET Prof. Bento Gonçalves da UFRJ.
•• Anestesiologista do programa de transplante hepático do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da UFRJ.
Ronaldo Alves de Souto
•• TSA/SBA - Membro do Comitê de Reanimação e Atendimento ao Politraumatizado da SBA
•• Instrutor do Curso SAVA/SBA
•• Coordenador da residência médica em Anestesiologia do Hospital Regional do Agreste
Vera Lúcia Fernandes de Azevedo
•• TSA/SBA – Instrutora do Curso SAVA/SBA
•• Responsável pelo CET da Assoc. Obras Sociais Irmã Dulce
•• Mestre em Medicina pela Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho-UNESP- área de Anestesiologia.
Doutoranda em Medicina pela Univ. Est. Paulista Julio de Mesquita Filho-UNESP- área de Anestesiologia.
APRESENTAÇÃO
Todo livro tem sua história e este não difere dos demais. Sua história teve início há doze
anos quando a diretoria da Sociedade Brasileira de Anestesiologia, capitaneada pelo dr.
Renato Almeida Couto de Castro, através da Comissão de Ensino e Treinamento lançou
a primeira edição, intitulando-o “Curso de Educação a Distância em Anestesiologia”, dando
continuidade a este projeto com muita seriedade e determinação até o ano de 2005. Naquela
época, a recém criada Comissão de Educação Continuada assumiu esta difícil tarefa com
muita eficiência e dedicação até 2010, quando foi editada a décima edição.
Para atender mudanças características do progresso, como a instituição da versão on-line,
no ano de 2011 a diretoria da Sociedade Brasileira de Anestesiologia, orquestrada pela dra.
Nádia Maria da Conceição Duarte, acatou sugestões de seus associados e alterou o seu tí-
tulo para “Livro de Educação Continuada em Anestesiologia”, este ano na sua segunda edição,
permanecendo sob cuidados da Comissão de Educação Continuada, além das muitas outras
atividades que esta desenvolve.
São abordados temas diversos e atualizados que, por essa mesma razão, gozam de in-
teresses dos mais variados anestesiologistas, permitindo-lhes enriquecer e atualizar seus
conhecimentos, fruto este colhido a partir da pesquisa dos experientes e dedicados autores,
portadores do mais alto padrão científico.
Enfim, mais uma vez, agradecemos o empenho da Comissão de Educação Continuada,
autores, diretores e funcionários da SBA, pela constante e integral dedicação aos projetos
SBA, possibilitando oportunidade aos associados à continuada educação médica.

Oscar César Pires


Diretor do Departamento Científico
Sociedade Brasileira de Anestesiologia
SUMÁRIO
Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

Capítulo 1
Estrutura administrativa da SBA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
Nádia Maria da Conceição Duarte

Capítulo 2
Dor crônica pós-operatória. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
Leandro Braun, Miriam Seligman Menezes e Paulo Adilson Herrera

Capítulo 3
Delirium pós-operatório . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
Vera Lucia Fernandes de Azevedo, Florentino Fernandes Mendes e Cláudia Regina Fernandes

Capítulo 4
Anestesia baseada em evidências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
Regina P. El dib

Capítulo 5
Monitorização hemodinâmica e reposição volêmica no transplante hepático. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
Fábio Scalet Soeiro, Bruno Salomé de Morais e Rodrigo Pereira Diaz André

Capítulo 6
A coagulação no paciente cirúrgico - parte 1. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87
Alexandre Teruya, Andrea Tiemi Kondo, Diná Mie Hatanaka, Gabriel Franzin Rusca, Jose
Mauro Kutner e Octavio Henrique Mendes Hypolito

Capítulo 7
Utilização de hemoderivados em cirurgia cardíaca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
Ricardo Lopes da Silva, Fernando Antônio Nogueira Cruz Martins e Kleber Machareth de Souza

Capítulo 8
Anestesia ambulatorial para procedimentos em reprodução assistida. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123
José Eduardo Bagnara Orosz e Ivani Rodrigues Glass

Capítulo 9
Glicemia, insulina, resposta inflamatória e anestesia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135
Florentino Fernandes Mendes e Ana Luft

Capítulo 10
Cuidados pós-reanimação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157
Márcio de Pinho Martins, Emilio Carlos Del Massa e Ronaldo Alves de Souto

Capítulo 11
Analgesia pós-operatória em pediatria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 179
Daniela Bianchi Garcia Gomes, Débora de Oliveira Cumino e Magda Lourenço Fernandes
PREFÁCIO
A ciência séria, árdua e sincera se transforma em conhecimento que pretende se perpetuar
em obras consultadas ao longo dos anos.
A Comissão de Educação Continuada da Sociedade Brasileira de Anestesiologia – SBA
apresenta mais uma edição do Livro “Educação Continuada em Anestesiologia”, o qual reúne
temas expressivos e atuais da anestesiologia.
Com certeza, este volume será de grande utilidade ao anestesiologista brasileiro no sentido
de continuar seu aprendizado, rever conceitos e atualizar seus conhecimentos.

Comissão de Educação Continuada


Daniel Volquind
Pedro Thadeu Galvão Vianna
Marcos Antônio Costa de Albuquerque

Prefácio | 13
Capítulo 01

Estrutura administrativa
da SBA
Nádia Maria da Conceição Duarte
Estrutura administrativa da SBA
Estrutura administrativa da SBA e sua política de formação, atualização e defesa
profissional dos anestesiologistas
A Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA) é uma associação civil, sem fins
econômicos, fundada em 25 de fevereiro de 1948, por tempo indeterminado, consti-
tuindo- se em uma Federação de Associações Regionais, com sede e foro na Cidade
do Rio de Janeiro1.
Sua missão institucional é congregar os anestesiologistas no Brasil, promovendo conti-
nuamente a formação, a atualização técnico-científica e a implementação de ações de defesa
profissional, além de fomentar o comprometimento da especialidade com a comunidade
médica e a sociedade em geral.
Sua visão para 2015 é significar para a comunidade em geral uma entidade exemplar
no campo do ensino, atualização científica, defesa profissional, qualidade e segurança
da anestesiologia, com reconhecimento científico mundial.
Para cumprimento de sua Missão Institucional, a SBA executa os seguintes serviços: • Reúne
os médicos interessados em fomentar o progresso, o aperfeiçoamento e a difusão da Anestesiolo-
gia, Terapia Intensiva, Tratamento da Dor e Reanimação e estabelece normas para o treinamento
na especialidade • Faz cumprir o Código de Ética Médica, o Código Profissional e Econômico
da SBA e defende os interesses profissionais de seus membros • Patrocina Congressos da
Especialidade, de âmbito nacional e internacional • Confere o Título Superior em Anestesiologia
(TSA) • Confere o Título de Especialista em Anestesiologia (TEA) e o Certificado de Área
de Atuação em Dor • Publica a Revista Brasileira de Anestesiologia e a Anestesia em Revista •
Confere prêmios, conforme regulamentos próprios.
A SBA possui, atualmente, 25 Regionais distribuídas em todas as regiões geográficas do
Brasil. Uma em cada um dos seguintes Estados da Federação e no Distrito Federal: Acre,
Amapá, Amazonas, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernam-
buco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Distrito
Federal, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e
Rio Grande do Sul.
No seu quadro de membros, também chamados de associados, fazem parte
10 categorias:
I - Fundadores,
II - Honorários,
III - Beneméritos,
IV - Estrangeiros,
V - Ativos,
VI - Aspirantes,
VII - Adjuntos,

16 | Educação Continuada em Anestesiologia


VIII – Aspirantes-adjuntos,
IX – Remidos e
X – Especiais
No seu organograma, constam os seguintes órgãos:
I - Assembleia Geral (AG),
II - Assembleia de Representantes (AR),
III - Conselho Superior,
IV - Conselho Fiscal,
V - Diretoria,
VI - Conselho de Defesa Profissional e
VII - Departamentos.
A Assembleia Geral é a instância máxima da Sociedade. Nela, todos os membros se re-
únem ordinariamente uma vez ao ano para eleger a Diretoria e o Conselho Fiscal, aprovar
as contas, alterar o Estatuto e deliberar sobre assuntos de especial importância para a SBA.
Na AG ainda poderão ser deliberadas a liquidação da SBA e a destituição da Diretoria e/ou
o Conselho Fiscal.
Na Assembleia de Representantes, constituída por representantes das Regionais, pelo
Presidente do Conselho Superior e pela Diretoria da SBA, delibera-se assuntos de interesse
da SBA e realiza-se a eleição para todos os demais cargos elegíveis da SBA (exceto Diretoria
e Conselho Fiscal, que são eleitos na AG).
O Conselho Superior é constituído pelos três últimos Presidentes da SBA e pelos Pre-
sidentes das Regionais. São suas atribuições: participar (através do seu Presidente), das
reuniões de Diretoria (sem direito a voto) e da Assembleia de Representante; examinar as
contas da SBA e recomendá-las à aprovação ou não pela Assembleia Geral, após conhecer
o relatório do Conselho Fiscal; indicar, por solicitação da Diretoria, substitutos para cargos
vagos nos períodos entre eleições; recomendar à Assembleia de Representantes nomes para
eleição aos cargos eletivos, exceto da Diretoria e Conselho Fiscal; opinar, em qualquer épo-
ca, sobre determinado assunto, por solicitação da Diretoria e apreciar as denúncias em grau
de recurso, conforme disposto no Código de Processo Administrativo da SBA.
Ao Conselho Fiscal, formado por três membros efetivos e três suplentes, compete confe-
rir, verificar, comprovar e opinar, trimestralmente, sobre a administração financeira da SBA,
enviando relatório ao Conselho Superior para apreciação.
O Conselho de Defesa Profissional é constituído pelo Presidente e pelo Secretário do Con-
selho de Defesa Profissional, pelos Presidentes das Regionais ou seus substitutos credencia-
dos, pelo último Presidente da SBA, pelo Presidente da SBA em exercício e pelo Presidente
da Federação Brasileira das Cooperativas dos Anestesiologistas (FEBRACAN) em exercício.
Tem como finalidade tratar das relações e condições de trabalho dos associados da SBA.
A Diretoria da SBA é composta por um Presidente, um Vice-Presidente, um Tesoureiro,
um Secretário-Geral e três Diretores de Departamentos – Administrativo, Científico e de
Defesa Profissional.

Estrutura administrativa da SBA | 17


Compete, coletivamente, à Diretoria da SBA:
I - Executar e fazer executar as resoluções das Assembleias.
II - Cumprir e fazer cumprir o Estatuto.
III - Designar Comissões, com mandato máximo de três meses.
IV - Apresentar à Assembleia de Representantes um relatório completo de suas atividades.
V - Contratar o pessoal necessário para o funcionamento da SBA.
VI - Reunir-se pelo menos uma vez por ano, com os Presidentes das Comissões
Permanentes e o Editor-Chefe da Revista Brasileira de Anestesiologia.
VII - Aprovar e recomendar à Assembleia de Representantes as cidades que têm condições
de sediar os Congressos Brasileiros de Anestesiologia.
VIII - Deliberar sobre o credenciamento e descredenciamento dos Centros de Ensino e
Treinamento, baseada nos relatórios da Comissão Ensino e Treinamento.
IX - Deliberar sobre os casos omissos neste Estatuto.
São três os Departamentos da SBA: Administrativo, Científico e Defesa Profissional.
Cada Departamento é integrado pelas Comissões, Comitês e publicações relativas à sua
área, sendo que as Comissões Permanentes e os Comitês de assessoramento técnico-cientí-
fico são subordinados à Diretoria através do Diretor da respectiva área.

Departamentos e suas respetivas Comissões e Comitês:


Departamento Administrativo
• Comissão de Estatuto Regimentos e Regulamentos
Departamento de Defesa Profissional
• Comissão de Honorários Médicos
• Comissão de Sindicância de Processo Administrativo
• Comissão de Saúde Ocupacional
• Comissão de Qualidade e Segurança em Anestesiologia
Departamento Científico:
• Comissões:
1. de Ensino e Treinamento
2. de Normas Técnicas
3. Examinadora do Título Superior em Anestesiologia
4. de Educação Continuada
5. de Treinamento e Terapêutica da Dor
• Comitês de:
1. Anestesia Ambulatorial
2. Anestesia em Cirurgia Cardiovascular e Torácica
3. Anestesia em Obstetrícia
4. Anestesia em Pediatria
5. Anestesia Loco-Regional

18 | Educação Continuada em Anestesiologia


6. Anestesia Venosa
7. Hipertermia Maligna
8. Reanimação e Atendimento ao Politraumatizado
9. Via Aérea Difícil
10. Medicina Perioperatória
11. Distúrbios do Sono
12. Anestesia em Transplantes de Órgãos
A SBA mantém na sua sede física as instalações administrativas, onde trabalha o seu
núcleo de funcionários, que inclui uma gerente geral, e onde despacham os diretores e reú-
nem-se comissões e conselhos. Nesta sede, em um casarão tombado no bairro de Botafogo,
ainda estão à disposição de seus associados um auditório, uma biblioteca física e um museu.
São dois os pilares mestres da estrutura organizacional e funcional da SBA: a formação /
atualização científica e a defesa profissional de seus associados.
Através de projetos de múltiplas ações, a SBA promove a qualidade do atendimento
profissional prestado à população; contribui para a atualização curricular, com vistas à re-
certificação do Título de Especialista; e oferece ao anestesista associado uma pluralidade
de instrumentos para o exercício de atividades vinculadas ao interesse epistemológico e à
necessidade acadêmica de educação, ensino, pesquisa e publicação.
O periódico Anestesia em revista, um dos meios de comunicação da Diretoria com os
associados, tem edições bimestrais com disponibilização impressa e virtual.
A Revista Brasileira de Anestesiologia 2 é o periódico científico da SBA. É editado bimes-
tralmente em três idiomas (português, inglês e espanhol), indexado ao MedLine3, SciELO4
e ao ISI5 (¨Institute of Science Information¨, atualmente conhecida como Thomson Reuters
ISI), com visibilidade e disponibilidade para toda a comunidade científica mundial por via
eletrônica e impressa.
Anualmente são editados livros com temas científicos e de defesa profissional, com con-
teúdos oriundos dos participantes dos comitês e comissões da SBA e também de professores
convidados. Estes livros são oferecidos aos associados, gratuitamente, tanto na forma eletrô-
nica quanto na impressa.
A SBA tem um robusto, moderno e atualizado portal eletrônico. Uma área restrita é cus-
tomizada para cada membro, com ícones que dizem respeito ás suas atribuições associativas,
informações sobre a SBA, suas regionais, cooperativas e outras instituições correlacionadas,
calendário científico, legislação, educação continuada, biblioteca virtual, periódicos, livros
textos, videoconferências, prêmios, anúncios de empresas colaboradoras, cadastro de só-
cios, informações históricas (SBA 63 anos), Cursos da SBA (Núcleo SBA Vida), um canal de
WebTV, entre muitos outros.
Ainda há no portal uma área para o público em geral, onde se encontram informações
sobre o ato anestésico e informações médicas em geral.
O Núcleo SBA Vida abriga os cursos oferecidos pela SBA. É ligado ao Departamen-
to Científico e possui uma estrutura com um coordenador geral e instrutores que são

Estrutura administrativa da SBA | 19


capacitados e certificados pela própria SBA. Fazem parte do Núcleo, atualmente, os
seguintes cursos:
• SAVA (Suporte Avançado de Vida em Anestesia). É um projeto educacional da Sociedade
Brasileira de Anestesiologia, com carga horária de 18 horas, que objetiva a qualificação
em prevenção, diagnóstico e tratamento de situações críticas em anestesia, principal-
mente a parada cardíaca (PCR). O curso proporciona um treinamento teórico-prático
para anestesiologistas formados ou em formação.
• Controle da Via Aérea. Com carga horária de 08 horas, é dirigido aos anestesiologistas,
aos médicos em geral e aos estudantes de medicina. Possui como objetivos a capacitação
para o manuseio das vias aéreas, através do desenvolvimento de habilidades técnicas
com vários dispositivos e técnicas para adequado controle ventilatório, o ensino e trei-
namento do gerenciamento de crises de origem respiratória e das medidas destinadas a
minimizar o dano decorrente da manipulação das vias aéreas.
• Máscara Laríngea. Com duração de 4 horas, tem proposta semelhante ao curso
de via área, porém com objetivo exclusivo de capacitação ao manuseio e uso de
máscaras laríngeas.
• Reanimação Cardíaca. Com carga horária de 08 horas, é dirigido para os médicos em
geral e estudantes de medicina, e possui como objetivos a capacitação para reconhe-
cimento, diagnóstico e tratamento imediato de condições críticas que podem causar
uma parada cardiorrespiratória (PCR), sem a abordagem específica para a anestesia,
que é o escopo do Curso SAVA.
• Salve uma Vida. O Curso Salve uma Vida está em consonância com as ações de responsa-
bilidade social da SBA e objetiva capacitação da população em geral (não médicos) para
reconhecimento, acionamento imediato de serviço médico especializado e tratamento
inicial de uma parada cardiorrespiratória, ou seja, o treinamento em Suporte Básico
à Vida. O curso pode ser oferecido para pequenos grupos, como funcionários de uma
empresa ou professores de uma determinada escola ou para um treinamento em massa,
como alunos da rede pública de uma cidade, membros de sindicatos, entre outros. Cada
turma é composta por, no máximo, 50 alunos, e tem a duração de 02 horas. São compe-
tências ensinadas durante o curso:
• Reconhecer e tratar os sinais de obstrução respiratória
• Fazer o diagnóstico de parada respiratória e parada cardíaca
• Saber como proceder para ativar o sistema de saúde
• Aprender como fazer reanimação de qualidade
• Ecocardiografia Transesofágica. O Curso Básico de Ecocardiografia Transesofágica no
Intraoperatório(ETI) é um curso presencial, dirigido para o médico anestesista associa-
do da SBA. Objetiva a aquisição de conhecimento básico sobre o uso da ecocardiografia
transesofágica na monitorização hemodinâmica intraoperatória, em cirurgias cardíacas
e em pacientes cardiopatas submetidos a cirurgias não cardíacas associadas, assim como

20 | Educação Continuada em Anestesiologia


abordar as grandes alterações hemodinâmicas a obtenção de informações anatômicas e
da dinâmica circulatória que definem o perfil cardiovascular no intraoperatório, à luz da
ecocardiografia transesofágica.
• Curso de Habilitação para Construção de Recomendações Práticas da SBA. Oferecido
por via eletrônica, mas com opção futura para ser realizado de forma presencial, tem
como objetivo habilitar os associados da SBA para a produção de recomendações práti-
cas baseadas em evidências científicas.
A formação de especialistas faz parte da missão e da origem ideológica da SBA. Sempre
articulados com os critérios de excelência formativa balizados pela experiência pioneira e
histórica dos Centros de Ensino e Treinamento (CET) e pela regulamentação emanada da
AMB e da Comissão Mista de Especialidades, a SBA garante em qualidade e quantidade
anestesistas para o mercado de trabalho brasileiro. Tendo, atualmente, 94 CET, distribuídos
por todas as regiões geográficas do país, a SBA capacita simultaneamente mais de 1.500
médicos em especialização, sendo, portanto, ofertados anualmente ao mercado cerca de 500
profissionais. A estrutura formadora de anestesiologistas no Brasil foi iniciada pela própria
SBA, e seguida, tempos após, pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC).
Além da formação de especialistas, já há vários anos a SBA tem preparado e certificado
os anestesiologistas para a área de atuação em dor, tendo sido até hoje a única especialidade
médica no Brasil a possuir centros formadores regularmente atuantes.
Além da formação e atualização científica, a defesa profissional do anestesista é outro
pilar estrutural da SBA. Com estratégias especificamente planejadas, nesta área são imple-
mentadas: ações de pesquisa, prevenção e tratamento de problemas ocupacionais, como
estresse, drogadição, exposição a ambientes com radiações ionizantes e insalubres em geral;
ações junto ao Ministério da Saúde, ABNT e Anvisa, para a normatização de apresentação e
funcionamento no que se refere a ambientes, condutas e dispositivos para a atuação médica;
apoio, orientação e divulgação, quando de movimentos locais ou regionais de litígio; parti-
cipação ativa de projetos, campanhas e movimentos em defesa da boa prática anestésica e da
adequada remuneração médica, que culminaram, por exemplo, com a criação e implantação
da CBHPM.
Após implantação e consolidação do seu Planejamento Estratégico e da familiarização
com as ferramentas de gestão de qualidade, no ano de 2009, a SBA submeteu-se ao processo
de certificação ISO 9001, selo criado pela International Organization for Standardization6,
cujo objetivo é estabelecer exigências internacionais para sistemas de gerenciamento de
qualidade. Após percorrer todos os passos de preparação e auditoração, a SBA foi a primeira
Sociedade de Especialidade Médica brasileira a receber o certificado ISO 9001/2008, uma
evidência de que o seu sistema de gerenciamento de qualidade foi aprovado e certificado
contra um padrão de melhores práticas.
A nível nacional, a SBA é vinculada à Associação Médica Brasileira (AMB)7. É uma de
suas 53 Sociedades de Especialidades Médicas. Na AMB, a SBA tem assento em várias Co-
missões e Conselhos. Forma, junto com as demais 53 Sociedades, o Conselho Científico,

Estrutura administrativa da SBA | 21


que discute assuntos da esfera científica, porém sem poder deliberativo. Dentre as Socie-
dades que compõem a AMB, a SBA é uma das 14 que compõem o Conselho Deliberativo,
órgão que discute e delibera sobre questões referentes às atividades científicas e de defesa
profissional, tanto da própria AMB quanto de todas as Sociedades de Especialidades Médi-
cas que a compõem.
Para o Conselho Federal de Anestesiologia (CFM)8, a SBA atende ao Convênio AMB/
CFM/CNRM, sendo a Sociedade de Especialidade de Anestesiologia reconhecida. A SBA
e suas federadas contribuem para a indicação dos membros componentes das Câmaras Téc-
nicas de Anestesiologia do CFM e seus braços regionais (CRM), respectivamente, e os seus
associados são, obrigatoriamente, cadastrados e quites com estes conselhos.
A Comissão Mista de Especialidades (CME), que é uma Comissão tripartite, formada
pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), Associação Médica Brasileira e Comissão
Nacional de Residência Médica (CNRM)9, reconhece a SBA como instituição formadora e
certificadora de especialistas em Anestesiologia. A CME também outorga à SBA a prerro-
gativa de formar e certificar anestesiologistas nas áreas de atuação de Administração, Dor e
Medicina Paliativa.
A SBA reconhece e possui relações institucionais com as Cooperativas Médicas de Anes-
tesiologia (Coopanests) e com a Federação Brasileira de Cooperativas de Anestesiologia
(FEBRACAN)10, entidade que congrega todas as Coopanests. Representada pelo seu pre-
sidente, a FEBRACAN é uma das partes que compõe o Conselho de Defesa Profissional,
órgão da SBA cuja finalidade é tratar das relações financeiras e suas implicações entre asso-
ciados, ou grupos de associados, com empresas, firmas e pessoas de âmbito privado, estatal
ou qualquer natureza.
A SBA é uma das instituições que tem assento na Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT)11. Juntamente com os demais componentes das Comissões Técnicas, contribui
para a criação, tradução e atualização de Normas Técnicas que regulamentam o desenho
e o funcionamento de equipamentos e instrumentos que possuem interface com a prática
anestésica, objetivando a adoção e implementação de medidas que promovam a segurança
do ato anestésico.
Interagindo ativamente com várias áreas dos Ministérios da Saúde e Educação, através
de seus distintos Departamentos e Secretarias, a SBA tem se empenhado na busca de con-
quistas relacionadas à atividade trabalhista do anestesista, como as portarias que definem
e normatizam periculosidade, insalubridade, exposição a agentes nocivos, tais como ra-
diações ionizantes, resíduos de anestésico, entre outros. A Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (ANVISA)12, habitualmente convoca a SBA para emissão de pareceres sobre no-
vos fármacos e equipamentos que estão em submissão para entrada no país. É também com
a ANVISA que a SBA argumenta e solicita a regulamentação de importação, produção e
disponibilização de insumos e produtos necessários à segurança do ato anestésico.
Internacionalmente, a SBA é filiada à World Federation of Societies of Anaesthesiologists
(WFSA)13. Pelo seu porte e número de associados, é atualmente a segunda maior Sociedade
da WFSA.

22 | Educação Continuada em Anestesiologia


A nível regional (América), a SBA é uma das Sociedades que compõe a Confederação
Latino Americana de Anestesiologia (CLASA)14, bloco formado por todas as Sociedades
Americanas, exceto Canadá e Estados Unidos. Na CLASA, a SBA participa das decisões
políticas relacionadas à orientação quanto à formação e atividade profissional, ao intercâm-
bio de especialistas entre os diversos países, à construção de instrumentos de Educação
Continuada e ao Congresso CLASA.
A SBA também faz parte da FASA, que é a Federação das Associações Sul Americanas
de Anestesiologia.
Com as Sociedades Americana e Europeia de Anestesiologia (ASA e ESA)15-16, a SBA
articula projetos, visando o estabelecimento de parcerias educacionais, como o intercâmbio
de profissionais entre os países, a participação nas programações de Congressos e nas pes-
quisas multicêntricas.
Junto aos países membros do ESA, a SBA é signatária da Declaração de Helsink de
Qualidade e Segurança em Anestesia17, um projeto de cooperação internacional, originado
durante o Congresso Europeu de Anestesiologia em junho de 2010. O documento emanado
do projeto descreve uma sequência de pontos a serem seguidos pelas entidades componen-
tes, com o compromisso de reduzir os índices de morbimortalidade relacionadas ao ato
anestésico, através do desenvolvimento, divulgação e implementação de medidas padrão,
para a obtenção de melhores resultados no exercício profissional nas áreas da anestesiologia,
cuidados intensivos, medicina de emergência e dor. Está incluído neste protocolo todos os
procedimentos perioperatórios e todas as situações dentro ou fora das unidades hospitala-
res, que devem reverter na melhor qualidade e segurança para o paciente.
Para que a SBA continue cumprindo a sua missão e mantenha o seu rumo em direção à
sua visão de futuro, é essencial a adesão, a participação, o comprometimento profissional e
institucional dos anestesiologistas, porque a SBA somos todos nós.
Referências bibliográficas:
1. Sociedade Brasileira de Anestesiologia. Disponível em: http://www.sba.com.br/. Acesso: 30/04/2012.
2. Revista Brasileira de Anestesiologia. Disponível em: http://www.sba.com.br/rba/index.asp -. Acessado
em: 07/05/2012.
3. US National Library of Medicine National Institutes of Health. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.
nih.gov/pubmed/ -. Acessado em: 07/05/2012.
4. Scientific Electronic Library Online. Disponível em: http://www.scielo.org/php/index.php -. Acessado
em: 07/05/2012.
5. Thomson Reuters. Disponível em: http://thomsonreuters.com/ Acesso: 07/05/2012.
6. International Organization for Standardization. Disponível em: http://www.iso.org/iso/home.html
Acessado em: 07/05/2012.
7. Associação Médica Brasileira. Disponível em: http://www.amb.org.br Acessado em: 25/04/2012.
8. Conselho Federal de Medicina. Disponível em: http://portal.cfm.org.br/ Acessado em: 25/04/2012.
9. Comissão Nacional de Residência Médica. Disponível em: http://portal.mec.gov.br Acessado
em: 25/04/2012.

Estrutura administrativa da SBA | 23


10. Federação Brasileira de Cooperativas de Anestesiologia. Disponível em: http://www.febracan.org.br/
Acessado em: 12/04/2012.
11. Associação Brasileira de Normas Técnicas. Disponível em: http://www.abnt.org.br/. Acessado
em: 07/05/2012.
12. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/wps/portal/
anvisa/home. Acesso em 07/05/2012.
13. World Federation of Societies of Anaesthesiologists. Disponível em: http://www.anaesthesiologists.
org/. Acessado em: 07/05/2012.
14. Confederação Latino Americana de Anestesiologia. Disponível em: http://www.clasa-anestesia.org/
web/ Acessado em: 07/05/2012.
15. American Society of Anesthesiologists. Disponível em: http://www.asahq.org/ Acessado em: 07/05/2012.
16. European Society of Anaesthesiology. Disponível em: http://www.euroanaesthesia.org/ Acessado
em: 07/05/2012.
17. Petrini F, Solca M, De Roberts E et al. - The Helsinki Declaration on Patient Safety in Anesthesiology:
a way forward with the European Board and the European Society of Anesthesiology. Minerva
Anestesiol, 2010;76:971-977.

24 | Educação Continuada em Anestesiologia


Capítulo 02

Dor crônica
pós-operatória
Leandro Braun
Miriam Seligman Menezes
Paulo Adilson Herrera
Dor crônica pós-operatória
1. Introdução
Dor Crônica Pós Operatória (DCPO) é uma síndrome dolorosa recentemente reco-
nhecida. Em 1999 Macrae e Davis em publicação da IASP (International Association
for Study of Pain) definiram DCPO como “Síndrome dolorosa desenvolvida no período
pós-operatório com duração de pelo menos dois meses, sem outras causas para a dor (ex.
infecção crônica, recorrência de neoplasia) e excluída a possibilidade da dor significar a
continuidade da doença pré existente1,2 .
Milhares de cirurgias são realizadas todos os anos no mundo inteiro. A ocorrência de dor
crônica pós-operatória varia entre diversos levantamentos dependendo do tempo de segui-
mento e do tipo de cirurgia. O que é certo é que DCPO pode ser uma complicação de cirur-
gias de todos os portes, ocorrendo aproximadamente em 60-70% dos pacientes submetidos a
toracotomias, mas também relatada por pacientes submetidas a herniorrafias inguinais, aonde
1,8% dos pacientes referem dor intensa após 6 anos de seguimento3. Com os avanços técnicos
mais e mais procedimentos cirúrgicos vem sendo realizados e nada indica que teremos em
um futuro próximo uma diminuição de casos de DCPO. Ao contrário, com o aumento do
número de procedimentos cirúrgicos realizados, a incidência de DCPO tem aumentado com
consequente aumento do custo social e da dimensão e relevância deste assunto.
É importante neste contexto determinar qual o papel dos anestesiologistas na prevenção
e no tratamento desta síndrome dolorosa. É disto que trata este tema de educação conti-
nuada. Primeiro por discutir quais as possibilidades de identificar aqueles pacientes que
tem maior risco para o desenvolvimento de dor crônica pós-operatória. Yarnstsky e col.
demonstraram que seria possível predizer a susceptibilidade à dor pós-toracotomia avalian-
do o estado pré operatório do Controle Inibitório Nocivo Difuso, (DNIC), isto é, a redução
da dor com a estimulação dolorosa de uma área remota4. Os mesmos autores, demonstraram
que a intensidade da dor aguda pós-operatória é uma variável independente para a incidên-
cia de dor crônica pós toracotomia. Alguns traços de comportamento e padrões genéticos
também podem estar associados com a predisposição de alguns pacientes para a dor crônica
pós-operatória. Os anestesiologistas, ao identificarem os pacientes susceptíveis, e ao atu-
arem no tratamento da dor pós-operatória, com estratégias multimodais, iniciadas desde
o pré-operatório, minimizam os processos de sensibilização periférica e central e podem
modificar o desfecho de manutenção crônica da dor no pós operatório.
Cabe também aos anestesiologistas otimizar o seguimento e a identificação dos pacien-
tes com DCPO no pós-operatório para que medidas de controle da dor possam ser toma-
das o mais precocemente possível. A maioria dos pacientes com DCPO tem componente
neuropático e necessitam de medicações específicas para o controle da dor. Muitos destes
pacientes passam longos períodos de tempo sendo inadequadamente tratados muitas vezes
somente com opioides e anti-inflamatórios. Os anestesiologistas detêm o conhecimento e as
habilidades necessárias para modificar o quadro de sofrimento da DCPO.

26 | Educação Continuada em Anestesiologia


2. Etiologia/Mecanismos
A real natureza da DCPO ainda tem sido tema de grandes investigações. Enquanto,
até recentemente, acreditava-se ser ela especificamente de origem neuropática, pela
sua relativa frequência de aparecimento após procedimentos cirúrgicos associados
à lesões de estruturas nervosas, como toracotomias, mastectomias ou amputações,
aceita-se, atualmente, que a nocicepção desempenha, também, um importante papel
na sua gênese 5-8 .
A lesão cirúrgica propriamente dita é interpretada no neuro-eixo como um traumatismo
e a sensação dolorosa irá variar de acordo com a intensidade, qualidade e duração do estí-
mulo, o qual envolve nocicepção, inflamação e remodelação das células nervosas. Sensibi-
lização periférica e central, induzidas por citocinas pro-inflamatórias, neutrofinas e outras
substâncias são resultantes da dor intensa e persistente9.
Os sintomas da DCPO são variáveis e muitas vezes não específicos. Assim como carac-
terísticas de dor neuropática são constantes em pacientes que apresentam dor crônica pós
herniorrafias inguinais10, outros pacientes com diagnóstico estabelecido de DCPO não apre-
sentam nenhuma característica de dor neuropática ou qualquer outra alteração sensorial,
tornando muito difícil, com o atual conhecimento, estabelecer um conceito fisiopatológico
para todos os pacientes que desenvolvem DCPO11. É muito provável que os mecanismos pa-
togênicos que levam ao desenvolvimento da DCPO sejam múltiplos, necessitando futuros
estudos para melhor entender a extensão do problema e dos riscos5.
Bem mais conhecidos do que a etiologia, são os fatores que contribuem para a incidência
da DCPO, os quais podem ser específicos do paciente ou do procedimento cirúrgico12 e ainda,
estarem relacionados com os períodos pré, intra e pós-operatórios (tabela I). O reconheci-
mento desses fatores de risco é de grande importância, uma vez que muitos deles podem ser
suprimidos ou mesmo minimizados, quando se trata da prevenção do quadro.
A intensidade e duração da dor pós-operatória e as técnicas cirúrgicas extensas e com
maior probabilidade de causarem lesões nervosas são os fatores de risco de maior relevância
para o desenvolvimento de DCPO5,7. Muita atenção tem sido dada, recentemente para os
fatores genéticos, porém, nenhum deles foi identificado, ainda, como marcador específico
na geração de DCPO13.
Populações vulneráveis emocionalmente (ansiedade, depressão, catastrofização, hiper-
vigilância e inflexibilidade), que apresentam reduzida capacidade de lidarem com a dor, ou
agirem com eficácia na presença de pensamentos, emoções ou sintomas desagradáveis car-
regam um risco elevado de desenvolverem DCPO14. No entanto, o papel que esses fatores
desempenham na progressão da dor aguda para a crônica não está ainda definido15.
Baseados nos fatores de risco, como idade, sexo, tipo de cirurgia, extensão da dor pós-
-operatória e nível de ansiedade, tem sido desenvolvidos sistemas de escores para prever a
intensidade da dor pós-operatória11, ao mesmo tempo que, pelas dificuldades em tratá-la, até
mesmo, contra-indicações de procedimentos cirúrgicos não urgentes ou emergentes, nesses
casos, tem sido grandemente considerados16-18.

Dor crônica pós-operatória | 27


TABELA I
Fatores de Risco para DCPO
Fatores Pré-Operatórios:
Dor moderada a intensa, com duraçào maior do que 30 dias
Cirurgias repetidas
Catastrofização (vulnerabilidade psicológica)
Ansiedade
Mulher
Adulto jovem
Ganho secundário
Predisposição genética
Ineficiente controle inibitório da dor
Fatores Intra-operatórios:
Risco elevado de lesão do nervo
Fatores Pós-operatórios:
Dor aguda moderada a intensa
Radioterapia na área cirúrgica
Quimioterapia neurotóxica
Depressão
Vulnerabilidade Psicológica
Neuroticismo
Ansiedade

3. Síndromes Pós Cirúrgicas


Anormalidades sensoriais subseqüentes à uma lesão nervosa podem ser classificadas
em sintomas negativos e positivos, os quais podem ocorrer espontaneamente ou em res-
posta a um estímulo aplicado. Sinais negativos incluem perda de sensibilidade ou das
sensações dolorosas (anestesia e analgesia respectivamente) enquanto sinais positivos
incluem (formigamento, queimação, pontadas) que podem ser contínuos ou paroxísticos.
As sensações positivas evocadas por estímulos mecânicos ou térmicos incluem a hiperal-
gesia, alodinia e hiperpatia19.
A neuralgia pós-cirúrgica pode ser diagnosticada quando sensações dolorosas positivas
espontâneas ou evocadas são detectadas independentemente de sinais negativos. Estes si-
nais clássicos de dor neuropática apresentam-se com uma grande variabilidade individual
mesmo quando se refere a uma mesma lesão nervosa.

3.1. Dor Pós-Amputação


A incidência de dor crônica após amputação pode variar de 30% a 81% 20. Nenhum
grande estudo avaliou sistematicamente a incidência de “dor fantasma” após trauma, do-
ença vascular ou câncer. A presença de intensa dor pós-operatória na extremidade aumen-
ta a probabilidade de seu aparecimento (de 33% para 72% em três meses)21,22 . O efeito do
cirurgião na manipulação dos grandes nervos é raramente mencionada nos artigos e não
podemos avaliar efeito da ligadura ou clipagem versus secção isolada. O efeito benéfico da
analgesia epidural na prevenção da “dor fantasma” ainda é inconclusivo. Entretanto, uma

28 | Educação Continuada em Anestesiologia


recente análise de estudos na profilaxia da “dor fantasma” mostrou que, quando aplicada
em todo o período perioperatório, a analgesia peridural reduziu intensamente a incidência
de dor fantasma23. Outro estudo reportando os efeitos da cetamina na “dor fantasma” com
acompanhamento de seis meses, mostrou a incidência de 47% no grupo da cetamina e de
71% no grupo controle, mas essa diferença não foi estatisticamente significativa 24,25.
A injeção de anestésico local por cateter localizado na bainha nervosa inserido pelo cirur-
gião no momento da amputação é um método seguro e se mostrou excelente no controle da
dor pós-operatória26, mas não provou prevenir a “dor fantasma” ou do coto de amputação23.

3.2 Dor Pós-Toracotomia


A síndrome dolorosa pós-toracotomia ou neuralgia pós-toractomia é definida pela IASP
como uma dor que recorre ou persiste após uma incisão de toracotomia por no mínimo
dois meses da cirurgia. A dor pós-toracotomia é geralmente associada à lesões dos nervos
intercostais o do nervo frênico. A maioria dos pacientes queixam-se de parestesias, diseste-
sias, hipoestesias na região torácica ou dor no ombro ipsilateral, uma combinação de sinais
positivos e negativos indicando lesão nervosa e subsequente dor neuropática
A dor crônica pós-toracotomia pode ter uma incidência de mais de 50% segundo alguns
estudos26,27, sendo intensa em cerca de 3-5% , e com prejuízo funcional significativo em 50%
dos pacientes. Alguns relatos de estudos não aleatórios reportaram menor incidência uti-
lizando a técnica de toracoscopia vídeo-assistida ou mesmo com a incisão anterolateral ao
invés da clássica abordagem postero-lateral 28,29,30,31.
A intensidade da dor aguda pós-operatória parece ser, estatisticamente significativo, um
fator de predição de dor crônica32 . O uso da técnica de analgesia peridural em todo período
peri-operatório comparado com o uso desta técnica no período pós-operatório, quando foi
utilizado anestésico local, associado ou não ao opióide, mostrou, em 6 meses, diminuição da
incidência de 67% para 33% de dor crônica pós-toracotomia33. Outros estudos não demons-
traram este benefício.

3.3 Dor Pós-Colecistectomia


A dor pós-colecistectomia é comum, variando de 3 a 56%, dependendo do estudo, mas
menos frequente que a incidência de dor pré-operatória (83-100%). A síndrome dolorosa
pós-colecistectomia apresenta outros fatores além da dor abdominal, e pode ter como causa
mais de uma etiologia. Fatores patogênicos incluem: dor pós-operatória somática incisional,
disfunção pós-operatória do esfíncter de Oddi, dor causada por outra doença pré-operatória
não diagnosticada e dor causada por coledocolitíase34,35.
Fatores pré-operatórios de risco incluem: vulnerabilidade psicológica, sexo feminino e
longa duração de sintomas antes da cirurgia 22 . A história clássica de crises sintomáticas é
associada com menor risco de desenvolvimento de sintomas crônicos36.
Os estudos que levam em consideração a abordagem cirúrgica (aberta ou laparoscópica)
apresentam resultados conflitantes, parecendo não alterar de maneira significativa as quei-

Dor crônica pós-operatória | 29


xas de dor crônica pós-operatória dos pacientes. O achado de dor que persiste até a sexta
semana após a cirurgia é um forte preditor de cronificação35,37.
Apesar da frequência de sintomas após a colecistectomia a satisfação dos pacientes após
o procedimento é alta, com alguns autores reportando índices de satisfação maiores que
90%. Isto deve estar relacionado ao fato de que a maioria dos pacientes com dor abdominal
e colelitíase têm a sensação de que estariam piores se não tivessem sido operados38.

3.4 Dor Pós-Mastectomia


Mulheres que são submetidas à cirurgia de mama apresentam dor crônica pós-operatória
em uma série de localizações: parede torácica, mama, cicatriz (11-57%), dor de mama fantas-
ma (13-24%), ombro e braço (12-51%)39.
No artigo de Husted e col., no qual foram incluídas 163 mulheres submetidas a mastec-
tomia com dissecção de nódulos axilares, o achado foi de que 45% referiam dor cicatricial,
45% referiam dor em braço, pescoço e ombro e apenas 21% estavam sem sintomas (dor,
parestesias, linfedema e déficit de função do ombro) entre 1-5 anos após a cirurgia40.
Como fatores de risco pré-operatórios estão envolvidos depressão e ansiedade, além
da presença de dor pré-operatória41,42 . Os fatores de risco intra-operatórios estão relacio-
nados com o tipo de cirurgia realizada. A dor é mais comum quando a cirurgia tem cará-
ter conservativo do que quando é radical43; quando envolve implante de prótese mamária
(53%)44 e finalmente quando ocorre a realização de dissecção axilar aumentando a chance
de problemas no braço além de aumentar o stress psicológico 45. No período pós-operatório
a intensidade da dor pós-operatória e o número de doses de analgésicos utilizados foram os
maiores preditores de dor persistente, tanto na área da mama como no braço ipsilateral46. A
radioterapia adjuvante foi também outro fator de risco47.
A lesão neurológica, tanto cirúrgica como radioterápica, tem sido geralmente atribuída
como causa da dor após a cirurgia de mama45-47. As lesões envolvem nervos intercostais ou
o intercostobraquial e são representadas por sensações negativas e, mais raramente, positi-
vas; entre elas a dor. Alterações sensitivas foram encontradas em 48-84% na distribuição do
nervo intercostobraquial das mulheres submetidas a exploração axilar. Nestas pacientes a
neuralgia do intercostobraquial se desenvolveu em 25-50% das mesmas48,49.

3.5 Dor Pós-Herniorrafia Inguinal


A dor inguinal pós-herniorrafia é uma síndrome dolorosa que se desenvolve tardiamente
na região inguinal previamente operada, que se caracteriza por dor inguinal associado ou
não a parestesia que pode se irradiar para genitais e/ou coxa.
Dor crônica pós-herniorrafia é bem conhecida por médicos que trabalham em clínicas de
dor, uma vez que é uma cirurgia muito frequente. Inúmeros estudos avaliam sua incidência
que varia de 0 a 37%. A incidência geral desses estudos é de 11.5%, no entanto são geralmente
estudos de má qualidade50. Os pacientes que apresentam maior risco são os que estão sendo
reoperados e os que estão envolvidos em algum tipo de licença/queixa trabalhista51,52 . Os

30 | Educação Continuada em Anestesiologia


dados são inconclusivos no tocante à técnica cirúrgica empregada (aberta ou laparoscópica,
com ou sem tela), estando mais relacionados à experiência do cirurgião ou serviço embora
pareça haver uma maior incidência com uso de próteses53 e menor pela via laparoscópica54. A
extensão da dor em 1 e 4 semanas é um fator preditivo para a dor após 1 ano52 .
A dor crônica da região inguinal pode ser dividida em três tipos: neuropática, somá-
tica e de ejaculação55. A dor neuropática é a mais frequente e se relaciona com lesão dos
nervos ilioinguinal, iliohipogástrico e genitofemural; a dor somática está relacionada a
uma periosteite e/ou tendinite púbica por alguma fibrose, sutura na região da inserção do
ligamento inguinal e é mais intensa com movimentação, quando ocorre tração desse liga-
mento, e por fim, o terceiro tipo é a menos frequente (0,04%) e se caracteriza por sensação
dolorosa durante ejaculação.
A lesão neurológica é um fator etiológico frequente, sendo comprovada pela existência
de uma relação entre alterações sensoriais e dor crônica. Os nervos mais frequentemente
atingidos são: ramos femorais do genitofemural e o cutâneo lateral da coxa 56.

3.6 Outras Síndromes Dolorosas Crônicas Pós-Cirúrgicas


Existem relatos na literatura de queixas de sintomas sensitivos e de neuralgia após trata-
mentos endodônticos de molares inferiores e pré-molares e de extração cirúrgica de terceiro
molar inferior. Estas queixas estão geralmente relacionadas a lesões nos nervos lingual e
alveolar inferior. A intubação traqueal pode também causar lesão do nervo lingual isolada
ou associada com o hipoglosso57.
Cirurgias de seios nasais podem estar associadas a lesões de ramos do trigêmeo, apresen-
tando como resultado dor permanente na região ocular58.
Biópsia de linfonodos cervicais podem lesar o nervo acessório e nervos cutâneos do pes-
coço. Outros procedimentos relacionados à lesão iatrogênica do acessório são: excisão de
tumores cervicais, endarterectomia de carótida, plásticas de face, cirurgias radicais e irra-
diação do pescoço59.

