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KALU GOMES LEAL

HETEROCICLOS:
Importância estrutural em moléculas biologicamente ativas

Betim
2016
KALU GOMES LEAL

HETEROCICLOS:
Importância estrutural em moléculas biologicamente ativas

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à


Faculdade Pitágoras – Unidade Betim, como
requisito parcial para a obtenção do título de
graduado em Farmácia Bioquímica.

Orientadora: Thamara Nishida Xavier da Silva

Aprovado em: __/__/____

BANCA EXAMINADORA

Prof(ª). Titulação Nome do Professor(a)

Prof(ª). Titulação Nome do Professor(a)

Prof(ª). Titulação Nome do Professor(a)

Betim

2016
Dedico este trabalho à minha mãe Lúcia
por toda força, palavras de incentivo
durante a realização do trabalho além do
seu amor incondicional. Dedico também
ao meu grande companheiro Bruno, por
todo seu apoio, compreensão e auxílio,
sem vocês, não seria possível.
AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos os professores que me auxiliaram durante a graduação,


repassando com excelência todos os seus ensinamentos e fornecendo um
embasamento essencial para a minha formação acadêmica.
À minha mãe Lúcia, que desde o início da jornada me apoiou. Sempre me
disse que eu seria capaz, e com seu otimismo e entusiasmo, tornou essa caminhada
mais leve e alegre. Obrigada pelo seu amor incondicional.
Ao meu companheiro Bruno, que me auxiliou com todo carinho e compreensão,
mesmo quando as preocupações eram grandes. Que com toda sua calmaria
conseguia tranquilizar-me diante de todas as dificuldades que surgiram durante o
desenvolvimento do trabalho.
Ao meu amado Théo, o cãozinho mais lindo e gordinho que dormia nos meus
pés enquanto eu passava horas sentada, escrevendo, e, vez ou outra me olhava
com aqueles olhinhos de pidão querendo um minutinho de carinho na barriga.
À minha madrinha de coração Gislaine, que abriu seus braços e me acolheu
com todo carinho, num momento de extrema dificuldade. Seu acolhimento foi crucial
para que eu terminasse essa jornada.
À minha tia Márcia, que com toda sua fé, me tranquilizou, assistiu e apoiou se
fazendo presente no momento que muito precisei.
Aos demais familiares, tios e primos e primas, que me apoiaram nesta minha
trajetória e me assistiram nos momentos de dificuldade.
RESUMO

Os heterociclos são compostos orgânicos caracterizados por possuírem em sua


estrutura átomos de carbono ligados ciclicamente. Em sua cadeia cíclica há pelo
menos um átomo diferente do carbono, chamado de heteroátomo, sendo os mais
comuns, os átomos de nitrogênio, oxigênio e enxofre. Os heterociclos nitrogenados
compõem o subgrupo mais abundante e tal informação deve-se entre outros
motivos, às características apresentada pelo átomo de nitrogênio. A introdução
dessas subestruturas em moléculas de fármacos justifica-se pela possibilidade de
ajuste de propriedades farmacêuticas e farmacocinéticas, viabilizando a síntese e/ou
semi-síntese de moléculas de fármacos amplamente utilizadas no arsenal
terapêutico.
Através de um levantamento bibliográfico com revisão sistemática, objetivou-se com
esse trabalho, demonstrar a importância que essas subestruturas fornecem para a
Química Medicinal, identificar as mais prevalentes e quais características físico-
químicas elas atribuíam às moléculas que eram introduzidas.

Palavras-chave: Heterociclos; heteroátomo; solubilidade; lipofilicidade;


carbociclos.
ABSTRACT

Heterocycles are organic compounds characterized by having cyclically bound


carbon atoms in their structure. In its cyclic chain for at least one atom other than
carbon, called the heteroatom, being the most common, atoms of nitrogen, oxygen
and sulfur. Nitrogen heterocycles make up the most abundant subgroup and such
information developed among other reasons, for nitrogen soil characteristics. The
introduction of substructures into drug molecules is justified by the possibility of
adjustment of pharmaceutical and pharmacokinetic properties, enabling a synthesis
and semi-synthesis of drug molecules widely used in the therapeutic arsenal.
Through a bibliographical survey with systematic review, the purpose of this work
was to demonstrate the importance that the substructures provide for a Medicinal
Chemistry, to identify as more prevalent and what physical characteristics.

Key-words: Heterocycles; heteroatom; solubility; lipophilicity; Carbocycles.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Gráfico 1 - Heterociclos nitrogenados de cinco membros ...................... 16


Figura 2 – Gráfico 2 - Heterociclos nitrogenados de seis membros ........................ 17
Figura 3 – Modelo de mosaico fluido – Membrana plasmática ................................ 21
Figura 4 – Estrutura - piridina .................................................................................. 26
Figura 5 – Estrutura - piperidina .............................................................................. 27
Figura 6 – Estrutura - pirrol ...................................................................................... 26
Figura 7 – Estatinas de primeira geração ................................................................ 29
Figura 8 – Estatinas de segunda geração ............................................................... 30
Figura 9 – Anti-inflamatórios da classe dos oxicams ............................................... 30
Figura 10 – A substituição do grupo amina pelo pirrol no sultopride ....................... 31
Figura 11 – Aumentando a polaridade de agentes antifúngicos...............................32
Figura 12 – Bioisosterismo utilizado para melhoria da biodisponibilidade na molécula
da losartana.............................................................................................................. 32
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Estrutura dos principais heterociclos...................................................... .15


