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POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

Unidade II
5 SERVIÇO SOCIAL, QUESTÃO SOCIAL E EDUCAÇÃO

A educação é um processo social vivenciado no âmbito da sociedade civil e protagonizado por


diversos sujeitos sociais, mas também é uma área estratégica de atuação do Estado. Por esse relevante
motivo, a política de educação, como política social, é um espaço contraditório de lutas de classes, um
embate entre poderes diversos que se legitimam historicamente, conforme se estabelece a correlação
de forças na diversidade dos projetos societários existentes.

A luta pela educação constitui uma das expressões da questão social, visando ao atendimento de uma
necessidade social, reconhecendo-a como um direito social. Assim, torna-se importante compreender
a relação estabelecida entre o serviço social e a política de educação, interpretando o ordenamento
jurídico que fundamenta essa política social sob óptica do serviço social, assim como sua interlocução
com o exercício profissional, objetivado na realidade vivenciada por seus protagonistas.

Por esse motivo, o significado político da inserção do serviço social na política de educação vincula‑se
à trajetória histórica dessa profissão e a seu acúmulo teórico e político em relação ao campo das políticas
sociais, podendo contribuir para a necessária articulação de forças sociais na luta pela educação pública,
de qualidade e como direito social.

Entendemos que o papel educativo do assistente social no ambiente escolar deve ser o de elucidar
e desvelar a realidade social em todos os seus meandros, socializando informações que possibilitem à
população ter uma visão crítica que contribua com sua mobilização social visando à conquista de seus
direitos. Se os assistentes sociais conseguirem levar essa proposta para a sua atuação no âmbito da
educação, a escola poderá dar início à discussão sobre novas formas de organização da vida social e,
principalmente, de identificação de diferentes sujeitos políticos no âmbito das instituições e, também,
da comunidade.

É necessário reconhecer que a relação da política da educação, especialmente com a política de


assistência social, pode ser um importante fator para enfrentar a questão da inclusão e da permanência
dos alunos das classes menos favorecidas na escola, pois essa articulação permitirá uma maior
compreensão da realidade de determinados territórios onde a desigualdade social, existente no país, se
apresenta de uma maneira mais proeminente.

Por essas razões, precisamos pensar cada vez mais em formas que permitam realizar a articulação
de políticas sociais, entre elas, especialmente, a assistência social com o intuito de minimizar as
desigualdades sociais e contribuir para o acesso e a permanência das crianças e adolescentes na escola,
sendo essa uma das atribuições, por excelência, do assistente social na política de educação.

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Não podemos negar que a educação para todos é uma meta dos governos, prevista há várias
décadas, mas para que essa meta seja alcançada é necessária a previsão de que incidam sobre o processo
de desenvolvimento dos sujeitos, pois somente por intermédio de uma educação de qualidade é que
o país ofertará condições que garantam o acesso e a permanência das crianças e adolescentes na
escola pública, com provisão de suportes físicos e sociais, imprescindíveis para que a educação seja um
diferencial na vida dessas pessoas.

Saiba mais

Leia o documento a seguir:

CFESS. Subsídios para a atuação de assistentes sociais na política de


educação. São Paulo: CFESS, 2014. Disponível em: http://www.cfess.org.br/
arquivos/BROCHURACFESS_SUBSIDIOS-AS-EDUCACAO.pdf. Acesso em:
29 jun. 2019.

5.1 A função social da escola e sua integração com a comunidade

De uma forma geral, quando nos referimos à função da escola, precisamos compreender que ela
é complexa, ampla, diversificada, pois a função social está relacionada à necessidade de dedicação
exclusiva por parte do professor e de acompanhar as mudanças que se processam no campo de trabalho,
atualizando o seu currículo e sua metodologia.

Visando acompanhar todas essas mudanças, a escola precisa fornecer um ensino que forme uma
relação entre o que o aluno está aprendendo na escola e o que ele está fazendo quando está fora dela,
principalmente no que se refere ao ensino formal e o mundo do trabalho, ou seja, entre o conhecimento
adquirido e a vida cotidiana do sujeito.

Observação

O termo cotidiano significa aquilo que é habitual ao ser humano, ou


seja, está presente na vivência do dia a dia.

Por esse motivo, entre as várias atribuições que são elencadas como função da educação está a
de promover novas estratégias que efetivem a formação do cidadão, para que ele tenha condições de
exercer a prática da cidadania. Dessa forma, a instituição escolar precisa adquirir competências que lhe
permitam formar cidadãos que possam inserir-se na sociedade de modo a modificá-la de forma positiva.

É preciso reconhecer que a escola é uma das poucas instituições que possui condições de formar
sujeitos que irão ocupar espaços na sociedade, porém, para que isso ocorra é necessário que o ambiente
escolar e o meio social mantenham uma relação de reciprocidade. Assim, é necessário que exista uma
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mútua colaboração entre a esfera social e a dimensão escolar, principalmente em relação ao entorno do
local onde as unidades escolares estão inseridas.

Saiba mais

Leia o artigo a seguir:

LIBÂNEO, J. C. O dualismo perverso da escola pública brasileira: escola


do conhecimento para os ricos, escola do acolhimento social para os pobres.
Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 38, n. 1, p. 13-28, 2012. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/ep/v38n1/aop323.pdf. Acesso em: 20 ago. 2019.

Para que possamos pensar na função social da escola e da sua integração com a comunidade, é
necessário tratarmos da questão da gestão democrática da escola, pois a gestão escolar é o meio pelo
qual as instituições educacionais são conduzidas e organizadas, tendo em vista os fatores econômicos,
políticos, estruturais, pedagógicos, sociais, entre outros. Uma gestão democrática poderá proporcionar a
oportunidade de se obter avanços de significativa relevância para a educação.

Observação

O conceito de gestão democrática é entendido como o processo


gerencial dialógico em que a autoridade decisória é compartilhada entre
os participantes da ação.

Porém, a expressão gestão democrática também tem sido usada para identificar as mais
variadas práticas sociais de diferentes atores não apenas governamentais, mas de organizações não
governamentais, associações, fundações e escolas.

A gestão democrática é um tema recente, que se introduz na sociedade brasileira na década de 1990
em meio à tensão entre dois processos que marcam a realidade contemporânea. Um desses processos
diz respeito à globalização da economia, que mercantiliza e amplia os segmentos de atuação no social.
O outro trata da regulação social tardia, através das conquistas de cidadania, do Estado democrático
de direitos e dos desafios da participação da sociedade civil. Assim, a gestão democrática tem sido
definida como a construção de diversos espaços para a interação social, inclusive na escola. Trata-se
de um processo que é levado a cabo numa determinada comunidade e que se baseia na aprendizagem
coletiva, contínua e aberta para a concepção e a execução de projetos que respondam a necessidades e
problemas do foro social.

A gestão democrática implica o diálogo entre diversos atores/intervenientes, como os governantes,


as empresas, as organizações civis e os cidadãos. Por esse motivo, o processo requer uma aprendizagem
conjunta e contínua para os grupos sociais, que lhes permita pronunciar-se sobre a concepção das políticas
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públicas. Em suma, trata-se da construção de um espaço de relação social e vínculos de relacionamento


institucional, o que se consegue através de um conjunto de ações. A gestão democrática representa,
por assim dizer, um intermediário através do qual a comunidade atua com espírito empreendedor para
promover mudanças sociais. Nesse sentido, é necessário reforçar os laços comunitários e trabalhar em
prol da recuperação da identidade cultural e dos valores coletivos da sociedade em questão.

Exemplo de aplicação

Trabalhar em equipe é uma necessidade. Ninguém parece ter dúvidas quanto a isso, mas a execução
de qualquer realização, contando com o apoio de todos os envolvidos num projeto, depende de uma
série de fatores, nem sempre levados em consideração pelos participantes.

O filme “FormiguinhaZ” discute essa transformação através de um divertido desenho animado.


Nele, a formiguinha Z não se adapta ao modelo rígido, mecânico e hierarquizado de administração do
formigueiro, propondo, ao final de uma série de aventuras, um modelo colaborativo, envolvente
e coletivo.

FORMIGUINHAZ. Direção: Eric Darnell; Tim Johnson. EUA: Dreamworks, 1998. 83 min.

Assista ao filme e, a partir das principais mensagens relativas ao trabalho em equipe, procure
identificar possibilidades que podem fazer parte das transformações que permitam aos estudantes se
relacionar melhor na escola e também com o mundo em que vivem.

No processo de gestão democrática, as pessoas passam a ser reconhecidas por suas capacidades de
coordenação e de negociação tanto dentro da sua própria organização como fora dela.

Uma das principais características da gestão democrática está relacionada com as preocupações e
princípios relativos à postura ética da conduta, à valorização da transparência na gestão dos recursos e à
ênfase sobre a democratização das decisões e das relações na organização. Diante dessas explicações,
podemos entender a gestão democrática como o processo gerencial dialógico em que a autoridade
decisória é compartilhada entre os participantes da ação, o que pode ocorrer perfeitamente dentro do
espaço escolar.

Um fator bastante positivo existente no processo de gestão democrática é o surgimento da cidadania


deliberativa, ou seja, a legitimidade das decisões passa a ter origem em processos de discussão, orientados
pelos princípios da inclusão, do pluralismo, da igualdade participativa, da autonomia e do bem comum.
Assim, a cidadania deliberativa une os cidadãos em torno de um autoentendimento ético e numa rede
de debates e de negociações, a qual deve possibilitar a solução racional de questões pragmáticas, éticas
e morais, sendo que o marco que possibilita essas formas de comunicação é a justiça, entendida como
a garantia processual da participação em igualdade de condições.

Na escola, a perspectiva é que a cidadania deliberativa contribua para que se desenvolva plenamente
um pluralismo cultural atuante conforme a sua própria lógica, por meio da possibilidade de participação.