4. Genética
Existe grande variabilidade em como as pessoas relatam suas experiências dolorosas.
Esta imensa variabilidade entre indivíduos pode ser atribuída a comportamentos aprendi-
dos, mas também à características inatas. Estudos em famílias e irmãos gêmeos com dores
crônicas evidenciam o papel da herança genética nestas síndromes. Estes estudos sugerem
que 30-60% da variação da apresentação de síndromes de dor crônica podem ser atribuídos
a fatores hereditários61.
A complexidade do comportamento doloroso nos seres humanos sugere que a herança
relacionada à dor seja resultado de uma interação complexa de genes, ou seja resultado de
uma herança poligênica não mendeliana.
Polimorfismo em nucleotídeos (SNP – do inglês: Single Nucleotide Polimorphism) em
genes específicos podem contribuir para aumentar ou diminuir a suscetibilidade à dor. Um

Dor crônica pós-operatória | 31


SNP é uma variação na sequência do DNA em uma única localização do genoma produzin-
do duas variantes alélicas.
Um grande número de variantes alelos de genes associados a processos dolorosos tem
sido identificado(tabela II). É natural supor que estas variantes alélicas, relacionadas à al-
terações no limiar doloroso, à síntese degradação de neurotransmissores ou a eficácia dos
analgésicos, estejam conectados diretamente a suscetibilidade que alguns paciente tem de
desenvolver dor crônica pós operatória (DCPO)62 .
Diversos estudos têm demonstrado que a intensidade da dor, a resposta aos analgésicos
ou o risco de desenvolvimento de dor crônica estão ligados a características geneticamente
herdadas. Num futuro não muito distante, poderemos a partir de exames pré-operatórios
identificar a presença de genes que aumentam o risco ou protegem o paciente da dor crô-
nica pós-operatória. Nos casos de cirurgia eletivas, avaliar o risco e o benefício e decidir
pela realização do procedimento. Poderíamos ainda individualizar os cuidados analgésicos
perioperatórios naqueles pacientes suscetíveis geneticamente com o objetivo de reduzir a
incidência ou a gravidade da DCPO.
Tabela II - Genes identificados alterar a incidência e/ou gravidade da dor pós-operatória

Gene Código Fenótipo

OPRM Receptor de Morfina Dor pós-operatória em cesarianas


GTP 5 Hidroxilase 1 (biossíntese
GCH1 Dor pós-laminectomia
serotonina, noradrenalina, dopamina)
CACNA2D3 Subunidade alfa 2 delta 3 de canal de cálcio Lombalgia crônica, dor pós-laminectomia

CACNG2 Subunidade gama de canais de cálcio DCPO pós-mastectomia


Dor em pacientes com lombalgia,
SCN9A Subunidade alfa de canais de sódio Nav 1.7
pancreatite crônica e pós-amputação.
Dor fantasma, lombociatalgia crônica, dor
KCNS1 Canais de potássio voltagem dependente
pós-amputação

5. Prevenção
Pelas grandes dificuldades encontradas no tratamento da DCPO, sem dúvida, a estraté-
gia potencial para sua prevenção seria a identificação dos fatores que possam predizer um
paciente suscetível1. Entretanto, ainda é impossível identificar com eficácia os pacientes
predispostos; predizer quem desenvolverá DCPO ou a natureza dessa dor ou mesmo esta-
belecer técnicas confiáveis e eficazes para sua prevenção6.
Várias medidas preventivas têm sido sugeridas, as quais vão desde uma precisa indica-
ção cirúrgica; opção por técnicas cirúrgicas menos invasivas ou “poupadoras de nervos”;
tratamento multimodal agressivo e precoce da dor pós-operatória; utilização preferencial
de anestesia e analgesia regional e mais recentemente a utilização de fármacos com efeitos
na sensibilização central como os gabapentinóides e a cetamina 5. Os efeitos dessas medidas,

32 | Educação Continuada em Anestesiologia


infelizmente, são com muita frequência, pequenos e as evidências ainda inconsistentes, ne-
cessitando futuros estudos para tão complexo quadro5.

6. Tratamento
A prevenção das lesões é a melhor estratégia, particularmente na ausência de terapia
comprovadamente validada para a neuralgia pós-cirúrgica estabelecida. A indicação e
habilidade cirúrgica e o treinamento são fatores importantes aqui, mas vão além dos obje-
tivos deste artigo. O tratamento agressivo da dor pós-operatória parece reduzir o risco de
desenvolvimento de dor crônica embora não haja estudos em larga escala que comprovem
esta estratégia.
A DCPO deve ser abordada de maneira parecida com outras síndromes dolorosas crônicas.
Uma vez instalada a síndrome dolorosa, o melhor tratamento para o paciente vai depender
do mecanismo etiológico. Dor neuropática é melhor tratada com antidepressivo(amitriptilina,
nortriptilina, duloxetina, venlafaxina), anticonvulsivantes (gabapentina, pré-gabalina, val-
proato de sódio). Dores nociceptivas podem ser manuseadas com analgésicos simples (pa-
racetamol, dipirona), ou opióides (tramadol, metadona, oxicodona)63.
A infiltração com corticosteroides com anestésicos locais pode ser empregada em alguns
casos com resultados muitas vezes satisfatórios.
A aplicação da radiofrequência pulsada sob o nervo acometido é uma opção interessante
por se tratar de técnica de neuromodulação, portanto não destrutiva. Alguns estudos mostra-
ram bons resultados64 mas, ainda são necessários mais estudos para avaliar estes resultados.
O uso de neuroestimulação medular e periférica pode ser empregada em casos refratá-
rios ao tratamento conservador particularmente na neuralgia pós-toracotomia e na dor do
membro fantasma com resultados encorajadores65,66.
Não existem evidências publicadas que definam um tratamento específico para a dor
pós-cirúrgica, mas devem ser abordadas de modo semelhante à outras síndromes dolorosas
crônicas. As técnicas ablativas como a neurectomia de nervos periféricos, particularmente
na dor crônica pós-hernioplastia, são técnicas de exceção, e têm sido utilizadas em casos
refratários, com bons resultados, segundo revisão sistemática publicada em 200567. Outros
tipos de lesões ablativas não têm indicação no manuseio destas síndromes, pois apresentam
morbidade inaceitável.
Não é sempre possível controlar a dor e outros sintomas adequadamente. Nestes casos os
pacientes irão requerer manuseio da dor com suporte psicológico para ajudá-los a enfrentar
seus problemas e reduzir o impacto em suas vidas diárias.

7. Futuro
A ausência de protocolos e tratamentos específicos para a reduzir a incidência e mi-
nimizar a dor dos pacientes com DCPO é preocupante. Algumas iniciativas começam
a surgir no âmbito das agências reguladoras como é o caso da ACTION: The Analgesic
Clinical Trial, Innovations, Opportunities and Networks. Uma parceria público-privada

Dor crônica pós-operatória | 33


associada a FDA (agência reguladora de medicamentos americana) com o objetivo de
aproximar pesquisadores e indústria para o desenvolvimento de analgésicos específicos
para o tratamento da DCPO68. Os inúmeros trabalhos avaliando o papel da analgesia pre-
ventiva na redução da DCPO falharam em demonstrar benefícios claros. No futuro estes
trabalhos deverão ser melhores desenhados preocupando-se em estratificar estes pacien-
tes de acordo com fatores de risco conhecidos, avaliar prospectivamente a sensibilidade à
dor através de testes padronizados no pré-operatório e manter a analgesia por um tempo
adequado. A maioria destes estudos mantém a analgesia somente pelo período operatório.
No futuro a análise genética dos pacientes poderá ser realizada rotineiramente no pré-
-operatório. Com base na predisposição para a DCPO poderemos manejar a analgesia
pré-operatória de maneira adequada e individualizada.

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Dor crônica pós-operatória | 37


Capítulo 03

Delirium pós-operatório
Vera Lucia Fernandes de Azevedo
Florentino Fernandes Mendes
Cláudia Regina Fernandes
Delirium pós-operatório
1- Introdução
O termo delirium vem do latim, cujo significado figurativo é “tornar-se louco”. Descreve-
-se que esta palavra foi usada pela primeira vez na linguagem médica por Aulus Cornelius
Celsus (25 B.C. – 50 A.C.)1. Embora haja relatos de que Hipócrates, considerado o pai da
medicina, que viveu na segunda metade do século V A.C.2, tenha descrito uma apresenta-
ção clínica compatível com quadro de delirium, diferenciando-o de outras condições, como
melancolia e mania.
Atualmente o delirium é definido como um disturbio agudo e flutuante da consciência,
com reduzida habilidade para focar, oscilando entre manutenção e alteração da atenção,
acompanhado por alterações na cognição e distúrbios de percepção, secundário a uma con-
dição médica geral (DSM-IV). Nas línguas neolatinas esta mesma condição é identificada
por meio da expressão “estado confusional agudo”3. A definição de delirium foi refinada
pela Classificação Internacional de Doenças (CID -10), que inclui: presença de distúrbio
psicomotor, distúrbio do ciclo sono-vigília, e distúrbios emocionais. Na maioria dos casos o
delirium tem uma característica transitória e autolimitada1,4, embora cada vez mais se pes-
quise a possibilidade da relação entre delirium pós-operatório, declínio da função cognitiva
e aumento da incidência de demência a longo prazo5.
O delirium pode ser considerado como uma disfunção cerebral aguda, análoga à insufi-
ciência renal ou à insuficiência respiratória aguda6.
A etiologia não está completamente esclarecida e provavelmente é multifatorial. A
deficiência colinérgica central aguda é uma das teorias mais aceitas. A diminuição da
atividade GABAérgica, anormalidades nas vias da serotonina e melatonina, hiperativi-
dade noradrenérgica, inflamação com aumento da liberação das interleucinas (IL) 1 e
6, levando a dano neuronal; e hipoperfusão cerebral, são outros possíveis mecanismos
patogênicos envolvidos1.
Por ser uma síndrome que frequentemente tem como fator causal determinadas condi-
ções clínicas ou intervenção cirúrgica, portanto, apresentando-se mediante sintomas cog-
nitivos e comportamentais, o delirium é frequentemente negligenciado, subdiagnosticado
e subtratado.
Esta condição é cada vez mais reconhecida como um importante evento adverso, que
acomete principalmente pacientes idosos no período pos-operatório, especialmente entre o
primeiro e terceiro dia após a cirurgia. Uma vez que o diagnóstico tenha sido estabelecido,
o principal objetivo da terapia é identificar causas orgânicas potencialmente tratáveis e pos-
sivelmente responsáveis pelo desencadeamento da síndrome7.
O objetivo deste capítulo é discorrer sobre o delirium pós-operatório, seus possiveis me-
canismos fisiopatológicos, os fatores desencadeantes e realçar os pontos chaves essenciais
para a prevenção, o diagnóstico e o tratamento, assim como discorrer sobre as evidências
atuais relacionadas ao prognóstico.

40 | Educação Continuada em Anestesiologia


2- Epidemiologia
O delirium é muito comum em pacientes idosos e hospitalizados, sua prevalência é da
ordem de 10%-24% em pacientes adultos não cirúrgicos, chegando a 37%-46% em pacientes
submetidos à cirurgia. Em Unidades de Terapia Intensiva (UTI), a prevalência relatada é da
ordem de 80-87%, constituindo-se em um indicador de prognóstico negativo. O delirium
pós-operatório (DPO) varia largamente, de 9% a 87%, dependendo da idade do paciente e
do tipo de cirurgia1,4,8.
Pacientes idosos submetidos a cirurgias ortopédicas, especialmente artroplastia total
de quadril, apresentam incidência de delirium pós-operatório da ordem de 25%–65%. A
presence desta síndrome constitui-se em fator preditivo de pobre recuperação da capacidade
funcional e da mobilidade9, além de estar associada com maior tempo de permanência
hospitalar, elevação dos custos e aumento da morbimortalidade4,10,11.
Embora o DPO seja descrito como um estado confusional agudo de caráter transitório,
muitos pacientes têm alta hospitalar apresentando delirium persistente. As taxas podem va-
riar de 32% no momento da alta hospitalar, 32% em seis meses e 41% em 1 ano após a alta12,13.
O que torna esta síndrome um preditor independente de disfunção cognitiva e funcional
um ano após a alta hospitalar, estando correlacionada com altas taxas de institucionalização,
ou seja, internação em lar para idosos. O que provoca tr�����������������������������������
anstornos familiares com necessida-
de de readaptação, além de gerar custos adicionais 14,15.

3- Fisiopatologia
A fisiopatologia do delirium após a anestesia e cirurgia ainda não está completa-
mente compreendida, podendo ser multifatorial. Mecanismos hipotéticos incluem:
desordens da neurotransmissão, inf lamação e estresse. Evidências suportam o papel
da reduzida transmissão colinérgica ou do excessivo tônus dapaminérgico no deli-
rium. Citocinas pró-inf lamatórias, como o fator de necrose tumoral (TNF) ou IL-1
também tem sido implicados, podendo alterar a neurotransmissão, aumentar a neu-
rotoxicidade, e aumentar a permeabilidade da barreira hemato-encefálica 16 . Fatores
genéticos também foram identificados como fatores de risco para o desenvolvimento
de delirium no pós-operatório17.
A idade do cérebro exibe alterações qualitativas e quantitativas no circuito neuronal,
o que poderia explicar a maior sensibilidade do paciente idoso ao delirium18,19. A hipótese
principal é o comprometimento reversível do metabolismo oxidativo cerebral associado a
alterações de múltiplos neurotransmissores20. Como a atividade neural aeróbica depende
da reserva de substratos como oxigênio, glicose e fosfatos, anormalidades nesse metabo-
lismo oxidativo comprometem a manutenção dos gradientes iônicos, alterando os poten-
ciais elétricos e a repolarização da membrana neuronal, levando à depressão da atividade
cerebral. A síntese de neurotransmissores e a depuração de neurotoxinas estão também
prejudicadas. Os neurônios colinérgicos, histaminérgicos e monoaminérgicos são extre-
mamente susceptíveis a essas alterações21.

Delirium pós-operatório | 41
Quanto à neuropatogênese do delirium, sabe-se que a etiologia, particularmente no
período pós-operatório, é geralmente multifatorial e de difícil de diagnóstico. Interações
entre fatores de risco do paciente, comorbidades e terapêutica polifarmácia pode precipi-
tar a síndrome.
Distúrbios em vários neurotransmissores têm sido implicados, mas a base neuroquímica do
delirium é mais frequentemente explicada por déficit na transmissão colinérgica (hipótese co-
linérgica). A acetilcolina tem importante papel na atenção, consciência e memória, sendo criti-
camente afetada na demência. Fatores não farmacológicos, tais como isquemia ou inflamação
no sistema nervoso central (SNC), podem também contribuir para o delirium pós-operatório.
Alterações na transmissão envolvendo o ácido gama-aminobutírico (GABA), glutamato, e
monoaminas (serotonina, noradrenalina, e dopamina) também têm sido correlacionadas com
a patogênese do delirium. Vários agentes sedativos e hipnóticos incluindo anestésicos inala-
tórios, propofol e benzodiazepínicos potencializam a transmissão GABA mediada no SNC.
Os transmissores do tipo monoamina têm proeminente papel neuromodulatório em regular a
função cognitiva, o despertar, o humor, sendo modulados por vias colinérgicas. O excesso de
transmissão dopaminérgica tem sido implicado no delirium hiperativo, que pode responder
a agentes antipsicóticos antagonistas do receptor da dopamina, tal como o haloperidol. Tem
sido observada relação inversa entre a atividade da acetilcolina e dopamina no delirium, sendo
que os campos terminais destes neurotransmissores se sobrepõem extensivamente no cérebro.
Fármacos antiparkinsonianos como a levodopa podem induzir delirium, e antagonistas da
dopamina podem tratar os sintomas7. Em relação à dopamina no cérebro, existe uma relação
recíproca entre as atividades colinérgicas e dopaminérgicas. No delirium, ocorre um excesso
de atividade dopaminérgica21. Aumentos e diminuições na sinalização da serotonina têm sido
associados com a síndrome, que pode ser induzida por inibidores seletivos da recaptação de
serotonina. Quantidades excessivas de noradrenalina circulante também têm sido associadas
com delirium hiperativo7.
A histamina é outro importante modulador das funções neurais. Tanto receptores hista-
minérgicos do tipo H1 quanto H2 alteram a polarização e a homeostase elétrica dos neurô-
nios hipocampais e corticais. Portanto, a ação de fármacos anti-histamínicos pode levar ao
delirium21.
Além do envolvimento das monoaminas e do ácido gama-aminoburítico na patogênese
do delirium, o aumento do cortisol, desencadeado pelo estresse anestésico-cirúrgico tam-
bém tem sido implicado22 . A alteração do ritmo circadiano do cortisol e das beta-endorfinas,
tem sido sugerido como uma possível explicação para o delírio causado por glicocorticoides
exógenos21. Desordens da melatonina também estiveram associadas a distúrbios do sono
em pacientes que apresentam delirium.������������������������������������������������
Além da alteração da homeostase dos neurotrans-
missores, existe ainda a hipótese de que mecanismos inflamatórios mediados por citocinas,
como a interleucina-1 e 6, também estão associados à patogênese do delirium 23,24.
Os mecanismos estruturais e as vias neuronais específicas envolvidas com o delirium são
desconhecidas. Estudos de imagem metabólica realizadas em pacientes com encefalopatia
hepática e estudos estruturais realizados em pacientes com traumatismo cranioencefálico

42 | Educação Continuada em Anestesiologia


ou com acidente vascular cerebral demonstraram que certas vias anatômicas podem desem-
penhar um papel mais importante do que outras. A formação reticular e suas conexões são
os principais locais de excitação e atenção. A via dorsal, projetando da formação reticular
mesencefálica ao tecto e ao tálamo, está envolvida no delírium. ���������������������������
A ruptura da barreira������
hema-
to-encefálica pode permitir a passagem de agentes neurotóxicos e citocinas inflamatórias
para o cerebro podendo contribuir para a ocorrência da síndrome22 .
A Figura 1 sumariza a ativação (setas ascendentes) ou inibição (seta descendente) de neu-
rotransmissores, citocinas, e hormônios, por vários fatores (medicações, síndrome de absti-
nência, desordem do sono, falência orgânica, inflamação, sepsis, entre outros), que podem
contribuir para ocorrência de delirium em pacientes idosos no período pós-operatório7.

Figura 1 – Hipótese para neuropatogênese do delirium em pacientes idosos cirúrgicos. Adaptado de: Mantz
J, Hemmings Jr. HC, Boddaert J. Case scenario: postoperative delirium in elderly surgical patients. Anesthesiology
2010;112:189-195.

4- Delirium e Dor
O delirium no período pós-operatório interfere com a recuperação funcional e normal-
mente ocorre entre o primeiro e terceiro dia de pós-operatório, com piora dos sintomas
durante a noite.
Existem controvérsias sobre a correlação entre a ocorrência de dor e delirium no pós-ope-
ratório. Enquanto alguns estudos não estabelecem associação25-28, outros certificam que a dor
intensa no pós-operatório é uma das causas de delirium hiperativo com agitação29.
Em um grande estudo de coorte realizado em 541 pacientes submetidos à cirurgia de colo
de fêmur, foi observado que 16% desenvolveram delirium no pós-operatório. Neste estudo, a
ocorrência de dor intensa foi associada com aumento de nove vezes no risco de desenvolver de-
lirium30. Outro estudo do tipo prospectivo acompanhou 333 pacientes com idade média de 74
anos, nos três dias de pós-operatório de cirurgia não cardíaca de grande porte, foi observado que
46% dos pacientes desenvolveram delirium. A dor em repouso e a aumento da dor basal no pri-
meiro dia de pós-operatório estiveram significativamente associados à ocorrência de delirium31.

Delirium pós-operatório | 43
Foi observado que a analgesia realizada com opioides em doses adequadas, não aumen-
tou o risco de desenvolver delirium, o contrário aconteceu com pacientes que apresentaram
escores elevados de dor em repouso. Possivelmente por afetar o ciclo de sono-vigília e os
níveis hormonais30.
A dor induzida por retenção urinária, não diagnosticada na Sala de Recuperação Pós-
-Anestésica (SRPA), é considerada causa de delirium32 .

5- Fatores de Risco
Os fatores de risco associados ao delirium podem ser divididos em fatores predisponentes,
normalmente não modificáveis, e precipitantes. Existem mais de 60 variáveis descritas na li-
teratura relacionadas ao desenvolvimento de delirium. O paciente que apresenta mais de três
destas variáveis tem aproximadamente 60% de chance de desenvolver a síndrome28.
Os principais fatores de risco estão descritos na Tabela 1.
Tabela 1 – Fatores de Risco para Ocorrência de Delirium no Pós-Operatório
Fatores Predisponentes
Reserva cognitiva reduzida
Demência | Depressão | Idade avançada
Reserva física reduzida
Doença aterosclerótica | Falência renal | Doença pulmonar | Idade avançada | Uso de beta-bloqueador
no pré-operatório
Sensório prejudicado (visão, audição)
Abuso de álcool
Desnutrição
Desidratação
Genótipo apolipoproteina E4
Fatores Precipitantes
Medicações ou abstinência de medicações
Anticolinérgicos | Relaxantes musculares | Antihistamínicos | Antiespasmódicos gastrointestinais
| Analgésicos opioides | Antiarrítmicos | Corticoides | Polifarmácia (> 6 tipos de medicações) | > 3
novas medicações durante a internação
Medicações psicotrópicas
Antidepressivos | Antiepilépticos | Antipsicóticos | Benzodiazepínicos
Dor
Hipotermia
Anormalidades eletrolíticas
Desnutrição
Desidratação
Mudança de ambiente (por exemplo: internação em UTI)
Distúrbios do ciclo sono-vigília
Uso de cateter urinário
Uso de contenção
Infecção
Adaptado de: Whitlock EL, Vannucci A, Avidan MS. Postoperative delirium. Minerva Anestesiol.
2011;77:448-456.

44 | Educação Continuada em Anestesiologia


Além dos fatores descritos, são também citados: alteração de ureia e creatinina, sexo
masculino, baixo nível educacional, estados de hipoperfusão, retenção urinária e fecal. Os
fatores precipitantes ambientais, como por exemplo, a permanência em unidade de terapia
intensiva, a falta de objetos de orientação (relógio, calendário, etc) e a baixa interação social
também podem contribuir22,27.
Cirurgias de longa duração e, alguns tipos específicos também são considerados fatores
precipitantes, tais como: cirurgias cardíacas, pela possibilidade de microembolismo e isque-
mia cerebral, e cirurgias ortopédicas devido à possibilidade de embolia gordurosa. Cirurgias
de catarata, devido uso de colírios com efeitos anticolinérgicos22 . Em cirurgias endourológi-
cas ou endoginecológicas o delirium pode ser precipitado por hiponatremia devido à exces-
siva absorção de água. A hipernatremia e a hipoglicemia em pacientes diabéticos também
podem ser causas de delirium no pós-operatório1.
No diagnóstico de delírium, esforços devem ser realizados para identificar a causa. O
delirium hipoativo também pode ocorrer em pacientes com doença de Parkinson. Pacientes
adictos a nicotina, etanol, opiodes ou benzodiazepínicos têm risco aumentado de desenvol-
ver delirium no pós-operatório. O Delirium Tremens também deve ser considerado e preve-
nido em pacientes alcoólatras33.
Fatores não relacionados ao paciente incluem o uso de contenção física, fármacos (in-
cluindo anestésicos) e privação do sono.
A ocorrência de Acidente Vascular Cerebral (AVC) no perioperatório é importante causa
de morbidade e mortalidade associado com cirurgias cardíacas e não cardíacas, particu-
larmente em idosos. O delirium, sem nenhum déficit motor ou sensitivo, pode ser a única
manifestação clínica de AVC neste contexto34.
Recentemente evidenciaram-se fatores preditores para o desenvolvimento de delirum
pós-operatório (1 a 3 dias) em pacientes acima de 65 anos, submetidos à artroplastia total
de quadril, que incluem: idade avançada, história de doença psiquiátrica prévia, diminuição
do status funcional, e diminuição da memória verbal. Estes achados foram observados no
pré-operatório mediante aplicação de testes neurocognitivos35.
Não existe consenso na literatura sobre a anestesia geral quando comparada com a anes-
tesia regional em relação à incidência de delirium pós-operatório22 .
Muitos fármacos usados na anestesia estão implicados como fatores que contribuem para
a ocorrência de delírium. O uso de anticolinérgicos para reversão do bloqueio neuromuscu-
lar está associado com delírium, particularmente em idosos36. A cetamina também tem sido
implicada37. Já o propofol tem sido associado com aumento da incidência de delirum du-
rante o despertar da anestesia em pacientes pediátricos38. A anestesia venosa com propofol,
realizada em idosos, para cirurgias laparoscópicas de longa duração esteve associada com
aumento na severidade, mas não na incidência de delirium no segundo e terceiro dia de pós-
-operatório, quando comparado a regime de anestesia baseado em sevoflurano39. Embora
recentemente tenha havido mudanças quanto ao uso do óxido nitroso em idosos, nenhum
dado suporta o aumento da incidência de delirium no pós-operatório desta população que
utilizou óxido nitroso durante a anestesia40.

Delirium pós-operatório | 45
Evidências apontam que a anestesia proporciona vasodilatação cerebral, que induz um
estado inflamatório e hipermetabólico, que resulta em estresse oxidativo, levando a anor-
malidades nos sistemas neuronais noradrenérgicos, histaminérgicos, dopaminérgicos e coli-
nérgicos, que por sua vez é considerado, o insulto inicial que culmina com as manifestações
de delirium no pós-operatório. A habilidade das células colinérgicas para sintetizar e liberar
acetilcolina pode está reduzida levando a desorientação e prejuízo da memória41. O aumento
resultante na liberação de dopamina contribui para causar agitação e alucinações42.
A sedação excessiva é um fator de risco para delirium. E, controlar a extensão e a pro-
fundidade da sedação poderia ser uma medida simples e econômica para diminuir sua in-
cidência43. Um estudo randomizado avaliou a profundidade da sedação mediante Índice
Biexprectal, em pacientes submetidos à cirurgia para correção de fratura de colo de fêmur,
sob raquianestesia A sedação foi realizada com infusão intravenosa de propofol. Foi obser-
vado que os pacientes tratados com níveis leves de sedação tiveram incidência de delirium
50% menor, quando comparados com o grupo submetido a sedação profunda (19% contra
40%; P = 0.02)44 .
Em Unidade de Terapia Intensiva, comparou-se o uso de benzodiazepínicos (midazolam,
lorazepam) com agonista alfa-2 adrenérgico (dexmedetomidina), usando o mesmo nível de
sedação, em períodos prolongados. Pacientes que receberam benzodiazepínicos apresen-
taram maior incidência e duração de delirium, quando comparados com os pacientes que
receberam agonista do receptor alfa-2 adrenérgico45,46.
A meperidina, opioide sintético, muito utilizado no passado para tratar a dor, também
pode precipitar delirium47.
Quanto às estatinas, estudos divergem quanto ao uso no pré-operatório. Em estudo de
coorte retrospectivo o uso de estatinas foi associado com aumento no risco de desenvolver
delirium em pacientes idosos submetidos a cirúrgias eletivas48, já em outro ensaio mais re-
cente, o uso de estatinas no pré-operatório foi associado à atenuação de delírium em pacien-
tes submetidos a cirurgia cardíaca49.
Outros autores dosaram a acetilcolinesterase no pré-operatório, e a butirilcolinesterase
no pós-operatório. Identificaram que a diminuição destas substâncias esteve associada com
a presença de delíirum no pós-operatório, em pacientes acima de 60 anos, submetidos a ci-
rurgia ortopédica. Sugerindo que a dosagem da colinesterase plasmática pode ser um candi-
dato a biomarcador para identificar pacientes com risco aumentado para o desenvolvimento
de delirium no pós-operatório50.
Foi observado que a fragilidade do idoso, observada através da avaliação do estado de
fragilidade (Frailty Status)51 no pré-operatório é fator de risco independente para o desen-
volvimento de delirium no pós-operatório preococe52. Esta avaliação leva em consideração
cinco critérios: perda de peso não intencional de mais de 4,5 kg no último ano; auto relato de
exaustão; força de preensão fraca; tempo de caminhada lento; e baixa atividade física51.
Em idosos, está descrito que fatores cirúrgicos também estão associados com o desencade-
amento de delirium no pós-operatório. As cirurgias ortopédicas, especialmente artroplastia
de quadril, cirurgias cardíacas e vasculares, estão mais frequentemente implicadas, embora

46 | Educação Continuada em Anestesiologia


qualquer cirurgia prolongada e de grande porte apresente risco. A tabela 2 descreve os fatores
cirúrgicos caracterizados como preciptantes.

Tabela 2 - Fatores Cirúrgicos Intraoperatórios, Preciptantes de Delirium no Pós-Operatório


Tipo de cirurgia
• Artroplastia de quadril
• Cirurgia cardíaca
• Cirurgia vascular
Complexidade da cirurgia
• Tempo cirúrgico
• Hipotensão/choque
• Arritmias
• Diminuição do débito cardíaco
• Cirurgias de emergência
Fatores operatórios
• Temperatura intraoperatória
• Administração de benzodiazepínicos e propofol
• Transfusão sanguínea
Fatores anestésicos
• Tipo de anestesia
• Duração da anestesia
• Uso de medicações psicoativas (meperidina)
Adpatado de: Rudolph JL, Marcantonio ER. Postoperative delirium: acute change with long-term implica-
tions. Anesth Analg 2011;112:1202–1211.

Recentemente buscou-se determinar a associação do tipo de procedimento cirúrgico


e anestesia na incidência de disfunção cognitiva pós-operatória, após procedimentos en-
volvendo sedação leve (cateterismo cardíaco), anestesia geral para cirurgia não cardíaca
(artroplastia total de quadril), e anestesia geral para cirurgia cardíaca com circulação extra-
corpórea (CEC). Foram aplicados oito testes neuropsicológicos no pré-operatório, no séti-
mo dia após o procedimento e três meses após. Observou-se que a incidência de disfunção
cognitiva pós-operatória no sétimo dia foi de 17% para artroplastia de quadril e 43% para
cirurgia cardíaca com CEC, em três meses a incidência foi em torno de 17% para os três gru-
pos estudados. Concluiu-se que a incidência de disfunção cognitiva pós-operatória em três
meses foi independente da natureza ou do tipo de procedimento cirúrgico ou anestésico.
O único fator associado com delirium no pós-operatório foi idade avançada, sugerindo que
futuros estudos devem focar na influência de fatores relacionados ao paciente53.

6- Manifestações Clínicas e Diagnósticas


Delirium é definido com um declínio agudo na atenção e cognição, representa uma
complicação séria em idosos após a anestesia e cirurgia e é preditivo de mortalidade em
seis meses em pacientes que foram internados em Unidade de Terapia Intensiva. Há su-
posições de que o delirium precede o desenvolvimento de disfunção cognitiva após a
internação em UTI10.

Delirium pós-operatório | 47
O delírium pode apresentar-se sob as formas hiperativa e hipoativa, esta última forma é
mais comum em pacientes idosos e frequentemente não diagnosticada54. As principais ma-
nifestações do delirium estão resumidas na tabela 2.
Tabela 3 – Manifestações Clínicas de Delirium em Pacientes Idosos Cirúrgicos, no Pós-Operatório
Principais Manifestações Clínicas do Delirium
Início agudo
Curso flutuante
Falta de atenção
Pensamentos desorganizados
Alteração da consciência
Déficit cognitivo (memória, orientação, funções executivas)
Alucinações (30% dos pacientes)
Distúrbios psicomotores
Letargia (delirium hipoativo)
Agitação (delirium hiperativo)
Alteração no ciclo sono-vigília
Distúrbios emocionais
Adapatado de: Mantz J, Hemmings Jr. HC, Boddaert J. Case Scenario: Postoperative Delirium in Elderly
Surgical Patients. Anesthesiology 2010; 112:189 -195.
Faz-se necessário distinguir as características do delirium, demência e depressão55, as
quais são apresentadas na tabela 3.
Tabela 4 – Características do Delirium, Demência e Depressão
Características Delirium Demência Depressão
Flutuação do nível
Tristeza, diminuição do
Distinção de consciência com Memória prejudicada
interesse nas atividades
diminuição da atenção
Início Agudo Gradual Variável
Curso Flutuante Crônico, progressivo Variação diurna
Consciência e Clara até estágios
Obnubilado, desorientado Não prejudicada
orientação avançados
Memória de curto prazo Memória de curto prazo Pobre atenção, porém
Atenção e memória
pobre, marcada desatenção pobre, sem desatenção memória intacta
Comum Menos comum
Presença de psicose? Menos comum
(alucinações simples) (alucinações complexas)
Adaptado de: Flinn DR, Diehl KM, Seyfried LS. Prevention, diagnosis, and management of postoperative
delirium in older adults. J Am Coll Surg 2009;209:261-268.

O diagnóstico em cenários pós-operatórios é baseado na aplicação de escalas validadas


na população americana. Entretanto, na prática atual, a maioria dos pacientes admitidos
em Unidades de Recuperação Pós-Anestésica e UTIs pós-operatórias não foram formal-

48 | Educação Continuada em Anestesiologia


mente avaliados para delirium ou disfunção cognitiva com testes apropriados no período
pré-operatório, o que torna o início dos sintomas incerto.
A escala CAM-ICU (Confusion Assessment Method for Intensive Care Unit Patients Scale) foi
validada em pacientes de UTI clínica como ferramenta confiável para detecção de delirium56
(Tabela 4). No entanto, para o ambiente de Sala de Recuperação Pós-Anestésica (SRPA),
demonstrou-se que a acurácia da ferramenta CAM-ICU para detecção de delirium é inferior a
Escala de Triagem de Delírium de Enfermagem (Nursing Delirium Screening Scale) – Tabela 5
e o Escore de Detecção de Delirium – Tabela 6, recentemente descritas57.
A Escala de Triagem de Delirium de Enfermagem (Nursing Delirium Screening Scale) in-
clui 5 itens com escores de 0-2: desorientação, comportamento inapropriado, comunicação
inapropriada, ilusões/alucinações e retardo psicomotor. Delirium é sugerido quando escore
≥ 2. O Escore de Detecção de Delirium tem sido adaptado para SRPA e inclui cinco ítens
estratificados de 0-7: orientação, alucinação, agitação, ansiedade e sudorese paroxística. O
diagnóstico de delirium é atribuído quando escore de detecção de delirium ≥ 8. A Escala
de Triagem de Delirium de Enfermagem e o Escore de Detecção de Delirium podem ser
ferramentas úteis, adicionando-as aos escores de avaliação da dor para garantir conforto e
restauração das funções cerebrais do paciente na SRPA.

Tabela 5 - Algoritmo Diagnóstico CAM (Confusion Assessment Method)


Avaliação dos
Sintomas
sintomas
1- Início agudo ou curso flutuante
Esta manifestação é usualmente obtida de um membro da família ou enfermeira e é
( ) negativo
expressa mediante uma resposta positiva para as seguintes perguntas: há evidência
de uma mudança aguda no estado mental quando se compara ao estado basal do
( ) positivo
paciente? Houve comportamento anormal flutuante durante o dia, com tendência a
vir e voltar, ou aumento e diminuição em severidade?
2- Falta de atenção
( ) negativo
Esta manifestação é demonstrada por uma resposta positiva as seguintes perguntas:
o paciente teve dificuldade de focar a atenção, por exemplo, distraindo-se facilmen-
( ) positivo
te, ou tendo dificuldade em acompanhar o que estava sendo dito?
3- Pensamento desorganizado
( ) negativo
Esta manifestação é demonstrada por uma resposta positiva as seguintes perguntas:
o pensamento do paciente estava incoerente, tal como desconexo ou conversação
( ) positivo
irrelevante, fluxo de ideias pouco claro ou ilógico, mudança de assunto imprevisível?
4- Alteração do nível de consciência
Esta manifestação é demonstrada por outra resposta diferente de “alerta” para as ( ) negativo
seguintes questões: Em geral, como você classificaria o nível de consciência deste
paciente? Alerta (normal), vigilante (hiperalerta), letárgico (sonolento, desperta fa- ( ) positivo
cilmente), estupor (difícil de despertar), ou coma (indespertável).
( ) sim
5- O diagnóstico de delirium pelo algorítimo CAM requer a presença das ma-
nifestações 1 e 2 e também 3 ou 4
( ) não
Adaptado de: Inouye SK, Van Dyck CH, Alessi CA, Balkin S, Siegal AP, Horwitz RI. Clarifying confusion:
the Confusion Assessment Method. Ann of Int Med 1990;113:941-948.

Delirium pós-operatório | 49
Tabela 6 - Escala de Triagem de Delirium de Enfermagem (Nursing Delirium Screening Scale)
Sintomas Avaliação dos sintomas
1- Desorientação
Manifestação verbal ou comportamental de não estar orientado no tempo ou ( ) 0 ( ) 1 ( ) 2
espaço ou não perceber pessoas no ambiente
2- Comportamento inapropriado
Comportamento inapropriado para lugar, para pessoas, ou ambos; por exem-
( )0 ( )1 ( )2
plo: puxar tubos ou vestimentas, tentando sair da cama quando é contraindi-
cado, e assim por diante
3- Comunicação inapropriada
Comunicação inapropriada para lugar, para pessoas, ou ambos; por exemplo: in- ( ) 0 ( ) 1 ( ) 2
coerência, não comunicabilidade, discurso sem sentido ou ininteligível
4- Alucinações/ilusões
( )0 ( )1 ( )2
Ver ou ouvir coisas que não estão lá; distorção visual de objetos
5- Retardo psicomotor
Respostas lentificadas, poucas ou nenhuma palavra/ações espontâneas. Por
( )0 ( )1 ( )2
exemplo: quando o paciente é manuseado, alguma reação é deferida, o paciente
está irresponsivo
Escore total ( ) ≥ 2 Sim
Delirium ( ) < 2 Não
Adaptado de: Gaudreau JD, Gagnon P, Harel F, Tremblay A, Roy MA. Fast, systematic, and continuous
delirium assessment in hospitalized patients: the nursing delirium screening scale. J Pain Symptom
Manage 2005;29:368-375.

Tabela 7 - Escore de Detecção de Delirium (Delirium Detection Score – DDS) – para SRPA
Sintomas Avaliação dos sintomas
1- Orientação ( )0
+ Orientado para tempo, lugar, e identidade de pessoas, capaz de se concentrar ( )1
+ Não tem certeza sobre o tempo, lugar, ou ambos, não é capaz de se concentrar ( )4
+ Não orientado no tempo, lugar ou ambos ( )7
+ Não orientado no tempo, lugar, e identidade pessoal
2- Alucinações ( )0
+ Nenhuma ( )1
+ Leves alucinações às vezes ( )4
+ Leve a moderadas alucinações permanentemente ( )7
+ Graves alucinações permanentemente
3- Agitação ( )0
+ Atividade normal ( )1
+ Atividade discretamente aumentada ( )4
+ Agitação moderada ( )7
+ Agitação grave
4- Ansiedade ( )0
+ Nenhuma ansiedade quando em respouso ( )1
+ Discreta ansiedade ( )4
+ Moderada ansiedade às vezes ( )7
+ Ataque agudo de pânico
5- Sudorese paroxística ( )0
+ Nenhuma sudorese
( )1
+ Sudorese quase não detectável, apenas nas palmas das mãos ( )4
+ Gotas de suor na testa ( )7
+ Intensa sudorese
( ) ≥ 8 Sim
Delirium ( ) < 8 Não
Adaptado de: Otter H, Martin J, Basell K et al. - Validity and reliability of the DDS for severity of delirium in
the ICU. Neurocrit Care 2005; 2:150-158.

50 | Educação Continuada em Anestesiologia


7- Prevenção
7.1 - Prevenção Não Farmacológica
A intervenção não farmacológica mostrou-se efetiva no cuidado específico da população
geriátrica hospitalizada de alto risco para delirium. Pacientes que receberam orientação
sistemática, atividades terapêuticas direcionadas para diminuir prejuízo cognitivo, mobili-
zação precoce, minimização no uso de fármacos psicoativos, prevenção da privação do sono,
aumento da comunicação, óculos e aparelhos auditivos, intervenção precoce para depleção
de volume circulante apresentaram incidência de delirium de 9,9% quando comparado a
15,0% no grupo que recebeu cuidado usual (OR 0,60 IC95%0,39 0,92). Nos pacientes que
desenvolveram delirium a exposição às medidas preventivas não alterou a severidade e a
duração do delirium ou qualquer complicação associada com o mesmo58.
Ensaio clinico randomizado, realizado em pacientes geriátricos, submetidos a correção
cirúrgica de fratura de colo de fêmur comparou o tratamento usual padrão com avaliação ge-
riátrica pré-operatória e planejamento dos cuidados perioperatórios. A consulta incorporou
recomendações padronizadas para garantir monitorização da oxigenação sistêmica e adequada
oxigenação cerebral, balanço eletrolítico e de fluidos, tratamento da dor, diminuição do uso de
fármacos psicoativos, otimização da função intestinal e vesical, nutrição, mobilização precoce,
prevenção de complicações pós-operatórias, estímulo ambiental apropriado e tratamento dos
sintomas de delirium. Neste estudo houve aderência de 77% à consulta geriátrica pré-opera-
tória e ocorrência de 32% de delirium quando comparado com 50% no grupo que recebeu o
tratamento usual padrão (OR 0,48 IC95% 0,23 – 0,98)59.
Ensaio clínico randomizado em pacientes submetidos a ventilação mecânica consistindo de
interrupção da sedação, comparou a incidência de delirium em 49 pacientes designados para
receber fisioterapia precoce e terapia ocupacional com 55 pacientes que receberam tratamento
padrão. Ocorreu menos dias de delirium na UTI durante a internação no grupo estimulado
precocemente. Os fatores de risco para delirium entre os grupos foram similares60.
Medidas não farmacológicas para a prevenção do delirium no pós-operatório podem ser
observadas na tabela 8.
Tabela 8: Medidas de Prevenção de Delírium no Pós-Operatório
Módulo Intervenções Pós-Operatórias
• Orientação (relógio, calendário)
Estimulação cognitiva • Evitar medicações ativas cognitivamente
• Óculos
Melhorar o estímulo sensorial • Próteses auditivas ou amplificadores
Mobilização • Mobilização precoce e reabilitação
• Eliminação de medicações desnecessárias
Evitar medicações psicoativas • Protocolo de manejo da dor
• Manejo de fluidos
Fluidos e nutrição • Monitorização dos eletrólitos e reposição
• Protocolo nutricional adequado
• Remoção precoce de cateteres urinários
• Oferta adequada de O2 para o sistema nervoso central, incluindo
Evitar complicações hospitalares O2 suplementar e transfusão para hematócrito muito baixo
• Protocolo de monitorização das complicações no pós-operatório
• Protocolos intestinais
Adaptado de: Rudolph JL, Marcantonio ER. Postoperative delirium: acute change with long-term implications.
Anesth Analg 2011;112:1202-1211.

Delirium pós-operatório | 51
Outras estratégias preventivas tais como preservação do sono e psicoterapia multimodal,
devem ser consideradas. A privação do sono é uma causa comum de delirium em pacientes
de UTI, sendo a melhora qualitativa e quantitativa um objetivo a ser perseguido61.
O impacto dos programas interdisciplinares na prevenção do delirium já tem sido ava-
liado na clínica médica e enfermaria de cirurgia; entretanto, a maioria dos estudos foram
realizados em cirurgias ortopédicas. Ensaio controlado e randomizado realizado em pacien-
tes acima de 75 anos, em diferentes enfermarias de especialidades cirúrgicas (ortopedia,
urologia e cirurgia digestiva), com intervenções de caráter multifacetadas, teve impacto na
redução do delirium no pós-operatório64. O programa foi interdisciplinar, composto de gru-
pos móveis e grupos pertencentes a enfermarias, cujam ações intervenconistas são descritas
a seguir:
Papel dos geriatras do Time Geriátrico Móvel (Mobile Geriatric Teams) nas enferma-
rias de cirurgia.
• Treinamento das enfermeiras para realização da CAM
• Treinamento dos cirurgiões da enfermaria para a prevenção do delíirum pós-operatório
• Realização de uma consulta geriátrica no pré-operatório
• Conferência trimestral sobre morbidade e mortalidade
• Papel das enfermeiras do Time Geriátrico Móvel
Realização de avaliações pré-operatórias
• Realizações de testes para diagnóstico de delirium
• Papel das enfermeiras da enfermaria cirúrgica
Realizar CAM um dia antes da cirurgia até 7 dias após a cirurgia
• Envolvimento na implantação do programa
• Envolvimento nas conferencias trimestrais sobre morbidade e mortalidade
Outros profissionais médicos da enfermaria
• Envolvimento na implantação do programa
• Envolvimento nas conferencias trimestrais sobre morbidade e mortalidade
7.2- Prevenção Farmacológica
O agonista alfa-2 adrenérgico dexmedetomidina aumenta o número de dias livre de de-
lirium em pacientes críticos sob ventilação mecânica, podendo ser uma boa estratégia para
sedação em UTI46.
O uso crônico de benzodiazepínico no pré-operatório está associado com delirium no
pós-operatório. Tal prescrição deve ser sempre questionada como medicação pré-anes-
tésica em idosos, no ato da avaliação pré-anestésica. Por outro lado, a retirada súbita de
benzodiazepínicos é uma causa clássica de delirium e deve ser evitada 33. Se existe opção
por administração de medicação pré-anestésica, o uso de hidroxizina ou clonidina deve
ser considerada.
A clonidina, agente alfa-2 agonista, exerce um importante efeito neuromodulador da
função cortical superior, aumentando a conectividade efetiva entre o locus ceruleus, o cór-
tex parietal e o córtex pré-frontal. Representa então, a primeira classe de fármaco sedativo

52 | Educação Continuada em Anestesiologia


capaz de aumentar o desempenho cognitivo62 . Em pacientes obesos mórbidos e jovens, em
quem foi usado clonidina como fármaco adjuvante na anestesia geral, foi observado desper-
tar mais rápido no final da anestesia associado a preservação da função cognitiva quando
comparado ao pré-operatório63.
Esforços clínicos na tentativa de reverter os fatores potenciais causadores de delirium
algumas vezes não têm sucesso. Pacientes que desenvolvem delirium, normalmente são
tratados com medicações psicoativas65. Devido a evidência limitada de que os agentes neu-
rolépticos melhorem desfechos nos pacientes com delirium pós-operatório, associado às di-
ficuldades de segurança com seu uso, esforços têm sido feitos para identificar uma estratégia
farmacológica para prevenir delirium no pós-operatório.
Estudos conduzidos com objetivo de encontrar fármacos que estabeleçam profilaxia
do delirium após cirurgias e anestesia têm focado na modulação das anormalidades dos
neurotransmissores, porém, têm falhado em demonstrar benefícios. Um grande ensaio clí-
nico randomizado utilizando baixas doses de droperidol na população idosa submetida à
cirurgia de fratura de colo de fêmur, não demonstrou benefícios na redução da incidência
de delirium66. Dois ensaios clínicos randomizados menores, também realizados com cirur-
gias ortopédicas falharam em demonstrar benefício com o uso de donepezil, um inibidor da
acetilcolinesterase67,68. São discutidas explicações para a falta de benefício observada nesses
estudos, dose inadequada do fármaco pode ter sido usada, a duração da terapia pode ter sido
curta, e por vezes não sendo iniciada antes da cirurgia42 . Outro inibidor da acetilcolineste-
rase (rivastigmina) foi utilizado em estudos clínicos randomizados, não sendo observado
benefícios na prevenção e tratamento do delirium pós-operatório. Assim, até este momento,
não se recomenda este tipo de medicação na prevenção ou tratamento do delirium69.
Por outro lado, foi observado que o uso do agonista alfa-2, dexmedetomidina, no intraope-
ratório esteve assoaciado com baixa incidência de delirium no pós-operatório70. Assim, o uso
de dexmedetomidina em pacientes com risco aumentado ou intermediário para delirium po-
dem ter benefícios que superam potenciais efeitos adversos. Especula-se que estes benefícios
também podem ser podem ser estendidos para a clonidina, um agente alfa-2 agonista menos
específicos que a dexmedetomidina, porém com propriedades cognitivas positivas62,63.

