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FILOSOFIA 3° ano

CARACTERÍSTICAS DO DISCURSO FILOSÓFICO:


COMPARAÇÃO COM O DISCURSO DA LITERATURA

A comparação do discurso filosófico com a produção literária


tem o sentido de propiciar o entendimento de uma forma de
manifestação do pensamento filosófico e, ao mesmo tempo,
reconhecer que Filosofia não é Literatura.
Fragmento 1: “(...) - Vai entender. Os fatos explicarão melhor os
sentimentos: os fatos são tudo.
A melhor definição do amor não vale um beijo de moça namorada.”

Fonte: Machado de Assis. “O espelho: esboço de uma nova teoria da alma humana”.
Obra Completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. v. II. Texto proveniente de: A
Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro. Escola do Futuro da Universidade de São
Paulo.

Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000240.pdf. Acesso em: 2 out. 2020.


Fragmento 2: “Todos os objetos da razão ou da investigação humanas
podem dividir-se naturalmente em dois gêneros, a saber: relações de ideias
e de fatos. Ao primeiro pertencem as ciências da geometria, da álgebra e da
aritmética e, numa palavra, toda afirmação que é intuitivamente ou
demonstrativamente certa. Que o quadrado da hipotenusa é igual à soma do
quadrado dos dois lados, é uma proposição que exprime uma relação entre
estas figuras. Que três vezes cinco é igual à metade de trinta exprime uma
relação entre estes números. As proposições deste gênero podem descobrir-
se pela simples operação do pensamento e não dependem de algo existente
em alguma parte do universo. (...) Os fatos, que são os segundos objetos da
razão humana, não são determinados da mesma maneira, (...)
O contrário de um fato qualquer é sempre possível, pois, além de jamais
implicar uma contradição, o espírito o concebe com a mesma facilidade e
distinção como se ele estivesse em completo acordo com a realidade. Que o
sol não nascerá amanhã é tão inteligível e não implica mais contradição do
que a afirmação que ele nascerá.”

HUME, David. Ensaio Sobre o Entendimento Humano. Seção II - Da origem das ideias.
Versão eletrônica do livro “Investigação Acerca do Entendimento Humano” Autor:
David Hume Tradução: Anoar Aiex Créditos da digitalização:
Membros do grupo de discussão Acrópolis (Filosofia) Homepage do grupo.

Disponível em Domínio Público: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/cv000027.pdf.


Acesso em: 9 maio 2019
ATIVIDADE 1
I - Leia os dois trechos indicados e elabore hipóteses mais
complexas do que o tamanho dos textos.
II – Qual a finalidade e estilo são utilizados nos textos?
III – Pesquise quem são os autores, onde e em que momento
viveram, assim como as obras mais relevantes.
Há diferentes possibilidades de expressão do pensamento.

Autores da Filosofia usaram versos para expor seus pensamentos, como, por
exemplo, os diálogos de Platão;

Parmênides e Voltaire, com seus contos cheios de sarcasmo e de ironia e,

Mais contemporaneamente, Sartre, que utilizava de diferentes gêneros de


escrita para manifestar suas ideias, posturas filosóficas e denúncias acerca
das nossas ações e pretensões.

Sartre escreveu textos literários, peças de teatro, roteiros de cinema, ensaios


e outros textos de teor filosófico.
Há escritores que, na sua produção literária, foram influenciados
profundamente pela Filosofia como Albert Camus, Milan Kundera, Clarice
Lispector.

Das relações entre Filosofia e Literatura, considera-se que, por vezes, a


produção literária empenha-se na reflexão filosófica, bem como a reflexão
filosófica é apresentada na produção literária.

Há ainda casos em que filósofos buscam na Literatura a matéria para a


reflexão filosófica, pois ela, muitas vezes, ilustra conceitos filosóficos.
Os diferentes gêneros filosóficos trazem um elemento fundamental: a
tentativa de universalidade.

Ainda que o texto filosófico apresenta personagens fictícios, com marcas


de personalidade individual, como nas obras de Voltaire e Sartre, ele apresenta
um ponto de vista capaz de ser generalizado, revela sempre a tentativa de
refletir sobre a relação entre o particular e o universal.

Toda a trama construída, seja ela em diálogo, carta, ensaio, poema,


aforismo, entre outros gêneros filosóficos, tem a pretensão de trazer elementos
capazes de construir a validade do seu enunciado principal revelador de um
pensamento, de um conceito fundamental.
O texto filosófico não comunica nenhuma novidade científica, política ou
cultural, não é fonte de informação, apesar das marcas do tempo e da
condição daquele que o elaborou se fazerem presentes.

O texto filosófico não é atual nem desatualizado. O texto filosófico,


independentemente do gênero, tem uma tese a ser defendida.