Tabela 2 – Coeficiente de partição e solubilidade dos principais heterociclos .........23
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

FDA Food and Drug Administration


g/L Gramas por litro
GSK Glaxo SmithKlyne
Ka Constante de acidez
P Coeficiente de partição (já mudei)
mg/L Miligramas por litro
mol/L Mol por litro
pH Potencial hidrogeniônico
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 13
1.1 PROBLEMA .......................................................................................................14
1.2 OBJETIVOS .......................................................................................................14
2 PRINCIPAIS HETEROCICLOS ENCONTRADOS NAS ESTRUTURAS DE
FÁRMACOS UTILIZADOS ATUALMENTE NA TERAPÊUTICA .............. .....ERROR!
BOOKMARK NOT DEFINED.
3 PRINCIPAIS PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS DOS HETEROCICLOS
DETERMINANTES PARA AÇÃO DO FÁRMACO....................................................21
3.1 Solubilidade e Coeficiente de Partição ...........................................................22
3.1.1 Acides e basicidade .......................................................................................25

4 CARBOCICLOS E HETEROCICLOS – INTRODUÇÃO EM MOLÉCULAS DE


FÁRMACOS……………………………………………………………………………......27
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................33
REFERÊNCIAS ........................................................................................................34
13

1 INTRODUÇÃO

Os heterociclos são estruturas orgânicas que possuem uma cadeia carbônica


fechada ciclicamente e pelo menos um átomo diferente do carbono nesta cadeia,
usualmente nitrogênio, oxigênio ou enxofre, denominado heteroátomo (CLAYDEN et
al., 2012). Esses fragmentos rígidos conferem às moléculas de fármacos que os
contêm, propriedades físico-químicas, farmacocinéticas e farmacodinâmicas
consideravelmente relevantes para a Química Farmacêutica. No entanto, os
heterociclos são estruturas pouco abordadas nas disciplinas de química do curso de
Farmácia, o que não reflete a importância do tema na Química Medicinal. Por serem
estudadas somente em questões muito específicas no contexto do desenvolvimento
de novos fármacos, na disciplina Planejamento de Fármacos, fez-se necessário,
então, uma revisão ampla do assunto, de modo a ressaltar sua importância para o
meio acadêmico e científico.
Utilizou-se o levantamento bibliográfico com revisão sistemática como método
de pesquisa, tendo como fonte a literatura científica disponível. Os textos básicos
foram os livros-texto de química orgânica e química medicinal utilizados no curso de
farmácia, a saber: Química Medicinal – As bases moleculares da ação dos fármacos
(BARREIRO e FRAGA, 2015), Organic Chemistry (CLAYDEN et al., 2012), An
Introduction to medicinal chemistry (PATRICK, 2013) e Química Orgânica, volumes 1
e 2 (SOLOMONS e FRYHLE, 2012), todos em suas edições mais atualizadas. A
pesquisa também foi complementada com teses e dissertações sobre o assunto.
Para abordar o tema de forma mais atualizada foram selecionados artigos
científicos indexados nas plataformas Pubmed e Scfinder. As buscas nas bases
citadas concentram-se em fármacos contendo heterociclos aprovados pela Food and
Drug Administration (FDA) nos últimos 25 anos. Desse modo, foram utilizadas
referências publicadas no período de 1990 e 2016. Vale ressaltar que os exemplos
de fármacos escolhidos nos livros citados não ficaram restritos a nenhum período de
tempo, por se tratarem de exemplos previamente selecionados para fins didáticos.
14

1.1 Problema de Pesquisa

Qual a importância dos heterociclos no planejamento e desenvolvimento de novos


fármacos? E de que forma suas características influenciam nas propriedades físico-
químicas de compostos bioativos?

1.2 Objetivos do Trabalho

Geral:
Fomentar a importância estrutural dos heterociclos em moléculas bioativas,
evidenciando sua relevância no planejamento e desenvolvimento de fármacos.

Específicos:
 Identificar os principais heterociclos presentes na estrutura dos fármacos
utilizados na terapêutica;
 Revisar as principais características químicas dos heterociclos identificados;
 Buscar na literatura exemplos de planejamento e desenvolvimento de
fármacos nos quais um ou mais heterociclos foram incorporados em sua
estrutura;
 Correlacionar os heterociclos identificados com características físico-químicas
das moléculas, bem como sua atividade farmacocinética e farmacodinâmica.
15

