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A EDUCAÇÃO, FORMAÇÃO DO PROFESSOR E POLÍTICA SOCIAL: A

PERSPECTIVA ASSISTENCIALISTA E A PROMOÇÃO DA CIDADANIA PLENA

NOME

Se a educação sozinha não transforma a


sociedade, sem ela, tampouco, a
sociedade muda
Paulo Freire

RESUMO:
O presente artigo tem como objetivo discutir a distribuição da educação em
ambiente classificados de alta vulnerabilidade, bem como dos aspectos que
influem para os baixos índices do Ideb nesses contextos. A partir de uma
discussão sobre as políticas assistencialistas e sobre a formação de professor
para esses contextos emerge a necessidade de mobilizações sociais com vistas à
promoção da equidade educacional, isto é, uma educação de qualidade para
todos, livres de estereótipos e de idéias pré-concebidas. Além disso, serão
apresentados resultados de outras pesquisas de campos sociais que corroboram
com a perspectiva aqui adotada: a do direito igualitário da distribuição
educacional. Só assim será possível construir uma sociedade mais igualitária e de
respeito às diferenças locais e culturais de todos os sujeitos.

Palavras-chave: Formação de professores. Cidadania. Vulnerabilidade. Política


social.

EDUCATION, TEACHER TRAINING AND SOCIAL POLICY: A CAREER


PERSPECTIVE AND A PROMOTION OF FULL CITIZENSHIP

ABSTRACT:
The purpose of this article is to discuss the distribution of education in environment
classified as high vulnerability, as well as the aspects that influence the low Ideb
indexes in these contexts. From a discussion on welfare policies and teacher
training in these contexts, there is a need for social mobilization with a view to
promoting educational equity, that is, quality education for all, free of stereotypes
and pre- designed. In addition, results from other social field surveys that
corroborate with the perspective adopted here will be presented: the egalitarian
right of educational distribution. Only in this way will it be possible to build a more
egalitarian society and respect for the local and cultural differences of all subjects.

KEYWORDS: Teacher training. Citizenship. Vulnerability. Social policy.


1 INTRODUÇÃO

Para melhor conhecer e compreender a sociedade, as relações sociais, as


contradições e conflitos em suas entranhas e percalços, seu percurso histórico e
características, vêm a propósito ser muito oportuno desvendar elementos
fundamentais da teia social. A pretensão de elucidar o significado pedagógico ao
estudar a teia social tem, como conseqüência, referir-se aos patamares da cultura
política e da educação como política social.
Isso implica uma pesquisa que intente recuperar alguns aspectos históricos
do associativismo como forma de organização da sociedade civil e as respectivas
contribuições na consolidação política. Ao mesmo tempo leva a tecer
considerações sobre as condições de miséria e marginalização. Sob a qual os
estudantes oriundos, especialmente, da rede pública estão imersos. Nessa seara,
este público anseia e ecoa um forte apelo de socorro, cabendo, portanto, à escola
um papel formativo que ofereça tal ajuda (BENEVIDES, 1992).
Caberia dar atenção especial a aspectos que configuram um patamar de
relacionamento educativo/formativo, considerando, de modo peculiar, como todo
indivíduo, ao integrar-se num determinado modo associativo, referencia um
processo pedagógico, sobretudo na medida em que, através de tal gesto, venha a
alterar sua concepção de mundo.
Na recente história do Brasil, cresceram as formas de associativismo no
campo popular e ao mesmo tempo a busca de aspectos relevantes de cidadania.
Entretanto, a diversidade e multiplicidade não se traduziram em unidade
ideológica e de propostas de ação estreitamente coletivas, bem como sob a ótica
da representação política verificam-se orientações políticas divergentes quanto
aos objetivos propostos. É intenção expressa relacionar, neste momento,
associativismo e cidadania na perspectiva da consolidação das políticas sociais.
O cunho educativo pode ser destacado no relacionamento inerente entre
demandas sociais, representação política, mudanças em curso e o papel das
instituições. Ante a reconhecida crise em que se encontra o sistema público de
ensino e a representação política através dos partidos políticos, parece mais que
conveniente, como contraponto, destacar processos educacionais informais, e,
dentre tais processos, a multiplicidade de mediações políticas pertinentes à
metodologia de construção do conhecimento sobre o real. Pretende-se destacar
um processo de informação das vontades políticas, seja pela iniciativa tomada a
partir da organização popular de orientação assistencial ou imbuída da perspectiva
em prol de direitos sociais, seja pelas determinações de programas sociais de
domínio de órgãos públicos (BENEVIDES, 1992).
Os cientistas sociais têm destacado a dupla importância para o
entendimento da realidade política brasileira, a conexão entre as propostas de
políticas sociais e a perspectiva das práticas pedagógicas. Grande parte dos
mesmos cientistas reconhece que, para a vigência da democracia no país, urge
destacar um processo educativo instaurado através da organização da sociedade
civil e que seja forte o suficiente para debelar a submissão do poder a qualquer
preço. Tais dimensões de relacionamento político de simples e estratégica podem
estar presentes do nível nacional ao local.
Podemos destacar, de um lado, o processo educativo resultante das
relações entre atores sociais e, de outro, a compreensão do pesquisador que
permite delinear e entrever dimensões apenas implícitas, passando a apontá-las
num espaço onde o senso comum não ousa evidenciar esta prática social. Cabe
interrogar a perspectiva da cidadania presente em cada campo de investigação,
bem como a propósito de razões da consolidação da assistência social, sobre os
efeitos dos programas sociais e da possível visualização das reivindicações de
direitos sociais (DEMO, 1988).
O horizonte metodológico desenhado consentiu com o encaminhamento
que englobou também a observação participante junto às instâncias em destaque,
o que possibilitou delinear a aprendizagem com o desenrolar dos fatos. Tal
mecanismo adaptou-se à tentativa de ultrapassar a simples e direta coleta de
dados que compreenderam fundamentalmente a representação que os indivíduos
envolvidos guardavam dos fenômenos.
O emprega da pesquisa qualitativa pressupõe que os indivíduos integrantes
da comunidade de informação vistos como agentes sobre a realidade, são
produtores de relações sociais e também contribuem para a elaboração de
conhecimento.
O presente artigo tem como objetivo discutir a distribuição da educação em
ambiente classificados de alta vulnerabilidade, bem como dos aspectos que
influem para os baixos índices do Ideb nesses contextos. A partir de uma
discussão sobre as políticas assistencialistas e sobre a formação de professor
para esses contextos emerge a necessidade de mobilizações sociais com vistas à
promoção da equidade educacional, isto é, uma educação de qualidade para
todos, livres de estereótipos e de idéias pré-concebidas. Além disso, serão
apresentados resultados de outras pesquisas de campos sociais que corroboram
com a perspectiva aqui adotada: a do direito igualitário da distribuição
educacional. Só assim será possível construir uma sociedade mais igualitária e de
respeito às diferenças locais e culturais de todos os sujeitos.

