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Dissertacao Regina Helena Alves Codesseira
Dissertacao Regina Helena Alves Codesseira
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DEDICATÓRIA
A Antonio Pires Codesseira, meu querido pai, que ao longo de minha vida me
auxiliou financeiramente em todos os momentos necessários.
À Cristina H. Alves Codesseira, minha irmã, que sempre me incentiva e torce pelo
meu sucesso e pela minha felicidade.
À Prof.a Ana Rosa Ferreira Dias, sábia e paciente orientadora, que com todo seu
conhecimento, meiguice e amizade, tão bem me orientou, tornando possível, desta
forma, a realização do presente trabalho.
Ao Prof. Dr. Dino Preti, querido professor e exemplar docente, por todo o carinho,
apoio, incentivo cultural e contribuição para mais essa etapa de minha formação.
Às queridas amigas que fiz nesta Pós-Graduação: Lúcia, Daniela, Luciana, Letícia,
por tornar o trabalho menos árduo e mais alegre, pelo incentivo, companheirismo e
generosidade.
“– Estou na pista de um segredo industrial que me
permitirá fabricar, sem um fiapo de algodão, um papel tão
sólido quanto o papel da Holanda, a cinqüenta por cento
abaixo do preço do custo atual da pasta de algodão.
– É uma fortuna! – exclamou Petit Claud.
– Uma grande fortuna, meu amigo, porque será preciso,
dentro de dez anos, dez vezes mais papel do que é
consumido agora. O jornalismo será a loucura de nosso
tempo!”
(BALZAC, Honoré de. Ilusões perdidas. p. 428)
RESUMO
This paper has the objective to identify and to classify the interactional
strategies present in the construction of the news’ leads produced by two
newspapers of great circulation from São Paulo: O Estado de S.Paulo e o Jornal
da Tarde.
Through the analysis of the sample, we arrived basically two resources that
can be used by the journalist to interact and to seduce his/her reader: or to move
with the imaginary of him, building slow and in full detail a scene in his/her mind,
or to drive directly him, creating, like this, an idea that the speakers maintain a
conversation face to face.
Introdução .............................................................................................................. 01
Anexos
1
INTRODUÇÃO
Além desse motivo, há, também, uma relevância social para se estudar a
notícia jornalística, que está fundamentada na importância do jornal, pois como
afirmam Bell e Garrett (1998: 2), “o jornal é o mais prestigioso dos gêneros da
mídia diária, e sua função é central no exercício do poder nas sociedades
modernas.”
público-alvo diferente.
Sendo assim, analisamos seis diferentes tipos de lides que têm como
preocupação inicial não o fato ocorrido, mas sim, o seu enunciatário, ou seja, o seu
leitor. Por esse motivo, esse lide não apresentará uma síntese da informação mais
3
Fomos ler os manuais de redação atuais desses principais jornais para saber
o que eles falavam sobre o lide e pudemos descobrir que o manual da Folha, de
uma maneira menos autoritária, afirma ter o lide a função de sintetizar a notícia,
mas que para isso não existe um modelo, embora dê alguns exemplos. Por sua vez,
7
Quanto à faixa etária dos leitores do jornal, de modo geral, 4% têm entre 10
e 14 anos; 10% entre 15 e 19 anos; 29% entre 20 e 29 anos; 21% entre 30 e 39
__________
1. A pesquisa do Grupo Estado foi disponibilizada para o presente trabalho pela funcionária responsável pelo setor
de marketing da empresa.
9
Quanto à faixa etária dos leitores deste jornal, de maneira geral, 2% têm
entre 10 e 14 anos; 8% entre 15 e 19; 25% entre 20 e 29 anos; 24% entre 30 e 39
anos; 19% entre 40 e 49 anos e 22% entre 50 e 69 anos.
marca de 86.564 exemplares, enquanto a média nos demais dias gira em torno dos
60.000. Neste dia, o jornal que, no ano passado custava R$ 1,30, passa a custar R$
1,50. O Estado de S.Paulo, por sua vez, investe nos “Classificados” de domingo,
que o torna bem mais volumoso neste dia. Por esse motivo, tornou-se também
conhecido na grande São Paulo pelo nome de Estadão.
que os demais sejam variações de assuntos sobre uma idêntica estruturação. Isso
posto, podemos afirmar que aqueles que apresentaram alguma diferença em uma
dessas formulações foram abordados.
Essas noções passam a fazer parte daquilo que van Dijk (2000) chama de
regra jornalística implícita de organização, ou seja, a pirâmide invertida e o lide
são mecanismos que estruturam o texto noticioso e que seguem o princípio da
__________
1. Pirâmide invertida é “uma técnica de redação jornalística pela qual as informações mais importantes são dadas
no início do texto e as demais, em hierarquização decrescente, vêm em seguida, de modo que as mais dispensáveis
fiquem no final”. (Manual da redação da Folha de S.Paulo, 2001: 93)
2. Lide representa a “abertura da notícia. Primeiro parágrafo da notícia em jornalismo impresso. Relato do fato
mais importante de uma notícia”. (Lage, 2001: 72)
14
relevância:
organização.