2 PRINCIPAIS HETEROCICLOS ENCONTRADOS NAS ESTRUTURAS DE


FÁRMACOS

Os heterociclos são estruturas ubíquas entre os fármacos que compõem o


arsenal terapêutico. Segundo levantamento feito em 2001 juntamente aos bancos de
dados da companhia MDL Informations Systems Inc., 56,7% dos fármacos
disponíveis para uso clínico naquele ano possuíam pelo menos um fragmento
heterocíclico (WU, 2012). Uma análise das substâncias sob investigação clínica,
aprovadas para uso clínico pela Food and Drug Administration (FDA) no período de
2000 até 2016 revelou que entre os heterociclos encontrados com mais frequência
nas moléculas desses fármacos e candidatos a fármacos, destacam-se piridina,
pirimidina, piperazina, morfolina, triazol, imidazol (incluindo os imidazóis fundidos),
furano (incluindo o benzofurano) e o indol (WU, 2012).
Em levantamento mais recente analisou-se sistematicamente anéis isolados e
sistemas de anéis presentes em 1175 fármacos liberados para comercialização
listados no FDA Orange Book até o fim de 2012. Os heterociclos mais
frequentemente encontrados foram piridina, piperidina, piperazina, tetra-hidropirano,
imidazol, pirrolidina, cefem, tetra-hidrofurano, tiazol, indol, pimidina, penam, tetrazol,
tiofeno, benzimidazol e quinolina, cujas estruturas estão mostradas na Tabela 1
(TAYLOR et al., 2014).

Tabela 1 – Estrutura dos principais heterociclos encontrados em fármacos.

Nome Estrutura Nome Estrutura

Piridina Tiazol

Piperidina Indol
16

Piperazina Pirimidina

Tetra-hidropirano Penam

Imidazol Tetrazol

Pirrolidina Tiofeno

Cefem Benzimidazol

Tetra-hidrofurano Quinolina

Fonte: Autora, 2016

Uma vez que os heterociclos nitrogenados são os mais abundantes, foi


encontrado na literatura levantamento específico envolvendo tal subclasse. Entre
1086 fármacos (pequenas moléculas) aprovados pela FDA até 2012, 640 (59%)
possuem pelo menos um nitrogênio heterocíclico. Nesse subgrupo, curiosamente, o
número médio de átomos de nitrogênio por fármaco é 3,5, exaltando a abundância e
importância desse elemento na química dos heterociclos. (VITAKU et al., 2014).
Os fragmentos nitrogenados mais comumente encontrados e o número de
fármacos contendo sua estrutura foram piperidina (72), piridina (62), piperazina (59),
cefem (41), pirrolidina (37), tiazol (30), imidazol (24), penam (22), indol (17), tetrazol
(16), fenotiazina (16) e pirimidina (16). Quando classificados segundo o tamanho do
17

anel, os heterociclos de 5 membros mais abundantes são pirrolidina (14,7%), tiazol


(12,0%) e imidazol (9,5%), ao passo que os heterociclos de 6 membros mais
comuns são piperidina (19,0%), piridina (16,4%) e piperazina (15,6%), conforme
mostrado nos Gráficos 1 e 2 (VITAKU et al., 2014).

Gráfico 1 - Heterociclos nitrogenados de cinco membros mais comuns.

3.60% 3.60%
Outros
4,00% Pirrolidina
4.40% Tiazol
29.90%
Imidazol
5.20%
Indol

6.40% Tetrazol
Benzimidazol

6.80% Imidazolidina
Imidazolina
14.70% 1,2,4-Triazol
9.50%
Isoxazol
12%

Fonte: Vitaku et al. (2014, p.10259).


18

Gráfico 2 - Heterociclos nitrogenados de seis membros mais comuns.

2,40% 2.40%
2,60%
Outros
2.90%
3,40% Piperidina
23.20%
3.70%
Piridina
4.20% Piperazina
4.20%
Pirimidina

Fenotiazina

15.60% 19% 4-Quinolina

Morforlina

Tetra-
16.40% hidroisoquinolina

Fonte: Vitaku et al. (2014, p.10259).

Em ambos os grupos há um número elevado de estruturas ainda pouco


comuns nos fármacos, mas que, conjuntamente, constituem uma parcela
significativa do total. Isso ocorre porque, incessantemente, novos sistemas de anéis
são idealizados e incorporados sinteticamente nas moléculas dos novos fármacos.
Com efeito, em média, 6 novos sistemas de anéis são incorporados no arsenal
químico dos fármacos a cada ano e aproximadamente 28% dos novos fármacos
possuem um novo sistema de anel, ou seja, um novo heterociclo (TAYLOR et al.,
2014).
Por que determinados heterociclos são mais prevalentes do que outros? Não
são encontrados nos levantamentos citados estes motivos de forma clara e objetiva,
uma vez a resposta é multifatorial. Uma substância bioativa deve atender a uma
série de requisitos para ser tornar um fármaco e, desde as etapas iniciais de seu
planejamento na química medicinal, os heterociclos podem contribuir de forma muito
diversa para que tais requisitos sejam cumpridos. Analisando, individualmente, os
exemplos de planejamento de fármacos, é possível dizer, em cada caso, porque um
heterociclo foi utilizado em detrimento de outro (BARREIRO e FRAGA, 2015).
É certo, contudo, que a viabilidade sintética é um fator dos mais importantes,
19

