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A breve história da psicologia conheceu múltiplos sistemas que ainda hoje não cessam de
surgir. Os sistemas são caracteristicamente abrangentes e geram escolas de psicologias.
Entretanto, o termo ‘sistema’ não provê completude nos esforços teóricos das escolas de
psicologia. Qualquer sistema tem engendrado em seu âmago a impossibilidade de qualquer
unidade abrangente ou discursiva que poderia representar todos os sistemas psicológicas em
um sistema único. Uma teoria que representa o sistema de todos os sistemas conjetura uma
irreal pretensao. Os sistemas psicológicos, construídos por seres humanos limitados, refletem
o alcance de pesquisas de uma momento da história e representam o espírito da época. Como
exemplo, entre os sistemas mais exuberantes da constelação ‘psi’ está a psicanálise, incluída
publicamente como psicologia.
Como fractais, os frutos dos sistemas incluem muitas escolas psicológicas que suscitam outras
escolas psicológicas. O número de escolas de psicologia reflete a especialização do
conhecimento psicológico. A eclosão de muitas escolas psicológicas tornou-se um fato com
consequências pulverizadas. Se alguns teóricos apontassem o ser humano como unidade
extensiva da ciência psicológica, esqueceriam da psicologia voltada aos animais ou a metáfora
computacional como fonte de estudo, por exemplo. Sob tais circunstâncias, percebemos a
inviabilidade de uma metapsicologia sistemática1. De forma desafortunada, alguns
profissionais acreditam que um sistema de sistemas existe e tal conversão reside na sua eleita
teoria. Assim, a teoria da qual trabalham representaria o ápice sistemático definitivo de valor e
verdade psicológica. O filósofo da ciência Paul Feyerabend (2010, p. 18) aponta a existência de
componentes escusos enxertados na ciência, já que para ele a “premissa de que existem
padrões de conhecimento e de ação universalmente válidos e aglutinadores é um caso
especial de uma crença cuja influência vai muito além do domínio do debate intelectual”.
Destarte, subjacente ao desenvolvimento científico a crença tem o poder de orientar e reger
pesquisas, legitimando resultados travestidos de um pretenso rigor metodológico. A crença,
substituindo a ciência, “pode ser formulada dizendo que existe uma maneira certa de viver
que o mundo deve aceitar” (Feyerabend, 2010, p. 18). Ao receber o bem viver enquanto dever
a ciência estaria muito perto de um regime autoritário.
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Não é apenas a psicologia que vive uma impossibilidade de unificação. “A meteorologia, a geologia, a
psicologia, vastas partes da biologia e das ciências sociais encontram-se ainda mais longe da unificação.
Portanto, em vez de multiplicidade de detalhes firmemente ligada a conjuntos de leis básicas
temporalmente invariáveis, temos uma variedade de abordagens com princípios unificadores
indistintamente aparecendo ao fundo” (Feyerabend, 2006, p. 191).
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método, quer de fato”. Mesmo a psicologia em sua esfera clínica concebe o conjunto de
algumas características avaliativas que diferem de outra abordagem clínica.
Na sua curta tradição, a psicologia se dividiu várias vezes em caráter de especialização, cuja
demanda está na realidade enquanto exigência prática. A ciência psicológica não comporta
uma dualidade entre racionalismo e empirismo na psicologia, pois ela se forma a partir da
prática, teoria e pesquisa entrelaçadas. O estágio de especialização da disciplina psicológica foi
concebido devido a inúmeros objetivos: psicologia jurídica, do trânsito, militar, escolar,
ambiental, comunitária, hospitalar, social, esportiva, etc. A diversidade de performances das
muitas psicologias também aparentam práticas não articuladas entre si. Entretanto, a
fragmentação coexiste dentro das próprias especializações, nos levando a reconhecer, por
exemplo, várias psicologias clínicas com metodologias específicas. A tematização das
diferentes teorias clínicas são ingenuamente vistas por alguns catedráticos como escolas rivais.
Estas rivalidades, frutos de vaidade ou ignorância, comungam distância e por conseguinte são
avessas à comunicação. Diante da defesa de seus campos de ação e teoria o monólogo
frequentemente instaura-se.