A quarta, e até agora última, publicação do manual saiu no ano de 2001 com
o nome de Manual da Redação. Este manual está organizado em quatro capítulos:
“Projeto Folha”, “Procedimentos”, “Padronização e estilo” e “Folha”, além de um
“anexo gramatical” e de um “anexo geral”, com informações amplas sobre o
legislativo, o militar, o religioso, o matemático e estatístico, dentre outros. Esse
manual também define os manuais de 1984 e de 1987 como sendo impositivos,
denominando, por sua vez, o atual de orientador do trabalho jornalístico:
cada vez mais flexíveis, veremos que essa flexibilização não existiu nem no início
nem na versão mais atual dos manuais.
Caprino (op. cit.: 79) apresenta a opinião de vários jornalistas que atestam
ser os manuais de redação um elemento uniformizador, mas que pretendem
unicamente dar ao jornal uma característica e não tolher a criatividade do
jornalista:
não haver uma fórmula para elaboração de um lide, uma vez que uma construção
de primeiro parágrafo formulada a partir de um modelo pode causar um
desinteresse no leitor e este não continuar a leitura da notícia:
Optamos por fazer esta longa citação para que se pudesse observar que as
regras deste manual são imperativas. Utilizam-se verbos no modo imperativo para
que não se tenha dúvida sobre o caráter rígido e obrigatório da construção do lide.
28
Aliás, a única mudança existente nessas quatro regras, entre o manual de 1990 e o
de 1997, é a de torná-las mais rígidas, uma vez que na primeira versão falava-se
em “evite iniciar matéria por declaração entre aspas” (Martins Filho, 1990: 18) e
é substituída na segunda por “não inicie matéria com declaração entre aspas” (op.
cit., 1997: 18), ou seja, a partir de 1990, a declaração entre aspas no lide poderia
ser feita, porém não com freqüência e, sim, raramente. Entretanto, a partir de 1997,
tal declaração passa a ser totalmente proibida.
Por sua vez, o lide interpretado pode aparecer tanto em uma reportagem
quanto em uma notícia. Utilizaremos o exemplo dado pelo próprio Manual para
justificar tal opinião:
Entretanto, como veremos adiante, este tipo de lide é bastante estudado por
31
Esses princípios ordenadores dos fatos que serão noticiados estão ordenados
em sumário (manchete e lide), background, evento principal, conseqüências e
comentário.
O background, como define van Dijk (2000: 146), tem a função de dar uma
informação que não é parte do evento principal ocorrido, porém fornece “o
contexto social, político ou histórico geral ou as condições desses eventos”.
A esse respeito, o próprio van Dijk (op.cit.: 151) alerta para o fato de que,
Quanto ao lide, Hohenberg (op. cit.) apresenta uma visão mais ampla do que
van Dijk (op. cit.), pois para aquele, além de ser o sumário de uma notícia
jornalística, o lide representa a abertura da notícia sendo, portanto, o responsável
por conduzir, por introduzir o leitor naquilo que será noticiado e por despertar seu
interesse, por envolvê-lo para que haja uma continuidade da leitura.
Para Hohenberg (op. cit.) há um progresso neste tipo de concepção, uma vez
que anteriormente o único objetivo do jornalista, ao escrever o lide de uma notícia,
era o de economizar o tempo e o esforço do leitor, destacando, assim, a informação
34
Essa é, também, a organização de lide proposta por Amaral (1987). Para ele,
o lide é a parte principal da notícia por ser o responsável pelo desenvolvimento do
interesse do leitor e, deve, portanto, responder ao que ele nomeia por elementos
essenciais da informação (quem, onde, quando, como, por quê e o quê), mas não
necessariamente todos de uma única vez. Sendo assim, propõe cinco maneiras
diferentes de elaboração de lide para valorizar cada um desses elementos: o lide de
valorização do quem, o de valorização do quando, o de valorização do onde, o de
valorização do como e o de valorização do por quê 5.
1. Valorização do quem
“A prefeita Marta Suplicy (PT) passou por maus bocados ontem, em visita
à Subprefeitura de Cidade Tiradentes (extremo da zona leste). Ela virou alvo de
bolinhas de papel, um caderno e até duas pedras, que foram arremessadas por
motoristas e cobradores de ônibus que perderam o emprego porque suas viações
foram descredenciadas pela administração” (JT: 30/04/2003, grifo nosso).
2. Valorização do quando6
Ontem, a prefeita Marta Suplicy (PT) passou por maus bocados em visita à
Subprefeitura de Cidade Tiradentes (extremo da zona leste). Ela virou alvo de
bolinhas de papel, um caderno e até duas pedras, que foram arremessadas por
__________
5. Amaral segue, em linhas gerais, o trabalho de José Marques de Melo, Valorização do ângulo principal no lead,
publicado pelo Departamento de Jornalismo da Escola de Comunicações Culturais da USP.
6. Os textos dos itens 2 a 5 sofreram processo de retextualização para que fiquem claras as elaborações de lides
propostas por Amaral (1987) .
36
3. Valorização do onde
Em visita à Subprefeitura de Cidade Tiradentes (extremo da zona
leste), a prefeita Marta Suplicy (PT) passou ontem por maus bocados. Ela virou
alvo de bolinhas de papel, um caderno e até duas pedras, que foram arremessadas
por motoristas e cobradores de ônibus que perderam o emprego porque suas
viações foram descredenciadas pela administração.
4. Valorização do como
Com bolinhas de papel, um caderno e até duas pedras arremessadas por
motoristas e cobradores de ônibus que perderam o emprego porque suas viações
foram descredenciadas pela administração, a prefeita Marta Suplicy (PT) virou
alvo ontem, em visita à Subprefeitura de Cidade Tiradentes (extremo da zona
leste).