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Saiba mais

Leia o texto a seguir:

O QUE FAZER para aproximar família e escola? Aprendizagem em


Foco, n. 9, abr. 2016. Disponível em: https://www.institutounibanco.org.br/
aprendizagem-em-foco/9/. Acesso em: 20 ago. 2019.

A participação integra o cotidiano de todos os indivíduos, dado que atuamos sob relações sociais. Por
desejo próprio ou não, somos, ao longo da vida, levados a participar de grupos e atividades. Esse ato nos
revela a necessidade que temos de nos associar para buscar objetivos que seriam de difícil consecução
ou mesmo inatingíveis se procurássemos alcançá-los individualmente.

Assim, cidadania e participação no ambiente escolar referem-se à apropriação pelos indivíduos do


direito de construção democrática dos objetivos, definição de prioridades, a elaboração de estratégias
de ação e o estabelecimento de canais de diálogo com o Poder Público, visando buscar soluções para
problemas comuns.

Por esses motivos, é importante que as escolas adotem um processo de gestão democrática e de
cidadania deliberativa nas suas relações com a sociedade, buscando assim uma maior proximidade com
os problemas e demandas do cidadão. Na construção desse processo, a escola precisa reconhecer que o
núcleo da sociedade civil forma uma espécie de associação que institucionaliza os discursos capazes de
solucionar problemas, transformando-os em questões de interesse geral no quadro de esferas públicas.

É importante destacar que gestão democrática, gestão compartilhada e gestão participativa


são termos que, embora não se restrinjam ao campo educacional, fazem parte de uma antiga luta
de educadores e movimentos sociais organizados em defesa de um projeto de educação pública de
qualidade social e democrática. Esse processo se concretizou na década de 1990, justamente pelo
fato de a Constituição Federal de 1988 estabelecer princípios para a educação brasileira, entre eles
obrigatoriedade, gratuidade, liberdade, igualdade e gestão democrática, sendo que esses princípios
foram devidamente regulamentados através de leis complementares.

Visando alcançar esses objetivos, a descentralização do ensino constitui um dos fatores essenciais
para o movimento de democratização das escolas brasileiras e da construção de autonomia da gestão
escolar. Descentralização pressupõe participação, entendida por Lück (2009, p. 29) da seguinte maneira:

A participação, em seu sentido pleno, caracteriza-se por uma força de


atuação consciente pela qual os membros de uma unidade social reconhecem
e assumem seu poder de exercer influência na determinação da dinâmica
dessa unidade, de sua cultura e de seus resultados, poder esse resultante de
sua competência e vontade de compreender, decidir e agir sobre questões
que lhe são afetas, dando-lhe unidade, vigor e direcionamento firme.

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Assim, entende-se que propiciar espaços para a participação da comunidade escolar na dinâmica,
nas atividades e nas decisões escolares constitui um dos papéis da escola, pois integrar e possibilitar
que os membros da escola possam interagir com ela, tomando consciência do seu papel na gestão e
no envolvimento, é necessário à abertura de espaços democráticos e de voz à comunidade. Porém,
para que essa participação se torne realidade, são necessários meios e condições favoráveis, ou seja, é
preciso repensar a cultura escolar e os processos, normalmente autoritários, de distribuição do poder
no seu interior.

Uma das principais ferramentas da gestão democrática é o planejamento participativo, uma vez que
ele pode envolver os mais diferentes segmentos da comunidade local e escolar que têm representação
no Conselho Escolar.

Observação

O Conselho Escolar é o órgão máximo para a tomada de decisões


realizadas no interior de uma escola. Ele é formado pela representação de
todos os segmentos que compõem a comunidade escolar.

Porém, para que o planejamento participativo possa cumprir o seu papel, ele deve ser gerenciado
com ampla participação da comunidade, envolvendo a equipe gestora da escola, o conselho escolar, o
grêmio estudantil e outros.

Para os autores que pesquisam o ambiente escolar, a democratização da gestão da escola constitui‑se
numa das tendências atuais mais fortes do sistema educacional, apesar da resistência oferecida pelo
corporativismo das organizações de educadores e pela burocracia instalada nos aparelhos de Estado,
muitas vezes associados na luta contra a inovação educacional.

Um dos maiores desafios da educação brasileira na atualidade não é somente garantir o acesso da
grande maioria das crianças e jovens à escola, mas permitir a sua permanência numa escola feita para
eles e por eles. Para que isso se concretize, é necessário que a escola coloque todos os saberes a serviço
do aluno, capacitando-o para a participação plena na vida social, política, cultural e profissional na
sociedade. Nesse sentido, o objetivo da gestão democrática é buscar a efetivação de uma educação
de qualidade, de modo que todos se reconheçam como atores corresponsáveis por sua promoção.

Entendemos que para a escola cumprir a sua função social é necessário que tenha uma visão do
que está ocorrendo na sociedade, conseguindo assim estabelecer uma conexão do que é ensinado com
a prática cotidiana do aluno, preparando-o para o exercício profissional. No entanto, isso somente
será possível se a sociedade for chamada para participar das decisões que irão ditar os rumos a serem
seguidos pela escola.

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Saiba mais
Sobre o tema, leia o texto a seguir:
GIL, R. M. O papel do gestor escolar na melhoria da qualidade da
educação. Paranavaí: Secretaria da Educação, 2013. Disponível em:
http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/cadernospde/pdebusca/
producoes_pde/2013/2013_uem_gestao_pdp_raquel_mattos_gil.pdf.
Acesso em: 28 ago. 2019.

5.2 Escola, desigualdade social e políticas de inclusão

Diante da realidade sobre as desigualdades educacionais existentes no Brasil, problema que possui
uma relação direta com o modelo socioeconômico adotado pelo país, o Estado tem colocado como um
dos objetivos da gestão pública o enfrentamento dessa questão social.

Por esse motivo, o enfrentamento das desigualdades sociais e educacionais e a pobreza são temas
inseridos nos Planos Nacionais de Educação (PNEs) de 2014 a 2024, apresentando as formas que deverão
ser utilizadas para o enfrentamento do problema visando reduzir o seu impacto social. O tema também
foi inserido nos Planos Plurianuais (PPAs) dos demais entes da federação.

Exemplo de aplicação

O ciclo orçamentário é um processo dinâmico e contínuo, com várias etapas articuladas entre si, por meio
das quais sucessivos orçamentos são discutidos, elaborados, aprovados, executados, avaliados e julgados.

Esse ciclo tem início com a elaboração do Plano Plurianual (PPA) e se encerra com o julgamento da
última prestação de contas do Poder Executivo pelo Poder Legislativo. O Plano Plurianual (PPA), a Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA), que são as três leis que regem o ciclo
orçamentário, são estreitamente ligadas entre si, compatíveis e harmônicas. Elas formam um sistema
integrado de planejamento e orçamento, reconhecido na Constituição Federal, que deve ser adotado
pelos municípios, pelos estados e pela União. A elaboração dos projetos de lei do PPA, da LDO e da LOA
cabe exclusivamente ao Executivo. Em nenhuma esfera o Poder Legislativo pode propor tais leis.

No âmbito municipal, por exemplo, apenas o prefeito pode apresentar à Câmara Municipal os
projetos de PPA, LDO e LOA. Os vereadores não apresentam tais projetos, mas podem modificá-los por
meio de emendas quando são enviados ao Legislativo para discussão e votação.

Já o Ministério Público não discute, não vota, nem aprova o orçamento público.

Procure saber quando o Ministério Público é chamado para ter algum tipo de participação no
ciclo orçamentário.

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Em relação às políticas orçamentárias, é importante destacar que o PNE é o instrumento que define
as diretrizes e as metas para a gestão e o financiamento da educação. Já o PPA é um instrumento
previsto no art. 165 da Constituição de 1988, sendo que o documento deve contemplar as políticas
públicas do governo para um período de quatro anos, tendo a função de organizar e de viabilizar a ação
pública por meio de diretrizes, objetivos e metas que devem balizar a elaboração das Leis Orçamentárias
Anuais (LOA). Ele apresenta a visão de futuro para o país e permite, também, que a sociedade possa ter
um maior controle sobre as ações governamentais.

Um elemento a destacar nos últimos PPAs elaborados pelo Governo Federal é a centralidade
dada à educação, pois o Plano de Desenvolvimento da Educação tem sido colocado como elemento
essencial para o desenvolvimento do país, principalmente no sentido da qualificação da educação. É
importante destacar, ainda, que a pobreza e a desigualdade social são tratadas, nos PNEs e nos PPAs,
como “problemas” centrais a serem atacados, sendo a educação considerada como uma mediação
fundamental para o seu enfrentamento.

Outra questão importante que podemos notar nos textos do PNE e do PPA é a apresentação de
propostas com o objetivo da ampliação das políticas sociais voltadas para o combate à pobreza e à
diminuição das desigualdades sociais e educacionais, a partir de diversos programas sociais, especialmente
do Programa Bolsa Família.

Observação

O Bolsa Família é um programa de transferência de renda do Governo


Federal que tem o objetivo de ajudar famílias brasileiras em situação de
pobreza e extrema pobreza.

Uma das principais preocupações que aparecem nos PNEs é a necessidade de expansão da cobertura
educacional, dando prioridade aos segmentos mais pobres, ou seja, para aqueles que são considerados
em situação de vulnerabilidade social.

Outra questão que tem sido levantada nos planos é a importância da educação como fator para
a superação das condições de pobreza, porém, atuando de forma articulada com as demais políticas
sociais, como saúde, assistência social, moradia, trabalho e emprego.

Essa proposta de articulação entre as políticas sociais consta no PNE 2014-2024 como uma
importante estratégia para o enfrentamento da pobreza. Nele destaca-se a defesa de ações que possam
garantir, especialmente, o acesso e a permanência na educação de estudantes oriundos das famílias
beneficiárias dos programas de transferência de renda (BRASIL, 2014b).