O fato de a Filosofia não ser Literatura não é impeditivo para que ambas
se inter-relacionam de forma diversa, sendo esse vínculo muito proveitoso
para despertar reflexões e aprimorar o conhecimento sobre o mundo e as
relações sociais, políticas, econômicas, culturais etc.
Voltaire, no Dicionário filosófico, entre os verbetes, procura refletir sobre
questões próprias da vida comum, trazendo uma linguagem pedagógica
acessível.

O verbete “amor-próprio”, por exemplo, tem o sentido de mostrar a


dificuldade de definir elementos da subjetividade como o “amor próprio”.
O Dicionário filosófico, de Voltaire, é uma obra do Iluminismo assim
como a Enciclopédia de Denis Diderot. Essas obras revelam o espírito de
uma época.

IV - A partir do exposto, faça a leitura do fragmento que segue e, a


partir dela, faça uma reflexão do sentido de “amor próprio” e em que
sentido os exemplos do mendigo e do faquir apresentam potencial para
revelar elementos do “amor próprio” capazes de contribuir para o
entendimento sobre o tema.

V - Pesquise a filosofia iluminista e o seu contexto, o cenário político e


social em que essas e outras obras foram construídas e publicadas,
assim como a recepção que elas tiveram naquele momento.
Amor Próprio
“Um mendigo dos arredores de Madri esmolava nobremente. Disse-lhe um
transeunte:
— O sr. não tem vergonha de se dedicar a mister tão infame, quando podia
trabalhar?
— Senhor, — respondeu o pedinte — estou lhe pedindo dinheiro e não
conselhos. — E com toda a dignidade castelhana virou-lhe as costas.
Era um mendigo soberbo. Um nada lhe feria a vaidade. Pedia esmola por
amor de si mesmo, e por amor de si mesmo não suportava reprimendas.
Viajando pela Índia, topou um missionário com um faquir carregado de
cadeias, nu como um macaco, deitado sobre o ventre e deixando-se chicotear
em resgate dos pecados de seus patrícios hindus, que lhe davam algumas
moedas do país.
— Que renúncia de si próprio! — dizia um dos espectadores. (...)
— Renúncia de mim próprio? — retorquiu o faquir. — Ficai sabendo que não
me deixo açoitar neste mundo senão para vos retribuir no outro. Quando
fordes cavalo e eu cavaleiro.
Tiveram, pois, plena razão os que disseram ser o amor de nós mesmos a
base de todas as nossas ações
— na Índia, na Espanha como em toda a terra habitável. Supérfluo é provar
aos homens que têm rosto. Supérfluo também seria demonstrar-lhes possuírem
amor próprio.
O amor próprio é o instrumento da nossa conservação. Assemelha-se ao
instrumento da perpetuação
da espécie. Necessitamo-lo. É-nos caro. Deleita-nos — E cumpre ocultá-lo.”

VOLTAIRE. Dicionário Filosófico. Verbete “amor próprio”.

Disponível em : http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/cv000022.pdf. Acesso em: 23 maio


2019.
ATIVIDADE 2
Leia o fragmento da obra O Príncipe, de Maquiavel, que
apresenta a política como “cenário” privilegiado da manifestação
da astúcia para vencer em situações reais.
Escreva um comentário sobre aspectos relativos ao
comportamento humano, presentes no fragmento de texto de
Maquiavel.
CAPÍTULO XV
DAQUELAS COISAS PELAS QUAIS OS HOMENS, E
ESPECIALMENTE OS PRÍNCIPES, SÃO LOUVADOS OU
RECRIMINADOS
(...) sendo minha intenção escrever algo de útil para quem por tal se
interesse, pareceu-me mais conveniente ir em busca da verdade extraída dos
fatos e não à imaginação dos mesmos, pois muitos conceberam repúblicas e
principados jamais vistos ou conhecidos como se realmente tivessem
existido. Em verdade, há tanta diferença de como se vive e como se deveria
viver, que aquele que abandone o que se faz por aquilo que se deveria fazer,
aprenderá antes o caminho de sua ruína do que o de sua preservação, eis que
um homem que queira em todas as suas palavras fazer profissão de bondade,
perder-se-á em meio a tantos que não são bons. Donde é necessário, a um
príncipe que queira se manter, aprender a poder não ser bom e usar ou não da
bondade, segundo a necessidade. (...)
Deixando de parte, assim, os assuntos imaginários para tratar dos verdadeiros,
digo que todos os homens, especialmente os príncipes por estarem situados em
posição mais proeminente, quando analisados, se fazem notar por alguns
daqueles atributos que lhes acarretam ou reprovação ou louvor. (...) Ainda, não
evite o príncipe de incorrer na má reputação por aqueles vícios que, sem eles,
seria difícil manter o Estado; pois, se bem considerado, sempre se encontrará
alguma coisa que, parecendo virtude, se praticada acarretará ruína, e alguma
outra que, com aparência de vício, uma vez seguida dará origem à segurança e
ao bem-estar.

MAQUIAVEL. N. O Príncipe. Edição Ridendo Castigat Mores.

Disponível em: http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/principe.pdf. Acesso em: 15 maio 2019.

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