Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
FERAL - Alem Dos Limites 92-111
FERAL - Alem Dos Limites 92-111
Retomada Histórica
4 Ver a respeito Mircea Marghescou, Le Concept de littérarité : Essai sur les pos-
sibilités théoriques d’une science de la littérature, Coll. De proprietatibus littera-
rum, La Haye: Moutoun, 1974; Charles Bouazis, Littérature et Société : Théorie
d’um modele du fonctionnement littéraire, Paris: Mame, 1972; Thomas Aron,
Littérature et Littérarité : Um essai de mise au point, Coll. Annales littéraires de
l’université de Besançon, Paris: Les Belles Lettres, 1984, assim como as primeiras
referências à noção de “literaridade”, esboçadas no âmbito da Escola de Praga.
5 No entanto, é preciso notar que o termo “teatralidade” foi introduzido na
França por Roland Barthes em 1954 (em Le Théâtre de Baudelaire, prefácio
à edição do Oeuvres complètes de Baudelaire, Paris: Club du meilleur livre,
1955; reeditado em Essais critiques, Paris: Seuil, 1964).
6 Ver Sharon Marie Carnicke, L’Instint théâtral: Evreinov et la théâtralité, Revue
des études slaves, v. 53, f. 1, p. 97-108, 1981. Em francês, a expressão mantida
foi “théâtralité”, em inglês, parece oscilar entre “theatrality” e theatricality”, e
seu uso é menos importante que entre os franceses.
86 além dos limites da razão: PARA UMA DEFINIÇÃO DA TEATRALIDADE
7 Em The tacit Dimension, New York: Garden City, 1967, Polanyi nota que esse
saber tácito provém das ligações que o indivíduo estabelece entre duas en-
tidades. O conhecimento de uma permite que deduza as características da
outra [“tacit knowing establishes a meaningful relation between two terms”
(p. 13); “we know the first term only relying on our awareness of it for attend-
ing to the second” (p.10)]. Aplicado à noção de teatralidade, isso sublinha que
nosso conhecimento do que é o teatro permitiria deduzir as características
da teatralidade. Ver também Jacques Baillon, D’Une entreprise de théâtralité,
Travail théâtrale, n. 18-19, 1975, p. 109-122.
8 A ausência do ator coloca um problema. Há teatralidade sem ator? Essa é a
questão fundamental. Beckett tenta dar uma resposta fazendo com que o ator
trabalhe no limite do desaparecimento.
A Teatralidade: Em Busca da Especificidade da Linguagem Teatral 87
11 Isso nos permite ler, pelo avesso, o segundo exemplo dado (a cena no metrô),
dessa vez para responder afirmativamente à questão colocada anteriormente
(Esta cena é teatral?): sim, o espetáculo no metrô é portador de teatralidade,
mesmo que o espectador ignorasse tratar-se de teatro.
A Teatralidade: Em Busca da Especificidade da Linguagem Teatral 89
A Teatralidade Teatral
O Ator
18 Ver Peter Brook: “Eu poderia tomar não importa que espaço vazio e chamá-lo
de cena. Alguém atravessa esse espaço vazio enquanto alguém o observa, e
é suficiente para que o ato teatral se inicie.” Peter Brook, L’Espace vide. Écrits
sur le théâtre, col. Pierres vives, Paris: Seuil, 1977, p. 25. A essa primeira defi-
nição, Peter Brook acrescenta a necessidade de um diálogo sobre a cena. “O
elemento de base de uma peça é o diálogo. Ele implica uma tensão e supõe
que duas pessoas não estejam de acordo. O que significa um conflito. Que
ele seja latente ou manifesto, pouco importa”, em Peter Brook, Points de Sus-
pension, col. Points Essais, Paris: Seuil, 2004.
19 A noção de ator é tomada aqui no sentido mais amplo possível: pode-se
tratar de marionetes, é claro, mas igualmente de teatro sem atores, como faz
o Nouveau Théâtre Expérimental de Montréal, quando apresenta uma peça
em que apenas os objetos atuam (Les Objets parlent [Os Objetos Falam],
1986-1987).