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Saiba mais

O texto a seguir traz algumas análises e informações sobre cada uma


das metas nacionais com o objetivo de aproximar, ainda mais, agentes
públicos e sociedade em geral dos debates e desafios relativos à melhoria da
educação, tendo por eixo os processos de organização e gestão da educação,
seu financiamento, avaliação e políticas de estado, com centralidade no
PNE e na efetiva instituição do SNE. Acesse:

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Planejando a próxima


década: conhecendo as 20 metas do Plano Nacional de Educação. Brasília:
MEC, 2014b. Disponível em: http://pne.mec.gov.br/images/pdf/pne_
conhecendo_20_metas.pdf. Acesso em: 5 ago. 2019.

Diante do que estamos estudando, percebemos que a escola pode ser considerada uma das instituições
sociais em que ocorre o maior encontro das diferenças existentes na sociedade. O espaço escolar possui
uma característica sociocultural marcada por símbolos, rituais e crenças, culturas e valores diversos. Por
esse motivo, as questões relacionadas com a diversidade cultural precisam ser respeitadas no processo
pedagógico dessas instituições.

Foi com a finalidade de tratar de forma mais abrangente a questão da diversidade que, também,
se iniciou a discussão sobre a educação inclusiva, que tem a sua história oriunda dos eventos e
documentos internacionais, nos quais governos mundiais assinaram acordos, sobretudo relacionados à
universalização da educação básica ofertada com qualidade, sem restrição de acesso.

O momento mais importante dessa discussão, sobre o processo de inclusão escolar, teve como marco
inicial a década de 1990, com o discurso em defesa da escola para todos, surgido na Conferência de
Jomtein, na Tailândia. A partir dos compromissos que foram firmados pelos representantes dos países
que participaram dessa conferência, foram realizados outros encontros com essa mesma finalidade, como
a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais (Salamanca, Espanha, 1994) e o Fórum
Consultivo Mundial – Educação para Todos: o Compromisso de Dakar (Dakar, Senegal, 2000). As discussões
realizadas nesses eventos foram importantes para se expandir os propósitos da educação inclusiva.

Lembrete

Educação inclusiva é uma modalidade de educação que inclui alunos


com qualquer tipo de deficiência ou transtorno, ou com altas habilidades
em escolas de ensino regular.

No Brasil, tais princípios balizaram as políticas que passaram a ser implementadas nas escolas
como princípios condutores da inclusão escolar. O principal objetivo dessas políticas é o de assegurar o
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direito de todas as crianças, jovens e adultos à educação, independentemente de suas condições físicas,
intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas e outras (BRASIL, 1997).

Dessa forma, todos os sistemas educativos devem ser projetados e os programas aplicados, de
modo que tenham em vista toda a gama dessas diferentes características e necessidades, sendo que,
principalmente as pessoas com necessidades educativas especiais devem ter acesso às escolas comuns,
que deverão integrá-las numa pedagogia centralizada na criança, capaz de atender a essas necessidades.

O entendimento formado é que essa orientação integradora representa o meio mais eficaz de
combater atitudes discriminatórias, criar comunidades acolhedoras, construir uma sociedade integradora
e dar educação para todos. Além disso, proporcionam uma educação efetiva à maioria das crianças
e ainda melhoram a eficiência e, certamente, a relação custo-benefício de todo o sistema educativo
(BRASIL, 1997, p. 10).

Visando alcançar esses objetivos, os Parâmetros Curriculares Nacionais referentes às quatro primeiras
séries do Ensino Fundamental trouxe princípios que auxiliam os educadores a fazer com que as crianças
dominem os conhecimentos de que necessitam para crescerem como cidadãos plenamente reconhecidos
e conscientes de seu papel em nossa sociedade. Porém, os próprios organizadores do documento
reconhecem que esses objetivos somente serão alcançados se for oferecido aos alunos pleno acesso
aos recursos culturais relevantes para a conquista de sua cidadania, sendo que tais recursos incluem
tanto os domínios do saber tradicionalmente presentes no trabalho escolar quanto as preocupações
contemporâneas com o meio ambiente, com a saúde, com a sexualidade e com as questões éticas
relativas à igualdade de direitos, à dignidade do ser humano e à solidariedade.

Há muito se diz que o Brasil é um país rico em diversidade étnica e cultural,


plural em sua identidade: é índio, afrodescendente, imigrante, é urbano,
sertanejo, caiçara, caipira... Contudo, ao longo de nossa história, têm existido
preconceitos, relações de discriminação e exclusão social que impedem
muitos brasileiros de ter uma vivência plena de sua cidadania. O documento
de Pluralidade Cultural trata dessas questões, enfatizando as diversas
heranças culturais que convivem na população brasileira, oferecendo
informações que contribuam para a formação de novas mentalidades,
voltadas para a superação de todas as formas de discriminação e exclusão
(BRASIL, 1997, p. 15).

Ressaltamos que os Parâmetros Curriculares Nacionais indicam como objetivos do Ensino


Fundamental que os alunos sejam capazes de:

• compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e
deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação e
repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito;
• posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais,
utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas;

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• conhecer características fundamentais do Brasil nas dimensões sociais, materiais e culturais como
meio para construir progressivamente a noção de identidade nacional e pessoal e o sentimento
de pertinência ao país;

• conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, bem como aspectos


socioculturais de outros povos e nações, posicionando-se contra qualquer discriminação baseada
em diferenças culturais, de classe social, de crenças, de sexo, de etnia ou outras características
individuais e sociais;

• perceber-se integrante, dependente e agente transformador do ambiente, identificando seus


elementos e as interações entre eles, contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente;

• desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas


capacidades afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social,
para agir com perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania;

• conhecer e cuidar do próprio corpo, valorizando e adotando hábitos saudáveis como um dos
aspectos básicos da qualidade de vida e agindo com responsabilidade em relação à sua saúde e à
saúde coletiva;

• utilizar as diferentes linguagens (verbal, matemática, gráfica, plástica e corporal) como meio para
produzir, expressar e comunicar suas ideias, interpretar e usufruir das produções culturais, em
contextos públicos e privados, atendendo a diferentes intenções e situações de comunicação;

• saber utilizar diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos para adquirir e


construir conhecimentos;

• questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isso


o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando
procedimentos e verificando sua adequação.

Saiba mais

Leia o documento a seguir:

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares


nacionais: pluralidade cultural, orientação sexual. Brasília: MEC/SEF,
1997. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro101.
pdf. Acesso em: 2 ago. 2019.

Assim, com o compromisso assumido pelos governos de implementarem a educação inclusiva, os


sistemas de ensino passaram a organizar seus atos normativos e orientativos, com vistas à oferta de uma
educação voltada para o enfrentamento à exclusão dos diferentes grupos por questões étnico-raciais
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ou de gêneros, considerando os pressupostos da educação para todos, conciliados com os princípios


e diretrizes da educação inclusiva. Para isso, foram e estão sendo adotadas mudanças dos sistemas
de ensino, das escolas e das práticas pedagógicas, além de outras providências que são necessárias à
viabilização do acesso e permanência com qualidade na escola, beneficiando todos os alunos.

Todo esse movimento também tem por fundamento a questão de que a inclusão deve estar
apoiada no princípio de que a escola inclusiva deve assegurar a igualdade entre os alunos diferentes,
e esse posicionamento lhes garante o direito à diferença na igualdade de direito à educação, sendo
que esse posicionamento do sistema escolar deve estar em consonância com o princípio da isonomia,
previsto no Artigo 5º da Constituição Federal.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e
à propriedade (BRASIL, 1988).

Observação

O princípio da isonomia, também conhecido como princípio da


igualdade, representa o símbolo da democracia, pois indica um tratamento
justo para os cidadãos.

O movimento mundial pela educação inclusiva é uma ação política, cultural, social e pedagógica,
desencadeada em defesa do direito de todos os alunos de estarem juntos, aprendendo e participando, sem
nenhum tipo de discriminação. Dessa forma, a educação inclusiva constitui um paradigma educacional
fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores
indissociáveis e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as circunstâncias
históricas da produção da exclusão dentro da escola.

Ao reconhecer que as dificuldades enfrentadas nos sistemas de ensino evidenciam a necessidade de


confrontar as práticas discriminatórias e criar alternativas para superá-las, a educação inclusiva assume
papel central no debate acerca da sociedade contemporânea e do papel da escola na superação da
lógica da exclusão. Por esse motivo, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional destinou um dos
seus capítulos para tratar exclusivamente da educação especial voltada para as pessoas portadoras de
deficiência, como veremos a seguir.

Lei n. 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – 1996.

Capítulo V. Da educação especial.

Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a
modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede
regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.
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§ 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola


regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial.

§ 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços


especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos,
não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular.

§ 3º A oferta da educação especial, dever constitucional do Estado, tem


início na faixa etária de zero a seis anos, durante a Educação Infantil.

Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com


necessidades especiais:

I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização


específicos, para atender às suas necessidades;

II – terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível


exigido para a conclusão do Ensino Fundamental, em virtude de suas
deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar
para os superdotados;

III – professores com especialização adequada em nível médio ou superior,


para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular
capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;

IV – educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na


vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem
capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação
com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma
habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;

V – acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares


disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.

Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios


de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas
e com atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e
financeiro pelo Poder Público.

Parágrafo único. O Poder Público adotará, como alternativa preferencial, a


ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na
própria rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às
instituições previstas neste artigo (BRASIL, 1996).

89
Unidade II

A partir das informações que apresentamos, verificamos que o grande desafio colocado para o Brasil
é a erradicação da pobreza extrema e diminuir as desigualdades educacionais. A universalização dos
níveis educacionais compreendidos entre a Educação Infantil e o Ensino Médio é uma proposta que
tem sido posta em prática com vistas a diminuir as desigualdades educacionais. Da mesma forma,
as desigualdades educacionais no âmbito da educação superior também precisam ser enfrentadas, e
isso tem sido feito por meio de políticas inclusivas e de assistência estudantil direcionadas para os
estudantes das instituições públicas, estudantes bolsistas das instituições privadas e beneficiários do
Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).