A psicologia rigorosamente concebida como empresa teórica e prática não pode ser
confundida com empreendimentos oriundos da autoajuda, magia, alquimia, terapia de pedras
ou qualquer outra atividade que deseja instaurar bem-estar recorrendo a métodos não
reconhecidos pela psicologia. A psicologia enquanto entidade linguística representa um
conjunto determinado de sentenças, preceitos e pesquisas. Introduzindo o exercício da
avaliação psicológica, o “que define a validade e a fidedignidade de uma avaliação psicológica
é a escolha adequada de instrumentos e técnicas psicológicas reconhecidas no âmbito da
profissão, bem como o domínio destes e preparo técnico do avaliador” (Entre linhas, 2016, n.
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A prática enquanto fundamento científico é uma exigência de várias áreas do conhecimento. É
perceptível que “cientistas de diferentes áreas usam diferentes procedimentos e constroem de
maneiras diferentes as suas teorias; em outras palavras – eles também têm concepções diferentes de
realidade. No entanto, não especulam somente; também testam os seus conceitos e frequentemente
têm sucesso: as diferentes concepções de realidade que ocorrem nas ciências têm um fundamento
empírico. Esse é um fato histórico, e não uma posição filosófica” (Feyerabend, 2006, p. 256).
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72, p. 27). Se há dificuldade de consenso entre as diversas escolas de psicologia, tampouco
haverá com outras práticas de origens e objetivos mais diversificados. A psicologia clínica não
admite espaços vazios no exercício profissional. Sua escuta e procedimentos, examinados em
si mesmos, estão adornados com componentes teóricos. São eles que justificam a condução
do tratamento psicoterápico. Uma condução de tratamento clínico sem arcabouço teórico é
totalmente insustentável.
Diante da diversidade de escolas, como os psicólogos poderiam pelo menos encontrar uma
linguagem comum? De modo superficial não haveria maneira das escolas se articularem. No
entanto, os psicólogos, como seres humanos concretos encontram-se com outras pessoas
dentro de um mundo que não é apenas psicológico. Os psicólogos e psicólogas dentro de sua
profissão comunicam sua prática para pessoas fora do ambiente psicológico. O valor da
comunicação extra psicológica é simples e objetivo e deve ser reconhecido enquanto valor
estratégico irrefutável de clareza na comunicação. Esta provavelmente é a chave também para
a comunicação entre escolas, ou seja, comunicar-se através de pressupostos básicos. Não se
trata de uma tentativa de combinação de teorias, mas de exposição das mesmas em
comunicação.
Ao invés de procurarmos identidade entre teorias, seria muito mais razoável buscarmos
correspondências. A busca de identificações tornou-se uma expressão inflacionária. O objetivo
não é encontrar justificações ou amplos padrões de compartilhamento teórico. O importante é
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o estabelecimento de diálogo entre os psicólogos de diferentes escolas. O diálogo pode iniciar
através de algo comum como possíveis equivalências teóricas.
Rivalidades
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“nós, psicanalistas, julgávamo-nos possuidores de um tipo de
conhecimento e experiência dos quais todas as demais pessoas
estavam excluídas. Todos aqueles que manifestassem dúvidas ou
críticas às nossas teorias, eram meramente pessoas perturbadas ou
neuróticas e que tinham “resistências” que as impediam de penetrar
nos “segredos do inconsciente”, que nós tão bem conhecíamos. Por
isso mesmo, nem sequer mereciam resposta. Sua única alternativa
era a de se psicanalisarem”.
Avaliação psicológica
Uma avaliação psicológica nunca abarcará máxima força diagnóstica. A avaliação tem um
domínio de aplicações importantes, mas não representativas de uma totalidade. Nesta
humilde perspectiva, não podemos prometer resultados psicoterápicos. O cliente em
psicoterapia responde ou emite afirmações e não verdades. Da mesma forma, o psicólogo não
veste o papel da verdade. A ampliação do ângulo de visão ou horizonte psicológico enquanto
verdade é uma falácia. Não trabalhamos com verdades. As aplicações de qualquer avaliação
(psicométrica ou não) não cobrem todo o ser humano, mas atingem pequenas porções da
experiência humana daquele indivíduo avaliado. Isto significa que a avaliação psicológica é
ainda deficitária? Embora as pesquisas em psicologia tenham muito o que se expandir, as
avaliações e seus instrumentos são muito estudados. Simplesmente a “abundância do mundo
que habitamos excede nossa imaginação mais ousada. (...) A mais simples das ações humanas
varia de uma pessoa para outra e de uma ocasião para a próxima” (Feyerabend, 2006, p. 26).
