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Volume IV
SBA
Sociedade Brasileira de Anestesiologia
Rio de Janeiro
2014
Educação Continuada em Anestesiologia
Copyright© 2014, Sociedade Brasileira de Anestesiologia
Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer sistema, sem prévio consentimento da SBA.
Diretoria
Sylvio Valença de Lemos Neto
Oscar César Pires
Ricardo Almeida de Azevedo
Sérgio Luiz do Logar Mattos
Antônio Fernando Carneiro
Erick Freitas Curi
Getúlio Rodrigues de Oliveira Filho
Comissão de Educação Continuada
Marcos Antonio Costa de Albuquerque - Presidente e Coordenador do livro
Cláudia Regina Fernandes
Carlos Othon Bastos
Capa e diagramação
Marcelo de Azevedo Marinho
Supervisão
Maria de Las Mercedes Gregoria Martin de Azevedo
Revisão Bibliográfica
Teresa Maria Maia Libório
Auxiliar Técnico
Marcelo de Carvalho Sperle
Ficha catalográfica
S678e Educação Continuada em Anestesiologia / Editores: Sylvio Valença de Lemos Neto, Marcos
Antonio Costa de Albuquerque, Cláudia Regina Fernandes, Carlos Othon Bastos e Getúlio
Rodrigues de Oliveira Filho
Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Anestesiologia/SBA, 2014.
224 p.; 25cm.; ilust.
ISBN 978-85-98632-25-4
Vários colaboradores.
AUTORES
Ana Carla Giosa Fujita
•• TSA-SBA, Membro do Comitê de Anestesia em Pediatria – SBA;
•• Instrutora Corresponsável pelo CET do HC-FMUSP;
•• Médica anestesiologista do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP;
Médica anestesiologista do Hospital Infantil Sabará.
Ana Cristina Pinho Mendes Pereira
•• TSA-SBA, Presidente do Comitê de Medicina Perioperatória – SBA;
•• Responsável pelo CET S.Anest.Inst.Nac.de Câncer - INCA;
•• Coordenadora clínica do Serviço de Anestesiologia, Dor e Medicina Perioperatória do HC1/INCA;
•• Presidente da SAERJ.
Ana Karla Arraes von Sohsten
•• TSA-SBA, Presidente do Comitê de Hipertermia Maligna – SBA;
•• Instrutora Corresponsável pelo CET HR-HGV-HUOC de Pernambuco;
•• Coordenadora do Serviço de Anestesiologia do Real Hospital Português de Pernambuco;
•• Mestre em medicina pela Universidade de Pernambuco.
Ângela Maria da Silva
•• Professora doutora associada da disciplina de infectologia do Departamento de Medicina da Universidade Federal
de Sergipe.
Antônia Maria de Carvalho
•• Coordenadora do Serviço de Anestesiologia da Maternidade Escola Assis Chateaubriand, da Universidade Federal
do Ceará.
Carlos Darcy Alves Bersot
•• TSA-SBA, Membro do Comitê de Hipertermia Maligna – SBA;
•• Responsável pelo CET Hospital Federal da Lagoa, Rio de Janeiro;
•• Membro Comissão Científica da SAERJ.
Cibelle Magalhães Pedrosa Rocha
•• TSA-SBA, Presidente do Comitê de Anestesia Loco-Regional – SBA;
•• Instrutora Corresponsável pelo CET do Instituto Dr. José Frota;
•• Diretora Científica da Sociedade de Anestesiologia do Estado do Ceará (SAEC).
Cláudia Regina Fernandes
•• TSA-SBA, Secretária da Comissão de Educação Continuada – SBA;
•• Responsável pelo CET Hosp.U.Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará;
•• Professora adjunta da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.
Dalmo Correia Filho
•• Professor doutor da Universidade de Uberlândia.
Daniel Capucci Fabri
•• Pós-graduando da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva da Escola Paulista de Medicina -
UNIFESP .
Daniela Bianchi Garcia
•• TSA-SBA, Presidente do Comitê de Anestesia em Pediatria – SBA;
•• Médica anestesiologista do Hospital Pequeno Príncipe;
•• Preceptora dos residentes em anestesia pediátrica do Hospital Pequeno Príncipe.
Danielle Maia Holanda Dumaresq
•• TSA-SBA;
•• Responsável pelo CET do Instituto Dr. José Frota;
•• Professora do curso de medicina Unichristus.
Débora Maia da Costa
•• ME3 no CET Hosp.U.Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará.
Eduardo Brigatto Sperling
•• ATV-SBA.
Eduardo Manso de Carvalho Andrade
•• TSA-SBA, Membro do Comitê de Medicina Perioperatória – SBA;
•• Responsável pelo CET do Hospital São Francisco e do Instituto Sta. Lydia.
Enis Donizetti Silva
•• TSA-SBA, Membro do Comitê de Via Aérea Difícil – SBA;
•• Instrutor Corresponsável pelo CET São Paulo-Serv.Méd.de Anest.S/C Ltda;
•• Presidente da Sociedade De Anestesia do Estado de São Paulo;
•• Membro do Comitê Gestor do CC HSL.
Florentino Fernandes Mendes
•• TSA-SBA, Membro do Comitê de Medicina Perioperatória – SBA;
•• Responsável pelo CET Univ.Fed.de Ciências da Saúde P.Alegre;
•• Professor adjunto doutor de anestesiologia do Departamento de Clínica Cirúrgica da UFCSPA.
Capítulo 02
Anestesia regional através de cateteres de nervo periférico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
Cibelle Magalhães Pedrosa Rocha, Danielle Maia Holanda Dumaresq, Melina Cristino de Menezes Frota, Pedro
Paulo Kimachi, Rafael Mercante Linhares, Igor Soares Furtado Melo
Capítulo 03
Bloqueios periféricos no trauma e na emergência. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
Danielle Maia Holanda Dumaresq, Melina Cristino de Menezes Frota, Cibelle Magalhães Pedrosa Rocha, Pedro
Paulo Kimachi, Rafael Mercante Linhares
Capítulo 04
Gerenciamento do centro cirúrgico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
Luís Antônio dos Santos Diego, João Henrique da Silva, Júlio Cezar Mendes Brandão
Capítulo 05
Miopatias e anestesia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
Ana Karla Arraes von Sohsten, Heber de Moraes Penna, Carlos Darcy Alves Bersot
Capítulo 06
Pré-condicionamento isquêmico remoto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
Débora Maia da Costa, Francisco Elano Carvalho Pereira, Josenília Maria Alves Gomes, Cláudia Regina Fernandes
Capítulo 07
Cardiopatia chagásica e anestesia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
Ivani Rodrigues Glass, Ângela Maria da Silva, Dalmo Correia Filho
Capítulo 08
Uso da ultrassonografia no manejo da via aérea . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113
Danielle Maia Holanda Dumaresq, Melina Cristino de Menezes Frota, Cibelle Magalhães Pedrosa Rocha, Luiz
Augusto Carneiro Neto
Capítulo 09
Desflurano. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
Maria Ângela Tardelli, Daniel Capucci Fabri
Capítulo 10
Bem-estar ocupacional em anestesiologistas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133
Gastão Fernandes Duval Neto
Capítulo 11
Experiência e desafios na implantação de um programa de analgesia de parto em uma
maternidade pública no nordeste do Brasil. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147
Cláudia Regina Fernandes, Antônia Maria de Carvalho, Geraldo Gonçalves da Silveira
Capítulo 12
Disritmias cardíacas e anestesia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157
Marisa Pizzichini, Luiz Fernando dos Reis Falcão, João Hermínio Pessoa dos Santos
Capítulo 13
Bloqueio epidural terapêutico para lombociatalgias. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 177
Leandro Mamede Braun, João Valverde Filho, Gustavo Rodrigues Costa Lages
Capítulo 14
Uso dos bloqueadores neuromusculares no manuseio das vias aéreas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 187
Rosalice Miecznikowski, Paulo Alipio Germano Filho, Enis Donizetti Silva
Capítulo 15
O sistema gastrointestinal e sua relação com as alterações perioperatórias. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 195
Florentino Fernandes Mendes, Ana Cristina Pinho Mendes Pereira, Eduardo Manso de Carvalho Andrade
Capítulo 16
Hipotermia em anestesia ambulatorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 207
Ricardo Caio Gracco de Bernardis, Eduardo Brigatto Sperling, Marco Aurélio Damasceno Silva, Ligia Andrade da
Silva Telles Mathias
Capítulo 17
Apneia obstrutiva do sono: um chamado à ação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 219
Giovanni Menezes Santos
PREFÁCIO
É com imensa satisfação que editamos o livro de Educação Continuada em sua versão
2014. A Sociedade Brasileira de Anestesiologia vem cumprindo seu papel de mantenedora
da atualização do conhecimento para seus associados.
O livro 2014 foi construído por colegas que trabalham em diferentes locais deste país e que
dedicaram algumas horas de seu lazer para escrever os capítulos – a eles nossos agradecimentos.
A confecção do livro passa por uma série de etapas, e delas participam os membros da
Comissão de Educação Continuada: a Dra. Cláudia Regina Fernandes e o Dr. Carlos Othon
Bastos, aos quais, desde já, agradeço o empenho.
A participação ativa da SBA é registrada no apoio de sua Diretoria e importante coo-
peração de seus dedicados e incansáveis funcionários, em especial Maria de Las Mercedes
Azevedo, grande ser humano que não mede esforços para ajudar a construir resultados posi-
tivos; Marcelo Sperle, na luta intensa pelo controle do recebimento dos originais e do envio
para a revisão ortográfica; Marcelo Marinho, pela qualidade da editoração, além do cuidado
técnico da revisão das referências bibliográficas realizada por Teresa Libório. Enfim, tudo
isso em prol de disseminarmos o conhecimento e proporcionarmos atualização aos colegas
associados.
O mundo passa por mudanças e precisamos fazer a diferença, colocar nossa energia para
a construção de melhores dias, e, para nós, anestesiologistas, a busca do conhecimento é
indispensável para evoluirmos na melhora da prestação de serviços à população.
Agradeço os anestesiologistas brasileiros que, mesmo diante de dificuldades, continuam
a fazer o melhor em benefício dos pacientes.
Prefácio | 13
Capítulo 01
Anestesia em Pediatria
Marcelo Neves Silva
Daniela Bianchi Garcia
Ana Carla Giosa Fujita
Anestesia em Pediatria
Introdução
O Comitê de Anestesia Pediátrica tem como objetivo iniciar uma série de atualiza-
ções voltadas para doenças congênitas que possam auxiliar, de forma prática, seu ma-
nejo no intraoperatório.
Abordaremos, nesta edição, três doenças não tão comuns, mas que podem evoluir com
sérias complicações quando não tratadas adequadamente. Doenças que mostram a impor-
tância de uma abordagem correta por toda a equipe envolvida desde o primeiro atendimen-
to do recém-nascido (RN).
Gastrosquise e Onfalocele
Definição e Incidência
Apesar de as origens embriológicas da gastrosquise e da onfalocele serem diferentes,
ambas caracterizam-se pela ausência parcial ou total da parede abdominal, causando, nor-
malmente, herniação do intestino, mas também de outras vísceras sólidas, e apresentam
uma abordagem anestésica similar.
A gastrosquise é definida como um defeito da parede abdominal que ocorre la-
teralmente ao umbigo e, com frequência, à direita da cicatriz umbilical. A incidên-
cia é variável, de acordo com o banco de dados consultado. Há relatos de 1:10.0000
nascidos vivos que apresentam gastrosquise, na literatura nacional, e até 1:30.000 na
literatura americana1,2 .
Fatores maternos relacionados à maior incidência são: idade menor que 20 anos, primí-
paras, baixo nível socioeconômico e uso de drogas lícitas ou ilícitas (álcool, tabaco e cocaí-
na)3, substâncias que parecem causar efeito vasorreativo durante o período embriogênico.
Existem, ainda, casos associados com história familiar e alterações cromossômicas, mas o
papel de todos esses fatores ainda não está bem esclarecido4.
O cordão umbilical encontra-se intacto e as alças intestinais não são protegidas pela
membrana amniótica e ficam expostas aos efeitos lesivos do líquido amniótico durante a
vida intrauterina. Em 60% dos casos, o recém-nascido é prematuro e apresenta baixo peso
ao nascer, não havendo qualquer prova de relação genética. No entanto, apresenta baixa in-
cidência de anomalias associadas5.
A gastrosquise à esquerda já está associada à maior incidência de defeitos extraintestinais.
A onfalocele é definida como um defeito embriológico em que não ocorre o fechamento
da parede abdominal ao nível do cordão umbilical, mas herniação do intestino em sua base.
Sua incidência gira em torno de 1:10.000 - 6:10.000 nascidos vivos4.
Outras malformações congênitas (cardíacas - 10%; gastrointestinais - 25%; genituriná-
rias - 25%; neurológicas e cromossômicas, síndrome de Beckwith Wiedemann) são comuns
e estão presentes em 75% dos casos. A maioria dos recém-nascidos é de termo4.
As vísceras herniadas encontram-se envoltas por uma membrana amniótica peritoneal.
Anestesia em Pediatria | 17
Preparo Pré-operatório
Um preparo pré-operatório adequado ao RN é essencial para o sucesso da cirurgia.
Uma série de medidas deve ser realizada:
• garantir pós-operatório em UTI;
• combinar o momento da cesariana com a equipe da cirurgia pediátrica, para que
esteja preparada para receber o RN;
• manter o RN com a cabeceira elevada;
• envolver, logo após o nascimento, as vísceras com campos estéreis embebidos com
soro fisiológico ou com plástico esterilizado, para minimizar a perda de calor e a
perda hídrica e diminuir o risco de infecção;
• introduzir sonda orogástrica ou nasogástrica de maior calibre possível para drenar o
conteúdo do estômago e prevenir a regurgitação e a broncoaspiração;
• puncionar a veia periférica e restaurar a volemia do paciente e o status oncótico
e eletrolítico (quanto menor o tempo entre o nascimento e a cirurgia, menor a
necessidade dessa restauração); geralmente, as necessidades hídricas iniciais são
maiores que 140 ml/kg/24h, devendo, se necessário, adicionar coloide (albumina)
ao cristaloide;
• o uso de antibiótico apropriado também é necessário para evitar o risco de septicemia;
• reservar hemocomponentes;
• se necessário, realizar punção venosa central sob anestesia geral, para evitar dis-
secção venosa ou punção com o RN acordado, o que minimiza os riscos inerentes
a tais procedimentos;
• enfaixar os membros superiores e inferiores para o melhor controle da temperatura;
• manter o ar-condicionado desligado até o RN estar com os campos cirúrgicos cobertos;
• exames laboratoriais em RN operados imediatamente após o nascimento não são
necessários e não se deve postergar a cirurgia por causa deles; já naqueles com tempo
mais longo entre a cirurgia e o nascimento, pode-se colher uma gasometria e corrigir
os possíveis distúrbios o mais rapidamente possível;
• todos os procedimentos realizados no paciente, como monitorização, punção de veia
periférica e indução da anestesia, devem ser realizados com luvas estéreis.
Preparo Perioperatório
Monitor/equipamentos
O paciente deve ser monitorizado com eletrocardiograma, oxímetro de pulso, capnogra-
fia, capnometria e pressão arterial não invasiva com manguito de tamanho compatível com
o paciente, além do controle da temperatura central.
A pressão venosa central pode ser utilizada como medida complementar nas crianças
com estado geral mais grave ou com malformações que possam comprometer a sobre-
vida4, embora seja menos fidedigna na faixa etária pediátrica. Importante monitorizar a
diurese, as perdas sanguíneas e a pressão intra-abdominal.
Manutenção
Durante o procedimento cirúrgico, uma boa interação entre o anestesista e o cirurgião
é essencial.
A possibilidade de fechar a parede abdominal em um só tempo deve ser analisada pelo
anestesista, por meio da capacidade de manter a ventilação adequada ao paciente.
Considera-se ventilação adequada o volume corrente em torno de 5-6 mL/kg de peso corpó-
reo, com pressão intratraqueal máxima de 30 cmH20, desde que não ocorra retenção de CO28.
Durante o procedimento, o relaxamento muscular pode ser essencial para auxiliar
nesse fechamento.
Entre as complicações cirúrgicas descritas, pode haver elevação da pressão intra-abdominal
(PIA). O aumento excessivo da PIA pode causar alteração da irrigação dos órgãos; isquemia; oli-
gúria; translocação bacteriana e diminuição da perfusão dos membros inferiores. A diminuição
do retorno venoso pela compressão pode causar hipotensão e congestão dos membros inferiores9.
Sendo assim, a PIA deve ser mensurada durante o fechamento da parede abdominal,
tendo como objetivo determinar a tolerância ou não desse fechamento. Embora a PIA infe-
Anestesia em Pediatria | 19
rior a 20 mmHg seja considerada segura para o fechamento da parede abdominal, o aumen-
to da pressão intratraqueal para valores maiores de 30 mmHg não recomenda o fechamento
primário da parede.
PIA maior que 20 mmHg e aumento da PVC de 4 mmHg estão associados à redução do re-
torno venoso e do índice cardíaco, podendo levar à síndrome compartimental intra-abdominal.
Quando a pressão abdominal alcança 30 mmHg, não é recomendado o fechamento completo.
A PIA pode ser monitorada por meio de um cateter intravesical, pela observação de
edema e cianose em MMII ou pela monitorização da SaO2 pós-ductal acima e abaixo do
abdome (ou seja, na mão esquerda e no pé), que prediz alterações do fluxo sanguíneo10.
Pós-operatório
Ao término da cirurgia, o paciente deve ser encaminhado à UTI intubado e com bom
nível de hipnose e bloqueio neuromuscular, que auxiliarão na ventilação nas primeiras horas
e por até 48 horas, a depender do grau de evisceração. Alguns RN podem ser encaminhados
em ventilação espontânea.
A observação clínica e a monitorização devem ser mantidas na busca de sinais de altera-
ção hemodinâmica, síndrome compartimental ou infecção.
Deve-se manter a sonda gástrica até o funcionamento intestinal se normalizar.
É importante preservar a reposição hídrica e de glicose. Alguns neonatos necessitam se
alimentar por via endovenosa por um longo período, uma vez que a função intestinal pode
demorar semanas para retornar ao normal.