2 A PESQUISA E O SIGNIFICADO PEDAGÓGICO DE ESTUDAR A TEIA


SOCIAL NO ÂMBITO DA VULNERABILIDADE

O conhecimento da teia social requer que se tracem, em linhas gerais, as


fronteiras existentes entre as diferentes formas de associação, em conexão com
os apelos do assistencialismo e da cidadania, estabelecendo um elenco de
objetivos, características, intervenção na sociedade, relacionamento com o poder
público, comportamento político desejado de seus membros. O sistema
educacional como política social também se encontra desafiado pela perspectiva
assistencialista que ronda a atividade social e interesses difusos.
A riqueza ostentada pela sociedade em suas redes intricadas permite
esboçar, considerando em termos comparativos, a evolução histórica como
mudança substantiva. Especialmente, no que tange às metas das associações da
sociedade civil que emergiram em quantidade a partir dos anos 70/80, cabe
investigar sua perspectiva e opção pelos direitos sociais. A prática política e o
comportamento daí resultantes referendam de modo peculiar uma relação
pedagógica, inclusive contemplando um nexo entre o sistema partidário e os
movimentos sociais. Nesse sentido, cabe demarcar um contorno quanto ao
significado pedagógico do associativismo consolidado na sociedade civil, bem
como vislumbrar as possíveis interferências do posicionamento e da ação de um
ator social sobre a vida de outro. Ou melhor, deve-se observar a possibilidade da
mútua influência (DEMO, 1988).
Nas últimas décadas, vivemos oportunidades em que o senso de cidadania
pode alentar-se, e programaram-se relacionamentos diversos do clientelismo,
expresso pelo rompimento com tal comportamento político via cultura política mais
democrática e participativa. As diversas expressões do comportamento político
remetem a relacionamentos plurais, não obstante verifiquem-se aspectos
limitadores da cidadania na conexão entre poderes constituídos e reivindicações
populares. Entende-se ainda que cabe interrogar se expressões políticas
tradicionais consolidam posturas de educação informal; todavia, numa
compreensão dinâmica, apresentam-se muito reais e efetivas na história.
Nesse sentido, de acordo com Cherubina (2015), a vulnerabilidade do
espaço social influencia na aprendizagem dos alunos. O estudo do pesquisador
ocorreu na Zona Leste, de São Paulo, apontando que a localização da Instituição
Escolar pode intervir, de maneira particular, nos resultados escolares, ou seja, os
resultados positivos/negativos rede de ensino está estreitamente atrelado ao seu
lócus na teia social.
Esta pesquisa teve o apoio da Fundação Itaú Social, da Unicef, da
coordenação da Cenpec, com subsídios da Fundação Tide Setubal. A mesma
demonstrou, por meio de dados estatísticos, que o grau alto de vulnerabilidade
está proporcionalmente vinculado ao baixo rendimento dos alunos. Essa
conseqüência foi chamada de “Efeito Território”.
Realizada entre 2012 e 2014, o estudo contou com aproximadamente 60
escolas públicas, da região da Zona Leste, perfazendo um total de 88 mil alunos.
A partir desse contingente, os dados mostram que as notas da avaliação do Ideb
foram mais baixas em territórios, onde os traços de vulnerabilidade social era mais
alto.
Por outro lado, é importante considerar que aqui não se trata de fazer a
adoção de uma postura determinista, sob a qual o estudante de vulnerabilidade
não possa ter uma educação de qualidade, tampouco não tenha capacidade
cognitiva para obter melhores resultados. Longe de quaisquer generalizações, o
estudo aponta para uma problemática social que, invariavelmente, influi nas
avaliações de aprendizagem e, muito provavelmente, na carga emocional, afetiva
e psicológica desses jovens que vivem em situação de risco iminente.