Um escola ou tipo de avaliação psicológica é um ponto de referência muito importante, mas
não uma totalidade. Cabe aqui a definição do Conselho Federal de Psicologia:
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De acordo com Feyerabend (2006, p. 214) “não há uma ciência uniforme – exceto nas mentes dos
metafísicos, professores e cientistas cegos pelas realizações do seu campo especial”.
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“A avaliação psicológica é entendida como processo técnico-científico de coleta de dados,
estudos e interpretação de informações a respeito dos fenômenos psicológicos, que são
resultantes da relação do indivíduo com a sociedade, utilizando-se, para tanto, de estratégias
psicológicas – métodos, técnicas e instrumentos” (Entre linhas, 2016, n. 72, p. 27).
Dentro da diversidade de orientações psicoterápicas também vale destacar que muitas teorias
comportam princípios de outras. Um exemplo ilustrativo sucede da denominada psicologia
positiva. Esta abordagem preconiza, através da ideia de resiliência, a história dos indivíduos
particulares e sua descontinuidade. Para a psicologia positiva, por mais difícil que tenha sido a
vida de um indivíduo, a história pregressa não determina seu futuro. No entanto, qualquer
psicólogo de outra abordagem concordará com esta premissa quando o cliente buscar saúde
através da mudança. Apesar das possíveis evidências contrárias colhidas da história do cliente,
a relação terapêutica tenta responder aos desafios. Se a história prescrevesse um futuro
‘petrificado’ a psicoterapia representaria um viés improvável. Assim, a psicoterapia não seria
uma alternativa e sua concepção de promoção de saúde não seria necessária.
Mas o que é real em psicologia? Penso que seria melhor reformular tal questão. O que seria
real no psiquismo de cada um? Real em termos psicológicos tem um componente subjetivo-
existencial. Segundo Feyerabend (2006, p. 108 e 268) consideramos como reais as coisas que
desempenham um papel importante ou central na espécie ou tipo de vida que preferimos,
queremos, levamos ou nos identificamos. “A subjetividade do avaliado é, na grande maioria
das demandas de avaliação, um dos componentes requisitados a ser investigado. (...) A
subjetividade do/a avaliador/a não deve interferir na obtenção de dados em quaisquer etapas
da avaliação psicológica” (Entre linhas, 2016, n. 72, p. 27).
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Percebemos que diversas áreas do conhecimento possuem representantes que comodamente
trocam as pessoas pelos modelos abstratos aos quais trabalham. Com certeza a redução da
pessoa ao instrumento consiste em uma pseudoderivação sem valor de orientação. Na
seguinte citação, veremos um exemplo de pseudorivação e onde lemos ‘modelo’ podemos
substituir por ‘instrumento psicométrico’:
“Em vez de perguntar às pessoas que estão envolvidas em certa
situação problemática, os promotores de desenvolvimento,
educadores, tecnólogos e sociólogos obtêm sua informação sobre “o
que essas pessoas realmente querem e precisam” de estudos
teóricos executados por seus estimados colegas naquilo que eles
pensam serem os campos relevantes. Não se consultam seres
humanos, mas modelos abstratos; não é a população-alvo que
decide, mas os produtores dos modelos” (Feyerabend, 2011, p. 333).
Se o psicólogo não deixar bem claro que ele interpretará os resultados, o veículo primordial da
avaliação psicológica será identificado com meia dúzia de papéis (folhas de resposta dos
testes), quando deveria estar ligada com a imagem do psicólogo em sua autonomia
profissional. Os gráficos produzidos através de baterias fatoriais de personalidade, por
exemplo, possuem um contexto: o cliente, suas relações históricas e seu ambiente. Existe uma
conexão rigorosa entre a vida do cliente e os dados psicométricos.
Alguns quesitos de uma avaliação psicométrica podem ter sido respondidos de forma errada.
O quesito ou categoria torna-se fidedigna quando há identificação com fatos. A fidedignidade
da categoria avaliada é indicação de uma porção da vida do indivíduo avaliado em seu mundo.
Aqui não se enquadra a forma mais verdadeira de vida da pessoa. Também não há uma
passagem entre os resultados de uma avaliação para interpretações de valores em categorias
como bem ou mal. A comprovação ou ausência de comprovação das escalas, quesitos ou
categorias avaliadas via psicometria advém das entrevistas que perfazemos com o cliente.
Através das entrevistas e do conhecimento que temos do cliente podemos validar ou perceber
escalas ou quesitos não fidedignos.