Anestesia em Pediatria | 21
uso de opioides, favorece a ocorrência de apneia no intra e no pós-operatório. Dessa forma,
o uso de opioides deve ser mínimo e a analgesia por outras drogas ou métodos, maximizada.
Entre as opções para analgesia, temos infiltração da ferida cirúrgica no início ou no final
do procedimento. Essa opção é bem segura, porém, não proporciona analgesia intraoperató-
ria quando realizada no fim do procedimento. A realização de bloqueio peridural via sacral
apresenta bons resultados, com a desvantagem de necessitar de grandes volumes de anes-
tésico local e da regressão precoce do bloqueio quanto mais cranial a região de interesse.
Autores descrevem a efetividade da peridural em nível torácico, mas as complicações, apesar
de raras, podem ser muito graves, havendo alternativas eficazes disponíveis. Uma possibi-
lidade descrita é o bloqueio bilateral da bainha do reto abdominal guiado por ultrassom,
um método seguro que utiliza pequena quantidade de anestésico local (0,3 mL/kg), com a
desvantagem de exigir equipamento e treinamento específicos, mas com excelente eficácia.
Uma pequena porcentagem dos pacientes vai necessitar de analgesia suplementar14.
Pós-operatório
A evolução pós-operatória costuma ser favorável. O paciente deve ser atentamente observa-
do após o término do procedimento quanto à ventilação. Se houver irregularidade, indica-se
a monitorização em ambiente intensivo. Uma pequena parte dos pacientes apresentará algum
episódio de vômito após o término da cirurgia, mas a maioria se recupera prontamente, com
boa aceitação alimentar e alta hospitalar no primeiro ou segundo dia de pós-operatório.
Referências bibliográficas:
1. Cumino DO, Valinetti EA, Nomura S. Malformação congênita em pediatria, em: Duarte NMC, Bagatini A, Azoati-
gui LC. Curso de Educação à Distância em Anestesiologia. São Paulo, Segmento Forma, 2005; 93-113.
2. Holzman RS, Mancuso TJ, Polaner DM. Anestesia Pediátrica. Rio de Janeiro, Revinter, 2011.
3. Saada J, Oury JF, Vuillard E et al. Gastroschisis. Clin Obstet Gynecol, 2005;48:964-972.
4. Bachiller PR, Chou JH, Romanelli TM. Neonatal Emergencies, em: Coté CJ, Lerman J, Anderson BJ. Coté and
Lerman’s a Practice of Anesthesia for Infants and Children. 5th Ed. Philadelphia, Elsevier/Saunders, 2013; 746-765.
5. Bikhazi GB & Davis PJ. Anesthesia for Neonates and Premature Infants, em: Montoyama EK, Davis PJ. Smith’s
Anesthesia for Infants and Children. 6th Ed. St Louis, Moby, 1996; 445-474.
6. Todres D, Firestone S. Neonatal emergencies. In: Coté CJ, Ryan JF, Todres D et al. A Practice of Anesthesia for
Infant and Children. 2nd Ed. London, Grune & Stration, 1992; 141-157
7. Singh SJ, Fraser A, Leditschke JF et al. Gastroschisis: determinants of neonatal outcome. Pediatr Surg Int, 2003;
19:260-265.
8. Holl JW. Anesthesia for Abdominal Surgery, em: Gregory AG. Pediatric Anesthesia. 4th Ed. Philadelphia, Chur-
chill Livingstone, 2002; 567-585.
9. Modolo NSP. Anestesia no Neonato, em: Costa MCF, Lima LC. Anestesiologia Materno-Infantil. Rio de Janeiro,
Medbook, 2011; 151-180.
10. Yaster M, Buck JR, Dudgeon DL et al. Hemodynamic effects of primary closure of omphalocele/gastroschisis in
human newborns. Anesthesiology, 1988; 69:84-88.
11. Georgoula C, Gardiner M. Pyloric stenosis a 100 years after Ramstedt. Arch Dis Child, 2012; 97:741-745.
12. Taylor ND, Cass DT, Holland AJ et al. Infantile hypertrophic pyloric stenosis: has anything changed? J Paediatr
Child Health, 2013; 49: 33-37.
13. Holzman RS, Mancuso TJ, Polaner DM. A Practical Approach to Pediatric Anesthesia. Philadelphia, Lippincott
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14. Breschan C, Jost R, Stettner H et al. Ultrasound-guided rectus sheath block for pyloromyotomy in infants: a retros-
pective analysis of a case series. Pediatr Anesth, 2013; 23:1199-1204.
Benefícios
Ao longo dos anos, diversos estudos evidenciaram os benefícios dos BCNP no controle
da dor. O uso de cateter para a analgesia contínua tem mostrado maior benefício em relação
ao uso oral ou parenteral de opioides. Além disso, tem também reduzido consideravelmente
a quantidade do consumo desses agentes, resultando em menores efeitos colaterais advindos
desses fármacos (sedação, náusea, vômitos e prurido). Há estudos que comprovaram que a
técnica contínua tem melhor controle da dor se comparar com os pacientes que receberam
uma única dose de anestésico local. Mostrou-se ainda superior às técnicas de analgesia sis-
têmica controlada pelo paciente (PCA)3.
Outras vantagens do uso dos BCNP são: menor tempo de reabilitação funcional; mobilização
precoce; menor tempo de permanência hospitalar e maior satisfação do paciente em relação à
analgesia pós-operatória4. O interesse do uso de bloqueios de nervos periféricos, associados ou
não à utilização de cateteres, tem crescido nos últimos anos ainda pelo seu potencial anti-infla-
matório, além da possibilidade de se abdicar do uso de técnicas neuroaxiais e suas complicações
de alta morbidade, principalmente quando existe uso de drogas anticoagulantes5,6.
Indicações
Os primeiros relatos dos BCNP descrevem seu uso para bloqueios anestésicos intrao-
peratórios e para o tratamento de soluços7-9. Posteriormente, artigos mostraram os BCNP
Figura 2 – (A) Posicionamento do probe de ultrassonografia sobre os músculos interescalênicos. (B) Pun-
ção do espaço interescalênico com cateter na região perineural ao plexo braquial.
Bloqueio Supraclavicular
• Objetivo
Posicionar o cateter de nervo periférico próximo às divisões do plexo braquial na proxi-
midade da artéria subclávia em região supraclavicular.
• Posicionamento e técnica
Figura 4 – (A) Posicionamento do probe de ultrassonografia e agulha na região supraclavicular. (B) Pun-
ção da região supraclavicular com cateter na região perineural às divisões do plexo braquial.
Figura 8 – Posicionamento do
transdutor de ultrassonografia
e da agulha abaixo do
ligamento inguinal transversal
à artéria femoral.
Figura 11 – Posicionamento
do transdutor 10 cm acima
da fossa poplítea transversal
ao fêmur com o paciente em
decúbito lateral.
Figura 12 – Bloqueio do
nervo isquiático com cateter
posicionado próximo ao nervo.
Figura 13 – Posicionamento e
fixação do cateter isquiático poplíteo
Escolha da solução
Muito se questiona, na literatura, sobre quais seriam a concentração, o volume e a massa
anestésica ideais para se obter maior tempo de analgesia, com menor incidência de paraefei-
tos tanto nos regimes de injeção única quanto nos regimes de infusão através de cateteres.
Importantes paraefeitos no que diz respeito a bloqueios de nervo periférico são o bloqueio
motor indesejável e a insensibilidade do membro bloqueado, principalmente para pacientes
em regime ambulatorial, nos quais esses bloqueios podem levar a dificuldade de movimen-
tação do membro, de deambular e risco de quedas domiciliares58.
Em um estudo recente, um cateter perineural em localização isquiática poplítea foi intro-
duzido e comparou-se a infusão da mesma massa, mas com diferentes concentrações e taxas
Referências bibliográficas:
1. Ilfeld BM. Continuous peripheral nerve blocks: a review of the published evidence. Anesth Analg, 2011;113:904-925.
2. Ilfeld BM, Enneking FK. Continuous peripheral nerve blocks at home: a review. Anesth Analg, 2005; 100:1.822-1.833.
3. Richman JM, Liu SS, Courpas G et al. Does continuous peripheral nerve block provide superior pain control to opioids? A
meta-analysis. Anesth Analg, 2006;102:248-257.
4. Arbona FL, Khabiri B, Norton JA. Introduction to continuous perineural catheters, em: Arbona FL, Khabiri B, Nor-
ton JA. Ultrasound-Guided Regional Anestesia: a pratical approach to peripheral nerve blocks. New York: Cambridge,
2011;133-142.
5. Martin F, Martinez V, Mazoit JX et al. Antiinflammatory effect of peripheral nerve blocks after knee surgery: clinical and
biologic evaluation. Anesthesiology, 2008;109:484-490.
Introdução
O trauma é considerado a maior causa de morbidade e mortalidade no mundo1. Essa con-
dição coexiste frequentemente com a dor aguda, secundária às lesões teciduais e à ativação
de nociceptores2. A dor, como definida pela Associação Internacional para o Estudo da Dor3,
interfere na recuperação dos pacientes, podendo comprometer suas vidas em vários aspectos.
Em um estudo feito por Berben e colaboradores, a dor apresentou alta prevalência nos
departamentos de emergência e trauma, chegando à incidência de 91% na admissão e de
86% na alta da emergência4. Outro aspecto que chama atenção é o fato de que a dor foi
considerada grave por uma grande quantidade dos pacientes.
Inúmeras demandas se sobrepõem ao manejo da dor no paciente vítima de trauma, fazen-
do com que, frequentemente, a dor nesse cenário não seja tratada adequadamente. Vários
fatores parecem contribuir e influenciar essa prática. Entre eles chama atenção a presença
de condições que implicam risco de vida, como choque hemorrágico e traumas cranioence-
fálico, abdominal e torácico5.
O receio de usar medicações analgésicas sistêmicas com potencial de desenvolvimento de
efeitos adversos indesejáveis, como sedação, depressão da consciência e da respiração, pode ser
um problema a ser considerado na fase inicial de atendimento ao paciente politraumatizado.
Vários estudos têm demonstrado que a AR torna mais rápida a recuperação, reduz o
tempo na Unidade de Terapia Intensiva e o tempo de internação hospitalar. As funções car-
díaca e pulmonar parecem melhorar com o emprego da AR. Além disso, ocorre também um
retorno mais precoce da função intestinal.
Os bloqueios periféricos podem ser realizados rapidamente e facilmente durante a fase
inicial do trauma, com o paciente ainda no departamento de emergência. Tal prática con-
tribuirá para reduzir a dor, determinando a analgesia em um sítio específico, para facilitar a
mobilização e proporcionar maior conforto ao paciente.
Sabe-se que a probabilidade de desenvolvimento da síndrome de estresse pós-traumático
e de dor crônica após um episódio de trauma é grande. Além das ações observadas em curto
prazo, a intervenção no processo álgico de forma precoce pode ter ações benéficas também
em longo prazo. Trevino e colaboradores mostraram que a cronificação da dor pode ter in-
cidência de 80% após quatro meses do episódio. Outro estudo verificou a presença de dor
crônica em 62% em um ano após o trauma.
Algumas causas comuns de dor crônica pós-trauma são cefaleia após TCE, síndrome de
estresse pós-traumático após lesões de extremidades, dor pós-lesão vertebral e dor fantasma
após amputação traumática.
No entanto, a despeito dos benefícios conhecidos oferecidos pela AR, os bloqueios anal-
gésicos ainda são subutilizados nas vítimas de trauma, especialmente durante a fase inicial10.
Figura 2 – (A) Posicionamento transversal do transdutor em relação aos vasos femorais ao nível da região
inguinal. (B) Imagem ultrassonográfica resultante, em que se visualizam a fáscia ilíaca superiormente, o
nervo femoral lateralmente à artéria femoral, a veia femoral medialmente à artéria e o músculo iliopsoas
inferiormente. NF - Nervo Femoral; AF- Artéria Femoral.
Figura 3 – Representação esquemática do compartimento da fáscia ilíaca contendo três dos principais
nervos do membro inferior: cutâneo femoral lateral, femoral e obturador. Entre a fáscia ilíaca e a fáscia lata,
os vasos femorais.
O ultrassom também pode ser usado para guiar a realização do bloqueio do compartimen-
to da fáscia ilíaca. Com o probe na posição transversal abaixo do ligamento inguinal, inicia-se a
visualização da mesma forma do bloqueio do nervo femoral. Após visualizar os vasos femorais,
desliza-se então o transdutor lateralmente, obtendo-se a visualização do músculo ilíaco reco-
berto pela fáscia ilíaca e mais externamente o músculo sartório (Figura 4).
Figura 4 – Visualização das estruturas durante a realização de bloqueio da fáscia ilíaca. Na região medial:
artéria femoral (AF); nervo femoral abaixo da fáscia ilíaca. Na região intermediária: músculo iliopsoas,
abaixo da fáscia ilíaca, e músculo sartório superiormente. Mais lateral: visão dos músculos iliopsoas, sartó-
rio e tensor da fáscia lata (TFL).
A fáscia lata é vista mais superficialmente, logo abaixo do tecido subcutâneo. A in-
jeção de cerca de 30-40 ml de anestésico local em concentrações analgésicas é realiza-
da logo abaixo da fáscia ilíaca (Figura 5). Tal prática normalmente permite o bloqueio
Figura 5 – Técnica de bloqueio da fáscia ilíaca: com o probe na posição transversal, a injeção apropriada
de anestésico local abaixo da fáscia, ao nível do músculo iliopsoas, vai dispersar no sentido medial e lateral,
levando ao bloqueio dos nervos femoral e cutâneo femoral lateral.
A Tabela 2 mostra sugestões de analgesia por meio de bloqueios periféricos para as fratu-
ras mais comuns de membro inferior.
Figura 6 – (A) Posicionamento transversal do transdutor na região cervical. (B) Imagem ultrassono-
gráfica resultante, com visualização dos músculos escalenos anterior (MEA) e médio (MEM); espaço
interescalênico com as raízes cervicais C5, C6 e C7 (setas largas); músculo esternocleidomastóideo
(MECM) superiormente.
Axilar
Plexo braquial Dificuldade de posicionamento no
Ossos da mão Bloqueio dos nervos
Raízes de C5-T1 bloqueio axilar
isolados
SC = Síndrome Compartimental.
Bloqueio Paravertebral
O bloqueio paravertebral em bolus ou com colocação de cateter se apresenta como uma
excelente alternativa analgésica nos traumas torácicos, especialmente se o acometimento é
unilateral38,39. Alguns estudos não demonstraram vantagem na utilização do bloqueio epi-
dural torácico sobre o paravertebral40,41.
A técnica paravertebral consiste no bloqueio dos nervos espinhais no momento em
que eles deixam o forame intervertebral. O espaço intervertebral é a região em formato de
cunha que tem como borda superior o ligamento costotransverso e o processo transverso
da vértebra. Medialmente, o espaço é limitado pelo corpo vertebral e o forame interverte-
bral. Anterior e lateralmente, encontramos a pleura (Figura 7)42-44.
Figura 11 – (A) Posicionamento longitudinal do transdutor em relação ao neuroeixo que corta transversal-
mente as costelas, ao nível da linha axilar média. (B) Imagem ultrassonográfica resultante, na qual visuali-
zam-se os músculos intercostais e a pleura inferiormente (linha hiperecogênica).
Nesse bloqueio, a visualização dos nervos intercostais é bastante difícil. Para ajudar na
identificação deles, pode-se utilizar o Doppler para facilitar a localização dos vasos intercos-
tais e, consequentemente, dos nervos intercostais49.
Algumas fraturas, como de platô tibial ou quando há lesão extensa de tecidos moles,
estão associadas à maior incidência de SC (Tabela 5). Fraturas de fêmur e de tornozelo são
menos implicadas nesse quadro. A decisão em realizar uma analgesia prolongada deve levar
em consideração essa possível ocorrência em cada caso.
Tabela 5 – Principais lesões associadas à síndrome compartimental
Lesões Associadas à Síndrome Compartimental
Pressão superior a 30 mmHg em pacientes normotensos é consistente com SC. Esse mé-
todo de monitorização é de valor especial em pacientes sedados, confusos ou anestesiados.
Coagulopatia e Anticoagulação
O paciente vítima de trauma geralmente apresenta risco de sangramento ou de coagu-
lopatia 53,54, pois a infusão de grande quantidade de volume durante a reanimação inicial
pode ocasionar hemodiluição. Por outro lado, pacientes com fratura de membros inferio-
res e com imobilidade prolongada estão em risco aumentado para a ocorrência de eventos
tromboembólicos, necessitando muitas vezes de estratégias de anticoagulação.
Apesar de pouca menção ao paciente com trauma agudo, as recomendações da Sociedade
de Anestesia Regional e Medicina da Dor devem ser seguidas, para decisão de se realizar ou
não o bloqueio e sobre o momento ideal de sua execução ou manipulação de catéteres em
pacientes que usam anticoagulantes55.
Para reduzir o risco de complicações em pacientes anticoagulados é essencial manter
boa comunicação entre a equipe médica e avaliar o momento e as condições adequadas para
a realização de bloqueios de nervos periféricos ou remoção de catéteres, evitando, assim,
procedimentos no auge da anticoagulação54.
Lesão Nervosa
A existência de lesão nervosa56 é uma contraindicação relativa à realização de bloqueios
periféricos, segundo os guidelines da Sociedade Americana de Anestesiologia.
A detecção da presença de lesão nervosa e a avaliação da extensão de comprometi-
mento neurovascular no paciente com trauma agudo podem ser difíceis de ser realizadas.
Aspectos médico-legais devem ser também considerados, sendo extremamente aconse-
lhado que a documentação do diagnóstico e do tipo da lesão nervosa pré-existente seja
feito de forma minuciosa.
O risco de dano direto pela agulha parece estar reduzido pelo uso da ultrassonografia.
No entanto, todos esses cuidados também devem ser evidenciados.
Gerenciamento do
centro cirúrgico
Luís Antônio dos Santos Diego
João Henrique da Silva
Júlio Cezar Mendes Brandão
Gerenciamento do centro cirúrgico
“Você não pode ensinar qualquer coisa para alguém, você pode somente ajudar
alguém a encontrar o conhecimento por si mesmo.”