Todas essas ações são vistas como fundamentais para a redução das desigualdades étnico-raciais,
bem como para ampliar o acesso e a permanência, nas universidades, dos estudantes pobres oriundos
das escolas públicas, afrodescendentes, indígenas, com deficiência, entre outros.

Além dessas ações, para que as desigualdades educacionais apontadas no PNE sejam enfrentadas, é
necessária a ampliação dos investimentos públicos em educação pública. Assim, podemos perceber que
muitos são os desafios para garantir a cidadania da juventude, sendo necessário investir no aumento da
permanência na escola, na elevação do nível de escolaridade, na ampliação do número de matrículas no
Ensino Superior e na educação técnica e profissional, na contenção da inserção precoce no mercado de
trabalho, entre outros aspectos, reforçando a continuidade da persistência de um quadro de desigualdades
educacionais no país. Por esses motivos, a qualidade da educação nacional é tomada como estratégica
e urgente, com o objetivo de preparar, especialmente, crianças e jovens para os desafios da vida em
sociedade, para a inclusão cidadã e a inserção no mundo do trabalho.

6 CIDADANIA, EMANCIPAÇÃO E O LUGAR DA ESCOLA PÚBLICA

Antes de iniciarmos o desenvolvimento deste tópico, é importante definirmos os conceitos de


cidadania e emancipação.

Podemos definir cidadania como o conjunto de direitos e deveres que são exercidos por uma
determinada pessoa que vive em uma sociedade. Ela também diz respeito ao poder e grau de
intervenção que o indivíduo dispõe no usufruto dos espaços que ocupa e, principalmente, na sua
posição e no poder que possui de interferir e transformar esses locais.

Já a palavra emancipação está relacionada com o ato de tornar livre ou independente. Porém, o
mesmo termo também pode ser aplicado para exemplificar a luta das minorias pelos seus direitos de
igualdade ou pelos seus direitos políticos enquanto cidadãos.

Emancipação: significa o ato de tornar livre ou independente. O termo é


aplicado em muitos contextos como emancipação de menor, emancipação
da mulher, emancipação política etc. Em Filosofia, a emancipação é a luta
das minorias pelos seus direitos de igualdade ou pelos seus direitos políticos
enquanto cidadãos (EMANCIPAÇÃO, 2010).

90
POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

Já que trouxemos a definição de cidadania e emancipação, torna-se importante também definir o


que devemos entender por escola pública.

Escola pública nos remete ao conceito de serviço público que precisa ser oferecido pelo Estado aos
cidadãos, devendo possuir um caráter universal, ou seja, para todas as crianças em idade escolar, sendo
que oferecer a oportunidade para que todas as crianças tenham acesso à escola pública representa a
igualdade de oportunidades.

Este tópico será dedicado à compreensão do processo que a escola pública deve desempenhar como
garantidora do processo de construção da cidadania do sujeito e, consequentemente, do seu processo
de emancipação.

Na década de 1950, Anísio Teixeira escreveu o livro Educação não é privilégio a partir de suas
conferências em que defendia a escola pública, laica e gratuita, e, por isso, sofreu profunda contestação,
tendo sido atacado por lideranças católicas brasileiras.

Saiba mais

Para quem se interessar em conhecer melhor a história de Anísio


Teixeira, é possível assistir ao vídeo a seguir:

ANÍSIO Teixeira: educação não é privilégio. Brasil: TV Escola, 2007.


44 minutos. Disponível em: https://tvescola.org.br/videos/educadores-
brasileiros-anisio-teixeira-educacao-nao-e-privilegio. Acesso em: 10 ago. 2019.

Trazemos esse exemplo pelo fato de que muitos dos problemas apresentados por Anísio Teixeira
permanecem na agenda de discussão e na pauta de reivindicações das políticas públicas de educação
em nosso país.

É inegável que a educação constitui-se um dos principais e ativos mecanismos


de transformação de um povo e é papel da escola, de forma democrática
e comprometida com a promoção do ser humano na sua integralidade,
estimular a formação de valores, hábitos e comportamentos que respeitem
as diferenças e as características próprias de grupos e minorias. Assim, a
educação é essencial no processo de formação de qualquer sociedade e
abre caminhos para a ampliação da cidadania de um povo. Ministra Matilde
Ribeiro (BRASIL, 2004, p. 7).

Atualmente, muito se diz e muito se pode dizer acerca da escola pública contemporânea, pois essa
instituição tornou-se alvo de disputas e manifestações que praticamente envolvem todos os segmentos
sociais da complexa sociedade capitalista atual. Nesse sentido, a instituição escola está sob intensa
disputa, quer pela função que ela realmente exerce no tipo de sociedade que se vem configurando, quer
pelas funções que os homens pensam que ela exerce ou poderia exercer.
91
Unidade II

Para que a educação consiga ensejar formas de emancipação social, tem, necessariamente, que
começar desvelando os princípios políticos subjacentes às práticas pedagógicas. Isso ocorre pelo fato
de que toda prática educativa é ao mesmo tempo uma prática política, não existindo nenhum tipo de
neutralidade nesse processo. Porém, nas relações de poder existentes na sociedade, muitas vezes vamos
encontrar discursos que são utilizados para esconder a dimensão política da educação.

Mas é sempre importante encontrar formas para que a educação possa articular-se e consiga, de fato,
contribuir para a construção do desenvolvimento de um projeto que seja ao mesmo tempo educativo e
emancipador. Assim, torna-se imprescindível pensar numa escola pública que consiga realizar práticas
pedagógicas que possam atender às demandas sociais e políticas dos indivíduos que buscam os seus
serviços, embora o processo de emancipação social deva ser objetivo de todas as políticas públicas, e
não somente da escola pública.

Nesse sentido, o maior desafio da escola pública se encontra na construção de conhecimentos


que sejam úteis para ampliar as possibilidades de emancipação social do sujeito, conduzindo-o
a uma formação política que o capacite para lutar por melhores condições de vida, adquirindo
competência de fazer uma análise crítica da sociedade e encontre possibilidades de superação
dentro de um modelo social que tem se demonstrado como extremamente injusto, principalmente,
para as classes menos favorecidas.

6.1 Assistência social e educação como políticas sociais

Para iniciarmos este tópico, podemos partir da afirmação de que não há política social desligada das
lutas sociais, pois somente a partir da luta dos trabalhadores por mais direitos é que o Estado assumiu
algumas das reivindicações populares ao longo de sua existência histórica. Assim, os direitos sociais
dizem respeito inicialmente à consagração jurídica de reivindicações dos trabalhadores.

As políticas sociais ora são vistas como mecanismos de manutenção da


força de trabalho, ora como conquista dos trabalhadores, ora como arranjos
do bloco no poder ou bloco governante, ora como doação das elites
dominantes, ora como instrumento de garantia do aumento da riqueza ou
dos direitos do cidadão (FALEIROS, 1991, p. 8).

Já mencionamos os direitos sociais, pois são eles os que obrigam o Estado a criar as políticas sociais.
Os direitos sociais são os chamados direitos de segunda geração. Ao contrário dos direitos de primeira
geração, em que o Estado não deve intervir, nos direitos de segunda geração o Estado passa a ter
responsabilidade para a concretização de um ideal de vida digno na sociedade.

Relacionados ao valor de igualdade, os direitos fundamentais de segunda geração são por


excelência os direitos sociais, econômicos e culturais – direitos que, para serem garantidos,
necessitam, além da intervenção do Estado, que este disponha de poder pecuniário, seja para
criá‑las ou executá-las, uma vez que eles não se podem cumprir efetivamente sem o aspecto
monetário os direitos de segunda geração.

92
POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

Assim, as políticas sociais têm uma relação direta com a política econômica e com conceitos
relacionados ao custo de oportunidade, pois quando o Estado decide investir mais recursos para valorizar
o capital, consequentemente haverá menos recursos para investir em políticas sociais.

Observação

O custo de oportunidade é um termo usado em economia para indicar


o custo de algo em termos de uma oportunidade renunciada.

Saiba mais

Para sabermos mais sobre as gerações do Direito, é importante a leitura


do artigo a seguir, em que o autor conceitua e demonstra a evolução
dos direitos fundamentais, apresentando as características marcantes e
individualizadoras dos direitos fundamentais e explicando cada uma delas.

SOUZA, I. As três gerações dos direitos humanos. Politize!, [s.d.].


Disponível em: https://www.politize.com.br/tres-geracoes-dos-direitos-
humanos/. Acesso em: 21 ago. 2019.

As políticas sociais estão relacionadas com as ações voltadas para a formação de um sistema
de proteção social que deve ser implantado pelo Estado, com o objetivo de diminuir a desigualdade
socioeconômica, através da redistribuição dos benefícios sociais. O principal objetivo das políticas sociais
é reduzir a desigualdade social e promover a inclusão das pessoas mais vulneráveis.

As políticas sociais no Brasil estão relacionadas diretamente às condições


vivenciadas pelo País em níveis econômico, político e social. São vistas como
mecanismos de manutenção da força de trabalho, em alguns momentos,
em outros como conquistas dos trabalhadores, ou como doação das elites
dominantes, e ainda como instrumento de garantia do aumento da riqueza
ou dos direitos do cidadão (FALEIROS, 1991, p. 8).

Agora que já temos uma compreensão sobre os direitos sociais e sobre as políticas sociais, podemos
tratar da política de assistência social e da política de educação.

A assistência social é uma das políticas sociais, sendo considerada um direito do cidadão e dever do
Estado instituído pela Constituição Federal de 1988 e regulamentado pela Lei Orgânica da Assistência
Social (Loas) em 1993. A assistência social é também uma política de seguridade social, formando o
chamado tripé da seguridade social, juntamente com a saúde e a previdência social.

93
Unidade II

Art. 1º A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de


Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada
através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade,
para garantir o atendimento às necessidades básicas (BRASIL, 1993).