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incompreensíveis tanto quanto inaplicáveis em psicologia. O que isto quer dizer? Significa que
o cliente pode idealizar os fatos de sua vida se assim quiser, mas o psicólogo não encaminha a
devolução da avaliação dessa forma.
A avaliação psicológica não é um universal e tem sentido apenas quando se conecta aos
particulares (indivíduos avaliados). Explicando melhor, a avaliação psicológica não suplanta ou
compõe pessoas, ela as conecta (de forma auxiliar). A avaliação é uma estrutura universal-
relativa aplicável à um contexto, tornando-se auxílio das ricas perspectivas particulares de
cada pessoa avaliada. Desta forma, quero dizer que a avaliação é um caminho contínuo e
permanente no próprio tratamento. Avaliação e tratamento psicológico têm fronteiras em
grande medida fluídas. Neste interim, o cerne da pessoa não é a avaliação e muito menos o
tratamento, mas ela mesma. Devemos reconhece-la em cada entrevista.
A primeira pessoa (eu) e suas relações são revistas e revisitadas do começo ao fim do
tratamento psicológico. A capacidade de falar na primeira pessoa torna o indivíduo-massa
(anônimo) uma pessoa, isto é, a avaliação é necessária mas não fala pela pessoa. A avaliação
psicológica, em um primeiro momento, é uma importante mediadora da pessoa com ela
mesma. Posteriormente, a mediação entre o psicólogo e seu cliente tem na avaliação a
possibilidade de trabalhar com o que parece inacessível.
A autoria do cliente
Além dos esforços do psicólogo para a mudança, elas também ocorrem por uma tríade do
cliente: vontade, autoconsciência e inteligência. São três características coextensivas com o
tratamento ao carregarem o mesmo com intenções, metas ou objetivos. Inteligência e vontade
denotam uma direção. A inteligência articula compreensões e a vontade a realização da
intenção (alvo). Já a autoconsciência é um traço do conhecimento e pode mudar, amplificar ou
diminuir as intenções. Os insights (consciência de algo) fazem clientes buscarem novos
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caminhos ou representarem seu cotidiano de formas inéditas. Dessa forma, a autoconsciência
modifica até a espontaneidade do eu que pode se tornar outra espontaneidade.
Devido à sua liberdade e inteligência o ser humano não pode ser reduzido a um teste ou
avaliação psicológica. Logicamente, esta não é a proposta e quem pensa assim ou é
desinformado ou receoso demais. A avaliação enquanto ponto de referência é um pequeno
mapa ou raio X de parte da personalidade e por isso um guia útil. Não há degradação do
indivíduo em vê-lo através do auxílio de instrumentos avaliativos. A avaliação tem um valor
basal e configura-se, ao meu ver, como um poder profissional de começar (um tratamento, um
vínculo). Desta forma, a avaliação é uma concepção de realidade profissional que o psicólogo
adota.
Embora a pessoa viva também em um reino subjetivo (seu mundo interno), também há um
mundo objetivo. A realidade e objetividade aqui mencionadas estão encerradas na
particularidade da pessoa. Apenas os ignorantes percebem os instrumentos psicométricos
como entes ou sujeitos ‘quase’ perceptivos; isto é insustentável. As avaliações são necessárias,
mas o sujeito perceptivo é claramente insubstituível. Alguns catedráticos tendem a contornar
os instrumentos psicométricos depreciando-os. Eles não percebem que o levantamento de
dados fornecidos por avaliações representam um meio de comunicação do cliente. Na
psicologia infantil os desenhos ‘falam’ mais do que podemos imaginar. A avaliação
psicométrica enquanto recurso não encerra-se na infância.