8. Tratamento
Estado de agitação associado a delirium requer pronta intervenção farmacológica.
O neuroléptico haloperidol é uma butirofenona antipsicótica bem tolerada, facilmente
titulável, não causa depressão respiratória, podendo ser utilizado para sedação. Devido
à sensibilidade aumentada de pessoas idosas a fármacos é aconselhável o início com
pequenas dosagens e titulação do efeito desejado. Em um estudo randomizado placebo
controlado, a profilaxia com haloperidol diminuiu a severidade e a duração do delirium
pós-operatório, mas não a incidência. O uso rotineiro de uma ferramenta de avaliação do
delirium pode reduzir o uso de haloperidol, induzindo a redução considerável na dosagem
e duração do tratamento7.

Delirium pós-operatório | 53
Considera-se que o tratamento mais efetivo do delirium é o diagnostico precoce e
prevenção. Tratamentos farmacológicos foram investigados, mas os estudos têm limi-
tações metodológicas. A Associação Americana de Psiquiatria recomenda evitar benzo-
diazepínicos como monoterapia para pacientes com delirium, exceto em síndrome de
abstinência ao álcool e aos próprios benzodiazepínicos71. Esta classe de fármacos pode
precipitar ou exacerbar delirium em muitos casos, além de apresentar efeitos adversos.
Ensaio clínico randomizado desenhado para comparar a eficácia de medicações antip-
sicóticas e lorazepam em pacientes com delirium foi interrompido por que o lorazepam
demonstrou uma prevalência mais alta de efeitos adversos como ataxia, aumento do
delirium e sedação excessiva72 .
Medicações antipsicóticas atípicas como a olanzapina e a risperidona são também
frequentemente usadas para tratar delirium. Quando comparada com os antipsicóti-
cos típicos essa classe farmacológica apresenta menor incidência de efeitos adversos
extrapiramidais. Em ensaio clínico randomizado, a olanzapina demonstrou melhora
da severidade do delirium, quando comparada com placebo73 . Porém sua eficácia se
mostrou atenuada em pacientes acima de 70 anos74 . Outro estudo clínico mais re-
cente comparou a risperidona com haloperidol. Houve melhora na severidade do de-
lirium em 75% no grupo haloperidol contra 42% no grupo risperidona. No entanto,
estatisticamente essa diferença não foi significativa e o estudo não apresentou poder
discriminatório suficiente75 .
Similar aos benzodiazepínicos, medicações com propriedades anticolinérgicas de-
vem ser evitadas na população de risco. Opioides não devem ser usados para sedação em
paciente agitado, devendo somente ser utilizado para tratamento da dor aguda. Embora
raro, existem relatos de que os bloqueadores histaminérgicos, como cimetidina e raniti-
dina causem delirium76.
A ocorrência de delirium é estressante para pacientes, familiares e cuidadores. O contro-
le farmacológico no paciente agitado ou assustado é desejável. Embora nenhum ensaio clí-
nico duplo cego e randomizado tenha estabelecido a eficácia e a segurança das medicações
antipsicóticas no manejo do delirium, a administração de antipsicóticos é referendada por
recomendação (guidelines) como parte da rotina clínica pela maioria dos especialistas em
terapia intensiva77,78.
Qualquer discussão sobre medicação antipsicótica, e sua categoria, é complicada por
uma variedade de diferenças de ação no receptor de cada uma delas. Em ensaio clínico,
pacientes que toleravam nutrição enteral na UTI foram randomizados para receber olanza-
pina ou haloperidol intravenoso. Ambos os grupos melhoraram com o tempo seus escores
de severidade do delirium. A necessidade de benzodiazepínicos, que reflete a necessidade
de sedação, diminuiu em ambos os grupos. Pacientes do grupo olanzapina tiveram menos
efeitos extrapiramidais do que os que receberam haloperidol79. Corroborando com a hipó-
tese de que todos os antipsicóticos convencionais típicos e atípicos parecem ser igualmente
eficazes no tratamento da psicose, e, no presente, não existe evidência de efeito diferencial
em casos de delirium.

54 | Educação Continuada em Anestesiologia


9. Prognóstico
O delirium é um indicador de prognóstico negativo em pacientes hospitalizados, com
consequente elevação da morbimortalidade. No momento é importante identificar e tratar
as causas do delirium, monitorar e modificar determinados fatores associados ao seu apare-
cimento e desenvolver condutas que influenciarão na obtenção de um melhor prognóstico.
É necessário mais estudos para evidenciar o papel do haloperidol em baixas doses como
terapêutica preventiva.
Existe a hipótese de que o a ocorrência de delirum contribui para o declínio da função
cognitiva em longo prazo. Esta hipótese não foi corroborada em recente estudo prospectivo,
realizado em pacientes acima de 65 anos que foram submetidos a cirurgia ortopédica de
grande porte (artroplastia total de quadril). Observou-se que 10% da população estudada
(480 pacientes) desenvolveu delirium pós-operatório, no entanto, neste pequeno grupo não
houve evidencia de declínio da função cognitiva três meses após a cirurgia 35. A resolução
dos sintomas pode ser mais lenta em pacientes com distúrbios prévios da função cognitiva,
com diagnóstico incorreto ou incompleto, apresentando doenças cerebrais estruturais pré-
vias, sendo tratados com altas doses de medicamentos psicoativos.
Demência e delirium estão intimamente relacionadas. Visto que os sintomas se sobre-
põem, sendo necessário tempo para obter uma valiosa avaliação neuropsicológica longe do
episódio agudo, e também porque os pacientes com demência são altamente predispostos
a desenvolver delirium. Outra característica é que metade dos pacientes que apresentam
delirium irá desenvolver demência. Finalmente, a demência pode algumas vezes ser difícil
de diagnosticar, porque pacientes idosos com demência na fase inicial podem algumas vezes
ser considerados normais devido a mecanismos compensatórios7.
Estudo em UTI demonstrou que quanto maior o número de dias de delirium maior a
mortalidade em um ano82 . Demonstrando que o assunto não deve ser subestimado.

10. Implicações Futuras.


Atualmente o mecanismo psicopatológico do delirium não está totalmente compreendi-
do, existe a clareza de que é multifatorial, estando as vias neurotransmissoras colinérgicas,
GABAérgica e as vias monoaminas frequentemente envolvidas. Esforços futuros com o
objetivo de esclarecer esses mecanismos e suas relações com outros fatores intrínsecos do
paciente, como demência, deverão favorecer o aumento do diagnóstico, melhorar o trata-
mento, e a prevenção.
Abordagens colaborativas e interdisciplinares, envolvendo anestesiologistas, cirurgiões,
geriatras e enfermeiros são essenciais para o ótimo manejo do paciente idoso de risco. A
ligação entre o período perioperatório, o delirium pós-operatório e a disfunção cognitiva
em longo prazo, representam uma importante área de pesquisa. O impacto de tais estra-
tégias, envolvendo o uso de fármacos, a avaliação das funções executivas e da memória no
pré-operatório, ou o controle dos fatores ambientais na prevenção do delirium na população
geriatra, constituem importantes linhas a serem desenvolvidas em futuras investigações7.

Delirium pós-operatório | 55
O delirium pode ter importantes consequências a longo-prazo, que atualmente estão sen-
do definidas mediante estudos epidemiológicos em grande escala, enquanto não se obtem
evidências concretas recomenda-se identificar os pacientes de risco, estabelecer a prevenção
e padronizar terapêuticas, utilizando estratégia interdisciplinar.
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Delirium pós-operatório | 59
Capítulo 04

Anestesia baseada em
evidências
Regina P. El Dib
Anestesia baseada em evidências
Provas científicas nos remetem a Medicina Baseada em Evidências (MBE), à Saúde Base-
ada em Evidências ou, ainda, à Economia Baseada em Evidências. Steven D. Levitt e Stephen
J. Dubner, economista e jornalista americanos, respectivamente, exploram o lado oculto e
inesperado do dia-a-dia1. Eles não só fazem perguntas simples, mas também inesperadas
como, por exemplo, qual é a melhor maneira de apanhar um terrorista? Será que a televi-
são aumentou os índices de criminalidade em Nova York? Ou, então, por que os médicos
não lavam as mãos? Eles buscam respostas por meio de evidências e, neste caso, utilizam
fundamentos econômicos até para mostrarem como os lutadores de sumô trapaceiam e os
corretores de imóveis nos enganam.
Até mesmo a religião vem utilizando evidências para comprovar ou não a existência de
Deus. Um exemplo disso são as evidências escrutinizadas pelos representantes da NASA
sobre a veracidade do Santo Sudário de Turim 2 . Será que houve contato do corpo de Jesus
no tecido que o envolveu? Ou será que houve uma radiação ou energia desconhecidas que
chamuscou o pano do nazareno? Segundo a NASA, utilizando-se de um aparelho chamado
VP-8, comprovou-se a tridimensionalidade da imagem demonstrando que o mecanismo
não ocorreu por contato direto2 . Nota-se que não apenas ganhamos com o desenvolvimento
da tecnologia, novos testes diagnósticos e avaliações econômicas em saúde, mas, também,
na identificação de questões a serem pesquisadas com maior rigor metodológico.
Desta forma, a Medicina Baseada em Evidências utiliza-se provas científicas existentes e
disponíveis no momento, com adequada validade interna (metodologia rigorosa) na aplica-
bilidade dos resultados na prática clínica (validade externa) para comprovar a efetividade,
eficácia e segurança de uma intervenção, bem como, verificar a sensibilidade e especificida-
de de testes diagnósticos e avaliação de fatores de risco por meio de estudos prognósticos.
Felizmente já existem a Cardiologia Baseada em Evidências3, Psiquiatria Baseada em
Evidências4, Fisioterapia Baseada em Evidências 5, Enfermagem Baseada em Evidências6,
dentre outros. A MBE não nega o valor da experiência profissional, mas propõe que esta seja
alicerçada em evidências.
Como praticamos, então, a Anestesiologia Baseada em Evidências? Primeiro há a neces-
sidade da transformação de uma informação (sobre etiologia, prevenção, tratamento, prog-
nóstico ou diagnóstico) em uma pergunta, geralmente composta por quatro itens-chave e,
que é internacionalmente conhecida, como PICO: Patients (participantes) – qual é a doen-
ça a ser estudada?; Intervention (intervenção) – qual é a intervenção a ser avaliada?; Control
group (grupo controle) – qual o grupo de comparação e; Outcomes (desfechos) – quais des-
fechos a serem mensurados?
Suponha que se queira saber sobre a eficácia e segurança da anestesia intravenosa com-
parada à inalatória na diminuição da mortalidade de pacientes submetidos a técnica de ven-
tilação monopulmonar. Neste exemplo, o P representaria os pacientes que se submeteram à
cirurgia com ventilação monopulmonar; I, anestesia intravenosa; C, anestesia inalatória e,
O, diminuição na ocorrência de taxas de mortalidade. Desta forma, a pergunta adequada e

62 | Educação Continuada em Anestesiologia


que ilustra explicitamente o que o investigador irá pesquisar seria “A anestesia intravenosa
é mais eficaz e segura quando comparada a anestesia inalatória na diminuição das taxas de
mortalidade em pacientes com ventilação monopulmonar?”. Veja que a pergunta segue a
ordem: [intervention A] versus [intervention B] for [health problem].
O segundo passo é identificar qual desenho de estudo melhor responde a questão clí-
nica para diminuir consideravelmente as chances de ocorrência de viés durante o plane-
jamento, condução, análise e interpretação dos resultados. No caso anteriormente citado
o melhor desenho de estudo seria uma revisão sistemática (RS) de intervenção, consi-
derada nível 1 de evidências de acordo com o Oxford Centre for Evidence-based Medicine
Levels of Evidence - Oxford CEBM7,8 e modificado por nós; seguido por um ensaio clínico
randomizado (ECR), nível 2 de evidências7,8. Veja a tabela 1 sobre os níveis de evidências
para tratamento e prevenção.
Tabela 1. Níveis de evidências para tratamento e prevenção7,8, modificado por nós de
acordo com as tabelas de 20017 e 20118 do Oxford Centre for Evidence-Based Medicine Levels
of Evidence.
Nível Terapia/Prevenção
1 RS de ECRs
ECR individual (com intervalo de confiança pequeno), ou estudo observacional com efeito
2
indiscutível
3 ECR individual (com intervalo de confiança grande), ou estudo controlado/estudo prospectivo
4 Estudos primários como os estudos coorte, coorte histórico, caso-controle e série de casos
5 Opinião de especialistas sem controle crítico ou baseada em fisiologia, ou pesquisas experimentais

Uma vez formulada a pergunta a ser respondida e identificado o melhor desenho de


estudo, o investigador poderá lançar mão das bases de dados eletrônicos para recuperar
pesquisas com nível 1 de evidencias (i.e., revisões sistemáticas). Uma das bases de dados
mais recomendadas para identificar se existe ou não uma revisão sistemática é a the Cochra-
ne Database of Systematic reviews (CDSR) da Biblioteca Cochrane disponível pela Biblioteca
Regional de Medicina (BIREME); no site http://cochrane.bireme.br/cochrane/main.
php?lang=pt&lib=COC9.
No exemplo citado anteriormente, realizamos uma estratégia de busca com todos os des-
critores referente ao termo ‘anestesia intravenosa’ e ‘anestesia inalatória’ e relacionamos com
os sinônimos do termo ‘ventilação monopulmonar’, a partir da busca nas bases de dados
Descritores em Ciências da Saúde (DECS, www.decs.bvs.br) e Medical Subject Headings
(MeSH, www.pubmed.com):

((Inhalation Anesthesia) OR (Inhalation Anaesthesia) OR (Insufflation Anesthesia) OR (Insufflation


Anaesthesia)) AND ((Intravenous Anesthesias) OR (Intravenous Anaesthesias) OR (Intravenous Anesthesia)
OR (Intravenous Anaesthesia)) AND ((one lung ventilation) OR (one-lung ventilation) OR (single-lung venti-
lation) OR OLV OR (one-lung anesthesia) OR (one-lung anaesthesia))

Anestesia baseada em evidências | 63


Nota-se que no primeiro conjunto, marcado de cor cinza, relacionamos todos os
descritores da anestesia inalatória utilizando-se o operador lógico booleano ‘OR’ com
os descritores da anestesia intravenosa e, associamos estes dois subconjuntos (anestesia
inalatória e anestesia intravenosa) por meio do operador lógico booleano ‘AND’. Após
isto, inserimos os parênteses externos, marcados na cor verde, para designar o conjunto 1
que envolve a intervenção e o grupo controle. O conjunto 1 foi relacionado, então, com
o conjunto 2 composto pelos descritores de ventilação monopulmonar (situação clínica),
também por meio do uso do operador ‘AND’.
Após este procedimento, “rodamos” a estratégia na base de dados CDSR. O intuito de
rodar a estratégia de busca primeiro na Biblioteca Cochrane fornece ao profissional mapear
rapidamente os estudos existentes com alto nível de evidências - revisões sistemáticas. Com
os títulos identificados na Biblioteca Cochrane, selecionamos os artigos em potencial para
uma leitura minuciosa. Caso não existam evidências sobre o assunto na CDSR, o profissio-
nal poderá lançar mão das principais bases de dados na área da saúde como a PUBMED
(http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/) e EMBASE (http://www.embase.com) para
identificar estudos em potencial sobre o tópico de interesse.
Ao localizar a revisão, o investigador deverá realizar uma análise crítica da evidên-
cia quanto à sua validade (proximidade da verdade), ao impacto (tamanho do efeito) e a
aplicabilidade na prática clínica, além de tomar suas decisões clínicas baseada na melhor
evidência científica. Neste caso, embora exista uma revisão sistemática10 que incluiu nove
ECRs envolvendo 291 pacientes, os autores concluem não haver evidências suficientes
para determinar qual técnica anestésica (intravenosa ou inalatória) é mais eficaz e segura
na diminuição da mortalidade em pacientes com ventilação monopulmonar e, solicitam a
realização de mais estudos primários, ou seja, ECRs para responder à pergunta.
Imaginamos agora que o intuito seja comparar a eficácia e segurança da anestesia inalatória
versus anestesia intravenosa nas taxas de mortalidade em pacientes submetidos à cirurgia de
revascularização miocárdica com ou sem circulação extracorpórea e, que após buscarmos na
base de dados CDSR não encontramos nenhuma revisão sistemática. Pois bem, segundo o
Oxford CEBM7,8, sobre os níveis de evidências para tratamento e prevenção, o estudo seguinte
mais apropriado seria um ECR, de preferencia com tamanho amostral acima de mil pacientes.
ECR com tamanho amostral grande é uma poderosa ferramenta, pois, além de ser prospectivo
e ter o processo de randomização, que assegura uma distribuição homogênea acerca das ca-
racterísticas demográficas dos pacientes selecionados para inclusão no estudo, possuem poder
estatístico. Claro que para cada questão clínica o tamanho amostral deverá ser calculado de
acordo com a prevalência do desfecho primário.
Para o cálculo do tamanho da amostra a ser utilizada na comparação do desfecho mortalidade
no grupo de anestesia inalatória (AIN) e no grupo da anestesia intravenosa (AIT) considera-se
então a comparação de duas proporções por meio da relação referida por Pocock,198311:

64 | Educação Continuada em Anestesiologia


Onde Θ = Z a + Z b sendo Z a e Z b respectivamente os escores de confiança liga-
dos aos intervalos de confiança (IC) (1-a) x 100% e (1-b) x 100%. Assumindo-se, por
exemplo, a prevalência de “mortalidade” no grupo AIN e AIT nos valores de 0,39 e 0,49,
respectivamente, e dada à intenção de realizar-se a comparação a um nível de significância
alfa de 5% com poder estatístico de 95% (1-b) e um teste de hipótese bicaudal temos, que
Θ = Z a + Z b = 1,65+ = 2,94 o que recomenda a utilização de, no mínimo 637
participantes em cada grupo para detectar uma possível diferença entre as técnicas anes-
tésicas nas taxas de mortalidade em pacientes submetidos à cirurgia de revascularização
miocárdica com ou sem circulação extracorpórea.
Outrossim, na ausência de revisões sistemáticas ou mesmo ensaios clínicos randomizados,
o investigador terá duas opções: a) basear-se em estudos de nível mais baixo como os estudos
controlados e coortes, porém o risco de ocorrência de vieses nos resultados deste estudo é
alto devido à ausência do processo de randomização sendo considerado nível 3 e 4 de acordo
com o Oxford CEBM7,8 e, modificado por nós (tabela 1) ou; b) desenhar um ensaio clínico
randomizado. Mesmo que o tamanho amostral seja insuficiente, ou seja, que não há pacientes
suficientes para chegar ao número desejado, o ECR conduzido no hospital de sua instituição
servirá como parte do quebra-cabeça de uma revisão sistemática. Em outras palavras, ECRs
comparando as mesmas intervenções e grupos controles, e avaliando os mesmos desfechos
para uma determinada situação clínica serão possivelmente plotados em uma metanálise e,
consequentemente, aumentarão o tamanho amostral da análise estatística podendo detectar
uma diferença estatisticamente significante entre os grupos estudados.
Agora, suponha que se queira saber sobre a eficácia da hipotermia induzida quando compa-
rada a normotermia na diminuição da mortalidade em pacientes submetidos à cirurgia cere-
bral. Formulada a pergunta clínica composta pelos quatro itens-chave (i.e., PICO), o primeiro
passo seria identificar o melhor desenho de estudo com o objetivo de reduzir a probabilidade
de resultados falsos e, neste caso, seria uma revisão sistemática de intervenção. A segundo
etapa é a elaboração de uma estratégia de busca com os termos referentes a intervenção de
interesse e a situação clínica, e rodá-la na CDSR para identificar a existência do estudo em
questão. Veja a estratégia de busca competente a esta questão clínica:
(Hypothermia OR Hypothermias OR (Artificial Hibernation) OR (Hypothermia Induced) OR (Circu-
latory Arrest Deep Hypothermia Induced) OR (Refrigeration Anesthesia) OR (Mild Hypothermia) OR
(Mild Intraoperative Hypothermia) OR Cryotherapy OR Cryosurgery OR Cooling OR (Hypothermic per-
fusion) OR (extracorporeal cooling) OR (topical cooling) OR (cold therapy) OR (cold therapies) OR cryo-
surgery OR cryosurgeries) AND ((Neurosurgical Procedures) OR Neurosurgery OR (Brain Neoplasms)
OR (Brain Injuries) OR (Traumatic Brain Hemorrhage) OR (Cerebrovascular Trauma) OR (Intracranial
Arterial Diseases) OR (Cerebral Hemorrhage) OR (Intracranial Hemorrhages) OR (Penetrating Head Inju-
ries) OR (Cerebrovascular Disorders) OR (Intracranial Aneurysm) OR (Brain Injury) OR (Brain Injuries)
OR (Brain Contusion) OR (Brain Contusions) OR (Diffuse Brain Injuries) OR (Diffuse Brain Injury) OR
(Focal Brain Injury) OR (Focal Brain Injuries) OR (Traumatic Brain Injuries) OR (Traumatic Brain Injury)
OR (Traumatic Encephalopathies) OR (Traumatic Encephalopathy) OR TBI OR TBIs OR (Brain Trauma)
OR (Brain Traumas) OR (Brain Lacerations) OR (Brain Laceration) OR (Cortical Contusion) OR (Corti-
cal Contusions) OR (Post-Concussive Encephalopathies) OR (Post-Concussive Encephalopathy) OR (Post
Concussive Encephalopathy) OR (Post Concussive Encephalopathies) OR (Post-Traumatic Encephalopa-
thies) OR (Post-Traumatic Encephalopathy) OR (Post Traumatic Encephalopathies) OR (Post Traumatic
Encephalopathy) OR (Acute Brain Injury) OR (Acute Brain Injuries))

Anestesia baseada em evidências | 65


É preciso chamar a atenção ao leitor que embora a estratégia de busca acima seja comple-
xa, ela é apropriada para quando o investigador estiver realizando uma revisão sistemática
e necessita escrutinizar toda a literatura das bases de dados na área da saúde, inclusive na
PUBMED e EMBASE. Para pesquisar apenas se há uma revisão sistemática na CDSR, o
leitor poderá elaborar uma estratégia mais simples como a apresentada a seguir:
(Hypothermia OR Cooling) AND (Brain Injuries)
Com a estratégia simples é possível localizar a seguinte revisão sistemática publicada
na CDSR: “Cooling for cerebral protection during brain surgery”12 . Os autores da revisão
incluíram quatro ECRs com um total de 1.219 pacientes. Embora, a quantidade de pacientes
pareça ser grande, não houve evidências suficientes para determinar a eficácia da hipotermia
na neuroproteção em pacientes submetidos à cirurgia cerebral comparado a normotermia
e, os autores solicitam a realização de mais ensaios clínicos para estabelecer se há algum
benefício desta técnica.
Este cenário de ausência de evidencias na área da saúde é muito comum. Em 2004
realizamos um estudo para avaliar as conclusões das revisões sistemáticas realizadas pela
Colaboração Cochrane13. De 1.064 revisões avaliadas, 47,83% concluíram evidencias in-
suficientes para recomendar ou refutar a intervenção de interesse e, os autores solicitaram
por mais estudos13.
As revisões sistemáticas têm sido uma visão produtiva desde o apelo de Archibald Le-
man Cochrane para a boa prática clínica, quando escreveu em 1979 “É certamente uma
grande crítica para nossa profissão que não tenhamos organizado um sumário crítico,
por especialidade ou subespecialidade, e atualizado periodicamente, de todos os ensaios
clínicos aleatórios14”. Isto levou à criação, na década de 1990, de uma colaboração inter-
nacional para produzir e disseminar revisões sistemáticas na área da saúde chamada Co-
laboração Cochrane.
Em nosso estudo13 concluímos que, embora as revisões sistemáticas sejam consideradas
o melhor nível de evidências para a tomada de decisão na saúde, a maioria das revisões Co-
chrane destacam a ausência de evidências ou evidências insuficientes em torno das questões
sobre cuidados de saúde.
A estratégia para lidar com a ausência de recomendação em revisões sistemáticas (ou
seja, a falta de estudos primários) foi sugerida como “para aumentar a consciência da neces-
sidade de se ter estudos primários de alta qualidade, as revisões Cochrane deveriam incluir
protocolos de ensaios clínicos relevantes”13. As revisões sistemáticas utilizam métodos ri-
gorosos para identificar, avaliar criticamente e sintetizar os achados de estudos relevantes15.
No entanto, apesar das revisões sistemáticas apresentarem uma estrutura metodológica
mais adequada criada até o momento para mapear as evidencias de um determinado assun-
to, verificamos que o “combustível” que as alimenta, ou seja, os estudos primários como os
ensaios clínicos para intervenção e estudos coortes para prognóstico, são escassos.
Desta maneira, a grande crítica da era da Medicina Baseada em Evidências é que não
tenhamos produzido estudos primários em massa e de alta qualidade, com a participação de

66 | Educação Continuada em Anestesiologia


centros em todo o mundo e, de acordo com os protocolos pré-definidos da Colaboração Co-
chrane, para abranger todas as revisões sistemáticas que não oferecem evidencias suficientes
para a prática clínica.
A Anestesia Baseada em Evidências pode mudar este cenário produzindo ECRs bem
delineados daquelas revisões sistemáticas já existentes, porém que recomendam mais es-
tudos para determinar a eficácia, efetividade e segurança de uma intervenção. Além disso,
implementar os conceitos da MBE no ensino é fundamental para disseminar a cultura da
boa prática clínica.

Referências bibliográficas:
1. Levitt S, Dubner S - Freakonomics: O Lado Oculto e Inesperado de Tudo Que Nos Afeta. Rio de
Janeiro, Campus, 2005.
2. Benitez JJ - O Enviado: a História de Jesus de Nazaré Recontada com Base nas Investigações Científicas
Realizadas pelos Técnicos da NASA no Santo Sudário. 7ª Ed. Rio de Janeiro, Record, 1994.
3. Yusuf S, Cairns JA, Camm AJ et al. - Evidence-Based Cardiology. 3rd Ed.: Wiley-Blackwell, 2010.
4. Lawrie SM, Scott AIF, Sharpe MC - Evidence-based psychiatry - do psychiatrists want it and can they
do it? Health Bull (Edinb), 2000; 58: 25-33.
5. Centre for Evidence Based Physioterapy. Disponível em: http://www.cebp.nl/
6. Evidence-Based Nursing. Disponível em: http://ebn.bmj.com/.
7. Centre for Evidence Base Medicine - Oxford Centre for Evidence-based Medicine. Levels of Evidence
2011. Disponível em: http://www.cebm.net/index.aspx?o=1025
8. Centre for Evidence Base Medicine – CEBM (Centre for Evidence Base Medicine) Levels of Evidence.
http://www.cebm.net/index.aspx?o=5653
9. Cochrane BVS. Disponível em:
10. http://cochrane.bireme.br/cochrane/main.php?lang=pt&lib=COC
11. Bassi A, Milani WRO, El Dib R et al. - Intravenous versus inhalation anaesthesia for one-lung
ventilation. Cochrane Database Syst Rev, 2008, 16: CD006313.
12. Pocock SJ - Clinical Trials: a Practical Approach. New York, John Wiley, 1983.
13. Milani WRO, Antibas PL, Prado GF - Cooling for cerebral protection during brain surgery. Cochrane
Database Syst Rev, 2011, 5: CD006638
14. El Dib RP, Atallah NA, Andriolo RB - Mapping the Cochrane evidence for decision-making in health
care. J Eval Clin Pract, 2007; 13:689-692.
15. Cochrane AL. 1931-1971: a critical review, with particular reference to the medical profession, em:
Medicines for the year 2000. London, Office of Health Economics, 1979.
16. Cook DJ, Mulrow CD, Haynes RB - Systematic reviews: synthesis of best evidence for clinical
decisions. Ann Intern Med, 1997; 126:376-380.

Anestesia baseada em evidências | 67


Capítulo 05

Monitorização
hemodinâmica e
reposição volêmica no
transplante hepático
Fábio Scalet Soeiro
Bruno Salomé de Morais
Rodrigo Pereira Diaz André
Monitorização hemodinâmica e reposição volêmica
no transplante hepático

Introdução
Eventos adversos no intraoperatório estão associados de forma independente a pior
prognóstico após o transplante hepático (TH)1. Alterações hemodinâmicas abruptas
são frequentes durante o procedimento, quase sempre secundárias a eventos cirúrgi-
cos como o pinçamento da veia cava, sangramentos agudos ou reperfusão do enxerto.
Arritmias cardíacas podem também ocorrer, particularmente na reperfusão. Falências
ventriculares direita ou esquerda e eventos embólicos de grande monta são causas bem
conhecidas de mortalidade.
Devido à pluralidade de apresentações dos pacientes no momento do transplante e le-
vando em consideração o porte cirúrgico em questão, deve-se utilizar o melhor conjunto de
monitorização possível. A extensão da monitorização do paciente durante o TH depende
da história clínica do receptor, da sua condição fisiológica na chegada à sala de cirurgia e da
técnica cirúrgica a ser empregada (piggyback ou exclusão vascular total, com ou sem bypass
venovenoso). Além da monitorização básica (oximetria de pulso, medida da temperatura
central, cardioscópio de cinco derivações com análise do segmento ST, capnografia com
análise de gases e débito urinário), deve-se monitorizar a pressão arterial de forma invasi-
va por meio de um ou dois sítios de punção (artéria radial e/ou artéria femoral) em todos
os pacientes. Apesar da monitorização invasiva variar de acordo com a disponibilidade do
serviço, a decisão de sua utilização deve ser baseada nos benefícios que pode oferecer, riscos
e condição clínica do paciente. A interpretação adequada dos monitores, associada à expe-
riência de quem os interpreta, pode ser determinante para o desfecho do caso. A análise dos
parâmetros deve nos orientar na escolha dos fármacos e intervenções, bem como individua-
lizar a reposição volêmica. Essa por sua vez deve ser planejada e reavaliada a cada momento,
segundo os dados provenientes da monitorização, em cada etapa do procedimento. Pode-se
dividir didaticamente a monitorização por sistemas.

Sistema Cardiovascular
A monitorização da pressão arterial de forma invasiva é mandatória. Sua medida a partir
da artéria radial pode subestimar a pressão aórtica em estados hipotensivos, principalmente
durante a reperfusão. A pressão sistólica monitorizada na artéria femoral é significativamen-
te mais alta do que a obtida no sitio radial e o uso de vasoconstritores pode acentuar essa
diferença2, com grandes variações interindividuais. A linha femoral pode porém não ser útil
no caso raro de clampeamento da aorta para realização da anastomose da artéria hepática.
Alguns centros utilizam os dois sítios simultaneamente, um para coleta de amostras de san-
gue e outro para a monitorização. A cateterização da artéria femoral pode ser útil também
para a instalação de monitor de débito cardíaco com termodiluição transpulmonar.

70 | Educação Continuada em Anestesiologia


Devido às múltiplas causas de hipotensão e instabilidade hemodinâmica durante a ci-
rurgia, o acesso à função cardíaca, à pré-carga e à pós-carga é essencial. A cateterização da
artéria pulmonar é considerada há longa data o padrão-ouro nesse sentido. Com o cateter de
Swan-Ganz podem-se obter medidas relacionadas à contratilidade, como: débito cardíaco
(DC), índice cardíaco (IC), volume sistólico (VS) e fração de ejeção do ventrículo direito
(FEVD). Obtêm-se também: análise da pré-carga; com a pressão venosa central (PVC),
pressão de oclusão da artéria pulmonar (PoAP) e o volume diastólico final do ventrículo
direito (VDFVD); e, ainda, o cálculo da resistência vascular sistêmica (RVS), que permite
avaliar a pós-carga. O cateter de artéria pulmonar é também imprescindível na análise da cir-
culação pulmonar, a partir das medidas das pressões de artéria pulmonar (PAPsist, PAPm,
e PAPdiast) e da resistência vascular pulmonar (RVP). Essa avaliação ganha importância
nos pacientes com hipertensão portopulmonar e síndrome hepatopulmonar. Ainda com
o cateter de Swan-Ganz podem-se avaliar medidas perfusionais como a saturação venosa
mista (SVO2) e, assim, equacionar a relação entre oferta e consumo de oxigênio. O grau de
informação obtido com o cateter de artéria pulmonar depende do refinamento do monitor
e da proficiência do operador. A falta de evidência de que o mesmo altere a sobrevida em di-
versos contextos3-7 e a incidência de complicações com seu uso desencorajou alguns centros
em relação à sua utilização8. Há, porém, artigos que não revelam aumento na mortalidade
associada ao uso do Swan-Ganz, sendo um deles um grande estudo multicêntrico, randomi-
zado com 1.041 pacientes5.
Independentemente da análise em relação à alteração ou não da mortalidade, é neces-
sário ater-se às informações úteis que o dispositivo provê. Embora se saiba que as medi-
das pressóricas “estáticas” (PVC, PoAP) careçam de acurácia9-11 na análise da pré-carga, o
cateter de Swan-Ganz fornece um universo de informações essencial para o manuseio de
pacientes tão complexos como os receptores no transplante. Obtêm-se medidas acuradas
de contratilidade, de pós-carga e mesmo de pré-carga no contexto do TH, quando se usam
cateteres modificados que permitem aferir a FEVD12 e calcular o VDFVD12,13 (Figura 1).

Figura 1 - Monitor de débito cardíaco


acoplado ao cateter de Swan-Gans
durante transplante hepático

Monitorização hemodinâmica e reposição volêmica no transplante hepático | 71


Atualmente, é foco de grande debate o uso das medidas de DC minimamente invasi-
vas. São inúmeros os monitores que se aplicam a essa modalidade, alguns deles já tendo
sido estudados no caso de TH, demonstrando erros percentuais elevados14. Principalmente
aqueles que determinam o DC com base na análise do formato da curva de pressão invasi-
va sem calibração parecem apresentar pior correlação com as medidas de DC obtidas com
o Swan-Ganz. Esse fato é ainda mais significativo nos pacientes com resistência vascular
sistêmica baixa, como pacientes sépticos e os Child B e C14.Quando comparadas técnicas de
DC a partir da análise da curva de pressão invasiva, os monitores calibrados se apresentam
menos influenciados pela resistência vascular sistêmica, porém ainda assim com acurácia
ruim quando comparados ao cateter de artéria pulmonar em transplante de fígado15. Me-
recem ressalva as técnicas de DC transpulmonar (Figura 2). Além de proverem medidas
com reduzidos erros percentuais na comparação com as outras técnicas vigentes de débito
minimamente invasivo16-18, fornecem informações importantes como o volume diastólico
global das quatro câmaras cardíacas e a quantidade de água extravascular pulmonar. Com
essas medidas pode-se refinar o manuseio volêmico, bem como individualizar o momento
da extubação traqueal, com medida fidedigna do risco de edema pulmonar18-22 . Estudos
recentes, inclusive, ressaltam a medida da água extravascular pulmonar como um preditor
de progressão da injúria pulmonar e também de mortalidade, podendo até mesmo guiar a
terapia de fluidos nos pacientes críticos e diferenciar a etiologia do edema pulmonar23-25.

Figura 2 - Monitor de débito


cardíaco transpulmonar durante
transplante hepático
Durante o TH monitoriza-se de forma acurada a volemia dos pacientes e isso pode ser
feito por meio de medidas dinâmicas e do ecocardiograma transesofágico (ETE). As me-
didas dinâmicas (variação da pressão sistólica, variação da pressão de pulso, variação do
volume sistólico) já foram investigadas em cirurgias hepáticas26 e também no transplante
de fígado. Sua acurácia foi demonstrada em algumas pesquisas27,28, mesmo durante a fase
anepática do transplante27 e também no pós-operatório28, não sendo, no entanto, observada
em outras29. O ETE tem sido usado de maneira crescente na monitorização cardiovascular

72 | Educação Continuada em Anestesiologia


do TH. É relativamente pouco invasivo e provê informação visual das valvas e cavidades
cardíacas, bem como análise da função miocárdica. É capaz de fornecer informações sobre a
pré-carga e detectar possível isquemia miocárdica, além de possibilitar diagnóstico imediato
de embolização de ar ou trombos intracavitários30. Apesar de todas essas informações úteis,
o ETE não substitui o cateter de artéria pulmonar e deve ser usado de forma complementar
ao Swan-Ganz, mesmo porque seu emprego no pós-operatório fica muito restrito31.

Sistema nervoso central


Os pacientes candidatos a TH podem exibir as formas mais variadas de apresentação
neurológica. Existem diversos graus de acometimentos e a fisiopatogenia predominante
também pode variar. Alguns têm a hiperemia cerebral como a alteração predominante,
enquanto outros podem apresentar isquemia cerebral. A monitorização cerebral deve ser
eficaz em diferenciar essas duas condições, uma vez que elas merecem terapêutica específi-
ca. A relevância dessa monitorização se faz presente principalmente na hepatite aguda grave.
Entre as opções disponíveis, deve-se destacar o uso do doppler transcraniano, a cateteriza-
ção do bulbo jugular, a monitorização da pressão intracraniana (PIC), além dos monitores
de plano anestésico.
Os monitores do plano anestésico como a entropia e o índice biespectral (BIS) têm sido
utilizados de maneira crescente e são de grande valia na adequação das doses dos fármacos
anestésicas em pacientes hepatopatas. Com esses monitores podem-se individualizar as
taxas de infusão dos anestésicos nas diversas fases da cirurgia. Durante a fase anepática a
pode-se reduzir a infusão de hipnóticos quando guiados por esses monitores enquanto que
na fase neo-hepática o aumento da necessidade de infusão de anestésicos guiados pelo BIS
sugere de maneira indireta o adequado funcionamento do enxerto.
A monitorização da pressão intracraniana (PIC) é de grande utilidade nos pacientes com
suspeita de hipertensão intracraniana, sendo profícuo na adequação das medidas de manu-
seio da pressão intracraniana. O cateter de bulbo jugular através da punção da veia jugular
com cateterismo retrógrado também é útil nesse sentido.
A monitorização com cateter no bulbo da jugular permite avaliar a relação oferta-consumo
de oxigênio cerebral32 a partir das medidas da saturação do bulbo jugular (SjO2)33-35 (Figura 3)
e do coeficiente de extração cerebral de oxigênio (CEO2)36. Assim, ao se adotarem condutas
visando a mudanças no fluxo sanguíneo cerebral (por exemplo, hiperventilação), verificam-se
a eficácia ou o efeito deletério das mesmas na perfusão encefálica. Apesar muito empregada no
manejo da hipertensão intracraniana, a hiperventilação pode, em alguns casos, agravar a is-
quemia cerebral por vasoconstrição cerebral excessiva. O uso continuado da monitorização do
bulbo jugular durante o TH de pacientes com graus elevados de encefalopatia pode fornecer
informações úteis sobre a hemodinâmica cerebral durante as diversas fases do procedimen-
to37. Vale lembrar que durante a ressecção hepática e principalmente durante a reperfusão
do enxerto pode haver alterações importantes no fluxo sanguíneo cerebral (principalmente
vasodilatação cerebral), comprometendo a perfusão encefálica.

Monitorização hemodinâmica e reposição volêmica no transplante hepático | 73


Figura 3 - Medida da saturação
do bulbo jugular em hepatite
fulminante .
O doppler transcraniano também pode ser usado no intuito de avaliar o fluxo sanguíneo ce-
rebral. Ao identificar a velocidade do fluxo nos grandes vasos cerebrais, podem-se diagnosticar,
de forma não invasiva, estados de hiperemia ou isquemia cerebral. Embora o valor absoluto do
fluxo sanguíneo cerebral (FSC) não seja verdadeiramente identificado, alterações relativas no
mesmo são medidas de maneira quantitativa. O padrão da onda pode prover também avalia-
ção qualitativa da pressão de perfusão cerebral, bem como a ocorrência de microêmbolos (de
ar ou partículas), que estão presentes mais frequentemente durante a revascularização e são
detectados por intermédio de High Intensity Transient Signals (HITS).

Coagulação
A hepatopatia terminal está associada à desordem multifatorial do sistema hemostáti-
co . A síntese e a depuração dos fatores de coagulação, como de seus inibidores, estão
38,39

alteradas pela cirrose, acarretando desequilíbrio entre pró e anticoagulantes. Isso coloca
os mesmos em risco de trombose ou sangramento grave. Entre os múltiplos fatores de risco
adicionais para coagulopatia, podem-se destacar: desordens congênitas ou adquiridas da
coagulação, hemodiluição, consumo de fatores de coagulação, hiperfibrinólise, liberação de
heparinoides endógenos ou exógenos e acúmulo de citrato pelas transfusões. Condições bá-
sicas como hipotermia, acidose, hipocalcemia e anemia também podem exercer importante
influência na hemostasia.
Apesar do estado de hipocoagulabilidade ser o mais comumente encontrado nos can-
didatos a TH, aproximadamente 35% dessa população apresentam quadro de hipercoagu-
labilidade. Sobretudo, esses pacientes apresentam alta incidência de trombose e oclusão
vascular das anastomoses (veia porta e artéria hepática), além do risco de microtromboses
da circulação pulmonar por agregados de plaquetas ativadas no enxerto hepático durante
a reperfusão 40,41.
A concepção sobre o sistema de hemostasia vem mudando nos últimos anos. O modelo
clássico da cascata de coagulação com uma via intrínseca e outra extrínseca tem sido
substituído por um modelo celular que possui três fases consecutivas: iniciação, amplifica-
ção e propagação. Ele reflete de forma muito mais adequada as interações entre os fatores
celulares e plasmáticos do que o modelo clássico.
A monitorização da coagulação durante o TH é de fundamental importância para o su-
cesso do procedimento. Devido à complexidade das alterações hemostáticas presentes na

74 | Educação Continuada em Anestesiologia


insuficiência hepática e no TH, os testes convencionais da coagulação não são capazes de
avaliar a hemostasia com precisão42 .
As limitações dos testes clássicos de coagulação podem ser resumidas nos seguintes pontos:
• Não detectam de maneira adequada a hiperfibrinólise.
• Podem apresentar medidas falsamente elevadas de fibrinogênio diante de coloides43,44.
• TAP e PTT podem estar alargados em caso de hipofibrinogenemia e afibrinogenemia.
• A contagem plaquetária isolada tem pouco significado.
• TAP e PTT apenas determinam a velocidade da geração da trombina, não a estabilidade
mecânica do coágulo.
• Os resultados dos testes de coagulação realizados em um laboratório central geralmente
não estão disponíveis em menos de 30-60 minutos.
O tromboelastograma (Figuras 4 e 5) fornece não apenas informação acerca do início
da coagulação, mas também sobre a mecânica, estabilidade e lise do coágulo. Entre suas
vantagens podem-se destacar: diagnóstico preciso de hiperfibrinólise, identificação de
deficiência de fibrinogênio, diferenciação entre desordens plaquetárias ou de fatores da co-
agulação, detecção de efeitos de heparinoides endógenos ou exógenos, além do estado de
hipercoagulabilidade45-51. Os resultados podem ser obtidos em tempo real, sendo possível
acessar as mudanças dinâmicas do processo de coagulação em todas as suas etapas. A adição
de heparinase permite a monitorização da hemostasia mesmo em pacientes completamente
heparinizados52 . Como o sistema permite que as medidas sejam feitas à temperatura do
paciente, o efeito da hipotermia e hipertermia também pode ser investigado. Destaca-se a
possibilidade de uso de aditivos diagnósticos ou terapêuticos nos testes in vitro, avaliando
seus efeitos antes de se iniciar uma conduta terapêutica in vivo.
A tromboelastografia rotacional (ROTEM) disponibiliza medidas viscoelásticas da
força do coágulo no sangue total. Pequena quantidade de sangue do paciente (0,3 mL), as-
sim como ativadores da coagulação, são adicionados a uma cubeta. Um pino descartável é
fixado a uma haste rotacional do aparelho e mergulhado na cubeta. À medida que o coágulo
se forma, as fibras de fibrina ligam as paredes da cubeta ao pino. Desse modo, a impedância
de rotação do pino é detectada e um gráfico é gerado.
Os parâmetros mais importantes do tromboelastograma são:
• CT (tempo de coagulação): corresponde ao tempo desde o início da reação até o au-
mento de 2 mm na amplitude. Representa a iniciação da coagulação, formação da
trombina e início da polimerização do coágulo.
• CFT (tempo de formação do coágulo): corresponde ao tempo entre o aumento de
amplitude de 2 a 20 mm. Identifica a polimerização da fibrina e estabilização do coá-
gulo com plaquetas e fator XIII.
• MCF (firmeza máxima do coágulo): corresponde à amplitude máxima atingida no
traçado, que se correlaciona com a contagem e função plaquetária e concentração
de fibrinogênio.

Monitorização hemodinâmica e reposição volêmica no transplante hepático | 75


• α (ângulo alfa): corresponde à tangente da curva de coagulação através do ponto de
2 mm de amplitude. Correlaciona-se com a força do coágulo
• A10, A15, A20... (amplitude de firmeza do coágulo, após 10, 15, 20... minutos).
• ML (lise máxima) – corresponde à razão entre a menor amplitude após o MCF e o
próprio MCF.
• CLI (índice de lise do coágulo).
• LOT (tempo de início da lise).

Nomenclatura
Parâmetro Processo
TEG ROTEM
A r: tempo de início da coagulação CT (tempo de coagulação): Iniciação da geração
(até atingir 2 mm de amplitude) tempo de início da coagulação de trombina e início da
até atingir 2 mm de amplitude polimerização do coágulo
B K: tempo entre o início da CFT: tempo de formação do Polimerização da fibrina, for-
formação do coágulo até atingir coágulo até atingir a amplitude mação da rede de fibrina com
a amplitude de 20 mm de 20 mm interação com as plaquetas.
C α (ângulo alfa): ângulo α (ângulo alfa): tangente da
formado da linha entre o final curva de coagulação através do
da r e o K ponto de 2 mm de amplitude
D MA (amplitude máxima): MCF (firmeza máxima Estabilização do coágulo
máxima amplitude registrada do coágulo): amplitude por plaquetas e fator XIII
máxima registrada
E CL45, CL60 (lise após 45 e 60 LY30, LY45 ou ML: lise em 30, Medida do grau de fibrinólise
minutos): amplitude em 45 e 45 minutos e lise máxima. após cada tempo específico
60 minutos.
Figura 4 – Traçado do tromboelastograma e nomenclatura utilizadas relacionadas com o processo
da coagulação

Esses três últimos parâmetros são utilizados na análise da hiperfibrinólise.


O aparelho possui quatro canais que podem ser analisados em paralelo, simultaneamente.
Entre os múltiplos testes possíveis, vale destacar os seguintes:

76 | Educação Continuada em Anestesiologia


• Ex-TEM (ativador utilizado: fator tecidual): avalia a via extrínseca e permite o acesso
rápido à formação do coágulo e à fibrinólise.
• In-TEM (ativador utilizado: ativador de contato): avalia a via intrínseca, acessa a for-
mação do coágulo e a polimerização da fibrina.
• Fib-TEM (ativador/inibidor utilizados: fator tecidual + antagonista plaquetário: cito-
calasina D): permite a avaliação qualitativa dos níveis de fibrinogênio.
• Ap-TEM (ativador utilizado: fator tecidual + aprotinina): avalia a via fibrinolítica, per-
mitindo detecção rápida da fibrinólise quando usado em conjunção com o ex- TEM.
• Hep-TEM (ativador/inibidor utilizados: ativador de contato + heparinase): detecção
específica de heparina. Atua como um in-TEM modificado pela adição de heparinase
para inativar a heparina eventualmente presente no paciente. É muito útil na detecção
de heparinoides comuns após a reperfusão do enxerto.