pois, obviamente, uma substância precisa ser sintetizada ou, mais raramente,
isolada de fontes naturais antes de ser estudada farmacologicamente. Piridina,
piperidina e piperazina são os heterociclos mais comuns em fármacos porque, entre
outros motivos abordados neste trabalho, as reações químicas de modificação
dessas substâncias nitrogenadas são bem conhecidas e acessíveis (JOULE e
MILLS, 2010). Porém, há casos em que as opções são muito restritas e a
acessibilidade sintética passa a ser menos importante. O anel -lactâmico é difícil de
ser modificado quimicamente e a maioria das penicilinas e cefalosporinas ainda é
obtida por semi-síntese. Uma relação estrutura-atividade das penicilinas revela que o
anel -lactâmico não pode ser substituído por outra subestrutura, pois isto resulta em
perda de atividade farmacológica (PATRICK, 2013). Assim, a despeito da baixa
viabilidade sintética, os heterociclos contendo o anel -lactâmico como cefem e
penam estão entre os mais comuns encontrados nos fármacos (TAYLOR et al.,
2014).
A razão primeira pela qual os heterociclos contendo oxigênio, enxofre e,
principalmente, nitrogênio são explorados no desenvolvimento de fármacos é a
farmacodinâmica. Os principais heterociclos presentes na estrutura dos fármacos
também são encontrados ou possuem análogos em ácidos nucleicos, aminoácidos,
lipídeos, carboidratos, vitaminas, hormônios, neurotransmissores, etc. Portanto,
essas estruturas e os fármacos que os contêm, em maior ou menor extensão,
mimetizam substâncias endógenas do organismo humano ou de microorganismos
que atuam em processos bioquímicos importantes passíveis de serem modulados
com o intuito de se obter uma resposta farmacológica (LEHNINGER et al., 2006). Os
heterociclos, com frequência, fazem parte do farmacóforo e, consequentemente,
estabelecem interações com seu alvo molecular, contribuindo para a afinidade do
fármaco pela macromolécula (BARREIRO e FRAGA, 2015).
O uso recorrente dos fragmentos heterocíclicos também se justifica pela
possibilidade de ajuste de propriedades farmacêuticas e farmacocinéticas. De modo
geral, oxigênio e nitrogênio aumentam a polaridade e o caráter hidrofílico das
moléculas, ao passo que o enxofre aumenta o caráter hidrofóbico. Assim, o balanço
das propriedades hidrofílicas e hidrofóbicas com vistas à obtenção de um bom perfil
de solubilidade em água e absorção pode ser obtido incorporando-se à estrutura do
candidato a fármaco um heterociclo apropriado ou substituindo-se um sistema de
20

anel heterocíclico por outro com caraterísticas físico-químicas mais adequadas


(GOMTSYAN, 2012). Diversos exemplos de substituições bioisostéricas envolvendo
heterociclos para melhorar potência, seletividade e perfil farmacocinético de
moléculas bioativas serão abordados nos capítulos subsequentes.

3. PRINCIPAIS PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS DOS HETEROCICLOS


DETERMINANTES PARA AÇÃO DO FÁRMACO

A ação terapêutica do fármaco é resultante de interações desses compostos


com sistemas biológicos e é dependente de fatores relacionados à sua estrutura
química, e consequentemente, com suas propriedades físico-químicas. Dentre
diversas propriedades físico-químicas, existem aquelas de maior importância para
que um fármaco apresente atividade biológica, essas propriedades são as que
envolvem aspectos hidrofóbicos/hidrofílicos, eletrônicos e estereoquímicos e
aspectos relacionados a características básicas e ácidas (BARREIRO e FRAGA,
2015). Cada uma dessas propriedades será descrita e correlacionada com o
heterociclo presente nos fármacos.
A membrana plasmática é uma barreira biológica que possui como principal
função separar o meio extracelular do citoplasma. São conhecidas hoje, inúmeras
moléculas que agem como mediadores e transpassam a membrana plasmática com
a finalidade de suprir as necessidades metabólicas das células. Esses mediadores
químicos são conhecidos como carboidratos, aminoácidos, íons entre outros. No
entanto, no meio intracelular, também são produzidas diversas moléculas que são
secretadas ou excretadas para o meio extracelular (JUNQUEIRA e CARNEIRO,
2008).
Desse modo, fez-se então necessário, descobrir como e porque substâncias
com características físico-químicas tão diferentes possuíam a capacidade de
transpassar esse obstáculo, e para isso foi necessário propor um modelo de
membrana plasmática. O modelo mais aceito hoje foi o proposto por Singer e
Nicholson, em 1972, conforme representado na Figura 3. Segundo eles, a
membrana plasmática é constituída por uma bicamada lipídica voltada para a região
interior da célula conferindo uma característica hidrofóbica, em contrapartida,
encontram-se na região externa grupos fosfato que conferem características
21

hidrofílicas à membrana. A membrana celular é composta também por proteínas,


glicídios e lipídeos que participam do mecanismo de absorção de biomoléculas
(GUYTON e HALL, 2006; JUNQUEIRA e CARNEIRO, 2008).

Figura 3 - Modelo de mosaico fluido – Membrana plasmática.