Técnica
Devido à pouca experiência alguns profissionais não utilizam a técnica, mas se tornam a
técnica. A insegura e a ansiedade antepõem-se na relação terapêutica e a técnica torna-se
recurso maior que a humanidade do profissional (e do cliente também). As consequências
variam desde o comportamento artificial até a rigidez excessiva na condução da entrevista. Por
vezes a exigência tangencia o próprio cliente, causando desconforto. O psicoterapeuta José
Lemmertz (2003, p. 96) relata:
“Não tenho a menor dúvida de que o fato de me considerar científico
impediu que me desse conta de que a verdade que eu possuía era
apenas parcial e que minha adesão estrita à rotina e às normas
habituais fez com que eu me tornasse cego, por assim dizer, me
desumanizasse, tornando-me incapaz de perceber coisas facilmente
acessíveis a qualquer pessoa”
Padrões inflexíveis não traduzem um grande aparato técnico na entrevista e muito menos
recurso salutar na avaliação. A espontaneidade, a amabilidade, a assistência e a empatia são
aspectos sufocados quando a crítica exagerada do psicólogo é aplicada em si mesmo. A técnica
não é um ritual e não pode prevalecer em detrimento da humanidade do profissional. Além
disso, psicoterapia não é aula. Aqueles que procuram um psicólogo apresentam mazelas
pessoais e relacionais “e não estudiosos que desejam adquirir informações detalhadas sobre
uma nova teoria psicológica” (Lemmertz, 2003, p. 88). A técnica ‘vive’ subjacente na entrevista
e confere o poder do encontro por parte do profissional. No entanto, técnica e humanidade
caminham unidas na direção psicoterápica. Lemmertz (2003, p. 91-92) recorda:
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“quando era homem cheio de “fé” na perfeição do método que eu
adotava, tive a oportunidade de reencontrar um velho amigo e
colega, com o qual convivera intimamente e a quem admirava devido
a sua excepcional capacidade terapêutica” (...) “Sabia que este
colega, na ocasião, não tinha maiores conhecimentos teóricos ou
técnicos do que eu e por isso suas afirmações me perturbaram um
pouco. Fui forçado a concluir que se extraordinário sucesso se devia
não a uma habilidade especial no manejo de nossa técnica, senão a
algo muito pessoal, como que uma maior capacidade de “amar” aos
seus pacientes”
Ética
Avaliação não é juízo. O juízo isola o psicólogo e coloca-o em uma posição privilegiada e
inaceitável. Qual motivo? Julgar assemelha-se a atitude teorética onde elevamos o que
observamos em um padrão de universalidade. No entanto, trabalhamos com indivíduos
particulares e a permanência, mesmo que momentânea no universalismo, tornaria o cliente
supérfluo enquanto pessoa real (pessoa com erros, devaneios, dificuldades). O que a pessoa
poderia ser, no sentido de idealização, é uma forma maximal que causa mais estranheza do
que compreensão. A psicologia não é um exercício sobre o dever ser.
Outra faceta importante é o tempo. Existe o tempo dentro do tempo, ou seja, vários tempos
imaginários, subjetivos que transcorrem dentro do tempo. Se avançarmos no tempo do
cliente, estamos já em fraca sintonia com ele. Além do tempo há o contexto como outra
condição para entendermos a pessoa.
Pluralidade de eus
Linguagem comunicacional
Por fim, a linguagem psicológica enquanto prática não é uma linguagem expositiva. Mesmo
quando a linguagem psicológica está apoiada em devolução de resultados psicométricos ela é
e suscita um diálogo. A psicologia é uma linguagem comunicacional. Nesse sentido, a
linguagem expositiva tem uma importância apenas marginal. A exposição enquanto tipo de
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comunicação não é interacionista. O valor da exposição concentra-se em nomear aquilo que o
cliente vive mas não sabe que vive. Por exemplo, algumas pessoas convivem desde a infância
com forte ansiedade, mas não sabem que são ansiosas ou que as características de sua
personalidade estão profundamente norteadas pela ansiedade. A consciência advém de uma
nomeação externa (a identificação dos sintomas com uma representação ou nome).
Somos pragmaticamente motivados a escolher. Não é a teoria que vai evidenciar-se razoável,
mas o psicólogo que se sentirá apto a atingir maior inteligibilidade possível com referência as
teorias que ele experimentou e estudou. O domínio de teorização aplicado à uma determinada
realidade já é uma ótica. O tipo de atividade profissional e o ambiente institucional ajudam a
alavancar a busca de teorias (por exemplo, trabalhar como psicólogo escolar). A inserção em
uma instituição já representa uma singularidade imensa de âmbitos, relações, objetos e
pessoas. A psicologia está atenta a expressabilidade da realidade, isto é, do mundo ao seu
redor. Posteriormente, a psicologia apreende a realidade institucional e serve-se dela para
comunicar. A demanda da realidade institucional também produz destinos. Por isso, uma visão
de mundo única é “uma fraude pedagógica” (Feyerabend, 2011, p. 310).
Referencial bibliográfico
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Panikkar, Raimon (1977). Compreensão e convicção (pp. 94-120). In: GADAMER H.G. e VOGLER
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