Figura 5 -formas características do tromboelastograma: A: nor-


mal: B: prolongada (anticoagulação ou deficiência de fatores da
coagulação), C: amplitude máxima diminuída (trombocitopenia
e/ou disfunção plaquetaria), D: fibrinólise, E: hipercoagulabilida-
de, F: coagulação intravascular disseminada (CIVD), G: estágio
tardio da CIVD (hipocoagulabilidade).

O tromboelastograma é considerado o padrão-ouro na monitorização da coagulação


durante o TH e também tem sido útil na avaliação dos doadores no transplante intervivos53.
Apesar de inúmeras vantagens, apresenta algumas limitações:
• Não detecta a atividade dos inibidores da coagulação (antitrombina, proteína C e
proteína S).
• Não detecta o efeito de substâncias antiplaquetárias (ácido acetilsalicílico, ticlopidi-
na, clopidogrel, ginko-biloba, ginseng).
• Não avalia de forma adequada a hemostasia primária, que requer monitor específico
como o Multiplate.
Apesar de a tromboelastografia permitir análise mais completa da coagulação, por
avaliar a capacidade viscoelástica do sangue, os fatores ligados ao endotélio não podem

Monitorização hemodinâmica e reposição volêmica no transplante hepático | 77


ser avaliados diretamente, por essa técnica. que também é responsável por diferenças na
avaliação da coagulação in vivo. Portanto julgamos que quando se utiliza esse método de
monitorização da coagulação, o tratamento também só deve ser realizado na vigência de
sangramento não cirúrgico.

Manejo volêmico no transplante hepático


Devido à hipovolemia, às alterações orgânicas multissistêmicas e à autorregulação au-
tonômica, o adequado manejo volêmico é mandatório para assegurar perfusão sistêmica
e do enxerto.
Estudos demonstram que a manutenção da PVC baixa durante as cirurgias para hepa-
tectomia e TH diminuem o sangramento e a necessidade de hemotransfusão54-58, porém
essa conduta é debatida. Apesar dos potenciais benefícios, medidas para diminuição da PVC
nessas cirurgias estão associadas a aumento de disfunção renal e mortalidade59,60. Associado
a isso, a reposição volêmica não deve ser baseada em valores de PVC, devido à incapacidade
desse método de prever volemia ou responsividade a teste volêmico9. Apesar da falta de
estudos randomizados, acredita-se que a reposição volêmica visando à normovolemia seja a
mais adequada para esses pacientes. Nenhuma pesquisa comparou a utilização de coloides
e cristaloides no TH.
Entre os coloides, a albumina é mais segura do que os hydroxyethyl starches e em algumas
situações deve ser indicada devido à baixa incidência de reações anafiláticas, alterações na
coagulação, disfunção renal ou hepática, prurido, instabilidade hemodinâmica e mortalida-
de61,62 . A albumina não promove inflamação, ao contrário dos demais coloides e cristaloi-
des, apresentando efeito imunológico anti-inflamatório bem definido63,64.
Revisão sistemática da Cochrane 65 concluiu que a albumina não apresenta vantagens
sobre os cristaloides em pacientes criticamente enfermos, porém a extrapolação de resul-
tados não deve ser feita para os pacientes hepatopatas, uma vez que se trata de populações
bastante distintas. A albumina está associada à diminuição de mortalidade em pacientes
cirróticos com ascite e síndrome hepatorrenal66,67. Algumas revisões sistemáticas68-70 sa-
lientaram menos morbidade em pacientes com doença hepática e hipoalbuminêmicos que
usaram albumina.
A albumina promove a expansão do volume intravascular de forma mais efetiva do que
os cristaloides e não atravessa livremente a membrana capilar para o espaço intersticial71.
Dessa forma, a pressão oncótica intravascular é mantida, o que é importante, sobretudo, nos
pacientes hipoalbuminêmicos como os hepatopatas. A meia-vida plasmática da albumina é
de 24 horas e, após distribuição, 60% permanecem no espaço intravascular.
Entre os cristaloides, o plasmalyte parece ser interessante opção para a utilização no TH.
Estudo prospectivo randomizado recente concluiu que os pacientes do grupo plasmalyte exi-
biram menos alteração de lactato, bilirrubinas, albumina e TAP no pós-operatório imediato
do que os do grupo ringer lactato, em cirurgias de hepatectomia direita para doação, apesar
de não haver diferença de morbimortalidade ou tempo de internação entre os grupos72 . Ou-

78 | Educação Continuada em Anestesiologia


tro artigo73 demonstrou que o plasmalyte apresentou menos alteração hidroeletrolítica do
que o ringer lactato ou a solução salina 0,9% no transplante renal, porém sem diferenças na
função renal pós-operatória.
O plasmalyte foi desenvolvido para ser uma solução cristaloide mais fisiológica e balance-
ada. Possui osmolalidade e pH similares ao plasma e apresenta algumas vantagens em rela-
ção aos demais cristaloides. É capaz de corrigir o déficit de volume e eletrólitos com menos
risco de sobrecorreção. A presença do magnésio em sua formulação tem efeito benéfico, pois
a hipomagnesemia é encontrada frequentemente no pós-operatório do TH e a reposição do
magnésio previne morbidade cardíaca e mortalidade pós-operatória, por ser importante co-
fator para a homeostase cardiovascular74-76. Pelo fato de não conter cálcio, pode ser utilizado
concomitantemente com a maioria dos fármacos e hemoderivados. Trata-se de solução iso-
tônica com menos risco de acidose dilucional ou hiperclorêmica. O acetato é rapidamente
convertido em bicarbonato, consumindo menos oxigênio e produzindo menos CO2 do que
o lactato. Alem disso, é metabolizado pela maioria dos tecidos, enquanto o lactato depende
de metabolismo hepático e renal, o que pode provocar seu acúmulo durante o TH, sobre-
tudo durante a fase anepática. O plasmalyte possui os mesmos problemas da maioria dos
cristaloides, como sobrecarga hídrica, edema e piora da hipertensão intracraniana. Apesar
das vantagens teóricas, são necessárias mais pesquisas randomizadas controladas e multi-
cêntricas que definam a superioridade do plasmalyte no TH, uma vez que apresenta custo
cerca de 30 vezes superior ao do ringer lactato ou da solução salina 0,9% e que nenhum
estudo enfatizou redução de morbimortalidade com a sua utilização.

Hemotransfusão no transplante hepático


O TH tem sido associado a acentuada perda sanguínea e necessidade de transfusão
de hemocomponentes. Nos últimos 20 anos, houve importante redução da necessidade
de transfusão.
A transfusão de plasma fresco congelado (PFC) com o objetivo de corrigir os defeitos
de coagulação não foi associada à diminuição de transfusão de concentrados de hemácias
(CH) durante o TH, pelo contrário; aumentou a necessidade de uso de CH e a mortalidade
em um ano60,77.
Por muito tempo a transfusão de hemocomponentes foi vista como tendo somente bene-
fícios; contudo, nos últimos 20 anos, ela começou a ser associada a diversos riscos. Diferen-
tes trabalhos mostraram associação entre transfusão de CH e diminuição de sobrevida após
TH78-80. Recentemente, alguns investigadores mostraram correlação negativa entre a utili-
zação transoperatória de PFC78,80 e plaquetas78,79 com sobrevida após TH. Alguns autores
têm evidenciado que a transfusão de sangue foi a principal variável independente associada
à diminuição de sobrevida79-81. Ao mesmo tempo, vêm se tornando mais conhecidos os efei-
tos de imunomodulação provocados pelas hemotransfusões em quase todos os pacientes.
Esse efeito pode aumentar o risco de infecções nosocomiais, lesão pulmonar aguda e desen-
volvimento de doenças autoimunes em longo prazo82 .

Monitorização hemodinâmica e reposição volêmica no transplante hepático | 79


Nos últimos anos, o conhecimento desses riscos aumentou o questionamento sobre os
riscos/benefícios do uso dos hemocomponentes.
Recente revisão sistemática83 avaliou a associação entre transfusão de hemocomponen-
tes, morbidade e mortalidade em pacientes hospitalizados. Do total de 571 artigos analisa-
dos, 45 preencheram os critérios de inclusão, com total de 272.596 pacientes incluídos. Das
45 publicações analisadas, em 42 os riscos superaram os benefícios, em dois os resultados
foram neutros e os benefícios foram superiores ao risco em apenas um subgrupo de um
estudo (pacientes idosos com infarto agudo do miocárdio e hematócrito inferior a 30%).
De 18 pesquisas, 17 mostraram que a transfusão de hemocomponentes foi fator de risco
independente para óbito. De 12 estudos, todos evidenciaram que a transfusão é fator de
risco independente para infecção nosocomial; de outros três, todos realçaram associação
entre transfusão e a síndrome de disfunção múltipla de órgãos; e de seis, todos sublinharam
associação entre transfusão e lesão pulmonar aguda. Esta revisão sistemática mostrou que
no espectro de pacientes de alto risco hospitalizados a transfusão de hemocomponentes está
associada a aumento de morbimortalidade.
A razão para o aumento de morbimortalidade associada à transfusão não está bem clara.
O fato tem sido atribuído à depressão do sistema imunológico, conhecido como imuno-
modulação relacionada à transfusão (TRIM), e às alterações nos produtos sanguíneos que
podem ocorrer durante o armazenamento84. O efeito da TRIM em humanos foi observado
inicialmente no transplante renal. O verdadeiro impacto da TRIM, assim como incidência
de infecções pós-operatórias, continuam sendo debatidas84.
A alteração do sistema imune provocada pela transfusão como determinante de com-
plicações infecciosas e mortalidade após TH foi recentemente sugerida81, requerendo mais
estudos para comprovar essa hipótese.
A síndrome conhecida como lesão pulmonar aguda relacionada à transfusão (TRALI)
é um edema pulmonar agudo não cardiogênico que ocorre em até seis horas da transfu-
são de hemocomponentes contendo plasma85. A TRALI foi considerada recentemente a
complicação mais grave da transfusão de hemocomponentes nos países desenvolvidos,
com incidência estimada de uma para 5.000 transfusões nos EUA 85. Os pacientes subme-
tidos ao TH parecem estar expostos a elevado risco de TRALI86. Ativação neutrofílica
é considerada a principal causa da TRALI. No TH tem sido sugerido que a isquemia e a
reperfusão do enxerto atuariam como condições predisponentes86.
Do ponto de vista de transmissão de infecções, os hemocomponentes tornaram-se bas-
tante seguros. A transmissão de doenças virais é pouco provável, apesar do surgimento de
novos vírus sempre desafiar a segurança das transfusões.
Não há estudos randomizados que definam os gatilhos transfusionais no TH. Força-tarefa
recentemente definiu nível 1 de evidência a estratégia transfusional restritiva (Hb<7 g/dL) em
pacientes criticamente enfermos, hemodinamicamente estáveis87. Como o contexto do TH
é diferente, os resultados não podem necessariamente ser extrapolados. A informação mais
recente da Sociedade Americana de Anestesiologia é de que não existe um valor único para a
concentração de hemoglobina para justificar ou determinar a transfusão, recomendando que

80 | Educação Continuada em Anestesiologia


a avaliação individualizada da condição clínica do paciente deve ser o fator de decisão e que, de
maneira geral, os protocolos transfusionais para TH tendem a ser mais restritivos87.
Diversas medidas têm diminuído a adoção de hemoderivados durante o TH, entre elas
a melhora das técnicas cirúrgicas, o uso da tromboelastografia, da unidade recuperadora
de glóbulos, de fármacos (eritropoetina, antifibrinolíticos, fator VII recombinante, desmos-
pressina), normotermia e providências que evitam congestão venosa.

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Monitorização hemodinâmica e reposição volêmica no transplante hepático | 85


Capítulo 06

A coagulação no paciente
cirúrgico – parte 1
Alexandre Teruya
Andrea Tiemi Kondo
Diná Mie Hatanaka
Gabriel Franzin Rusca
Jose Mauro Kutner
Octavio Henrique Mendes Hypolito

- A parte 2 deste capítulo virá no volume III


A coagulação no paciente cirúrgico – parte 1
Perda sanguínea excessiva é uma complicação importante durante o período periope-
ratório, podendo levar à necessidade de transfusões de hemocomponentes, má-perfusão
tecidual, quadros de choque e até ao óbito.
Assim, cabe ao anestesiologista identificar os pacientes e os procedimentos cirúrgicos
que podem predispor a maior risco de sangramento. Dessa forma, a prevenção da hemor-
ragia, bem como o planejamento no tratamento da mesma pode ser estabelecido de forma
organizada e racional.
Atualmente, além do arsenal terapêutico, há formas de monitorização da coa-
gulação que podem ser utilizadas no tratamento das coagulopatias. Neste capítulo
serão abordadas algumas situações que predispõem à perda sanguínea, por con-
dições inerentes ao paciente, como no caso da hepatopatia, ou às relacionadas ao
procedimento cirúrgico.

1. A coagulação normal – teoria celular


Em 1998, Roberts e Monroe descreveram um modelo de ativação da cascata da coagu-
lação que é iniciada por um fator tecidual, presente na membrana das células endoteliais.
Quando essas são lesadas o complexo formado entre o fator tecidual e o fator VIIa são
responsáveis pela ativação dos fatores IX e X 1.
Subsequentemente, o fator Xa interage com o fator V (também presente na membrana
celular) e este complexo ativa uma pequena quantidade de protrombina em trombina (fa-
tor IIa). Esta quantidade de fator IIa não é suficiente para formar um coágulo firme, mas
é o bastante para iniciar a agregação plaquetária, dissociar o fator de von Willebrand do
fator VIII, e ativar os fatores V, VIII e XI. Como conseqüência da ativação destes fatores,
a produção de trombina é amplificada.
Já o fator IXa, se liga a superfície plaquetária na presença do seu co-fator VIIIa. O
complexo IXa-VIIIa, ativa então o fator X em Xa. Na presença do fator Va, o fator Xa
consegue ativar grandes quantidades de protrombina em trombina. Importante notar
que os fatores VIIIa e Va necessários para esta parte do processo são oriundos da ati-
vação do complexo fator tecidual-VIIa, que culmina com a produção de trombina e
ativação dos fatores V e VIII.
Este modelo demonstrou que a função normal da coagulação depende não só da presen-
ça de todos os fatores da coagulação, mas da interação entre o fator tecidual (celular), fator
VIIa e as plaquetas.
Tão importantes quanto os mecanismos pró-coagulantes são os mecanismos que
limitam a propagação indeterminada da formação de coágulos2 . Assim, o fator inibidor
da via tecidual neutraliza o fator Xa quando o mesmo forma complexos com o fator
tecidual-fator VIIa e a antitrombina neutraliza o fator Xa e a trombina quando os mes-
mos estão presentes em grandes concentrações 3,4.

88 | Educação Continuada em Anestesiologia


2. A coagulação do hepatopata
O hepatopata apresenta diversas alterações na coagulação: diminuição da contagem e
função plaquetária, diminuição na produção de fatores pró e anticoagulantes, diminuição
no “clearance”de fatores ativados da coagulação, hiperfibrinólise, entre outros5.
A plaquetopenia é devido ao seqüestro esplênico, causado pela hipertensão portal e pela
deficiência de trombopoetina (produzida pelo fígado, causa a proliferação e maturação dos
megacariócitos)6,7. Sabe-se também que a função plaquetária é afetada no hepatopata, com
diminuição da adesão e interação anormal com os fatores da coagulação, o que é demonstra-
do pelos resultados alterados nos testes de agregação plaquetária com adenosinadifosfato,
ristocetina, adrenalina, colágeno e trombina8,9.
A diminuição na produção de fatores de coagulação se reflete nos resultados alterados
de exames laboratoriais: o tempo de protrombina (TP) começa a aumentar, principalmente
devido à menor produção do fator VII. Em seguida o tempo de tromboplastina parcial ati-
vada (TTPa) também é aumentado, por diminuição na produção dos fatores de maior peso
molecular, como os fatores XI e XII10-12 . Um estado hipercoagulável pode ser demonstrado
através de uma tromboelastografia, uma vez que os fatores inibidores da coagulação tam-
bém são produzidos pelo fígado13.
A disfibrinogenemia está presente em 60 a 70% dos pacientes portadores de insuficiência
hepática. Ocorre uma polimerização deficiente da trombina por conta de alterações estru-
turais no fibrinogênio do paciente. Assim, é observado um aumento no tempo de trombina
(TT), mesmo com TP, TTPa e dosagem de fibrinogênio normais5.
Hiperfibrinólise, que pode ser evidenciada com a tromboelastografia e pelo aumento
dos níveis séricos do D-dímero e dos produtos de degradação da fibrina é achado comum
no hepatopata. Duas hipóteses são propostas para justificar esta alteração: a diminuição do
“clearance” do fator tecidual ativador do plasminogênio (que promove a lise do coágulo após
sua formação) ou a ação fibrinolítica intrínseca do liquido ascitíco, já que 93% dos pacientes
que possuem ascite apresentam hiperfibrinólise. Aparentemente, a combinação destes dois
fatores responde por esta patologia14,15.
As provas convencionais de coagulação são úteis na quantificação da gravidade da
hepatopatia do paciente. Assim, conforme discutido anteriormente, vemos que quanto
maiores as alterações no TT, TP, TTPa e na contagem plaquetária do paciente, maior o
acometimento hepático.
Apesar disso, o TP e o TTPa são limitados quando utilizados para avaliar sangramentos
durante o transplante de fígado. Isto porque nenhum destes testes reproduz a interação “in
vivo” entre as plaquetas, as células endoteliais e os fatores de coagulação. Em acréscimo,
principalmente durante o período perioperatório, as perdas sanguíneas podem estar re-
lacionadas a diversos fatores como hemodiluição, coagulopatia de consumo, hipotermia,
fibrinólise e outros desequilíbrios metabólicos17,18.
Assim, o teste mais adequado para avaliar a coagulação durante o transplante de fí-
gado seria aquele que analisasse em conjunto, a interação entre os fatores de coagulação,

A coagulação no paciente cirúrgico – parte 1 | 89


as plaquetas, e os fatores anticoagulantes. Neste caso, a tromboelastografia constitui um
excelente recurso.

3. A coagulação no paciente pediátrico


O sangue do recém-nascido apresenta ambos os tipos de hemoglobina: a hemoglobina
adulta (HbA) e a fetal (HbF), que se diferenciam, estruturalmente pela disposição das qua-
tro cadeias de globina. A primeira constituída por duas cadeias alfa e duas beta, e a segunda
por duas alfa e duas gama. Diferença estrutural essa, que fornece à HbF uma maior afinidade
por oxigênio, facilitando a transferência placentária do gás proveniente do sangue materno,
e auxiliando na manutenção da estrutura molecular e funcional em meios mais acidóticos,
característica do ambiente fetal. A predominância de HbF corresponde à 70% a 80% em
crianças nascidas a termo, podendo chegar até 90% em prematuros.
Entretanto, após o nascimento, com o aumento do pH e queda da PaCO2 no sangue do
neonato, a curva de dissociação da hemoglobina desloca-se para a esquerda, limitando ainda
mais a liberação de oxigênio para os tecidos periféricos. Essa limitação é compensada pelo
maior débito cardíaco, para suprir as necessidades dos tecidos, e presença de maiores níveis
de 2,3-DPG, que desloca a curva para direita e facilita a liberação de oxigênio.
A adaptação referida sustenta o suprimento periférico de oxigênio até toda a HbF ser
reposta pela HbA, com aproximadamente 6 meses de vida. Durante esse período, a degra-
dação da HbF ocorre de forma mais rápida que a síntese de HbA, devido a uma combinação
de baixos níveis de eritropoietina, com a limitação dos sítios de produção de HbA na medu-
la óssea em desenvolvimento. Isso leva à anemia fisiológica da infância, que normalmente
ocorre com 8 a 10 semanas de vida, e à maior suscetibilidade de pacientes dessa faixa etária
a perdas sanguíneas 19.
Embora todos os componentes do sistema hemostático estejam presentes no
nascimento, diferenças qualitativas e quantitativas importantes existem entre os recém-
-nascidos e adultos 20.
Tabela 1. Componentes da coagulação dos recém-nascidos em relação aos adultos:
= contagem plaquetária
Hemostasia Primária
> Fator de von Willebrand
< Fatores II, VII, IX e X
< Fatores XI, XII, pré calicreína e cininogênio de alto peso
molecular
Fatores da Coagulação
< ou = Fatores V e XIII
= Fibrinogênio
>Fator VIII e von Willebrand

< TFPI, proteínas C e S


Fatores Anticoagulantes
> alfa 2 macroglobulina
< plasminogênio
Fibrinólise
> ou = inibidor do ativador do plasminogênio

90 | Educação Continuada em Anestesiologia


Para os fatores pró-coagulantes a diferença é primariamente quantitativa:
• Fatores ativados pelo contato: XII, XI, pré calicreína, e cininogênio de alto peso mo-
lecular são mais baixos no nascimento e permanecem até os 6 meses de vida 21. Essa
deficiência contribui para o prolongamento do TTPa nessa faixa etária.
• Fatores dependentes de vitamina K: II, VII, IX, X também estão baixos no nascimento e
não atingem os níveis adultos até os 6 meses de vida 22 .
• Fatores V e XIII estão baixos inicialmente, mas se elevam rapidamente e atingem níveis
adultos com apenas 5 dias de vida 22,23.
• Fator de von Willebrand(vWF) e fator VIII são os únicos procoagulantes com níveis
mais elevados que os adultos 22,23.
• Fator II (Fibrinogênio): valores médios comparáveis com os adultos, entretanto várias
evidências sugerem uma disfunção qualitativa, presentes na forma fetal, sendo menos
efetivo, até aproximadamente um ano de vida 19,20.

Os principais fatores anticoagulantes antitrombina III(AT), proteína C e fator inibidor


da via do fator tecidual (TFIP) estão baixos ao nascimento, tanto nos recém nascidos a ter-
mo quanto nos prematuros23. Seus níveis alcançam as taxas dos adultos com 3, 6 meses e
durante a infância, respectivamente.
Para compensar o déficit de anticoagulantes mencionados, um inibidor de trombina,
alfa-2-macroglobulina, de importância secundária nos adultos, estão marcadamente eleva-
dos nos recém-nascidos24 e assumem a responsabilidade de principal fator anticoagulante,
evidência descrita em diversos estudos25,26.
A contagem e o volume médio das plaquetas não diferem da faixa normal do adulto, no
entanto a função plaquetária está reduzida nas primeiras 2 a 4 semanas pós gestacionais.
Quando examinadas in vitro, as plaquetas exibem uma resposta reduzida a uma varieda-
de de agonistas padrões, com diminuição da secreção granular, da expressão de receptores
do fibrinogênio na superfície plaquetária e da sua agregação 27.
No entanto, quando realizado exame in vivo não é observada disfunção plaquetária em
diversos estudos utilizando teste de sangramento, tromboelastometria(ROTEM®) e analisa-
dores de função plaquetária(PFA-100 ®), resultados que sugerem que, em condições fisiológi-
cas, as plaquetas dos neonatos apresentam a mesma eficiência dos adultos para proporcionar
a hemostasia primária28,29. Observações que podem ser explicadas pela maior quantidade
de fator de von Willebrand encontradas nos neonatos em relação aos adultos, contribuindo
para melhorar a adesividade das plaquetas no endotélio vascular lesado.
O plasma do recém nascido apresenta metade dos níveis de plasminogênio encontra-
dos nos adultos, atingindo os valores normais somente com 6 meses de vida. Além disso,
apresentam cinética de ativação lenta à plasmina quando estimulado pelo t-PA. Estudos
demonstram que , nestes pacientes, são necessárias concentrações até cinco vezes maiores
de t-PA para produzirem quantidades similares de plasmina às dos adultos30.

A coagulação no paciente cirúrgico – parte 1 | 91


O inibidor de ativador de plasminogênio (PAI) exibe concentração normal ou aumenta-
da em relação ao adulto, no momento do nascimento 31.
Somando todos esses dados podemos concluir que a geração de plasmina está diminuída
no neonato e o sistema fibrinolítico é menos eficaz que no adulto.

4. Distúrbio de coagulação após circulação extracorpórea

4.1 Introdução
Desde a utilização pela primeira vez da circulação extracorpórea (CEC), em 1950, para
realização de cirurgia cardíaca, tem sido identificados casos de sangramentos graves, sem
causa cirúrgica aparente.
O sangramento pós-operatório é uma das complicações mais comuns e grave da
cirurgia cardíaca sendo associada a aumento de morbidade e mortalidade. Autores
reportam que a incidência de acidente vascular cerebral 35 , síndrome do desconforto
respiratório agudo37, arritmias atriais 37, insuficiência renal, sepse, suporte ventilatório
prolongado e morte são significativamente maiores em pacientes submetidos a reopera-
ções por sangramento33 .
Aproximadamente 2% a 4% dos pacientes submetidos à cirurgia cardíaca necessi-
tam de reavaliações por sangramento, com taxas ainda maiores em procedimentos de
alta complexidade.
Avaliação da Sociedade Americana de Cirurgiões Torácicos em relação a incidência,
os fatores de risco e a evolução de 528.686 pacientes que realizaram cirurgia de revascu-
larização do miocárdio e necessitaram nova cirurgia para revisão de hemostasia, entre os
anos de 2004 a 2007, mostrou ser de 2,4% o índice de reoperação34. Os fatores de risco
encontrados, foram: idade avançada, sexo masculino, comorbidades tais como: doenças
vasculares periféricas, cerebrovasculares, pulmonar obstrutiva crônica, insuficiência
renal, insuficiência cardíaca, cirurgia de urgência/emergência, uso de balão intraórtico
no perioperatório, intervenções prévias, intervenções percutâneas em menos de 6 horas
antes da revascularização do miocárdio e o uso de tienopiridina, um anticoagulante, me-
nos de 24 horas antes do procedimento cirúrgico34. O risco de mortalidade ajustado foi
significativamente maior nos pacientes reoperados: 5,9% contra 1,97% 34.
Outros estudos identificaram como fatores de risco adicionais para sangramento no pós
operatório: tempo prolongado de CEC33,35, uso de clopidogrel pré-operatório, cessação do
uso de aspirina dentro de 4 dias antes da cirurgia, não utilização de medicações antifibrino-
líticas no intra-operatório e tipo de cirugia35.
Diante desse quadro de complicações relacionadas ao sangramento, associadas a to-
dos os riscos da transfusão de componentes sanguíneos autólogos é imperioso à equipe
assistencial a identificação da etiologia desse sangramento. Sendo que causas cirúrgicas
são identificadas em 50% dos pacientes submetidos à reoperação por sangramentos36, e no
restante dos pacientes é multifatorial.

92 | Educação Continuada em Anestesiologia


4.2 Fisiopatologia do distúrbio de coagulação relacionada à CEC
O distúrbio de coagulação apresentado por pacientes submetidos à cirurgia cardíaca
e circulação extracorpórea é complexo e multifatorial, consequência de interações de
diversos sistemas:
• Ativação do sistema de coagulação: o trauma cirúrgico ocasionado pelas incisões, uso de
afastadores e manipulações, causando lesão vascular, desencadeia a liberação de fator te-
cidual, que juntamente com o contato dos elementos sanguíneos com o circuito tubular
da CEC leva a coagulopatia por consumo dos fatores protéicos.
• Ativação do sistema inflamatório: liberação de mediadores químicos com consequente
ativação do sistema de coagulação.
• Uso de heparina sistêmica e todas as complicações na sua reversão com o emprego
de protamina.
• Hemodiluição inicial para preenchimento do circuito da CEC e relacionada a esquemas
de hidratação liberais.
• Hipotermia, necessária para proteção de órgãos.
• Fluxo sanguíneo não pulsátil proveniente das bombas propulsoras, criando condições
não fisiológicas de perfusão tecidual, convergindo para possível acidose metabólica e
disfunção hemostática.
• Ativação do sistema fibrinolítico: hiperfibrinólise durante e após a CEC.
• Disfunção plaquetária, sendo essa a complicação mais associada a sangramento após
procedimentos com circulação extracorpórea 38.

Figura 1. Principais causas de sangramen-


to após cirurgia cardíaca e CEC.

A coagulação no paciente cirúrgico – parte 1 | 93


Ativação do sistema de coagulação
A heparina, um glicosaminoglicano utilizado para prevenir a coagulação imediata do
sangue no interior do circuito da CEC, via antitrombina III (ATIII) inibe efetivamente a
trombina sistêmica, mas não é capaz de inibir a trombina que se liga à superfície do circuito
tubular da CEC e na membrana de oxigenação 39-41, ativando assim o sistema hemostático
pela via de contato.
Com isso, fibrinogênio e fibrina são atraídos e se depositam nessa superfície tornando-
-se resistentes à heparina e estimulando a produção de mais trombina sistêmica, que ativa
plaquetas e cria uma plataforma fosfolipídica para ação do complexo de protrombinase,
permitindo a ativação de mais protrombina em trombina.
Os fatores ativados nesse sistema de contato da cascata de coagulação, envolvem: fator
XII, XI, pré-calicreína, cininogênio de alto peso molecular que é degradado para bradi-
cina42 . Todos esses fatores são consumidos podendo causar coagulopatia no período pós
operatório.
Estudos sugerem que a ativação do sistema de contato da cascata de coagulação pela
antiga via intrínseca não é o único a desencadear a geração de trombina 43,44. Essas informa-
ções indicam que a ativação do sistema de coagulação na circulação extracorpórea deve-se
também à liberação do fator tecidual e estimulação do fator VII (via extrínseca).
Essa ativação, além de fibrinólise e hemólise, é descrita, em parte, como sendo devida à
reinfusão do sangue recuperado pela aspiração do conteúdo da cardiotomia, que contém
restos celulares, lipídeos e fator tecidual exposto ao ar e a superfície trombogênica45,46.

Figura 2. Modelo da exposição do sangue a materiais estranhos, formando uma camada de proteínas plas-
máticas em torno do plástico. Reproduzido da referência71.

94 | Educação Continuada em Anestesiologia


Efeitos da Hipotermia e Hemodiluição
A hipotermia em graus variáveis é induzida durante o procedimento com o intuito de
reduzir a taxa metabólica, e portanto as necessidades por oxigênio de todos os órgãos. Essa
alteração desencadeia disfunções plasmáticas e celulares dos componentes da coagulação:
sequestro de plaquetas pela circulação esplâncnica e ativação parcial de sua função, libera-
ção de fator tecidual, ativação da fibrinólise e disfunção enzimática da cascata de coagulação
mesmo após o reaquecimento.
Felizmente a maioria desses efeitos são de pouca relevância para o paciente durante o
período de CEC, e os principais desafios hemostáticos ocorrem no momento do reaqueci-
mento do paciente. No entanto, existem evidências de que a disfunção plaquetária no final
da CEC é consideravelmente maior quando o paciente permaneceu hipotérmico durante
longos períodos de tempo47.
A hemodiluição desencadeada pelo preenchimento inicial do reservatório e das cânulas
plásticas do circuito da CEC, para evitar transferência de êmbolos de ar para o paciente,
podem contribuir para coagulopatia dilucional perioperatória e ainda agravar a perfusão
tecidual com a queda de hematócrito, podendo gerar estados acidóticos e piorar a disfunção
hemostática, no final da CEC.

Anticoagulação
Como descrito anteriormente a heparina é o anticoagulante de eleição para prevenir a co-
agulação do sangue no interior do circuito de CEC, e as suas doses foram determinadas em-
piricamente desde o início de sua utilização. Tradicionalmente o uso do tempo de coagulação
ativado (TCA) é utilizado para monitorizar o nível adequado de coagulação durante a CEC, e
diversos centros utilizam a dose 300-400UI/kg de heparina, com o intuito de manter o TCA
>400 segundos, sendo que doses adicionais podem ser administradas para manter esses valores.
Entretanto os valores do TCA fornecem somente informações gerais em relação ao
estado de coagulação e não o mecanismo exato dessa inatividade do sistema hemostático.
Além de não se correlacionar com a concentração plasmática de heparina e ser influencia-
do pela hemodiluição, hipotermia e uso de medicações antifibrinolíticas 48-50.
A associação entre a dose de heparina utilizada e o sangramento no pós-operatório
ainda continua obscura, no entanto diversos estudos têm demonstrado que doses maiores
de heparina, controladas pela concentração plasmática e não pelo TCA estão relacionadas
com menores sangramentos no período pós-operatório 51-55. Isso se dá provavelmente pela
inibição da ativação excessiva da formação de trombina e fibrinólise, e manutenção de
níveis mais elevados dos fatores de coagulação após a CEC.
O sulfato de protamina é o agente mais utilizado para reversão da anticoagulação pela
heparina no final da CEC, formando um complexo estável de 1:1 e meia vida de aproxi-
madamente 5 minutos56. Entretanto apresenta diversas limitações potenciais: hipotensão
sistêmica, aumento da pressão na circulação pulmonar, diminuição do débito cardíaco,
anafilaxias, além de algumas disfunções do próprio sistema de hemostasia 57.

A coagulação no paciente cirúrgico – parte 1 | 95


A administração excessiva de protamina, em relação à heparina, pode inibir a reatividade
e a agregação plaquetária induzida pela trombina 58, e também alterar a interação entre o
receptor plaquetário GPIb e o fator de von Willebrand 59, com consequente distúrbio de
coagulação após a reversão da anticoagulação na saída da CEC.
Portanto, a utilização de estratégias para reversão da anticogulação é essencial para re-
duzir esses efeitos adversos: doses fixas não ultrapassando 1,3 mg de protamina para 1mg
de heparina administrada60, titulação das doses de protamina, uso de curvas dose respostas
TCA/Heparina, a fim de não exceder a dose necessária.

Sistema Inflamatório
A circulação extracorpórea induz uma resposta inflamatória de fase aguda, que asseme-
lha-se à apresentada na sepse, com interligações com o sistema de coagulação.
Ocorre ativação leucocitária com liberação de mediadores inflamatórios como interleucina
I, fator de necrose tecidual, endotoxina, que estimulam monócitos com consequente expres-
são de fator tecidual, geração de trombina e ativação paradoxal e inadequada do sistema de
coagulação61. Ocorre ainda diminuição da atividade da proteína C, com consequente favore-
cimento da produção de trombina durante a CEC 62, contribuindo para maior consumo dos
fatores de coagulação.

Sistema Fibrinolítico
Durante a circulação extracorpórea, desde o seu início ocorre ativação do sistema
fibrinolítico, inicialmente induzida pelo fator XIIa e, posteriormente pela produção endo-
telial do fator ativador do plasminogênio tecidual (t-PA) e do ativador do plasminogênio
uroquinase (u-PA), liberado pelos monócitos, macrófagos e fibroblastos.
Esse estado de hiperfibrinólise é estimulado pela própria trombina e fibrina produzi-
das por outros mecanismos 63 , além de outros mediadores inf lamatórios como citocinas
e endotoxinas 64.
Evidências sugerem que a plasmina e o t-PA são compostos com efeitos inibidores da
função plaquetária, degradando o fator de von Willebrand, e as glicoproteínas de membrana
GPIb e GPIIb/IIIa 66, resultando em disfunção plaquetário no final da CEC.
Vários estudos têm demonstrado que a administração de um composto antifibrinolítico
(aprotinina, ácido tranexâmico e ácido aminocapróico) durante a CEC diminui a ativação
do sistema fibrinolítico e inflamatório, além de reduzirem perdas sanguíneas no período pós
operatório e utilização de hemocomponentes 65, possivelmente pela atenuação da disfunção
plaquetária ocasionada pela hiperfibrinólise.

Disfunção Plaquetária
A disfunção plaquetária é considerada em muitos estudos como a principal causa de he-
morragia relacionada à circulação extracorpórea. Testes de função estão alterados após a
CEC: tempo de sangramento 65, força de contração plaquetária 67.

96 | Educação Continuada em Anestesiologia


Historicamente a disfunção plaquetária durante e após a cirurgia cardíaca, tem sido atri-
buída à ativação da plaqueta, com consequente perda de seus receptores GPIb e GPIIb/
IIIa, e liberação do conteúdo de seus grânulos( ADP, fator 4, tromboglobulina). Entretanto
estudos atuais com novas evidências têm sugeridos que fatores outros, que não somente o
trauma são responsáveis pela ativação das plaquetas. E entre os responsáveis os mais impor-
tantes são a utilização de heparina, hipotermia e a hiperfibrinólise.
A administração de heparina antes da instituição da CEC promove disfunção plaquetá-
ria, medidas pelo aumento do tempo de sangramento e redução da capacidade das plaquetas
de produzirem tromboxane A 2 , in vivo 68, além de distúrbios na sua agregação.

4.3 Diagnóstico da coagulopatia pós-CEC


O diagnóstico etiológico da disfunção hemostática que ocorre no término da CEC não
costuma ser um procedimento fácil e acurado, uma vez que os testes convencionais para
avaliação da coagulação (TP, TTPa, níveis séricos de fibrinogênio, número de plaquetas,
TT) são imprecisos e demandam um certo tempo para serem realizados, podendo postergar
ações terapêuticas, além de não fornecer informações sobre a função plaquetária 69.
Desse modo, cresceu o interesse sobre um dispositivo antigo, mas que não obteve espaço no
âmbito da cirurgia cardíaca até o início da década de 90, a tromboelastografia/ tromboelastome-
tria. Esta permite acessar com facilidade e rapidez todo o processo de formação (propriedades
viscoelásticas) e dissolução do coágulo, e com isso proporcionar resultados instantâneos com
terapêuticas específicas e direcionadas, antes mesmo de acessar os resultados de testes conven-
cionais de coagulação. Diversos estudos tem validado a sua utilização em cirurgias cardíacas e
demonstrado maior rapidez e acurácia na identificação da causa de sangramento pós CEC 70,71.

5. Hemorragia em Obstetrícia
A hemorragia pós-parto é uma das principais causas de morte materna, acompanhada
de eventos embólicos e hipertensão. Sua incidência vem aumentando, chegando, segundo
estudos americanos, a 2,93% de todos os partos 72,73. Por definição, caracteriza-se como he-
morragia pós-parto a perda sanguínea maior que 500 ml no parto normal e maior que 1000
ml no parto cesariano72 .
Os sangramentos precoces ocorrem em até 24 horas após o parto e são clinicamente mais
importantes, com maiores perdas sanguíneas, podendo levar a choque hemorrágico, coagu-
lopatia e óbito, sendo que 79% destes são causados por atonia uterina. Entre outras causas de
hemorragia pós-parto estão: retenção de fragmentos placentários, laceração de trato genital,
ruptura uterina, inversão uterina, placenta acreta e coagulopatia hereditária 72,73.
Alguns fatores de risco como causa de atonia uterina são: grande distensão uterina (como
em gestações múltiplas ou polidrâmnio), hipertensão arterial, pré-eclampsia, corioamnioni-
te, parto cesáreano e idade materna maior do que 35 anos. Entretanto, segundo estudo, em
38% dos casos de hemorragia por atonia uterina, nenhum dos fatores de risco anteriormente
relacionados foram identificados73.

A coagulação no paciente cirúrgico – parte 1 | 97


Alterações fisiológicas ocorrem durante a gestação a fim de preparar o organismo mater-
no para o sangramento que ocorre durante o parto e o puerpério imediato: ocorre um au-
mento de 42% no volume plasmático, um aumento na massa eritrocitária além da instalação
de um estado hipercoagulável do sangue 72,73.
Entretanto, em casos de perdas sanguíneas mais intensas, estes mecanismos de compen-
sação tornam-se insuficientes e a paciente pode apresentar anemia, choque hemorrágico,
coagulopatia dilucional (resultante de reposição de grandes quantidades de cristalóide) e
coagulação intravascular disseminada, que acarretará ainda maior consumo de plaquetas e
fatores de coagulação.
Nos casos em que já é esperado hemorragia pós-parto como nos casos de acretismo
placentário, a preparação para o momento do parto deve ser diferenciada: acessos venosos
calibrosos devem ser obtidos, concentrados de hemácias e produtos derivados do sangue
devem estar disponíveis em sala para tranfusão se necessário. A anestesia geral deve ser con-
siderada uma vez que o tempo operatório pode se prolongar e instabilidade hemodinâmica
pode ocorrer em caso de grande sangramento 71.
A transfusão de sangue autólogo recuperado do campo cirúrgico, com a utilização do
sistema de recuperação de hemáceas (cell saver) é descrita em obstetrícia e pode ser uma
ferramenta útil nos casos em que a hemorragia pós-parto é esperada.
A embolização das artérias uterinas tem sido realizada de maneira eletiva com bons resul-
tados em casos de acretismo placentário e de maneira emergencial em casos de sangramento
uterino não responsivo às medidas clínicas, quando se quer preservar o útero da paciente 74.
Em termos de reposição de hemocomponentes, a maioria dos estudos preconiza que os
níveis de hemoglobina da paciente sejam mantidos acima de 7 a 8 g/dL. O que é discutível
é o momento a partir do qual a coagulação da paciente deve ser tratada. Estudo japonês
mostrou que quando houve necessidade de transfusão com seis ou mais concentrados de
hemácias, o plasma fresco congelado também foi transfundido. O mais interessante é que
os pesquisadores concluíram que a razão transfundida foi de 1 unidade de plasma para cada
1,3 ou 1,4 unidade de hemáceas e sugerem que em casos de hemorragias obstétricas, a coa-
gulação seja tratada segundo esta proporção75,76.
O papel do fibrinogênio na coagulação vem sendo cada vez mais discutido, embora até
agora nenhum protocolo tenha estabelecido um valor exato a partir do qual crioprecipitado
deva ser administrado. Atualmente, é consenso que quando níveis menores que 1g/L sejam
atingidos, este hemoderivado seja transfundido 76.
Na coagulopatias dilucional e intravascular disseminada, pode ocorrer trombocitopenia
e é consenso que seja realizada a transfusão de plaquetas, a fim de manter contagens acima
de 50.000/dl76.
O uso do fator VII ativado, inicialmente descrito para o tratamento de sangramento em
hemofilias, atualmente vem sendo utilizado em pacientes obstétricas. Alguns estudos apre-
sentaram resultados favoráveis em casos de hemorragia pós-parto após histerectomia ou
como agente que evitou a histerectomia (quando foi administrado após falha das medidas
clínicas, na tentativa de preservar a fertilidade da paciente).

98 | Educação Continuada em Anestesiologia


Entretanto, o seu emprego em obstetricia necessita de mais estudos clínicos. Há ainda
a preocupação do risco de eventos tromboembólicos, que já foram descritos nos pacientes
sem coagulopatia prévia que receberam o fator VII ativado 77.

6. Monitorização da coagulação: tromboelastografia/tromboelastometria


No intuito de avaliar com rapidez as condições de coagulação do paciente no período
peri- operatório, e havendo limitações dos exames tradicionais na avaliação da coagulação
sanguínea, a tromboelastografia tornou-se ferramenta importantíssima no manejo do pa-
ciente em cirurgias com alto risco de sangramento, tais como o transplante hepático e a
cirurgia cardíaca com circulação extra-corpórea.
A tromboelastografia foi desenvolvida originalmente por Helmut Hartert em 1948
como instrumento de pesquisa78 e, anos mais tarde, introduzida na prática clínica por
Kang como forma de monitorização da coagulação em transplantes hepáticos79, posição
ocupada até os dias atuais. Permite uma avaliação integral do processo de iniciação, for-
mação, estabilização e lise do coágulo, representando a interação de todos os componen-
tes relacionadas à sua formação.
O princípio baseia-se no registro das propriedades viscoelásticas de uma amostra de
sangue total, pela medida de sua impedância mecânica e outras alterações relacionadas,
durante a formação do coágulo. Uma pequena amostra sanguínea colocada numa cubeta
aquecida é submetida à uma oscilação tendo um pino suspenso em seu interior conectado
a um sistema de detecção. Com a formação do coágulo a magnitude do movimento desse
pino é modificada e essas alterações são transformadas por transdutores elétricos e mecâ-
nicos criando sinais que são posteriormente processados fornecendo traçados típicos, com
informações quantitativas do processo de coagulação 80.
Com o advento de novas tecnologias e do refinamento da técnica, duas empresas lança-
ram no mercado novos aparelhos a partir de 1996 utilizando o mesmo princípio, mas deno-
minações diferentes dos parâmetros: tromboelastografia TEG® registrado pela Haemoscope
Corporation (Figura 3) e tromboelastometria ROTEM® comercializada pela Penthafarm
GmbH (Figura 4).

Figura 3 – Traçado da trom-


boelastografia TEG®

A coagulação no paciente cirúrgico – parte 1 | 99


Figura 4 – Traçado da tromboelasto-
metria ROTEM®

Após o processamento dos sinais, ambos os equipamentos mostram traçados similares e


fornecem informações quantitativas do processo de formação do coágulo, no entanto, com
denominações diferentes:
• Tempo para início de formação da fibrina ( tempo desde o início do traçado até atingir a
espessura de 2 mm ).
TEG® R - Reaction time .
ROTEM® CT – Clotting time.
• Cinética de formação de fibrina e desenvolvimento do coágulo (período entre as ampli-
tudes de 2 a 22 mm ).
TEG® K- Kinetics e ângulo alfa.
ROTEM® CFT – Clotting formation time e ângulo alfa.
• Tensão máxima e estabilidade do coágulo (sofrendo influência das plaquetas, fibrinogê-
nio e fator XIII ).
TEG® MA – Maximum amplitude.
ROTEM® MCF – Maximun clot firmness.
• Lise do coágulo ( representa a fibrinólise – representa a porcentagem do MCF ou MA
após o tempo do início da formação do coágulo ).
TEG® CL – clotting lisys .
ROTEM®: LY.
Com isso podemos caracterizar os padrões gráficos de coagulopatias (Figura 5):

Figura 5: Padrões gráficos


da tromboelastometria.

100 | Educação Continuada em Anestesiologia


Para melhorar a capacidade de diferenciação entre as etiologias das coagulopatias fo-
ram criados diferentes testes utilizando reagentes específicos, disponíveis para ambos
os equipamentos.
No caso do ROTEM®:
• Ex-TEM: possui fator tecidual, indicado para avaliação rápida da formação do coágulo e
fibrinólise da via extrínseca da coagulação.
• In-TEM: ativação por contato, avalia a formação do coágulo e polimerização da fibrina,
via intrínseca da coagulação.
• Fib-TEM: possui fator tecidual e antagonista das plaquetas, indicado para avaliação dos
níveis de fibrinogênio.
• Ap-TEM: possui fator tecidual e aprotinina, indicado para detecção de hiperfibrinólise
quando associado ao ex-TEM.
• Hep-Tem: possui ativador por contato e heparinase, indicado para detecção de heparina
quando comparado ao in-Tem.