Fonte: JUNQUEIRA e CARNEIRO, 2008

Pode-se concluir que, para um fármaco ser absorvido pela membrana


plasmática, ele não pode apresentar caráter extremamente hidrofílico e nem
extremamente hidrofóbico, visto que a membrana apresenta ambos os aspectos.
Para alcançar seu sitio de ação em concentrações adequadas e apresentar
atividade biológica, o fármaco precisa passar pelos processos de absorção,
distribuição, biotransformação e excreção. Tais processos estão diretamente
relacionados à capacidade do fármaco de atravessar a membrana e, portanto, à
solubilidade relativa do fármaco em óleo (parte hidrofóbica) e água (parte hidrofílica).
Essa capacidade é denominada de Coeficiente de partição óleo-água (P),
normalmente expresso como logP. (BARREIRO E FRAGA, 2015).
Além disso, considerando que a forma não ionizada de um fármaco é mais
lipossolúvel que a forma ionizada e que a maioria dos fármacos são ácidos ou bases
fracas, ou seja, dependendo do pH do meio há variação da relação das
concentrações de formas ionizadas e não ionizadas, os processos de absorção,
transporte e excreção dos fármacos também dependem de sua constante de acidez
(Ka) e do pH do meio biológico em que o fármaco se encontra. Portanto, pode-se
concluir que as propriedades farmacocinéticas de um fármaco dependem de seu
22

coeficiente de partição (P) e de sua constante de acidez (Ka). (BARREIRO E


FRAGA, 2015).

3.1 Solubilidade e Coeficiente de partição

Entende-se por solubilidade a quantidade máxima que uma determinada


substância pode dissolver-se em um líquido. Sua unidade de medida pode ser
expressa em mol por litro (mol/L), gramas por litro (g/L), miligramas por litro (mg/L)
ou em porcentagem de soluto/solvente. Além disso, a solubilidade de determinada
substância depende das características físico-químicas do soluto e do solvente,
como por exemplo, a sua polaridade, pois os solutos tendem a solubilizar-se em
solventes com polaridades semelhantes às suas. Além de depender também de
outros fatores, tais como temperatura e pressão. (FELTRE, 2005).
A introdução de um heteroátomo em uma cadeia carbônica cíclica confere à
estrutura, dentre outras características, uma maior polaridade comparada a um
carbociclo, devido à maior eletronegatividade dos heteroátomos que são
adicionados comparados ao átomo de carbono. Essa diferença de polaridade reflete
diretamente em sua solubilidade em água, visto que os heteroátomos interagem
melhor com o meio aquoso através de interações dipolo-dipolo e ligações de
hidrogênio, diferentemente da cadeia carbônica. Os heterociclos que contém o
oxigênio e/ou nitrogênio são os mais hidrossolúveis já que possuem maior
capacidade de formar ligações de hidrogênio com a água (SOLOMONS, 2012). Tal
informação pode ser observada na Tabela 2, quando comparadas as solubilidades
dos compostos benzeno e piridina. Observa-se que o benzeno se caracteriza como
um carbociclo, e sua solubilidade segundo dados do Pubchem é de 1,79 g/L a uma
temperatura de 25°C, o que expressa sua menor polaridade e consequentemente
sua menor solubilidade em água comparado à piridina, que é um heterociclo que
possui estrutura semelhante à do benzeno e que no entanto, foi submetida à
introdução do nitrogênio como heteroátomo, a piridina por sua vez é considerado
com um composto miscível (PUBCHEM, 2016).

Tabela 2 – Coeficiente de partição e solubilidade dos principais heterociclos.


23

Sítios Sítios
aceptores doadores
logP Solubilidade
Ciclo Estrutura de ligação de ligação
(Scifinder) (Pubchem)
de de
hidrogênio hidrogênio

Benzeno 2,18 0 0 1,79 g/L (25 C)

31,0 mg/L (25


Naftaleno 3,37 0 0
C)

Ciclopentadieno 2,09 0 0 1,80 g/L (25 C)

Piridina 0,84 1 0 Miscível

Piperidina 0,61 1 1 Miscível

Piperazina -1,50 2 2 Miscível

Quinolina 2,03 1 0 6,11g/L (25 C

Furano 1,34 1 0 10,0 g/L (25 C)


24

3,02 mg/L (25


Tiofeno 1,81 0 0
C)

Pirrol 0,85 1 1 45 g/L (25 C)

Levemente
Tiazol 0,44 1 0
solúvel

Imidazol -0,01 2 1 633 g/L (20 C)

1,2,3-triazol -0,63 3 1 Muito solúvel

Fonte: Autora, 2016

O mesmo acontece quando comparados os compostos aromáticos naftaleno


e quinolina, que são compostos semelhantes, no entanto, diferem-se na introdução
do nitrogênio como heteroátomo na quinolina. Observa-se na Tabela 2, que a
solubilidade do naftaleno corresponde a 31,0 mg/L a 25ºC, em contrapartida a
solubilidade da quinolina é 6,11 g/L a 25ºC. Fator esse que demostra nitidamente
que a introdução de um heteroátomo, aumenta sua polaridade que, por conseguinte
aumenta sua solubilidade em água. Pode-se exemplificar o aumento da polaridade
com introdução de um heteroátomo no carbociclo também com os compostos
ciclopentadieno e pirrol. O ciclopentadieno é um carbociclo que possui solubilidade
igual a 1,80 g/L a 25ºC e o pirrol é um heterociclo que possui solubilidade em água
igual a 45 g/L hidrogênio (PUBCHEM, 2016; SCIFINDER, 2016).
Observa-se também na Tabela 2 que, de um modo geral, quanto mais solúvel
em água for o composto, ou seja, quanto maior for sua polaridade, menor é o
25