Galileu
***Handoff (USA) ou handover (GB) – é uma palavra da língua inglesa utilizada para expressar momentos
de transmissão (em redes sem fio, por exemplo) que, por analogia, também é empregada no setor de saúde
em momentos de transferência do paciente entre setores (do centro cirúrgico para a UTI, por exemplo) ou
de plantões (NA).
Gerenciamento de Conflitos
Quase sempre os profissionais de saúde estão envolvidos numa rotina de trabalho ex-
tenuante por causa de diversos fatores, como acatar decisões de superiores hierárquicos,
realizar procedimentos diversos, conferir suas atribuições diárias, interagir no ambiente de
trabalho, comunicar-se adequadamente com colegas, pacientes e familiares. No ambiente
restrito do centro cirúrgico, considerado estressante, trabalham médicos, enfermeiros,
técnicos, auxiliares, administradores etc., e o convívio, respeitando hierarquias e regras,
associado a diferenças culturais, pode não ser fácil. Assim como em qualquer local de tra-
balho, preparar e gerenciar um ambiente hospitalar que mantém os resultados de qualidade
depende da interação entre as diversas equipes e o nível de habilidade de seus líderes. O
gerenciamento adequado dos diversos conflitos que ocorrem dentro desse ambiente será
fator decisivo na manutenção do equilíbrio para seu funcionamento apropriado.
O gerenciamento dos diversos conflitos existentes no centro cirúrgico depende de vários
fatores, incluindo conceitos como a importância das relações de hierarquia, a capacidade de
conviver e se relacionar com pessoas diferentes, a comunicação e a linguagem e o conhe-
cimento técnico, entre outros aspectos. Estes dependem de muitos fatores subjetivos e a
psicologia pode contar muito nesses momentos.
Comunicação
Os diversos profissionais de saúde envolvidos na gestão da operação de um hospital e,
em particular, do centro cirúrgico precisam de habilidades de comunicação eficazes. Eles
precisam assumir a responsabilidade de garantir que outros recebam a intenção correta
do sentido de suas mensagens e seus objetivos. Esse tipo de habilidade possui um impacto
direto e importante sobre a qualidade do atendimento ao paciente e melhora vários rela-
cionamentos. A comunicação deve incluir compreensão da linguagem usada nos hospitais
em base adequada. Os gerentes devem se relacionar com pacientes, colegas de trabalho e
funcionários. Os gerentes também devem ter consciência sobre a comunicação não verbal,
que ocorre por meio de expressões faciais e gestos com diversas partes do corpo.
Conhecimento Técnico
Os diversos tipos de habilidade e padrão técnico podem variar de acordo com a posição
do profissional. Os gerentes de médicos, enfermeiros, fisioterapeutas e outros profissio-
nais da saúde necessitam de subsídios que incluam conhecimentos, técnicas, habilidades,
Delegação de Tarefas
Os gestores devem delegar tarefas para seus liderados. Esse tipo de habilidade envolve
muito mais do que a simples entrega de uma tarefa para um funcionário, por exemplo, mas
a consideração de suas habilidades e capacidades, bem como suas deficiências. Os gestores
devem ter compreensão clara sobre os conceitos e os resultados esperados, bem como a ma-
neira como a pessoa deve proceder antes de entregar a tarefa solicitada resolvida completa-
mente. O gestor eficaz delega tarefas e permite que o indivíduo tenha liberdade para utilizar
seu talento pessoal para completá-la. Entretanto, ele deve receber relatórios regulares sobre
o progresso e a evolução. Às vezes, um líder tem de fornecer orientação sobre o projeto ou
trabalhar com as pessoas, ajudando na realização de suas atividades, com a finalidade de
melhorar suas habilidades e rendimentos.
Relações Interpessoais
O tipo de trabalho, o local e o ambiente do centro cirúrgico está comumente associado a
circunstâncias estressantes, portanto, os gestores devem possuir habilidades interpessoais
bem estabelecidas para saber conduzir e conviver com os colegas, funcionários, familiares e
pacientes. Para tanto, exige-se a capacidade de desenvolver empatia com os outros, demons-
trar entusiasmo e manter atitude otimista em relação às atividades do dia a dia. As relações
interpessoais eficazes combinam vários outros tipos de habilidade, incluindo a comunica-
ção e a tentativa de resolução e gestão de conflitos presentes no cotidiano.
As unidades hospitalares e, em especial, o centro cirúrgico possuem funcionários com
diferentes níveis de qualificação, ensino, influências culturais, religiosas, preferências pes-
soais, experiências de treinamento e modo de formação técnica. Assim, é esperado que
surjam diferenças entre essas pessoas, que desenvolvem atividades e estão presentes em tal
ambiente. Os gestores devem ajudar os membros da equipe a negociar, solucionando seus
problemas e resolvendo conflitos da forma mais amigável possível. Os líderes devem ter boa
capacidade de negociação e conversa. A comunicação deve ser bem estabelecida e deve-se
evitar a transmissão de informações com duplo sentido ou de difícil entendimento. Entre as
habilidades para a adequada gestão de conflitos deve-se sempre aprimorar a capacidade de
comunicação e tentar um julgamento o mais imparcial possível, com a finalidade de facilitar
a compreensão e contar com a colaboração dos funcionários em todos os grupos e diferentes
profissões que trabalham no mesmo ambiente. A resolução de conflitos pode implicar ree-
ducação, revisão de políticas locais ou reformulação de diretrizes13.
As situações de estresse e conflito sempre estarão presentes nas atividades que exerce-
mos, já que a equipe multidisciplinar está envolvida na manutenção do maior bem do ser
humano, a vida. Cabe às lideranças que representam a instituição estarem engajadas com
as equipes, para respaldar a condução dos conflitos diários. Como resultado, o ambiente
do centro cirúrgico se tornará mais ágil e efetivo e um local melhor para trabalhar, o que
determinará, certamente, melhor resultado para os pacientes.
Estetoscópio
Produtos que entram em contato com pele ín-
Não críticos Termômetro
tegra ou não entram em contato com o paciente
Cubas “rim”
Cânula de Guedel
Produtos que entram em contato com pele não Máscara facial
Semicríticos
íntegra ou mucosas íntegras colonizadas Lâmina de laringoscópio
Válvulas respiratórias
Produtos para a saúde utilizados em proce-
dimentos invasivos, com penetração de pele
Instrumental cirúrgico
e mucosas adjacentes, tecidos subepteliais e
Críticos “Traqueias” do aparelho de anestesia
sistema vascular, incluindo todos os produtos
Acessórios de respiradores
para a saúde que estejam diretamente conecta-
dos com esses sistemas
Produtos para a saúde cujas superfícies internas Instrumental cirúrgico (tesouras
e externas podem ser atingidas por escovação cirúrgicas)
Não complexos
durante o processo de limpeza e tenham diâ- Cubas
metro superior a 5 mm nas estruturas tubulares Pinça de Magill
Produtos para a saúde que possuam lúmen
Instrumental com reentrâncias (p.
inferior a 5 milímetros ou com fundo cego,
Complexos ex., porta-agulhas)
espaços internos inacessíveis para a fricção
Agulhas especiais de punção
direta, reentrâncias ou válvulas
Na CME, o f luxo deve ser controlado desde o recebimento do material (sala de re-
cepção e limpeza); durante o preparo e a esterilização (sala de preparo e esterilização
e sala de desinfecção química, quando aplicável); na área de monitoramento do pro-
cesso de esterilização e na sala de armazenamento e distribuição do material esterili-
zado. Para tanto, é necessária uma barreira física que delimite a área contaminada da
área limpa.
Cada etapa do processamento do instrumental cirúrgico e dos produtos para saúde deve
seguir o Procedimento Operacional Padrão (POP), elaborado com base em referencial cien-
tífico atualizado e normatização pertinente. O material sujo e contaminado, ao ser enviado
para a CME, é submetido, inicialmente, a um processo de remoção da sujidade visível – or-
gânica e inorgânica – com o uso de água, sabão e detergente neutro ou detergente enzimá-
tico em artigos e superfícies. Se um artigo não for adequadamente limpo, isso dificultará os
processos de desinfecção e esterilização.
Conclusão
Os médicos anestesiologistas devem conhecer os conceitos e processos que regem o ge-
renciamento do centro cirúrgico e se inteirar deles, para que haja o entendimento de que se
essa estrutura for bem gerida, implicará maiores ganhos diretos para o profissional, do tipo
financeiro, ou indiretos, do tipo mais tempo disponível para o lazer, para a família, além
de propiciar oportunidades de desenvolver seu trabalho com mais qualidade e segurança,
contribuindo para resultados positivos em relação aos pacientes, à própria qualidade de vida
e à melhor gestão financeira da organização na qual estão inseridos.
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14. Wisinski J. Como Resolver Conflitos no Trabalho. Rio de Janeiro, Campus, 1994.
Miopatias e Anestesia
Ana Karla Arraes von Sohsten
Heber de Moraes Penna
Carlos Darcy Alves Bersot
Miopatias e Anestesia
Introdução
Miopatias são desordens estruturais e/ou funcionais dos músculos esqueléticos, resul-
tantes de uma variedade de etiologias. Anormalidades na estrutura ou no metabolismo da
célula muscular que levam a vários padrões de fraqueza muscular e, consequentemente, de
manifestações clínicas.
As miopatias devem ser diferenciadas das doenças do neurônio motor, das neuropa-
tias periféricas e das doenças da junção neuromuscular. Apesar de terem baixa preva-
lência na população em geral, podem levar a graves complicações durante procedimen-
tos anestésicos, como hipertermia maligna, rabdomiólise, crises miotônicas e piora da
função respiratória1.
As miopatias podem ser classificadas em duas categorias principais: hereditárias ou
adquiridas. O curso temporal, o padrão da fraqueza muscular e a ausência ou presença de
história familiar de miopatia ajudam a distinguir entre os dois tipos. O início dos sintomas
em idade precoce associado à longa duração da doença sugere o diagnóstico de miopatia
hereditária, enquanto um início súbito ou subagudo dos sintomas e em idade mais tardia su-
gere miopatia adquirida. As duas categorias apresentam ainda subclassificações, conforme
o Quadro 12 .
Miopatias Hereditárias
Distrofias Musculares e Miopatias Congênitas
As distrofias musculares envolvem um grupo diverso de doenças, com herança genética,
caracterizadas por fraqueza muscular progressiva e degeneração muscular. Os músculos
envolvidos variam de acordo com o tipo de distrofia (Quadro 2)4,5.
Miopatias e Anestesia | 71
Por serem mais prevalentes, o registro de anestesias em portadores de DMD e DB tam-
bém é maior. As complicações anestésicas relatadas nesses pacientes podem ser divididas
em quatro grupos de manifestações:
1. Falência cardíaca intraoperatória;
2. Rabdomiólise e parada cardíaca por hipercalemia sem administração de succinilcolina;
3. Hipecalemia e parada cardíaca após o uso de succinilcolina;
4. Síndrome de Hipertermia Maligna (HM).
Os relatos de comprometimento cardiovascular grave foram, em sua maioria, de pacien-
tes submetidos à cirurgia de coluna, em que a causa pode ser atribuída a grandes perdas
sanguíneas ou à disfunção miocárdica previamente existente.
Em pacientes com DMD, as rabdomiólises na ausência de succinilcolina foram observa-
das durante exposição mínima na indução da anestesia e com uso de halotano. Os níveis de
potássio chegaram a 8 mEq/l. Dantrolene foi utilizado empiricamente após documentação
de acidose metabólica e respiratória, sem a presença de febre ou com discreto aumento de
temperatura. Relatos no período de pós-operatório foram confirmados quando do em-
prego de halotano, isoflurano e sevoflurano, tendo sido a evolução desfavorável na metade
dos casos. Há registros de casos semelhantes em portadores de DB em que o dantrolene
foi empregado; porém, sintomas de hipermetabolismo que precedessem a rabdomiólise e a
hipercalemia não ocorreram.
Nas evidências de rabdomiólise e parada cardíaca após succinilcolina, a maioria não
apresentava diagnóstico de miopatia por ocasião do evento, sendo investigado e firmado
secundariamente ao quadro. A mortalidade foi de 30%. Considerando a possibilidade de
anestesia em pacientes sem suspeição de miopatias, o uso da succinilcolina deve se limitar
a situações extremas, em que outras alternativas não estejam disponíveis para acessar as
vias aéreas6.
Casos suspeitos de hipertermia maligna têm sido reportados na DMD e na DB. Pacientes
com DMD desenvolveram febre inexplicada e taquicardia com o uso de halotano e outros
tiveram rabdomiólise sem hipercalemia. Na maioria dos casos, já havia diagnóstico prévio
de miopatia. A dificuldade em se estabelecer a verdadeira correlação entre as distrofias e
hipertermia maligna reside no fato de que as rabdomiólises e os quadros associados com-
partilham muitos sintomas de uma verdadeira crise de hipertermia maligna, e até mesmo os
quadros de hipertermia maligna são bastante variáveis; rabdomiólise e acidose lática podem
não existir8.
Parece não haver confirmação genética entre DMD e HM porque a mutação genética
da DMD encontra-se ligada ao cromossomo X, enquanto na HM está usualmente locada
no cromossomo 19. A existência da demonstração de testes positivos à contratura cafeína/
halotano em portadores de distrofia tem sido questionada; uma vez que já existe alteração
intrínseca do músculo distrófico, tornando-o mais sensível ao teste9.
A real preocupação da não utilização de agentes voláteis e succinilcolina em portadores
de distrofia talvez seja a prevenção da ocorrência de rabdomiólise e/ou hipercalemia, e não
a possibilidade de desencadear crise de hipertermia maligna.
Miopatias Mitocondriais
Por meio de processos que incluem o ciclo de Krebs, o transporte de elétrons na cadeia
respiratória e a fosforilação oxidativa; a mitocôndria é capaz de fornecer o principal subs-
trato energético molecular para as células16. Os distúrbios desses mecanismos fisiológicos
levam ao aparecimento das doenças mitocondriais, ocasionadas por mutações primárias ou
herdadas. O primeiro estágio da fosforilação, a conversão de NADH em NAD e o trans-
porte de elétrons constituem as etapas mais frequentemente acometidas nas anomalias
mitocondriais. As três principais formas de apresentação das doenças mitocondriais congê-
nitas são desordem multissistêmica infantil fatal; miopatias e encefalopatias, tendo as duas
últimas evoluções e prognósticos variáveis, conforme o uso de suplementos metabólicos,
as modificações dietéticas e, às vezes, o transplante de órgãos; esse último pode ser o único
tratamento definitivo. A incidência é estimada em 1 para 4.000 nascimentos17.
Atualmente, mais de 200 pontos de mutação no genoma mitocondrial estão reportados
e, por causa disso, as manifestações clínicas se mostram extremamente variáveis e podem se
apresentar em diferentes idades. Em geral, fraqueza muscular progressiva e intolerância ao
exercício são mais frequentes. Entretanto, pode haver debilidade da musculatura extrínseca
do olho, das pálpebras, da face e do pescoço. Em estágios mais avançados, dificuldade na fala e
na deglutição também tem sido relatada. O grau de intolerância ao exercício tem grande varia-
bilidade, indo desde problemas com o simples caminhar até aqueles que manifestam sintomas
somente com exercícios físicos extremos. Dor e lesão muscular resultam em rabdomiólise e
mioglobinúria, que podem culminar em insuficiência renal temporária ou permanente.
Uma vez que a deficiência na produção de ATP constitui o principal ponto de acome-
timento da doença, órgãos com altas demandas metabólicas como cérebro, coração e rins,
Miopatias e Anestesia | 73
quando atingidos, demonstram quadro clínico com cefaléia, deficiência auditiva, convul-
são, dificuldade de aprendizado e até retardo mental. Devem ser levadas em consideração
as cardiomiopatias e as anormalidades da condução cardíaca, como bloqueios de ramo e a
síndrome de Wolff-Parkinson-White. Podem ocorrer ainda insuficiência respiratória com
necessidade de suporte ventilatório, distúrbios gastrointestinais traduzidos por vômitos ou
disfagia inexplicada, deficiência pancreática exócrina e diabetes18. Pacientes com miopatias
ainda não esclarecidas merecem cuidados especiais, mesmo tendo o risco estimado de de-
senvolver hipertermia maligna ou rabdomiólise em torno de 1,09%19.
Um caso de teste positivo à contratura com cafeína e halotano em paciente portadora de
miopatia mitocondrial foi relatado, mas o emprego de anestésicos capazes de desencadear
crises não parece estar relacionado em caso de miopatias mitocondriais20.
Miopatias adquiridas
Miopatias Inflamatórias
As miopatias inflamatórias são um grupo de doenças raras (incidência anual de
1/100.000 nos EUA) que inclui a polimiosite (PM), a dermatomiosite (DM) e a miopatia
necrotizante auti-imune (MN). São doenças da fase adulta e acometem mais mulheres que
homens21. A dermatomiosite se apresenta como fraqueza muscular proximal de início agudo
ou insidioso, dolorosa, além de rush cutâneo característico nas superfícies extensoras das
mãos e dos dedos, calcificação subcutânea e prurido. Na polimiosite, os sintomas se limitam
ao tecido muscular e a disfagia aparece em um terço dos casos, assim como o quadro de fra-
queza na musculatura facial. A miopatia necrotizante se apresenta como fraqueza muscular
proximal progressiva, de início subagudo e sem rush cutâneo, geralmente mais severa que
na polimiosite.
Há aumento de incidência das doenças pulmonares intersticiais, que leva a dispnéia e
tosse22; desordens autoimunes, neoplasia e doenças cardiológicas, que geram defeitos na
condução e arritmias dos pacientes portadores de PM, DM e MN23.
Em relação ao diagnóstico laboratorial, a creatina kinase sérica (CK) está bastante au-
mentada (acima de dez vezes a taxa normal) na maioria dos casos de miopatia inflamatória.
Por causa das doenças pulmonares e cardíacas associadas, testes de função pulmonar e es-
tudos por imagem do tórax, assim como rigorosa avaliação cardiológica, estão indicados na
avaliação pré-operatória.
Miopatias Tóxicas Induzidas por Drogas
Várias drogas usadas na prática clínica podem levar à toxicidade do tecido muscular de
forma inesperada, gerando diferentes graus de manifestações clínicas: de sensação de des-
conforto e fraqueza muscular a danos permanentes. Pode haver elevação da CK e mioglobi-
núria em pacientes sem história prévia de doenças musculares.