Na mesma linha, as políticas educacionais também pertencem ao grupo de políticas públicas


sociais do Brasil, constituindo-se num dos elementos de normatização do Estado, visando garantir o
direito universal à educação de qualidade e o pleno desenvolvimento do educando. Assim, as políticas
educacionais tiveram a sua efetivação com o propósito de alcançar a maior parte da população, buscando
por meio do acesso à educação oferecer oportunidades que possam promover a igualdade social.

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será


promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988).

A obrigação do Estado em se responsabilizar pelas políticas sociais tem uma relação direta com
o conceito de direitos sociais que, apesar de não poderem ser exigidos subjetivamente, obrigam
uma atitude positiva, constante e diligente do Estado, no intuito de promover a transformação das
estruturas sociais.

No Brasil, os direitos sociais foram alcançados ou construídos por meio das relações estabelecidas
entre os deveres do Estado e as relações deste com a sociedade civil, sendo que a Constituição Federal
de 1988 colocou esses direitos como um assunto prioritário para a gestão pública. Os princípios
constitucionais dos direitos sociais estão elencados no artigo 6º da nossa Constituição Federal.

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a


moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade
e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição
(BRASIL, 1988).

Exemplo de aplicação

Ouça a música a seguir. Na sequência, faça uma reflexão sobre a letra da música e os direitos
previstos no artigo 6º da Constituição Federal.

ANTUNES, A.; FROMER, M.; BRITTO, S. Comida. Intérprete: Titãs. In: TITÃS. Jesus não tem dentes no
país dos banguelas. Rio de Janeiro: WEA, 1987. LP. Faixa 2.

Para que se forme uma interface entre os direitos sociais e as políticas sociais é que existe a gestão
social, que deve ser constituída no foco do social em complementariedade ao econômico e no foco do
espaço público, como lócus de interface entre a sociedade civil e o Estado.

94
POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

A gestão social funda-se na concepção de um Estado social de direito – portanto, comprometida


com a cidadania de todos os cidadãos de uma nação – e ancora-se em princípios constitucionais que
dão forma e conteúdo às políticas, aos programas e aos serviços públicos, reconhecendo o Estado como
autoridade reguladora das ações públicas. Assim, no desenho e no conteúdo da política social, voltam‑se
as maiores expectativas por redução de desigualdades, enfrentamento da pobreza e oportunidade
efetiva de inclusão social de grande parcela da população brasileira.

Na atualidade, para termos parâmetros que permitam discutir o tema políticas sociais, é necessária
uma reflexão situando o significado das políticas sociais, seus novos desenhos, tendências e a busca
por novas propostas de gestão pública do social no Brasil, uma vez que o país passou por significativas
mudanças sociais após a promulgação da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, os novos desafios postos ao trabalho social são resultados de mudanças maiores na
conjuntura brasileira e no cenário internacional, imposta principalmente pela adoção de um modelo
econômico neoliberal adotado pelas políticas públicas pós-1990. As conjunturas mudaram, a sociedade
tornou-se mais urbana e complexa e, nesse contexto, a própria configuração da questão social alterou‑se
num mundo globalizado e os desenhos e os arranjos da política social ganharam maior complexidade.

Observação

A globalização é um dos termos mais frequentemente empregados


para descrever a atual conjuntura do sistema capitalista e sua consolidação
no mundo.

Porém, o trabalho social continua sendo a mediação necessária a toda política pública que se
comprometa com a busca da equidade e o enfrentamento das desigualdades sociais.

Compreendemos como trabalho social as atividades que pretendem melhorar as condições materiais,
de salubridade, culturais ou educativas da população, considerando que os assistentes sociais são por
essência os trabalhadores sociais. Assim, a produtividade das políticas públicas agora depende de um
processo de articulação política, de enraizamento comunitário, de informação e de comunicação.

Apesar dessas considerações, é inegável que no Brasil, a partir da Constituição de 1988, foram
abertos espaços para a implementação de políticas públicas mais democráticas, descentralizadas e
participativas, sem, contudo, alcançar os resultados almejados.

As políticas públicas adotadas, com os seus resultados muito positivos, se


deram no quadro de um marco institucional relativamente avançado, graças
à Constituição de 1988, mas com uma cultura política profundamente
deformada: a máquina pública foi criada e utilizada não para prestar serviços
e desenvolver a cidadania, mas para administrar privilégios. Repensar as
políticas públicas, neste quadro, tornou-se essencial (CARVALHO, 2014, p. 13).

95
Unidade II

Nesse novo cenário constitucional, as políticas públicas são concebidas como um conjunto de
iniciativas articuladas, focando o acesso ao mercado de trabalho, a segmentação urbana, as desigualdades
de gênero, os desequilíbrios regionais e outras demandas proeminentes. Porém, as demandas dos
cidadãos e territórios estão postas de forma interconectada; quem as separa são as políticas setoriais, ao
ofertar de forma fragmentada e desconexa os seus serviços, programas e benefícios. Assim, as políticas
integradas precisam se materializar em iniciativas articuladas e diferenciadas em territórios concretos.

Pesquisa do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação


Comunitária (Cenpec), por exemplo, mostra que nas áreas de elevada
vulnerabilidade social a educação simplesmente não funciona: é preciso ter
um mínimo de condições de segurança, de renda, de habitação e ambiente
cultural para a educação fazer sentido (CARVALHO, 2014, p. 13).

Diante dessa realidade, o trabalho social torna-se essencial para o próprio sucesso das políticas
públicas, ao gerar melhor capacidade local de absorvê-las de maneira interativa.

Na atualidade, percebe-se claramente o quanto as mediações produzidas


pelo trabalho social são indispensáveis para a apropriação e o usufruto
efetivo dos serviços e programas sociais priorizados pelas políticas
públicas na mudança das condições de vida da população em situação de
vulnerabilidade social. Por exemplo, na educação, política pública da maior
importância, estamos obtendo pífios resultados no desempenho dos alunos
ainda no Ensino Fundamental (CARVALHO, 2014, p. 19).

O que se percebe é que a garantia do usufruto e a permanência dos adolescentes e jovens nas escolas
também dependem da qualidade da relação que os serviços e operadores das políticas estabelecem com
eles. Os dados demonstram que a mera existência de equipamentos e serviços não garante a apropriação
e o usufruto efetivo da população. Por esses motivos, o trabalho social tornou-se estratégico para
promover a efetivação da ação política pública, sua articulação e protagonismo do cidadão. Assim, o
trabalho social deve incorporar uma agenda de desenvolvimento do território, integrado e sustentável.

Agir no território e
com o território

Agir no fortalecimento de Agir de forma integrada


vínculos sociorrelacionais, Trabalho e articulando políticas
competência comunicativa e Social setoriais, fortalecendo o
participação agir em rede

Agir potencializando os aportes


culturais que podem promover
mudanças

Figura 7

96
POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

Tal tipo de cooperação também está previsto nas normativas do Sistema Único de Assistência
Social (Suas). Entre os princípios que devem regular a chamada Gestão Territorial da Proteção Social
Básica (tarefa a cargo das Secretarias de Assistência Social) estão a promoção da articulação
intersetorial e a busca ativa.

Além disso, um dos serviços previstos na Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais é
o Serviço Especializado em Abordagem Social. Segundo a normativa do Suas, esse serviço deve ser
ofertado nos municípios pelas Secretarias de Assistência Social de forma continuada e programada,
envolvendo um trabalho de abordagem e busca ativa que identifique nos territórios a incidência de
problemas que atingem crianças e adolescentes, tais como trabalho infantojuvenil ilegal, exploração
sexual e situação de rua, que geram, entre outras consequências negativas, limitações na trajetória
escolar ou evasão escolar.

Se for operado em sintonia com as escolas públicas, esse serviço socioassistencial pode contribuir
de forma significativa não apenas para interromper violências, mas também para promover o
encaminhamento de crianças e adolescentes às demais políticas setoriais, entre as quais a educação.

Raciocínio semelhante pode ser feito para o Programa Saúde da Família, cujos agentes podem atuar
em sintonia com as escolas e os serviços socioassistenciais para identificar e promover ações protetivas
contra problemas que afetam a saúde dos adolescentes e limitam sua trajetória escolar, tais como o uso
de substâncias psicoativas por parte de familiares ou dos próprios adolescentes.

Lembrete

O Programa Saúde da Família busca promover a qualidade de vida da


população brasileira e intervir nos fatores que colocam a saúde em risco.

Se pensarmos na violência e na criminalidade presentes nas comunidades de risco, no entorno ou


mesmo no interior de muitas escolas, a articulação e a cooperação mais intensas entre as escolas e a
segurança pública também são vitais.

Outro desafio para a melhoria da educação brasileira, cujo enfrentamento depende da existência de
uma adequada articulação entre as escolas e os serviços socioassistenciais, é a criação de condições que
viabilizem a oferta da educação integral (e em tempo integral) para crianças e adolescentes.

Nesse sentido, o Plano Nacional de Educação, em sua meta 6, afirma a necessidade da oferta de
educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos,
25% dos alunos da educação básica.

Antes do Plano Nacional de Educação, o Programa Mais Educação (instituído pela Portaria
Interministerial n. 17/2007 e detalhado pelo Decreto n. 7.083/2010) já havia definido a educação em
tempo integral como a jornada escolar com duração igual ou superior a sete horas diárias, durante todo
o período letivo, compreendendo o tempo total em que o aluno permanece na escola ou em atividades
escolares oferecidas em outros espaços educacionais.
97
Unidade II

O Programa Mais Educação estimula a adoção da educação integral sob a forma de jornada
ampliada. Busca promover a melhoria da aprendizagem de crianças, adolescentes e jovens matriculados
no Ensino Fundamental de escolas públicas, por meio da multiplicação da oferta de atividades de
acompanhamento pedagógico, experimentação e investigação científica, cultura e artes, esporte e lazer,
cultura digital, educação econômica, comunicação e uso de mídias, meio ambiente, direitos humanos,
práticas de prevenção aos agravos à saúde, promoção da saúde e da alimentação saudável, entre outras.
Segundo o Decreto que detalhou o programa, essas atividades poderão ser desenvolvidas dentro do
espaço escolar, de acordo com a disponibilidade de cada escola, ou fora dele, sob orientação pedagógica
da escola, mediante o uso dos equipamentos públicos e do estabelecimento de parcerias com órgãos ou
instituições locais.