Coeficiente de partição (P) do heterociclo. Isso ocorre porque a polaridade do


composto está diretamente relacionada com sua capacidade de formar ligações de
hidrogênio, que por sua vez está relacionada com o número de sítios aceptores ou
doadores de ligação de hidrogênio. (SOLOMONS, 2012).
Comparando os compostos naftaleno e quinolina novamante, que apresentam
logP igual a 3,37 e 2,03 respectivamente, segundo o banco de dados Scifinder,
conclui-se que a introdução de um heteroátomo no carbociclo diminui o logP, pois
aumenta sua polaridade e sua concentração na fase aquosa. Observa-se também
que, quando comparados compostos de 5 membros como o imidazol, triazol e pirrol,
quanto maior for o número de heteroátomos presentes no heterociclo, maior é seu
caráter hidrofílico (Figura 11). Segundo a Tabela 2, o imidazol apresenta 2 sítios
aceptores de ligação de hidrogênio, o 1,2,3-triazol, por sua vez apresenta 3, e o
pirrol possui apenas 1 sítio aceptor de ligação hidrogênio (PUBCHEM, 2016;
SCIFINDER, 2016).
O enxofre é um átomo mais volumoso e menos eletronegativo, comparado ao
oxigênio e ao nitrogênio. Sendo assim, os heterociclos que contêm o enxofre como
heteroátomo são mais lipofílicos que os que contêm oxigênio e nitrogênio. O tiofeno,
por exemplo, é um composto heterocicliclo de 5 membros que apresenta um átomo
de enxofre como único heteroátomo, seu logP corresponde a 1,81. Em
contrapartida, o tiazol que possui estrutura semelhante, diferindo-se apenas na
introdução do nitrogênio como mais um heteroátomo, apresenta logP bem menor
(0,44), fator tal que reforça ainda mais a característica polar apresentada por
heterociclos que apresentam nitrogênio e/ou oxigênio como heteroátomo. hidrogênio
(PUBCHEM, 2016; SCIFINDER, 2016).

3.1.1 Acidez e basicidade

No que se refere à acidez e basicidade, ao analisar estruturas de compostos


como, por exemplo, a piridina, piperidina e pirrol, observam-se na Figura 4, que a
piridina apresenta o nitrogênio hibridizado em sp² e doa um elétron ligante ao
sistema 𝜋 que juntamente com um de cada um dos cinco átomos de carbono,
fornecem à piridina um sexteto de elétrons, obedecendo assim à Regra de Hückel,
que afirma que os anéis aromáticos apresentam 4n + 2 elétrons 𝜋, onde n é um
26

número inteiro (SOLOMONS, 2012). Sendo assim, a piridina apresenta dois pares
de elétrons que não fazem parte do sistema 𝜋, e não se encontram em ressonância
no anel, ou seja, estão disponíveis para se ligarem a um hidrogênio, conferindo um
caráter fracamente básico à piridina, que apresenta pKa do ácido conjugado igual a
5,5. (BARREIRO E FRAGA, 2015).

Figura 4 – Estrutura piridina

Fonte: PATRICK, 2009.

Em contrapartida piperidina apresenta um caráter mais básico comparado à


piridina (pKa do ácido conjugado igual a 11,2). Isso se explica devido ao fato de a
piperidina não apresentar ligações duplas e seu par de elétrons não ligante se
encontrar em orbital sp³, conforme demonstrado na Figura 5. Sabe-se que elétrons
dos orbitais com maior caráter p, são mais básicos do que aqueles com menor
caráter p, pois eles estão mais afastados do núcleo e mais aptos a captar um próton.
Por esse motivo, o nitrogênio da piperidina é mais básico do que o da piridina.
(CLAYDEN et al., 2012 e SOLOMONS, 2012).

Figura 5 – Estrutura piperidina

Fonte: PATRICK, 2009.

No pirrol os elétrons são arranjados de forma diferente, comparados à piridina


e a piperidina. Isso ocorre porque o pirrol é um heteroátomo de 5 membros (Figura
6), ou seja, os átomos de carbono presentes nesse composto contribuem apenas
27

com quatro elétrons 𝝅, sendo assim o nitrogênio do pirrol, que se encontra


hibridizado em sp² deve contribuir com dois elétrons para fornecer um sexteto
aromático e não com apenas um, como ocorre com a piridina. Portanto, no caso do
pirrol não existe elétrons disponíveis para captação de um próton, o que torna o
pirrol (pKa do ácido conjugado igual a 0,27) uma estrutura com baixa basicidade.
(CLAYDEN et al., 2012 e SOLOMONS, 2012).

Figura 6 – Estrutura pirrol

Fonte: PATRICK, 2009.

Desse modo, observa-se as diversas contribuições que a introdução de um


heterociclo pode fornecer à molécula do fármaco devido às suas diversidades físico-
químicas.