A miotoxicidade induzida por drogas é causada por uma variedade de mecanismos:
lesão de organelas da fibra muscular, como mitocôndrias e lisossomos; alterações dos
antígenos musculares, que geram respostas imunológicas ou causam distúrbios hidro-
eletrolíticos e desequilíbrio nutricional na célula muscular. No entanto, a miopatia
Conduta anestésica
O manejo anestésico de pacientes com patologias musculares é um desafio. Além das
respostas esporádicas imprevisíveis, como rabdomiólise e intenso catabolismo, podem
ocorrer complicações associadas à fraqueza muscular respiratória, miocardiopatia prévia e
alterações na anatomia das vias aéreas, entre outras.
Para identificar e minimizar os riscos, uma avaliação pré-anestésica minuciosa é funda-
mental. Portadores de miopatia devem ter diagnóstico baseado em aspectos clínicos, mas,
se possível, deve-se estabelecer o mecanismo molecular subjacente, identificado através do
exame histopatológico.
Miopatias e Anestesia | 75
Todos os pacientes portadores de miopatia devem ser investigados do ponto de vista car-
diológico. Em muitas miopatias, de fato, pode-se observar uma cardiopatia pré-clínica ou
uma cardiomiopatia dilatada manifesta, além de distúrbios de condução, encurtamento do
intervalo PQ , prolongamento do QT, especialmente em estágios avançados30,31.
A função respiratória e a capacidade do paciente para mobilizar secreções devem ser
avaliadas. Em estágios avançados, essas patologias são acompanhadas por insuficiência
respiratória; assim, adequado suporte ventilatório pós-operatório pode ser necessário e a
disponibilidade de uma unidade de terapia intensiva pós-operatória, prudente. Baseado no
grau de fraqueza da musculatura esquelética, a indução com via aérea em sequência rápida
pode prevenir a aspiração broncopulmonar.
A dosagem pré-operatória do potássio sérico basal e da creatina quinase em pacientes
com doenças musculares é importante para avaliar a integridade da membrana muscular,
por causa do risco aumentado de rabdomiólise. Considerar a não utilização de soluções
com lactato. Distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-básicos, alterações da coagulação e hiper-
glicemia devem ser rapidamente corrigidos.
É recomendado jejum mínimo de 6-8 horas para sólidos e de 2 horas para líquidos claros,
conforme recomendações habituais. Estudos sugerem que esses pacientes não só estão em
maior risco de aspiração do conteúdo gástrico, por causa da fraqueza muscular e dismoti-
lidade intestinal, mas também podem desencadear uma crise metabólica pelo inadequado
metabolismo da glicose32 .
Todas as técnicas anestésicas e drogas apresentam vantagens e desvantagens em pacien-
tes portadores de miopatias. Assim, os anestésicos voláteis são contraindicados apenas nas
miopatias congênitas com o risco associado de hipertermia maligna32 . Esses fármacos tam-
bém têm sido implicados em rabdomiólise e reações semelhantes a HM.
O uso de bloqueador neuromuscular despolarizante deve ser evitado em pacientes com
doenças neuromusculares. A succinilcolina é um gatilho reconhecido para desencadear HM
em pacientes suscetíveis. Além disso, pode levar à despolarização prolongada com liberação
de potássio para o meio extracelular e influxo de cálcio muscular, que aumentaria o risco de
rabdomiólise. Esses efeitos são mais proeminentes em pacientes com receptores de acetilco-
lina extrajuncional, como ocorre no paciente portador de DMD. Como os mesmos efeitos
podem ser desencadeados por anticolinesterásicos, estes também não são recomendados. A
recente introdução da gamaciclodextrina (sugamadex) oferece alternativa atraente nessas
circunstâncias. Se o bloqueio neuromuscular for necessário, um bloqueador neuromuscular
adespolarizante deve ser preferido.
A anestesia venosa total tem sido defendida por muitos autores como a técnica anes-
tésica mais segura, porém, o uso de propofol tem sido questionado por apresentar com-
ponente lipídico, que pode afetar a oxidação de ácidos graxos, e por seus efeitos diretos
sobre a função mitocondrial. Ambos podem predispor o paciente à síndrome de infu-
são do propofol, sendo essa caracterizada por acidose láctica, bradicardia, rabdomió-
lise e insuficiência renal. Embora seja mais frequente com infusões de maior duração
(> 48 horas), em pacientes suscetíveis, mesmo infusões de curta duração podem levar
ao quadro33-35 .
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Pré-condicionamento
isquêmico remoto
Débora Maia da Costa
Francisco Elano Carvalho Pereira
Josenília Maria Alves Gomes
Cláudia Regina Fernandes
Pré-condicionamento isquêmico remoto
Introdução
O pré-condicionamento isquêmico remoto pode beneficiar o paciente cirúrgico. É
uma estratégia citoprotetora simples, barata e exequível em pacientes que se submeterão à
cirurgia de grande porte, com potencial insulto isquêmico de órgãos-alvo. Pesquisas estão
avançando e, em breve, saberemos quem são os pacientes que mais se beneficiarão com
esse procedimento.
O objetivo deste capítulo é discorrer sobre o conhecimento atual acerca do fenômeno de
pré-condicionamento isquêmico local e remoto, suas repercussões orgânicas e as evidências
científicas sobre os mecanismos de ação relacionados a esse fenômeno.
Pré-condicionamento isquêmico
O pré-condicionamento isquêmico (PCI) é definido por breves períodos de isquemia
tecidual, intercalados com reperfusão do respectivo tecido, que antecedem um período de
isquemia sustentada. Esse procedimento prepara e protege a célula contra eventuais danos
causados por um período de isquemia prolongada1.
Jennings, em 1960, discorreu pela primeira vez sobre reperfusão, sugerindo estratégias
cardioprotetoras para diminuir o grau de lesão miocárdica2 . Atualmente, reconhece-se que
o fenômeno de isquemia tecidual, seguida da reperfusão do referido tecido, complica uma
série de eventos, entre eles o infarto do miocárdio, o acidente vascular cerebral e os trans-
plantes de órgãos e tecidos, contribuindo para lesões tissulares, que estão associadas com o
aumento da mortalidade3. Em todas essas condições, a restauração do fluxo sanguíneo ade-
quado é o principal tratamento. No entanto, mesmo após a restauração do fluxo sanguíneo,
o dano tecidual persiste, em parte induzido pela própria reperfusão.
A investigação sobre a redução da lesão de isquemia–reperfusão (IR) ganhou grande
impulso após a publicação do estudo de Murry e col., em 1986, quando o fenômeno do
pré-condicionamento isquêmico foi descrito. Mediante estudo em coração de coelhos, os
autores demonstraram que a indução de isquemia leve, seguida por período de reperfusão,
tornou o coração mais resistente a posterior insulto isquêmico de potencialidade fatal, infe-
rindo que o pré-condicionamento isquêmico retarda a lesão letal no miocárdio que sofre de
isquemia prolongada4. Ao longo das últimas três décadas, outros autores têm demonstrado
o efeito protetor do pré-condicionamento isquêmico em outros tecidos5-8, no entanto, o co-
ração tem sido o órgão mais amplamente estudado.
A doença arterial coronariana, cursando com infarto agudo do miocárdio, é a principal
causa de morbidade e mortalidade em todo o mundo. A trombólise ou angioplastia
coronariana primária, para resolver a obstrução coronariana e o infarto agudo do
miocárdio, com o pronto restabelecimento do fluxo sanguíneo coronariano na artéria
acometida, continua sendo a intervenção mais eficaz para limitar o tamanho da área
afetada pelo infarto, reduzindo, assim, o remodelamento do ventrículo esquerdo (VE),
preservando a função do VE e melhorando os desfechos clínicos9,10. Paradoxalmente, o
Conclusão
Conclui-se, portanto, que estudos mais aprofundados precisam ser realizados para defi-
nir protocolos de utilização clínica do PCIR, inclusive para outros órgãos além do coração.
Tão bem como se faz necessário melhor entendimento sobre os mecanismos envolvidos
nesse fenômeno.
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Cardiopatia chagásica
e anestesia
Ivani Rodrigues Glass
Ângela Maria da Silva
Dalmo Coreia Filho
Cardiopatia chagásica e anestesia
Introdução
A doença de Chagas apresenta desafios durante o ato anestésico que incluem disfunção
sistólica severa, cardiopatia dilatada, arritmias ventriculares e relativa resistência aos ino-
trópicos e vasopressores1. Pode está associada ao comprometimento do cólon com o mega-
cólon e do esôfago com disfagia, que devem ser levados em consideração durante a consulta
pré-anestésica, no período transoperatório e no pós-operatório. Desse modo, poderá ser
realizada a técnica anestésica mais adequada ao tipo de intervenção e ao estado do paciente
e, assim, ser tomadas as medidas necessárias para cada caso2 .
A tripanossomíase americana constitui, ainda hoje, um problema socioeconômico na-
cional e regional. Essa endemia abrange uma região que vai do México até a Argentina,
principalmente, os países do Cone Sul da América. Entretanto, são registrados casos em
países não endêmicos, como os Estados Unidos e o Canadá e muitos países europeus, pela
migração de pessoas infectadas pelo Trypanosoma cruzi, em que a triagem para detectar a
doença de Chagas em doadores não era realizada até muito recentemente3 . Estima-se que
ainda existam 10 milhões de infectados na América Latina, dos quais 2 milhões somente no
Brasil, e cerca de 10 mil morrem todos os anos como resultado da doença4.
O sistema cardiovascular é responsável por grande parte dos eventos mórbidos ou fa-
tais no período perioperatório. O avanço da tecnologia permitiu que a propedêutica pré-
-operatória, a monitorização e a terapêutica se tornassem mais adequadas para esse grupo
de pacientes. Como a maioria das doenças cardiovasculares está relacionada com o enve-
lhecimento, a tendência atual é que haja mais pacientes cardiopatas submetidos aos mais
complexos procedimentos cirúrgicos.
Pacientes chagásicos com lesões no sistema nervoso autonômico periférico provavel-
mente têm resposta atípica às drogas colinérgicas e adrenérgicas, podendo, ainda, interferir
na acomodação pupilar e salivação. Existe também a probabilidade de que esses pacientes
tenham dificuldade em compensar as quedas do débito cardíaco promovidas por depressão
cardiovascular de natureza farmacológica, comum durante a administração de anestésicos5.
Verificar essas alterações e suas repercussões é de grande interesse clínico, considerando
que muitos pacientes chagásicos são submetidos à anestesia para tratamento cirúrgico de
lesões produzidas pela doença ou para a cura de doenças intercorrentes.
Manifestações Clínicas
A infecção pelo T. cruzi ocorre em duas etapas sucessivas, a fase aguda e a fase crôni-
ca. A fase aguda pode durar de 6 a 8 semanas10,11. Nessa fase da doença os sinais podem
aparecer no próprio lugar onde se deu a contaminação pelas fezes do inseto. Esses
sinais, quando presentes, aparecem aproximadamente de 4 a 6 dias após a infecção e
se caracterizam por um edema bipalpebral unilateral (sinal de Romaña) quando o T.
cruzi penetra na conjuntiva; ou quando, ao nível da pele, geralmente nos braços, nas
pernas ou no rosto, a lesão assemelha-se a um furúnculo ou a uma mancha avermelhada
(chagoma de inoculação). Quase sempre ocorre infartamento ganglionar satélite, pró-
ximo aos locais de porta de entrada. A manifestação mais comum é a febre, usualmente
prolongada, constante e não muito elevada7,8 . Essa forma somente é reconhecida em 1%
a 2% dos indivíduos infectados. Nessa fase, os sinais e sintomas podem desaparecer es-
pontaneamente, evoluindo para a fase crônica, ou progredir para formas agudas graves,
que podem levar ao óbito11.
A fase crônica pode se apresentar como forma indeterminada, cardíaca, digestiva ou
mista (cardiodigestiva)12 . A forma indeterminada é a mais frequente, ocorre em torno de
50% a 70% dos indivíduos infectados11,13. Os pacientes com essa forma apresentam sorologia
e/ou exames parasitológicos positivos para Trypanosoma cruzi, mas não manifestam sinto-
mas, sinais físicos ou evidências de lesões orgânicas (cardíacas e extracardíacas) ao ECG e
na radiografia de tórax, bem como em outros estudos radiológicos do esôfago e cólon10,11,14,15.
Enquanto alguns pacientes permanecem nessa forma indefinidamente, 30-40% destes de-
senvolverão a forma cardíaca após um período de 30-40 anos16-18.
A forma digestiva abrange as repercussões da doença no trato gastrointestinal, den-
tre as quais sobressaem as alterações de motilidade do esôfago e do cólon, resultando
em megaesôfago e megacólon endêmicos. Verifica-se aumento do diâmetro das vísceras
ocas em proporção ao estádio evolutivo da afecção. O acometimento do tubo digestivo
resulta da destruição de células neurais do plexo mioentérico, causando distúrbios de
motilidade, acalásia do esfíncter esofagiano inferior e do complexo muscular esfincte-
riano anal19.
Tratamento
O tratamento etiológico da doença de Chagas é formalmente indicado durante a fase
aguda e também tem sido recomendado na fase crônica recente, definida com menos de 10
anos de infecção, que, na prática, é restrita a crianças em idade escolar12 .
Para a fase crônica de maior duração, o tratamento tem sido indicado na forma indetermi-
nada e nas formas cardíacas leves e digestivas. Não há evidências de benefícios, nas formas
avançadas, quanto à sua evolução clínica. A regressão de lesões inflamatórias e fibróticas, já
observada em estudos experimentais, ainda não foi confirmada na clínica. No tratamento
etiológico, quando há negativação da sorologia, na fase crônica, esta ocorre tardiamente,
após 10 ou 20 anos de tratamento15.
No Brasil, o benzonidazol é a única droga atualmente disponível para o tratamento espe-
cífico da doença de Chagas. O nifurtimox, existente na América Central, pode ser utilizado
como alternativa em caso de intolerância ao benzonidazol. No caso de falha terapêutica com
uma das drogas, apesar de eventual resistência cruzada, a outra pode ser tentada. A dose
indicada varia de acordo com a idade12,15.
Patogenia e Fisiopatologia
A história natural da cardiopatia chagásica começa quando a destruição de fibras
miocárdicas pelo processo inf lamatório e sua substituição por tecido fibroso atinge
um limite crítico, obrigando os ventrículos a se remodelarem ante a perda gradativa
dos elementos contráteis. Uma inf lamação crônica ativa, progressiva e fibrosante é
o substrato morfológico fundamental dos mecanismos patogênicos responsáveis pela
miocardite 25 . A disfunção biventricular, consequente das lesões miocárdicas, causa
inicialmente comprometimento regional, assemelhando-se ao que ocorre na cardio-
patia por obstrução coronária, mas, paulatinamente, verificam-se dilatação e hipoci-
nesia generalizada, conferindo o padrão hemodinâmico de cardiomiopatia dilatada à
cardiopatia chagásica crônica 27.
O frequente comprometimento do nó sinusal, do nó atrioventricular e do feixe de His,
por alterações inflamatórias, degenerativas e fibróticas, pode dar origem a disfunção si-
nusal e a bloqueios variados atrioventriculares e intraventriculares. Por serem estruturas
mais individualizadas, o ramo direito e o fascículo anterossuperior esquerdo são mais
vulneráveis e mais frequentemente afetados. Focos inflamatórios e áreas de fibrose no
miocárdio ventricular, especialmente em regiões posterior-lateral e inferior-basal, podem
produzir alterações eletrofisiológicas e favorecer o aparecimento de reentrada, principal
mecanismo eletrofisiológico das taquiarritmias ventriculares malignas, que acarretam
morte súbita mesmo em pacientes sem insuficiência cardíaca ou grave disfunção de ven-
trículo esquerdo27,29.
Para explicar a destruição de cardiomiócitos e a fibrose progressiva, quatro teorias prin-
cipais encontraram suporte anatomopatológico em pacientes e em modelos experimentais:
destruição direta pelo T. cruzi; teoria neurogênica, com destruição de células ganglionares
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Uso da ultrassonografia no
manejo da via aérea
Danielle Maia Holanda Dumaresq
Melina Cristino de Menezes Frota
Cibelle Magalhães Pedrosa Rocha
Luiz Augusto Carneiro Neto
Uso da ultrassonografia no manejo da via aérea
Introdução
O uso do ultrassom (US) vem ganhando cada vez mais destaque na anestesiologia mo-
derna por ser um método seguro, rápido, não invasivo e reprodutível com razoável facili-
dade. Além disso, possui inúmeras vantagens para sua utilização pelo fato de ser portátil e
oferecer imagens dinâmicas em tempo real1.
Com a disponibilidade cada vez maior nos serviços de emergência, unidades de tera-
pia intensiva e centros cirúrgicos, o ultrassom vem sendo amplamente utilizado na prática
clínica2, com o uso já bem estabelecido na anestesia regional e no auxílio para a punção
de acesso venoso central3. É importante que os anestesiologistas tenham conhecimento da
importância de sua aplicabilidade atual e futura.
O manejo da via aérea continua a ser uma das principais causas de morte e dano ce-
rebral em anestesia e em medicina de emergência 4,5 . Nos últimos anos, vários estudos
vêm demonstrando que a ultrassonografia é uma ferramenta simples, de grande im-
portância para avaliação e manejo da via aérea 6 . O método permite obter rapidamente
informações anatômicas importantes das vias aéreas que não seriam evidentes apenas
com o exame clínico2 . O uso do ultrassom tem se tornado útil como técnica não inva-
siva para avaliação de vias aéreas em anestesia, no departamento de emergência e em
cuidados intensivos 6 .
A ultrassonografia tem um largo espectro de aplicações clínicas. Dentre elas, podemos
destacar seu uso para identificar patologias de vias aéreas superiores, verificar o posiciona-
mento do tubo endotraqueal, avaliar o tamanho ideal do tubo endotraqueal, guiar a reali-
zação de traqueostomia ou cricotireoidostomia percutânea, detectar estenose subglótica e
estimar a probabilidade de estridor pós-extubação. Pode-se ainda avaliar o estado prandial
do paciente e parece ser um método promissor para identificar pacientes portadores de via
aérea difícil7,8.
Figura 1 – Corte longitudinal que mostra a via aérea superior. A seta indica a interface existente entre
tecido e ar. Na figura do meio, observa-se a imagem ultrassonográfica; na figura à direita, o esquema mostra
a área tracejada, constituída de artefatos.