Vale ressaltar, ainda, que todos os lides apresentados por Amaral (1987) são
construídos segundo o princípio da pirâmide invertida, ou seja, não importa qual
aspecto está sendo valorizado, mas é o fato principal que está encabeçando a
notícia. Temos, então, diferentes versões para um mesmo lide tradicional.
Hohenberg (1962) afirma ser a pirâmide invertida a mais antiga e mais útil
das estruturas da notícia. Ela surgiu a partir da invenção do telégrafo por uma
necessidade de transmitir a notícia em primeira mão, rápida e corretamente.
que não apenas informassem o leitor sobre algo, mas sim, atraíssem-no,
seduzissem-no e encantassem-no.
Hohenberg (1962) apresenta seis tipos de lides, considerados por ele como
eficazes. O primeiro é o nomeado de lead 7 direto. Este é constituído por uma ou
mais frases, um ou mais parágrafos e devem traçar a ação, o local e o significado
da notícia. Representa um meio eficaz de resumir a notícia para um leitor
apressado. Utilizaremos em todos os tipos de lides apresentados a seguir um
exemplo dado pelo próprio autor:
O lead de contraste é, para Hohenberg (op. cit.), uma das maneiras mais
comuns para se iniciar uma notícia, que é, como o próprio nome já diz, a inclusão
de um contraste no lide:
O lead episódico, cujo objetivo é atrair o leitor para um fato que poderia não
interessá-lo, tem sua origem nas revistas. O jornal utiliza-se dessa prática, também
com o mesmo objetivo e inicia suas notícias com pequenas histórias:
Erbolato (op. cit.) afirma existirem para a notícia tantos tipos de lide quanto
a imaginação do jornalista permitir. Ele apresenta de forma sucinta doze tipos: o
simples (trata de um único fato principal); o composto (refere-se a vários fatos
importantes); o integral, (responde às seis perguntas – quem?, o quê?, quando?,
onde?, por quê? e como?); o de suspense ou dramático (pretende emocionar o
leitor); o lead-flash (introduz de forma resumida uma notícia); o resumo (igual ao
lide composto); o citação (transcreve a fala de outrem); o contraste (trata de fatos
diferentes e opostos); o chavão (cita um slogan ou dito popular); o documentário
(faz uso de um fato histórico); o direto (trata diretamente do fato principal) e o
pessoal (dirige-se ao leitor).
41
Bond (1959: 163) classifica esse lide nomeado por Erbolato (op. cit.) e por
Hohenberg (1962) de pessoal, de lide de apelo direto:
Além desse lide de apelo direto, Bond (op. cit.) faz referência a outros sete
tipos: o condensado, que se assemelha ao lead-flash de Erbolato (op. cit.); o
circunstancial, utilizado quando a história possui um lado humano; o entre aspas,
que corresponde ao lide citação de Erbolato; o descritivo, que ilustra inicialmente
o ocorrido; o ativador de interesse, assemelha-se ao lide suspense ou dramático de
Erbolato; o numerado, que se utiliza de meios gráfico-visuais como os números
para se estruturar e o original, que representa uma criação nova de lide proposta
pelo jornalista.
Uma outra forma de lide proposta por Medina (1978: 141) é o lead-literary
que se vale de recursos ficcionais e inicia a notícia de maneira literária. Podemos
relacioná-lo ao lide episódico proposto por Hohenberg (1962):
Julgamos ser ainda necessário ressaltar que nossa pesquisa não pretende
invalidar a função e a utilidade de um lide tradicional. O que pretendemos apontar,
neste capítulo, é que o lide de uma notícia jornalística, ao contrário do que expõe
Possendoro (2002), não precisa e não deve seguir uma estrutura fechada e pronta.
Não precisa, por haver outras maneiras de se construir lides bem mais atraentes ao
leitor, e não deve para que a leitura do jornal não se torne algo pesaroso e
monótono.
44
O leitor parece ser o motivador dessas alterações, pois é ele, como afirma
Norberto (s.d.:21-2), o elemento central, a figura primordial de um jornal:
Eco (op. cit.) afirma que todo autor, no momento de produção de um texto,
seqüência lingüística escrita ou oral produzida em uma situação de comunicação
determinada, prevê um leitor específico, denominado por ele de leitor-modelo.
Esse leitor deve ser capaz de atualizar e de interpretar esse texto elaborado:
Conforme ressalta Eco (op. cit.: 39), o autor empírico, ou seja, o produtor da
enunciação textual, o sujeito concreto, deve ser capaz de hipotetizar esse leitor-
modelo com a finalidade de adequar seu texto a esse leitor e, assim, possibilitar a
reconstrução e a compreensão desse texto. Essa hipótese de leitor-modelo
representa, portanto, uma estratégia textual por parte do autor.
Maingueneau (2001), assim como Eco (op. cit.), também aponta o princípio
de cooperação postulado por Grice (1982) como um dos primeiros elementos
necessários para que haja uma comunicação, ou seja, ele afirma que o leitor deve
supor que o autor ao produzir um texto respeita certas regras como, por exemplo,
comunicar algo sério, verdadeiro, de interesse do leitor, de forma clara e sem
ambigüidade3. Podemos verificar que ao postular tais regras, o elemento
primordial da enunciação continua a ser o leitor, pois o respeito a essas regras
demonstra, primeiramente, a elaboração de um leitor-modelo por parte desse autor
empírico e, em seguida, uma preocupação com a compreensão e a interpretação
desse leitor.