Associando os diferentes testes podemos melhor diagnosticar a etiologia


das coagulopatias:
Paciente Normal (Figura 6):

Figura 6: Padrão de tromboelastometria ROTEM® normal

A coagulação no paciente cirúrgico – parte 1 | 101


Paciente com deficiência plaquetária (Figura 7):

Figura 7: Padrão de tromboelastometria ROTEM® em deficiência plaquetária

Paciente com deficiência de fibrinogênio (Figura 8):

Figura 8: Padrão de tromboelastometria ROTEM® em deficiência de fibrinogênio

102 | Educação Continuada em Anestesiologia


Paciente com hiperfibrinólise (Figura 9):

Figura 9: Padrão de tromboelastometria ROTEM® na hiperfibrinólise

Paciente com influência da heparina (Figura 10):

Figura 10: Padrão de tromboelastometria ROTEM® com o uso de heparina

A coagulação no paciente cirúrgico – parte 1 | 103


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108 | Educação Continuada em Anestesiologia


Capítulo 07

Utilização de
hemoderivados em
cirurgia cardíaca
Ricardo Lopes da Silva
Fernando Antônio Nogueira Cruz Martins
Kleber Machareth de Souza
Utilização de hemoderivados em cirurgia cardíaca
Determinação do valor mínimo do hematócrito em cirurgia cardiovascular –
Evidencias favoráveis e contrárias a adoção de um gatilho transfusional.
Em 1947, John Lundy, baseado em anos de experiência nas salas de cirurgia da Clinica
Mayo, publicou que uma hemoglobina (Hb) de 10g/dl ou uma perda de 15% do volume
circulante seriam apropriados para utilizar como gatilho transfusional1. Este conceito
perdurou até a década de 80 quando se começou a questionar os riscos e benefícios da
transfusão sanguínea.
Atualmente, os conceitos sobre transfusão sanguínea estão baseados na necessidade
de aumentar a capacidade carreadora de oxigênio do sistema circulatório. O adequado
transporte de oxigênio (DO2) é o que mantém a homeostase normal dos tecidos, de-
pendendo do f luxo sanguíneo e do conteúdo de oxigênio arterial. O f luxo sanguíneo
é dependente do débito cardíaco e de condições circulatórias locais. Enquanto que o
conteúdo de oxigênio está diretamente relacionado com os níveis de Hb, saturação de
oxigênio e o oxigênio dissolvido no plama 2 (CaO2= Hb X 1,34 X SaO2 + 0,0034 X PaO2).
Portanto, a capacidade de transporte de oxigênio é diretamente proporcional ao
conteúdo de hemoglobina, uma vez que a quantidade de oxigênio dissolvida no
plasma é ínfima.
Em condições normais, o transporte de oxigênio sobrepõe o seu consumo em quatro
vezes e sua extração em torno de 20-30%. Quando ocorre uma queda nos níveis de Hb, ane-
mia, o organismo lança mão de respostas adaptativas, como aumento do fluxo sanguíneo
através de um acréscimo no débito cardíaco, redistribuição do fluxo de órgãos não vitais
para órgãos vitais, especialmente cérebro e coração, além do aumento na taxa de extração
de oxigênio pelos tecidos. O valor do transporte crítico de oxigênio humano ainda não é
conhecido, o lactato plasmático é um bom marcador da inadequada perfusão. No momento
que a reserva do organismo começa a se exaurir e falta oxigênio para o metabolismo aeróbi-
co, este se converte em anaeróbico, evidenciado pelo aumento no lactato plasmático3. Neste
ponto crítico, seria o momento em que a hemotransfusão estaria indicada, visando restaurar
a capacidade carreadora de oxigênio. Definir este momento é muito difícil, sendo ele variá-
vel dependendo das condições físicas do paciente. Experiência com pacientes Testemunhas
de Jeová mostram que o aumento da morbimortalidade em pacientes saudáveis começa a
ocorrer com uma Hb inferior a 5g/dl4.
Não existe um gatilho transfusional que atenda a todos os pacientes, o que existe são pa-
râmetros que nos guiam quanto à necessidade de se administrar concentrado de hemácias.
Em um guideline publicado pela Sociedade Americana de Anestesiologia (ASA), postula-se
que nunca há necessidade de hemotransfundir quando o paciente apresenta Hb superior a
10g/dl, porém em indivíduos com Hb inferior a 6g/dl a utilização de concentrado de hemá-
cias está bem indicada5. Na faixa que varia de 6-10g/dl de hemoglobina, a necessidade ou
não de transfusão vai depender das condições clinicas do paciente.

110 | Educação Continuada em Anestesiologia


A hemotransfusão em cirurgia cardíaca deve ser considerada de forma especial, uma vez
que os mecanismos de compensação estão prejudicados, especialmente nos pacientes
coronariopatas. O miocárdio apresenta uma alta taxa de extração do oxigênio em torno de
90%, impossibilitando seu aumento para compensar uma anemia. Em pacientes com estenose
coronariana tem-se pouca ou nenhuma reserva para aumentar o fluxo sanguíneo miocárdico,
portanto é muito importante que a capacidade carreadora de oxigênio seja mantida. Porém,
mesmo nos coronariopatas não existe um gatilho transfusional bem definido. A decisão de se
transfundir deve levar em consideração outros critérios clínicos como índice cardíaco (IC),
isquemia miocárdica e a idade do paciente. Os pacientes com IC<2, presença de isquemia do
miocárdio e idade avançada se beneficiam de uma estratégia mais liberal, iniciando a hemo-
transfusão com Hb 8,3g/dl ou hematócrito de 25%. Nos pacientes jovens, idade inferior a 55
anos, IC> 2,5 a opção por uma estratégia mais restritiva iniciando a transfusão de concentra-
dos de hemácias com Hb 7,0g/dl ou hematócrito de 22% parece ser mais adequada6.
A circulação extracorpórea (CEC) é um período especial durante a maioria das cirurgias
cardíacas, na qual ocorre uma anemia dilucional podendo ocasionar um transporte inade-
quado de oxigênio e consequentemente, uma lesão isquêmica. Quando o hematócrito cai
abaixo de 20% em pacientes jovens e de 24% em pacientes idosos, ocasionará um aumento
na incidência de acidente vascular cerebral isquêmico, insuficiência renal, edema pulmo-
nar e falência de múltiplos órgãos. Os baixos níveis de hematócrito durante a CEC um é
preditor importante e independente de mortalidade operatória7. Portanto é recomendável
que durante o período de CEC o hematocrito mínimo seja mantido em 22% e nos pacientes
idosos igual a 24%.
O estabelecimento de um valor fixo de hematócrito como um gatilho transfusional
para pacientes submetidos à cirurgia cardiovascular baseado nos conhecimentos atu-
ais é praticamente impossível. Estaríamos correndo o risco de não transfundir pacientes
que realmente necessitam e com isto causando uma diminuição da oferta de oxigênio
ao miocárdio e consequentemente agravando as condições de isquemia miocárdica. Ou
poderíamos transfundir pacientes que ainda não necessitem e que ficariam expostas as
suas complicações como: reações transfusionais, transmissão de infecções, risco da injúria
pulmonar aguda e alteração na imunomodulação. Por estes motivos é que a decisão de se
transfundir ou não concentrados de hemácias deve ser individualizada e não utilizar um
valor fixo de hematócrito mesmo que, para uma cirurgia especifica.

Diretrizes para transfusão de hemocomponentes em cirurgia cardiovascular.


A transfusão de hemocomponentes visa restaurar a capacidade carreadora de oxigênio
do sangue ou corrigir distúrbios da coagulação. A utilização de hemoderivados com a fi-
nalidade de repor volume é totalmente inadequada, sendo que para esta finalidade deve se
lançar mão de soluções colóides ou cristalóides. Plasma fresco congelado, concentrado de
plaquetas e crioprecipitados devem ser utilizados de forma racional com a finalidade única
de corrigir algum distúrbio da coagulação.

Utilização de hemoderivados em cirurgia cardíaca | 111


A utilização de plasma fresco congelado deve ser orientada pelo sangramento excessivo
e, sempre que possível, preferencialmente por exames laboratoriais. Estando indicada em
casos de Tempo de Protrombina superior a 1,5 vezes ou com uma Relação Normatizada
Internacional (RNI) superior a 2 vezes. Os fatores de coagulação devem ser repostos em
pacientes que apresentaram grande perda sanguínea e necessitaram hemotransfundir uma
ou mais volêmia, na reversão da terapia com warfarim em pacientes submetidos à cirurgia
cardíaca de urgência em que esta terapêutica não pode ser interrompida em tempo hábil, na
dose de 5-8 ml/Kg e para correção da deficiência de algum fator de coagulação na falta de
um concentrado específico5.
É muito comum que os pacientes submetidos à cirurgia cardiovascular estejam medi-
cados com drogas antiplaquetárias. A utilização de plaquetas, para restaurar sua função,
mesmo com a contagem plaquetária acima de 100.000/mm 3,deve ser indicada em caso
de sangramento excessivo. O tempo prolongado da CEC é uma das causas de disfunção
plaquetária, portanto a presença de discrasia sanguínea após CEC pode ser tratado com
reposição de plaquetas. A utilização de plaquetas esta indicada nos pacientes que apre-
sentem contagem plaquetária abaixo de 50.000/mm 3 e entre 50.000 e 100.000/mm 3 com
sangramento microvascular5.
A utilização de crioprecipitado em cirurgia cardíaca segue as mesmas recomenda-
ções da sua utilização para as demais cirurgias, quando o fibrinogênio for menor que
80-100mg/dl e sangramento microvascular excessivo. Correção de sangramento mi-
crovascular em pacientes maciçamente transfundidos, quando for impossível dosar o
fibrinogênio; pacientes com deficiência congênita de fibrinogênio. E pacientes com
doença de Von Willebrand na falta do concentrado especifico podem ser tratados
com crioprecipitado5 .

Complicações da Transfusão Sanguínea


As complicações relacionadas à terapia com hemoderivados devem ser considera-
das em um contexto individual, ou seja, a análise dos possíveis riscos e a evidência de
que ocorrerão benefícios que os superem. Os anestesiologistas devem estar cientes
dos possíveis eventos indesejáveis, saber reconhecer e em algumas situações, tratar
tais eventos.

Transmissão de doenças infecciosas


A incidência de infecções decorrentes de transfusão de hemoderivados tem reduzido. O
fator mais importante relacionado a essa redução é a realização de testes mais precisos no
material do doador.
Entre os agentes infecciosos mais frequentes estão: vírus da hepatite B (1 em 220.000),
vírus tipo I linfotrófico das células T humanas - HTLV1 (1 em 640.000), vírus da hepatite
C (1 em 1,6 milhões), vírus da imudeficiência humana - HIV (1 em 1,8 milhões), citomega-
lovírus, malária e doença de Chagas6.

112 | Educação Continuada em Anestesiologia


Lesão pulmonar aguda relacionada à transfusão - TRALI
É uma síndrome de angústia respiratória que ocorre nas primeiras 6 horas após trans-
fusão de eritrócitos ou plasma fresco congelado. Caracteriza-se por dispnéia e hipoxemia
arterial secundárias ao edema pulmonar de origem não cardíaco. O diagnóstico é confirma-
do quando o edema ocorre na ausência de hipertensão atrial esquerda e apresenta líquido
de extravasamento rico em proteínas. A conduta imediata diante do quadro é interromper
a transfusão do hemoderivado, administrar tratamento de suporte para manter os sinais
vitais hemodinâmicos e respiratórios, determinar a concentração de proteínas do fluido pul-
monar obtido via cânula endotraqueal, realizar radiografia do tórax e hemograma, além de
informar o banco de sangue sobre o ocorrido, para que outras unidades de hemoderivados
obtidos da mesma amostra possam ser avaliadas. Uma amostra do hemoderivado transfun-
dido e a bolsa com o conteúdo devem ser reenviadas ao banco de sangue7.

Imunomodulação relacionada à transfusão


A hemotransfusão suprime a imunidade mediada por células, a qual associada ao trauma
anestésico-cirúrgico pode levar ao risco aumentado de infecção pós-operatória.
Concentrado de eritrócitos, que apresenta menor quantidade de plasma do que o sangue
total, produz menos imunossupressão. Tal fato sugere que o plasma contém algum tipo de
fator imunossupressivo.
A remoção da maior quantidade possível de leucócitos do sangue e dos concentrados
de plaquetas (leucorredução) tem se tornado comum. Essa prática reduz a incidência de
reações febris não hemolíticas e a transmissão de vírus associados aos leucócitos. Outros
possíveis benefícios da leucorredução são a redução da recorrência do câncer e das infec-
ções pós-operatórias8.

Alterações metabólicas
As principais alterações metabólicas que acompanham a estocagem de sangue total in-
cluem o acúmulo de íons hidrogênio e potássio, a redução da concentração de 2,3-difosfo-
glicerato (2,3-DPG) e a redução do cálcio sérico no receptor.

Íons hidrogênio
A função contínua do metabolismo dos eritrócitos resuta em produção de íons hidrogê-
nio, os quais se associam àqueles presentes na maioria das soluções preservativas. Mesmo
com essas características, a ocorrência de acidose metabólica no receptor não é comum.
Assim, o uso de bicarbonato deve ser regulado pelos valores de pH e não de forma empírica.

Íons potássio
O conteúdo de potássio aumenta progressivamente no sangue estocado, mas mesmo em
transfusões maciças, não é comum a ocorrência de hiperpotassemia. Uma unidade de san-

Utilização de hemoderivados em cirurgia cardíaca | 113


gue total contém 300 mL de plasma com concentração média de potássio de 21 mEq/L, o
que representa administração de cerca de 7 mEq de potássio.

Redução do 2,3-DPG
A estocagem de sangue leva a progressiva redução do 2,3-DPG, o que resulta em maior
afinidade do oxigênio pela hemoglobina (redução da P50). Conceitualmente a afinidade aumen-
tada do oxigênio pela hemoglobina pode causar menor disponibilidade desse gás aos tecidos.

Citrato
O metabolismo do citrato em bicarbonato pode causar alcalose metabólica. De fato, é comum
a ocorrência de alcalose, ao invés de acidose, em pacientes que receberam transfusão maciça.
Por outro lado a ligação de citrato ao cálcio poderia levar a hipocalcemia. A rápida me-
tabolização do citrato a bicarbonato, no fígado, além da mobilização de cálcio ósseo, torna
pouco comum a ocorrência de hipocalcemia em pacientes que recebem transfusão de san-
gue total. A administração de cálcio ao paciente deve seguir parâmetros objetivos, como:
prolongamento do intervalo QT no eletrocardiograma e redução da concentração de cálcio
ionizado plasmático. Além disso deve-se considerar a reposição quando a taxa de infusão de
sangue for mais rápida do que 50 mL/min, na presença de hipotermia ou doença hepática
que interfira com o metabolismo hepático do citrato e em neonatos9.

Hipotermia
A administração de sangue a 6oC pode resultar em hipotermia. Deve-se realizar a passagem
do hemoderivado por aquecedores apropriados. A redução da temperatura aumenta o consu-
mo de oxigênio em até 400% (em caso de tremor pós-operatório) e aumento compensatório
do débito cardíaco, o que pode levar a isquemia miocárdica em coronariopatas9.

Reações transfusionais
As reações transfusionais podem ser classificadas como febris, alérgicas e hemolíticas.
Em muitos casos, a anestesia pode mascarar os sintomas. A possibilidade de reação deve ser
suspeitada quando há hipertermia, aumento da pressão de pico das vias aéreas e/ou altera-
ção aguda da cor da urina ou débito urinário.
Periodicamente durante transfusão de hemoderivados deve-se observar sinais e sinto-
mas, tais como: urticária, hipotensão, taquicardia, aumenta de pressão de vias aéreas, hemo-
globinúria, hipertemia e sangramento microvascular.
Antes de instituir a terapia para reações transfusionais, deve-se interromper a transfusão
e iniciar os testes diagnósticos.

Reações febris
São as mais comuns reações não-hemolíticas. A explicação mais provável é a interação
entre anticorpos do receptor e antígenos existentes nos leucócitos ou plaquetas do doador.

114 | Educação Continuada em Anestesiologia


A temperatura raramente fica maior do que 38oC e cessa com antitérmicos. Reações graves
com tremor devem ser seguidas pela interrupção imediata da transfusão10.

Reações alérgicas
Manifestam-se por hipertermia, urticária e prurido. Tratamento deve ser feito com anti-hista-
mínicos e descontinuação da transfusão, em casos mais graves. Nesses casos deve-se avaliar
a presença de hemoglobina urinária para excluir reação hemolítica10.

Reações hemolíticas
Ocorrem quando sangue de tipagem incorreta é administrada. O fator comum na pro-
dução de hemólise intravascular e desenvolvimento de hemorragia é a ativação do sistema
complemento. Com exceção da hipotensão, os demais sintomas da reação hemolítica podem
ser mascarados pela anestesia: dor lombar ou esternal, febre, calafrios, dispnéia, vermelhi-
dão da pele). O aparecimento de hemoglobina livre urinária ou no plasma sugere ocorrência
da reação. Insuficiência renal resulta da precipitação de componentes lipídicos ou estromais
de eritrócitos hemolisados (não hemoglobina livre) nos túbulos renais distais. Coagulação
intravascular disseminada pode resultar em coagulopatia iniciada por material liberado das
hemácias rompidas.
O tratamento inclui descontinuação imediata da administração do hemoderivado e ma-
nutenção do débito urinário com uso de cristalóides venosos, manitol e furosemida. Corti-
cóides e bicarbonato de sódio para alcalinizar a urina e melhorar a solubilidade de produtos
da degradação de hemoglobina, são controversos10.

Alternativas a Transfusão de Hemocomponentes – O Futuro do Manuseio de


Hemocomponentes.
Como consequência de uma maior compreensão envolvendo os problemas clínicos as-
sociados a transfusão de sangue alogênico, bem como o aumento do custo associado a esta
situação clínica, têm se estimulado a busca por novas alternativas vinculadas a transfusão de
hemocomponentes. Alguns centros hospitalares têm inclusive obtidos melhores resultados
clínicos baseado na prática de métodos alternativos à transfusão de sangue alogênico e na
racionalização da transfusão destes11-12 .
Esforços tem sido feito na busca por métodos transfusionais alternativos. A Sociedade
Avançada de Manuseio do Sangue define manuseio de sangue como “o adequado forneci-
mento e uso do sangue, seus componentes e derivados, além de estratégias para reduzir ou
evitar a necessidade de transfusão sanguínea.” – http://www.sabm.org/about/mission.php.
Em outras palavras, o sangue deve ser utilizados somente em situações clínicas, nas quais
há evidências de que a sua utilização traz comprovadamente benefícios ao paciente. No
entanto estas evidências não estão ainda bem definidas na literatura, e a transfusão de
sangue alogênico é realizada baseado na história clínica e avaliação subjetiva de quem
a pratica.

Utilização de hemoderivados em cirurgia cardíaca | 115


Estratégias visando reduzir a incidência de transfusão sanguínea alogênica se dividem
em métodos associados ao período pré-operatório, perioperatório e pós-operatório12 .
Um dos fatores que levam a administração de sangue alogênico é a presença de
anemia pré-operatória, em muitas situações, como o trauma, pouco pode ser feito! No
entanto, especificamente no paciente a ser submetido a cirurgia cardíaca eletiva, em
poucas semanas isto pode ser realizado sem maiores problemas visando o controle da
anemia pré-existente12 .
O problema é o momento em que se identifica a anemia, muitas vezes isto é feito pela
própria equipe anestésica, o ideal é que a equipe cirúrgica o faça em avaliação prévia e com
antecedência. Já há no mercado equipamentos simplificados que podem facilitar a avaliação
da presença ou não de anemia ainda no ambiente da consulta12 .
Nestes casos a utilização de agentes estimulantes da eritropoiese trará grandes benefí-
cios. Em relação ao risco de trombose associado ao uso de estimulantes da eritropoiese,
sugere-se que se determine a etiologia da anemia13.
Por vezes a própria reposição de sulfato ferroso pode ser suficiente, podendo ainda se
recorrer a ação conjunta entre a administração de sulfato ferroso e agentes estimulantes
da eritropoiese12 .

Recuperação Intraoperatória de Sangue


Há basicamente três métodos de recuperação intraoperatória de sangue, o de centrifugação
utilizando o cell saver. O de ultra-filtração utilizando o hollow fiber ultrafiltre e o retransfusão
de sangue processado.
As duas últimas técnicas apresentam a vantagem de processar plaquetas, proteínas plas-
máticas e fatores de coagulação, no entanto a solução (infusato) é heparinizada o que requer
protamina adicional para sua reversão14.
O processo de ultra-filtração pode expor o infusato a elevadas pressões trans-membrana
que poderam ocasionar hemólise. A técnica do cell saver produz um infusato rico em células
vermelhas, porém sem a presença de plaquetas, proteínas plasmáticas, fatores de coagulação
e heparina. A utilização de sangue centrifugado tem estado associado ao aumento do tempo
de pró-trombina, tempo da trombina e tempo de ativação da trombina quando comparado
a infusão direta de sangue processado e ultra-filtração. A infusão de ultra-filtrado do sangue
está associado a altos níveis de fibrinogênio e pressão oncótica, não persistindo por mais
de 6 horas. Os estudos tem sido incapazes de diferenciar alterações no perfil de coagulação
quando comparou-se o infusato do cell saver com o do ultra-filtrado.

Hemodiluição Normovolêmica Aguda Pré-Operatória


Doação Autóloga Pré-operatória (DAP)
Para doação autóloga, o paciente, segundo protocolo da Associação Americana de
Bancos de Sangue deve apresentar hemoglobina superior a 11 g/dL ou o hematócrito
superior a 33 % antes de cada doação. A doação pode ser de até 10.5 ml/kg. A quan-

116 | Educação Continuada em Anestesiologia


tidade de sangue retirado é reposto ao paciente em quantidade idêntica a retirada,
utilizando-se solução cristalóide ou colóide. A última doação deve ocorrer até 72 horas
antes da cirurgia para permitir a recuperação do volume intravascular. Apesar de rela-
tos seguros na literatura, a DAP não é habitualmente recomendada para pacientes com
doença cardiovascular, principalmente aqueles com estenose aórtica e coronariopatia,
pois a produção e liberação de eritropoeitina endógena e a eritropoiese compensatória
são inadequadas15-16 .
Esta técnica mantêm o volume circulante e o transporte de oxigênio pela diminuição
da viscosidade sanguínea. Durante a hemodiluição há dois mecanismos compensatórios
primários para queda do volume de células circulantes: o aumento do débito cardíaco
secundário ao aumento da frequência cardíaca e da contratilidade, além da redução da
viscosidade sanguínea que promoverá um aumento do retorno venoso17-18.
Portanto, a prática da hemodiluição normovolêmica pressupõe uma capacidade de
adaptação cardiovascular visando um adequado transporte de oxigênio tissular. Convém
lembrar que nos pacientes a serem submetidos a cirurgia cardiovascular é importante ava-
liar esta capacidade de adaptação17-19.
Outra vantagem é a presença de quantidades significativas de plasma e plaquetas no san-
gue ofertado17-18.
O conceito é simples, porém o processo de execução exige alguns cuidados importantes
e de difícil manuseio. A via de retirada do sangue deve permitir um fluxo sanguíneo elevado
e para tanto deve ser de grosso calibre visando evitar que este coagule. A via de eleição é um
calibroso acesso central ou uma linha arterial que também pode ser utilizada. Porém a uti-
lização das veias braquial e cefálica pode não serem adequadas, especialmente em pacientes
idosos que apresentam estas veias dotadas de um calibre menor.
A quantidade retirada de sangue permitido é motivo de controvérsia na literatura, em
especial pelo risco de isquemia miocárdica e cerebral19.
Alguns serviços provem uma hemodiluição onde o hematócrito chega a atingir 25%,
outros mais “permissivos” o hematócrito chega em torno de 18% a depender das condições
clínicas do paciente que certamente não se aplica ao paciente candidato a cirurgia cardiovascular
(onde se prefere a técnica intra-operatória). Em geral a determinação do hematócrito final
dependerá do inicial19.
A DAP determina que a elevação do hematócrito deve ser de 11% (sem suplementação
de ferro) e 19 % (com suplementação de ferro) do volume de eritrócitos, o que não impede
a ocorrência de anemia em pacientes submetidos à DAP. Alternativamente, o esquema
de DAP de duas doações semanais por 3 semanas nos casos onde se prevê uma perda
sanguínea de grande monta, deve se iniciar 25-35 dias antes da cirurgia, estimulando a
elevação da eritropoetina endógena, com elevação do volume de eritrócitos entre 19 e 26 %.
O uso da eritropoetina exógena pode ser uma opção , visando o aumento ainda maior dos
níveis de hematócrito19.
Os custos com a coleta de sangue autólogo são superiores aos da coleta de sangue alogê-
nico, ne entanto podemos citar como vantagens;

Utilização de hemoderivados em cirurgia cardíaca | 117


1. prevenção de doenças associadas à transfusão
2. prevenção de aloimunização
3. fornecimento de sangue a pacientes com aloanticorpos
4. prevenção de reações transfusionais adversas.
Protocolos rígidos visando a doação autóloga devem ser estabelecidos visando diminuir a
possibilidade de doenças infecciosas virais, armazenamento e erros associados à administração.
Quando o processo é realizado em uma mesma instituição hospitalar os erros são
minimizados, mas as possibilidades tornam-se maiores a medidas que são realizados em
instituições diferente19.
As diretrizes da STS consideram a DAP como recomendação de nível 2a, com nível A de
evidência, quando associada à eritropoetina e/ou de sulfato ferroso19.

Hemodiluição Normovolêmica Aguda Intra-Operatória em Cirurgia Cardíaca


A hemodiluição normovolêmica aguda intra-operatória em cirurgia cardíaca, implica
na remoção de sangue total do paciente e substituição deste por igual volume de solução
cristaloide ou colóide antes da circulação extra-corpórea.
Este procedimento pode estar20-21-22 ou não associado a necessidade de transfusão de
sangue alogênico23-24.
Embora a segurança do método esteja bem estabelecida, a eficácia ainda é motivo
de controvérsia 26-27.
O debate envolve a segurança do método quanto a quantidade de células vermelhas
e consequentemente plaquetas que podem ser retiradas pré-circulação extra-corpórea
com segurança 26-27.
Em relação a técnica intra-operatória (mais utilizada) dois métodos podem ser realiza-
dos: o primeiro é a colheta de sangue em bolsas contendo citrato de sódio via linha venosa
central ou via arterial pré-heparinização. Esta técnica apresenta como obstáculo a retirada
de um volume maior que 1000ml em função do tempo restrito anterior a heparização do
paciente. O segundo método relaciona-se a retirada de sangue de uma linha venosa com o
paciente em bomba de circulação extra-corpórea, ou retirada da própria bomba de circula-
ção extra-corpórea, após a heparinização do paciente, durante a instalação do processo de
circulação extra-corpórea; de forma semelhante é raro que se obtenha um volume retirado
maior do que 1000ml de sangue26-27.
Portanto a eficácia do processo limita-se a quantidade de volume sanguíneo capaz de ser
retirado do paciente durante o processo26-27.
A transfusão de 1000ml de sangue raramente é capaz de produzir melhora clínica sig-
nificativa do paciente, particularmente quando se compara a contagem plaquetária, ou
função clínica do volume retirado, em relação ao pool plaquetário presente no volume
circulante do paciente26-27.
A quantidade de células vermelhas é menos importante ainda, pois são geralmente
menos consumidas que as plaquetas durante a circulação extra-corpórea.

118 | Educação Continuada em Anestesiologia


Desta forma, em detrimento desta técnica, a maioria dos serviços de cirurgia cardíaca,
acabam optando por repor ao paciente ao final da circulação extra-corpórea, o volume
contido no oxigenador e aspirado no reservatório26-27.

Análogos da Eritropoetina
Eritropoetina
Hormônio glicoprotéico produzido pelos rins, sendo que sua concentração eleva-se
na vigência de hipóxia. Após atingir a medula óssea, a eritropoetina atua em células
precursoras do eritroblasto o que induzirá sua diferenciação, acelerando a produção
de eritrócitos maduros. O processo de aceleração na produção de eritrócitos se inicia
geralmente no segundo dia de administração e atinge seu ápce no quarto ou quinto dia
após sua administração. Seu efeito se encerra após onze a doze dias. Deve-se observar
seu perfil clínico visando a administração de ferro e a realização de doação autóloga.
Pode-se utilizar para administração a via venosa e a via subcutânea, necessitando o
ajuste de doses para cada via determinada. A administração venosa promove biodis-
ponibilidade de 100% da eritropoietina, enquanto a via subcutânea em torno de 25%14.
É importante salientar que a efetividade da eritropoietina é dependente da co-administração
de ferro para sua efetividade.
Metanálises presentes na literatura tendem a demonstrar que a eritropoietina é ca-
paz de promover uma menor realização de transfusão de sangue alogênico associado a
um melhor perfil “cardioprotetor” reduzindo áreas de infarto, quando comparados ao
grupo controle.
A relação custo X benefício tende a favorecer a utilização da eritropetina, principalmente
em se considerar os riscos de doenças infecciosas associadas as transfusões sanguíneas14.

Medicamentos e Métodos Alternativos que Minimizam Perdas Sanguíneas


Antifibrinolíticos (ácido ε-amino capróico e ácido tranexâmico)
Os antifibrinolíticos reduzem o sangramento e as transfusões em cirurgia cardíaca com
CEC14. Estes fármacos bloqueiam de maneira reversível um dos sítios de ligação da lisina
na molécula de plasminogênio e da cadeia pesada de plasmina. Isso previne a fixação do
plasminogênio e da plasmina sobre a fibrina. Este mecanismo previne a fibrinólise mesmo
se a plasmina já estiver formada.
Outro esquema a ser utilizado é a infusão do ácido tranexâmico via infusão contínua
após dose de ataque. A dose de ataque utilizada gira em torno de 20mg/kg e a de manu-
tenção em torno de 6mg/kg/min. A dose utilizada segundo a literatura, também pode ser
em bolus de 10 a 15 mg/kg de ácido tranexâmico. Outro recurso é a administração de 100
a 150 mg/kg de ácido ε-amino capróico (AEAC) antes da incisão cirúrgica14.
Em casos de comprometimento da função renal recomenda-se a redução das doses de
manutenção após a dose de bolus inicial. As doses de manutenção habituais são de 1 mg/
kg/h para o ácido tranexâmico e 10-15 mg/kg/h para o ácido ε-aminocapróico14.

Utilização de hemoderivados em cirurgia cardíaca | 119


O ácido ε-amino capróico e o ácido tranexâmico possuem meia vida de eliminação
plasmática de aproximadamente três horas.Estudos demonstram que o ácido tranexâmico
reduz em 25 % a necessidade de transfusão14.
Desmopressina
Análogo sintético da vasopressina, o DDAVP, é capaz de induzir a liberação do fator
de von Willebrand e do fator VIII a partir dos compartimentos celulares. É disponível por
meio da administração: nasal e endovenosa. Durante a circulação extracorpórea alterações
plaquetárias são frequentes, o DDAVP parece reduzir as perdas sanguíneas, ainda que de
pequena monta e a taxa de transfusão de sangue autólogo (Cattaneo 2008)28.
Estudos ainda se fazem necessários visando se estabelecer o nível de evidência relaciona-
do a utilização do DDAVP28.
Fator VIIa recombinante (rFVIIa ou eptacog alfa ativado)
Este medicamento é semelhante ao FVIIa endógeno. Estudos experimentais sugerem
que em altas doses promovem a formação de grandes quantidades de trombina tanto atra-
vés do fatores teciduais como através de vias independentes de fatores teciduais, sendo as
plaquetas um exemplo da ativação no local da lesão vascular. Sua meia vida gira em torno de
2.7 horas em indivíduos adultos. Esta substância tem sido utilizada em casos de hemorragia
maciça ou sangramentos importantes com bons resultados.
Sua utilização em cirurgias cardiovasculares tem apresentado bons resultados, porém
ainda carecem na literatura de resultados mais conclusivos29.
Cabe aqui a ressalva do custo elevado do fármaco que muitas vezes irá inviabilizar sua
utilização quando necessário29.

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Utilização de hemoderivados em cirurgia cardíaca | 121


Capítulo 08

Anestesia ambulatorial
para procedimentos em
reprodução assistida
Jose Eduardo Bagnara Orosz
Ivani Rodrigues Glass
Anestesia ambulatorial para procedimentos em
reprodução assistida
Introdução
A reprodução assistida desenvolveu-se muito nas últimas três décadas, com o adven-
to dos fármacos análogos hormonais utilizados para a indução ovulatória e preparo do
endométrio para a transferência do embrião. Contribuíram para melhores resultados as
técnicas microcirúrgicas utilizadas para obtenção de espermatozóides, sobretudo de pacientes
azospérmicos1, e as relacionadas à fertilização com auxílio de injeção intracitoplasmática
(IntraCytoplasmic Sperm Injection - ICSI)2 . As microcirurgias possibilitaram obter célu-
las do parênquima testicular, e a ICSI, que uma célula ainda imatura pudesse fertilizar
o óvulo. Muitos casais hoje conseguem conceber graças à técnica desenvolvida e ao
conhecimento acumulado nesses últimos anos.
Assim, a participação do anestesiologista não mais se restringe à obtenção de óvulos, e se
faz necessária também em procedimentos que visam obter espermatozóides, sobretudo de
homens azospérmicos.
Apesar disso, a aspiração de óvulos, realizada através de punção de fundo de saco vaginal
com agulha longa, guiada por ultrassonografia, é ainda o procedimento que demanda maior
cuidado na escolha da técnica anestésica, pois há indícios de que alguns fármacos anestési-
cos podem ser prejudiciais à qualidade dos oócitos.
Dessa forma, técnicas anestésicas empregando fármacos de curta duração, com rápida
distribuição e/ou metabolização, cuja concentração no plasma decresça rapidamente, tem
sido a escolha em diversos centros.
Os procedimentos envolvidos na reprodução assistida são feitos rotineiramente em
regime ambulatorial, uma vez que são pouco invasivos, com rápida recuperação, e envolvem
pacientes relativamente jovens, que apresentam, apenas em raros casos, idade superior a 50
anos, e tem baixa incidência de comorbidades.

Etapas do processo
Inicialmente é feita a estimulação ovariana com análogos hormonais, a fim de produzir
uma hiperovulação. O estado dos ovários é acompanhado através de exames ultrassono-
gráficos a intervalos variáveis, até as vésperas da captação dos óvulos, quando é realizada a
punção do fundo de saco vaginal e aspiração do líquido de cada um dos folículos, usando-se
uma agulha longa.
O material obtido é então processado, e os oócitos são classificados e incubados em meio
de cultura e condições específicos. Após um período variável em função da maturidade e
qualidade das células obtidas, podem receber tratamento complementar para desnudação, e
são então submetidas à fertilização pelos espermatozóides.
Os espermatozóides, por sua vez, são obtidos do esperma ejaculado ou, no caso
de pacientes azospérmicos, de punção de epidídimo (Percutaneous Epididymal Sperm

124 | Educação Continuada em Anestesiologia


Aspiration – PESA) ou de biópsia testicular (Testicular Sperm Aspiration – TESA),
habitualmente realizados quando a etiologia é obstrutiva 3 . Nesses casos, a esperma-
togênese está preservada, mas há um bloqueio mecânico em algum ponto entre o
epidídimo e o duto ejaculatório, ou os epidídimos e os dutos deferentes estão total ou
parcialmente ausentes.
Em casos mais graves, ou nos casos de azoospermia não obstrutiva, pode ser ne-
cessária a exteriorização dos testículos, e a dissecção do parênquima sob microscopia
(Testicular Sperm Extraction - micro-TESE). Nesses casos são escolhidas áreas com
morfologia favorável e excisadas porções de túbulos seminíferos1 - Figura 1.

Figura 1. Extração microcirúrgica de espermatozóides do testículo (micro-TESE). A figura ilustra as etapas


do procedimento, incluindo a técnica cirúrgica e o processamento laboratorial do parênquima testicular.
Modificado de Verza Jr. S, Esteves SC: Técnicas de extração de espermatozóides obtidos do epidídimo e
do testículo. In: Dzik A, Donadio NF, Esteves SC, Nagy ZP (Eds). Atlas de Reprodução Humana, 1a. edi-
ção, Sociedade Brasileira de Reprodução Humana, Segmento Farma, São Paulo, in press, sob permissão
do autor.

Avaliação pré-anestésica
Habitualmente, quando os pacientes chegam à etapa cirúrgica, em que há participação
do anestesiologista, já passaram pelas fases de investigação da causa da infertilidade,
receberam extensas orientações, e tiveram eventuais comorbidades tratadas ou com-
pensadas. Ainda assim, durante a avaliação pré-anestésica deve-se ter especial atenção às
comorbidades eventualmente associadas à infertilidade, como tireoidopatias, obesidade e
depressão endógena, e ao eventual uso de fármacos que podem apresentar interação com os
anestésicos, como antidepressivos e benzodiazepínicos4.

Anestesia ambulatorial para procedimentos em reprodução assistida | 125


Perfil psicológico
Ainda que muitas das causas de infertilidade feminina possam se manifestar em qualquer
momento durante o período de idade fértil da mulher, grande parte das pacientes candidatas à
reprodução assistida apresentam idade superior a 30 anos.
Não é incomum apresentarem perfil psicológico bastante complexo, envolvendo grande
expectativa, não só do casal, mas também da família. Esse estado de estresse psicológico pode
ainda ser agravado pelas mudanças hormonais a que estão submetidas nesse momento de intensa
estimulação ovariana exógena.
Por isso é conveniente a preferência por técnicas que envolvam sedação, a fim de pro-
ver ansiólise e maior conforto à paciente.

Procedimentos para Obtenção de Espermatozóides


Apesar de apresentarem campo cirúrgico de extensão variável, os procedimentos para
obtenção de espermatozóides são sempre executados em uma região restrita. Assim, mesma
nas intervenções mais extensas há relativa facilidade na execução do bloqueio anestésico
local ou locorregional.
Dessa forma, apesar de se apresentarem também como opção segura e eficiente para a
realização desse procedimento, a anestesia geral e os bloqueios espinhais podem dar lugar a
técnicas mais simples, menos invasivas, e que oferecem recuperação mais rápida, adequadas
ao regime ambulatorial, além de grande satisfação dos pacientes.

Punção de Epidídimo
Também chamada PESA (Percutaneous Epididymal Sperm Aspiration). Trata-se de
procedimento em que uma agulha é inserida no epidídimo para a se obter espermato-
zóides para uso em ICSI (Intra Cytoplasmic Sperm Injection).
Envolve a imobilização manual e a punção do epidídimo com agulha 40x12mm, e aspi-
ração do conteúdo com seringa preenchida parcialmente com meio de cultura apropriado.
Pela efemeridade e pequena a moderada intensidade da estimulação dolorosa, não há neces-
sidade de bloqueios quando se emprega algum tipo de sedação moderada a profunda.
Como é regra entre os pacientes que se submetem a reprodução assistida, muitos estão
ansiosos no dia do procedimento. A técnica de sedação usando apenas propofol, sob
ventilação espontânea e/ou assistida com máscara facial, tem resultados positivos, tanto
quanto à condição de trabalho do cirurgião, como em relação à satisfação do paciente.
A dose de propofol deve ser adequada a cada paciente, a fim de se obter o plano
necessário, e usualmente é de cerca de 3 a 4mg.kg-1, associada ou não, a um opióide
como fentanil (1 a 3µg.kg-1) ou alfentanil (10 a 20µg.kg-1).

Punção Testicular
Denominada TESA (Testicular Sperm Aspiration), é empregada para se obter espermato-
zóides diretamente dos testículos, através de punção percutânea do seu parênquima.

126 | Educação Continuada em Anestesiologia


Figura 2: Punção testicular para obtenção de amostra
do parênquima.
Nesse caso convém associar à sedação descrita para punção do epidídimo, a infiltração
com anestésico local, uma vez que há maior manipulação do testículo, que é puncionado
com a mesma agulha 40x12mm, mas tem seu parênquima extraído sob pressão. Cerca
de 2ml de lidocaína 1% sem vasoconstritor são suficientes tanto para o intra como para
o pós-operatório imediato. Opcionalmente, pode-se associar o bloqueio percutâneo do
cordão espermático, com 6 a 8ml de lidocaína 1%, sem vasoconstritor, injetados ao nível
do anel inguinal externo5.

Figura 3: Representação esquemática da localização do


cordão espermático e do anel inguinal.

Microdissecção Testicular
Referida como Micro-TESE, ou Microdissection Testicular Sperm Extraction, é utili-
zada na tentativa de se identificar áreas de produção espermática no parênquima testicu-
lar. Envolve a dissecção microcirúrgica dos túbulos seminíferos a fim de se obter células
germinativas viáveis para uso em ICSI. Indicada em casos mais graves, ou nos casos de
azoospermia não obstrutiva. São escolhidas áreas com morfologia favorável e excisadas
porções de túbulos seminíferos.
Anestesia ambulatorial para procedimentos em reprodução assistida | 127
Nesse caso se faz necessária uma incisão ampla, exteriorização dos testículos e, frequen-
temente, algum grau de tração do cordão espermático, e é esperada maior intensidade de
estímulo nociceptivo. Está indicada técnica anestésica capaz de prover, além de analgesia
adequada, bloqueio de eventual resposta autonômica à tração do cordão espermático.
A sedação profunda sob ventilação assistida, ou a anestesia geral sob ventilação con-
trolada, utilizando-se fármacos de curta ou ultracurta duração, podem ser a técnica de
escolha. Mas também é possível obter suficiente analgesia com o emprego de infiltração
local, associada ao bloqueio do cordão espermático com anestésico local, que pode ser
complementado com sedação leve a moderada6.
Para isso utiliza-se, por exemplo, o propofol, na dose de indução de 3 a 4mg.kg-1, seguida
de infusão de 60 a 100µg.kg-1.min-1, conforme as necessidades e características do paciente,
sob ventilação espontânea ou assistida, e máscara facial com O2 100%.
Pequena dose de um opióide como fentanil (1 a 2µg.kg-1) ou alfentanil (7 a 15µg.kg-1) tem
sido empregada com sucesso antes da infiltração de pele e subcutâneo, com licocaína 1%
sem vasoconstritor, pelo cirurgião.
O bloqueio do cordão é realizado com 4 a 6ml do mesmo anestésico local, infiltrado “a
céu aberto” pelo cirurgião, quando o plexo pampiniforme é exposto.

Figura 4: Representação esquemática da localização do


cordão espermático e do plexo pampiniforme.

Procedimentos para Obtenção de Óvulos

Punção de fundo de saco vaginal


Para realização da punção de fundo de saco vaginal a paciente é colocada em posição
ginecológica, e são realizados exame especular e a histerometria. O passo seguinte é a insta-
lação do probe transvaginal do aparelho de ultrassonografia, que apresenta uma guia através
da qual é introduzida a longa agulha que então alcança os ovários.

128 | Educação Continuada em Anestesiologia


Durante esse procedimento são dois os principais eventos geradores de estímulo doloroso.
O primeiro, mais intenso, porém pontual, é a punção propriamente do fundo de saco vaginal.
O segundo, de menor intensidade, e cujo desconforto gerado parece estar relacionado à res-
posta ovariana à estimulação hormonal, é a manipulação do transdutor do aparelho, que
acontece de forma intermitente durante a aspiração dos folículos, toda vez que se necessita
realocar o probe. A duração do procedimento guarda estreita relação com a experiência do
cirurgião, e com o número de folículos a serem explorados pela agulha, mas raramente excede
cerca de 10 a 15 minutos.
Na literatura são propostas as mais diversas técnicas para prover anestesia, que vão
da sedação endovenosa sob ventilação espontânea à anestesia geral, passando pelos blo-
queios espinhais ou locorregionais 4. Não há consenso acerca da escolha ideal, tampouco
vantagem absoluta de qualquer delas7. A eleição da técnica utilizada depende do contexto
de cada serviço.
Para a realização dos procedimentos em regime ambulatorial em clínicas, comum no
Brasil e nos EUA4, a sedação endovenosa sob ventilação assistida/espontânea tem se mostra-
do suficiente do ponto de vista anestésico, segura, e possibilita rápida recuperação e alta das
pacientes, que relatam também alto grau de satisfação8. A escolha de fármacos e doses deve
também ser feita em função da rotina do serviço, e de cada caso, sempre com especial atenção
às exigências do procedimento, visando evitar eventual prejuízo às células obtidas.
Os oócitos são muito suscetíveis a eventos físico-químicos, como mudanças de tempera-
tura, contaminação por partículas voláteis ou incidência de luz. Sofrem influência também
de substâncias exógenas eventualmente presentes no liquido folicular, como é o caso dos
anestésicos que se difundem a partir do sangue que perfunde os ovários. Assim, para pa-
cientes submetidas a captação oocitária a escolha dos fármacos empregados na assistência
anestésica pode ser de crucial importância para se alcançar um resultado positivo do trata-
mento. A influência de diversas classes de anestésicos vem sendo discutida desde o início da
década de 1990.
A utilização do propofol para captação oocitária como parte do processo de fertilização
in vitro está bem estabelecida. Além de propiciar rápida recuperação, apresenta propriedades
antieméticas9, oferece despertar com estado mental claro e sensação de bem estar, além de
grande satisfação das pacientes8.
Estudos acerca de sua farmacocinética foram realizados relacionando doses infundidas
e concentrações plasmáticas e no líquido folicular10. E demonstraram que a despeito da flu-
tuação da concentração do fármaco no plasma, no líquido dos folículos a mesma é crescente
durante a infusão, e proporcional à dose total infundida, revelando o caráter de acúmulo
nesse tecido. Assim, a elevação da concentração do propofol no fluido folicular poderia, em
tese, ter efeitos nas taxas de fertilização in vitro e no desenvolvimento embrionário inicial,
acarretando repercussões do ponto de vista clínico e ético. Os autores ressaltam que apesar
de ser improvável, da forma como o fármaco é usado para esse tipo de procedimento, que
tal elevação seja capaz de promover efeito indesejável sobre as células, ainda assim todos os

Anestesia ambulatorial para procedimentos em reprodução assistida | 129


cuidados devem ser tomados para que o procedimento seja o mais breve possível, a fim de
limitar a elevação da concentração do propofol no líquido folicular10.
Christiaens et al. demonstraram haver diferença nos tempos de elevação das concentra-
ções arterial e folicular do propofol, sugerindo que o fluido folicular deva ser considerado
como parte do reservatório mais periférico no modelo tricompartimental, que descreve a
distribuição do fármaco no organismo. O processo de difusão do propofol do sangue para
o fluido folicular é lento, com um clearance aparente de 6%11.
Estudos experimentais com oócitos de ratos desnudados, expostos a diferentes concen-
trações de propofol, documentaram um efeito deletério do fármaco para as células, e que tal
efeito é dose e tempo de exposição dependentes12 .
Em outro experimento observou-se retardo na maturação de oócitos de ratos, mas sem
alteração nas taxas de fertilização e clivagem dos embriões, e ocorrendo apenas quando ex-
postos a altíssima concentração de propofol (10µg.ml-1), que em situações clínicas reais não
é alcançada, nem mesmo após muitas horas de infusão13.
A associação de opióides, quando necessária, deve limitar-se a doses baixas. Fentanil per-
mite reduzir a dose total de propofol necessária para se manter o plano anestésico adequado.
Em uma comparação com emprego de propofol como agente único, essa vantagem permi-
tiu também despertar mais rápido das pacientes que receberam a associação de propofol
e fentanil14. Mas esse estudo não avaliou a incidência de náuseas e vômitos, que em nossa
experiência tende a ser maior quando associamos opióides ao propofol.
A concentração de alfentanil alcançada no líquido folicular foi estudada através de
radioimunoensaio, comparando à encontrada no plasma em 14 mulheres submetidas à
captação oocitária. Os autores encontraram concentrações 10 vezes inferiores de alfentanil
nos folículos, comparadas às aferidas no plasma, em procedimentos de duração pouco
superior ao que temos visto na prática atualmente (18+/-2,4 minutos)15.
Técnica anestésica utilizando apenas infusão de remifentanil, após pré-medicação com
7,5mg de midazolan por via oral, mostrou-se eficiente do ponto de vista da analgesia, em
estudo que envolveu 80 pacientes. Porém os autores relatam 9 casos de reações motoras à
punção, além de diversos casos de dessaturação de oxigênio clinicamente relevantes, o que
os fez abandonar a técnica, passando a associar propofol 1mg.kg-1 a infusões menores de
remifentanil (0,2µg.kg-1.min-1)16.
Wilhelm et al. compararam anestesia geral combinada, utilizando alfentanil e propofol,
associados a óxido nitroso (N2O), com técnica exclusivamente endovenosa, empregando
remifentanil como agente único, em infusão inicial de 0,25µg-1.kg-1.min-1, reajustada em
intervalos de 0,05µg.kg-1.min-1 conforme necessário. O estudo envolveu 251 mulheres
submetidas à captação de óvulos, e observou no grupo que recebeu N2O resultados muito
inferiores quanto à taxa de gravidez (16,3 vs. 28,2%)17. Esses achados levantam suspeita
acerca de eventual prejuízo ao resultado pelo uso de N2O.
Mas Rosen et al. em estudos realizados com isoflurano/N2O não encontraram diferenças sig-
nificativas entre as taxas de fertilização ou gravidez quando comparado com isoflurano/O218, o que
pode levar à hipótese de que o halogenado, por sua vez, pode ser tão prejudicial quanto o N2O.