4. CARBOCICLOS E HETEROCICLOS – INTRODUÇÃO EM MOLÉCULAS DE


FÁRMACOS

O átomo de carbono é bastante versátil no modo de fazer ligações


covalentes, podendo estabelecer 4 ligações simples ou 1 dupla e 2 simples ou 1
tripla e 1 simples, com diversos arranjos distintos. Porém, do ponto de visto sintético,
construir uma ligação carbono-carbono, especialmente envolvendo moléculas
polifuncionalizadas, como os fármacos não é simples. O crescimento da química dos
heterociclos possibilitou que estas estruturas fossem cada vez mais incorporadas na
estrutura dos fármacos, criando alternativas para as dificuldades sintéticas
encontradas na síntese de carbociclos (BARREIRO, 2015).
O oxigênio e o nitrogênio são átomos mais eletronegativos que o carbono,
possuem pares de elétrons não ligantes e, de modo geral, são mais reativos do que
o carbono. Hidroxilas e aminas são grupos nucleofílicos que, na presença de
eletrófilos apropriados, podem ser alquilados, acilados e sulfonados, gerando éteres,
28

aminas substituídas, ésteres, amidas, sulfonamidas e outros grupos funcionais


presentes nos heterociclos e nos fármacos. O nitrogênio é ainda mais versátil do que
o oxigênio, pois forma 3 ligações para completar seu octeto, ao passo que o
oxigênio forma apenas 2 ligações, e seu par de elétrons é ainda mais nucleofílico já
que o nitrogênio é menos eletronegativo do que o oxigênio. Isso explica, em parte,
porque os heterociclos nitrogenados são os mais abundantes. O enxofre, por sua
vez, possui uma característica interessante: é capaz de estabelecer múltiplas
ligações covalentes, como no grupo sulfona (SO2), devido à possibilidade desse
elemento expandir seu octeto (SOLOMONS, 2012).
Uma vantagem sintética dos heterociclos sobre os carbociclos é a sua menor
capacidade de gerar centros estereogênicos, pois oxigênio, nitrogênio e enxofre não
são tetravalentes como o carbono. Durante o planejamento de fármacos, a geração
de centros estereogênicos é normalmente indesejada e evitada, pois a
complexidade da síntese ou semi-síntese aumenta consideravelmente com o
número de carbonos assimétricos. Se uma molécula possui n centros quirais, o
número de estereoisômeros é 2n!. A maior dificuldade de se trabalhar com
substâncias assimétricas resulta da necessidade de se obter substâncias
opticamente puras para os ensaios biológicos. Mesmo que um fármaco quiral seja
comercializado como forma racêmica, por exemplo, é necessário que os
enantiômeros sejam avaliados individualmente nos estágios pré-clínicos e clínicos
para que eles sejam aprovados pelas agências reguladoras (CLAYDEN et al., 2012).
A redução do número de centros estereogênicos de uma molécula bioativa
quiral visando à obtenção de análogos estruturalmente mais simples é uma
estratégia de modificação molecular conhecida como simplificação molecular. Ela foi
utilizada com sucesso no planejamento de fármacos sintéticos hipocolesterolêmicos
da classe das estatinas. O primeiro inibidor potente da enzima 3-hidroxi-3-
metilglutarilcoenzima A redutase (HMG CoA redutase), alvo molecular das estatinas,
foi a substância compactina, descoberta por triagem de fungos nos anos 1970
(Figura 7). Posteriormente, foi descoberta a lovastatina, lançada no mercado
farmacêutico como fármaco hipocolesterolêmico em 1987. A partir dela produziu-se
por semi-síntese a sinvastatina, aprovada para uso clínico em 1988. Todos esses
fármacos possuem uma cadeia hidrofóbica, constituída pelo anel bicíclico decalina,
29

que possui 5 centros estereogênicos, como pode ser visualizado na Figura 7.


(BARREIRO, 2015 e PATRICK, 2009).

Figura 7 – Estatinas de primeira geração.

_____________________
Os centros estereogênicos da simvastatina estão assinalados com asterisco.

Fonte: PATRICK, 2009.

Para se contornar a dificuldade em se trabalhar com a decalina, ela foi


substituída por heterociclos aromáticos sintéticos sem nenhum carbono assimétrico,
dando origem às estatinas de segunda geração, nos anos de 1996 e 1997. (Figura
8). Os heterociclos serviram de núcleo para a ancoragem de grupos hidrofóbicos
volumosos como o anel 4-fluorfenila e isopropila, que ocuparam eficientemente os
bolsos presentes no sítio ativo e permitiram a manutenção da inibição enzimática e
da atividade farmacológica (PATRICK, 2009).

Figura 8 – Estatinas de segunda geração.

Fonte: PATRICK, 2009.


O piroxicam é um anti-inflamatório não esteroidal descoberto em 1971 e
pertence à classe dos oxicams cujo efeito farmacológico é decorrente da inibição da
ciclo-oxigenase e prostaglandina endoperóxido sintase. É conhecido comercialmente
30

como Feldene®, Inflamene® e Floxicam®. A substituição do anel fenílico do núcleo


benzotiazínico do piroxicam pelo tiofeno originou o tenoxicam, que possui
comparável perfil de atividade farmacoterapêutica, mas pode ser administrado em
dose única diária de 20 mg, devido ao seu maior tempo de meia vida. Outras
substituições do anel fenílico do piroxicam por heterociclos permitiu a obtenção de
novas moléculas, com semelhante perfil farmacológico, como o aza-piroxicam, que
possui um nitrogênio heterocíclico em sua estrutura (Figura 9, BARREIRO e
FRAGA, 2015).

Figura 9 – Anti-inflamatórios da classe dos oxicams.

Fonte: PATRICK, 2009.