__________
3. Grice nomeia cada uma dessas regras: máximas de qualidade, máximas de quantidade, máximas de relação e
máximas de modo. Todavia consideramos ser suficiente para esta dissertação apenas assinalarmos que na relação entre
autor e leitor, o primeiro respeita certas regras para que possa, assim, atingir o segundo.
50
Por sua vez, possuir uma competência genérica quer dizer que o autor deve
adequar seu texto a certos gêneros de discurso, que são, segundo o próprio
Maingueneau (op. cit.: 61), “tipos de discurso4 associados a vastos setores de
atividade social”, e o leitor-modelo, instituído por esse autor, precisa ser capaz ao
menos de distinguir diferentes gêneros a fim de que este consiga compreender e
interpretar o texto lido.
__________
4. Adotamos, nesta dissertação, a distinção entre texto e discurso proposta por Maingueneau (1998). Para ele, texto
possui uma forte estruturação e o destaque é dado à sua unidade, “que faz dele uma totalidade e não uma simples
seqüência de frases” (op. cit.: 142). Entretanto, o discurso “é concebido como a associação de um texto a seu contexto”
(op. cit.: 45).
51
Esse autor (op. cit.) aponta ainda que, dentre essas três competências, uma
não se sobrepõe à outra e que elas não obedecem especificamente a uma seqüência
ordenada. As três são igualmente importantes e interagem para que o autor produza
seu texto de forma que o seu leitor-modelo possa compreendê-lo e interpretá-lo.
O leitor empírico de Eco (op. cit.) é denominado por Maingueneau (op. cit.)
de público, que é concebido e diferenciado em duas categorias: o público genérico
e o público atestado.
O público atestado, por sua vez, não possui uma ligação com o gênero de
53
discurso, mas sim, com a diversidade espacial e temporal. O público atual de uma
notícia jornalística publicada em um jornal paulista de grande circulação, por
exemplo, não enxerga e lê o jornal da mesma forma que o público no início do
século XX. As expectativas e concepções atuais, também, são outras.
Ao tratar, por sua vez, do leitor-modelo, o teórico francês (op. cit.) utiliza as
denominações leitor invocado ou apostrofado e leitor instituído ou cooperativo.
Maingueneau (op. cit.: 37) aponta ainda que esse leitor instituído precisa
ser cooperativo para que, então, o texto possa ser compreendido e interpretado, ou
seja, ele deve ser capaz de construir o universo ficcional a partir das indicações
fornecidas pelo autor.
Contudo, a interação pode ser analisada sob um outro prisma que não seja
simplesmente uma relação estabelecida em uma conversação. Essa outra forma é a
de considerá-la como uma atividade presente em todo e qualquer uso da
linguagem, uma vez que ninguém escreve ou fala algo sem que imagine um leitor
ou um ouvinte.
modelo, pois como assinala Eco (1986: 37), “todo texto quer que alguém o ajude a
funcionar”.
Essa definição de interação é muito mais ampla pelo fato de englobar todo e
qualquer ato de linguagem seja ele oral ou escrito. Esta concepção está
58
Por esse motivo, essa compreensão por parte do interlocutor não é uma
atividade passiva, ou seja, ele deve ser capaz de refletir sobre o enunciado,
concordar, opor-se, comentar etc. O próprio locutor não espera uma atitude passiva
de seu interlocutor:
__________
5. Sentido e significação assumem nesta dissertação uma relação de sinonímia. Ambos estão relacionados ao
processo de compreensão. Ducrot (1987:170) recusa-se a considerar a significação parte do sentido. Entretanto, afirma
não poder justificar o motivo da recusa.
61
__________
6. Quanto à distinção entre língua e linguagem, Bakhtin considera a língua como sistema e, portanto, algo
determinado e fechado. A linguagem, por sua vez, é algo produzido por indivíduo ou um grupo de indivíduos e, por
isso, é passível de ser estudado e possui uma relação dialógica.
62
conseqüentemente à interação7.
__________
7. No presente trabalho, utilizaremos o conceito de dialogismo relacionado à interação. Entretanto, consideramos
pertinente a exploração de tal distinção dada a complexidade das formulações teóricas de Bakhtin.
8. Concebemos o termo enunciado como “a manifestação concreta de uma frase, em situações de interlocução.”
(Koch, 1998: 13) O termo enunciação já foi definido anteriormente. Precisamos assinalar, ainda, que, como pontua
Koch, ambas as definições fazem parte da teoria da enunciação, que tem como precursor M. Bakhtin.
63
pelo pensador russo. Ampla, primeiramente, pelo fato de Bakhtin considerá-la sob
diferentes aspectos (intertextual e interacional) e, depois, principalmente pelo fato
de ser um elemento constitutivo da linguagem.
__________
9. Concebemos a Teoria da Enunciação como aquela que não se preocupa unicamente em descrever os enunciados
produzidos por um locutor, mas que acima de tudo preocupa-se com “as condições de produção (tempo, lugar, papéis
representados pelos interlocutores, imagens recíprocas, relações sociais, objetivos visados na interlocução)”, (Koch,
1998: 13-4) todos esses elementos constitutivos de um enunciado.