130 | Educação Continuada em Anestesiologia


Hammadeh et al. realizaram estudo comparando o efeito da anestesia geral versus
sedação em reprodução assistida. Para anestesia geral foi utilizado remifentanil associado
a propofol ou isoflurano. Nos pacientes submetidos apenas à sedação empregaram mida-
zolam, diazepam ou propofol, de acordo com a necessidade clínica. O número de oócitos
coletados foi significativamente maior sob anestesia geral, comparada à sedação, embora
o número de oócitos fertilizados não tenha sido diferente. Um melhor aproveitamento dos
folículos existentes pode ter sido a causa do maior número de oócitos obtidos das pacientes
sob anestesia geral, pois esse grupo recebeu analgesia, movendo-se menos durante o pro-
cedimento. Não houve diferença significativa nas taxas de clivagem e gravidez. Os autores
propoem que a técnica anestésica com remifentanil sem N2O é uma alternativa à sedação,
podendo ser empregada quando a anestesia geral está indicada19.
Ben-Shlomo et al. compararam anestesia geral com fentanil 0,017mg.kg-1, propofol
2,5mg.kg-1 e isoflurano, à sedação com midazolam 0,06mg.kg-1 e cetamina 0,75mg.kg-1,
para captação de oócito por via transvaginal, em 50 pacientes sem pré medicação. Mos-
traram que a taxa de embriões transferidos e de gravidez não foi diferente entre os dois
grupos estudados, e concluíram que a sedação com midazolam / cetamina pode ser uma
alternativa à anestesia geral. Entre os benzodiazepínicos, o midazolam é o mais comu-
mente utilizado. Mínima quantidade foi encontrada no fluido folicular, e nenhum efeito
deletério foi relatado20.
Estudo comparando os resultados obtidos de tratamentos sob anestesia epidural e
anestesia geral mostrou não haver benefício quando se emprega esse tipo de bloqueio espinhal.
Em um caso submetido ao bloqueio, apesar de se ter alcançado suficiente analgesia, foi
necessário associar-se sedação com propofol, devido ao estado de grande ansiedade em
que se encontrava a paciente21.
Embora uma grande variedade de técnicas anestésicas esteja descrita na literatura,
compreendendo desde sedação consciente, bloqueios locais, locorregionais e espinhais, e
anestesia geral, nenhum trabalho provou superioridade absoluta de alguma delas. O que se
percebe é a melhor adequação ao regime ambulatorial das técnicas que combinam sedação
moderada a profunda, associadas ou não a bloqueios realizados apenas com anestésico local.
Em nossa experiência de mais de 10 anos num centro de referência em reprodução humana,
por se tratar de procedimento de curta duração, em que o estímulo nociceptivo mais intenso
é pontual, seguido apenas de um desconforto pela manipulação do transdutor durante a
aspiração, a sedação com pequenas doses de indução de opióides, como fentanil, alfentanil
ou sufentanil (1 a 2µg.kg-1, 7 a 15µg.kg-1, ou 0,1 a 0,2µg.kg-1, respectivamente), associadas ao
propofol (1 a 3mg.kg-1), tem sido suficiente para prover o plano anestésico adequado.
Os resultados da técnica tem sido bastante positivos, por oferecer conforto, com
ansiólise e amnésia, além de rápida recuperação, satisfazendo tanto a expectativa das
pacientes quanto as exigências em qualidade e segurança em relação ao material obtido.
Para manutenção temos usado bolus fracionados (10 a 20mg) ou infusão contínua (40
a 60µg.kg-1.min-1) apenas do propofol, conforme a demanda de cada caso, e pelo tempo
necessário ao procedimento.

Anestesia ambulatorial para procedimentos em reprodução assistida | 131


Independentemente da técnica escolhida, o que realmente importa, além de segurança
e conforto das pacientes, é selecionar fármaco e técnica de forma a minimizar o potencial
nocivo da anestesia ao material genético obtido.
Para tanto, preconiza-se empenhar todos os esforços para que, sem permitir prejuízo ao
bem estar e ao conforto da paciente, se possa reduzir ao mínimo necessário as doses totais
utilizadas dos anestésicos.
Procuramos deixar claro à paciente a importância de restringir sua exposição aos fárma-
cos ao estritamente necessário, o que envolve, por exemplo, postergar a indução anestésica
para após o exame especular, iniciando-a imediatamente antes da colocação do transdutor
ultrassográfico vaginal, por ocasião da captação oocitária.

Analgesia Pós Operatória


Na captação oocitária a intensidade da dor pós-operatória parece guardar relação mais
estreita com o estado dos ovários antes da punção, do que com o procedimento cirúrgico
propriamente. Pacientes que apresentam grande número de folículos tendem a ter maior
desconforto, tanto pelo edema, que modifica a anatomia de ovários e anexos, como pela
necessidade de maior manipulação do transdutor vaginal durante o procedimento.
A analgesia multimodal envolvendo analgésicos pouco potentes, como dipirona e
paracetamol, associados a um fármaco antiinflamatório não esteroidal (AINE), como o
cetoprofeno, tem sido usada com resultados satisfatórios. Pela característica de dor visceral
dos anexos ovarianos, nota-se benefício também na associação de antiespasmódico, como a
escopolamina, que pode oferecer relaxamento de musculatura lisa. Raramente, e a depender
da sensibilidade individual e da eventual irritação peritonial, presente nos casos em que há
maior resposta à estimulação hormonal, um analgésico de maior potência como tramadol
pode ser necessário, habitualmente em doses de até 1 mg.kg-1.
Para analgesia pós-operatória nas cirurgias masculinas tem sido suficiente dipirona e um
AINE, com exceção dos casos de microdissecção testicular, quando é esperada dor de intensi-
dade proporcional à maior manipulação da bolsa escrotal. O uso do tramadol (1mg.kg-1) tem
ficado, na maioria dos casos masculinos, reservado a esse procedimento.

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Anestesia ambulatorial para procedimentos em reprodução assistida | 133


Capítulo 09

Glicemia, insulina,
resposta inflamatória
e anestesia
Florentino Fernandes Mendes
Ana Luft
Glicemia, insulina, resposta inflamatória
e anestesia

Introdução
Como a glicose é o substrato preferencial durante condições críticas, a hiperglicemia de
estresse foi considerada por um longo tempo uma resposta benéfica, por que permitia uma
disponibilidade adequada de energia aos tecidos1.
Esse conceito começou a mudar quando um grande ensaio clínico mostrou redução na
mortalidade de pacientes cirúrgicos, com ou sem o diagnóstico de diabetes, tratados com
insulina, na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), com controle agressivo da glicemia 2 .
Subsequentes trabalhos, realizados com pacientes cirúrgicos ou internados em unida-
des de tratamento intensivo, têm reduzido o entusiasmo inicial com o controle agressivo
da glicemia 3,4, por causa do risco inaceitável de desenvolver hipoglicemia 5,6.
Indivíduos submetidos a cirurgias têm hiperglicemia transitória, considerada secun-
dária ao estresse associado com o insulto cirúrgico. Alternativamente a desrregulação
perioperatória da glicemia pode ser uma manifestação específica de doença, ou evidência
de intolerância a glicose ou diabetes não diagnosticada7,8.
Durante a cirurgia o controle deficiente da glicemia pode prejudicar a função leucocitária,
ser um preditor de infecção na ferida operatória, associar-se a complicações pós-operatórias
e aumentar custos8.
As pesquisas com utilização de insulina intravenosa não tem especificamente comparado
pacientes com e sem hiperglicemia de estresse em estudos prospetivos e controlados.
Outros investigadores excluem os pacientes sem diagnóstico de diabetes conhecido.
Existem poucos ensaios clínicos randomizados e a maioria dos dados é obtida de estudos
observacionais realizados em UTIs ou com pacientes com IAM ou eventos cerebrovascu-
lares. Além disso, aproximadamente 50% dos pacientes cirúrgicos com diabetes podem
não ser diagnosticados 9,10.
O objetivo deste trabalho é revisar o papel do controle da glicemia, com o uso da insulina,
na resposta inflamatória.

Regulação Fisiológica da Glicemia


A glicose sanguínea é regulada com precisão por dois mecanismos: 1- o sistema hormonal,
que consiste no balanço entre a ação hipoglicemiante da insulina e a ação hiperglicemiante
dos hormônios contrarregulatórios (glucagon, epinefrina e cortisol); 2- mecanismo neural,
através da ativação de mensagens emitidas pelos sensores de glicose de vários órgãos 11.
Estes sinais hormonais e neurais modulam o metabolismo dos carboidratos controlando
os fluxos de glicose, incluindo a produção endógena e a entrada de glicose nas células. A
translocação de transportadores de glicose (GLUTs) é o mecanismo mais proeminente para
a modulação do transporte de glicose através da membrana das células. Entre os transpor-

136 | Educação Continuada em Anestesiologia


tadores, GLUT 1 é o transportador predominante para captação de glicose não mediada
pela insulina. GLUT 2 regula o fluxo de glicose através das membranas celulares do fígado.
GLUT 1 e GLUT 3 regulam o fluxo de glicose no cérebro e GLUT 4 é o principal transpos-
tador de glicose insulino-responsivo e, portanto, modula a captação de glicose mediada por
insulina no tecido adiposo e nos músculos cardíaco e esqueléticos 12 .
Em condições de estresse, uma sobrecarga maciça de glicose acontece em tecidos aonde a
captação de glicose não é insulino mediada. Este acúmulo determina inibição da regulação de
GLUT 1 por mediadores pró-inflamatórios, hormônios contrarreguladores e hipóxia. Vários
efeitos deletérios foram associados a estas altas concentrações de glicose nas células1.

Mecanismos da Hiperglicemia Associada ao Estresse


Embora compartilhem alguma semelhança, o mecanismo patogenético do diabetes
tipo 2 e da hiperglicemia associada ao estresse são diferentes. No diabetes, a causa
da hiperglicemia é a combinação de resistência à insulina com secreção deficiente de
insulina pelas células beta pancreáticas. Durante a hiperglicemia associada ao estresse,
interações complexas entre os hormônios contrarregulatórios (catecolaminas, hormônio
do crescimento, cortisol) e citocinas levam a produção excessiva de glicose pelo fígado e
resistência periférica (Figura 1).

Figura 1 – Representação esquemática da hiperglicemia de estresse. Em condições de estresse os tecidos que


absorvem glicose sob influência da insulina tornam-se resistentes aos efeitos da insulina (resistência à insuli-
na periférica). Como consequência a glicose é desviada dos tecidos com captação de glicose mediada por in-
sulina e substratos (alanina, glicerol e lactato) são liberados e utilizados pelo fígado para produzir glicose. No

Glicemia, insulina, resposta inflamatória e anestesia | 137


fígado a produção endógena de glicose é alimentada por glicogenólise e neoglicogênese, que são estimuladas
pelos hormônios contrarregulatórios e menos inibida pela glicose circulante (resistência à insulina central).
A hiperglicemia resultante, sob a influência de citocinas pró-inflamatórias, finalmente conduz a um aumento
da captação de glicose por tecidos com captação não-mediada por insulina. GLUT - transportadores de glu-
cose; IL-1 –interleucina -1; TNF-α - fator de necrose tumoral alfa. Mod. da referência1.

Embora a identificação desses pacientes apresente certa complexidade, a hiperglicemia


associada ao estresse geralmente se refere à hiperglicemia transitória que ocorre durante
a doença, ou durante a realização da cirurgia, e é usualmente restrita a pacientes sem
evidências de diabetes1.
Nos EUA, 30% dos pacientes que têm diabetes desconhecem essa condição13. E, portanto,
muitos pacientes cirúrgicos com diagnóstico aparente de hiperglicemia ao estresse têm
diabetes ainda não diagnosticado1. De fato, resultado de pequenos estudos têm confir-
mado que uma alta proporção de indivíduos com hiperglicemia durante a internação tem
confirmado o diagnóstico de diabetes em 1 ano14.
O aumento da liberação de glicose resulta de gliconeogênese e, em menor extensão,
de glicogenólise. A gliconeogênese é acionada em maior medida pelo glucagon do que
pela adrenalina e pelo cortisol. A glicogenólise é desencadeada principalmente por
catecolaminas e perpetuada sob a inf luência de epinefrina e cortisol. O Fator de necrose
tumoral alfa (TNF- α) pode promover gliconeogênese por estimular a produção de glu-
cagon. O aumento da resistência periférica à insulina é caracterizado pela incapacidade
dos músculos esqueléticos e dos adipócitos absorverem glicose. A Resistência central
à insulina é utilizada para definir a capacidade diminuída da insulina para suprimir a
produção hepática de glicose e, durante o estresse, parece ser menos afetada do que a
resistência periférica.
Além disso, durante o perioperatório, o aumento da reabsorção da glicose e a depuração
diminuída de glicose renal foram relatados e podem contribuir para a hiperglicemia 15. Em-
bora, o estresse cirúrgico, via indução de resistência à insulina desencadeada por citocinas e
pelos hormônios contrarregulatórios, seja considerado o gatilho mais importante 16.
O grau de resistência à insulina relaciona-se com a magnitude e com a duração do es-
tresse cirúrgico. Em pacientes diabéticos e não diabéticos submetidos a cirurgias cardíacas
e abdominais, a resistência pré-operatória a insulina relaciona-se com aumento do risco de
desenvolver complicações pós-operatórias 17-19.
Em pacientes não diabéticos submetidos a cirurgias abdominais de grande porte, a ad-
ministração pré-operatória de glicose associa-se com diminuição da resistência a insulina e
dos níveis glicêmicos 19.
Existiria, assim, um tempo ideal para a administração de glicose. Esse conhecimento
é importante, por que se demonstrou que pacientes que recebem glicose durante o pós-
-operatório têm níveis glicêmicos mais elevados, quando comparados com pacientes que
recebem soluções cristaloides20.
É interessante o fato de que, durante o estresse a captação total de glicose está au-
mentada. Isso ocorre nos tecidos insulina-independentes como o cérebro e os glóbulos

138 | Educação Continuada em Anestesiologia


vermelhos. Na musculatura esquelética, a captação de glicose e a síntese de glicogênio
diminuem primariamente relacionadas a um defeito no GLUT-4. A hiperglicemia aguda
tem muitos efeitos deletérios incluindo a diminuição da vasodilatação, o comprometi-
mento da geração de óxido nítrico endotelial, o decréscimo na função do complemento, o
aumento na expressão de moléculas de adesão, aumento na produção de citocinas, levando
a prejuízos na quimiotaxia e fagocitose de neutrófilos, aumento da resposta inflamatória,
vulnerabilidade para infecções e disfunção de múltiplos órgãos21.

Resposta Inflamatória
Existe uma orquestração complexa de eventos associados à resposta inflamatória aguda
que envolvem perda de água, sal e proteínas do compartimento vascular, ativação das cé-
lulas endoteliais, interações adesivas entre leucócitos e endotélio vascular, recrutamento
de leucócitos, ativação de macrófagos nos tecidos, ativação dos sistemas de complemento,
coagulação e fibrinolítico e liberação de proteases e oxidantes pelas células fagocitárias.
A marca da resposta inflamatória aguda é a adesão de leucócitos polimorfonucleares
(PMN) no endotélio vascular e a diapedese para os tecidos lesados. Existem diversas al-
terações dentro do compartimento celular que iniciam a resposta inflamatória. A primeira
alteração é a ativação das células endoteliais. Quando a ativação ocorre as células endoteliais
expressam na sua superfície moléculas de adesão para leucócitos e monócitos (P-seletina,
L-seletina, E-seletina, moléculas de adesão intracelular - ICAM-1, moléculas de adesão de
células vasculares - VCAM-1, entre outros) e, uma vez ativadas, expressam e liberam citoci-
nas inflamatórias e quimiocinas (que vão atrair e ativar PMN).
O endotélio ativado expressa, também, fator tecidual (TF) na luz do vaso. A ativação do
complemento pode causar aumento da regulação de TF que é um potente pró-coagulante
e pode levar a formação de trombo no interior do vaso. O segundo evento que acontece
é a abertura das junções finas entre as células endoteliais que se acompanha de perda de
proteínas e fluídos do compartimento intravascular para o compartimento extravascular.
Outra característica da resposta inflamatória é a ativação plaquetária, que usualmente está
associada à conversão de protrombina em trombina. A plaqueta pode ser ativada por vários
agentes, com a formação de agregados de plaquetas e formação de trombose intravascular
(fator ativador plaquetário - PAF, ADP, trombina). Finalmente, a resposta inflamatória pode
associar-se com hemorragia por causa da lesão estrutural da barreira endotelial. A trombose
intravascular pode ser resolvida pela ativação do sistema fibrinolítico através do ativador de
plasminogênio tecidual (TPA) e de outros fatores que ativam enzimas fibrinolíticas. Pro-
teases e oxidantes produzidos pelas células fagocitárias ativadas causam lesão nas células
endoteliais e nos compartimentos vasculares e extravasculares.
A resolução da resposta inf lamatória requer a morte das bactérias invasoras, a remo-
ção dos debris e a cicatrização do tecido lesado. Para resolução da resposta inf lamatória
aguda é necessário que os leucócitos sejam removidos, via drenagem linfática ou por
apoptose22 (Figura 2).

Glicemia, insulina, resposta inflamatória e anestesia | 139


Figura 2 – Mecanismos da resposta inflamatória aguda com os eventos intravasculares iniciais que levam a
aumento da permeabilidade, ativação das células endoteliais, expressão de moléculas de adesão, ativação de
plaquetas, deposição de fibrina e hemorragia.

Hiperglicemia, Insulina e Resposta Inflamatória


Considerando que a proteína C reativa (PCR), proteína de fase aguda sintetizada pelo
fígado, serve como indicador da presença de inflamação e necrose tecidual, esta foi avaliada
nos pacientes que participaram do estudo de Leuven. Observou-se redução progressiva e
mais precoce da PCR com o uso de insulina, diferentemente do grupo que recebeu tratamen-
to convencional, sugerindo papel antiinflamatório da insulina como um dos mecanismos
para a redução de mortalidade encontrada. Além disto, níveis reduzidos de lecitina manose-
-ligada (MBLA), proteína ligada à defesa do hospedeiro e a imunidade inata, observados
inicialmente nestes indivíduos criticamente doentes, podem ser revertidos pelo tratamento

140 | Educação Continuada em Anestesiologia


com insulina. Em indivíduos criticamente doentes e naqueles após IAM é possível que a su-
pressão da PCR possa ser parcialmente responsável pelos efeitos vantajosos do tratamento
com insulina 23.
De fato, em pacientes com IAM o efeito antiiflamatório da insulina foi inicialmente relacio-
nado a redução de 40% da proteína C reativa altamente sensível e dos níveis de amiloide A 24.
A insulina via ativação da proteína quinase beta (Akt) aumenta a produção de óxido
nítrico (NO) que é dependente do óxido nítrico sintetase endotelial (e-NOS), inibe a pro-
dução de TNF-α, a expressão endotelial de P-selectina e de moléculas de adesão intracelular
-1 (ICAM-1) pelos cardiomiócitos 25. Esses achados complementam relatos prévios de que
o NO inibe a infiltração de monócitos, a interação entre o leucócito e a célula endotelial e,
como consequência, a resposta inflamatória 26.
Pacientes hiperglicêmicos têm altos níveis circulantes de citocinas inflamatórias, que
podem levar, por sua vez, a disfunção de órgãos. A mais conhecida dessas citocinas é o
TNF-α que pode causar lesão pulmonar e renal 27. O TNF-α é liberado após o IAM e
causa disfunção endotelial, além de determinar atividade pró-coagulante e deposição
de fibrina. Durante hiperglicemia aguda aumentos dos níveis plasmáticos de TNF-α, de
interleucina-1β e de interleucina-8 e redução dessas citocinas inflamatórias com a admi-
nistração de insulina foram documentados 28.
A relação entre citocinas inflamatórias e metabolismo da glicose é complexa. A hipergli-
cemia pode ser causada por citocinas, via indução de resistência periférica a insulina. Essa
relação é vista na clínica, pacientes com sépsis severa frequentemente necessitam altas doses
de insulina para manter normoglicemia 7.
O tratamento intensivo com insulina melhora os efeitos lesivos da hiperglicemia por
reduzir a ativação endotelial via decréscimo da ativação dos níveis circulantes de ICAM-1 e
E-seletina 29, protegendo a ultraestrutura da mitocôndria no hepatócito 30, estimulando a cap-
tação periférica de glicose pelo aumento da transcrição de GLUT-4 31, normalizando os níveis
de peptídeo C e de adiponectina 32 e melhorando o perfil de lipídeos por aumento dos níveis de
lipoproteínas de baixa e de alta densidade e diminuição dos níveis de triglicerídeos 31.
O TNF-α pode inibir a ação vasodilatadora da insulina e o fator inibidor de macrófagos
pode ser suprimido pela insulina, de forma que estes efeitos também devem ser considerados
nos mecanismos do benefício do uso de insulina e glicose em indivíduos criticamente doentes.

Vias de Sinalização da Insulina


A insulina regula a hemostasia da glicose por promover disposição de glicose no músculo
esquelético, no tecido adiposo e inibir a gliconeogênese no fígado. A insulina tem importan-
tes funções fisiológicas no cérebro, células beta pancreáticas, coração e endotélio vascular e
ajuda a coordenar e acoplar o metabolismo e a hemostasia cardiovascular sobre condições
saudáveis. Por exemplo, ação vasodilatadora da insulina para estimular a produção de óxido
nítrico (NO) do endotélio, levando a aumento do fluxo sanguíneo e aumento na captação de
glicose pela musculatura esquelética 33.

Glicemia, insulina, resposta inflamatória e anestesia | 141


Assim, o óxido nítrico, um determinante importante da função endotelial, é produzido
no endotélio vascular por ativação da óxido nítrico sintetase endotelial (eNOS). O clássico
vasodilatador colinérgico, a acetilcolina, ativa receptores acoplados à proteína G na célula
endotelial que medeiam o aumento dos níveis de cálcio intracelular. A interação cálcio/
calmodulina com o sítio de ligação calmodulina do eNOS resulta em aumento da atividade
enzimática. Em adição, a fosforização da eNOS para serina por serina quinases, incluindo
Akt, AMPK e fosfoquinase A (PKA) também estimula a produção de óxido nítrico de ma-
neira cálcio independente. A atividade da eNOS também é regulada por outras modifica-
ções pós translacionais incluindo a acilação e a S-nitrosilação34,35.
As ações metabólicas da insulina tendem a ser mediadas pela via de sinalização depen-
dente do fosfatidilinositol 3 quinase (PI3K). Enquanto que a proteína quinase ativada por
mitógeno (MAPK) dependente de sinalização de insulina tipicamente regula mitogênese,
crescimento e a diferenciação celular36 (Figura 3).

Figura 3 – Representação das vias de sinalização da insulina. As ações metabólicas da insulina são media-
das pela via de sinalização dependente do fosfatidilinositol 3 quinase (PI3K). A proteína quinase ativada
por mitógeno (MAPK) dependente de sinalização de insulina regula a mitogênese, o crescimento e a di-
ferenciação celular.

A resistência à insulina é caracterizada pelo prejuízo seletivo na sinalização PI3K depen-


dente nos tecidos metabólicos e vasculares alvos da insulina. Consequentemente, glicotoxi-
cidade, lipotoxicidade e inflamação que contribuem para o desenvolvimento de resistência
a insulina também levam a disfunção endotelial37.

142 | Educação Continuada em Anestesiologia


A disponibilidade de L-arginina (substrato para eNOS) e cofatores enzimáticos (fosfato de
dinucleotídeo nicotinamida adenina, dinucleotídeo flavina adenina, mononucleotídeo flavina
e tetrahidrobiopterina) também têm um papel na regulação da produção de NO por eNOS.
O NO derivado do endotélio se difunde para as células musculares lisas dos vasos onde ativa a
guanilato ciclase. O aumento dos níveis de guanilato ciclase leva a vasodilatação37.
Em adição a modulação do tono vascular o NO atenua a produção de citocinas infla-
matórias, diminui a expressão de VCAM, limita o recrutamento de leucócitos, inibe a
proliferação das células da musculatura lisa vascular (VSMC), opõe-se a apoptose, atenua
a agregação plaquetária e reduz a adesão de monócitos na parede vascular38.
A inativação do NO por aumento da produção de espécies reativas de oxigênio (ROS)
pode reduzir a biodisponibilidade de NO. Isso contribui para a disfunção endotelial. O
termo disfunção endotelial refere-se ao fenótipo endotelial mal adaptado caracterizado
por disponibilidade reduzida de NO, aumento do estresse oxidativo, expressão elevada de
fatores proinflamatórios e protrombóticos e vaso reatividade anormal 39.
A disfunção endotelial é acoplada aos estados de resistência a insulina, incluindo diabe-
tes, obesidade e síndrome metabólica. Isso aumenta a susceptibilidade dos pacientes com
essas doenças para desenvolverem complicações cardiovasculares incluindo aterosclerose
acelerada, doença coronariana e hipertensão. A disfunção endotelial é fator independente
associado com morte cardíaca, infarto e AVC40.
Em humanos com síndrome metabólica e resistência a insulina existe prejuízo na habi-
lidade para induzir vasodilatação. Diminuição do fluxo sanguíneo estimulada por insulina
por diminuição da vasodilatação foi demonstrada em pacientes obesos e com diabetes tipo 2.
No endotélio vascular o receptor de insulina ativa eNOS e a produção de óxido nítrico que,
por sua vez tem importante ações vasculares levando a vasodilatação e aumento da perfusão
sanguínea e, por outro lado exerce efeitos antiapoptóticos e pró sobrevivência no coração
submetido a lesão de isquemia reperfusão41.
O efeito cardioprotetor da insulina pode ser bloqueado por inibidores da PI3K42 . A
g
N -nitro-L-arginina metil éster (L-NAME), um inibidor competitivo da NOS reduz o efeito
protetor na insulina por bloquear a produção de NO. Estudos têm demonstrado que a
deficiência de eNOS exacerba a lesão de isquemia reperfusão no miocárdio 43, que a admi-
nistração de doadores de NO44,45 e que a inalação de NO protegem o miocárdio por reduzir,
durante a isquemia, o consumo de oxigênio, preservar a sensibilidade ao cálcio e a função
contrátil, sem aumentar o consumo de energia46,47.
Na situação de isquemia reperfusão a administração exógena de NO melhora significativa-
mente a perfusão na microcirculação, reduz a infiltração de leucócitos, diminui a apoptose e o
tamanho da área de infarto48.

Estresse Oxidativo-Nitrativo e Insulina


Durante isquemia a atividade da NOS é reduzida, por que a NOS necessita oxigênio para
produzir NO e é inibida pelo pH baixo. Durante os primeiros segundos ou minutos da

Glicemia, insulina, resposta inflamatória e anestesia | 143


reperfusão a NOS miocárdica produz simultaneamente uma grande quantidade de NO e
superóxidos (O2-), que reagem para formar peroxinitrito (ONOO-). O NO isolado não é tóxico
e não produz lesão tecidual, mesmo em grandes concentrações. Contudo na presença de O2- o
NO é desviado para uma via tóxica formando ONOO- que causa estresse oxidativo41,49.
As células do endotélio vascular geram NO constitutivamente e produzem em gran-
de quantidade O2- uma fonte de geração de ONOO-. A produção de ONOO- derivada do
endotélio, contudo, é improvável alcançar uma concentração alta o suficiente para causar lesão
celular. De fato, uma produção limitada de ONOO- na fase aguda da reperfusão pode inibir a
adesão endotelial dos neutrófilos polimorfonucleares (PMN) e evitar a lesão cardíaca50.
Outra origem potencial de ONOO- é a NOS induzível (iNOS) expressada no miocárdio
isquêmico. Enquanto a produção fisiológica de NO da isoforma endotelial eNOS apresenta
um papel crítico na hemostasia cardiovascular, o excesso de produção de NO pela isoforma
induzida iNOS está envolvido com a lesão de isquemia e reperfusão e medeia a citotoxicida-
de em uma variedade de estados patológicos51.
Estudos revelam que na lesão de isquemia e reperfusão a expressão de iNOS miocár-
dica aumenta substancialmente, com subsequente excesso de produção de NO e elevado
estresse nitrativo resultante da reação entre espécies reativas de oxigênio (ROS) e NO
derivado da iNOS52 .
Após isquemia e reperfusão, o infiltrado leucocitário, provavelmente, é a origem mais
significante de ONOO-, uma vez que gera uma grande quantidade de NO e O2- e produz
ONOO- quando acumulado no miocárdio53.
O efeito antioxidante da insulina foi documentado em pacientes obesos nos quais a ad-
ministração de insulina suprime a produção de ROS 54.
A insulina aumenta a produção de NO através da fosforilação da eNOS e exerce efeito fisioló-
gico cardioprotetor. Durante condições patológicas, quando a expressão de iNOS é estimulada,
a insulina inibe a iNOS e protege o tecido contra o estresse nitrativo. Portanto, concentrações
fisiológicas ou farmacológicas de NO produzidas através de eNOS ou de doadores de NO
exercem efeito cardioprotetor e antagonizam as ações citotóxicas do ONOO- 41.

Resistência à Insulina
A resistência à insulina é tipicamente definida como um decréscimo da sensibilidade
ou responsividade para as ações metabólicas da insulina. A diminuição da sensibilidade
ou resistência para as ações da insulina no endotélio vascular também contribui para o
fenótipo clínico de resistência à insulina. No entanto, a resistência à insulina pode envol-
ver qualquer um dos seus efeitos biológicos. Em indivíduos saudáveis, a insulina aumenta
o fluxo e o volume sanguíneos no músculo esquelético, o que lhe confere características
de um hormônio vasodilatador. Na vasculatura periférica, a insulina causa vasodilatação
dose e tempo dependente, efeito este que está prejudicado em estados caracterizados por
resistência à insulina, tais como a obesidade, hipertensão arterial e diabetes. Esta resistên-
cia vascular à ação da insulina pode ser um mediador na fisiopatologia vascular 23.

144 | Educação Continuada em Anestesiologia


Controle Glicêmico – Estudos Observacionais
Estudos observacionais associam a hiperglicemia na internação como fator de risco
independente para marcar mortalidade e morbidade55.
Essa associação é mais significativa em pacientes com infarto agudo do miocárdio, AVC
e hemorragia cerebral e o benefício de diminuir os níveis glicêmicos abaixo de 145mg.dL -1
foi sugerido por análises retrospectivas de grandes estudos de coorte realizados com pa-
cientes criticamente doentes. Consistentemente com essas séries, pacientes com variações
glicêmicas menores do que 145mg.dL -1 tiveram melhores resultados quando comparados
com aqueles com glicemias acima desse limiar56,57.
Estudo tipo antes e depois avaliou 300 pacientes diabéticos e encontrou melhora de re-
sultados vitais após a implementação do controle glicêmico intraoperatório e durante os três
primeiros dias de pós-operatório58.
Outro estudo tipo antes e depois realizado em pacientes com hemorragia subaracnoidea
demonstrou que a implementação de protocolo rígido de controle glicêmico (abaixo de
120mg.dL -1) associa-se a mortalidade similar quando comparada com o grupo controle e
está associado com maior risco de ocorrer hipoglicemia59.
Esses resultados suportam a ideia de que os benefícios associados com o manejo cuidadoso
da glicemia podem ser contrabalançados pelo risco de desenvolver hipoglicemia.

Controle Glicêmico – Estudos Clínicos – Perioperatórios


Em pacientes diabéticos a severidade da resistência à insulina relaciona-se com a qualidade
do controle glicêmico pré-operatório17.
E o estresse e o jejum associados com a cirurgia podem resultar num estado de resistên-
cia insulínica relativa e levar a hiperglicemia e aumento dos ácidos graxos livres60.
Existem poucos ensaios clínicos realizados durante o período perioperatório.
Ensaio clínico randomizado incluiu 73 pacientes diabéticos e 371 não diabéticos
que foram submetidos a cirurgias de revascularização coronariana. O estudo focou
exclusivamente o período intraoperatório e comparou o controle agressivo ( glicemia
alvo de 90 a 110mg.dL -1 ) com o grupo convencional ( glicemia alvo menor do que
180mg.dL -1 ). Após a cirurgia a glicemia foi controlada de forma igual nos dois
grupos. Os resultados demonstraram que o controle glicêmico intraoperatório não
melhora resultados 61.
Ensaio clinico randomizado, não encoberto, incluiu pacientes submetidos à revascula-
rização periférica e avaliou o impacto da infusão intravenosa de insulina na morbidade e
na mortalidade pós-operatória. Durante o 1º dia após a cirurgia a glicemia foi tratada no
grupo intervenção com administração contínua de insulina para manter a glicemia entre
100 a 150mg.dL -1 e no grupo controle com injeções intermitentes de insulina para manter
a glicemia abaixo de 150mg.dL -1. Quando comparado o grupo intervenção com o grupo
controle, houve redução significativa nos eventos cardiovasculares pós-operatórios
(3,5% versus 12,3%; P = 0,013)62 .

Glicemia, insulina, resposta inflamatória e anestesia | 145


Lesão de Isquemia-Reperfusão e Coração
Sabe-se que a reperfusão é uma condição fundamental para salvar o tecido miocár-
dico após um IAM, melhorando a função ventricular e a sobrevida após este evento.
No entanto, a reperfusão induz perda celular, além daquela esperada pela isquemia por
si só; além da necrose, um componente da morte celular não previamente reconhecido
na lesão após reperfusão, denominado morte celular programada ou apoptose, teria um
papel biologicamente significativo.
No local da isquemia, por que requer metabolismo aeróbico, os ácidos graxos livres
aumentam o consumo de oxigênio e inibem o uso de glicose, diminuem a contratilidade e
predispõe o paciente ao desenvolvimento de arritmias e acúmulo de radicais livres60.
Este padrão alterado de utilização de substratos resulta em menor produção de ATP, geração
de radicais livres de O2, maior consumo de O2 pelo miocárdio e disfunção contrátil miocárdica7.
O aumento da glicólise e da oxidação da glicose dependem do incremento do transporte
deste substrato para a célula miocárdica e da ativação da glicogenólise. Durante isquemia
miocárdica aguda, a maior captação de glicose e seu metabolismo associam-se à preservação
da função miocárdica. Até 50% dos pacientes com IAM apresentam hiperglicemia na admissão
hospitalar secundária ao estresse e consequente aumento de cortisol e noradrenalina, ou ainda
por diabetes sem diagnóstico prévio. Independente de diagnóstico prévio de diabetes, a
hiperglicemia neste momento é fator de pior prognóstico, associando-se o maior risco de
insuficiência cardíaca e mortalidade. Em caso da disponibilidade de glicose estar prejudica-
da em condições de isquemia, poderá ocorrer prejuízo da função miocárdica. A deficiência
de insulina, absoluta ou relativa, característica do DM, leva a menor translocação de GLUT
4 para a membrana celular, limitando a disponibilidade de glicose, o que determina a utili-
zação de ácidos graxos livres AGL pelo miocárdio23.
Contudo, a presença de O2- desvia o NO para uma via tóxica formando ONOO-, que
causa estresse oxidativo/nitrativo no tecido pós-isquêmico49.
Em conjunto, estes dados suportam um papel da insulina em promover sobrevida celular
durante a reperfusão via múltiplos eventos sinalizadores pró-sobrevida e antiapoptóticos23.

Cirurgia Cardíaca
No coração os ácidos graxos livres (AGL) são a principal fonte de energia dos cardiomiócitos
e a captação e oxidação são proporcionais às concentrações séricas. Na isquemia miocárdica,
a energia celular dependerá quase que exclusivamente do metabolismo anaeróbico da glicose,
pois a redução na oferta de oxigênio torna o miocárdio incapaz de oxidar os AGL.
Estudos realizados em pacientes submetidos a cirurgias cardíacas mostram que durante
cirurgia cardíaca o controle intensivo da glicemia pode aumentar a mortalidade e as taxas de
AVC. Assim, o racional para usar soluções contendo glicose, potássio e insulina (GIK) foca
o efeito cardioprotetor da mistura via promoção da glicose como um substrato energético
primário, diminuindo os níveis circulantes de ácidos graxos livres, aumentando a estabilida-
de da membrana miocárdica e promovendo a sobrevida celular61,63.

146 | Educação Continuada em Anestesiologia


E após a realização da cirurgia cardíaca controle deficiente da glicemia foi associado a
piores resultados4.
Estudo tipo antes e depois comparando o uso intravascular intensivo de insulina com
o uso subcutâneo, em pacientes diabéticos submetidos a cirurgias de revascularização do
miocárdio, demonstrou redução na mortalidade de 57%3.
Esse estudo é limitado pelo desenho não randomizado, pelos grupos heterogêneos e pela
alteração do protocolo durante o estudo com 14 anos de seguimento.
Outro estudo antes e depois mais recente demonstrou que, em pacientes diabéticos
submetidos a cirurgia de revascularização do miocárdio, o tratamento intensivo com
insulina (glicemia alvo de 150 a 200mg.dL -1) no intraoperatório e no pós-operatório
(glicemia alvo de 140mg.dL -1) reduz a mortalidade em 72%58 . Esses achados também
foram verificados em outros estudos 4 e nessa população quatro glicemias acima de
200mg.dL -1 foram associadas com aumento de morbidade, quando comparado com
pacientes sem hiperglicemia.
Em pacientes diabéticos submetidos a cirurgias de revascularização do miocárdio, en-
saio clínico randomizado com o uso de GIK iniciado no intraoperatório (glicemia alvo
de 125 a 200mg.dL -) comparado com tratamento padrão (glicemia alvo de < 250mg.dL -)
evidenciou diminuição da mortalidade, do tempo de internação e das taxas de infecção da
ferida operatória64.
Ensaio clínico randomizado, com 400 pacientes incluídos, comparou em cirurgia cardíaca
controle intensivo da glicemia (glicemia alvo de 80 a 100mg.dL -1) com o controle tradicio-
nal. Com o controle intensivo da glicemia com insulina não houve redução na mortalidade
ou na morbidade. Com o controle intensivo aumentou a mortalidade (4 mortes versus
0, P = 0.061) e aumentou a incidência de AVC (8 versus 1, P = 0,020)61.
Outros estudos têm confirmado que durante cirurgia cardíaca o controle glicêmico
rígido associa-se com diminuição das taxas de infecção e melhora da sobrevida3,4.

Estudos Pós-Operatórios – Cirurgia Cardíaca


Em pacientes diabéticos submetidos a cirurgia cardíaca diversos estudos têm avaliado os
efeitos da hiperglicemia no período pós-operatório. Espera-se que o controle glicêmico possa
diminuir o risco de infecção da ferida operatória. A análise de 1.585 pacientes submetidos
a cirurgias cardíacas antes e depois da utilização de um protocolo de uso de insulina
(glicemia alvo > 200mg.dL -) revelou um decréscimo significante na incidência de in-
fecção profunda da ferida operatória (2,4 – 1,5%)65.
Resultados similares foram obtidos através de estudo prospectivo com 2.464 pacientes
com o mesmo alvo de glicemia 66. Em análise retrospectiva a hiperglicemia pós-operatória
foi um preditor independente de complicações infecciosas em pacientes diabéticos submeti-
dos a cirurgia de revascularização miocárdica67
Assim, a leitura em conjunto destes trabalhos permite afirmar que durante o pós-operatório
de cirurgia cardíaca o controle glicêmico diminui a taxa de infecção.

Glicemia, insulina, resposta inflamatória e anestesia | 147


Estudos Pós-Operatórios – Cirurgia Não Cardíaca
Em pacientes submetidos a cirurgia vascular periférica, estudo de coorte encontrou que o
nível elevado de glicemia no pós-operatório é um fator de risco independente para infecção68.
Em adição, em pacientes com hemorragia subaracnoidea por aneurisma após clipamento
cirúrgico, ECR comparou controle agressivo (glicemia alvo de 80 a 120mg.dL -) com
tratamento convencional (glicemia alvo de 80 a 220mg.dL -). O tratamento intensivo foi as-
sociado à diminuição das taxas de infecção (42 para 27%). Não houve diferença nas taxas de
vasoespasmo, déficits neurológicos e mortalidade69.
A administração de glicose e insulina iniciadas antes da cirurgia melhoram a sensibilida-
de pós-operatória à insulina e diminui o estresse oxidativo70.
Metanálise demonstrou que o controle agressivo da glicemia no pós-operatório associa-se
com redução do risco de desenvolver septicemia71.

Controle Glicêmico – Estudos Clínicos – Terapia Intensiva


Van den Berghe e colegas publicaram o primeiro estudo da cidade de Leuven, com
1.548 pacientes cirúrgicos recebendo ventilação mecânica na unidade de tratamento
intensivo. O estudo comparou o grupo de pacientes submetido a tratamento intensivo com
insulina e glicose, glicemia mantida entre 80-110mg.dL -1, com o grupo que recebeu tratamento
padrão, que recebia infusão de insulina e glicose quando suas glicemias excediam 215 mg.dL -1,
com o objetivo de mantê-las entre 180-200mg.dL -1. Houve redução de 34% na mortalidade
intrahospitalar no grupo submetido ao tratamento intensivo. A principal causa da diminuição
da mortalidade nestes pacientes foi atribuída à redução da frequência de falência de múltiplos
órgãos por septicemia. Além disso, houve redução da morbidade que foi relacionada à redu-
ção dos episódios de septicemia, de insuficiência renal aguda, do número de transfusões
de sangue, do tempo de ventilação mecânica, da duração da internação e da prevalência de
polineuropatia. O grupo que recebeu tratamento intensivo apresentou mais episódios de
hipoglicemia – glicemia abaixo de 40mg.dL -1 (5,1% versus 0,8%), que não foram acompanha-
dos por eventos adversos graves, uma vez que o algoritmo para alteração da dose de insulina de
acordo com o teste glicêmico garantia rápida detecção e tratamento2.
Uma sub-análise pré-planejada deste estudo, realizada quatro anos após a internação na
UTI, demonstrou que a mortalidade após a alta hospitalar foi similar nos dois grupos. Isso
reflete a manutenção do benefício agudo72 .
Mais recentemente, contudo, existiu considerável controvérsia sobre a eficácia
e segurança do controle glicêmico rígido. O segundo estudo de Leuven comparou
pacientes submetidos a tratamento intensivo com insulina e glicose, glicemia mantida
entre 80-110mg.dL -1, com o grupo que recebeu tratamento padrão, que recebia infusão de
insulina e glicose quando suas glicemias excediam 215 mg.dL -1, com o objetivo de mantê-
-las entre 180-200mg.dL -1. Quando analisados pela intenção de tratar, houve redução
do tempo de internação na UTI e no hospital, no tempo de ventilação mecânica e nas
taxas de insuficiência renal mas não houve redução na mortalidade. Hipoglicemia -

148 | Educação Continuada em Anestesiologia


glicemia abaixo de 40 mg.dL -1 – ocorreu em 18,7% dos pacientes do grupo intensivamente
tratado com insulina comparado com 3,1% dos pacientes do grupo convencional e foi um
preditor independente de mortalidade73.
Esse ensaio clínico proporcionou a primeira evidência de que o tratamento intensivo
com insulina e a consequente hipoglicemia podem ser prejudiciais.
E dois estudos foram interrompidos precocemente pelo conselho de monitoramento de
segurança devido a alta incidência de hipoglicemia (glicemia abaixo de 40mg.dL -1) e a ocor-
rência de efeitos adversos graves74,75.
A validade externa do segundo estudo de Leuven e o nível ótimo de controle da glicemia
foram avaliados por grandes estudos multicêntricos, que compararam o controle rígido da
glicemia através do uso intensivo de insulina74,76-79. O desenho desses estudos são similares,
mas não idênticos. Todos os ECR tinham como objetivo comparar os efeitos da terapia com
insulina para restaurar e manter a glicemia entre 80 a 110mg.dL -1. O NICE-SUGAR
(Normoglycemia in Intensive Care Evaluation-Survival Using Glucose Algorithm Regulation)79
e o Glucontrol usaram o valor alvo de glicemia de 140 a 180mg.dL -1 enquanto que os outros
estudos usaram o valor alvo de 180 a 200mg.dL -1 2,73,74,76,77.
No estudo NICE-SUGAR, o controle com uso intensivo de insulina foi associado com
aumento da mortalidade em 90 dias, embora nos outros ensaios clínicos não foi encontra-
da nenhuma diferença nos dois grupos. Como esperado o grupo com controle intensivo
com insulina foi associado com incidência 4 a 6 vezes maior de hipoglicemia (5% a 25%
dos pacientes randomizados para receber tratamento intensivo com insulina)79.
Quando utilizado o tratamento intensivo com insulina, a alta incidência de hipoglicemia
representa a principal preocupação e constitui-se na principal causa do aumento de trabalho
médico e de enfermagem.
Nos estudos VISEP74 e Glucontrol78, as taxas de mortalidade de pacientes que sofreram
pelo menos um episódio de hipoglicemia (definida como glicemia inferior a 40mg.dL -1)
foram maiores do que em pacientes que não experimentaram hipoglicemia. Em contraste,
em ambos os estudos de Leuven, pacientes hipoglicêmicos não apresentaram diferenças
detectáveis no resultado quando comparados com pacientes sem quaisquer episódios de
hipoglicemia. Isto não exclui a possibilidade de ocorrer hipoglicemia de longa duração, com
consequente diminuição na disponibilidade de glicose para os tecidos que são glicose de-
pendente, o que pode ser deletério ou apresentar risco de vida.
A análise dos resultados do primeiro estudo de Leuven demonstrou que a menor glicemia,
mais do que a dose de insulina utilizada, foi relacionada com a redução de mortalidade. A
dose de insulina foi um preditor negativo independente para insuficiência renal aguda80. Em
adição, estudo observacional prospectivo57 e retrospectivo81 correlacionaram positivamente
a dose de insulina com mortalidade.
Ensaio clínico randomizado controlado realizado em pacientes cirúrgicos em estado
crítico demonstrou que o controle glicêmico rigoroso, definido como restauração e ma-
nutenção da glicemia entre 80 a 110mg.dL -1, com tratamento intensivo com insulina foi
associado com diminuição da mortalidade e da taxa de complicações 2 .