Várias estruturas podem ser visualizadas pelo ultrassom convencional (Tabela 1). No
entanto, a faringe posterior e a parede posterior da traqueia não podem ser vistas, por causa
da coluna de ar intraluminal que impede a passagem das ondas ultrassonoras.
É possível observar a via aérea através do US desde o mento até a região média da tra-
queia. A pleura e o diafragma também podem ser visualizados. Técnicas específicas, como
US transesofágico ou broncoscopia, podem ser necessárias para a avaliação da traqueia e dos
brônquios em sua totalidade.
Ao avaliar a via aérea através de ultrassonografia, encontramos diferentes níveis de eco-
genicidade, a depender do tipo de tecido que constitui cada estrutura6 (Tabela 2).
Figura 2 – (A) Posicionamento transversal do transdutor convexo (baixa frequência) para visualiza-
ção do assoalho da boca e da língua. (B) Imagem ultrassonográfica resultante. (C) Sombras acústicas
decorrentes da mandíbula bilateralmente (linhas tracejadas). Superfície dorsal da língua (L). Palato duro
(linha contínua).
Figura 3 – (A) Posicionamento longitudinal do transdutor convexo (baixa frequência) para visualização do
assoalho da boca e da língua. (B) Imagem ultrassonográfica resultante. (C) Sombra acústica do mento da
mandíbula (linha pontilhada). Língua (L). Sombra acústica do osso hioide (linha tracejada). Palato duro
(linha contínua).
Laringe
Por causa da localização superficial da laringe, a ultrassonografia com transdutor de alta
frequência proporciona imagens de melhor resolução do que a tomografia ou mesmo a res-
sonância magnética10.
Porção superior da tireoide Cordas vocais verdadeiras (CV); ligamento vocal (setas); glândula
tireoide (GT)
Cartilagem cricoide Cartilagem cricoide (CC) em forma de anel com glândula tireoide
(GT) na lateral
Osso hioide
O osso hioide é um ponto de referência importante que separa a via aérea superior em duas
regiões a serem estudas pela US: supra e infra-hioide. Pode ser visto no corte transversal como
uma estrutura linear hiperecoica, na forma de um “U” invertido com uma sombra acústica
posterior2 (Figura 4).
Membrana tireóidea
A membrana tireóidea fica entre a borda caudal do osso hioide e a borda cefálica da
cartilagem tireoide. Ela é uma janela sonográfica para a visualização da epiglote. Com o
transdutor de alta frequência posicionado em um corte transverso ao nível dessa membrana
é possível visualizar a epiglote.
Epiglote
A epiglote é vista através da membrana tireóidea. Apresenta-se como uma estrutura hipoecoica
curvilínea nos cortes parassagital e transverso. Sua borda superior é delimitada pela gordura pré-
-epiglótica e sua borda inferior, por uma linha brilhante de interface ar–tecido (Figura 5). Sua vi-
sualização parece ser facilitada na abordagem transversa com movimentos de angulação variáveis
do transdutor no sentido cefálico ou caudal. A protrusão da língua ou deglutição também pode
auxiliar na identificação da epiglote pela observação de um discreto movimento na base da língua.
Figura 5 – (A) Posicionamento do transdutor linear (alta frequência) em plano transversal ao nível da membrana
tireóidea. (B) Imagem ultrassonográfica resultante. (C) Músculos infraioides (estruturas hipoecoicas, tracejadas bila-
teralmente). Espaço pré-epiglótico. Epiglote (estrutura linear hipoecoica). Interface epiglote–ar (linha hiperecoica).
Cordas vocais
A cartilagem tireoide proporciona a melhor janela para a visualização das cordas vocais,
que são vistas formando um triângulo com uma sombra traqueal no centro. As cordas vo-
cais verdadeiras aparecem como duas estruturas triangulares hipoecoicas delineadas me-
dialmente pelos ligamentos vocais, observados como duas linhas hiperecoicas. Já as cordas
vocais falsas são vistas paralelamente com uma ecogenicidade diferente, por causa de maior
quantidade de gordura, mostrando-se hiperecogênicas (Figura 6).
Figura 7 – (A) Posicionamento do transdutor linear (alta frequência) em plano sagital médio da região
cervical. (B) Imagem ultrassonográfica resultante. (C) Cartilagem tireoide (estrutura tracejada). Membrana
cricotireoide (linha contínua). Cartilagem cricoide (estrutura pontilhada). Anéis traqueais (círculos cheios).
Interface tecido–ar (linha contínua hiperecoica abaixo da cartilagem cricoide e dos anéis traqueais).
Traqueia
A localização da traqueia na linha média do pescoço facilita bastante sua visualização ultras-
sonográfica em corte transversal11. Frequentemente, os primeiros seis anéis traqueais podem
ser visualizados pelo ultrassom quando o pescoço se encontra em extensão leve. A traqueia é
coberta por pele, tecido subcutâneo, músculos infra-hioides e glândula tireoide (Figura 8).
Figura 8 – (A) Posicionamento do transdutor linear em corte transversal da região cervical acima da
fúrcula esternal. (B) Imagem ultrassonográfica resultante. (C) Glândula tireóidea (linha tracejada). Porção
anterior dos anéis traqueais (linha contínua).
Figura 9 – (A) Posicionamento do transdutor linear em corte transversal da região cervical ao nível da
cartilagem cricoide. (B) Imagem ultrassonográfica resultante. (C) Porção da glândula tireoide (linha
pontilhada). Músculo infra-hioide (superiormente); cartilagem cricoide (linha tracejada); porção anterior
dos anéis traqueais (linha contínua).
Figura 10 – (A) e (B) Imagem ultrassonográfica que evidencia a traqueia em corte transversal (círculo
maior) e a medida de seu diâmetro, envolvida anteriormente pela glândula tireoide (linha tracejada); arté-
ria carótida à direita (círculo menor).
Figura 11 – (A) Imagem ultrassonográfica que evidencia a traqueia em corte transversal antes da intubação
endotraqueal. (B) e (C) Imagem ultrassonográfica da traqueia (linha tracejada) depois da intubação endo-
traqueal, em que se pode visualizar a região anterior do tubo (linha contínua).
A confirmação indireta é feita com o transdutor na linha axilar média através da visualiza-
ção do movimento da pleura e do diafragma, evidência dinâmica que indica expansão pulmo-
nar e, portanto, posição correta do tubo endotraqueal. A avaliação deve ser feita bilateralmente
para assegurar a não seletividade do tubo. No caso da intubação esofágica, a ventilação pelo
tubo resultará em imobilidade ou movimento paradoxal do diafragma. Entretanto, com essa
forma de avaliação, o risco de broncoaspiração não será evitado.
Ambas as formas citadas podem ser superiores aos métodos tradicionais em algumas situa-
ções. O uso do ultrassom tem vantagem sobre a capnografia nas situações em que o débito car-
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Desflurano
Maria Ângela Tardelli
Daniel Capucci Fabri
Desflurano
Introdução
A popularidade dos anestésicos inalatórios decorre de sua fácil administração e da possi-
bilidade de seus efeitos serem monitorados não apenas por meio de sinais clínicos, mas atra-
vés de sua concentração expirada que fornece uma estimativa da concentração no sangue e
no sistema nervoso central.
O desflurano foi introduzido no Brasil recentemente, em 2013. Sintetizado na década de
1960, sua utilização na prática clínica ocorreu apenas em 1993, em decorrência de dificuldades
na produção e pela potência menor que os anestésicos similares. É um éter metil-etil fluorado
que difere do isoflurano por apenas um átomo. Um átomo de flúor substitui o átomo de cloro
no carbono alfa-etil do isoflurano, o que torna o desflurano totalmente halogenado com flúor.
Esse processo resulta em vários efeitos, como menor solubilidade no sangue e nos tecidos,
menor potência, maior estabilidade molecular e maior volatilidade (maior pressão de vapor)1,2.
Propriedades físicas
A Tabela 1 mostra os valores das diferentes propriedades físicas dos anestésicos halogenados1,2.
Tabela 1: Propriedades dos anestésicos voláteis
Propriedade Halotano Isoflurano Sevoflurano Desflurano
Desflurano | 127
Farmacodinâmica
Sistema Respiratório
Os efeitos respiratórios do desflurano são semelhantes aos do isoflurano, exceto pela
pungência, que é maior, por isso não é recomendado para indução, apesar de relatos de que
concentrações menores que 1 CAM não induzem irritação de vias aéreas, tosse e laringoes-
pasmo. Pacientes mais idosos ou administração de opióide são fatores que diminuem a irri-
tação; o contrário ocorre com o tabagismo. Concentrações que promovem irritação durante
a indução não são irritantes durante a manutenção com intubação traqueal ou máscara la-
ríngea2 . Semelhante aos halogenados deprime a ventilação, a resposta ventilatória à hipóxia
e à hipercarbia de modo dose-dependente. Apneia ocorre entre 1,5 e 2 CAM. A depressão
da vasoconstrição pulmonar hipóxica não tem repercussão sobre a oxigenação na ventilação
monopulmonar7. O desflurano não altera a resistência de vias aéreas em pacientes não fu-
mantes, mas pode aumentar em torno de 20% nos fumantes8. Em pacientes não fumantes, 1
CAM de desflurano tem o mesmo efeito broncodilatador que o isoflurano e o sevoflurano,
entretanto, se aumentar para 2 CAM, esse efeito não é mantido com o desflurano9.
Sistema Cardiovascular
O desflurano apresenta dois tipos de efeito no sistema cardiovascular: o direto e a res-
posta transitória consequente à ativação do sistema nervoso simpático. Os efeitos diretos
são semelhantes aos do isoflurano. Diminuem a contratilidade, o débito cardíaco e a pres-
são arterial média, de modo dose-dependente. A depressão da contratilidade é resultado
da diminuição do influxo de cálcio e a queda da pressão arterial ocorre pela diminuição
da resistência vascular periférica. A frequência cardíaca pode aumentar com concentrações
expiradas maiores que 1 CAM. O desflurano promove controle mais rápido das respostas
hemodinâmicas à estimulação cirúrgica do que o isoflurano. Não predispõe a arritmias ven-
triculares, nem sensibiliza o coração aos efeitos arritmogênicos da adrenalina.
A ativação simpática do desflurano se relaciona com a dose e com a velocidade de altera-
ção na concentração. Ocorre com concentração expirada maior que 1,25 CAM e com rápida
elevação na concentração inspirada. O resultado é o aumento transitório, por cerca de 3
minutos, da frequência cardíaca e da pressão arterial. Essa resposta pode ser prevenida por
incrementos mais lentos da concentração inspirada, assim como pela administração prévia
de opióides, clonidina ou bloqueadores beta-adrenérgicos2 .
Proteção de Órgãos
Assim como os outros anestésicos voláteis, o desflurano também promove efeito cardiopro-
tetor a insultos isquêmicos, por mecanismo semelhante ao pré-condicionamento isquêmico.
Recente meta-análise mostrou que, em pacientes submetidos à revascularização do miocárdio
com ou sem circulação extracorpórea, o desflurano reduz a incidência de infarto do miocárdio
e a mortalidade no pós-operatório, a liberação de troponina, a necessidade de inotrópicos, o
tempo de ventilação mecânica, de estadia na UTI e de permanência hospitalar16.
A resposta imunológica da ventilação monopulmonar com liberação de mediadores in-
flamatórios nos alvéolos é atenuada na anestesia balanceada com desflurano, comparativa-
mente à anestesia venosa total17.
Quanto à proteção cerebral, o aumento da concentração de desflurano para 9%, para
produzir ondas de supressão, durante a oclusão temporária da artéria cerebral média, não
altera a oxigenação do tecido cortical. O contrário ocorre com os pacientes que receberam
tiopental para a supressão, sendo evidenciada a diminuição da oxigenação cortical18.
A administração de 1,2 CAM de desflurano e sevoflurano reduziu a mortalidade de sete
dias em animais com peritonite séptica induzida por perfuração cecal19.
Desflurano | 129
Toxicidade
A não detecção de íons fluoreto e níveis mínimos de trifluoroacetato resultantes do baixo
metabolismo do desflurano implicam na ausência de nefrotoxicidade e baixa possibilidade
de hepatotoxicidade, respectivamente. O desflurano, diferente do isoflurano, não está rela-
cionado com o aumento do nível de proteína beta-amiloide no liquor, biomarcador associa-
do com doença de Alzheimer e disfunção cognitiva 20.
Uso clínico
Sugestão de Administração
O desflurano é um anestésico indicado para a manutenção de anestesia de pacientes
adultos ou pediátricos.
A manutenção do plano adequado da anestesia com o desflurano, à semelhança dos outros
anestésicos, deve considerar a CAM adequada para a faixa etária. Para o propósito de hipnose,
manter a fração expirada em 0,7 CAM de anestésico volátil tem a mesma eficácia que a mo-
nitorização com o BIS para prevenir a consciência intraoperatória21. No paciente adulto, para
atingir esse objetivo, pode-se utilizar a regra dos 6-6-6, ou seja, após a indução da anestesia,
iniciar a manutenção com o vaporizador do desflurano em 6% (1 CAM), com fluxo de gases
(FG) (oxigênio/ar) de 6 L.min-1, durante 6 minutos. Depois desse tempo, passar o FG para 1
L.min-1 e manter o vaporizador em 6%. Utilizando o simulador Gasman®, observa-se que, nesse
esquema, o equilíbrio entre a fração expirada do desflurano e sua concentração nos tecidos ri-
camente vascularizados (TRV) se estabelece aos 10 minutos com valor ao redor de 4%, o que
significa aproximadamente 0,7 CAM. Se a opção for utilizar FG de 1 L.min-1 desde o início da
administração do desflurano, iniciar com o vaporizador em 12% por 6 minutos e então dimi-
nuir para 6%. Nesse esquema de administração do desflurano o equilíbrio entre fração expirada
e TRV também ocorre em 10 minutos, com valor ao redor de 3,5%. A fração expirada de 4% é
atingida aos 30 minutos. Se houver a necessidade de aprofundar o plano anestésico, recomenda-
-se aumentar a concentração liberada pelo vaporizador para 9% e o FG para 6 L.min-1 durante
1 a 2 minutos e então retornar o FG para 1 L.min-1; passados mais 2 a 3 minutos, retornar a
concentração do vaporizador para 6%. Se esse esquema for associado ao óxido nitroso, deve ser
considerado o efeito aditivo desse inalatório sobre a CAM do desflurano.
Se a opção for atingir rapidamente e manter a fração expirada em 1 CAM, outras técnicas
são sugeridas22 .
Recuperação da Anestesia
À semelhança dos outros voláteis ao término da anestesia, após desligar o vaporizador de
desflurano, é interessante aumentar o FG para 6 a 8 L.min-1 para acelerar a recuperação.
Estudos clínicos têm demonstrado que a recuperação com o desflurano apresenta tempo
de despertar e de retirada da cânula traqueal menor e mais previsível quando comparado
com isoflurano, sevoflurano e propofol7.
A rápida recuperação do plano anestésico com o desflurano implica alguns cuidados
que devem ser observados, como assegurar que a analgesia pós-operatória esteja efetiva ao
despertar e desligar o vaporizador após o término da cirurgia e dos curativos e quando há
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Bem-estar ocupacional
em anestesiologistas
Gastão Fernandes Duval Netos
Bem-estar ocupacional em anestesiologistas
Introdução
Inicialmente, é importante ressaltar que é de suma de importância a caracterização do
tema central deste capítulo, que é o bem-estar ocupacional. Para tanto, se torna necessária
sua definição. Bem-estar ocupacional em medicina foi definido pela Organização Mun-
dial da Saúde, em 2005, como: “A percepção individual do médico, de sua posição na vida,
incluída em um contexto cultural e em um sistema de valores, no qual sejam ponderadas
suas relações de gratificação, expectativa, conceito e crítica pessoal.”1
Por outro lado, outra definição pode ser aplicada ao termo: “Como me sinto mentalmente,
fisicamente e psicologicamente em cada momento de todos os dias, relativamente a minha ati-
vidade ocupacional, a minhas relações de convivência e ao meio ambiente profissional no qual
convivo?” A maneira de responder a essa questão pode ser por meio de uma análise introspectiva
sobre as dificuldades individuais e frustrações do profissional da anestesiologia no manejo das
situações ocupacionais consideradas estressantes ou se uma síndrome depressiva psicogênica já
se instalou, pelo fato de o profissional estar constantemente submetido a condições ocupacionais
estressantes (caráter de individualidade na capacidade de percepção do estresse ocupacional).
A situação de bem-estar ocupacional de um profissional da área da saúde é o entendi-
mento individualizado do efeito positivo ou negativo de fatores a que ele está submetido
durante a rotina da prática clínica.
O professor Hans Hugo Selye, em sua abordagem sobre a capacidade individual de esta-
bilização adaptativa, descreveu o estresse como a própria destruição insidiosa, resultado de
acumulativa fonte de depressão psíquica interna. Dessa maneira, é essencial entender que
cada um de nós possui seu limiar interno de capacitância para lidar, de maneira saudável,
com esse fenômeno. É importante compreender, com profundidade, que, por essa capaci-
dade possuir características de individualidade, não é comparativa com a de outros indiví-
duos submetidos à mesma situação; por causa disso, as atitudes gerais de estabelecimento
de condutas em relação à atividade clínica devem respeitar esse tipo de característica de
individualidade do profissional submetido às mesmas diretrizes, regimentos etc.2
Conclusões24-32
Como foi visto anteriormente, a literatura médica tem evidenciado, ao longo do tempo,
que o ambiente de trabalho dos profissionais da área da saúde, incluindo o dos médicos
anestesiologistas, apresenta nível de estresse bem mais elevado, quando comparado com o
ambiente de outras atividades profissionais.
Esse grupo de profissionais (anestesiologistas) está constantemente exposto a situações
ocupacionais com elevado número de fatores estressantes, como sobrecarga de trabalho;
pressões sociais intensas; perda do papel claro de suas funções e limites; clamor afetivo cons-
tante do enfermo; possibilidade de acidentes no desempenho de suas funções (acidentes
perfurocortantes); contaminação por doenças infectocontagiosas; desvalorização de suas
opiniões e reivindicações. Esses fatores estressantes, físicos ou psíquicos, geram o aumento
de situações de erro médico e incidentes críticos no atendimento médico por parte desse
grupo de profissionais. Frequentemente, esse fato tem como fator etiológico as alterações
psíquicas patológicas do profissional, com consequentemente diminuição da segurança do
paciente cirúrgico.