Buscando promover a concretização dessas parcerias e, desta forma, ampliar a oferta de educação
integral, o Ministério do Desenvolvimento Social e o Ministério da Educação lançaram, em dezembro de
2014, a Instrução Operacional n. 01, que orienta gestores e profissionais das áreas da assistência social
e da educação a efetivar a integração entre os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos
(SCFV), que são oferecidos pelas Secretarias Municipais de Assistência Social, e as escolas públicas, cuja
atuação deve ser orientada pelo Programa Mais Educação.

Segundo essa Instrução Operacional, os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos


possuem características que favorecem a oferta de ações complementares, de caráter cultural, lúdico,
social e educacional, a um público de crianças e adolescentes que é atendido tanto pelas políticas de
assistência social quanto pelas escolas públicas.

A Instrução Operacional afirma que as parcerias entre as escolas e os SCFV não devem se limitar
à simples inclusão de estudantes beneficiários do Programa Bolsa Família nos espaços que oferecem
atividades no contraturno escolar, mas devem ser desenvolvidas de modo a promover o fortalecimento
das relações intersetoriais entre educação e assistência social.

Juntas, as escolas e os serviços socioassistenciais devem também articular a participação de áreas


como cultura, esporte, meio ambiente, ciência e tecnologia e juventude, ampliando assim as condições
de proteção, apoio e garantia dos direitos dos sujeitos e de suas famílias.

Em suma, os planos e orientações mencionados reafirmam a indiscutível importância da articulação


entre políticas setoriais para o enfrentamento de problemas que restringem a vida escolar e o
desenvolvimento integral de crianças e adolescentes.

Cumpre agora verificar em que medida essas normas estarão sendo concretizadas na prática,
acompanhar o processo de sua implantação e identificar dificuldades e caminhos que precisem ser
considerados para que os avanços desejados se concretizem.

Diante do exposto, podemos concluir que na atualidade os assistentes sociais possuem atribuições
que se inserem no âmbito da elaboração, execução e avaliação de políticas públicas, inclusive na área da
educação. E, como profissional inserido na política de educação, o assistente social tem a possibilidade
de contribuir para que o direito de acesso a essa política social alcance um maior número de indivíduos,
98
POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

principalmente os que se encontram numa situação de vulnerabilidade social, entendendo vulnerabilidade


de acordo com a definição expressa no PNAS 2004:

Constitui o público usuário da Política de Assistência Social, cidadãos


e grupos que se encontram em situações de vulnerabilidade e riscos,
tais como: famílias e indivíduos com perda ou fragilidade de vínculos de
afetividade, pertencimento e sociabilidade; ciclos de vida; identidades
estigmatizadas em termos étnico, cultural e sexual; desvantagem pessoal
resultante de deficiências; exclusão pela pobreza e, ou, no acesso às demais
políticas públicas; uso de substâncias psicoativas; diferentes formas de
violência advinda do núcleo familiar, grupos e indivíduos; inserção precária
ou não inserção no mercado de trabalho formal e informal; estratégias e
alternativas diferenciadas de sobrevivência que podem representar risco
pessoal e social (BRASIL, 2005).

6.2 Educação e neoliberalismo

Para iniciar o nosso estudo sobre educação e neoliberalismo, é necessário fazer algumas indagações:
A educação é livre para todos? Qual é a proposta liberal e neoliberal para a educação no Brasil?

Com certeza não temos uma resposta definitiva para essas questões, e durante a leitura do texto o
aluno observará que os autores que tratam do tema defendem ou criticam o liberalismo que cada um
deles concebe a partir de determinadas referências teóricas clássicas e contemporâneas de que se utilizam.

Nosso objetivo não é dizer se o modelo de educação neoliberal adotado no Brasil obteve resultados
satisfatórios ou não. O que buscamos é trazer informações sobre o liberalismo e sobre o modelo de
educação neoliberal para que o próprio aluno tenha condições de formar a sua opinião sobre esse tema
importante e que está diretamente relacionado com o desenvolvimento do país. Acreditamos ser essa
a melhor forma de tratar o assunto pelo fato de que, no Brasil, ainda não temos uma definição exata
do melhor modelo de educação a ser adotado, ou, ainda, se podemos ter somente um modelo para um
país de proporções continentais como o nosso e com significativas diferenças culturais, econômicas e
sociais que devem ser levadas em conta no momento de se pensar um projeto educacional. Assim, para
que possamos discutir educação e neoliberalismo, precisamos conhecer o movimento liberal e as suas
principais propostas para a organização das políticas do Estado.

Falar de liberalismo significa falar de algo que está presente em nossa vida, nas relações sociais.
Ele está tão incorporado à nossa vida que às vezes, apesar de não admitirmos, na prática, somos mais
liberais do que pensamos.

Ao escrevermos sobre liberalismo ou neoliberalismo, é necessário expor sobre qual liberalismo


estamos tratando e qual liberalismo estamos tomando como referência. Por esse motivo, visando
facilitar o percurso do aluno no emaranhado conceitual do termo liberalismo, precisamos fazer uma
explanação sobre o pensamento liberal. De uma forma geral, o liberalismo pode ser tomado como
uma doutrina política que propõe um Estado como associação de indivíduos independentes visando
99
Unidade II

facilitar os projetos ou a felicidade de seus membros (LOMBARDI; SANFELICE, 2007). Já numa forma
mais genérica, o liberalismo é uma referência à toda moderna tradição ocidental de pensamento e
comportamento em contraste com as tradicionais formas de ordem encontradas na Ásia e na África.
Para a crítica marxista, o liberalismo é o aspecto doutrinário do capitalismo.

Outra questão importante é que o significado de liberalismo muda não apenas com o seu nível
de abstração e com o passar do tempo, mas também de país a país. Por esse motivo, os mais variados
autores defendem ou criticam certo liberalismo que, à sua maneira, cada um deles concebe a partir de
determinadas referências teóricas clássicas e contemporâneas que se utilizam.

Diante dessas observações, verifiquemos o que podemos apreender sobre liberalismos ao consultarmos
o dicionário, assim poderemos continuar os nossos estudos partindo de uma referência prévia, tomando
por base a seguinte indicação:

Liberalismo: Doutrina econômica, política e social fundada na livre


iniciativa, na liberdade individual, no pluralismo partidário, e nos governos
representativos, na economia de mercado, na igualdade de oportunidade
para todos e na proteção das liberdades civis e políticas, sem nenhuma
intervenção do Estado, para se atingir o progresso geral e o bem-estar social
e privado (LIBERALISMO, 2010).

Toda esta discussão preliminar tem por objetivo nos aproximar do tema “educação e neoliberalismo”,
pois o liberalismo como uma filosofia política tem como princípio fundamental a liberdade como bem
supremo do indivíduo e que não pode ser transgredido por outros indivíduos.

Para impedir que um indivíduo tenha seus direitos limitados por outrem, criou-se o Estado, cujo
papel é de, por meio do governo, criar condições para que nenhum indivíduo seja coagido por terceiros.
O Estado moderno como conhecemos hoje é constituído de três elementos originários e indissociáveis,
como veremos a seguir:

• Povo: é o seu componente humano, demográfico.

• Território: a sua base física, geográfica.

• Governo soberano: o elemento condutor do Estado, que detém e exerce o poder absoluto de
autodeterminação e auto-organização emanado do povo.

O Estado, portanto, é a única entidade que tem o poder de coagir na sociedade, podendo fazer isso
inclusive pelo uso da força. Para frear a tendência do Estado em acrescentar e assumir outras funções, é
fundamental o cumprimento de uma Constituição Liberal. Nesse sentido, para os pensadores liberais, na
área educacional, bem como em outras esferas da vida social, o Estado deve se abster de toda e qualquer
tentativa de atuar diretamente, ministrando educação, ou de regular ou de intervir na educação.

Para o pensamento liberal, a educação somente dever ser regulada pelo mercado, sendo um bem pago
e não obrigatório, pois ninguém deve ser obrigado a buscá-lo, nem mesmo para o seu próprio bem.
100
POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

Os autores liberais também consideram incompatível com os princípios liberais a existência de um só


tipo de escola, um só tipo de currículo, uma só metodologia de aprendizagem, um só ritmo a que todos
os educandos devem se adequar.

Diante desse posicionamento sobre a educação, torna-se imperioso para o liberalismo a valorização
do ensino privado, pois é uma ideologia que justifica e racionaliza os interesses do capital, em diferentes
etapas do seu desenvolvimento. E nessas diferentes etapas, a privatização foi uma estratégia de
recomposição e manutenção da ordem capitalista, não por uma determinação política, mas por um
imperativo do desenvolvimento econômico.

Adam Smith, um dos criadores do pensamento liberal clássico, já defendia que as instituições
educacionais públicas deveriam ser pagas de modo a cobrir seus gastos.

Observação

Adam Smith (1723-1790) foi um economista e filósofo social do


iluminismo escocês e é considerado o pai da economia moderna. Abordou
questões como crescimento econômico, ética, educação etc.

Para Smith, o ensino seria mais bem desenvolvido e obteria melhores resultados se ocorresse sem a
interferência do Estado, a partir da relação livre e natural entre os indivíduos, isto é, por meio do mercado.

Além da perspectiva preferencialmente privatista de Smith, este também


defendia uma educação dualista: um ensino mínimo para as “pessoas
comuns” (centrado no essencial: ler, escrever, calcular e rudimentos da
geometria e da mecânica); o ensino das ciências mais elevadas e mais úteis
para as “pessoas de posição e fortuna médias ou superiores” (LOMBARDI;
SANFELICE, 2007, p. 13).