As políticas públicas com muita freqüência encontram-se associadas a


uma avaliação a partir do eixo sócio-econômico. Exemplo típico dessa
perspectiva são as justificativas para implementar ou especialmente
retrair a ampliação de determinados benefícios, considerando os
escassos recursos públicos disponibilizados para essa finalidade. De
outro modo, a assistência social encontra-se inscrita entre os direitos da
cidadania, todavia considerando os casos especiais enquanto políticas
sociais em que se aplica como dever do poder público (RUSCHEINSKY,
2014, p.51).

Assim, convém considerar a peculiaridade que diferencia assistência social


enquanto requisito da cidadania da ótica política do assistencialismo cuja
tendência possui relevante abrangência histórica.
O assistencialismo não chega a tocar no ponto essencial da desigualdade
social, nem possui, em sua concepção, de projeto social e na sua prática
cotidiana, a virtude de poder reduzi-la. Está ligado a um número bem reduzido de
bens de consumo, quando não supletivos dentro da sociedade de consumo.
Entretanto, seus efeitos encontram-se menos perceptíveis no aspecto econômico
envolvido, do que nas dimensões da cultura política diretamente afetas
(RUSCHEINSKY, 2014).
A partir das reflexões de Altenfelder (2012), o que se intentou discutir foram
os impactos desse tal “Efeito do Território” nas possibilidades educacionais que
eram oferecidas aos estudantes. Um dos dados da pesquisa apontou que os
jovens que moravam em locais mais privilegiados socialmente e economicamente
estavam com níveis educacionais aquém do esperado, configurando, assim, um
paradoxo.
Segundo as investigações, esse paradoxo advém da segregação social, na
qual aqueles que estão à margem são marginalizados pela condição social. Em
outras palavras, o que se percebe é que a educação, no geral, não é oferecida de
maneira potencializada por todos os seguimentos, por conta da sua posição no
território onde ela se materializa.
A pesquisa ganha, também, relevância a partir do momento que representa,
sob diversos prismas, os mecanismos promotores das desigualdades. Isso porque
a Fundação tem a preocupação de atuar em locais onde a reprodução das
violências e marginalizações são mais acirradas, onde a precarização de serviços
básicos é elevada a níveis extremos, tornando a condição desses sujeitos mais
miserável e subumana possível. Nesse sentido, o professor-educador tem a
missão singular nesse contexto, de modo a identificar e, conseqüentemente,
denunciar essas irregularidades, tendo em vista a integração de políticas e ações
públicas que visem quebrar esse ciclo de miséria (DEMO, 1988).
Sob essa perspectiva, as instituições de ensino e a rede escolar devem
estar envolvidas em processos de mobilização social, a fim de contribuir para um
debate mais amplo acerca do oferecimento de políticas públicas educacionais que
possam dirimir as mazelas sociais. Isso porque, infelizmente, esse determinismo
que paira nas mentes de professores e demais profissionais de que locais com
vulnerabilidade tendem a ser difíceis de trabalhar tem influenciado negativamente
o desenvolvimento educacional.
A seguir, serão apontadas algumas evidências identificadas na pesquisa
citada anteriormente. Tais evidências estão atreladas às oportunidades
educacionais e taxas de vulnerabilidade social.
Nesse estudo, a primeira evidência foi que, das 61 escolas observadas, as
que estavam localizadas em locais com altas taxas de vulnerabilidade ficaram com
índices muito ruins na avaliação do Ideb. De lado oposto, aqueles estudantes de
São Miguel Batista, região central, apresentaram mais recursos financeiros,
culturais e sociais obtiveram as notas mais elevadas no Ideb.
Fonte: WEBER, 2014.