Por sua vez, tem sido evidenciada a importância da intervenção de instituições ligadas
ao atendimento médico e dos próprios médicos no sentido de mudar essa situação, ou seja,
diminuir o elevado estresse ocupacional e suas patológicas consequências. Embora a inter-
venção institucional deva ser a preferencial no sentido de modificar a situação em pauta,
a ação combinada entre as instituições e os profissionais da área (médicos e enfermeiros)
mostra resultados positivos mais consistentes e permanentes, tanto no diagnóstico como na
profilaxia e no tratamento de seus componentes.
Responsabilidade individual
• Deverão estar alertas aos pontos frágeis de sua saúde que podem impactar em
vida profissional.
• Estar constantemente alerta para a qualidade de seu bem-estar ocupacional.
• Procurar por auxílio especializado se alterações na saúde forem detectadas.
• Estar constantemente alerta para o fenômeno de fadiga ocupacional, principalmente
se resultar em uma prática clínica insegura – informar o fato à instituição ou ao de-
partamento responsável.
• Evitar regimes de trabalho que resultem em fadiga.
• Aceitar o limite ou a modificação de seu regime de trabalho quando ele pode pôr em
risco a segurança dos pacientes.
• Manter um adequado seguro (suporte) no caso de impedimento da prática médica
por alteração de saúde ou do bem-estar ocupacional.
Responsabilidade institucional
O termo instituição se refere às autoridades da área da saúde ou da administração de
hospitais, faculdades e/ou departamentos de anestesiologia que possuam influência execu-
tiva na prática da especialidade, visando ao desempenho da especialidade em um ambiente
de bem-estar ocupacional.
• As instituições deverão ter controle e abordagem efetiva na promoção do bem-estar
ocupacional do anestesiologista que contemplem as diferentes necessidades dos pro-
fissionais (carácter de individualidade).
• As instituições devem possuir um sistema de suporte ao anestesiologista que procura
por auxílio para sua saúde física ou psíquica.
• A instituição deve promover assistência à saúde do médico de maneira confidencial.
• A instituição deve promover a assistência, se possível, em outra estrutura que não a
de origem do profissional enfermo.
• A instituição não deverá ser obrigada a promover suporte ao anestesiologista que se
nega ao atendimento proposto.
• A instituição deverá promover um ambiente ocupacional compatível com a manu-
tenção do bem-estar ocupacional dos profissionais atuantes na área – períodos de re-
pouso em ambientes adequados, alimentação saudável e uma sequência de plantões
que não resultem em excessive fadiga.
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Experiência e desafios na
implantação de um programa
de analgesia de parto em
uma maternidade pública no
nordeste do Brasil
Cláudia Regina Fernandes
Antônia Maria de Carvalho
Geraldo Gonçalves da Silveira
Experiência e desafios na implantação de um
programa de analgesia de parto em uma maternidade
pública no nordeste do Brasil
Os passos percorridos
Com base na motivação intrínseca de uma anestesiologista funcionária pública da
Universidade Federal do Ceará, com aprovação do comitê de ética da instituição, inicia-
ram-se o desenvolvimento e a implantação do programa de analgesia de parto mediante
os seguintes passos:
1. Buscou-se apoio dos gestores, pois, para a efetuação de qualquer mudança no status
vigente, é necessário o apoio político das forças que estão no poder de decisão. Então,
no dia 13 de julho de 2010, com a autorização da direção da MEAC e dos obstetras
de plantão e o consentimento das parturientes, foram realizadas quatro analgesias de
parto, juntamente com os residentes de anestesiologia da instituição12.
2. Iniciou-se um processo de sensibilização da equipe multiprofissional. Em se-
tembro de 2010, o fórum de discussão intitulado Analgesia de Parto: Proposta
Definitiva de Parto Humanizado, cujo objetivo foi discutir, de forma interdisci-
plinar, as repercussões do trabalho de parto e a analgesia de parto, foi realizado.
Foram discutidos temas relacionados com as alterações fisiológicas do trabalho
do parto e a fisiopatologia do estresse exacerbado; a definição de parto huma-
nizado; repercussões fetais do estresse durante o trabalho de parto; indicações
para a analgesia e técnicas mais utilizadas de analgesia de parto; possíveis com-
plicações decorrentes da analgesia e planejamento para a estruturação de proto-
colos para o desenvolvimento de um programa de analgesia de parto no Centro
de Parto Humanizado da MEAC.
3. Realizou-se um planejamento integrado com os setores envolvidos na implantação
do programa, com discussão orçamentária com os gestores, mediante descritivo de
necessidade de recursos humanos e recursos materiais, baseado na média do núme-
ro de partos vaginais praticados por mês. Após aprovação orçamentária dos recursos
materiais, ocorreram encontros com os responsáveis pela farmácia, que resultaram
na confecção de kits padronizados para a analgesia de parto, e reuniões de planeja-
mento com a chefia de enfermagem da sala de parto, a fim de definir e organizar o
material e treinamento de profissionais de enfermagem para auxílio durante o pro-
cedimento. Não houve necessidade de aquisição de materiais diferentes dos que já
existiam na MEAC para anestesia em obstetrícia.
4. Construção de protocolo (se encontra no final deste capítulo) – um grupo de anes-
tesiologistas da MEAC, juntamente com a autora do projeto, discutiu e construiu
um protocolo pormenorizado, em que descreve a importância do relacionamento
A humanização no parto
Embora a analgesia de parto seja uma intervenção descrita no mundo há mais de um sé-
culo, era uma estratégia relativamente nova para alguns profissionais da maternidade, então,
foi importante a compreensão de alguns profissionais de que o processo de humanização no
parto, além do acolhimento e do afeto, traz em conjunto a possibilidade de as parturientes
optarem por um parto sem dor. A humanização requer a implementação de um processo
interdisciplinar reflexivo acerca dos princípios e valores que regem a prática de diferentes
profissionais de saúde em busca de sua dimensão ética. Falar em humanização no ambiente
hospitalar pressupõe, além de tratamento digno, solidário e acolhedor por parte dos tra-
balhadores a seu principal alvo de trabalho – o doente/ser fragilizado –, uma nova postura
ética e relacional que permeie todas as atividades profissionais e processos de trabalho ins-
titucionais. Logo humanização significa considerar a essência do ser humano, o respeito
à individualidade e às diferenças profissionais, bem como a necessidade da construção de
um espaço concreto nas instituições de saúde o qual legitime o aspecto humano de todas as
pessoas envolvidas na assistência16.
A construção de uma nova práxis no espaço interdisciplinar, norteada por princí-
pios éticos e humanitários, desenvolve-se, basicamente, por meio do processo dialógico
e reflexivo. O diálogo, no entanto, não significa somente ouvir o outro, mas desafiá-lo,
problematizando a situação existencial, para uma possível transformação da realidade.
O diálogo não pode ser caracterizado como um ato passivo ou parcial, já que exige um
entrar sensível no mundo do outro, histórico e cultural, para compreender o movimento
dinâmico que se estabelece em torno do sujeito. É fundamental compreender e valorizar
a dimensão histórica e, ainda, notar que toda cultura que poderia ser considerada arcaica
e primitiva contém, nela própria, uma mistura de sabedoria, de verdades profundas, de
conhecimentos, erros e superstições17.
Na construção da implantação do programa de analgesia da MEAC, buscou-se a cons-
cientização de que o alívio da dor está inserido no contexto da humanização da assistên-
cia ao parto18. E, aos poucos, demonstrou-se a satisfação das pacientes com o alívio da
dor19, obtendo-se o apoio de enfermeiras, auxiliares de enfermagem, obstetras, residentes,
Desafios
Compreende-se que muito ainda se tem a avançar. A MEAC realiza, em média, 500 par-
tos por mês, e aproximadamente 250 são partos vaginais. Sabendo-se que ainda não se che-
gou aos 30% de analgesia para partos normais praticados na instituição, ainda se tem muito
a perseverar. Os objetivos a serem alcançados são: maior conscientização dos obstetras
sobre as possibilidades e os benefícios do parto vaginal com analgesia; maior envolvimento
dos anestesiologistas que atuam no período noturno e nos finais de semana; esclarecimento
da gestante nas consultas pré-natal 22 ou mesmo na sala de espera para referidas consultas23,
da possibilidade de um parto sem dor, ou seja, permanente educação continuada e contínua
monitorização e avaliação dos processos, no que diz respeito à vontade, à escolha da mulher,
fazendo desta a maior protagonista do parto já no período pré-natal.
Conclusões
Mediante motivação profissional, apoio dos gestores, análise estratégica das condições
de trabalho, planejamento, elaboração de um plano de ação, monitoramento e avaliação das
ações é possível estruturar e implantar um programa de analgesia de parto em uma materni-
dade escola pública, com grandes perspectivas de torná-lo sólido e perene.
Agradecimentos
À professora Zenilda Vieira Bruno, professora associada IV de ginecologia e obstetrícia
da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará, e ao professor Carlos Augusto
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Disritmias cardíacas
e anestesia
Marisa Pizzichini
Luiz Fernando dos Reis Falcão
João Hermínio Pessoa dos Santos
Disritmias cardíacas e anestesia
Introdução
A ocorrência de disritmia cardíaca (ou arritmia cardíaca) no perioperatório é um
evento relativamente comum, podendo o ato anestésico funcionar como gatilho para seu
aparecimento. Muitas disritmias são de caráter benigno e não necessitam de tratamento.
Se incorretamente tratadas, podem causar lesão adicional ao paciente, complicando o ato
anestésico-cirúrgico.
O conhecimento da eletrofisiologia cardíaca, o reconhecimento das disritmias e a
utilização correta das medicações antidisrítmicas e dos novos anticoagulantes, quando
necessário, são de extrema importância para o anestesiologista e a condução adequada
da anestesia.
Drogas antidisrítimicas
Os antiarrítmicos são habitualmente divididos em quatro classes, segundo suas princi-
pais propriedades eletrofisiológicas. Essa classificação proporciona um ponto de partida útil
para analisar os mecanismos envolvidos, entretanto, não é raro que determinada substância
de uma classe apresente ações interligadas ou típicas de outra classe. Além disso, algumas
medicações não se encaixam nessa classificação, que data de 1970 e é conhecida como clas-
sificação de Vaughan & Williams (Quadro 1).
Substâncias da Classe I
Apresentam como característica o fato de se coligarem a canais de Na+, voltagem e
tempo dependentes, inibindo-os. De acordo com a intensidade do bloqueio, são subdi-
vididos em IA, IB e IC, sendo moderados, fracos e fortes depressores da velocidade de
condução, respectivamente.
Classe IA
Quinidina, procainamida e disopiramida se equivalem em suas ações e são, hoje em dia,
muito pouco utilizadas. Apresentam importante potencial arritmogênico ao prolongarem o
intervalo QT do ECG, com consequente aumento na incidência de taquicardia ventricular
do tipo Torsades de Pointes. Quinidina e disopiramida estão disponíveis apenas para uso
oral, compartilham efeitos anticolinérgicos secundários, sobretudo no nódulo AV, e poten-
cial inotrópico negativo, esse mais intenso com a disopiramida. Apresentam razoável poten-
cial na reversão da fibrilação atrial, sobretudo a quinidina, mas não são drogas de primeira
linha, sendo substituídas por agentes da classe IC, propafenona e novas drogas.
A procainamida, por via intravenosa, eventualmente é utilizada na reversão da taqui-
cardia por reentrada na via acessória na forma antidrômica e na reversão da fibrilação atrial
em pacientes portadores de Wolf-Parkinson-White (WPW). A dose de 15 mg/kg, diluída
em 100 ml de SF0 9% e infundida num período de 30 minutos, é seguida por uma infusão
contínua de 1 a 4 mg/min.
Classe IB
A lidocaína como antiarrítmico é utilizada por via intravenosa ocasionalmente em dis-
ritmias ventriculares relacionadas a pós-infarto agudo do miocárdio, intoxicação digitálica
e cirurgia cardíaca, sendo ineficaz em disritmias supraventriculares. A lidocaína é adminis-
trada em bólus intravenoso de 1 a 1,5 mg/kg. As injeções devem ser dadas em intervalos de
5 a 8 minutos, quando necessário, numa dose total de 1,5 a 3 mg/kg. Quando há resposta
terapêutica, uma infusão de 1 a 4 mg/min deve ser iniciada para a manutenção da concen-
tração efetiva. Doses menores devem ser utilizadas em pacientes idosos e naqueles com
Substâncias da Classe IV
A característica do grupo é bloquear os canais de Ca++ voltagem dependentes do tipo L,
responsáveis pela fase 0 nos tecidos de resposta rápida.
Verapamil
Diferentemente dos derivados di-idropiridínicos (nifedipina, anlodipina), que se ligam
mais aos canais do tipo L da musculatura lisa dos vasos, o verapamil se coliga aos canais
de Ca++ do tipo L, presentes no tecido cardíaco. Dessa forma, é esperada uma ação volta-
da para os tecidos de resposta lenta. Assim, o verapamil deprime o automatismo sinusal
ao diminuir a despolarização diastólica lenta, reduz a velocidade de condução e prolonga
a refratariedade do nódulo AV. O resultado é a bradicardia. É um agente muito eficaz na
reversão da taquicardia atrial. Por via oral pode ser utilizado na profilaxia das taquicardias
supraventriculares, com exceção daquelas associadas à via AV acessória. É bem absorvido,
mas apresenta metabolismo de primeira passagem hepática de quase 80%, o que reduz bas-
tante sua biodisponibilidade. A dose oral habitual é de 80 mg a cada 6 ou 8 horas. A dose
habitualmente utilizada por via intravenosa, em pacientes adequadamente monitorizados, é
de 5 mg em injeção lenta de 3 a 5 minutos. Pelo bloqueio dos canais de Ca++, apresenta efeito
inotrópico negativo bem definido, que limita seu uso a pacientes selecionados.
Principais disritmias5
Taquicardia Atrial Multifocal (TAM)
A frequência varia de 110-200 bpm, resultante de disparos aleatórios de vários focos
ectópicos dentro do átrio. Quando a frequência está abaixo de 100 bpm, denomina-se
marca-passo atrial mutável. Características (Figura 2): 1) ritmo irregular; 2) intervalos
PR e PP variáveis; 3) morfologia da onda P variável, pelo menos três diferentes, e 4) QRS
de duração normal. Está associada a pneumopatias na maioria dos casos, podendo ser
causada por descompensação cardíaca ou respiratória, tromboembolismo pulmonar, alte-
rações eletrolíticas e pacientes tratados agressivamente com β-agonistas e teofilina. Pode
evoluir para fibrilação atrial. O tratamento pode ser feito com verapamil, betabloqueador
e magnésio. Evitar digitais.
Disritmias Ventriculares5
Contração ventricular prematura
A reentrada do impulso elétrico ou o foco ectópico que origina o complexo prematuro locali-
za-se no miocárdio ventricular. Se apresentar a mesma forma no ECG, deve ser denominada mo-
nomórfica e, se tiver diversas formas, polimórfica (Figura 3). De acordo com sua inter-relação,
pode ser classificada como isolada, pareada, em salva, bigeminada, trigeminada, quadrigeminada
etc. As extrassístoles ventriculares podem ser estreitas (QRS < 0,12 s) e largas (QRS > 0,12 s).
Polimórfica
Ritmo ventricular com QRS de morfologia variável, pelo menos dois complexos QRS
têm morfologias diferentes na mesma derivação do ECG e frequência superior a 100 bpm.
Deve ser classificada também em sustentada e não sustentada se o período da disritmia for
superior ou inferior a 30 segundos, respectivamente. Possui conduta baseada na existência
prévia de intervalo QT longo e ocorrência de Torsades de Pointes (TdP).
Flutter ventricular
Observam-se contrações eficazes de fibra ventricular e débito cardíaco que permitem
a sobrevida, ainda que por tempo limitado. Entretanto, o mais comum é a evolução para a
fibrilação ventricular.
Aberração de Condução
Um estímulo supraventricular encontra dificuldade de propagação regional no sistema
de condução, gerando um QRS com morfologia de bloqueio de ramo.
Figura 7 – WPW com ritmo sinusal e entalhe na onda delta (flecha) no ramo ascendente positivo do
complexo QRS.
Bloqueio atrioventricular
O período do início da onda P ao início do QRS determina o intervalo PR, tempo em
que ocorrem a ativação atrial e o retardo fisiológico na junção atrioventricular (AV), cuja
duração é de 0,12 a 0,20 s.
Figura 11 – Bloqueio cardíaco de terceiro grau (BAVT). Ondas P regulares em 50 a 55 bpm; “ritmo de esca-
pe” ventricular regular em 35 a 40 bpm; não há relação entre as ondas P e o ritmo de escape.
Taquicardia sinusal
Na taquicardia sinusal é observada à morfologia normal dos complexos do ECG. A
frequência cardíaca encontra-se acima de 100 bpm. Essa disritmia pode ser causada por
hipovolemia (mais frequente), hipóxia, hipercarbia, dor, febre, sepse e aumento do metabo-
lismo. O tratamento é a correção da causa base. Fármacos com atividade parassimpática ou
β-bloqueadores podem ser utilizados eventualmente no controle da frequência cardíaca em
pacientes com doença coronariana ou estenose mitral.
Disritmia sinusal
Na disritmia sinusal observa-se morfologia normal dos complexos do ECG. Contudo, o
intervalo RR é variável. A frequência cardíaca encontra-se dentro dos limites normais. Esse
tipo de disritmia não requer tratamento.
Eventos Ectópicos
Contração atrial prematura
A extrassistolia atrial com condução normal é observada como uma onda P prematura
e achatada. O intervalo RR é variável entre o complexo normal de base e a contração atrial
Disritmias supraventriculares
Ritmo juncional
No ritmo juncional observa-se frequência cardíaca que varia entre 40 e 110 bpm. Ritmo
originado no nó atrioventricular, sem onda P ou com onda P invertida (após o QRS pela con-
dução retrógrada aos átrios). Complexo QRS, intervalo ST, onda T e intervalo RR são normais.