A análise desse clássico evidencia que a defesa de um ensino privado e dual, sob controle do mercado,
nada tem de novo. Porém, este tópico trata de “educação e neoliberalismo”, e até agora escrevemos
somente sobre o liberalismo; assim, faz-se necessária a seguinte consideração: neoliberalismo nada mais
é do que o liberalismo apresentado com uma nova “roupagem”, de certa forma mais fácil de ser aceito
pela sociedade. Vejamos a definição encontrada no dicionário.

Neoliberalismo: Movimento político-econômico, iniciado nos anos 60, que


combina ideias liberais tradicionais de justiça social com uma grande ênfase
ao desenvolvimento econômico, sem nenhuma interferência do Estado na
economia (NEOLIBERALISMO, 2010).

Para desvelar o momento atual do capitalismo é necessário fazer uma análise da produção teórica
de Friedrich Hayek e Milton Friedman, os quais estabeleceram os fundamentos para a redução do Estado,
a mercantilização dos direitos sociais, a ausência de sensibilidade com o social e uma reacionalidade
101
Unidade II

instrumental, em benefício do capital. É importante essa colocação para podermos compreender em que
momento houve a transição do liberalismo clássico para o neoliberalismo moderno.

Para se compreender o neoliberalismo, é preciso analisá-lo numa perspectiva histórica que permita
ver o que há de novo no liberalismo, já que, por um lado, o termo indica que há uma ruptura e, por
outro, que ocorre uma continuidade no liberalismo.

Sem dúvida alguma, Friedrich Hayek (1899-1992) e Milton Friedman (1912-2006) destacam-se entre
os principais ideólogos da versão do liberalismo que tomou corpo, principalmente, a partir da segunda
metade da década de 1970 e que se estende até o século XXI.

Segundo Hayek, já que o Estado não pode ser abolido totalmente, deve ser reduzido ao mínimo.

Observação

O caminho da servidão, livro escrito por Friedrich Hayek, vencedor do


Prêmio Nobel de Economia de 1974, destaca-se como uma das obras de
referência na defesa do liberalismo econômico.

Para Friedman, compete ao Estado proteger a liberdade dos indivíduos, preservar a lei e a ordem,
reforçar os contratos privados e promover mercados competitivos. No mais, a mão invisível do mercado
constitui-se na melhor alternativa para resolver os problemas do bem-estar e das desigualdades.

Observação

Em 1956, Milton Friedman fez a série de palestras que deu origem ao


livro Capitalismo e liberdade, no qual defendeu a abolição de subsídios.
Ele recebeu o Nobel em 1976.

De modo geral, nenhum liberal se autodenomina neoliberal. Isso, porém, não é o fundamental, uma
vez que diante dos fatos não resta dúvida de que o que existe é o liberalismo, o que constitui uma ideologia
(de justificação do capitalismo) que assume características de acordo com o desenvolvimento do capital
e submete-se às suas necessidades.

Um dos primeiros países do mundo a adotar os princípios neoliberais em sua economia foi a Inglaterra,
no governo de Margaret Thatcher, primeira-ministra entre 1979 e 1990. Ela adotou políticas direitistas
radicais que, embora vistas como modernizadoras por muitos, foram consideradas destruidoras de
empregos e de setores econômicos tradicionais por outros.

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POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

Saiba mais

Veja a cinebiografia de Margaret Thatcher, que retrata desde a sua infância


até o período mais impopular do seu governo, em 1982, quando ela tentava
salvar sua carreira nos 17 dias que antecederam a Guerra das Malvinas:

A DAMA de ferro. Direção: Phyllida Lloyd. Reino Unido: Pathé, 2011. 104 min.

O projeto neoliberal de sociedade e de educação se implantou, aprofundou e consolidou no


Brasil a partir do início dos anos de 1990. Porém, desde a década de 1980, diversos sujeitos políticos
coletivos disputavam a hegemonia, conformando duas principais tendências: defendiam, por um
lado, um projeto liberal-coorporativo, ou neoliberal, e, por outro, um projeto democrático de massas
de sociedade e de educação.

A consolidação do Projeto Neoliberal se traduz, no Brasil, a partir do programa denominado


Educação para Todos, ideia que oficialmente surgiu na Conferência Regional de Ministros da Educação e
Planejamento Econômico, realizada no México em 1979, a qual recomendou a formulação de um Plano
Principal de Educação para a América Latina e Caribe.

No Brasil, os objetivos principais tomaram as seguintes direções:

• Universalização do ensino básico.

• Valorização do magistério.

• Melhoria da qualidade do ensino.

Mas o projeto neoliberal de sociedade e de educação consolida-se como hegemônico no Brasil dos
anos de 1990, na óptica do capital, realizando mudanças nas nossas políticas educacionais e provocando
uma dissociação cada vez mais profunda entre uma educação voltada para a cidadania e a formação
científico-tecnológica voltada para o trabalho.

A perspectiva neoliberal de educação escolar é difundir e sedimentar entre as atuais e futuras


gerações a cultura empresarial, conformando técnica e eticamente às mudanças que mundialmente o
capital tem implementado nas forças produtivas e nas relações sociais de produção capitalista.

De uma forma hegemônica, a política educacional neoliberal segue as mesmas diretrizes neoliberais
das políticas sociais em seu conjunto, ou seja: redução dos gastos públicos, focalização das ações
governamentais, descentralização dos encargos e participação da sociedade na sua operacionalização.

As principais críticas sobre esse modelo estão na perspectiva que a política educacional neoliberal
focaliza a ação direta do Estado na universalização da escolaridade obrigatória para a população de
103
Unidade II

faixa etária requerida pela lei, na expansão do Ensino Médio e no aumento de sua participação nos
programas de formação profissional, ou seja, essa política destina-se prioritariamente à formação do
trabalho simples.

Por outro lado, os que defendem o modelo apresentam dados que demonstram a evolução do sistema
educacional brasileiro na década de 1990, especialmente os da educação básica. Afirmam, ainda, que ao
compararmos os dados brasileiros com os indicadores das demais nações que assinaram a Declaração
de Jomtien, também chamada de Declaração Mundial de Educação para Todos, o Brasil se destaca como
um dos países que mais avançaram na década.

Assim, o que se evidencia é que no Brasil ainda existe uma disputa no campo educacional, tendo de
um lado a proposta neoliberal acreditando que a competição produz o efeito pedagógico de estimular
o crescimento do sistema. No sentido inverso, outros se apoiam no princípio da centralidade que o
Estado deve ter para orientar uma política pública da educação, ou seja, que o governo assuma seu
compromisso indelegável para com os excluídos. Porém, o que observamos na prática é que o ensino
no Brasil não tem apresentado índices satisfatórios de qualidade, sendo necessário repensar o sistema
e o modelo de ensino. Uma das sugestões que constantemente surge nos debates é a necessidade de se
manter os jovens na escola e de se elevar o salário de professor.

Exemplo de aplicação

No site a seguir é possível ter acesso ao relatório “Educação para Todos: avaliação da década”,
produzido pelo MEC/Inep em 2000. Conhecer esse documento é importante para podermos avaliar se
o discurso oficial era condizente com as práticas de ensino existentes na realidade concreta. Os atores
que participaram do projeto de educação neoliberal implementado no Brasil fizeram essa avaliação, que
abrange a década de 1990 a 2000.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Educação para Todos: avaliação da década. Brasília: MEC, 2000. Disponível em: http://
portal.inep.gov.br/documents/186968/485564/Educa%C3%A7%C3%A3o+para+todos+avalia%C3%A7%C3%A3o+da+d%C3%A9cad
a+S%C3%ADntese+do+I+Semin%C3%A1rio+Nacional+sobre+Educa%C3%A7%C3%A3o+para+Todos+%28Bras%C3%ADlia%2C+1
0+e+11-6-1999%29/a698194e-feab-4117-9088-53c1297b315b?version=1.0. Acesso: 10 ago. 2019.

Principalmente agora que já estamos completando 20 anos da implantação desse modelo de


educação e passados 10 anos da publicação dessa avaliação, é importante retomarmos o documento
para percebemos as mudanças ocorridas no sistema educacional.

Reflita sobre a seguinte questão: Será que conseguimos uma evolução na qualidade e no acesso
à educação?

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POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

Resumo

Nesta unidade, entendemos que o surgimento da escola no Brasil e no


mundo foi para buscar solução para uma questão social e que o modelo da
política educacional brasileira precisa de uma nova estratégia de inclusão
e mudança.

Aprendemos também que a estratégia neoliberal de conquista


hegemônica ocupa um significativo destaque na política educacional, pois
a educação e as políticas voltadas para essa área sofrem as influências
das características e do poder dos grupos hegemônicos. Assim, a educação
neoliberal implementada por meio das políticas públicas neoliberais é
marcada pelos interesses dos grupos dominantes e, portanto, influenciada
pela lógica do mercado globalizado.

Nesse sentido, o neoliberalismo é mais do que uma alternativa teórica,


econômica, ético-política, educacional porque constitui uma ideologia que,
ao ser assimilada pelo senso comum, pode tornar-se hegemônica como
se fosse a única leitura possível e viável para os problemas criados pelo
próprio capitalismo. Essa orientação, na verdade, mascara a realidade, uma
vez que a educação é somente uma das expressões objetivas do modo
como a sociedade produz e reproduz a sua própria existência.

Além disso, é necessário compreender que existem outras formas de


se pensar e de desenvolver as políticas educacionais, principalmente se
levarmos em conta que a nossa Constituição Federal apresenta um modelo
de educacional que é direito de todos e que deve ter o seu acesso garantido
pelo Estado brasileiro, independentemente da ideologia política vigente.
Porém, é notório que o Brasil precisa de uma nova estratégia educacional
para poder atuar na pobreza extrema, assegurando à população nessas
condições o direito à educação. E, para isso, é fundamental associar a
política social à política educacional.