O sultopride, lançado em 1976 pela Sanofi-Aventis é conhecido


comercialmente como Barnetil®, Barnotil® e Topral®. Consiste em um agente
antipsicótico utilizado no tratamento de esquizofrenia. Pertence à classe das
benzamidas e atua como antagonista de dopamina nos receptores D2 e D3. No caso
do sultopride, utilizou-se do bioisosterismo para promover a substituição de grupos
considerados problemáticos no que diz respeito à sua biotransformação, (Figura
10). Nesse caso, o grupamento amida, que é suscetível a ações enzimáticas
hidrolíticas, que podem comprometer sua atividade farmacológica, foi substituído por
um pirrol. A realização dessa substituição levou à obtenção de uma molécula que
apresenta aumento da atividade e da seletividade pelo receptor de dopamina D3,
comparado aos receptores de dopamina D2. (PATRICK, 2009).

Figura 10 – A substituição do grupo amina pelo pirrol no sultopride.


31

Fonte: PATRICK, 2009.

O tioconazol, conhecido comercialmente como Cartrax®, Gino-tralen®,


Gynomax® e Seczol®, é um antifúngico derivado do imidazol. Devido a sua
característica pouco polar, seu uso e apenas tópico, utilizado para infecções de pele,
visto que sua solubilidade no sangue é baixa. A introdução de um grupo hidroxila
que é polar e de mais heteroátomos nos anéis heterocicliclos levou à descoberta de
um outro agente antifúngico, o fluconazol, conhecido comercialmente como
Candizol®, Zoltec® e Fluconax®, que possui maior polaridade, comparado ao
tioconazol, e pode ser utilizado via oral para tratamentos de infecções sistêmicas
(Figura 11). (PATRICK, 2009).

Figura 11 – Aumentando a polaridade de agentes antifúngicos.

Fonte: PATRICK, 2009.


A utilização do bioisosterismo de anéis para melhora da atividade
farmacoterapêutica também pode ser representada por um agente anti-hipertensivo
que tem como o principal representante da classe, a losartana. Ele também atua
como antagonista de receptores de angiotensina II. Pesquisadores da Glaxo
SmithKlyne (GSK), no intuito de aumentar o tempo de meia-vida da losartana,
32

realizaram a substituição de um anel benzênico contido nesta molécula por um


heterocíclo aromático, o anel benzofurano, tal modificação possibilitou a obtenção de
uma molécula com melhoria de aproximadamente 20% da biodisponibilidade do
fármaco comparado ao protótipo inicial. (Figura 12) (BARREIRO E FRAGA, 2015).

Figura 12 – Bioisosterismo utilizado para melhoria da biodisponibilidade na molécula


da losartana.

Fonte: BARREIRO E FRAGA, 2012.

Observa-se, portanto, diante das informações citadas acima, que a introdução


de heterociclos nas moléculas de fármacos visando à melhoria farmacocinética e
farmacêutica do mesmo tem se tornado cada vez mais frequente. Tornando a
arsenal farmacoterapêutico já existente mais diversificado, o que promove
consequentemente, maiores possibilidades de tratamentos farmacológicos de
acordo com o perfil de cada paciente.
33

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a realização do levantamento realizado para identificar os principais


tipos de heterociclos utilizados pela química medicinal, qual é a subclasse de
heterociclo mais prevalente, as características físico-químicas relevantes dessas
subestruturas e quais contribuições elas podem fornecer a moléculas de fármacos já
existentes e também para aqueles que ainda estão em desenvolvimento, foi possível
observar ainda mais quão importante essas subestruturas são para a química
medicinal. No entanto, como comentado no início da discussão, é um tema ainda
pouco abordado nas disciplinas de graduação do curso de Farmácia, sendo assim o
trabalho realizado visou fomentar a importância dos heterociclos para o meio
acadêmico e científico.
Concluiu-se que a subclasse de heterociclos mais prevalente são os
heterociclos nitrogenados, que características físico-químicas dos heterociclos como:
Coeficiente de Partição, Acidez e basicidade são de extrema importância para a
atividade farmacoterapêutica do fármaco e que os heterociclos constituem na maior
parte das vezes, o farmacóforo da molécula.
34

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ação dos fármacos. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015.

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Oxford University Press, 2012.

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Heterocyclic Compounds, v. 48, n. 1, p. 7-10, 2012.

GUYTON, A.C.; HALL, J.E. Tratado de Fisiologia Médica. 11ª ed. Rio de Janeiro,
Elsevier Ed., 2006

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JUNQUEIRA, L.C.U. & CARNEIRO, J. Histologia Básica. 11ª Ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2008. 524p.

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São Paulo: Sarvier, 2006.

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2013.

FELTRE, Ricardo. Fundamentos de Química: vol. único. 4ª.ed. São Paulo:


Moderna, 2005. 700 p

SOLOMONS, T. W. G.; FRYHLE, C. B. Química Orgânica, 10. ed. Rio de Janeiro:


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Medicinal Chemistry, v. 57, n. 14, p. 5845-5859, 2014.

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substitution patterns, and frequency of nitrogen heterocycles among U.S. FDA
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SciFinder (Chemical Abstracts Service) < https://scifinder.cas.org/>. Acesso em: nov.


2016.

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