65
uma falsidade, pois para ele essa distinção entre interior e exterior proposta pelos
subjetivistas individualistas não existe, e toda formulação, para que se estabeleça
uma comunicação com um interlocutor, dá-se no plano exterior:
relação que esses interlocutores pretendem construir, uma vez que esta pode ser
alterada por eles de acordo com a hierarquia ou familiaridade existente, ou, ainda,
dependendo da proximidade ou envolvimento que se pretende estabelecer.
Bakhtin (op. cit.) assinala, ainda, que, embora pareça que trate do termo
interação apenas presente num ato de conversação, ele sempre se refere às duas
formas de comunicação, ou seja, a fala e a escrita, sendo esta última nomeada por
ele no momento de exemplificar de “ato de fala impresso”:
Ao final do capítulo que trata sobre interação, o pensador russo (2002: 124)
propõe uma ordem metodológica desenvolvida em três passos para que se estude a
língua:
Ele faz uso dos pensamentos propostos pelo pensador russo, procurando
encontrar em um enunciado escrito aquilo que ele nomeia por traços de
interatividade, pois o autor, o locutor, denominado por ele de escrevente, deixa
alguns traços, algumas marcas que denunciarão o estabelecimento de uma relação
direta entre os interlocutores desse enunciado:
Procurar indícios de interatividade significa para esse autor (op. cit.: 143)
verificar o “movimento específico no processo de textualização em que a presença
do interlocutor está marcada na própria realização textual”.
Ao tratar de uma notícia jornalística, afirma que ela faz parte de um outro
gênero de discurso e é produzida para um público amplo e desconhecido, cuja
função é apenas a de informar, a de partilhar algo com seu interlocutor, que pode
não ser de seu conhecimento. Segundo Marcuschi (op. cit.), uma notícia
jornalística só estabelecerá uma relação direta com seu interlocutor, caso esta
busque um sensacionalismo:
Marcuschi (op. cit.), após comentar o eixo central dos pressupostos teóricos
elaborados por Bakhtin, que são a interação e o dialogismo, como também situar
suas marcas de interatividade enquanto campo de análise, apresenta
sistematicamente cinco diferentes indícios de interatividade presentes em
enunciados de diferentes gêneros de discurso. Ele aponta, ainda, a existência de
outros índices, porém afirma que explorará apenas cinco deles.
Tratar sobre o envolvimento não nos parece ser uma tarefa fácil pelo fato de
alguns teóricos divergirem sobre sua relação com o texto escrito. Alguns teóricos
74
Sob a ótica sociointeracionista, Marcuschi (op. cit. 33) afirma que tanto a
fala quanto a escrita possuem dialogicidade, usos estratégicos, funções
75
Idéia contrária ao explicitado por Marcuschi (op. cit.) e Urbano (op. cit.)
é apresentada por Rodrigues (2001) acerca da noção de envolvimento. Segundo
ela, o envolvimento é uma característica exclusiva da fala, pois é somente em uma
conversação face a face que tanto locutor quanto interlocutor compartilham um
mesmo momento, um mesmo espaço e, por esse motivo, podem juntos construir
um único enunciado.
A escrita, por sua vez, é considerada por Rodrigues (op. cit.) como o espaço
do distanciamento, pois representa um ato solitário por parte do autor. Para ela,
este não se preocupa com seu interlocutor e sim, apenas, com a elaboração de um
enunciado consistente:
Não nos deteremos em tais exemplos pelo fato deles já terem sido citados,
ao apontarmos as idéias desenvolvidas por Marcuschi (1999). Os exemplos dados
por Rodrigues (op. cit.) na fala se parecem com os de Marcuschi (op. cit.) na
escrita, como podemos observar na citação anterior.
12. O Projeto NURC é um projeto de estudo da norma lingüística urbana culta, “tem âmbito nacional, e gravações
foram realizadas em cinco capitais brasileiras: São Paulo (Projeto Nurc/SP), Rio de Janeiro, Porto Alegre, Recife e
Salvador. Cada uma dessas cidades gravou aproximadamente 300 horas com falantes cultos (entendidos como tal os de
formação universitária completa); brasileiros; nascidos na capital em que as gravações foram realizadas; filhos de luso-
falantes; distribuídos em três faixas etárias (25-35, 36-55, 56 anos em diante); de sexo masculino ou feminino; que
deixaram seu testemunho oral da fala urbana e dos três tipos de inquéritos realizados: elocuções formais, diálogos e
entrevistas.” (Preti, 2001: 7)
80
formas são as que já apontamos: o locutor consigo mesmo, o locutor com seu
interlocutor, o locutor com o tema do enunciado.
Além desses traços, Dias (op. cit.) aponta mais um ligado especificamente à
notícia jornalística: o “tom” ficcional da notícia. Neste caso, ela assinala que o
locutor, que é um jornalista, expõe o fato, posicionando-se não como tal, ou seja,
ele não mantém uma linguagem objetiva, mas sim trata desse fato como um
“narrador-jornalista”, aproximando, então, seu texto a uma narrativa ficcional:
Neste último caso, para diminuir tal distância, procurar envolver o leitor,
seduzi-lo e prender a sua atenção, o locutor pode fazer uso de alguns mecanismos
auxiliadores tais como os elencados por Dias (1996) ao citar Tannen.