Constitui ritmo comum durante o período de anestesia, principalmente quando se em-
prega halotano. De forma rotineira, não é necessário tratamento; caso ocorra deterioração
hemodinâmica, pode-se bloquear o tônus parassimpático com atropina ou mesmo utilizar
vasopressores simpatomiméticos como a efedrina.
Taquicardia supraventricular (TSV)
Na taquicardia supraventricular, a frequência cardíaca pode chegar a 250 bpm. As ondas
P são anormais. Entretanto, elas são usualmente coincidentes com o QRS ou precedem as
ondas T de forma não discernível. O QRS é normal, a menos que haja condução aberrante,
caso em que um padrão de bloqueio de ramo direito está presente. É desafiadora a distinção
entre a TSV com aberrância de condução e a taquicardia ventricular.
Os mecanismos responsáveis pelo aparecimento e pela perpetuação das taquiarritmias
são a reentrada, o automatismo e a atividade deflagrada. A condição para o desencadea-
mento dessa disritmia pode refletir doença da válvula mitral, síndrome de Wolff-Parkinson-
-White ou doença cardíaca coronariana, hipertensiva ou congênita. Fatores precipitantes
pré-operatórios incluem ansiedade, fumo, álcool e cafeína. Os fatores precipitantes periope-
ratórios são a hipóxia e os anestésicos.
Flutter atrial
O flutter atrial se apresenta com frequência atrial de 250 a 350 bpm e onda P com padrão
serrilhado (onda F). O complexo QRS é normal, podendo ser vista condução aberrante. As
causas mais comuns são: doença da válvula mitral; tireotoxicose; doença miocárdica; hipóxia
ou sequelas de cirurgias cardíacas. As drogas antiarrítmicas do tipo IA podem interromper
o flutter. A cardioversão apresenta alta taxa de sucesso, levando ao ritmo sinusal normal. Di-
goxina, propranolol e verapamil interrompem ocasionalmente a disritmia, mas, comumente,
aumentam o grau de bloqueio AV, lentificando a frequência ventricular.
Indicação para cardioversão elétrica e farmacológica. Escolha das drogas antiarrítmicas para a cardioversão
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Conclusão
A eletrofisiologia cardíaca varia de forma dinâmica em resposta a influências externas,
como tônus autonômico, equilíbrio eletrolítico e ácido base, isquemia ou estiramento do
miocárdio. Portanto, um coração normal pode apresentar, como resposta, alterações no
potencial de repouso, na velocidade de condução, nas concentrações de cálcio intracelular
e na repolarização, qualquer uma das quais pode criar disritmias ou alterar a resposta à
terapia antiarrítmica.
As disritmias cardíacas são causas importantes de complicação perioperatória, que pode
decorrer de etiologia primária ou de causas reversíveis. Deve ser prevenida pelo reconheci-
mento dos fatores de risco, monitorização adequada, escolha criteriosa de fármacos e remo-
ção de eventos precipitantes como hipóxia, acidose, distúrbios eletrolíticos e isquemia do
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Introdução
Lombalgia (dor lombar baixa) é definida como dor localizada na região inferior do dorso,
em uma área situada entre o último arco costal e a prega glútea, acompanhando ou não de
irradiação da dor para os membros inferiores1,2 . Quando irradia para o membro inferior até
um ponto distal ao joelho, denomina-se lombociatalgia2 . Pode ser definida também quanto
de acordo com a duração do episódio em: aguda, menos de 6 semanas; subaguda, entre 6 e 12
semanas; crônica, 12 semanas ou mais2,3.A dor lombar aguda pode se originar dos discos e
articulações intervertebrais, ligamentos e músculos. Espasmo muscular está frequentemen-
te associado. É a segunda causa mais frequente de procura ao médico no serviço de urgência,
ficando atrás apenas da gripe/resfriado. Acomete 80% da população em algum momento de
suas vidas. Noventa por cento desses pacientes melhorarão sem qualquer intervenção em 4
a 7 dias. O manejo inicial deve ser o mais simples, reservando tratamentos mais complexos
para os pacientes que não respondem.Analgésicos simples (paracetamol e dipirona, 1g a
cada 6hs) e em seguida (se não suficiente), os aintiinflamatórios não esteroidais (AINEs)
devem ser prescritos para alívio da dor. Orientações sobre o problema, auto cuidado, manter
se fisicamente ativo, tratamento e prognóstico devem ser oferecidas a todas as pacientes.
Evitar grandes esforços e mesmo repouso no leito por curto intervalo de tempo (2 a 4 dias),
nos casos de sintomas iniciais muito intensos também são recomendações comuns. O pa-
ciente deve ser reavaliado em 1 semana. Nesse periodo, a maioria terá melhorado. Caso isso
não ocorra, relaxantes musculares, TENS, terapia térmica, fisioterapia também podem ser
recomendados. Opióides fracos e, se insuficientes, fortes podem ser prescritos. 2-8.
Lombalgia e ciatalgias
A dor lombar crônica constitui uma causa freqüente de morbidade e incapacidade, sendo
sobrepujada apenas pela cefaléia na escala dos distúrbios dolorosos que afetam o homem.
Apenas em 15% dos casos consegue-se determinar precisamente a estrutura responsável
pela dor3,4,6. Diversas estruturas podem ser fonte de dor na coluna lombar: ânulo fibroso,
núcleo pulposo, facetas articulares, articulação sacroilíaca / ligamentos, dura mater, liga-
mentos espinhais, nervosespinhais, gânglio da raiz dorsal. As dificuldade da abordagem das
lombalgias e lombociatalgias decorrem de vários fatores, dentre os quais: a inexistência de
uma fidedigna correlação entre os achados clínicos e os de imagem; ser o segmento lombar
inervado por uma difusa e entrelaçada rede de nervos, tornando difícil determinar com pre-
cisão o local de origem da dor, exceto nos acometimentos radículo-medulares3. Tais fatos
fazem da caracterização etiológica da síndrome dolorosa lombar um processo eminente-
mente clinico, 3deixando os exames complementares para alguns casos especiais, confirma-
ção diagnóstico ou quando há possibilidade de cirurgia ou bloqueios.
Os bloqueios diagnósticos, sim, quando associados à avaliação clínica e de imagem podem
aumentar para 85% a chance de um correto diagnóstico da estrutura dolorosa, permitindo
um tratamento mais específico. Devem ser usados sempre que se propõe procedimentos in-
Dez por cento dos pacientes apresentam persitência do quadro por mais de 12 semanas,
tendo seu processo doloroso cronificado. Os fatores psicossociais são importantes nesse
processo. A identificação de fatores de risco2,3,8 (Yellow flags) é fundamental para a aborda-
gem agressiva desses, incluindo terapia cognitivo-comportamental 2 . – Tab 2.
Tabela 2 Bandeiras Amarelas na Avaliação da Dor Lombar
Crença de que a dor nas costas é potencialmente nociva ou gra-
Atitudes e comportamentos
vemente incapacitante. Altas expectativas no tratamento passi-
inadequados frenta a dor
vo. Cinesiofobia: medo, evitação, níveis reduzidos de atividades.
Ganhos secundários Insatisfação no trabalho
Depressão, ansiedade, estresse, tendência ao desânimo, reclu-
Problemas emocionais
são social.
obesidade, tabagismo, grau de escolaridade, realização de traba-
Outras causas lhos pesados, sedentarismo, fatores genéticos e antropológicos,
hábitos posturais.
Dor radicular
Dor radicular lombossacra (também referida como ciática ou isquiática)8 é caracterizada
por dor que irradia por um ou mais dermátomo sacral ou lombar; podendo ou não ser acom-
panhado de outros sintomas radiculares como deficit de força ou sensitiva, nesses casos,
radiculopatia. Parestesia frequentemente está associada.7,8. A taxas de prevalência anualde
dor radicular na população geral é alta: 9,9-25%. É a condição mais comum de dor neuropá-
tica. A dor resolve completamente ou parcialmente em 60% a 80% dos pacientes dentro de 6
a 12 semanas do início dos sintomas. Entretanto, 30% mantém dor por 3 meses a 1 ano. As
mulheres parecem ter pior prognóstico em relação aos homens (odds 3,3 para dor crônica).
Em pacientes com menos de 50 anos, a hérnia de disco é a causa mais frequente. Após os
50 anos de idade, as causas mais frequentes de dor radicular são as alterações degenerativas
(estenose do forame intervertebral)8.
A dor pode ser causada por irritação, inflamação e/ou compressão da raiz nervosa8. Os
sintomas da hérnia de disco são resultado da herniação do núcleo pulposo sobre um ânulo
fibroso mecanicamente fraco O paciente descreve sua dor como penetrante, latejante ou em
queimação. A dor causada por hérnia de disco classicamente piora com a inclinação do tronco
para frente, ao acentar e ao tossir. De forma contrária, a dor radicular resultante de esteno-
se de canal espinhal, tipicamente, aumenta ao caminhar e melhora imediatamente ao fletir
o tronco8. A distribuição dos sintomas ao longo
de um dermátomo ajuda a determinar o nível
envolvido (Fig 1), embora haja grande variação
no padrão irradiação7,8. O dermátomode S1 é o
mais reproduzível. Quando presente, a distri-
buição da parestesia é mais específica8.
O teste de Lasègue verifica a mobilidade da
dura mater e da bainha dural sobre as raizes
de L4 a S2. A sensibilidade para o diagnóstico
de hernia de disco lombar varia de 0,6 a 0,97
com especificidade de 0,1 a 0,6. Espera-se re-
produzir os sintomas do paciente em decubito
ventral fletindo o membroinferior (joelho ex-
tendido) ao extender a o membro acometido
em 15 a 60 graus (Fig2).
Fig 1 – Representação dos dermátomos lombossacros.
Evidências
O acesso ao espaço peridural para injeção de fármacos para o alivio da dor decorrente
das doenças da coluna vertebral, apresentam vantagens e desvantagens com resultados va-
riados. Embora a dor por nocicepção seja a mais comum, freqüentemente são observados
doentes com radiculopatia e podem ser encontrados tanto na fase aguda quanto crônica 28.
O diagnóstico nosológico da doença é importante, como nocicepção, neuropatia, mielopa-
tia e miofascial, para que ocorram abordagens e medidas adequadas intervencionistas ou
farmacológicas (multimodal).
Manchikanti L et al, trataram lombalgia inespecífica sem hérnia de disco, sem doença
das facetas articulares ou radiculopatia, com injeção de lidocaína com corticóide ou somen-
te anestésico local por via peridural sacral, lombar ou interlaminar e observaram redução da
dor com melhor condição funcional em 50% dos doentes durante um ano29,30.
Após dois anos, observaram redução dos escores de dor e atividade funcional maior ou
igual a 50% em 72% dos doentes submetidos a injeção peridural lombar com lidocaína e, em
67% dos doentes que receberam injeções com corticóide31.
Doentes com historia recente de 6 a 12 semanas por compressão radicular foram subme-
tidos as cirurgias e obtiveram alivio da dor mais rápidos do que os doentes submetidos aos
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Introdução
A adequada ventilação sob máscara facial é a mais importante e fundamental habilidade
para o manuseio seguro das vias aéreas durante a indução anestésica. Por vezes, há dificulda-
des com a ventilação, contornadas, na grande maioria dos casos, com manobras de liberação
das vias aéreas e inserção de cânulas orofaríngeas ou nasofaríngeas. No entanto, em raras
situações, pode haver impossibilidade não prevista de ventilação sob máscara, com poten-
cial para complicações fatais. Por essa razão, muitos preferem administrar os bloqueadores
neuromusculares (BNM) após a confirmação da adequada ventilação sob máscara facial.
No entanto, a eficácia e a justificativa para essa prática1 são questionáveis, com fraca base
científica. Os trabalhos mostram que o uso dos BNM não torna a ventilação sob máscara
mais difícil2, ao contrário, a facilita3. Na publicação de Kheterpal e col.4, uma revisão de 50
mil anestesias, nos 77 pacientes nos quais foi impossível a ventilação sob máscara facial, 73
foram intubados com o uso de BNM.
Após o uso das doses plenas dos agentes indutores, sem a adoção dos BNM, o tempo para
que o paciente reassuma a ventilação espontânea poderá não ser rápido o suficiente para
que não ocorram danos associados à grave hipoxemia. O uso de doses menores de agentes
anestésicos venosos permitiria escape precoce. Por outro lado, a dificuldade na ventilação
poderia se dar pela inadequação do plano anestésico, caracterizando um risco para a venti-
lação sob máscara facial difícil5.
Há várias publicações que descrevem boas condições de intubação traqueal com aneste-
sia venosa total ou inalatória. A maioria não compara o grupo com e sem BNM e, quando o
faz, as condições de intubação são mais favoráveis com os BNM6. Na verdade, parece que a
não utilização dos BNM está associada à maior dificuldade de intubação e ao desconforto
pós-operatório para o paciente por lesões nas vias aéreas, as quais configuram as principais
queixas contra anestesistas – dados do Closed Claims Analisys7.
Combinação de BNM
O princípio dessa técnica consiste na atuação pré-sináptica do primeiro BNM, para
inibir a mobilização e a liberação de acetilcolina. A seguir, o segundo BNM teria sua ação
facilitada nos receptores pós-sinápticos. Uma propriedade dos BNM é a afinidade variável
pelos receptores pós e pré-sinápticos.
Do ponto de vista farmacológico, podemos classificar os BNM não despolarizantes
de acordo com a estrutura química em benzilisoquinoleínicos e aminoesteroides. As
associações entre BNM acarretam efeito aditivo (agentes de mesma estrutura química)
ou sinérgico (agentes de estrutura química diferente), porém de intensidade imprevisí-
vel. Para alcançar 95% de bloqueio, basta somente um quarto da ED95 de cada fármaco
administrado conjuntamente, por exemplo, cisatracúrio 0,0125 mg/kg-1 com rocurônio
0,075mg/kg-1 22 .
Altas Doses de BNM
Tradicionalmente a infusão de duas vezes DE95 propicia boas condições de intubação
traqueal. Entretanto, a administração de três a oito vezes a DE95 visa alcançar as con-
dições ótimas em menos de 90 segundos. Com isso, os BNM de duração intermediária
comportam-se como de longa duração. Para o rocurônio 1,2 mg/kg-1 (quatro vezes a
DE95), oferece bloqueio neuromuscular completo em 55±14 segundos (média ± desvio
padrão) e duração clínica de 73±32 minutos23. Além disso, efeitos colaterais gerados pela
liberação de histamina (benzilisoquinoleínicos) e efeitos autonômicos (aminoesteróides)
são risco potencial.
Sulfato de Magnésio
O emprego de sulfato de magnésio (MgSO4) em dose igual ou superior a 30 mg/kg-1, no
mínimo 15 antes da administração de BNM não despolarizantes, propicia o encurtamento
do tempo de início de ação. Kim e col. demonstraram a associação do uso de MgSO4 e dose
priming com redução de 63% do tempo para o início de ação do rocurônio24. Em estudo
recente, Rotava e col. demonstraram que, em pacientes idosos, há o encurtamento do início
da ação do rocurônio, porém, com prolongamento da duração, compatível com os BNM de
ação longa25.
Para obter uma intubação em sequência rápida com segurança, os seguintes princípios
devem ser observados: pré-oxigenação; doses adequadas de agentes hipnóticos; intubação
entre 60 e 90 segundos e pressão sobre a cartilagem cricoide, com atenção para a dificuldade
potencial de visualização glótica.
Outro componente crítico para o controle da via aérea é evitar o bloqueio neuromuscu-
lar residual26,27. Para tanto, o uso rotineiro de monitores de transmissão neuromuscular e a
adequada reversão dos BNM representam elementos fundamentais28.
Conclusão
A conduta de checar a ventilação sob máscara facial antes da administração dos bloque-
adores neuromusculares não tem evidência científica e o uso desses agentes não só não a
dificulta como a facilita, podendo até ser fundamental, em alguns casos. Salvo, claro, as
situações em que tanto a indução anestésica quanto seu uso não sejam a melhor forma de
manuseio do paciente.
A disponibilidade do binômio rocurônio/sugamadex pode gerar uma sensação de segu-
rança no manuseio das vias aéreas danosa a todos os envolvidos. A confiança de fácil resolu-
ção diante da má evolução pode levar à redução no cuidado da avaliação pré-anestésica da
via aérea. Outros pontos de relevância estariam no uso do rocurônio/sugamadex em situa-
ções de obstrução das vias aéreas, em postergar um acesso invasivo e no tempo dispensado
para sua administração.
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O sistema gastrointestinal
e sua relação com as
alterações perioperatórias
Florentino Fernandes Mendes
Ana Cristina Pinho Mendes Pereira
Eduardo Manso de Carvalho Andrade
O sistema gastrointestinal e sua relação com as
alterações perioperatórias
Introdução
Entre as inúmeras alterações orgânicas que caracterizam o período perioperatório, as al-
terações gastrointestinais precisam ser levadas em consideração, pela potencial repercussão
sistêmica e interferência no desfecho pós-operatório. Diversos estudos têm demonstrado o
papel fundamental do intestino na propagação de doenças críticas1 e, atualmente, há uma
série de linhas de pesquisa que evidencia que, por meio de diferentes mecanismos fisiopato-
lógicos, esse órgão poderia atuar como o “motor” na origem e na propagação da sepse e da
resposta inflamatória sistêmica1,2 .
Considerando a resposta inflamatória, o intestino é um órgão complexo formado por
três estruturas: epitélio, tecido imune e flora comensal. A regulação, interação, mudança e
ativação dentro do complexo microambiente local têm impacto sistêmico, podendo mudar
o desfecho de pacientes com falência múltipla de órgãos.
Sabe-se que o sistema imune e a flora intestinal estão em constante evolução, permi-
tindo que o intestino desenvolva várias funções adaptativas para manter a homeostase
local. A parede intestinal é protegida por uma complexa flora comensal, por várias linhas
de defesa (tanto da imunidade inata quanto da adquirida) que, trabalhando em constante
interação, permitem o mais perfeito mutualismo entre o hospedeiro e os microrganismos
da flora intestinal.
Já está bem reconhecido o papel fundamental da flora intestinal na homeostase do hos-
pedeiro, mas sue desempenho ou influência da condição de saúde ou doença do indivíduo
começou a ser estudada e reconhecida há pouco tempo2 .