Glicemia, insulina, resposta inflamatória e anestesia | 149


Estudos, subsequentes realizados em outras unidades de terapia intensiva (UTIs) não
foram capazes de reproduzir os achados do estudo inicial 73,74, 76,77.
Metanálise, com 29 ensaios clínicos incluídos, comparou o tratamento intensivo com
insulina com o tratamento convencional em adultos submetidos a tratados na unidade de
terapia intensiva. Não houve diferença estatística na mortalidade hospitalar 82 .

Alvo Glicêmico - Hipoglicemia


A hipoglicemia pode ser prejudicial, por que o cérebro apresenta metabolismo aeróbico
obrigatório dependente de glicose. O cerebelo e o tronco cerebral são poupados da lesão.
Hipoglicemia severa causa necrose neuronal por aumento da concentração de aminoácidos
excitatórios, com predileção para os neurônios das camadas superficiais do córtex e do giro
denteado do hipocampo83.
O controle glicêmico rígido está associado com o aumento do risco de desenvolver
hipoglicemia e existe controvérsia a respeito do alvo glicêmico mais apropriado5,6.
Sabe-se que a taxa de Infecção e a mortalidade hospitalar aumentam com o a elevação
da glicemia67. Outros estudos, contudo, têm demonstrado benefício com taxas mais altas
de glicemia64,66.
Em adição existe evidência de que a variabilidade da glicemia, não somente seus níveis,
afeta a morbidade e a mortalidade. Estudo retrospectivo com 7.049 pacientes de 4 UTIs
clínicas e cirúrgicas demonstrou que o desvio padrão das glicemias foi o fator independente
mais significante para mortalidade hospitalar (OR = 1,27 por mg; P = 0.013, DP glicemia
31mg.dL e 41mg.dL em sobreviventes e não sobreviventes respectivamente) entre pacientes
diabéticos e não-diabéticos84. Esses achados foram confirmados em outro estudo retrospec-
tivo realizado em pacientes sépticos6.
A hiperglicemia causa desvio de líquidos, aumento da resposta inflamatória levando a
disfunção endotelial, aumento da adesividade plaquetária e diminuição da resposta imune60.
A hiperglicemia pode prejudicar a atividade do complemento. A glicose através da glicação
do complemento tem o potencial de competir com microrganismos pela ligação com o com-
plemento. Quando isso acontece existe prejuízo na opsonização.
É difícil determinar o limiar glicêmico para que ocorram os efeitos deletérios, por que
alguns desses efeitos foram testados em vitro com níveis de glicose usualmente acima
de 180mg.dL -1.
Metanálise concluiu que o tratamento intensivo com insulina pode diminuir mortalidade
(poder de 40%), mas está associado com o aumento da ocorrência de hipoglicemia37,60.

Pacientes Diabéticos – Não Diabéticos


Não existem estudos prospetivos desenhados para comparar o efeito do controle da
glicemia em pacientes diabéticos e não diabéticos. Estudo retrospectivo demonstrou que
a hiperglicemia durante cirurgia de revascularização do miocárdio é um preditor indepen-
dente de mortalidade em pacientes diabéticos e não-diabéticos, o tamanho do efeito foi

150 | Educação Continuada em Anestesiologia


similar nos dois grupos88. Não está claro se os benefícios do controle glicêmico diferem nos
pacientes com diabetes tipo 1 e nos pacientes com diabetes tipo 2. Em geral o diabetes tipo 1
é caracterizado por deficiência insulínica devido a destruição autoimune das células beta
pancreáticas. Enquanto o diabetes tipo 2 é caracterizado por resistência à insulina e requer
doses mais elevadas de insulina que o tipo 1 para obter o mesmo nível de controle glicêmico7.

Conclusões e Recomendações para o Controle da Glicemia


Enquanto aguardamos mais estudos, algumas recomendações podem ser feitas com
respeito ao controle da glicemia dos pacientes cirúrgicos.
Durante o período pós-operatório e no paciente crítico recomenda-se:
1. Evitar hiperglicemia severa (acima de 180mg.dL -1);
2. Evitar grandes variações na glicemia;
3. Evitar controle agressivo da glicemia em situações de emergência;
4. Minimizar a resistência pós-operatória à insulina;
5. Evitar hipotermia;
6. Evitar transfusão de sangue e derivados;
7. Administrar líquidos claros contendo 50 a 100gr de carboidratos até duas horas antes
da cirurgia;
8. Monitorizar a glicemia transoperatória a cada 30 - 60 minutos;
9. Detecção e tratamento precoces da hipoglicemia.

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156 | Educação Continuada em Anestesiologia


Capítulo 10

Cuidados pós-reanimação
Márcio de Pinho Martins
Emilio Carlos Del Massa
Ronaldo Alves de Souto
Cuidados pós-reanimação
Introdução
A injúria cerebral é a causa mais comum de morbidade e mortalidade em pacientes após
parada cardiorrespiratória (PCR), desta forma, esta injúria se faz responsável pela causa de
morte em 68% dos pacientes após PCR extra-hospitalar (PCR-EH) e em 23% após PCR
intra-hospitalar (PCR-IH)1. Os cuidados pós-ressuscitação têm um potencial significativo
para reduzir a incidência de mortalidade precoce, causada por instabilidade hemodinâmica
e falência orgânica múltipla, além da morbiletalidade tardia resultante de lesão cerebral 2 .
O objetivo de toda reanimação cardiorrespiratória (RCP) após a parada cardíaca (ou
parada cardiorrespiratória – PCR) consiste no retorno da circulação espontânea (RCE). O
que se deseja é o retorno da função cerebral do paciente ao mesmo estado antes da PCR,
com estabilidade do ritmo cardíaco e da hemodinâmica. Porém, o período imediatamente
subsequente à RCP com sucesso é um período de grande instabilidade e de vulnerabilidade
do paciente. A maioria das mortes dos pacientes que foram reanimados, ocorre nas primei-
ras 24 h após o RCE. Negovsky3, reconhecendo a complexidade das alterações deste período
crítico, criou o termo doença pós-ressuscitação, chamando atenção de que o processo de
reanimação não se encerra após o RCE 4. O International Liaison Committee on Resuscitation
(ILCOR), em um consenso envolvendo diversos especialistas, propôs o termo síndrome
pós parada cardíaca (SPPCR)5.
A mortalidade da PCR permanece elevada cerca de 5 a 10% das vítimas sobrevive à PCR-
-EH e 15% à PCR-IH. Devido a avanços no atendimento das vítimas de PCR e implemen-
tação cada vez maior dos diferentes elos da cadeia de sobrevivência, uma maior proporção
de vítimas de PCR apresenta RCE, e chega com vida aos hospitais6. Dentro das mudanças
propostas nas últimas diretrizes para RCP da AHA/ILCOR, foi incorporado um quinto
elo na cadeia de sobrevida do suporte avançado de vida (SAV). Este quinto elo enfatiza as
peculiaridades do estado pós-RCP, bem como a importância do manejo terapêutico rápido
e apropriado nesse período.
Figura 1: Quinto elo da cadeia de sobrevivência

Fonte: 2010 AHA Guidelines for CPR and ECC 7


1. Reconhecimento imediato da PCR e acionamento do SAMU
2. RCP precoce, com ênfase nas compressões torácicas
3. Rápida desfibrilação
4. Suporte avançado de vida eficaz
5. Cuidados pós-PCR integrados

158 | Educação Continuada em Anestesiologia


Síndrome pós parada cardíaca
Representa um complexo de alterações fisiopatológicas que podem ser agrupadas em
4 categorias:
• Resposta de isquemia e reperfusão;
• Lesão cerebral;
• Disfunção miocárdica;
• Persistência dos fatores etiológicos da parada cardíaca.
A gravidade desta síndrome varia de acordo com a duração e a causa da PCR. Apresenta
diversas características semelhantes à sepsis, incluindo vasodilatação e depleção do volume
circulatório. Pode não se manifestar nos casos de pronta reversão da PCR.

Cuidados pós-reanimação
Estes cuidados iniciam logo após o RCE, no local em que a RCP foi realizada. Uma vez
estabilizado, o paciente deve ser transferido para uma unidade de cuidados intensivos, CTI
ou unidade coronariana. A qualidade nestes cuidados influencia de forma significativa os
resultados dos pacientes que sobrevivem à PCR.
Os principais componentes dos cuidados pós-reanimação são8 .
• Manter oxigenação e a ventilação adequadas;
• Otimização da hemodinâmica;
• Cateterismo cardíaco precoce;
• Correção de distúrbios hidroeletrolíticos e metabólicos;
• Indução de hipotermia terapêutica, sempre que possível.

Via aérea e ventilação


Pacientes que foram prontamente reanimados, podem retornar rapidamente a um nível
consciência normal. Nestes pacientes, não é necessário intubação traqueal (IT) ou venti-
lação controlada. O2 sob máscara, para manter SaO2 normal, é o suficiente. Em pacientes
com alteração do nível de consciência, é comum a hipoxemia e a hipercarbia, que podem
contribuir para piora da lesão cerebral e precipitar novo episódio de PCR. Nestes casos, a
ventilação mecânica controlada (VMC) está indicada. Após um breve período de VMC, o
paciente pode apresentar recuperação do nível de consciência, nesta situação, a extubação
não deve ser postergada. Antes da extubação, é aconselhável a passagem de sonda para dre-
nagem do conteúdo gástrico, caso não tenha sido introduzida anteriormente.
A SaO2 deve ser mantida entre 94 e 98%, pois foi demonstrado que a hiperóxia favorece a
liberação de radicais livres e piora o prognóstico. A ETCO2 deve monitorada continuamente
por meio da curva de capnografia e ajustada para valores entre 35-40 mmHg. A PaCO2 deve
estar entre 40 e 45 mmHg.
Deve-se examinar a expansão torácica e ausculta pulmonar para detecção de intubação se-
letiva, problema comum após IT emergencial, transporte do paciente ou mudança de decúbito.
É importante descartar fraturas de costelas e hemo/pneumotórax no RX de tórax.

Cuidados pós-reanimação | 159


Circulação
Após PCR, a instabilidade hemodinâmica e do ritmo cardíaco são comuns. A monito-
rização contínua da pressão arterial (PA) e do ECG é essencial. Sinais de turgência jugular
patológica podem indicar insuficiência ventricular direita (IVD) ou tamponamento cardíaco.
Assim que possível, uma linha arterial deve ser introduzida, que pode ser usada para guiar o
tratamento, usando análise do contorno arterial e variação da fluidoresponsividade, quando
disponíveis. As novas e menos invasivas técnicas para medida do débito cardíaco, pré-carga
e fluidoresponsividade apresentam adequada precisão e podem ser uma alternativa ao uso da
pressão capilar pulmonar (PCaP) em pacientes graves9.
No período pós-reanimação, a dor torácica e/ou elevação do segmento ST apresentam
baixo valor previsor de oclusão coronariana, por este motivo, a intervenção coronariana
percutânea (ICP) deve ser considerada em todos os pacientes com suspeita de a doença
arterial coronariana (DAC) ser a causa primária da PCR. Esta intervenção pode ser realiza-
da durante o período de hipotermia terapêutica.

Síndromes coronarianas agudas após PCR


A síndrome coronariana aguda (SCA) engloba um conjunto de manifestações clínicas
que refletem um quadro de isquemia miocárdica aguda incluindo três formas principais10:
• Angina instável;
• Infarto agudo do miocárdio sem supra desnivelamento do segmento ST (IAM sem SST)
• Infarto agudo do miocárdio com supra desnivelamento de ST (IAM com SST).
No Brasil em 2009, a SCA foi responsável por 7% do total de óbitos, estando associada a
substanciais custos diretos e indiretos para o Sistema de Saúde11.

Fisiopatologia das síndromes coronarianas agudas


A SCA resulta do desequilíbrio súbito entre a oferta e o consumo de oxigênio causa-
do pela alteração do fluxo sanguíneo no miocárdio. Os mecanismos da SCA englobam
vasoconstrição e elementos de trombose superpostos a lesões de placas ateroscleróticas.
A ruptura da placa aterosclerótica é considerada o evento-chave na patogênese da SCA 12 .
As placas mais suscetíveis à ruptura são aquelas que contém um núcleo rico em lipídios e
fina cápsula fibrosa13.
As plaquetas, em resposta a injúria endotelial, agregam-se e liberam conteúdo granular,
provocando aumento da agregação plaquetária, vasoconstrição e aumento do trombo.
A obstrução total da luz arterial provoca isquemia, levando a necrose miocárdica, a qual
é demonstrada no ECG através do supra desnivelamento do segmento ST. Após a fase aguda
do IAM, instalada a lesão, geralmente verificamos aparecimento de onda Qno ECG. Se o
trombo formado não for oclusivo, algum fluxo de sangue chegará ao território em sofrimen-
to causando IAM sem supra desnivelamento do segmento ST ou angina instável.
A SCA é a causa mais frequente de disritmia maligna seguida de morte súbita14. Os
objetivos do tratamento incluem a correção de arritmias graves, potencialmente letais,

160 | Educação Continuada em Anestesiologia


como a fibrilação ventricular (FV) ou bradicardia extrema e a preservação da função
ventricular, minimizando a extensão da lesão do miocárdio. As recomendações atuais
centram-se nas primeiras horas pós-início dos sintomas. O tratamento pré-hospitalar e
no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) varia em função da disponibi-
lidade, recursos e organização local 15 .

Abordagem diagnóstica das SCA

Diagnóstico Clínico
A principal manifestação clínica da SCA é a dor precordial em aperto, constrição ou ar-
dência, geralmente no repouso, acompanhada de sintomas neurovegetativos (dispnéia, su-
dorese, náusea, vômito e síncope). O quadro clínico clássico de IAM com SST consiste em
dor precordial súbita, em aperto, intensa, duradoura (>30 min), de localização precordial
com irradiação para membro superior esquerdo, pescoço ou região mandibular. Porém, a
apresentação clínica pode ser atípica(dor em queimação ou sensação de plenitude gástrica),
mais comum em idosos, diabéticos e mulheres.
A dor precordial anginosa da SCA sem SST tem as mesmas características anteriores,
exceto pelo fato da dor apresentar duração menor que 30 minutos e associar-se a náuseas,
sudorese, dispnéia e mal-estar.
No IAM com supra de ST, o paciente apresenta-se pálido, sudorético e agitado. A frequ-
ência cardíaca (FC) e a pressão arterial (PA) geralmente estão elevadas, entretanto, depen-
dendo da extensão e localização do IAM, pode ser encontrado disfunção ventricular asso-
ciada à hipotensão (IAM do ventrículo direito – VD). O aparecimento de sopro sistólico
deve servir de alerta para complicações do IAM associadas a disfunção do músculo papilar
e comunicação interventricular.
Avaliação clínica criteriosa inicial tem valor nos diagnósticos diferenciais entre os
quais incluem-se: pericardite, tromboembolismo pulmonar, dissecção aórtica e quadros
digestivos altos.
Estudos com nível de evidência(NE) 2 e 3, não apoiam o uso de quaisquer sinais e sin-
tomas independentes de ECG, biomarcadores cardíacos ou outros testes para diagnósticar
ou descartar a SCA noatendimento pré-hospitalar ou hospitalar. Embora alguns sintomas
sejam mais sensíveis e específicos do que outros, nenhum sinal ou sintoma avaliado isolada-
mente, excedeu a sensibilidade de 92% e especificidade de 91% (NE-3).

Diagnóstico eletrocardiográfico
O ECG de 12 derivações (ECG 12D) é o elemento fundamental no diagnóstico, na ava-
liação e na abordagem terapêutica inicial das SCA. Na suspeita de SCA e na PCR após o
RCE, deve ser feito de imediato um ECG com 12 derivações (Classe I, NE B). Quando reali-
zado no atendimento pré-hospitalar, permite alertar o hospital de destino, acelerar decisões
e o início do tratamento. Em pacientes com dor torácica aguda e elevação do segmento ST, a
incidência de IAM é de 80 a 90% 16. Nos casos em que não há possibilidade de interpretação

Cuidados pós-reanimação | 161


do ECG 12D no local, é aceitável a interpretação assistida por computador ou a transmissão
do ECG para interpretação à distância.
A presença de supra desnível de ST maior que 1 mm em derivações periféricas contíguas ou
maior que 2 mm nas precordiais, se correlaciona à presença de oclusão coronariana total e iden-
tifica os pacientes que, na maioria das vezes, irão evoluir para infarto com onda Q 17. O supra
de ST poderá estar presente também em pacientes com pericardite, aneurisma ventricular ou
hipertrofia de ventrículo esquerdo (HVE). Alterações dinâmicas no segmento ST (depressão ou
elevação do ST) ou inversões da onda T durante episódio doloroso, que se resolvem pelo menos
parcialmente quando os sintomas são aliviados, são importantes marcadores de prognóstico ad-
verso, isto é, subsequente IAM ou morte. A presença de novo bloqueio de ramo esquerdo (BRE)
impossibilita o reconhecimento do supra desnível de ST. Portanto, novo BRE associado à história
clínica sugestiva de isquemia cardíaca é indicativo de IAM devendo o doente ser encaminhado
à terapia de reperfusão. No IAM com SST, está indicada a reperfusão coronária imediata por
intervenção percutânea coronáriaprimária (ICPP) ou fibrinólise pré-hospitalar.
Em pacientes com SCA, a presença de infra desnível de ST maior que 1mm em duas ou
mais derivações ou inversão da onda T, podem ocorrer na angina instável ou no IAM sem
supra de ST. Estas alterações são geralmente vistas quando o ECG é realizado na presença
de dor precordial devendo regredir com o alívio da dor (alterações dinâmicas do ST). É im-
portante enfatizar que um ECG normal em paciente com dor torácica não exclui a presença
de SCA. As análises retrospectivas dos pacientes que são admitidos com IAM demonstram
que o ECG inicial é diagnóstico em aproximadamente 60% dos casos, porém, pode estar
normal mais de 15% dos casos. Se houver suspeita SCA, o paciente dever ser mantido hospi-
talizado para realização de curva enzimática e ECGs seriados (0, 3 e 9 h).
Marcadores Bioquímicos de Injúria Miocárdica
Os marcadores de necrose miocárdica são macromoléculas liberadas pelo músculo car-
díaco lesado, fundamental para a avaliação diagnóstica e prognóstica dos pacientes com
provável SCA. Podem ser divididos em marcadores precoces e tardios e também devem ser
coletados de modo seriado após o início da dor.
• Mioglobina: é o primeiro marcador a elevar-se (3h do início da dor), no entanto, é
pouco especifico devido a sua presença ainda em músculo esquelético, ocasionando
resultados falsos-positivos.
• Troponinas ( T e I ): As troponinas são proteínas que participam da contração das
miofibrilas cardíacas.São os marcadores mais sensíveis e específicos de lesão mio-
cárdica, sendo considerados o padrão ouro de necrose miocárdica1. O aumento das
troponinas ocorre em média, 4 a 6 h após início da dor e ocorre normalização dentro
de 10 a 15 dias após o evento.
• Creatinina quinase (CK e CK-MB): A CK total está presente tanto no miocárdio
quanto nos músculos esqueléticos. Sua isoenzima CK-MB é mais específica para o
diagnóstico de necrose miocárdica. Esta enzima começa a elevar-se 3 a 12 horas após
início da dor e normaliza em 3 a 4 dias.

162 | Educação Continuada em Anestesiologia


Tabela I: Marcadores bioquímicos
Início de elevação Pico sérico Tempo de normalização
Mioglogina 1 a 4 horas 6 a 7 horas 24 horas
CK-MB massa 3 a 12 horas 24 horas 48 a 72 horas
TroponinaT 3 a 12 horas 12 a 48 horas 5 a 14 dias
Troponina I 3 a 12 horas 24 horas 5 a 10 dias

SCA – Abordagem terapêutica


Medidas gerais e tratamento dos sintomas
Devem ser realizadas em todos os pacientes com suspeita diagnóstica de SCA e incluem:
• Obtenção dos sinais vitais: PA, FC, além de exame físico criterioso;
• Suporte Ventilatório: através de oxigênio por cateter ou máscara;
• Obtenção de acesso venoso;
• Monitorização do ritmo cardíaco e da saturação de oxigênio;
• Administração de 200 mg de aspirina por via oral;
• Nitrato 5 mg ou nitroglicerina 0,4mg sublingual (SL);
• Obtenção de ECG com 12 derivações;
• Administração de morfina IV quando a dor for muito intensa.
A nitroglicerina deve ser considerada se a pressão arterial é > 90 mmHg e a dor torácica
persiste. Também útil no tratamento do edema agudo do pulmão devido à venodilatação
dos vasos de capacitância, dilatação das artérias coronárias e em menor grau,na dilatação das
artérias periféricas. Os nitratos não devem ser utilizados em pacientes hipotensos (pressão
arterial sistólica - PAS<90mmHg) e bradicárdicos, com IAM inferior e suspeita de envolvi-
mento do VD, pois podem intensificar a hipotensão e reduzir ainda mais o débito cardíaco.
A morfina é o analgésico de escolha na dor resistente aos nitratos, além de ter efeito
calmante, que dispensa o uso associado de outros sedativos na maioria dos casos. Como
a morfina é venodilatadora dos vasos de capacitância, tem efeitos benéficos adicionais nos
pacientes com congestão pulmonar. A dose inicial de morfina é de 3-5mg IV, podendo ser
repetidaa cada 20 minutos até o doente não referir dor. Os antiinflamatórios não esteróides
(AINES) devem ser evitados devido à sua ação pró-trombótica18.
O uso de oxigênio suplementar deve ser restrito aos pacientes que estejam hipoxêmicos.
Oxigênio em altas concentrações pode ser prejudicial nos doentes com IAM não complicado19.
A resposta sistêmica à isquemia/reperfusão e a disfunção miocárdica da síndrome
pós-PCR têm muitas características semelhantes à sepse20. Dessa forma, aventou-se que
a terapêutica precoce direcionada por metas poderia beneficiar pacientes após PCR,
mas tal benefício ainda não foi comprovado na literatura. Além disso, as metas e estra-
tégias para alcançar esses objetivos podem ser diferentes na síndrome pós-PCR, dada
a presença concomitante de dano cerebral, disfunção miocárdica e persistência dos
fatores precipitantes21.

Cuidados pós-reanimação | 163


SCA – Medidas específicas
Inibidores da agregação plaquetária
A inibição da agregação plaquetária é de fundamental importância no tratamento inicial,
assim como na prevenção secundária, já que a ativação e agregação das plaquetas é o
fenômeno principal na fisiopatologiadas síndromes coronárias agudas.
• Ácido Acetil Salicilíco (AAS)
É o medicamento que apresenta as mais fortes evidências de beneficio no prognós-
tico precoce e na evolução tardia dos pacientes com SCA. O AAS deve ser usado em
todos os casos de SCA, exceto na presença de contra-indicações (úlcera péptica ativa,
sangramento ativo, hipersensibilidade ao A AS). A dose recomendada é de 160 a 325mg
VO (comprimido mastigável).
• Inibidores dos receptores de ADP
As tienopiridinas (clopidogrel, prasugrel) e a ciclo-pentil-triazolo-pirimidina, (ticagrelor)
inibem os receptores de ADP de forma irreversível,reduzindo a agregação plaquetária de
forma mais potente do que o AAS. Recomenda-se a utilização destes agentes nas SCA como
tratamento inicial e na prevenção secundária, caso o uso do AAS esteja contra-indicado. O
clopidogrel deve ser administrado o mais precocemente possível e em associação com o AAS
e anti-trombínico a todos os doentes com SCA – IAM sem SST. Se a opção for por um trata-
mento conservador, administrar uma dose de carga de 300mg nos pacientes com idade < 75
anos e 75mg sem dose de carga nos pacientes > 75 anos associado a AAS e anti-trombínico. Se
a opção incluir ICP programada, a dose inicial deve ser de 600mg.
• Inibidores da glicoproteína IIb/IIIa
São antiagregantes plaquetários mais potentes que o AAS atuando no elo final da agre-
gação plaquetária. O eptifibatide e o tirofiban provocam inibição reversível, enquanto que
o abciximab provoca inibição irreversível do receptor da Gp IIB/IIIA. Não há dados su-
ficientes para apoiar a utilização de rotina dos inibidores do receptor da Gp IIB/IIIA no
pré-tratamento dos pacientes com SCA e IAM (com ou sem SST).
• Antitrombínicos
A formação do trombo sobre a fissura da placa aterosclerótica é desencadeada não apenas
pela ativação e agregação de plaquetas, como também pela produção de trombina. Agindo
sinérgicamente, os dois mecanismos contribuem para ampliar o trombo sobre a placa. As
heparinas aceleram a ação da antitrombina circulante inibindo a ação da trombina IIa e dos
fatores IX e Xa.
Como agentes antitrombínicos temos: a heparina não fracionada (HNF) – inibidor indi-
reto da trombina, heparina de baixo peso molecular (HBPM) e fondaparinux – ambos mais
específicos sobre o fator Xa ativado, e bivalirudina – inibidor direto da trombina. Com os
novos anti-trombínicos, não há necessidade de controle da coagulação e o risco de trombo-
citopenia é menor.
A enoxaparina em comparação com a HNF reduz em conjunto a mortalidade, IAM e a
necessidade de revascularização urgente, quando administrado nas primeiras 24-36h após
início dos sintomas nos SCA – IAM sem SST22 .
164 | Educação Continuada em Anestesiologia
Nos doentes com risco de hemorragia aumentado, administrar fondaparinux ou bivalirudina,
que causam menos hemorragia do que a HNF23.

Antiisquêmicos
Dentre esta classe destacamos os betabloqueadores, pois seus efeitos benéficos resul-
tam da diminuição do consumo de oxigênio pelo miocárdio (MVO2), controle da FC
e PA, redução da contratilidade cardíaca. Os betabloqueadores, quando usados na fase
aguda do IAM, demonstram redução significativa de re-infarto, isquemia recorrente e
mortalidade geral 24.

Estratégias e sistemas de saúde


No sentido de melhorar a qualidade dos cuidados pré-hospitalares dos doentes com
SCA, as estratégias centram no reconhecimento imediato dos doentes com IAM com SST
com intenção de encurtar o tempo até a reperfusão. Os pacientes devem ser encaminhados
para centro terciário que disponha de ICP 24h / 7 dias da semana. Neste contexto, várias
decisões específicas que têm de ser tomadas na fase de cuidados iniciais, principalmente
sobre as estratégias de reperfusão em doentes com IAM com SST, i.e. ICPP vs fibrinólise
(pré) hospitalar.

Estratégias de reperfusão nos pacientes com IAM com SST


Nos doentes com IAM com SST, a reperfusão deve iniciar-se o mais depressa
possível, nas primeiras 12h após início dos sintomas, independentemente do método
selecionado25 . A reperfusão pode ser feita com fibrinólise ou ICP ou a associação das
duas 26 . A eficácia das técnicas de reperfusão é profundamente dependente da duração
dos sintomas. A fibrinólise é especificamente eficaz nas primeiras 2-3h após início
dos sintomas.
Os fibrinolíticos podem ser administrados com segurança por paramédicos treina-
dos, enfermeiros ou médicos, desde que seguindo protocolos pré-estabelecidos. A ICP
ou angioplastia primária, realizada no máximo até 6 à 12h após o início dos sintomas,
tem sido considerada a melhor forma de reperfusão miocárdica no IAM 27. Esta medida
pode ser útil mesmo em casos de obstrução coronariana completa. Em relato de RCP
durante 96 min em paciente com FV causada por obstrução da descendente anterior
esquerda, a ICP foi eficaz na reperfusão coronariana e na reversão do quadro de choque
cardiogênico. A efetividade da RCP neste caso foi comprovada pela curva de capnografia
durante todo o processo de reanimação28 . Abaixa disponibilidade de serviços de hemo-
dinâmica capazes de realizar angioplastia primária em tempo integral (24h.dia-1) limita
muito seu uso, tornando os agentes trombolíticos a única opção.A indicação destes
agentes deve ser em até 6 a 12h após o início dos sintomas. Existem contra-indicações
absolutas e relativas ao uso de trombolíticos que deverão ser pesquisadas antes da indicação
de trombólise química.

Cuidados pós-reanimação | 165


Monitorização após reanimação
Após transferência para uma unidade de tratamento intensivo (CTI ou unidade corona-
riana), recomenda-se a monitorização contínua de:
• ECG;
• Linha arterial (PA invasiva);
• Acesso venoso central (para saturação do sangue venoso– SvO2, pressão venosa central e
infusão de drogas vasoativas);
• Débito cardíaco (DC);
• Frequências cardíaca e respiratória (FC e FR);
• Oximetria;
• Capnografia;
• Temperatura central;
• Débito urinário.
É importante observar os efeitos fisiológicos de todas as intervenções terapêuticas, como
uso de diuréticos e início de VMC.
Tabela II: Investigação inicial após reanimação
Hemograma ECG 12 Gasometria
Bioquímica RX tórax Ecocardiograma
completo derivações arterial
Excluir anemia Ritmo de Posição de TT, Ventilação
Função renal Causas de PCR
grave admissão PVC e SNG adequada
EAP e/ou
Obter valores Na+, K+, Mg++ e Tamanho/
Sinais de SCA congestão Lactato
basais Ca++ função cardíaca
pulmonar
Assegurar Aspiração Derrame
IAM antigo
normoglicemia pulmonar pericárdico
Detectar e
Troponina acompanhar Pneumotórax Volemia
seriada anormalidades Hemotórax Alterações
QT prolongado ácido-base
Fraturas de Stunning
Obter valores Obter valores costelas esterno miocárdico
basais basais Obter padrão Obter padrão
basal basal
Abreviações: SCA – síndrome coronariana aguda, IAM – infarto agudo do miocárdio, TT – tubo traqueal,
PVC – punção venosa central, SNG – sonda naso-gástrica

Otimização das funções orgânicas


I- Cardiovascular
A disfunção miocárdica pode causar:
• Hipotensão;
• Débito cardíaco baixo;
• Arritmias cardíacas.

166 | Educação Continuada em Anestesiologia


A linha arterial é fundamental para monitorar continuamente a PA do paciente. O trata-
mento com inotrópicos, agentes vasopressores, reposição volêmica deve ser guiado pela PA,
FC, débito urinário, SvO2, e clearance do lactato. A pressão arterial média deve ser mantida
em valores > 65 mmHg (ou PAS > 90 mmHg), ser adequada para manter SvO2acima de 65%
e 70% para a SvcO2, reduzir os valores do lactato sérico (diminuição do lactato sérico de 5%
ou uma depuração de 10% em 4 a 6 horas)e gerar débito urinário de 1 ml.kg-1.h-1.
Os dados do ecocardiograma podem ser úteis, assim como monitores de débito cardíaco,
porém não existem evidências de que melhorem o prognóstico. Caso não exista resposta
clínica adequada, considerar o uso de balão de contrapulsação intra-aórtico 29.
II- Cerebral
Imediatamente após o RCE, por cerca de 15 minutos, ocorre um período de hiperemia
cerebral. Edema cerebral pode ocorrer transitoriamente, mas está raramente associado a
elevação significativa da pressão intracraniana (PIC).
A autorregulação cerebral fica comprometida após a PCR, portanto a pressão de per-
fusão cerebral fica mais dependente da PA do paciente. A PA deve ser mantida em valores
próximos aos valores basais do paciente antes da PCR. A hipotensão neste período deve ser
prontamente corrigida.
A sedação adequada irá reduzir o consumo de O2(VO2), além de facilitar a VCM. Uma
combinação de opióides e hipnóticos tem sido usada, mas não existe nenhuma vantagem para
qualquer agente específico. Agentes de curta duração (propofol, alfentanil e remifentanil) per-
mitem uma avaliação neurológica mais precoce.
Não existe nenhuma recomendação em relação à duração da sedação, mas deve ser man-
tida durante a hipotermia terapêutica, facilitando a sua indução e a fase de reaquecimento,
minimizando os tremores.
Convulsões ou mioclonia ocorrem em 5-15% dos pacientes que apresentam RCE,
e 10-40% dos que permanecem comatosos. As convulsões aumentam o metabolismo
cerebral em até 300%, podendo agravar danos cerebrais. Devem ser tratadas pronta-
mente com benzodiazepínicos, propofol, barbitúrico, fenitoína ou valproato sódico.
O clonazepam é o agente mais efetivo para o tratamento das mioclonias. Outras drogas
que podem ser usadas: propofol, valproato sódico e levetiracetam.
III- Metabólica
• Glicemia
A hiperglicemia está associada à mau prognóstico neurológico após PCR, porém a hipo-
glicemia grave está associada à aumento da mortalidade em pacientes críticos 30.Pacientes
em coma apresentam alto risco de hipoglicemia grave não reconhecida, e o controle rígido
da glicemia (CRG) está associado a episódios mais frequentes de glicemia < 40 mg.dl-1.
Oksanen e col. 31. não observaram benefício em relação à sobrevida em pacientes com PCR
extra-hospitalar tratados com controle rígido em relação ao controle glicêmico moderado
(CGM). Os pacientes com CRG apresentaram maior número de episódios de hipoglicemia
do que os pacientes com CGM, 18 X 2% (p<0,008), respectivamente.

Cuidados pós-reanimação | 167


As recomendações atuais são de controle glicêmico moderado (recomendação classe
IIb e NE: B):
• 144 a 180 mg.dl-1(8 a 10 mmol.L -1)

Controle da temperatura
Hipertermia nas primeiras 48h após a PCR e RCE é comum. Vários estudos mostram
que a febre piora o prognóstico destes pacientes, por este motivo deve ser sempre tratada
com antipiréticos ou com resfriamento ativo, se necessário.

Hipotermia terapêutica
Nos últimos anos, numerosos estudos vêm demonstrando, de forma bem estabele-
cida, que a hipotermia terapêutica (HT) pode minimizar o dano do sistema nervoso
central (SNC) proveniente da PCR, melhorando o prognóstico neurológico. A HT
induzida nos cuidados pós PCR consiste na manutenção da temperatura central dos
pacientes, de forma controlada,entre 32 e34°C, durante 12–24 horas,com o objetivo
terapêutico de minimizar os danos produzidos pela isquemia durante a PCR, bem como
as lesões provocadas pela reperfusão8 .
Os efeitos benéficos da HT responsáveis por amenizar os danos causados pelos
processos de isquemia–reperfusão são obtidos através da redução do VO2 cerebral, su-
pressão de reações químicas associadas com lesões de reperfusão, redução das reações de
radicais livres que aumentam o dano cerebral, redução da interação de cálcio intracelular,
modulação da apoptose, modulação da resposta anti-inflamatória e proteção de membranas
lipoprotéicas32,33. Recentemente, foi demonstrado que a HT leve estabiliza a hemodinâmica
nos sobreviventes de PCR, o que pode contribuir para o aumento da taxa de sobrevida
destes pacientes. Ocorre aumento da contratilidade miocárdica, provavelmente pelo
aumento da sensibilidade ao Ca++do miocárdio em falência 34.

Indicações para hipotermia terapêutica


As recomendações de consenso aprovam o uso da HT em pacientes adultos que perma-
necem em coma apósRCEna PCR extra-hospitalar com ritmo inicial de fibrilação ventricular
(FV) e taquicardia ventricular (TV) (classe I, NE B).A indução da HT deve ser considerada
em pacientes comatosos com RCE após PCR intra-hospitalar, no qual nenhum ritmo foi
identificado, e após PCR extra-hospitalar com ritmo inicial de atividade elétrica sem pulso
(AESP) ou assistolia (classe IIb, NE B)35,36.Entretanto, a HT não deve ser realizada em
pacientes em estado de choque circulatório, com coagulopatia primária ou em gestantes37,38.

Fases da hipotermia
A HT se mostrou eficaz para a proteção do cérebro e outros órgãos, bastante eficiente,
sendo necessário tratar seis pacientes para salvar uma vida - número necessário para tratar
de 6 (NNT=6). Porém, algumas nuances não estão bem estabelecidas sobre sua utilização,

168 | Educação Continuada em Anestesiologia


tais como: temperatura ideal, momento ideal para indução, duração, métodos para a indução,
manutenção e reaquecimento.
Dados de dois grandes trabalhos prospectivos sugerem que a janela terapêutica da HT seja
entre 2-8 horas após o retorno da circulação espontânea (RCE). Durante a fase de indução da
HT os pacientes devem ser resfriados a uma temperatura alvo entre 32-34°C39,40. Temperatu-
ras menores que 32°C podem resultar em aumento das complicações.
Diversas técnicas invasivas ou não invasivas de resfriamento foram testadas em busca de
se obter um método rápido, prático e com baixos índices de complicações para indução e
manutenção da HT.
Tabela III – Métodos de resfriamento
Técnicas Invasivas Técnicas Não Invasivas

Infusão de solução salina gelada Bolsas geladas

Circulação extracorpórea Cobertores gelados

Cateter intravascular de resfriamento Capacetes gelados

Lavagem nasal, nasogástrica, retal, peritoneal Imersão em água gelada

Pacientes podem ser facilmente resfriados com soluções cristalóides a 4°C41. Soluções
de ringer lactato ou soro fisiológico a 0,9% podem ser administradas em bolus de 500 ml ou
30 ml.kg-1.Técnicas de resfriamento de superfície, tais como bolsas de gelo em virilha, axila,
cabeça e pescoço, também poderão ser utilizadas como técnicas auxiliares42,43.
A monitorização axilar, oral ou timpânica da temperatura não é adequada durante a fase de
indução da HT.Em substituição a essas, a temperatura central pode ser obtida através de um
sensor de temperatura no cateter de Foley ou através de um termômetro esofágico, quando
não for utilizado lavagem gástrica com solução salina gelada. O termômetro retal poderá ser
utilizado quando modos de monitorização da temperatura central não estejam disponíveis.
Pacientes com tremores podem apresentar problemas para atingir a temperatura ideal
e devem ser agressivamente tratados. Opióides e ansiolíticos são os fármacos de eleição
para o tratamento, segundo recentes recomendações. Em pacientes resistentes ao trata-
mento inicial, bloqueadores neuro-musculares podem ser necessários. A HT pode reduzir
o clearance de medicamentos, interferindo na farmacocinética de sedativos e bloqueado-
res neuro-musculares.
Alguns pacientes atingem a temperatura alvo de 32-34°C na segunda fase da HT: fase de
manutenção. O objetivo desta, é manter a temperatura central atingida durante 12-24 horas.
Para tanto, além da infusão de solução salina gelada, serão utilizadas técnicas adicionais
como bolsas de gelo e cobertas geladas.
Após as 12-24 horas do período de manutenção, os pacientes deverão ser reaquecidos
através de método passivo ou ativo como uso de cobertores térmicos ou, eventualmente,
com solução salina levemente aquecidas44. Os dados atuais, baseados principalmente na
opinião de consenso, recomendam o reaquecimento a uma velocidade de 0,25-0,50°C por

Cuidados pós-reanimação | 169


hora.A transição da hipotermia para normotermia pode resultar em significativas alterações
no estado metabólico e hemodinâmico, como também em modificações nos níveis de ele-
trólitos e concentrações de fármacos.
Durante todas as fases da HT, recomenda-se a contínua monitorização da oxigenação e
da ventilação, bem como a otimização hemodinâmica, conforme descrito na monitorização
após reanimação.Oresumo das fases da HTencontra-se no quadro I.
Quadro I. Fases da Hipotermia Terapêutica

Fase de Indução
• Temperatura alvo 32 - 34°C;
• Administrar fluidos intravenosos a 4° C (30 - 40 ml.kg-1 de Soro Fisiológico ou Ringer Lactato);
• Usar métodos de resfriamento de superfície (bolsas de gelo, mantas térmicas, equipamentos comer-
ciais de resfriamento de superfície);
• Controle de tremores;
• Monitorar temperatura central (vesical, esofágica, retal e intravascular).
Fase de Manutenção
• Manter a hipotermia (32 - 34°C);
• Manter por 12 – 24h;
• Monitorizar e manter etrófilos em níveis normais (magnésio, fosfato, potássio, cálcio);
• Monitorar glicose e tratar hiperglicemia;
• Monitorar coagulação (tempo de protrombina, tempo de tromboplastina parcial ativado, plaquetas)
Fase de Reaquecimento
• Reaquecer a uma velocidade de 0,25 a 0,5°C por hora;
• Monitorizar e manter eletrólitos e glicemia em valores normais;
• Reaquecimento rápido pode reiniciar um processo catabólico e agravamento dos resultados.

Principais complicações da hipotermia


As complicações da HT incluem arritmias, aumento da resistência vascular sistêmica,
leucopenia, coagulopatia, pneunomia, sepse, hiperglicemia e hipertemia de rebote 45,46.O
resfriamento também pode induzir diurese, resultando em hipofosfatemia, hipomagnesemia,
hipocalcemia e hipovolemia47.

Prognóstico pós PCR


O prognóstico dos pacientes que sobrevivem a uma PCR é influenciado pordiversos
fatores relacionados com a PCR, tais como olocal da PCR (extra-hospitalar X intra-hos-
pitalar X intraoperatória), o ritmo inicial da PCR (FV/TV sem pulso X AESP/assistolia),
tempo para desfibrilação ou início de RCP por testemunhas e com fatores relacionados
ao paciente, como idade e presença de comorbidades: DPOC, sepsis, insuficiência renal,
cirrose hepática e malignidades 48.

170 | Educação Continuada em Anestesiologia


Para evitar tratamento fútil, devido ausência de qualquer benefício nas tentativas
de reanimação, existem regras como a do suporte avançado de vida para término da
RCP49. Segundo esta regra, cerca de 30% das vítimas de PCR seriam declaradas mor-
tas no local. A suspensão dos esforços de reanimação pela equipe de socorro estariam
indicadas quando:
• Ausência de RCE durante a RCP até o momento do transporte;
• Nenhuma tentativa de desfibrilação foi realizada até a chegada no local;
• O momento da PCR é desconhecido pela equipe de socorro ou por testemunhas
(PCR não testemunhada);
• Nenhuma RCP foi realizada por testemunhas da PCR antes da chegada.
Durante a RCP a ETCO 2 pode ser usada para prognóstico da sobrevida da vítima
de PCR. Pacientes que no início da RCP apresentam valores inferiores a 10 mmHg ou
que após 20 min de RCP apresentam valores de até 14,3 mmHg evoluem para a morte,
com valor de 100% para sensibilidade, especificidade, valor previsor positivo e valor
previsor negativo50 .
Apesar de todo o desenvolvimento tecnológico, nossa capacidade de realizar um
prognóstico em relação ao estado neurológico final dos pacientes em coma após a PCR
permanece bastante pobre.Nenhum teste isoladamente apresenta valor previsor posi-
tivo igual a 100%. O teste ideal para prognóstico deve apresentar uma taxa de falso
positivo igual a zero (TFP=0). A combinação de vários marcadores prognósticos é
recomendada, entretanto, mais dados serão necessários para estabelecer uma recomen-
dação baseada em evidências51.
O exame neurológico é o parâmetro de avaliação mais usado nos pacientes coma-
tosos, e tem sido o padrão ouro para prognóstico por muitas décadas, porém nenhum
sinal clínico desta avaliação permite prognosticar de forma confiável em menos de 24
h após o RCE. A ausência dos ref lexos fotomotor pupilar e córneo-palpebral após 72 h
da PCR indicam mau prognóstico (TFP=0). O ref lexo óculo-vestibular e a Escala de
Coma de Glasgow (GCS<5 após 72h) tem sido usados, porém com menor confiabilida-
de. A presença de mioclonia não deve ser usada como fator prognóstico isoladamente
(Classe III, NE C).
Dos testes eletroneurofisiológicos, o que apresenta a melhor capacidade discriminativa
é o potencial evocado somatossensorial (PESS). O uso de PESS precocemente após o coma
apresenta especificidade de 100% na identificação depacientes com mau prognóstico52. A prin-
cipal medida é a resposta N-20 do córtex somatossensorial primário. A ausência bilateral desta
medida, nos dias 1 e 3 pós PCR, é sinal confiável de mau prognóstico. Na ausência de fatores
que possam confundir a avaliação (hipotensão, convulsões, sedativos ou bloqueadores
neuromusculares), após 24 h do RCE, o PESS e o exame físico são os previsores mais confiá-
veis de mau prognóstico, em pacientes normotérmicos.
A HT terapêutica pode interferir nos resultados de testes clínicos e funcionais de
avaliação do SNC. Apesar de exames neurológicos ou de estudos neuroeletrofisiológicos
prevendo resultados ruins dentro do tradicional período para prognóstico de 3 dias

Cuidados pós-reanimação | 171


após a PCR, alguns resultados bons em pacientestratados com HT tem sido observa-
dos. Portanto, as características ou os resultados de testes que indicavamresultados
ruins em pacientes pós-PCR no passado, podem não ref letir a realidade após o uso mais
disseminado de HT nestes pacientes 53,54. Decisões de conduta não devem ser tomadas
baseadas em um único parâmetro prognóstico e no caso de incerteza, decisões que te-
nham impacto irreversível no tratamento devem ser retardadas por alguns dias para
repetição destes testes 55 .
A tomografia computadorizada (TC) de crânio e a ressonância magnética (RMI) cerebral
tem sido ferramentas essenciais no diagnóstico, conduta e prognóstico de pacientes com
lesões cerebrais agudas e também são usadas para o prognóstico dos pacientes após PCR.
O edema cerebral após PCR está relacionado ao dano cerebral e aumento da mortalidade.
Este edema pode ser medido pela TC sem contraste, como uma diminuição da atenuação
do raio X pela substância cinzenta. Metter e col. 56 estudaram a relação desta atenuação
entre a substâncias cinzenta e branca (gray/white ratio – GWR). Uma relação GWR<
1,20 mostrou baixa sobrevida, mesmo em pacientes submetidos à HT. A RMI pode mos-
trar lesões cerebrais invisíveis na TC, como edema citotóxico precoce após AVC isquêmico,
lesões difusas axonais após lesão cerebral traumática e necrose cortical laminar após a
PCR. Desta forma, pode aumentar a capacidade prognóstica na avaliação diagnóstica
destes pacientes 57.
Alguns marcadores bioquímicos tem sido bastante estudados, como a enolase neurônio-
-específica (NSE) e a S-100B. O níveis séricos da S-100B e da NSE aumentam após a PCR
devido à lesão cerebral anóxica58. A determinação seriada destes marcadores pode ser usada
para prognóstico com resultados semelhantes ao prognóstico baseado na avaliação clínica 59.
Embora não estejam amplamente disponíveis, podem apresentar resultados prognósticos
superiores ao exame neurológico isoladamente60.
Diversos novos métodos tem sido propostos para auxiliar no prognóstico pós RCE.
Arnalich e col. 61 mediram em equivalentes genômicos (GE.ml -1), o DNA livre no
plasma (livre de célula) em pacientes após PCR-EH no momento da admissão hos-
pitalar. Os autores concluem que este teste pode apresentar utilidade clínica para
prognóstico. Os valores mais elevados na admissão estiveram associados significati-
vamente à maior mortalidade. Com uma medida de corte em 4.340 GE.ml -1, este teste
apresentou uma sensibilidade de 76% e especificidade de 83% para identificação de
mortalidade em 24 h destes pacientes. Huang e col. 62 identificaram através de aná-
lise de regressão logistíca múltipla que DNA livre no plasma (livre de célula) maior
que 1.170 GE.ml -1 foi um previsor independente para mortalidade hospitalar e para a
mortalidade em 90 dias.
O doppler transcraniano pode identificar dano neurológico irreversível nas primeiras
24h pós PCR, evitando a futilidade terapêutica nestes pacientes 63.
Os principais previsores de mau prognóstico de pacientes que permanecem em coma
após a PCR estão resumidos na tabela IV. Para que a avaliação seja mais confiável, estes
parâmetros devem ser avaliados após 72 h da PCR 64.