Duas funções podem ser dadas para tais lides a partir dessa constatação: a
primeira é a de chamar a atenção do leitor para uma notícia secundária produzida
em determinado caderno. A segunda é exatamente o contrário, ou seja, é a de
enfatizar, de dar um destaque ou enfoque diferente para um fato já bastante
explorado pelo rádio, pela televisão ou pela internet.
Esses seis lides que procuram um envolvimento direto com seu interlocutor
podem ser divididos em dois grandes grupos: no primeiro, o envolvimento se dá
por meio do trabalho com a imaginação do leitor, ou seja, o jornalista interage com
seu interlocutor, criando uma cena, uma situação em sua mente. Cabe a esse leitor,
como postula Bakhtin (2003), compreender tal cena, refletir sobre ela e concordar,
discordar ou comentar aquilo que leu. No segundo grupo, o envolvimento se dá por
88
meio da simulação de uma conversa, ou seja, o jornalista estabelece com seu leitor
uma relação nos moldes da conversação face a face. Neste caso, assim como no
grupo anterior, também cabe ao leitor concordar, discordar ou comentar aquilo que
leu.
Neste segundo caso, o jornalista mexe com a imaginação do leitor, pois para
despertar a sensibilidade deste, o locutor deve fazer seu interlocutor ver ou sentir
aquilo que está sendo noticiado. A maior preocupação do jornalista passa a ser,
89
Como afirma Dines (2001: 94), uma determinada situação ao ser imaginada,
ao ser construída na mente do leitor, possui uma retenção muito maior, pois a
dramaticidade está presente nesta recomposição da realidade narrada ou descrita:
Sendo assim, o leitor, ao invés de apenas saber o que aconteceu por meio de
um lide tradicional, conseguirá compor uma imagem em sua mente e, desta forma,
sentir-se-á envolvido e preso pela situação narrada desde a primeira linha da
notícia.
Mesmo que tal impressão seja criada em muitas notícias jornalísticas, como
veremos mais adiante em outros tipos de lides, neste caso, o jornalista situa o fato
ocorrido em um momento anterior ao narrado, anterior à relação dialógica
interacional existente entre locutor e interlocutor. Ele constrói uma seqüência
narrativa sustentada em uma intriga.
• a fase das ações, que contém os acontecimentos desencadeados por essa ação
perturbadora;
Para que isso ocorra, ele primeiramente apresenta a situação inicial, que
trata da entrada de um homem magro em um depósito de uma loja de roupas:
“Eram 9h40 de ontem quando um homem magro, com 1,65 metro de altura e cerca
de 35 anos entrou no depósito da loja de roupas Tubo D’Água, localizada na Rua
Juruá, no Pari, centro de São Paulo”.
Em seguida, surge a fase das ações: “Exigiu a pasta preta do dono da loja e
mandou a secretária Carla Patrícia Muñoz Lopez, de 23 anos, ir para os fundos do
depósito./ Em seguida, Carla ouviu um estampido. Uma bala atingiu a cabeça do
comerciante Cláudio Hanna Hiar, de 40 anos, que morreu na hora. Ele era irmão
do deputado estadual Alberto Hiar (PSDB), conhecido como Turco Loco./ Sem
levar a pasta, o criminoso fugiu. Na saída, encontrou o motorista de Hiar, Benedito
de Lima, de 48 anos, que estava voltando de uma banca para onde havia ido
comprar um jornal para o patrão. ‘Entra e fica na moral’, disse o assassino,”.
O jornalista mostra-se preocupado não com o fato em si, mas sim com a
transmissão de uma imagem que envolva seu leitor à notícia e desperte-lhe um
maior interesse por ela. Por esse motivo, a relação dialógica interacional, no dizer
de Mikhail Bakhtin, que se estabelece entre jornalista e leitor é justamente a de
procurar uma relação mais próxima e íntima entre eles, uma vez que o primeiro
não está simplesmente noticiando um fato, mas sim contando uma história para o
seu leitor, para seu interlocutor, procurando, desta forma, fazer com que esse leitor
imagine a cena e sinta a angústia por que Hiar e sua secretária passaram.
Bronckart (2003: 221) esclarece que, além das cinco principais fases da
seqüência narrativa, outras duas podem ser acrescentadas: a fase de avaliação e a
de moral. Na primeira, o que ocorre é o acréscimo de um comentário relacionado
ao desenrolar da história e, na segunda, “se explicita a significação global atribuída
a história”.
termo de repente, assim como no lide anterior, serve como elemento intensificador
da expectativa, pois parece chamar a atenção do leitor para uma nova situação.
Aliás, vale ressaltar que, para Maingueneau (2001), o uso do discurso direto
pode representar ou uma exata reprodução das palavras do locutor, ou
simplesmente relatar algo que pode não ter sido dito exatamente dessa forma. Ele
destaca, ainda, que sendo verdadeiras ou falsas tais palavras, elas têm a função de
criar um efeito de autenticidade:
não com o tema, pois assim como no lide ficcional, o que ele privilegia é a
interação, é o envolvimento com seu leitor, e não o fato ocorrido:
98
Esse lide à primeira vista parece ser um lide ficcional. No entanto, o que o
diferencia do lide anterior é que o jornalista não assume mais a função de um
narrador onisciente nem a história sobre essa pessoa anônima é o centro da notícia,
ou o que a gerou. Neste lide, por exemplo, o jornalista institui esse anônimo para
servir como pretexto para tratar das altas temperaturas em pleno outono, ou seja, a
história do estudante Rodrigo L. Assoer funciona como um elemento prefaciador
da notícia, uma vez que nos dois parágrafos subseqüentes, o jornalista esclareça o
fato em si. Neste caso, então, o lide é constituído por três parágrafos.