94 além dos limites da razão: PARA UMA DEFINIÇÃO DA TEATRALIDADE
20 “Todos os espetáculos partilham esse ‘não-não eu’: Olivier não é Hamlet, mas
ao mesmo tempo ele não é não Hamlet: seu jogo se situa entre a negação de
ser um outro (= eu sou eu) e a negação de não o ser (= eu sou Hamlet)”. Rich-
ard Schechner, Between Theatre and Anthropology, Philadelphia: University
of Pennsilvania Press, , 1985, p. 123.
21 A relação com o corpo difere, é claro, segundo as escolas de formação. Al-
gumas tendem a inculcar no ator uma maestria absoluta, fundada em um
método atlético – é o exemplo de Grotowski – e outras exaltam a perda do
ator em si mesmo: é o exemplo de Artaud.
A Teatralidade: Em Busca da Especificidade da Linguagem Teatral 95
O Jogo
24 Johan Huizinga, Homo Ludens. Essai sur la fonction sociale du jeu, trad. Cécile
Seresia, Paris: Gallimard, 1951, p. 35.
25 As regras do jogo teatral são diferentes, por exemplo, na época elisabetana
ou na época clássica; da mesma forma que a Commedia dell’Arte não impõe
as mesmas regras de jogo que a tragédia de Sófocles. Hoje, à medida que nos
colocamos ao lado do teatro herdado dos anos de 1960 ou do lado da tradição,
as regras do jogo cênico são diferentes. Nesse sentido, a historicização das
regras do jogo surge de um estudo da estética.
26 A noção de enquadramento foi definida por Ervin Goffman em 1959 em
Frame Analysis. Na Essay on the Organization of Experience, London: Harper
& Row, 1974, assim como em La Mise en scène de la vie quotidienne, Paris: Édi-
tions de Minuit, 1973 (1959). Nesse domínio da psicologia, o enquadramento
é aquilo que permite a interpretação da experiência. Esse enquadramento
virtual que impõe regras, mas também liberdades, tem certo parentesco com
o espaço transicional de Donald Woods Winnicott em Jeu et réalité. L’Espace
A Teatralidade: Em Busca da Especificidade da Linguagem Teatral 97
potenciel (Playing and Reality), 1971, traduzido do inglês por Claude Monod
e J.B. Pontalis, Paris: Gallimard, 1997 (1975), reeditado na col. Folio, 2002.
98 além dos limites da razão: PARA UMA DEFINIÇÃO DA TEATRALIDADE
A Proibição
28 Seria correto dizer que as transgressões que o jogo autoriza são determina-
das por diversos gêneros, épocas, países e estéticas. É onde a teatralidade no
singular dá lugar às teatralidades no plural (conceito que é, aqui, quase sinô-
nimo de estéticas). Explorar esses limites poderia ajudar-nos a estabelecer a
diferença entre teatralidades específicas ligadas a épocas ou gêneros dados e
a teatralidade profunda, aquela que sobrevive através de todas as teatralida-
des específicas. A título de início de reflexão, poderíamos dizer, por exemplo,
que a nudez hoje aceita em cena, como já o foi na Idade Média, provocou
escândalo nos anos de 1960. No entanto, o quadro virtual do jogo estava
bem colocado, mas as liberdades e transgressões autorizadas pela cena e pe-
las estéticas de épocas anteriores não permitiam o desnudamento do corpo
do ator. Prova de que o quadro virtual colocado pelo processo de jogo não
permite (autoriza) todas as liberdades e elas continuam marcadas por certas
restrições ligadas a épocas específicas, estéticas, gêneros, mesmo se uma das
funções do teatro é de assumir essas transgressões.
100 além dos limites da razão: PARA UMA DEFINIÇÃO DA TEATRALIDADE
29 Em outro lugar, Dostoiévski observou que “no teatro duas vezes dois são três
ou até mesmo cinco, em função do grau maior ou menor da teatralidade im-
plementada”. Citado por Evreinov, e retomado por Marie Carnicke, op. cit.,
p. 105.
30 É um processo paralelo àquele que D.W. Winnicott estabelecia, ao afirmar
que o investimento pulsional no jogo não devia reduzir os desejos do sujeito,
senão o jogo não seria mais possível.
A Teatralidade: Em Busca da Especificidade da Linguagem Teatral 101