Essa necessidade de uma abordagem governamental diferenciada para a


área da educação se torna evidente quando observamos os relatórios sobre os
resultados obtidos pelos alunos, nos quais se constata uma grande defasagem
escolar, principalmente, entre as classes menos favorecidas economicamente.

Nesse novo cenário educacional que se apresenta, o serviço social


possui um papel fundamental para a efetivação de uma educação
inclusiva, seja garantindo os direitos e deveres, seja cumprindo as regras
da normatização da assistência social em prol da população. Podemos

105
Unidade II

perceber isso quando estudamos os objetivos do Serviço de Convivência


e Fortalecimento de Vínculos, voltado para crianças e adolescentes, que
apresenta como propósito fazer a interlocução positiva entre os diversos
públicos que habitam um determinado território, sendo que a escola tem
um papel primordial nesse processo. Assim, o aumento no conhecimento
dos assistentes sociais sobre o contexto escolar, em consonância com a
atuação de uma equipe escolar interdisciplinar, vai colaborar muito para
proporcionar o direito à educação para um maior número de cidadãos.

A sociedade é o palco de ressonância das questões sociais e essas expressões


têm se introduzido nas escolas, atingindo todos os envolvidos no ambiente
educacional. Podemos destacar questões como a violência, o uso de drogas
e a grande evasão escolar. Por esse motivo, a função social da escola passou
a ser também o de propiciar o desenvolvimento das potencialidades físicas,
cognitivas e afetivas do indivíduo, capacitando-o a tornar-se um cidadão
participativo na sociedade em que vive, pois muitas vezes o ambiente escolar
é o único espaço onde eles encontrarão respaldo para as angústias que
vivenciam em suas famílias e no território onde vivem.

Existe outra função básica da escola que deve ser garantida no espaço
escolar: o de propiciar a aprendizagem de conhecimento, habilidades
e valores necessários à socialização do indivíduo. Para que isso ocorra, é
necessário que a escola proporcione o domínio dos conteúdos culturais
básicos da leitura, da escrita, da ciência das artes e das letras, pois sem
essas aprendizagens dificilmente o aluno poderá exercer seus direitos de
cidadania. Mas, infelizmente, muitas vezes constatamos que nem mesmo
esse direito básico de alfabetização tem sido assegurado ao público escolar.
Assim, cabe à escola desenvolver novas habilidades para se tornar capaz de
formar alunos com senso crítico, reflexivos, autônomos e conscientes de
seus direitos e deveres, com compreensão da realidade econômica, social
e política do país e, principalmente, que saibam ler, escrever e tenham
conhecimentos de matemática.

Num sentido mais amplo da função escolar, o que também se espera


é que tenhamos escolas aptas a construir uma sociedade mais justa e
tolerante a diferenças como orientação sexual, pessoas com necessidades
especiais, etnias culturais e religiosas etc.

Ocorre que, no Brasil, a escola pública, disponível à maioria da população,


deixa muito a desejar quando se fala de educação escolar e de formação de
cidadãos para viver numa sociedade tão multicultural e pluriétnica como
a nossa.

106
POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

É fundamental termos a percepção de que vivemos num momento em


que a cidadania enfrenta novos desafios, busca novos espaços de atuação
e abre novas áreas por meio das grandes transformações. O direito à
educação escolar é um desses espaços que não perderam e nem perderão
sua atualidade. Isso ocorre porque a educação escolar é uma dimensão
fundante da cidadania, e tal princípio é indispensável para as políticas que
visam à participação de todos os espaços sociais e políticos e também para
reinserção no mundo profissional.

Portanto, vivemos num momento histórico em que é necessário se


pensar numa educação comunitária que tenha o propósito de atuar como
um mecanismo facilitador da transformação social, por meio da geração de
processos de aprendizagem que incentivem a elaboração comunitária de
ações dirigidas à superação de problemas da vida cotidiana. Nesse sentido,
os assistentes sociais deverão ser capazes de contribuir para viabilizar a
participação da população usuária nas decisões institucionais e estabelecer
estratégias para democratizar as informações e o acesso da população
aos programas disponíveis no espaço institucional escolar como um dos
mecanismos indispensáveis à inserção e à participação dos usuários nas
políticas públicas.

Exercícios

Questão 1. Considere a charge e o texto a seguir:

Figura 8

107
Unidade II

Educação inclusiva

Apesar dos esforços internacionais [...], a inclusão educacional ainda é um desafio presente em
escolas o mundo inteiro, pois existem divergências na forma como a inclusão é percebida, impedindo,
assim, que práticas e políticas inclusivas avancem.

Ao longo da história, o atendimento a pessoas portadoras de necessidades especiais apresentou


diferentes características, sendo, na maioria das vezes, tratada de maneira segregadora ou complementar
ao ensino regular e em centros de reabilitação. No caso do Brasil, a partir da segunda metade do século
XIX começaram a surgir escolas especializadas para atender às demandas dessa parcela da população. Foi
o caso, por exemplo, do Instituto Benjamin Constant (1854) voltado para o atendimento dos deficientes
visuais e auditivos; ou das APAE – Associação de Pais e Amigos de Excepcionais (1954), onde eram
realizadas atividades de vida diária.

Em função dessa visão historicamente discriminatória e segregadora, a inserção desses alunos em


escolas regulares (final do século XX) não foi acompanhada por mudanças na organização das escolas
regulares a fim de receber esses alunos como, por exemplo, adaptação física e predial; tampouco houve
revisão de projetos pedagógicos, adaptação curricular ou estratégias de ensino que contemplassem as
especificidades e diferentes tempos de aprendizagem desses alunos.

Fonte: Pereira (s.d.).

Agora, analise as afirmativas:

I – Charge e texto apontam para um problema central na implantação da educação inclusiva: a


adaptação de estratégias e métodos pedagógicos.

II – A charge apresenta discurso antagônico ao texto, pois mostra uma situação de sala de aula
efetivamente inclusiva.

III – De acordo com o texto, historicamente, no Brasil, a educação é discriminatória e segregadora.

IV – O texto desvaloriza a ação de escolas especializadas, mostrando sua ineficiência na educação de


pessoas com deficiência.

É correto o que se afirma somente em:

A) II, III e IV.

B) I e III.

C) I e IV.

D) I, III e IV.
108
POLÍTICA SETORIAL – EDUCAÇÃO

E) II e III.

Resposta correta: alternativa B.

Análise da questão

A charge e o texto mostram que faltam adaptações no ensino para que a educação seja, de fato,
inclusiva. O texto não critica a ação de escolas especializadas, apenas relata que atualmente a educação
de pessoas com deficiência é pensada de forma mais inclusiva.

Questão 2. Considere a conhecida frase do educador Paulo Freire e o capítulo “O vergalho”, do livro
Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis.

“Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor.”

(Paulo Freire)

O vergalho

Tais eram as reflexões que eu vinha fazendo, por aquele Valongo fora, logo depois de ver e ajustar a
casa. Interrompeu-mas um ajuntamento; era um preto que vergalhava outro na praça. O outro não se
atrevia a fugir; gemia somente estas únicas palavras: — “Não, perdão, meu senhor; meu senhor, perdão!“
Mas o primeiro não fazia caso, e, a cada súplica, respondia com uma vergalhada nova.

— Toma, diabo! dizia ele; toma mais perdão, bêbado!

— Meu senhor! gemia o outro.

— Cala a boca, besta! replicava o vergalho.

Parei, olhei... Justos céus! Quem havia de ser o do vergalho? Nada menos que o meu moleque
Prudêncio, — o que meu pai libertara alguns anos antes. Cheguei-me; ele deteve-se logo e pediu-me a
bênção; perguntei-lhe se aquele preto era escravo dele.

— É, sim, nhonhô.

— Fez-te alguma cousa?

— É um vadio e um bêbado muito grande. Ainda hoje deixei ele na quitanda, em quanto eu ia lá
embaixo na cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber.

— Está bom, perdoa-lhe, disse eu.

— Pois não, nhonhô. Nhonhô manda, não pede. Entra para casa, bêbado!
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Unidade II

Saí do grupo, que me olhava espantado e cochichava as suas conjecturas. Segui caminho, a desfiar
uma infinidade de reflexões, que sinto haver inteiramente perdido; aliás, seria matéria para um bom
capítulo, e talvez alegre. Eu gosto dos capítulos alegres; é o meu fraco. Exteriormente, era torvo o
episódio do Valongo; mas só exteriormente. Logo que meti mais dentro a faca do raciocínio achei‑lhe
um miolo gaiato, fino, e até profundo. Era um modo que o Prudêncio tinha de se desfazer das pancadas
recebidas, — transmitindo-as a outro. Eu, em criança, montava-o, punha-lhe um freio na boca, e
desancava-o sem compaixão; ele gemia e sofria. Agora, porém, que era livre, dispunha de si mesmo, dos
braços, das pernas, podia trabalhar, folgar, dormir, desagrilhoado da antiga condição, agora é que ele se
desbancava: comprou um escravo, e ia-lhe pagando, com alto juro, as quantias que de mim recebera.
Vejam as sutilezas do maroto!

Fonte: Assis (1994).

Com base na leitura, analise as asserções e a relação proposta entre elas:

I – O episódio narrado no livro ilustra, por meio de elementos concretos, o desejo do oprimido se
tornar opressor.

Porque

II – No episódio, o ex-escravo repete o comportamento cruel do seu senhor.

Assinale a alternativa correta.

A) As duas asserções são verdadeiras, e a segunda justifica a primeira.

B) As duas asserções são verdadeiras, e a segunda não justifica a primeira.

C) A primeira asserção é verdadeira, e a segunda é falsa.

D) A primeira asserção é falsa, e a segunda é verdadeira.

E) As duas asserções são falsas.

Resposta correta: alternativa A.

Análise da questão

O episódio narra que o ex-escravo comprou um escravo para si e o castiga, da mesma forma como
fora castigado. Isso ilustra, com elementos concretos, a ideia de que o oprimido pode desejar tornar-se
opressor, e não acabar com a opressão.

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