Neste caso, por exemplo, o título tem como tema o pagamento da taxa do
lixo, e o lide trata da dificuldade encontrada por uma psicóloga para quitar sua
dívida. Não há, desta forma, como nos lides anteriores, um estranhamento gerado
por esse conflito entre título e lide. Entretanto, assim como no primeiro lide, o
jornalista opta por narrar o efeito, o resultado do problema para depois, então,
tratar do fato em si. Mas por que mesmo assim ele é considerado particularizante?
Por que não pode ser considerado um lide ficcional?
Como vimos, o lide ficcional pretende criar uma imagem na mente do leitor
que vai sendo construída paulatinamente pelo jornalista por meio do processo de
intriga. Tal lide coloca em um segundo plano o fato em si, o que realmente
ocorreu, para criar toda uma ambientação por meio de uma narração minuciosa
feita por um jornalista que assume a postura de um narrador onipresente ou
onisciente. Esse jornalista pretende, então, fazer seu leitor ver ou sentir o que
ocorreu.
Contudo, no lide particularizante, isso não acontece, ou seja, o jornalista ao
invés de tratar unicamente do ocorrido, particulariza o fato citando algo acontecido
com uma pessoa anônima. Essa estratégia aproxima o leitor do jornalista
justamente pelo fato de o segundo estar especificamente contando um problema
vivido por uma pessoa específica, que poderia ser o próprio leitor.
101
Neste caso, então, o jornalista quer fazer o seu leitor ver a confusão que a
cobrança da taxa de lixo está causando às pessoas. Portanto, assim como nos lides
anteriores, a estratégia interacional presente neste outro lide é a construção de uma
cena, de uma imagem para que um elo mais próximo entre leitor e jornalista se
estabeleça.
Podemos considerar que, no caso do lide descritivo, não há esse desejo por
parte do jornalista de criar ou de simular, utilizando como uma das estratégias
interacionais o leitor apostrofado, uma proximidade afetiva com seu leitor. Há,
porém, o desejo de estabelecer uma proximidade com ele, de envolvê-lo, de atrai-
lo por aquilo que está sendo dito. Como estratégia interacional, ele institui um
leitor-modelo que conheça a estruturação da notícia, do lide tradicional, que ainda
é, como já dissemos, predominante no jornal, rompe com essa estruturação, cria
uma ambientação logo no início por meio de uma descrição minuciosa e atrai o seu
leitor para o restante da notícia ou parte dela:
Este lide está dividido em dois parágrafos: o primeiro cria uma cena e
descreve-a para o seu interlocutor. O segundo por sua vez, com características de
lide tradicional, situa para o leitor tal descrição feita anteriormente.
Iniciar uma notícia jornalística por uma descrição desperta uma certa
curiosidade pelo fato de o leitor não saber ao certo do que o jornalista está
tratando, uma vez que o título da notícia também não aponta diretamente para o
fato, o lançamento de uma coletânea de DVDs dos Beatles. Essa incerteza atrai,
seduz o leitor pela notícia, uma vez que ele vai desejar saber verdadeiramente do
que o jornalista está tratando. Por esse motivo, esse leitor dá continuidade a sua
leitura.
Todavia, não é apenas uma curiosidade que esse tipo de lide desperta no
leitor. Toda descrição tem a função de apresentar verbalmente um objeto, um ser,
uma coisa, uma paisagem ou até mesmo um sentimento. De acordo com Garcia
(2003: 247),
Neste lide, a jornalista lentamente descreve a cena para que seu leitor
consiga visualizar como se deu a coletiva do fundador do Movimento Raeliano.
Entretanto, ela não conta, como no lide anterior, com o conhecimento
enciclopédico de seu leitor. Aliás, ela cria um leitor-modelo que possa não
conhecer nem Claude Vorilhon nem seu movimento. Por esse motivo, a jornalista
faz uma pausa, esclarecendo primeiramente quem é aquele que o “moço de calça
muito justa, camisa semi-aberta” chama de “sua santidade” e, em seguida, explica
qual a relevância desse movimento para a sociedade.
A jornalista também utiliza dois parágrafos para situar seu leitor sobre o que
pretende relatar. A sensação que ela parece desejar despertar no leitor é a de
desconforto e estranheza absoluta, pois logo de início descreve um moço que
nomeia um outro homem de “santidade”. No segundo parágrafo, ela continua a
descrever a cena, mas resumidamente informa de quem está falando e o que esta
pessoa fez. O lide desenvolvido em dois parágrafos termina com uma opinião da
jornalista sobre a descrição da cena vista: “parece um espetáculo”.
Conforme afirma Bearzoti Filho (1991:10), toda descrição tem por objetivo
fazer seu interlocutor ver ou sentir aquilo que foi descrito:
Os lides a seguir, porém, não têm por objetivo único despertar a curiosidade
do leitor, mas sim, quando os produz, o jornalista procura envolver seu interlocutor
de uma maneira mais intensa por meio da utilização de estratégias que minimizem
a distância espaço-temporal existente entre eles e criem, por esse motivo, a ilusão
de que jornalista e seu leitor mantêm uma conversação face a face.