Embora haja grandes e importantes avanços clínicos e terapêuticos, a abordagem dos
pacientes com sepse e SIRS3 continua um grande desafio médico. Apesar da evolução nas
medidas de suporte, milhões de pacientes morrem a cada ano de choque séptico2 .
O objetivo deste texto é revisar o papel do intestino nas alterações perioperatórias que
são do interesse da anestesiologia.
Mucosa intestinal
A complicada arquitetura da mucosa do intestino tem uma superfície de troca de aproxi-
madamente 300 a 400 m2 2-5. A barreira intestinal tem funções desafiantes e que poderiam
ser consideradas conflitantes, pois, além de exercer mecanismos de defesa suficientes para
a proteção contra a passagem de grandes quantidades de microrganismos e substâncias do
meio externo, precisa atuar como uma estrutura com alta permeabilidade para absorver os
nutrientes necessários.
Epitélio
É o elemento fundamental para a função digestiva e a integridade do órgão2,3. A barreira
intestinal é formada pelos enterócitos, células colunares que formam uma camada única e
Figura 1 – A barreira intestinal. Epitélio, células imunes e flora bacteriana comensal atuam juntos para
prevenir a invasão de substâncias potencialmente nocivas.
Flora comensal
A mucosa intestinal é colonizada por bilhões de bactérias luminais derivadas de mais
de 500 espécies diferentes2-4, entre as quais encontramos aeróbios, aeróbios facultativos e
bactérias anaeróbicas.
Considerações anestésicas
Manejo de Fluidos
Embora a definição da melhor estratégia permaneça incerta e controversa17, sabe-se que
a administração de fluidos no perioperatório tem papel importante no desfecho do pacien-
te18,19. A administração intravenosa de grandes quantidades de líquido no intraoperatório
ainda constitui prática bastante comum e, embora seja feita com os objetivos de expansão
do espaço intravascular, melhora da perfusão e da oxigenação tecidual e diminuição das
complicações pós-operatórias, é atualmente considerada conduta capaz de aumentar a mor-
bidade pós-operatória18.
Resultados perioperatórios apontam para uma administração de líquidos direcionada
por parâmetros hemodinâmicos, em contraponto à administração liberal, sem a considera-
ção de objetivos. Tem sido observado, especialmente na cirurgia colorretal, que uma condu-
ta individualizada, guiada por parâmetros hemodinâmicos minimamente invasivos deriva-
dos da monitorizarão cardíaca e do Doppler esofágico, melhora o desfecho dos pacientes18.
Anestesia peridural
Estudos experimentais e clínicos têm atribuído à anestesia peridural benefícios no re-
sultado de cirurgias do sistema digestivo, como menor tempo de íleo, melhor qualidade da
analgesia, mobilização mais precoce, menor tempo para restabelecimento da via oral para
alimentação, maior tolerância ao exercício físico e melhor qualidade de vida 20-26.
A contratilidade do intestino é modulada por fatores neurais e humorais e pela intera-
ção entre os sistemas nervoso simpático e parassimpático. A anestesia peridural diminui o
tempo de íleo pós-operatório pela inibição do reflexo espinhal desencadeado pela dor, pelo
bloqueio da aferência nociceptiva e pelo bloqueio do simpático toracolombar, com preserva-
ção do funcionamento da inervação parassimpática. Diversos estudos desenhados para in-
vestigar a influência da analgesia peridural na duração do íleo após cirurgia gastrointestinal
mostram redução do tempo de íleo e maior eficácia do bloqueio em nível torácico quando
comparado ao bloqueio realizado em nível lombar24,25.
A hiperatividade simpática desencadeada pelo procedimento cirúrgico provoca
a inibição da motilidade. O predomínio da atividade parassimpática gastrointestinal
após os nervos torácicos e lombares simpáticos serem bloqueados pela anestesia peridu-
ral neutraliza a hiperatividade simpática, aumentando a estimulação dos movimentos
peristálticos do estômago, intestino delgado e cólon proximal (e reduzindo o tempo de
íleo, consequentemente)24-26 .
Em pacientes submetidos à laparotomia, a administração peridural de anestésico local,
quando comparada ao uso de opioides sistêmicos ou no espaço peridural, pode diminuir a
paralisia gastrointestinal ocasionada pelo manuseio das alças e por alterações de eletrólitos.
O uso de morfina peridural diminui o tempo de esvaziamento gástrico25.
Anestesia Peridural e Fluxo Sanguíneo Esplâncnico
O bloqueio simpático e suas consequências fisiológicas – como a redução dos níveis de
pressão arterial e frequência cardíaca – são diretamente proporcionais às doses de anestésico
local utilizadas e à extensão do bloqueio e produzem aumento significativo da capacitância
das veias mesentéricas. A dilatação da circulação esplâncnica que acompanha o bloqueio
torácico ou toracolombar não ocorre quando a anestesia se limita ao segmento lombar, que,
além de causar menor diminuição da pressão arterial, produz vasoconstrição das veias me-
sentéricas, prejudicando o fluxo esplâncnico21,22 .
Embora estudos sugiram que a diminuição na resistência da vasculatura esplâncnica e
o aumento do fluxo sanguíneo pelo bloqueio simpático possam interferir na anastomose,
melhorando a cicatrização e diminuindo deiscência anastomótica 20-24, uma metanálise,
com 562 pacientes incluídos, concluiu que não existe diferença significativa na ocorrência
de deiscência de anastomose em pacientes submetidos à anestesia peridural com anestésico
local, anestésico local e opioide ou opioide sistêmico ou peridural 27. Uma explicação para os
achados do estudo seria que, apesar do aumento do fluxo esplâncnico pela anestesia peridu-
Opioides
Os opioides endógenos (endorfinas, encefalinas e dinorfina) e exógenos diminuem a
atividade peristáltica do trato gastrointestinal. Os dois ativam os mesmos receptores no in-
testino, retardam o peristaltismo e alteram a atividade secretora, o transporte de eletrólitos
e fluidos e o esvaziamento gástrico30,31.
Os movimentos intestinais são regulados por mecanismos neuroendócrinos, endócrinos
e autócrinos. O sistema nervoso entérico intrínseco é formado pelo plexo mioentérico, que é
constituído por milhões de neurônios aferentes e eferentes, que liberam neurotransmissores
como acetilcolina, serotonina, peptídeo intestinal vasoativo e óxido nítrico. A quantidade
de serotonina no sistema gastrointestinal é essencial (95% do total está nesse órgão). Os
receptores 5HT1 e 5HT4 são importantes para a função de contratilidade intestinal.
O sistema nervoso extrínseco consiste num sistema autônomo simpático das fibras tora-
colombares e parassimpático do nervo vago. O intestino apresenta dois tipos de movimento
– segmentar e peristáltico. O movimento segmentar serve para misturar o conteúdo lumi-
nal; já os movimentos peristálticos envolvem o tônus muscular com o objetivo de movimen-
tar o conteúdo da luz intestinal.
O uso de agonistas de receptores opioides de forma aguda ou crônica contribui para o
surgimento de íleo pós-operatório e outras disfunções gastrointestinais. O íleo pós-opera-
tório é resultado de variáveis como a ativação simpática pelo estresse, o trauma cirúrgico,
a resposta inflamatória e a administração de opioides para o tratamento analgésico. É mais
comum após cirurgias abdominais ou pélvicas, mas pode acontecer após qualquer cirurgia
de grande porte. As disfunções intestinais causadas pelos opioides acontecem por sua ad-
ministração aguda ou crônica e é consequência direta das ações inibitórias dos opioides na
motilidade e secreção intestinal. Estudos sugerem que os opioides induzem constipação,
entre 40% a 90% dos pacientes em tratamento para dor crônica 31.
No sistema gastrointestinal foram localizados três tipos de receptor de opioides – mu,
delta e kappa. A morfina atua principalmente nos receptores mu que se encontram no siste-
ma nervoso central e periférico, além do sistema gastrointestinal. No intestino, a localização
varia com cada espécie e com a área intestinal estudada. Os receptores mu se encontram
distribuídos entre o plexo submucoso e o mioentérico, não existindo evidência de sua pre-
sença nas células da mucosa ou no músculo liso intestinal. A ativação dos receptores mu
inibe a liberação de neurotransmissores dos neurônios motores excitatórios, resultando
em movimentos intestinais não propulsivos. Em condições normais, a função dos opioides
endógenos não está totalmente esclarecida, mas parece desempenhar papel na modulação
da motilidade gastrointestinal, podendo, em condições de estresse, contribuir para o desen-
volvimento de íleo pós-operatório.
Conclusão
O conhecimento dos intricados detalhes do funcionamento do sistema gastrointestinal
e suas implicações na resposta inflamatória e na sepse é importante para o entendimento e
para a condução de uma anestesia mais segura.
Referências bibliográficas:
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Hipotermia em anestesia
ambulatorial
Ricardo Caio Gracco de Bernardis
Eduardo Brigatto Sperling
Marco Aurélio Damasceno Silva
Ligia Andrade da Silva Telles Mathias
Hipotermia em anestesia ambulatorial
Hipotermia perioperatória
A temperatura corporal é regulada pelo equilíbrio entre a produção e a perda de calor.
A maior parte do calor do corpo humano é produzida em órgãos profundos, em seguida, é
transferido para a pele e, posteriormente, perdido no meio ambiente. Assim, a produção do
calor do organismo dependerá do metabolismo corporal e a perda derivará, principalmente,
da rapidez com que o calor pode chegar até a pele e a velocidade com que esse calor é perdido
da pele para o meio ambiente7.
O sistema termorregulador do homem mantém a temperatura corporal central em torno
de 37 ºC, assim, conserva as funções metabólicas. No paciente em estado de vigília, a tempe-
ratura central pode variar de 0,5 °C a 1 °C sem resposta do centro termorregulador8.
Durante o ato anestésico, é comum a ocorrência de hipotermia não intencional, com a
diminuição de 1 ºC a 3 ºC na temperatura, decorrente da inibição do centro termorregula-
dor e diminuição do metabolismo, induzida pela medicação anestésica e pela exposição do
paciente ao ambiente frio das salas cirúrgicas9. Essa faixa de variação da temperatura é mais
ampla no estado hipotérmico quando comparado ao hipertérmico9.
Definição de Hipotermia Perioperatória
A hipotermia é definida como temperatura corporal central menor que 36 °C e ocorre
frequentemente durante o procedimento anestésico, por causa da inibição do centro termor-
Anestesia Regional
A anestesia subaracnóidea inibe o controle central termorregulador através do
bloqueio do sistema nervoso simpático periférico e dos nervos motores, que abolem
a vasoconstrição e os tremores. A redistribuição fica restrita aos membros inferiores
e continua sendo a principal causa de hipotermia perioperatória nesses pacientes. Sua
magnitude varia conforme o estado térmico inicial do paciente e pode ser atenuada
pelo aquecimento dos membros inferiores antes do início da anestesia. Como há menor
Anestesia Combinada
Ela representa a situação de maior risco de hipotermia perioperatória não intencional.
A redistribuição inicial nas quatro extremidades leva rapidamente à hipotermia, e a fase
linear desenvolve-se sob maior velocidade. A anestesia regional per si diminui o limiar de
vasoconstrição e, quando sobreposta à anestesia geral, tem seu efeito somado. Como re-
sultado, a vasoconstrição é desencadeada mais tardiamente e sob menor temperatura. Por
outro lado, a anestesia geral inibe os tremores que poderiam aumentar a produção interna
de calor durante a anestesia espinhal. Mas o fator mais importante decorrente da associação
é a abolição da vasoconstrição nas extremidades inferiores por causa do bloqueio de nervos
periféricos. A vasoconstrição exclusivamente central é ineficaz e a temperatura continua a
declinar, não atingindo a fase de platô7.
Anestesia Local
A infiltração com anestésico local não causa bloqueio na condução dos estímulos do
sistema termorregulador perioperatório, mas alguns pacientes submetidos à anestesia local
também recebem sedação ou analgesia com opioides e/ou hipnóticos, como propofol, que
inteferem no funcionamento do sistema termorregulador. O midazolam é o único anesté-
sico entre os agentes anestésicos que aparentemente não altera o sistema termorregulador.
O risco de hipotermia deve ser considerado quando o paciente está sedado ou sob analgesia
com anestésico local14.
Métodos de aquecimento
Temperatura ambiente suficientemente elevada (> 23 ºC) mantém ou restabelece a nor-
motermia durante a anestesia, porém gera desconforto térmico para a equipe anestésico-
-cirúrgica e piora seu desempenho cognitivo7.
Estratégias de aquecimento ativo ou passivo devem ser empregadas7. Aquecimento
passivo é um método de baixo custo e eficaz. Consiste em cobrir e aquecer, durante o
intraoperatório, toda a superfície cutânea possível com o uso de lençóis, cobertores ou
mantas, para reduzir a perda de calor em 30%. O aquecimento com cobertores não gera
transferência adicional de calor, tornando-o apenas mais confortável11. A temperatura da
sala cirúrgica também é fator determinante na perda de calor, e deve-se evitar que fique
mais baixa que 22 °C12 .
Cobertores ou colchões com circulação de água são benéficos apenas quando colocados sobre
o paciente. Cobertores elétricos também podem ser utilizados. A vasodilatação periférica induzi-
da pelos agentes anestésicos proporciona transferência intercompartimental de calor, facilitando
o deslocamento do calor aplicado à superfície cutânea para o compartimento central12.
Sistemas que envolvem a circulação de ar aquecido são excelentes e diminuem perdas de
calor por irradiação. Esses aquecedores transmitem de 30 W a 50 W para a superfície cutânea11.
O aquecimento ativo, além de ser o método mais efetivo, pode reverter a hipotermia já insta-
lada. A área total a ser coberta é crucial. O aquecimento da região anterior é mais efetivo que o
da parte em contato com a mesa de operação, uma vez que pouco calor é perdido por condução9.
Existem no mercado mantas térmicas de corpo inteiro, de membros superiores ou de
membros inferiores, e, mais recentemente, são encontrados aventais térmicos, que têm o
formato de avental e cobrem do pescoço à altura dos joelhos, na região anterior e posterior
do corpo. Outro método utilizado são os cobertores elétricos. Estudos sugerem que sua efi-
ciência é semelhante ao sistema de ar aquecido. A utilização de vestimentas com circulação
de água aquecida consegue transferir mais calor para o organismo que os sistemas de circu-
lação de ar aquecido, aquecendo 0,4°C por hora, mais rápido9.
A infusão de soluções aquecidas é útil na manutenção da temperatura corporal central,
mas não funciona no tratamento da hipotermia13.
Conclusão
Os procedimentos ambulatorias são rotineiramente de curta duração e com alta hospi-
talar no mesmo dia, mas, de acordo com esta revisão, quanto aos cuidados com o controle
da temperatura, devemos monitorar todos os procedimentos com duração superior a 30
minutos, utilizar dispositivos de aquecimento ativos sempre que for identificada tempera-
tura central inferior a 36 °C e for possível iniciar o aquecimento pré-anestésico naqueles
procedimentos com maior risco de hipotermia.
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Definição
A síndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS) é caracterizada pela obstrução pe-
riódica, parcial ou total das vias aéreas superiores durante o sono. Isso causa despertares
repetitivos para reestabelecer a permeabilidade das vias aéreas, o que pode levar à hiper-
sonolência diurna e a outras manifestações de sono fragmentado, como agressividade ou
comportamento distraído em crianças. A obstrução das vias aéreas também pode causar
queda periódica da saturação de hemoglobina associada ao sono, hipercarbia ocasional e
disfunção cardiovascular. No período perioperatório, tanto os pacientes adultos quanto os
pediátricos com SAOS, mesmo se assintomáticos, representam um desafio especial, que
deve ser enfrentado para minimizar o risco de morbidade e mortalidade.
Avaliação pré-operatória
A avaliação pré-operatória deve ser realizada levando-se em conta os elementos de exame
clínico que elevam a suspeita de SAOS: índice de massa corporal >35 em adultos; percentil >
95% em crianças; circunferência do pescoço acima de 17 polegadas (43,18 cm) para homem
e 16 polegadas (40,64 cm) para mulher; anormalidades craniofaciais que acometem as vias
aéreas; obstruções anatômicas nasais; amígdalas que se aproximam da linha média. Além
disso, é importante a história de aparente obstrução de vias aéreas durante o sono, como:
ronco em especial, o que pode ser ouvido com a porta fechada; ronco frequente; pausas
respiratórias observadas durante o sono; acordar do sono com sensação de sufocamento;
Conduta intraoperatória
Os pacientes portadores de SAOS têm maior propensão ao colabamento das vias aéreas e
à privação do sono. Além disso, são especialmente suscetíveis ao efeito depressor respirató-
rio de sedativos, opioides e anestésicos inalatórios. Portanto, a técnica anestésica empregada
deve levar em conta estas particularidades:
a) procedimentos de superfície podem ser mais bem conduzidos sob anestesia local ou
bloqueio regional, com sedação leve ou moderada;
b) o uso de sedação moderada demanda monitorização por capnografia, por causa do
risco de que a obstrução de via aérea passe desapercebida;
c) o uso de CPAP intraoperatório deve ser considerado nos pacientes que já fazem uso
dele e serão submetidos à sedação;
d) o uso de anestesia geral com a via aérea assegurada é preferível à sedação profun-
da sem proteção de via aérea, em especial nos procedimentos que mecanicamente
a comprometem;
e) os pacientes com SAOS devem ser extubados acordados, exceto se houver contraindicação;
f) o bloqueio neuromuscular deve estar completamente revertido antes da extubação;
g) quando possível, a extubação e a recuperação desses pacientes devem ocorrer em po-
sição lateral e semielevada.
Conduta pós-operatória
Considerando o risco do uso de opioides nesse grupo de pacientes, algumas condutas,
visando ao seu uso racional, devem ser consideradas:
• o uso de técnicas regionais analgésicas;
• o uso racional de opioides no neuroeixo, uma vez que sua distribuição rostral pode
causar depressão respiratória. Considerar que o uso de anestésico local puro pode
ser uma boa opção;
• se for utilizado o regime de analgesia controlada pelo paciente, a infusão basal de
opioide deve ser evitado ou usado com cautela extrema;
• o uso de analgésicos anti-inflamatórios não esteroides e outras formas de analgesia
(gelo, estimulação elétrica transcutânea), com o intuito de diminuir o uso de opioi-
des, deve ser considerado;
Referências bibliográficas:
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