A segunda evidência verificada foi que os alunos com os níveis


socioculturais próximos podem apresentar desenvolvimentos dispares de acordo
com o grau de vulnerabilidade de onde sua escola está alocada. Observou-se que,
aproximadamente, 50% dos alunos oriundos dos territórios de alta vulnerabilidade
apresentaram baixo grau de proficiência em Língua Portuguesa. Tal índice cai
para 38% nas regiões centrais. Esse dado mostra que, desde que haja condições
igualitárias de aprendizado, todos os estudantes têm capacidades de aprendizado.
Para tanto, há a necessidade de ampliação e boa vontade de disseminar esse
saber.
Essa discussão sobre o ensino da Língua Portuguesa é fundamental
quando se trata de vulnerabilidade, pois, invariavelmente, aqueles estudantes que
apresentam uma variedade não padrão da língua estão situados nessa região. O
resultado disso são alunos incapazes de produzirem textos escritos de acordo
com a norma culta. O que não implica em afirmar a incapacidade desses alunos,
mas sim na falta de investimento do poder público para propiciar um ensino de
qualidade para esses estudantes, para que possam ser “donos de sua língua” e,
conseqüentemente, alçaram melhores condições de emprego e aos bens sociais.

Fonte: WEBER, 2014.

A pesquisa mostrou que "o modelo escolar que organiza o funcionamento


das escolas exige um repertório que os alunos com baixos recursos não possuem.
A escola precisa estar preparada para atender o aluno real (p.77)" conforme o
diretor do Cenpec e líder da pesquisa, Wagner Weber (2014). Verificou-se,
também, a emergência de políticas públicas específicas para sanar os baixos
desempenhos dos estudantes que estão localizados nesses ambientes. Cabe
também, aos professores a sensibilidade de se adequar a essa realidade e,
sobretudo, fornecer possibilidades de atuação para o seu alunado.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse sentido, conclui-se que a prática social diz respeito ao horizonte


assistencialista faz jus ao plano da demagogia, das contradições e conflitos, do
controle social e da compensação. Acima de tudo, tal prática obscurece e encobre
sob o manto de um benefício às diferenças fundamentais da sociedade, enquanto
uns poucos privilegiados arvoram-se um suposto direito adquirido ao banquete e
outros tantos ficam relegados ao contento com restos e migalhas.
Dentro de uma perspectiva assistencialista, o combate da pobreza na
sociedade significa socorrer os setores que não foram agraciados com a sorte da
propriedade. Entretanto, mesmo quando se arrisca conceder que se efetue
parcela de distribuição de bens, há o estrito cuidado para que isso se realize de
modo muito limitado. Além do temor da explicitação do conflito em torno de
interesses materiais, essa perspectiva teme a democratização das relações de
poder.
Dentro dessa ótica, o professor e as políticas públicas têm um papel
fundamental de promotores dessa cidadania. Deve-se, portanto, esquecer os
estereótipos de que nas condições de vulnerabilidade não seja possível ter
aprendizado significativo, tampouco uma educação de qualidade. Adotando,
portanto, essa postura á se tem um primeiro passo para um ensino livre de
preconceitos e estereótipos contra o jovem que vive em condições de
marginalidade.

REFERÊNCIAS

ALTENFELDER, Leonardo. Um novo desenho institucional para o novo


associativismo. Lua nova, CEDEC, n.39, 2012.

BENEVIDES, Maria Vitória. A cidadania ativa. São Paulo: Ática, 1992.

CHERUBINA, G. B. Educação em territórios de alta vulnerabilidade. Portal


Cenpec. 2015.

DEMO, Pedro. Participação é conquista. São Paulo, Cortez, 1988.

RUSCHEINSKY, Aloísio. Educação e Política social: a perspectiva


assistencialista e a cidadania. Porto Alegre: Sulina, 2014.

WEBER, Wagner L. O mosquito na vidraça: a formação dos cidadãos à luz da


teoria crítica da Escola de Frankfurt. In: ZUIN, A. A. S., PUCCI, B & OLIVEIRA, N.
R. (org.). A educação danificada. São Carlos, UFSCar/Petrópolis, Vozes, 2014.

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