Desta forma, ele chama a atenção de seu leitor para o fato e estabelece um
vínculo maior entre eles, uma vez que, ao invés de se ocultar para privilegiar esse
fato, criando, assim, esse efeito de objetividade, o jornalista primeiramente
externaliza seu pensamento. Neste caso, sendo colocado logo no início do
parágrafo, essa opinião é o elemento central, a idéia mais importante do lide.
Este lide mantém com seu leitor uma interação bem mais explícita pelo fato
de utilizar a expressão “é claro”. Tal expressão dirige-se a um leitor-modelo
109
O uso dessa expressão “é claro” atrai o seu leitor para a notícia por expor
primeiramente a opinião do jornalista para, em seguida, apresentar o fato.
Havemos de ressaltar, entretanto, que o fato apresentado possui alguns
argumentos levantados por esse jornalista, tais como: MRV tem a melhor
campanha da fase classificatória e conta com ex-jogadoras da Seleção Brasileira de
Vôlei. A função desses argumentos é a de justificar a opinião apresentada logo no
início da notícia por ele.
Mais uma vez o jornalista faz uma avaliação de uma determinada situação e
expõe sua opinião acerca de um fato noticiado. Neste caso, ele também se dirige a
um leitor instituído ou cooperativo, ou seja, a um leitor esperado, porém não
explicitado no lide.
Assim como nos anteriores, neste lide, a opinião do jornalista é exposta logo
no início do parágrafo e com um ponto de exclamação para intensificar sua opinião
e também alegria. Entretanto, neste caso, essa opinião se prolonga um pouco mais
ao longo do lide. Vilaron afirma que o time corintiano teve “força”, fez uma
“campanha invejável” e mais uma vez venceu o time do São Paulo.
Essa opinião presente logo de início, “que tapetão, que nada!”, pretende
mostrar para seu leitor toda a alegria que o jornalista está sentindo. Ele, então,
além de externalizar sua opinião, tendo por objetivo aproximar-se de seu leitor e
manter um elo conversacional com ele, como nos lides anteriores, compartilha com
o leitor sua alegria pela vitória do Corinthians.
Havemos de ressaltar, ainda, que esse tipo de lide opinativo, como se pôde
perceber pelas análises, está presente em sua maioria no Caderno de Esportes tanto
de O Estado de S.Paulo quanto do Jornal da Tarde. Esse dado nos permite inferir
que ao tratar de um assunto considerado lazer ou hobby pela grande maioria das
pessoas, o jornalista não precisa produzir uma notícia tão objetiva, clara e
imparcial como nos demais assuntos. Dessa forma, ele parece manter uma
conversa com seu leitor, criando, então, um ambiente descontraído, um tom de
conversa informal entre homens, pois como pudemos levantar, a maioria dos
leitores do Caderno de Esportes de ambos os jornais (74% em O Estado de S.Paulo
e 78% no Jornal da Tarde) é composta por leitores do sexo masculino e o mesmo
ocorre com os jornalistas que escrevem para esse caderno.
leitor. Por sua vez, como o próprio nome aponta, essa impressão de conversa entre
interlocutores se constrói também por meio de uma indagação:
São três as estratégias interacionais presentes neste lide que criam uma
proximidade espaço-temporal entre o jornalista e o seu leitor e que, por esse
motivo, simulam uma conversa face a face entre os interlocutores.
Não sabe o que fazer com seu velho Pentium/133? Deixe que
um bebê o descubra. Esse é o pré-requisito de dois novos títulos
da série Winnie the Pooh, distribuídos pela Positivo Informática.
O primeiro, Winnie the Pooh – Primeiros Passos, é indicado para
114
Neste lide, porém, o jornalista não está fazendo um convite ao seu leitor,
mas sim está lhe fazendo uma pergunta a qual ele já parece saber a resposta, ou
seja, o leitor invocado do autor empírico, não sabe o que fazer com seu velho
computador. A sugestão apresentada por ele é a mais inusitada possível: deixar que
um bebê descubra.
Consideramos oportuno ressaltar que, como assinala Frias Filho (1984: 4), a
notícia desperta interesse no leitor quanto mais ela for improvável. O mesmo
ocorre com o lide, ou seja, à medida que ele é construído de forma a causar um
115
certo estranhamento, uma certa curiosidade, mais ele conseguirá prender seu leitor
à notícia:
jóquei.
Além desse indício, uma estratégia interacional utilizada pelo jornalista para
aproximar os interlocutores é a instauração de um leitor invocado ou apostrofado.
Embora esse locutor não utilize explicitamente o termo você ou o leitor, ele está
subentendido no momento em que afirma ou convida seu leitor para entender o
fato ocorrido.
Desta forma, além de noticiar, ele tem o objetivo de fisgar a atenção de seu
interlocutor, e, por esse motivo, ou lhe desperta a curiosidade, construindo uma
imagem da cena em sua mente e desenvolvendo-lhe sensações agradáveis ou não,
ou dirige-se diretamente a esse leitor, procurando criar a impressão de que leitor e
jornalista mantêm uma conversação face a face.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desejamos apontar, também, por meio das análises, que o jornalista, para
interagir com seu leitor, para seduzi-lo, pode utilizar basicamente dois recursos: ou
mexer com o imaginário dele, construindo lenta e detalhadamente uma cena em
sua mente, ou dirigir-se diretamente a ele, criando uma idéia de que os
interlocutores mantêm uma conversação face a face.
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