172 | Educação Continuada em Anestesiologia


Tabela IV. Fatores associados a pior prognóstico em pacientes em coma pós PCR
Previsores de mau prognóstico

Ausencia de reflexo fotomotor e córneopalpebral

Resposta à dor ausente ou com extensão

Idade > 70

Ritmo inicial da PCR diferente de FV

Duração da PCR > 25 min

DPOC

Mioclonia

NSE > 80 ng.ml-1

PESS com N-20 ausente bilateral

Conclusão
Os cuidados pós-reanimação devem estar dentro de um contexto institucionalmente
organizado, permitindo que todos os elos da cadeia de sobrevivência sejam cumpridos e
conectados, possibilitando que os sobreviventes de PCR cheguem até o nível final desta
cadeia de sobrevivência e possam receber o tratamento mais sofisticado dentro de uma
unidade de cuidados intensivos. Com isto, é possível reduzir a incidência da mortalidade
precoce, causada por instabilidade hemodinâmica e por falência orgânica múltipla, bem
como a mortalidade tardia resultante de lesão cerebral pós PCR.
As SCA apresentam importante papel na etiologia na maioria das PCR-EH. O tratamento
deve ser iniciado de forma precoce e organizada. Para obter os melhores resultados, a reperfu-
são deve ocorrer nas primeiras horas após o início dos sintomas. Para isto, é fundamental um
sistema de saúde preparado para a triagem de pacientes e início do tratamento de acordo com
os recursos locais disponíveis.
Apesar de ser ainda subutilizada, a HT vem se mostrando, nos últimos anos, o melhor
tratamento disponível para a síndrome pós-reanimação. Na ausência de contraindicações, é
recomendável em todos os pacientes sobreviventes de PCR 65.
Infelizmente, um percentual alto de pacientes apresentará resultados ruins após
PCR, podendo evoluir para morte cerebral ou coma persistente. Toda equipe que for-
nece cuidados pós-reanimação deve implementar os procedimentos apropriados para
uma possível doação de órgãos e tecidos, em tempo hábil e de modo eficaz, orientando,
dirimindo dúvidas e respeitando a vontade do paciente e de seus familiares.

Cuidados pós-reanimação | 173


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Cuidados pós-reanimação | 177


Capítulo 11

Analgesia pós-operatória
em pediatria
Daniela Bianchi Garcia Gomes
Débora de Oliveira Cumino
Magda Lourenço Fernandes
Analgesia pós-operatória em pediatria
1- Introdução
A maior conquista na terapia da dor pediátrica é o reconhecimento que a dor sem trata-
mento ou subestimada, é importante causa de morbidade, mesmo após trauma cirúrgico de
pequeno porte.
Na última década, a validação de instrumentos de avaliação da dor específicos para esta
população, os avanços na neurobiologia e na farmacologia, o surgimento de novos fármacos
e as novas possibilidades terapêuticas (como a abordagem multimodal para a prevenção e
o tratamento da dor) têm ajudado o anestesiologista no controle mais eficiente da dor pós-
-operatória em pediatria1, permitindo o alívio da dor sem os efeitos colaterais indesejáveis e
propiciando rápida recuperação e alta hospitalar precoce.
A associação de analgésicos leves, bloqueios loco-regionais e opioides, frequentemente, é
eficaz em prover adequado controle da dor aguda2 .
Atualmente, diversas organizações de saúde, como American Pain Society (APS), Agency
for Health Care Research and Quality (ARQ ) e a Joint Commission on Accreditation of Health
Care Organizations (JCAHO) definiram diretrizes, baseadas em evidências científicas, para
adequada gestão da dor nas diversas faixas etárias pediátricas3.
O tratamento da dor aguda inicia ao estimar a probabilidade de dor pós-operatória e
elaborar estratégia de analgesia baseada na escada analgésica da Organização Mundial da
Saúde (OMS) (Figura 1).

Figura 1. Escada analgésica proposta


pela OMS-1996

É importante considerar alguns princípios e peculiaridades da população pediátrica4


conforme demonstrado na Figura 2.
Para o êxito na gestão da dor nesta população é essencial organização de um serviço
multidisciplinar de dor, incluindo anestesiologistas, outras especialidades médicas e enfer-
magem, um grupo treinado de consultores comprometidos com a avaliação, prevenção e
tratamento da dor nesta população.

180 | Educação Continuada em Anestesiologia


Figura 2. Algoritmo para analgesia pós-operatória em pediatria.
Leão ACC, Lima LC. Analgesia pós-operatória em pediatria. Em: Vane LA e col. Manual de Algoritmos e
Fórmulas Úteis em Anestesiologia. 1° Ed, Rio de Janeiro, Sociedade Brasileira de Anestesiologia, 2007; 29-31.

2- A dor aguda na criança


Durante muitos anos acreditou-se que crianças, especialmente as muito jovens, não
sentiam dor ou não tinham recordação de eventos adversos não havendo, na época, neces-
sidade de desenvolver abordagens para melhorar a analgesia pós-operatória dos mesmos.
Esta crença se baseava no fato delas possuírem fibras nervosas incompletamente mielinizadas6.
Este equivocado pensamento foi bem documentado em estudos publicados na década de
19807 e novos conceitos surgiram afirmando que amielinização incompleta do sistema
nervoso e a podre mielinização das conexões tálamo-corticais, reflete a imaturidade e não
a ausência de função8.
Os riscos do inadequado tratamento da dor atingem a esfera psicológica e física e os
benefícios do seu controle são muitos9. Embora várias técnicas de analgesia tenham sido
desenvolvidas para o uso neste grupo de pacientes10, o tratamento inadequado da dor em
crianças ainda é uma realidade11.

3- Avaliação da dor
A avaliação adequada da dor é pré-requisito essencial ao planejamento do tratamento.
Novos avanços surgiram nos últimos anos, incluindo dezenas de escores de dor, porém esses
testes nem sempre se aplicam a todas as faixas etárias. Além disso, a avaliação da dor em
alguns grupos especiais, como neonatos e crianças que não verbalizam ou que possuem
atraso de desenvolvimento, ainda é um desafio10.

Analgesia pós-operatória em pediatria | 181


Existem três abordagens fundamentais para esta avaliação12 .
a) Autorrelato: É a única medida verdadeiramente direta, considerada como “padrão
ouro” para avaliação da dor. Na criança, porém, por motivo de desenvolvimento, ele
nem sempre é aplicável.
b) Observacional/comportamental: Medida baseada na alteração comportamental asso-
ciado à dor ou a experiência de percepção da dor pelos pais ou acompanhantes.
c) Fisiológica: Medida baseada na excitação fisiológica consequente à dor.
Para que a dor seja medida com a maior precisão possível, os princípios que fundamen-
tam a avaliação nas diferentes idades e nos diferentes contextos devem ser respeitados.
Escalas frequentemente utilizadas para adultos, como escala analógica visual e a escala
numérica verbal podem não ser aplicadas em crianças menores.
Ao contrário, escalas comportamentais têm sido bem validadas para uso em diversas
faixas etárias.
Segundo um guideline publicado em 200812 recomenda-se avaliar a dor pós-operatória
em crianças através das seguintes escalas:
a. comportamental FLACC: em crianças de 1 a 18 anos (hospitalizados)13,14 (Tabela 1)
b. de faces Wong e Backer: em crianças de 3 a 18 anos (Figura 3)15
c. de faces revisada: em crianças de 4 a 14 anos15
d. analógica e numérica: em crianças acima de 8 anos (Figura 3)
e. Pieces of Hurt Tool: em crianças de 3 a 8 anos
f. comportamental PPPM (Parents Postoperative Pain Measure): em crianças de 1 a 12
anos (domiciliados)
Tabela 1: Escala FLACC traduzida (face, pernas atividade, choro e consolabilidade)
Categoria Descrição Pontos
Faces Nenhuma expressão facial ou sorrindo 0
Fazendo caretas ou franzindo a testa ocasionalmente. Introvertido,
1
desinteressado.
Tremendo o queixo, mandíbulas cerradas 2
Pernas Pernas em posição habitual ou relaxadas 0
Pernas inquietas, agitadas ou tensas 1
Chutando ou com pernas esticadas 2
Atividade Quieto, em posição normal, move-se com facilidade 0
Contorcendo-se, movimentando para frente e para trás, tensa. 1
Encurvada, rígida ou com movimentos bruscos 2
Choro Sem choro 0
Gemendo ou choramingando de vez em quando 1
Choro persistente, gritos ou soluços, queixa frequente. 2
Consolabilidade Alegre, relaxada, tranquila 0
Tranquiliza com carinhos, abraços ou conversas 1
Difícil de consolar ou confortar 2

182 | Educação Continuada em Anestesiologia


Figura 3 - Escala de faces Wong-Baker em correspondência com escala analógica visual e a escala numérica verbal

As escalas faciais parecem ser a melhor escolha para se estimar, separadamente, o componen-
te sensorial e os componentes afetivos da dor pós-operatória16. As crianças mais velhas relatam o
seu próprio nível de dor e as mais jovens podem ter as avaliações fornecidas por seus pais17.

4- Analgesia Regional
Em pacientes pediátricos, o bloqueio regional é frequentemente utilizado para prover
analgesia, combinada à anestesia geral.Quando realizado antes da incisão cirúrgica, o
bloqueio regional diminui o consumo de opoides e inalatórios no intra-operatório e os
efeitos adversos destes agentes. Proporciona rápida recuperação das funções fisiológicas
e diminui a resposta ao estresse cirúrgico18,19. Deve sempre ser considerada no tratamento
da dor aguda, exceto se contraindicado.
A Bupivacaína é o anestésico mais estudado e utilizado na população pediátrica, pro-
piciando analgesia prolongada e de boa qualidade para o pós-operatório. A ropivacaína e
levobupivacaína são alternativas interessantes devido à menor cardio e neurotoxicidade,
principalmente em neonatos, pacientes com insuficiência hepática e naqueles que requerem
infusão contínua prolongada ou grande massa de anestésico local.
A ultrassonografia se tornou uma ferramenta de grande valor na prática do anestesiologista,
permitindo visualização direta das estruturas anatômicas, movimentação da agulha e difusão do
anestésico. Agrega maior precisão no posicionamento de cateteres, possibilita administração de
menores doses de anestésico, diminuindo o risco de injeção intraneural e da toxicidade sistêmica18.
Sempre é importante respeitar as limitações fisiológicas desta população, como o ele-
vado débito cardíaco, imaturidade das vias hepáticas de degradação metabólica e os me-
nores níveis plasmáticos de albumina e alfa 1-glicoproteína, responsáveis pelo aumento da
fração livre do anestésico local e pelo maior risco de toxicidade sistêmica 20. É importante
respeitar as normas de segurança, utilizar materiais apropriados (agulhas com mandril 21,22
de tamanho adequado para a idade), respeitar a dose máxima segura para cada anestésico

Analgesia pós-operatória em pediatria | 183


local e recomendada para cada faixa etária, adequar massa e volume do anestésico, obtendo
a concentração mais apropriada para cada tipo de bloqueio.
A lidocaína pode ser usado em doses de 5mg.kg-1 quando isolada ou até 7 mg.kg-1, se associada
com epinefrina. A dose máxima recomendada de bupivacaína é de 2,5mg.kg-1, quando utili-
zado pura, e 3 mg.kg-1 quando combinado à epinefrina.
É fundamental evitar a adição de epinefrina aos anestésicos locais se o bloqueio for
realizado em área de circulação terminal, como os bloqueios peniano e digital.

Bloqueios no neuroeixo
O cone medular em neonatos e lactentes está localizado ao nível de L2-L3, sendo mais
caudal que nos adultos (L1), da mesma forma que as meninges localizadas em S3-S4 nos
neonatos e ao nível de S1 nas crianças acima de 1 ano de idade.
O sacro é mais delgado e estreito e o hiato sacral é facilmente identificado, permitindo
acesso direto ao espaço peridural e subaracnóideo.
Os RN e lactentes têm um pélvis proporcionalmente menor que adultos e o sacro está
localizado mais cefálico. Logo, diferente do adulto, a linha de Truffier cruza a linha média da
coluna vertebral no interespaço L4-L5 ou L5-S1, abaixo da terminação da medula espinal,
tornando-a apropriada para os bloqueios espinais nos pacientes pediátricos22 .
A terminação mais caudal do saco dural propicia a punção inadvertida do espaço
subaracnóideo durante a realização do bloqueio caudal 23 .
Dentre as particularidades fisiológicas no sistema nervoso central (SNC), a menor es-
pessura dos nervos e o processo de mielinização incompleto até em torno dos 18 meses
de vida promovem inespecificidade de resposta aos estímulos nervosos. A menor distância
entre os nodos de Ranvier e a frouxa bainha perineurovascular permitem uma comunicação
livre com os espaços perineurais, maior difusão dos anestésicos locais e uma maior área de
analgesia após injeção única da droga.
O volume do líquido cefalorraquidiano (LCR) relativo ao peso é maior em RN e
lactentes (4ml.kg-1) quando comparado aos adultos (2ml.kg-1), explicando parcialmente as
necessidades de maiores doses de anestésico local e a duração mais curta da anestesia
espinal nesta população.
As alterações hemodinâmicas são raras devido à imaturidade do sistema nervoso simpático
(SNS) e a menor capacitância do sistema venoso em crianças abaixo dos 8 anos de idade.
Todos estes fatores contribuem para a grande eficácia dos bloqueios de neuroeixo na po-
pulação pediátrica, promovendo uma anestesia de boa qualidade com soluções diluídas e
menores concentrações do anestésico local.

Contraindicações
As contraindicações absolutas ao uso do bloqueio de neuroeixo são similares as dos adul-
tos (recusa familiar, infecção no local de punção ou septicemia, hipovolemia e ou instabili-
dade hemodinâmica e alterações da coagulação sanguínea).

184 | Educação Continuada em Anestesiologia


Outras contraindicações relativas incluem deformidades anatômicas da coluna, lesões
medulares, derivação ventrículo-peritoneal e alterações da complacência craniana de-
correntes de processos expansivos (tumores ou hidrocefalia) pelo risco de aumento da
pressão intracraniana 23.

Raquianestesia
A raquianestesia, na população pediátrica, ganhou popularidade a partir das publi-
cações de Melman 24, 1975 e de Abajian 25 , 1984, onde o bloqueio espinal isolado de-
monstrou ausência de apnéia pós-operatória em neonatos ex-prematuros. No entanto,
estudos mais recentes demonstram que a disponibilização de agentes anestésicos de
curta duração tem diminuído a incidência de apneia, possibilitando a realização de
bloqueios espinhais sob sedação leve o que facilita a punção em crianças pouco colabo-
rativas, aumenta o conforto durante o bloqueio e diminui o risco de lesão neurológica
pela movimentação da criança durante a execução do bloqueio26 . Atualmente, com o
incremento dos procedimentos ambulatoriais, ampliou-se a utilização dos bloqueios
espinais na população pediátrica devido às características favoráveis como rápido
início de ação e curta duração, sendo utilizada para procedimentos de pequeno porte
abrangendo uma maior faixa etária e permitindo alta hospitalar precoce22 , em reparos
de mielomeningocele, gastrosquise, onfalocele, artrodese de coluna 27 e raqui total para
correções de cardiopatias congênitas19,28 .

Anestésicos locais e adjuvantes no bloqueio espinal


Soluções de anestésicos hiperbáricos ou isobáricos têm similar qualidade e duração de
aproximadamente 50 minutos nos bloqueios em crianças. Vários agentes e doses são descritos
na literatura, incluindo tetracaína, bupivacaína 29, lidocaína, ropivacaína e levobupivacaína.
Porém, o agente mais estudado e utilizado em crianças para anestesia espinal ainda é a
bupivacaína nas doses de 0,3 a 1 mg.kg-1 a depender do nível desejado de bloqueio.
A associação de anestésicos locais com opioides espinais ou outros adjuvantes tem um
efeito de modulação das vias da dor, melhorando de forma efetiva a qualidade da analgesia
dos bloqueios espinhais.
A morfina em doses de 4 a 10 µg.kg-1, associada ao anestésico local30, aumenta significa-
tivamente a analgesia, obtendo-se 6 a 24 horas de controle da dor no pós-operatório32 . Mas
sua administração por via espinal não é desprovida de efeitos colaterais, apresentando
incidência de até 30% de náuseas, vômitos e prurido31, além de eventos adversos graves como
dessaturação e depressão respiratória tardia. Portanto, recomenda-se vigilância em terapia
intensiva com monitorização adequada por no mínimo 12 horas após a administração da
morfina espinal32 .
Adição de Fentanil ao anestésico local, em doses de 0,25 a 1µg.kg-1, melhora significati-
vamente a qualidade do bloqueio espinal, podendo proporcionar aumento na duração da
analgesia em até 80 minutos, quando comparado aos 50 minutos da bupivacaína isolada33.

Analgesia pós-operatória em pediatria | 185


Novos adjuvantes, como a clonidina (1 a 2 µg.kg-1) associada à bupivacaína, prolonga a
duração da analgesia espinal para o dobro da duração habitual em RN e lactentes34, podendo
ocorrer diminuição transitória na pressão arterial e sedação prolongada no pós-operatório
com doses de 2 µg.kg-1 de peso.

Anestesia Peridural
Caudal
A anestesia peridural caudal ainda é a técnica mais utilizada para prover analgesia em
crianças abaixo dos 4 anos de idade35,36 sendo considerada uma técnica de fácil execução.
A extensão do bloqueio depende do volume administrado: para procedimentos em
membros inferiores e região inguinal, utiliza-se 0,5 a 0,7 ml.kg-1 de volume anestésico nas
mesmas doses e concentrações preconizadas para os bloqueios peridurais lombares; para
procedimentos em região abdominal baixa, 1 ml.kg-1; para abdome superior, 1 a 1,5 ml.kg-1
e para procedimentos torácicos de 1,5 a 2 ml.kg-1. Deve-se considerar a dose tóxica do anes-
tésico, adequando-se o volume à concentração, que varia de 0,125% a 0,25% de bupivacaína
e levobupivacaína ou 0,2% a 0,35% de ropivacaína.
É importante evitar o uso de concentrações elevadas de anestésicos locais, pois, o bloqueio
motor causa grande desconforto e angustia nas crianças1.
O bloqueio caudal em dose única oferece uma limitada duração da analgesia, em torno
de 90-120 minutos com bupivacaína. Inúmeros estudos com adjuvantes no neuroeixo
(epinefrina, opioides, alfa-2-agonistas, s-cetamina, tramadol, neostigmina demonstram a
possibilidade de prolongar a duração da mesma37,38.
Lombar e Torácica
Bloqueios em níveis mais altos exigem experiência e cautela do anestesiologista devido
ao risco de punção acidental da dura-máter e lesão medular, o local preferível para executar
a punção é L3-L4 ou L4-L5.
A técnica é similar à realizada no adulto, porém, na criança, o espaço epidural é mais
superficial e possui menor capacidade, sendo identificado pelo teste da perda de resistência
ao ar ou solução salina. Alguns estudos demonstram que o uso de solução salina diminui o
risco de embolia aérea e promove melhor analgesia, pois o ar pode formar bolhas no espaço
epidural impedindo a dispersão homogênea do anestésico local39.
A ultrassonografia pode auxiliar muito na realização da peridural em crianças,
as ondas ultrassonográficas passam com maior facilidade pela coluna lombar menos
ossificada, gerando imagens muito claras das estruturas de interesse no bloqueio. Pos-
sibilita determinar a profundidade do ligamento amarelo e identificar as referências
anatômicas, sendo particularmente vantajoso em crianças obesas 40. A dura-máter, em
crianças menores que 6 meses, é com frequência visualizada, permitindo observar a
progressão da agulha de Tuohy em tempo real41. Porem, ele não exclui a necessidade
de realizar teste de perda da resistência para confirmar o posicionamento correto da
agulha no espaço peridural.

186 | Educação Continuada em Anestesiologia


Anestesia peridural contínua
São raros os relatos de infecção com uso de cateteres em crianças, recomenda-se
degermação, assepsia rigorosa durante a realização do bloqueio e passagem do cateter,
curativo de barreira oclusivo e inspeção diária do local de inserção com objetivo de
reduzir o risco. Porem, como a manutenção do cateter de inserção caudal apresenta
risco de contaminação fecal, muitos anestesiologistas pediátricos preferem punções
lombares ou torácicas 42 .
A possibilidade de tunelização do cateter para segmentos mais altos é uma estratégia uti-
lizada para minimizar contaminação em crianças que necessitam de analgesia por períodos
mais prolongados42.
A inserção de cateter peridural torácico apresenta risco real de lesão medular, sendo
fundamental experiência do anestesiologista com a técnica e extremo cuidado durante a
punção e posicionamento do cateter43.
O uso de ultrassonografia reduz o risco de contato ósseo e permite a visualização da
dispersão do anestésico a partir da ponta do cateter epidural44.
Um estudo recente, multicêntrico, demonstrou incidência de 4,9% de complica-
ções com uso de cateter nos bloqueios de neuroeixo em crianças, relacionando-se a
dificuldade de manutenção, ao mau funcionamento do cateter, aos problemas técni-
cos durante a inserção, porém não cursa com outras complicações como infecções ou
lesões neurológicas 45 .

Anestesia Peridural Controlada pelo Paciente (PCA)


Os dispositivos de analgesia controlada pelo paciente são populares e muito utilizados
em adultos, porém, apresentam limitações na população pediátrica. Crianças em idade es-
colar e adolescentes compreendem como utilizar os dispositivos de PCA e se beneficiam da
autonomia sobre o controle da dor pós-operatória por meio da auto-administração de bolus
de anestésico local46.
O PCA peridural tem como indicação analgesia pós-operatória após extensas cirur-
gias abdominais, torácicas, de membros inferiores e da coluna vertebral, mantendo-se
infusão contínua de anestésico local associado à opioide, além da programação de bolus
sob demanda1.
Estudo avaliando analgesia pós-operatória em cirurgia ortopédica com 48 crianças, com-
parou o uso de ropivacaína 0,2% na peridural contínua e no PCA peridural, demonstrando
alívio da dor nas primeiras 48 horas do pós-operatório com ambas as técnicas. No entanto,
o PCA peridural, necessitou de infusões 50% menores de anestésico em comparação com a
peridural contínua para o adequado controle da dor47. Esta é uma vantagem potencial, pois
diminui o risco de toxicidade e permite o uso de menores volumes e concentrações.
Ainda existe a possibilidade do uso de PCA peridural controlado pelos pais ou pela
enfermagem em crianças que ainda não compreendem a técnica ou que apresentam limi-
tações cognitivas 48.

Analgesia pós-operatória em pediatria | 187


Anestésicos locais e adjuvantes no bloqueio peridural
Os novos agentes, levobupivacaína e ropivacaína, como alternativas à bupivacaína, têm
apresentado ampla margem de segurança comparado com a bupivacaína racêmica em
relação à toxicidade sistêmica. A levobupivacaína apresenta equipotência à bupivacaína, en-
quanto a ropivacaína apresenta apenas 60% da potência da bupivacaína. Ambos agentes são
alternativas interessantes na população pediátrica, principalmente em neonatos e lactentes,
provendo bloqueios eficientes e seguros49.
A indução da anestesia geral previamente à realização do bloqueio regional impossibilita
as crianças de descreverem os efeitos colaterais que antecedem os sintomas cardíacos ou
neurológicos, nos casos de intoxicação sistêmica49.
A utilização de dose teste com epinefrina 0,5 µg.kg-1 adicionada ao anestésico local
é defendida por algumas autoridades para a identificação precoce de injeção intravas-
cular inadvertida de anestésico local. No entanto, é importante compreender que o
uso de dose teste tem baixa sensibilidade e especificidade para injeção intravascular
inadvertida e toxicidade sistêmica na população pediátrica, considerando que a prática
padrão em crianças é realizar os bloqueios de neuroeixo sob anestesia geral.Em crianças,
as alterações hemodinâmicas variam conforme o agente anestésico utilizado (Halotano,
sevoflurano, isoflurano ou propofol) e administração prévia de atropina. O uso de atropina
0,01 mg/kg parece potencializar o aparecimento e a manutenção de taquicardia após a
injeção de epinefrina no neuroeixo, principalmente na vigência de anestesia com halotano
ou isoflurano50. A criança pode apresentar um aumento da freqüência cardíaca em 10 ba-
timentos por minuto (bpm), da pressão arterial sistólica em 15 mmHg e uma elevação da
amplitude da onda T ao eletrocardiograma 51.
A melhor rotina para evitar intoxicação sistêmica ainda são os cuidados durante a execu-
ção dos bloqueios. Utilizar dose e volume apropriados à população pediátrica, anestésicos
locais em baixas concentrações (respeitando as doses tóxicas de cada um deles), agentes
com menor potencial de cardio ou neurotoxicidade e realizar injeção lenta com repetidas
aspirações durante a execução para avaliar a presença de sangue52,53.
Em infusão contínua, para controle da dor pós-operatória, em neonatos utiliza-se infusão
de 0,2 a 0,25 mg.kg-1.h-1, em concentrações de 0,125% de bupivacaína ou levobupivacaína e
0,1% de ropivacaína; em lactentes acima dos 6 meses de idade:0,4 a 0,5mg.kg-1.h-1 a 0,25%
de bupivacaína ou levobupivacaína e 0,2% de ropivacaína. Diluir solução de bupivacaína
(0,1%), combinada com fentanil 1-2 μg.mL-1 é comumente usado para o controle efetivo da dor1.
Diversos agentes adjuvantes já foram associados aos bloqueios de neuroeixo com o ob-
jetivo de prolongar a analgesia(adrenalina, morfina, fentanil e sulfentanil). Atualmente,
nota-se um aumento na utilização de adjuvantes não opioides nos bloqueios peridurais
(clonidina -1 a 2 μg.kg-1 e cetamina - 0,25 a 0,5 mg.kg-1)54 e diminuição da utilização de
agentes opioides38.
A morfina associada aos bloqueios peridurais também é bastante utilizada na população
pediátrica, nas doses de 30 a 50 μg.kg-1 via peridural55,32 .

188 | Educação Continuada em Anestesiologia


Bloqueios Periféricos
Os bloqueios de nervos periféricos têm recuperado popularidade na pratica diária de
muitos anestesiologistas56, principalmente com o auxilio da ultrassonografia, apresentando
taxas de sucesso e complicações semelhantes aos adultos57,58.
Em 1996, a Sociedade de Língua Francesa de Anestesiologistas Pediátricos (ADARPEF)59,
publicou estudo prospectivo multicêntrico envolvendo 1 ano de estudo epidemiológico
sobre a prática da anestesia regional pediátrica. Foram obtidos dados de 85.412 procedi-
mentos e destes 24.409 foram anestesias combinadas a bloqueios regionais. Os bloqueios
de nervos periféricos representaram apenas 38% do total de bloqueios regionais. A maioria
dos bloqueios foi realizada sob anestesia geral (89%), confirmando o fato de que as técnicas
regionais são usadas como técnicas de analgesia.
As complicações foram raras (25 incidentes envolvendo 24 pacientes) e não resultaram
em sequelas. A taxa de complicação global da anestesia regional foi de 0,9 / 1000 e ocorreram
apenas nos bloqueios de neuroeixo, a incidência extremamente baixa (zero neste estudo) de
complicações com bloqueios de nervos periféricos incentivou os anestesiologistas pediátricos
a utilizarem com mais frequência esta técnica.
Quatorze anos depois do primeiro estudo, a mesma entidade, ADARPEF, projetou mais
um 1 ano de estudo multicêntrico e prospectivo atualizando os dados epidemiológicos e mor-
bidade da anestesia regional em crianças35. Incluindo 104.612 anestesias gerais puras, 29.870
anestesias inalatórias associadas a bloqueios regionais e 1.262 bloqueios regionais puros. Os
bloqueios de neuroeixo representaram 34% de todas as anestesias regionais e 66% foram
bloqueios periféricos, demonstrando um aumento significativo da utilização de bloqueios
periféricos em anestesia pediátrica. O estudo revelou uma taxa global de complicações de
0,12%, 6 vezes maior em bloqueios centrais comparados aos periféricos, mais uma vez favorecen-
do a utilização de bloqueios periféricos devido ao perfil de segurança e qualidade na analgesia.

5- Analgesia Sistêmica
Várias são as medicações que podem ser utilizadas por via endovenosa para promover o
alívio da dor na população pediátrica. No entanto, existe uma carência de estudos de muitas
dessas drogas nesta faixa etária o que faz com que esta população seja considerada, ainda,
uma órfã terapêutica.

Analgésicos
Os analgésicos não opioides são indicados para o tratamento da dor leve (como agente
isolado) a moderada (associdados a AINE ou opioide). Podem, ser usados de forma preemp-
tiva, diminuindo a intensidade e a duração da dor no pós-operatório ao bloquear os efeitos
nociceptivos antes que eles ocorram, ou como coadjuvante no alívio da dor pós-operatória.
Constituem medicações que apresentam substâncias analgésicas e antitérmicas, porem
sem ação anti-inflamatória. Apresentam uma relação dose-resposta limitada, acima da qual
haverá um aumento dos efeitos colaterais, sem aumento da analgesia.

Analgesia pós-operatória em pediatria | 189


Paracetamol - Acetaminofen
O paracetamol é a medicação de escolha para o tratamento da dor e da febre na popu-
lação pediátrica e é considerado o único medicamento seguro para uso em neonatos 60. No
entanto, são poucos os dados farmacológicos desta droga nesta faixa etária e a efetividade
analgésica nos neonatos ainda não está clara. Sua forma endovenosa já está disponível em
alguns países e já foi aprovado para uso em crianças maiores de 1 ano de idade.
Como os neonatos apresentam uma menor função do citocromo P450 e uma maior
síntese de glutationa, o índice terapêutico do paracetamol acaba sendo maior. Além dis-
so, o volume de distribuição (VD) é relativamente pequeno e seu clearance reduzido nos
neonatos, devendo-se diminuir a dose nesta população.
Seu uso está contraindicado nos recém-nascidos portadores de deficiência de G6PD,
que apresentam sensibilização a droga ou doença hepática.
Fatores como jejum prolongado, vômitos incoercíveis, hipovolemia, desidratação, sepsis
e doença hepática pré-existentes depletam os estoques de glutationa e/ou precursores de
sulfato e glicuronida, substancias criticas ao metabolismo e a eliminação de paracetamol
e de seus metabolitos, podendo causar necrose hepática60. Crianças com problemas renais,
cardíacos e hepáticos ou com distúrbios de coagulação são de maior risco para reações
adversas ao paracetamol.
Deve-se evitar o uso concomitante de analgésicos com drogas irritantes da mucosa e anticoa-
gulantes. O uso desses medicamentos é formalmente contraindicado se houver antecedentes de
úlcera péptica, transtornos da coagulação ou reação de caráter anafilático à dose anterior desses
medicamentos. Em função do risco de síndrome de Reye, a aspirina deve ser contraindicada para
crianças que apresentem infecções de etiologia viral, especialmente, influenza e varicela61.
No caso de se utilizar o acetaminofeno, é fundamental verificar se a criança não
está recebendo drogas que atuem sobre o citocromo P450 e que possam contribuir para o
aumento da hepatotoxicidade (anticonvulsivantes e medicamentos contra a tuberculose).
Quando utilizado em doses terapêuticas, raramente causa efeitos adversos. Apresenta
um início de ação de 30 minutos.
Via Oral Via Retal Via Endovenosa
Idade (meses) 0-6 >6 0-6 6 RN prematuro RN termo
Dose ataque
20-30 20-30 30 40 10-15 10
(mg/kg)
Dose manutenção
15-20 15 20 20 10-15 10
(mg/kg)
Intervalo
8 4 8 6 8 8
(horas)
Duração máxima
48* 48* 48* 48* 48* 48*
de uso (horas)
* Dose por mais que 48 h deve ser avaliado pela equipe médica pelo risco de hepatotoxicidade
* A dose máxima diária não deve exceder 90-100 mg/kg para crianças, 70-80 mg/kg para lactentes e
60 mg/kg para RN termos e pré termos> 32 semanas idade pós-conceptual; 40 mg/kg para neonatos
prematuros < 32 semanas pós-conceptual.

190 | Educação Continuada em Anestesiologia


Dipirona
Apesar de não existir estudos farmacológicos e clínicos em crianças menores de 6 anos
de idade, seu grande uso em nosso país mostra ser uma droga analgésica e antitermica
segura e efetiva, inclusive no período neonatal. Alguns autores consideram que este
fármaco é mais seguro do que a aspirina, pois raramente está associado ao risco de agra-
nulocitose (<1 por milhão de usuários) e, além disso, não foi comprovada sua associação
com aplasia medular61,62 .

Anti-inflamatórios não-esteroidais (AINE)


Os anti-inflamatórios não hormonais correspondem a um grupo heterogêneo formado
por diferentes substâncias químicas com função analgésica, antitérmica e anti-inflamatória.
Ocupam lugar de destaque no tratamento da dor pós-operatória sejam administrados
de forma isolada na dor leve ou como adjuvantes na dor moderada. Apresentam, ainda,
efeito antipirético.
Têm sido utilizados, cada vez mais, associados ao paracetamol e aos opiáceos ao produzir
um efeito analgésico sinérgico com o qual se consegue um melhor controle da dor e uma
redução dos efeitos colaterais e no consumo de opioides60.
Com exceção do ibuprofeno, a maioria dos AINE são pouco estudados na faixa etária
pediátrica e apresentam indicações muito restritas. Apesar disso, no Brasil, a aspirina e
o diclofenaco são administrados as crianças sem que os médicos e leigos atentem para a
ausência de dados sobre sua segurança e efetividade nesta faixa etária.
A ação dos AINH deve-se à inibição das enzimas ciclooxigenases (COX)60. As prosta-
glandinas estão associadas à inflamação e febre, mas também desempenham importantes
funções fisiológicas, e os fármacos que inibem sua produção podem causar diversos danos
ao organismo. Por serem importantes para a maturação renal nas crianças e responsáveis
pela regulação da natriurese, estimulação da secreção de renina, aumento do clearance de
água livre, e pela vasodilatação da arteríola aferente, estas drogas estão contraindicadas em
crianças menores de 1 ano de idade2 .
Os AINE podem potencializar a toxicidade de outras drogas, como os aminoglicosídeos
e a ciclosporina. E pode reduzir o fluxo sanguíneo renal nos RNPT. Apresentam vários
efeitos adversos decorrentes da inibição da ciclooxigenase, que são menos comuns nas
CR que nos adultos, como alterações na função plaquetária61, intolerância gástrica e exa-
cerbação de quadros de asma, sendo contra-indicados em crianças com potencial risco de
sangramento, que apresentam distúrbios de coagulação 62,63, asmáticas ou que apresentam
pólipos nasais. Além disso, muitos cirurgiões ortopedistas também relatam sobre a influência
de todos os AINH no crescimento ósseo, promovendo um retardo da fusão óssea 64 e
recomendam que este tipo de medicamento não seja administrado em seus pacientes no
período pós-operatório.
As drogas mais utilizadas em pediatria, no perioperatório, são o ibuprofeno e
o diclofenaco.

Analgesia pós-operatória em pediatria | 191


Ibuprofeno
É uma das primeiras drogas desta classe a ser utilizada na população pediátrica no auxilio
do fechamento do canal arterial em neonatos. Na pediatria, sua pratica ainda deve ser bem
estabelecida, sendo seu uso não recomendado para menores de 3 meses como analgésico.

Cetorolaco
Foi o primeiro AINE injetável utilizado nos EUA e um dos poucos AINE aprovados pelo
FDA para o controle da dor em crianças de 2 a 16 anos. Existe grande interesse e trabalhos
publicados em crianças menores. Pode ser considerado uma alternativa aos opioides para o
tratamento da dor aguda moderada a severa.
Seu efeito analgésico tem eficácia comparada a alguns opioides comumente utilizados
nesta população, com menor incidência de efeitos colaterais. Apresenta efeito antipirético,
anti-inflamatório, ação periférica semelhante a dos AINE e ação central.
Uma analgesia adequada no pós-operatório é obtido com a administração precoce do
cetorolaco, imediatamente após a indução da anestesia, já que o início do alívio da dor
ocorre 20-30 minutos após a mesma.
Seu uso para cirurgias de adenoamigdalectomias tem sido muito controverso, sendo
abandonado nos EUA pela grande quantidade de reoperações. Mas, estudos recentes não
demonstram alterações na incidência de sangramentos nesta população, passando a ser am-
plamente utilizado após a hemostasia cirúrgica efetiva 2,65-67. Tem sido relatado quadros de
disfunção renal em pacientes hipovolêmicos, que apresentam alteração da perfusão renal,
durante o período perioperatório, com normalização do quadro após terapia conservadora.

Doses de dipirona e anti-inflamatórios recomendadas para crianças


Dose Intervalo Pico
Utilização Via Dose máxima
(mg/kg) (h) (h)

Qualquer 500 mg
Dipirona 12,5 – 30 VO,IM,EV 4-6 1-2
idade nos neonatos

40 mg/kg/dia
Ibuprofeno >6meses 4-10 VO 4/4,6/6, 8/8 1-2
ou 2 g/dia

6/6, 8/8,
Cetorolaco* >2 anos 0,25-1,0 VO/EV 15-30 mg/kg/dia 1-2
12/12, 24/24

VO
>1 ano 1
6/6,8/8,
Cetoprofeno >15 anos
EV lento em 12/12
3-5
SF0,9% 100ml

Tenoxican >12 anos 0,4 EV 12/12


* Período máximo: 2 dias

192 | Educação Continuada em Anestesiologia


Cetoprofeno
Tem sido utilizado para o tratamento da febre, da dor no peri e pos-operatório e da dor
de causa inflamatória, por várias vias. Estudos mostram que sua administração por via oral
é tão efetiva quanto o acetaminofen e o ibuprofeno para o controle da febre, permitindo um
rápido retorno as atividades com melhora na qualidade do sono e do apetite64. Associado
a sua ação periférica, o cetoprofeno, por atravessar a barreira hemato-encefálica, também
apresenta ação analgésica central.
Sua eficácia analgésica é similar quando se compara as vias endovenosa, intramuscular,
ou retal, mas a via oral apresenta um resultado inferior quando comparado a via endovenosa
para o tratamento da dor cirúrgica.
Geralmente é uma droga bem tolerada pela criança e muitos dos eventos adversos
relatados são leves e transitórios e, similares aos observados com outros anti-inflamatorios
não hormonais.

Analgésicos opioides
Os opioides são considerados as drogas mais importantes e mais utilizadas na população
pediátrica para o tratamento da dor moderada a severa e da dor em RN criticamente enfermos.
São drogas que agem em receptores opioides espalhados pelo SNC, cuja ativação inibe a
transmissão do estimulo nociceptivo, inibem a aferência da dor na medula espinal e ativam
as vias descendentes inibitórias.
Seus efeitos nos receptores μ2 são responsáveis pelos efeitos colaterais (depressão
respiratória, náuseas e vômitos).
Como pequenas variações das doses podem resultar em grandes efeitos colaterais eles
acabam sendo utilizados em subdoses analgésicas ou em intervalos muito prolongados,
gerando um subtratamento da dor nesta população. Como o citocromo P450 encontra-se
imaturo ao nascimento e só atinge os níveis de atividade do adulto por volta do primeiro ou
segundo mês de vida, pode ocorrer prolongamento do clearance e eliminação tardia dos opioides.
Este sistema enzimático pode, ainda, sofrer influencia de outras drogas (fenobarbital).
Crianças com disfunção hepática ou criticamente enfermas podem evoluir com alteração
do metabolismo e da eliminação dos opioides, resultando em acúmulo dos mesmos, prolon-
gamento do tempo de duração e toxicidade sistêmica. As drogas inativas, como a codeína,
que se tornam ativas ao serem metabolizadas no fígado podem ser inefetivas nas crianças
com doença hepática grave.

Morfina
É o opioide mais comumente usado em pediatria no controle da dor PO de moderada a
forte intensidade. Pode ser usado por várias vias de administração e, nas doses preconiza-
das, é segura e efetiva em crianças de qualquer faixa etária.
Os baixos níveis de proteínas plasmáticas nesta população resulta em maior quantidade
da droga livre no plasma e, em maior risco de depressão respiratória. A meia-vida de elimi-

Analgesia pós-operatória em pediatria | 193


nação nos adultos e em crianças maiores é de 3-4 horas. Nos neonatos ela é duas vezes
maior, sendo ainda maior nos RN prematuros (10 a 20 h) pela imaturidade hepática da
idade. O clearance da droga também está diminuído nos recém-nascidos (RN) quando
comparado a crianças e aos adultos. Estes dados sugerem que a utilização de alguns opio-
ides em RN prematuros (menores de 37 semanas de idade gestacional) e com menos de
52-60 semanas de idade pós-conceptual deva ser realizada sob o máximo de cautela e sob
monitorização adequada 2 .
Após os 2 meses de idade, os valores em relação ao clearance e ao volume de distribuição
se assemelham aos dos adultos o que a torna uma boa escolha para técnicas de infusão con-
tinua, com menor risco de acúmulo.
Administração intermitente – 0,05 a 0,20 mg/kg/dose 4/4 h EV
Dor moderada Dor intensa

RNT (μg/kg/h) 5-10 10-20

RNPT (μg/kg/h) 2-5 5-10

>3 meses (μg/kg/h) 20-40 40

Ventilação espontânea (μg/


3-8 3-8
kg/h)

Fosfato de codeína
É um opioide menos potente que a morfina e usado para o tratamento da dor leve a mo-
derada de curta duração, principalmente no momento de conversão da droga endovenosa
para via oral. Apresenta uma boa disponibilidade por via oral (60-70%) e é convertida em
morfina no fígado. Como seu efeito depende do metabolismo hepático através da enzima
CYP2D6 e como essas enzimas variam entre os grupos étnicos, seu efeito analgésico é
imprevisível e sua eficácia variável.
Dose oral: 1 mg/kg/dose 4/4 h (dose limite 60 mg/dose)

Fentanil
É um opioide sintético, 60-100 vezes mais potente que a morfina. Sua farmacocinética
é variável na população pediátrica, sendo os neonatos e os RN prematuros particularmente
sensíveis aos seus efeitos.
Administração intermitente– 1-4 μg/kg/dose a cada 2 ou 4 h EV
Dor moderada Dor intensa

RN Termo (μg/kg/h) 0,5-2 2-3

RN Prematuro (μg/kg/h) 0,5-1 1-2

194 | Educação Continuada em Anestesiologia


Tramadol
É um opioide derivado sintético da codeína, amplamente usado nas crianças de todas
as faixas etárias para o tratamento da dor leve a moderada. Sua potencia analgésica é
intermediária entre a morfina (10-15 vezes menos potente que a morfina) e os AINH. Sua
administração deve ser feita de forma lenta (em 15 a 30 minutos) para evitar a ocorrência
de mal estar, náuseas e vômitos e tonturas68,69. A utilização de ondansetrona para tratar as
náuseas e os vômitos resulta em inibição de sua analgesia provavelmente pela redução de sua
ligação com os receptores 5-HT3 ao nível da espinal.

Via endovenosa Via oral


Dose (mg/Kg) 0,7-2 1-2
Intervalo (h) 8 8
Infusão contínua (mg/kg/h) 1-0,25

Nalbufina
É um analgésico opioide sintético agonista (K1-K2) - antagonista parcial (μ), sendo mui-
to utilizada para o tratamento da dor moderada a severa em pacientes maiores de 18 anos,
não estando ainda estabelecido sua segurança para crianças abaixo desta faixa etária.

Lidocaina
Pode auxiliar como adjuvante no tratamento da dor aguda, sendo suplementado seu uso na
anestesia regional e local. Não há estudos comparáveis na população pediátrica para sugerir
que infusões de lidocaína IV sejam benéficas em crianças com dor aguda perioperatoria.

Fármacos analgésicos e sedativos


Cetamina
É um potente analgésico em doses subanestésicas e regularmente usado em procedimen-
tos dolorosos em crianças na sala de emergência (redução de fraturas, curativos de quei-
maduras). Seu uso está aumentando novamente nesta população devido ao maior conhe-
cimento de seu mecanismo de ação, sendo usado não só pelas suas propriedades sedativas,
mas durante a anestesia geral para prover analgesia preemptiva, como analgésico ou como
adjuvante nos bloqueios centrais e periféricos70.

Via endovenosa Via intramuscular/ via oral


Dose (mg/Kg) 0,03-2 3-5
Início de ação (min) 1-2 5-10
Infusão contínua (μg/kg/h) 25-200

Analgesia pós-operatória em pediatria | 195


Alfa 2 agonistas adrenérgicos:
Clonidina
A clonidina é capaz de diminuir a atividade adrenérgica e potencializar a ação de
anestésicos inalatórios, intravenosos e locais. Pode ser administrada através das vias oral,
intravenosa, epidural, subaracnoidea e em bloqueio de nervos periféricos. Atenua a ativi-
dade ventilatória na mesma extensão que o sono fisiológico, mas não parece potencializar
os efeitos depressores respiratórios dos opioides71.
Administrada através das vias oral (em medicação pré-anestésica: 2 a 5 mg.kg-1 )
intravenosa (injeção isolada 2 a 6 mg.kg-1 ou contínua 2 mg.kg-1.h-1)

Dexmedetomidina
A dexmedetomidina está sendo usada off-label como um agente adjuvante para sedação e
analgesia em pacientes pediátricos na unidade de cuidados intensivos e para sedação duran-
te procedimentos não invasivos em radiologia.
Também apresenta papel potencial como parte dos cuidados para evitar o delírio emergência
e tremores pós-anestésico.
Pode ser de grande utilidade no pós-operatório imediato, facilitando a extubação precoce.
Porém, existem alguns relatos contraditórios na literatura no que diz respeito aos seus efei-
tos na função ventilatória, sugerindo um grau leve de depressão respiratória, diminuição da
ventilação minuto e da resposta ao CO272 .
É uma droga particularmente útil em crianças acima de 18 meses de vida por promover
analgesia e sedação leve. No pós operatório a dose para analgesia e sedação é de 0,2-0,6
mg.kg-1.h-1. Não há necessidade de diminuir a infusão antes da extubação.

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